A problemática da
linguagem em
Aristóteles
Solange Galeano
“As palavras são imagens dos
pensamentos e as letras imagens das
palavras.”
Aristóteles
Introdução
A realidade da linguagem não é
transparente. Ela não se oferece na
evidência de uma observação, uma
descrição ou uma reflexão. Trata-se, na
verdade, de elaboração conceitual e
teórica cuja história pode ser traçada.
Este estudo tem por objetivo
demonstrar como Aristóteles, em seus
tratados, trabalho a linguagem ou o
conceito da linguagem.
Em Aristóteles não existe tratado
algum especificamente sobre a
linguagem. Sabe-se que ele é o criador
da lógica, o codificador da retórica, o
crítico sistemático dos sofismas. E é nos
textos lógicos, retóricos, sobre a
argumentação, que se descobrirá a sua
opinião sobre a linguagem.
Esse ponto de vista aparece de
maneira muito dispersa em seus
tratados e sob diferentes pontos de
vista. O que representa um obstáculo a
ser transposto para definir uma
concepção aristotélica da linguagem.
Entretanto, faz-se, no
presente, uma relação entre lógica e
linguagem, entre linguagem e
pensamento, entre linguagem e
realidade nos tratados de Aristóteles a
fim de que se possa entender, com
maior clareza, a sua “concepção” de
linguagem.
Aristóteles e a ciência grega
I - O ambiente Histórico
Aristóteles nasceu em Estagira,
cidade da Macedônia situada ao norte de
Atenas, no ano de 384 a. C.. Seu pai era
amigo e médico de Amintas, rei da
Macedônia. O próprio Aristóteles parece
ter sido membro da grande confraria
médica de Asclepíades. Sua mãe era
originária de Cálcis, onde Aristóteles
viveria seus últimos dias.
Perdeu seu pai aos sete anos. Muito
possivelmente, também recebeu do pai
e do tutor o início da formação em
medicina, pois sendo um asclepíada,
estava destinado a seguir o mesmo
ofício de seu pai.
Muitos atribuem a esses primeiros
anos de formação o interesse que
Aristóteles manifestará, durante toda
sua vida e em sua obra, pelas coisas da
Natureza, pela biologia, pelo estudo das
plantas e dos animais, dos astros e da
alma.
Aos dezoito anos, Aristóteles vai
para Atenas onde passa a frequentar a
academia de Platão. Lá permaneceu
durante dezenove anos, até a morte do
mestre, cujo pensamento o influenciou
decisivamente e, ainda que possuísse
um gênio próprio e muito independente
e que viesse a criticar Platão, Aristóteles
recebeu a marca do platonismo.
Com a morte de Platão, Aristóteles
deixou a Academia. Essa ficara sob a
direção de Espeusipo que faz
predominar, nos ensinamentos da
escola e em suas obras, o pensamento
que Platão desenvolvera nas Leis, em
que a influência do orfismo pitagórico
fora marcante e crescente. Com isto,
Espeusipo torna a Academia um grande
centro matemático e astronômico,
afirma que, somente por meio desses
estudos, o homem chega a conhecer a
realidade última das coisas – as ideias –
como proporção perfeitas com as quais
Deus ordenou o mundo, de sorte que a
realidade última é o número e a unidade.
Aristóteles discorda dessa concepção
que tende a identificar filosofia e
matemática. Sua origem médica e
naturalista não se adapta ao
matematicismo místico, que começa a
tomar conta da Academia, e transfere-
se para Eólia, para as cidades de Assos
e Ateneu, governada por Hérmias.
Hérmias patrocinara a criação de
uma escola platônica e, durante três
anos, Aristóteles ensinou nessa escola.
Dessa época parece datar o primeiro
escrito contra o pitagorismo da
Academia.
Hérmias tinha grande interesse
político numa unificação entre a
Macedônia e a Pérsia, mas conspirações
palacianas acabaram fazendo-o ser
assassinado e Aristóteles transferiu-se
para a cidade de Mitilene.
Do período de Mitilene, datam suas
primeiras obras no campo da biologia,
havendo nelas muitas referências e
observações sobre plantas e animais. Foi
de Mitilene que Filipe da Macedônia o
chamou para ocupar-se da educação de
Alexandre, em 342 a. C..
Quando Alexandre subiu ao trono e
iniciou a conquista do Oriente,
Aristóteles foi para Atenas onde fundou
o Liceu, em 335 a.C.. Do mesmo modo
que a Academia, o Liceu também
praticava a vida comunitária, mas a
disciplina escolar era mais rígida do que
na escola de Platão.
Foi nesse período que Aristóteles
compôs suas obras mais importantes.
Também nesse período, fixa uma
classificação das ciências por ordem de
complexidade, dificuldade e
dependência interna para orientar a
formação do currículo escolar do Liceu,
e essa classificação é a que permanece
no pensamento ocidental, até nossos
dias, tendo, durante séculos,
determinado o currículo de todas as
universidades europeias até o século XIX
de nossa era. Com a morte de
Alexandre, em 323 a.C., ressurgiram
sentimentos antimacedônicos profundos
em Atenas. Combinando-se o fato de
que Aristóteles tinha ligações com a
Macedônia e que o Liceu não era bem-
visto pela Academia de Espeusipo, nem
pela escola de retórica de Isócrates, os
atenienses começaram a julgar
Aristóteles suspeito de traição.
Aristóteles abandona Atenas,
estabelecendo-se em Cálcis, na Eubeia.
Alguns meses depois, vítima de uma
doença do estômago, veio a morrer (321
a.C.).
II – A obra de Aristóteles
Pelo menos, quatro são as
principais dificuldades para o
conhecimento das obras de Aristóteles:
1) As obras conhecidas até os meados
do século 1 a.C., eram as
exotéricas (poemas, cartas,
diálogos e transcrições dos cursos
abertos ao grande público). Isso se
deve ao fato de que os amigos de
Aristóteles, no período em que
houve um forte sentimento
antimacedônico em Atenas,
retiraram as obras acroamáticas
(ensino filosófico mais profundo).
2) A partir dos meados do século I,
juntaram-se os dois conjuntos que
formou o corpus Aristotélicus.
Aristóteles, até então desconhecido
das obras filosóficas, fascinou os
leitores que passaram a dar maior
importância às suas obras
acroamáticas. O resultado foi que,
pouco a pouco, essas obras
passaram a ser negligenciadas,
esquecidas e, finalmente,
perderam-se. Hoje, só as
conhecemos por citações e
interpretações dos primeiros que
as haviam lido. Existe, pois, o
problema de saber qual a relação
que o próprio Aristóteles