MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ 9ª Promotoria de Justiça da comarca de Foz do Iguaçu Proteção aos Direitos Constitucionais, à Saúde Pública e ao Meio Ambiente
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AÇÃO CIVIL PÚBLICA
Autor:
Ministério Público do Estado do Paraná
Réu:
Município de Foz do Iguaçu
Objeto:
Compelir o réu a dar vazão ao art. 5º, incisos XIV e XXXIII e art. 216, § 2º, ambos da
Constituição Federal, regulamentados pela Lei Federal n. º 12.527/2011, que busca
efetivar a Política de Transparência da Administração Pública, especificamente através
do imediato fornecimento aos usuários do Sistema Único de Saúde que por qualquer
motivo não venham a ser atendidos quando procurarem o serviço público de saúde,
mediante solicitação verbal e/ou requerimento deste, de certidão ou documento
equivalente através do qual sejam informados, no mínimo, o nome do usuário, a
identificação da unidade de saúde, a data, a hora e o motivo da recusa e/ou
impossibilidade do atendimento.
SUMÁRIO
I. SÍNTESE DA PETIÇÃO INICIAL II. PROLEGÔMENOS III. DOS FATOS JURIDICAMENTE RELEVANTES IV. DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS DO DIREITO COLETIVO À TRANSPARÊNCIA DOS ÓRGÃOS PÚBLICOS
V. DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS A PLENA POSSIBILIDADE DE O JUDICIÁRIO DETERMINAR O CUMPRIMENTO DA
CONSTITUIÇÃO E DAS LEIS. INAPLICABILIDADE DA TESE DA VIOLAÇÃO AO POSTULADO DA
SEPARAÇÃO DE PODERES AO CASO CONCRETO
VI. DO PEDIDO VII. DOS REQUERIMENTOS
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU, ESTADO DO PARANÁ.
Todos os atos oficiais dos agentes públicos devem ser submetidos ao regime integral de publicidade. Todo cidadão tem o direito fundamental de saber a verdade e tomar conhecimento daquilo que foi feito em nome do povo, do qual ele, cidadão, é um dos componentes. (Fábio Konder Comparato1).
O Ministério Público do Estado do Paraná, por seu
Promotor de Justiça infra-assinado, com fulcro no art. 127, caput, art. 129,
incisos III e lX da Constituição Federal; no art. 1º e 2°, letra b, na Lei nº
12.527/2011 (na Lei de Acesso à Informação) e Lei Complementar nº 101/2000
(Lei de Responsabilidade Fiscal), com alteração da Lei Complementar n.º
131/2009, da Lei n.° 7.347, de 24 de abril de 1985; no art. 25, inciso IV, letra a,
da Lei n.° 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, combinados com o art. 282 do
Código de Processo Civil e demais diplomas normativos pertinentes a espécie,
vem a presença de Vossa Excelência para propor
AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA IMPOSIÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER
em face do MUNICÍPIO DE FOZ DO IGUAÇU, pessoa jurídica de direito público
interno, com sede à Rua Xavier da Silva, 660, Centro, a ser representado pelo
prefeito municipal, senhor RENI CLÓVIS DE SOUZA PEREIRA, neste município
e comarca de Foz do Iguaçu, pelas razões de fato e de direito que adiante
seguem.
1 Ética: direito, moral e religião no mundo moderno. São Paulo: Companhia das Letras. 2006, p. 635.
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I. SÍNTESE DA PETIÇÃO INICIAL
Ao longo da petição inicial o autor desenvolverá as ideias
e argumentos adiante indicados, mas que podem ser sintetizadas na seguinte
frase formulada por Sérgio Seabra, Secretário de Prevenção da Corrupção e
Informações Estratégicas da CGU: “Um cidadão que precisa de atendimento em um hospital público, mas não há
médicos disponíveis, pode solicitar a relação de médicos que deveriam estar de
plantão e questionar o poder público sobre essa ausência. Dessa forma, a Lei de
Acesso à Informação tem impacto na qualidade do serviço prestado pelo governo”.
a) A Lei de Acesso à Informação (n. º 12.527/2011) entrou
em vigor em 16 de maio de 2012 com o propósito de regulamentar o direito
constitucional de acesso dos cidadãos às informações públicas no país.
b) Dentre importantes inovações, a Lei de Acesso à
Informação (LAI), que ampliou os mecanismos de obtenção de informações e
documentos, estabeleceu o princípio de que o acesso é a regra e o sigilo a
exceção, cabendo à Administração Pública atender às demandas de cidadãos.
c) Devem cumprir as disposições da LAI os órgãos e
entidades públicas dos três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), de
todos os níveis de governo (federal, estadual, distrital e municipal), assim como
os Tribunais de Contas e o Ministério Público, bem como as autarquias,
fundações públicas, empresas públicas, sociedades de economia mista e demais
entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito
Federal e Municípios.
d) Pois bem, no tocante ao município de Foz do Iguaçu, não
existe a efetiva vontade por parte do gestor local do Sistema Único de Saúde em
providenciar a almejada transparência quanto ao serviço público de saúde. Esta
falta de transparência, por sua vez, implica em maior dificuldade na fiscalização
do serviço, o que, por seu turno, reflete negativamente em sua qualidade.
e) Neste sentido, o Ministério Público do Estado do Paraná
expediu, em agosto de 2013, a Recomendação Administrativa n. º 03/2013 ao
prefeito municipal de Foz do Iguaçu e ao gestor local do Sistema Único de
Saúde, recomendando a ambos que garantissem aos usuários do Sistema Único
de Saúde que por qualquer motivo não vierem a ser atendidos quando
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procurarem o serviço, o fornecimento imediato, mediante solicitação verbal e/ou
requerimento destes, de certidão ou documento equivalente através do qual
sejam informados, no mínimo, o nome do usuário, a identificação da unidade de
saúde, a data, a hora e o motivo da recusa e/ou impossibilidade do atendimento.
f) Contudo, mesmo decorrido mais de um ano da expedição
da Recomendação Administrativa, o município de Foz do Iguaçu não efetivou a
medida nela prevista, sequer demonstrou intenção de possibilitar que a
população tenha conhecimento e exerça de fato este direito. Até aqui só foram
adotadas medidas meramente formais, despidas de qualquer efetividade.
g) Por isso é que no ínterim do procedimento diversas foram
as tentativas de buscar extrajudicialmente que a omissão descrita fosse sanada,
o que sempre encontrou resistência por parte da municipalidade. O que se pôde
observar, repita-se, é a falta empenho por parte da Administração Pública em
dar efetividade a estas providências destinadas à transparência da gestão
pública, o que, a toda evidência, não pode ser aceito.
h) Abordagem sobre questões ligadas ao direito material e
processual atinentes ao caso.
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II. PROLEGÔMENOS “Conhecimento é poder”, afirmou Francis Bacon nos idos
de 1605. A aceitação desta máxima implica no reconhecimento de que o acesso
ao poder está diretamente relacionado ao acesso a informações. Difundir o
conhecimento significa compartilhar e democratizar o poder. Restringi-lo, por sua
vez, resulta na concentração do poder nas mãos daqueles que detêm o acesso a
informações.
Assim, o exercício prático do princípio constitucional de
que “todo poder emana do povo” está condicionado ao acesso da população ao
conhecimento e à informação. A noção de democracia, consagrada pela
Constituição Federal brasileira, está vinculada à capacidade dos indivíduos de
participarem efetivamente do processo de tomada de decisões que afetam suas
vidas. Não existe democracia plena se a informação está concentrada nas mãos
de poucos.
De fato, as instituições provedoras de conhecimento e de
informação sempre caminharam lado a lado com a ideia de democracia. A
escola, a imprensa e as bibliotecas foram sustentáculos das democracias
nascentes, e a ampliação de seu acesso à população resultou na consolidação e
no aprofundamento da democracia.
As sociedades modernas também ratificaram um
conjunto de direitos que se vinculam à disseminação do conhecimento e da
informação. São os direitos à educação, à liberdade de expressão, de imprensa
e de manifestação do pensamento e à informação.
O direito à informação é o direito de todo indivíduo de
acessar informações públicas, ou seja, informações em poder do Estado ou que
sejam de interesse público.
Embora a Constituição Federal brasileira proteja a
liberdade de informação, o exercício deste direito no País era dificultado pela
ausência de uma lei que regulamentasse obrigações, procedimentos e prazos
para a divulgação de informações pelas instituições públicas2.
2 Acesso à informação e controle social das políticas públicas; coordenado por Guilherme Canela e Solano Nascimento . Brasília, DF : ANDI ; Artigo 19, 2009.
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Em contraposição a este quadro, a Lei de Acesso à
Informação (LAI) entrou em vigor em 16 de maio de 2012 com o propósito de
regulamentar o direito constitucional de acesso dos cidadãos às informações
públicas no país. Ela traz vários conceitos e princípios norteadores do direito
fundamental de acesso à informação, bem como estabelece orientações gerais
quanto aos procedimentos de acesso. Tais conceitos e princípios devem ser
corretamente compreendidos e aplicados pelos ocupantes de cargos e funções
públicas, de forma a garantir a qualquer interessado o pleno exercício do direito
constitucional de acesso à informação de seu interesse particular ou de interesse
coletivo ou geral.
Assim, a LAI, que deve ser cumprida por todos os órgãos
e entidades da administração direta e indireta, representa uma mudança de
paradigma em matéria de transparência pública, pois define que o acesso é a
regra e o sigilo, a exceção. Qualquer pessoa, física ou jurídica, poderá solicitar
acesso às informações públicas, isto é, aquelas não classificadas como
sigilosas, conforme procedimento que observará as regras, prazos, instrumentos
de controle e recursos previstos.
Esta lei também contém comandos que fazem referência
à obrigatoriedade de órgãos e entidades públicas, por iniciativa própria,
divulgarem informações de interesse geral ou coletivo, salvo aquelas protegidas
por algum grau de sigilo. A iniciativa do órgão público de dar divulgação a
informações de interesse geral ou coletivo, ainda que não tenha sido
expressamente solicitada, é denominada de princípio da “Transparência Ativa”.
Diz-se que, nesse caso, a transparência é “ativa”, pois parte do órgão público a
iniciativa de avaliar e divulgar aquilo que seja de interesse da sociedade.
Do mesmo modo que estabelece mecanismos da
chamada Transparência Ativa, a LAI igualmente prevê procedimentos e ações a
serem realizados pelos órgãos e entidades públicas de forma a garantir o
atendimento ao princípio da Transparência Passiva. A Transparência Passiva se
dá quando algum órgão ou ente é demandado pela sociedade a prestar
informações que sejam de interesse geral ou coletivo, desde que não sejam
resguardadas por sigilo. A obrigatoriedade de prestar as informações solicitadas
está prevista especificamente no artigo 10 da LAI:
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Art. 10. Qualquer interessado poderá apresentar pedido de acesso a informações
aos órgãos e entidades referidos no art. 1° desta Lei, por qualquer meio legítimo,
devendo o pedido conter a identificação do requerente e a especificação da
informação requerida.
Dessa forma, além de disponibilizar informações que o
estado/município julgue ser de caráter público e de interesse coletivo, é também
dever do ente garantir que as informações solicitadas pela população sejam
atendidas.
A fim de melhor garantir o direito de acesso à informação,
a LAI previu o estabelecimento de um local próprio para a instalação de um
Serviço de Informações ao Cidadão (SIC) físico, descrito no inciso I do artigo 9º
da Lei. Nesse artigo, a LAI define que os SIC´s devem contar com uma estrutura
que apresente condições para orientar e atender pessoalmente o público,
informar sobre a tramitação de documentos e protocolizar requerimentos de
acesso a informações e documentos em geral3.
Além da obrigatoriedade de um SIC físico, a LAI
estabelece ainda que os órgãos e entidades públicas proporcionem meios aos
interessados para que estes possam encaminhar pedidos de informação através
da Internet.
Compete a cada estado e município, em legislação
própria, obedecidas as normas gerais estabelecidas na LAI, definir regras
específicas quanto à criação e funcionamento do Serviço de Informação ao
Cidadão (art. 45 da LAI), que, além de ser um “balcão de atendimento virtual”,
seja também uma ferramenta de gerenciamento dos pedidos de informação, o
que auxilia o trabalho da gestão da informação.
Nesse tipo de serviço o interessado pode, por meio da
Internet, fazer o pedido de informação que julgar necessário. A resposta ao
pedido também pode ser realizada, pelo órgão público demandado, pela Internet.
A prestação desse serviço pela rede de computadores se mostra uma forma ágil
3 A despeito de a LAI prever que a regulamentação dos SIC´s estaduais e municipais fique a cargo de cada um desses entes federados, é certo que todos eles devem contar com estruturas físicas que permitam o atendimento presencial ao cidadão. Dessa forma, o que o texto da Lei deixou para ser regulamentado por estados e municípios são aspectos operacionais relativos ao funcionamento do SIC, tais como: locais e horários de atendimento, regras de atendimento, entre outros detalhes não estabelecidos taxativamente na LAI para os âmbitos municipal e estadual, mas necessários ao processo de atendimento ao cidadão.
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e fácil de atender ao solicitante, que pode obter as informações necessárias sem
precisar sair de casa4.
III. DOS FATOS JURIDICAMENTE RELEVANTES
Partindo-se da premissa anterior, não é preciso ir muito
longe para que se imagine a série de equívocos e problemas que envolvem o
atendimento dispensado às pessoas pela rede pública de saúde. Aliás, além das
questões relacionadas à qualidade do atendimento em si, talvez o que chame
mais atenção e deixe a população verdadeiramente indignada seja o total
descaso dos gestores públicos em fornecer informações aos usuários do
Sistema Único de Saúde. Pacientes e familiares não conseguem obter sequer os
dados mais básicos sobre a gestão do Sistema, como, por exemplo, nome dos
médicos que lhes estão atendendo, motivos pelos quais uma consulta não se
realizou etc.
A par disto, é forçoso indagar por qual razão estes
usuários não poderiam ter conhecimento sobre os motivos pelos quais não
conseguiram atendimento em determinada ocasião? Aliás, como estas
informações já estão disponíveis num primeiro momento, quando o paciente ou
familiar se dirige até a unidade de saúde, o que impede que elas lhe fossem
repassadas de imediato?
O que se vê no dia-a-dia é uma realidade na qual não
existe a efetiva vontade por parte dos gestores em conferirem a almejada
transparência ao aludido serviço público e, por conseguinte, esta falta de
transparência implica em maior dificuldade na fiscalização do serviço
dispensado, o que, por seu turno, reflete negativamente na sua qualidade. Além
da violação das normas jurídicas vigentes, este descaso acaba por solapar a
cidadania e a dignidade da pessoa, fazendo com que ela se sinta absolutamente
impotente diante do Estado.
A questão do fornecimento das certidões é tão pacífica
que a Controladoria Geral da União divulgou material onde expressamente
afirma:
4 apud Manual da Lei de Acesso à Informação para Estados e Municípios, CGU, 1ª Edição, Brasília/2013.
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“Um cidadão que precisa de atendimento em um hospital
público, mas não há médicos disponíveis, pode solicitar a relação de médicos
que deveriam estar de plantão e questionar o poder público sobre essa
ausência. Dessa forma, a Lei de Acesso à Informação tem impacto na
qualidade do serviço prestado pelo governo”5.
Pois bem, diante do contexto acima descrito, o Ministério
Público do Estado do Paraná expediu, em agosto de 2013, a Recomendação
Administrativa n. º 03/2013 (cópia em anexo) ao prefeito municipal de Foz do
Iguaçu e ao gestor local do Sistema Único de Saúde - que é o secretário
municipal de saúde – visando a implantação das seguintes providências: 1. O município de Foz do Iguaçu e Sistema Único de Saúde,
através da sua gestão local, deverão garantir ao usuário do Sistema Único de
Saúde que por qualquer motivo não venha a ser atendido quando procurar o
serviço, o fornecimento imediato, mediante solicitação verbal e/ou requerimento
deste, de certidão ou documento equivalente através do qual sejam informados,
no mínimo, o nome do usuário, a identificação da unidade de saúde, a data, a hora
e o motivo da recusa e/ou impossibilidade do atendimento.
2. Esta certidão (ou documento equivalente) deverá ser fornecida
por servidor público, ainda que eventualmente os serviços de recepção e outros
das unidades de saúde venham a ser terceirizados.
3. Nenhum embaraço ou condicionante poderá ser imposta ao
usuário que solicitar ou requerer a certidão supra, sob pena de, o fazendo, incidir
responsabilização administrativa, criminal e/ou civil, sem prejuízo da
responsabilidade também da administração pública.
4. Em todas as unidades de saúde do município deverá ser fixado
em local facilmente visível aos usuários do Sistema Único de Saúde orientações
sobre o direito ao fornecimento da certidão mencionada no item “1”, bem como a
forma de solicitá-la.
Ocorre que, por mais prosaicas e singelas que fossem
estas medidas, decorrido mais de um ano da expedição da Recomendação
Administrativa, o município de Foz do Iguaçu não deu vazão a elas, sequer
demonstrou intenção de fazê-lo.
Nesta seara, já de início o município de Foz do Iguaçu
afirmou às fls. 26 do Inquérito Civil que não disporia de recursos financeiros para
5 Fls. 24 do Inquérito Civil.
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a confecção de alguns cartazes (?!). O gestor local do Sistema Único de Saúde,
ainda, asseverou que a lei a ser observada para o fornecimento de informações
seria a Lei Federal n. º 9.051/95, e não a LAI, o que, a toda evidência, é um
equívoco.
Posteriormente, alertado pelo Ministério Público do
Estado do Paraná acerca da insubsistência da sua justificativa e da ilicitude
presente em sua omissão, o prefeito municipal, ainda que de forma muito tímida,
fez publicar o decreto municipal n. º 22.742, que deveria regulamentar a emissão
de certidão para a defesa de direitos e esclarecimentos de situações aos
usuários do Sistema Único de Saúde em Foz do Iguaçu.
Advertido quanto às impropriedades contidas no aludido
decreto, o senhor prefeito alterou em parte seu teor, conforme de vê das fls. 89 e
fls. 99-100. Posteriormente, o município de Foz do Iguaçu informou que os
cartazes citados na Recomendação Administrativa haviam sido disponibilizados.
Além disto, apresentou apontamentos sobre a ouvidoria do Sistema Único de
Saúde.
Diante destas assertivas, com o objetivo de apurar se de
fato o acesso às informações/certidões estava sendo disponibilizado à
população - ainda que com base no equivocado decreto municipal - foram
realizadas diligências por servidores do Ministério Público do Estado do Paraná.
O resultado foi negativo. Com efeito, constatou-se um absoluto despreparo dos
órgãos públicos e de seus servidores em dar cabo desta missão. Na prática não
havia nenhuma orientação para que os servidores recebessem eventuais
solicitações de certidões nas unidades de saúde. Aliás, estes servidores sequer
tinham ciência sobre o tema. Também os cartazes não haviam sido colocados
em local de fácil visibilidade6. Do mesmo modo, nenhum dos usuários presentes
nas unidades de saúde tinha conhecimento sobre seu direito de solicitar as
certidões.
Em suma, do que foi acima narrado denota-se que o
município de Foz do Iguaçu, que é o gestor local do Sistema Único de Saúde,
está flagrantemente descumprindo as normas jurídicas vigentes que possibilitam
o acesso à informação e a obtenção de certidões por parte da população!
6 Cf. fls. 117-119 do Inquérito Civil.
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O Poder executivo local se limitou a adotar providências
de caráter meramente formais, numa tentativa de tentar conferir uma aparência
de efetividade à LAI, quando, na realidade, não há efetividade alguma. Denota-
se, então, que em momento algum houve uma real tentativa de dar vazão ao
comando constitucional que apregoa o imediato acesso à informação. Em
absoluto.
Se isto não bastasse, mesmo quanto ao aspecto
meramente normativo do decreto municipal n. º 22.742, várias impropriedades
são notadas. O mais gritante reside no fato de a LAI determinar que o acesso à
informação solicitada seja imediato (art. 11). Apenas quando houver comprovada
e insuplantável impossibilidade por parte da Administração Pública, a informação
poderá ser fornecida em outra oportunidade. Contudo, o município de Foz do
Iguaçu, de antemão, fixou um prazo de 13 (treze) dias (3 mais 10) para o
fornecimento da certidão, o fazendo sem nenhuma justificativa, numa clara
tentativa de dificultar o acesso à informação por parte da população. Tanto isso é
verossímil que, repita-se, o réu sequer se deu ao trabalho de elencar ao menos
um motivo que o impossibilitasse de fornecer imediatamente as certidões
mencionadas na Recomendação Administrativa imediatamente.
Por outro lado, relembre-se que as informações
mencionadas na Recomendação Administrativa estarão sempre disponíveis de
imediato na própria unidade de saúde, quais sejam, o nome do usuário que não
pôde ser atendido, a identificação da unidade de saúde, a data, a hora e o
motivo da recusa e/ou impossibilidade do atendimento. Assim, causa estranheza
a postura do gestor público. O ente federativo reluta em adimplir de forma
voluntária as obrigações demandadas pela Lei de Acesso à Informação, no caso
deixando de fornecer aos pacientes singelas explicações sobre o motivo de uma
recusa e/ou sobre a impossibilidade de um atendimento na área de saúde,
informações despidas de qualquer complexidade, pontue-se novamente.
Diante disso, em atenção à defesa dos direitos difusos da
coletividade em relação ao conhecimento da atuação administrativa em todos os
seus níveis, não resta outro caminho a não ser buscar no Poder Judiciário a
tutela do direito fundamental à boa Administração Pública, que reclama
necessariamente a observância do princípio da absoluta transparência
administrativa, em especial depois dos comandos existentes na LAI.
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IV. DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS DO DIREITO COLETIVO À TRANSPARÊNCIA DOS ÓRGÃOS PÚBLICOS
Tal como o direito à saúde, o direito à informação está
garantido por instrumentos nacionais e internacionais. Tendo como base o art.
19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, pode-se resumir o
direito à informação como o “direito de buscar, receber e difundir informação e
ideias” sobre qualquer tema, inclusive aquele relacionado à saúde.
Na Constituição Federal, o direito à informação está
definido no art. 5º, incisos XIV e XXXIII, bem como no art. 37:
“Art. 5º, XXXIII – todos tem direito a receber dos órgãos
públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou
geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade,
ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e
do Estado”.
A regulamentação deste direito se estabeleceu através
da Lei de Acesso à Informação, em 2011. A partir da LAI, a transparência
passou a ser a prática e o sigilo, a exceção.
A regulamentação do direito à informação contribui para
uma mudança na cultura de segredo existente dentro dos poderes públicos do
país, ao colocar o Estado como um guardião da informação pública, não como
proprietário.
No caso concreto, para que o princípio constitucional da
publicidade (CF, art. 37) e o direito fundamental à informação (CF, art. 5.º, XIV e
XXXIII) sejam efetivados é necessário que o município de Foz do Iguaçu se
adeque aos comandos estabelecidos pela Lei de Acesso à Informação, dentre
os quais aquele previsto no seu art. 11, de acordo com o qual “o órgão ou
entidade pública deverá autorizar ou conceder o acesso imediato à informação
disponível”. (gn)
Somente assim será permitido à população o pleno
conhecimento e acompanhamento, em tempo real, dos atos do Poder Executivo
municipal voltados à eficiência da gestão do Sistema Único de Saúde.
Em síntese, repisando o que consta da Recomendação
Administrativa:
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1. A saúde constitui-se em direito fundamental, tendo
em conta ser um direito social, conforme artigo 6º da Constituição Federal, e
estar incluída no Título II, que prevê os Direitos e Garantias Fundamentais.
2. O §1º do artigo 5º da Constituição Federal
assevera que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm
aplicação imediata.
3. O artigo 5º, inciso XXXIII, da Constituição Federal
de 1988 garante a todos o direito a receber dos órgãos públicos informações de
seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas
no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo
seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.
4. Já o inciso XXXIV, do mesmo artigo 5º, assegura a
todos, independentemente do pagamento de taxas, o direito de petição aos
poderes públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder,
bem como a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de
direitos e esclarecimentos de situações de interesse pessoal.
5. O artigo 10 da Lei 12527/11, que regula o acesso a
informações previsto no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do §3º do art. 37 e
no §2º do art. 216 da Constituição Federal, assegura a qualquer interessado
apresentar pedido de acesso a informações aos órgãos e entidades, por
qualquer meio legítimo, exigindo apenas a identificação do requerente e a
especificação da informação requerida.
6. O artigo 11, também da Lei 12527/11, determina
ao órgão ou à entidade pública que autorize ou conceda o acesso imediato à
informação disponível.
7. No Sistema Único de Saúde (SUS), um grande
número de cidadãos não consegue atendimento pelas mais diversas razões (por
exemplo, ausência de profissional médico habilitado, falta dos serviços ou filas
de espera para serviços de urgência e emergência, impossibilidade de o
prestador realizar os exames ou de entregar os medicamentos prescritos, entre
outras).
8. Na maioria das vezes, os próprios atendentes
responsáveis pela guarda ou regularidade da unidade de saúde informam aos
demandantes a falta do serviço buscado e as respectivas razões, prestando
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essas informações verbalmente, sem maiores esclarecimentos acerca de
prazos, filas, entre outros dados cabíveis.
9. Todavia, caso solicitado pelo usuário, é dever da
Administração Pública fornecer informações escritas sobre a falta de qualquer
serviço público, consoante previsão constitucional e legal.
10. As demandas desatendidas, por vezes, sequer
chegam ao conhecimento do gestor público que, por isso mesmo, vê-se
impedido de reorganizar os serviços.
11. A União, em atenção aos problemas gerados pela
falta de atendimento médico e de transparência na informação, editou a
Resolução Normativa (RN) nº 319, de 5 de março de 2013, da Agência Nacional
de Saúde Suplementar (ANS). Esta Resolução assentou a obrigatoriedade de os
planos privados de assistência à saúde informarem, a seus usuários, por escrito,
a negativa de autorização de procedimentos solicitados por profissionais de
saúde, no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas, em linguagem clara e
adequada, e, obrigatoriamente, as razões da negativa e a clausula contratual ou
dispositivo de lei que a ampara.
12. A par disto, os postulados de direito à saúde e
transparência na informação podem e devem refletir melhorias, também, para os
usuários dos Serviços Públicos de Saúde, e não apenas para os usuários dos
planos privados.
Senhor Juiz, a não ser por razões escusas, não se deve
jamais ocultar dos cidadãos os assuntos que a todos interessam. Daí a
necessidade de utilizar múltiplos instrumentos para garantir a transparência de
gestão. O atual estágio da sociedade exige que o Poder Público dê amplo
acesso as informações, quer através dos meios físicos, quer por intermédio de
meio eletrônico na internet, redimensionando e potencializando, com a força
comunicativa que a rede mundial de computadores possui, o alcance do
princípio da publicidade.
Como efeito reflexo, o aumento da transparência
possibilitará maior controle social, facilitando a obtenção de dados relativos à
gestão de pessoal, orçamentária e financeira e, consequentemente, reduzindo a
margem de atuação dos agentes ímprobos. É uma medida de caráter preventivo
e que visa o direito fundamental a uma boa administração pública, que deve ser
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sempre almejado, como destaca Juarez Freitas7: Almeja-se, em outro dizer, que o centro de gravidade evolua
para a concretude do primado fundamental à boa administração pública,
compreendido – com inspiração no art. 41 da Carta dos Direitos Fundamentais de
Nice, e sobretudo, à luz de nossa Constituição – como o direito fundamental à
administração pública eficiente e eficaz, proporcional cumpridora de seus deveres,
com transparência, motivação, imparcialidade e respeito à moralidade, à
participação social e à plena responsabilidade por suas condutas omissivas e
comissivas.
A publicação de informações da Administração Pública é
a forma mais eficaz de prevenir os ilícitos administrativos, além de constituir
elemento fundamental do regime republicano e do Estado Democrático de
Direito, sendo realidade na maioria dos endereços eletrônicos dos órgãos
públicos, nas esferas federal, estadual e municipal de todo o país.
A respeito do tema, são oportunas as considerações de
Wallace Paiva Martins Junior8: A publicidade ampla é o primeiro estágio de democratização da
gestão pública, mas não se esgota em si própria. Ela desempenha importante
papel formal para a motivação e a participação. Entre elas se estabelece um
círculo virtuoso porque “o conhecimento do fato (acesso, publicidade) e de suas
razões (motivação) permite o controle, a sugestão, a defesa, a consulta, a
deliberação (participação)”. Círculo virtuoso que tem efeitos formidáveis, bem
aquilatados: a transparência é um dos deveres funcionais que alcançam a ética,
articulada através de expedientes de sua instrumentalização, como a motivação, o
acesso às informações, o contraditório e a participação popular.
A participação popular, na medida em que permite a
fiscalização e a própria influência dos atos de gestão fiscal, conduz à
aceitabilidade social dos atos do Poder Público, conferindo-lhes a indispensável
legitimidade. Com efeito, segundo o Texto-Base da 1ª Conferência Nacional
sobre Transparência e Controle Social – Consocial:
7 O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 4 ed. São Paulo: Malheiros,
2009,p. 36. 8 Princípio da publicidade. In Princípios de Direito Administrativo. Organizador: Thiago Marrara.
São Paulo: Atlas, 2012, p. 235.
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16
A transparência e o acesso à informação são essenciais para a
consolidação do regime democrático e para a boa gestão pública. Além disso, são
ótimas medidas de prevenção da corrupção. A transparência e o acesso à
informação incentivam os gestores públicos a agirem com mais responsabilidade e
eficiência. E, ainda, são fundamentais para possibilitar a participação popular e o
controle social. Com o acesso aos dados públicos, os cidadãos podem
acompanhar a implementação das políticas públicas e fiscalizar a aplicação do
dinheiro público.
Enfim, nos dias atuais não se pode mais admitir que a
Administração Pública tenha o silêncio e o sigilo como as suas características de
atuação, pois, como destaca o Ministro Celso de Mello (RTJ 139/712), o novo
estatuto político brasileiro – que rejeita o poder que oculta e não tolera o poder
que se oculta – consagrou a publicidade dos atos e das atividades estatais como
valor constitucionalmente assegurado.
Nessa senda, Marcelo Figueiredo9 afirma que o princípio
da transparência concretiza o princípio da cidadania (artigo 1.º, inciso I, da CF) e
oferece meios para que os cidadãos brasileiros possam, não somente
compreender a gestão dos recursos públicos, como efetivamente participar
desse processo administrativo.
Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior10
também enfatizam que o conteúdo exegético do princípio em causa foi reforçado
pelo disposto no art. 5.º, XXXIII, de nossa Lei Maior, visto que este assegura o
direito de 'receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular,
ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena
de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à
segurança da sociedade e do Estado.
Sem transparência não há dados. Sem dados não há
informação. Sem informação não há fiscalização. Sem fiscalização não há
democracia, pois, como ensina Noberto Bobbio11, todas as operações dos
governantes devem ser conhecidas pelo Povo Soberano.
9 FIGUEIREDO, Marcelo. A Lei da Responsabilidade Fiscal – Notas essenciais e alguns
aspectos da improbidade administrativa. In Juris Plenum Ouro, Caxias do Sul: Plenum, n.º 12, mar./abr. 2010. 1 DVD. ISSN 1983-0297.
10 In Curso de Direito Constitucional. ed. Verbatim. 15ª edição, pág. 376. 11 O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. São Paulo: Paz e Terra, 1997, p. 84-86.
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17
Por isso é que, ampliando os marcos regulatórios da
transparência na gestão pública, foi editada a Lei do Acesso à informação, que
expressamente estabelece: Art. 8º É dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de
requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas
competências, de informações de interesse coletivo ou geral por eles produzidas
ou custodiadas.
Sobre a transparência passiva, ou seja, aquela em que a
Administração Pública divulga informações sob demanda em atendimento às
solicitações da sociedade, vale destacar o comando existente no art. 9º da Lei
12.527/2011: Art. 9o O acesso a informações públicas será assegurado mediante:
I - criação de serviço de informações ao cidadão, nos órgãos e entidades do
poder público, em local com condições apropriadas para:
a) atender e orientar o público quanto ao acesso a informações;
b) informar sobre a tramitação de documentos nas suas respectivas
unidades;
c) protocolizar documentos e requerimentos de acesso a informações;
e
II - realização de audiências ou consultas públicas, incentivo à participação
popular ou a outras formas de divulgação.
Relembre-se a doutrina da efetividade nesse plexo. O
texto da Constituição e sua efetividade, no Brasil, foram confundidos durante
anos com uma mera carta de intenções, como se toda a Constituição tivesse
mero caráter programático. A densidade normativa parecia igualar-se às
promessas de campanha dos parlamentares que a votaram. Um exemplo dessa
apatia é notado já na primeira Constituição, a do Império, de 1824, que
consagrava o princípio da igualdade de todos perante a Lei12, quando, em
contrapartida, o sistema convivia, sem qualquer constrangimento, com um
hediondo regime escravocrata.
A frustração constitucional integrava o conteúdo da
decepção político-eleitoral, empolgada pelo populismo, pelo coronelismo, pelo
12 Texto original da Constituição de 1824: “Art. 179: (...) XIII. A Lei será igual para todos, quer
proteja, quer castigue, o recompensará em proporção dos merecimentos de cada um.”
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18
mandonismo, pelo filhotismo e pela manipulação eleitoral.
Todavia, já durante a Constituinte, os esforços para se
dar efetividade à Lex Mater se fizeram presentes (com por exemplo, a previsão
de ADIN por omissão, o mandado de injunção etc.). E, especialmente após a sua
promulgação, desenvolveu-se fortemente a doutrina brasileira da efetividade.
Sobre o tema, discorre com maestria o hoje Ministro Luís Roberto Barroso13: A doutrina da efetividade se desenvolveu e foi sistematizada no
período que antecedeu a convocação da Assembléia Constituinte que viria a
elaborar a Constituição de 1988. Partindo da constatação ideológica de que o
constituinte é, como regra geral, mais progressista do que o legislador ordinário,
forneceu substrato teórico para a consolidação e aprofundamento do processo de
democratização do Estado e da sociedade no Brasil.
Para realizar esse objetivo, o momento pela efetividade
promoveu, com sucesso, três mudanças de paradigma na teoria e na prática do
direito constitucional no país. No plano jurídico, atribuiu normatividade plena à
Constituição, que passou a ter aplicabilidade direta e imediata, tornando-se fonte
de direitos e obrigações. Do ponto de vista científico ou dogmático, reconheceu ao
direito constitucional um objeto próprio e autônomo, estremando-o do discurso
puramente político ou sociológico.
E, por fim, sob o aspecto institucional, contribuiu para a
ascensão do Poder Judiciário no Brasil, dando-lhe um papel mais destacado na
concretização dos valores e dos direitos constitucionais.
Deve-se, portanto, pautado pelo princípio constitucional
da publicidade, firmar-se a ideia de efetividade na interpretação das normas
infraconstitucionais supracitadas, dando-se um viés que lhe potencialize o
alcance.
V. DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS
DA PLENA POSSIBILIDADE DE O JUDICIÁRIO DETERMINAR O CUMPRIMENTO
DA CONSTITUIÇÃO E DAS LEIS. INAPLICABILIDADE DA TESE DA VIOLAÇÃO AO
POSTULADO DA SEPARAÇÃO DE PODERES AO CASO CONCRETO
13 Na obra, TEMAS DE DIREITO CONSTITUCIONAL, Tomo III, Ed. Renovar, 2005, pág. 76.
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19
Em sua resposta à inicial, é muito provável que o
município de Foz do Iguaçu venha a alegar que a ação administrativa decorrente
do cumprimento das normas que embasam esta Ação Civil Pública não estaria
no campo das prioridades das gestões ora demandadas. Também por certo
poderá alegar que faltariam recursos ou, ainda, trazer a tona supostas
dificuldades operacionais, tudo o que, em verdade, havendo prioridade, são
facilmente superáveis.
Contudo, o avanço dos estudos de Direito Constitucional
permite concluir, a partir da doutrina mais atualizada com o atual momento
histórico (neoconstitucionalismo, para muitos), que, em princípio, não há óbice
para o controle, via ação civil pública, dos atos e omissões ilegais ou
inconstitucionais, o que, afinal, se coaduna com a complexidade das sociedades
modernas: Todavia, embora excepcional a realização do controle, não
prevalece a insindicabilidade da omissão administrativa pelo Ministério Público e
pelo Poder Judiciário. Com efeito, diante da omissão ilícita violadora de interesses
difusos ou coletivos não pode a discricionariedade, o princípio da separação de
poderes e os demais obstáculos geralmente alegados impedirem o controle, seja
processual, seja extraprocessual14.
Ora, se o Estado contemporâneo deve atingir as metas
impostas para a realização das necessidades sociais, e se o cidadão pode
participar das decisões, apontando os desvios da gestão da coisa pública, não se
compreende como se possa afirmar que a ação coletiva, ao exigir a observância
de um dever para o atingimento de um fim que não pode ser desconsiderado pelo
Estado-Administração, possa significar uma interferência inconcebível do
Judiciário na esfera do Poder Executivo15.
O Judiciário, que de início recebeu com certa reserva a
novidade, hoje parece perceber que a ação civil pública vem lhe permitindo
verdadeira afirmação como Poder da República. A ação, de fato enseja-lhe dizer o
Direito em relação a algumas das mais sensíveis questões nacionais. O
alargamento contínuo das fronteiras da ação civil pública alcança hoje o fenômeno
chamado de “jurisdicionalização de políticas públicas” e talvez contribua para a
14 GOMES, Luis Roberto. O Ministério Público e o Controle da Omissão Administrativa: O
controle da Omissão Estatal no Direito Ambiental. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2003, p. 294-295.
15 MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela Inibitória: individual e coletiva. 3 ed. São Paulo: RT, 2003,
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20
ruptura de uma estrutura de repartição de poderes que se traduz em hegemonia
real do Poder Executivo. Também o Poder Legislativo tende a ter seu papel mais
destacado. Rompida a tradição de edição de leis sem instrumentos de
implementação (já no Império chamadas de leis “para inglês ver”), também a
responsabilidade e grandeza desse Poder serão mais evidentes e enaltecidas16.
Não sem razão, vários autores admitem a utilização da
ação civil pública como meio idôneo à intervenção do Poder Judiciário em
matéria de políticas públicas. Podemos citar, dentre eles, Rodolfo de Camargo
Mancuso17, Luiza Frischeisen18 e João Batista de Almeida19.
A jurisprudência também tem admitido, mesmo que com
algumas restrições, o controle de políticas públicas, ainda que diante de
omissões estatais ilícitas. Eis um julgado paradigmático do Excelso Pretório: Ementa: Arguição de descumprimento de preceito fundamental. A questão da
legitimidade constitucional do controle e da intervenção do Poder Judiciário em
tema de implementação de políticas públicas, quando configurada hipótese de
abusividade governamental. Dimensão política da jurisdição constitucional
atribuída ao Supremo Tribunal Federal. Inoponibilidade do arbítrio estatal à
efetivação de direitos sociais, econômicos e culturais. Caráter relativo da liberdade
de conformação do legislador. Considerações em torno da cláusula da ‘reserva do
possível’. Necessidade de preservação, em favor dos indivíduos, da integridade e
da intangibilidade do núcleo consubstanciador do ‘mínimo existencial’. Viabilidade
instrumental da argüição de descumprimento no processo de concretização das
liberdades positivas (direitos constitucionais de segunda geração) 20 21.
p. 108.
16 FERRAZ, Antonio Augusto Mello de Camargo. Ação Civil Pública, Inquérito Civil e Ministério Público. In: MILARÉ, Édis. Ação Civil Pública: Lei 7.347/1985 – 15 anos. São Paulo: RT, 2001, p. 85.
17 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. A Ação Civil Pública como Instrumento de controle Judicial das Chamadas Políticas Públicas. In: MILARÉ, Edis (Coord.). Ação Civil Pública: Lei 7.347 – 15 anos. São Paulo: RT, 2001, p. 707-751.
18 FRISCHEISEN, Luiza Cristina Fonseca. Políticas Públicas: A Responsabilidade do Administrador e do Ministério Público. São Paulo: Max Limonad, 2000, p. 125-126.
19 ALMEIDA, João Batista de. Aspectos controvertidos da ação civil pública: doutrina e jurisprudência. São Paulo: RT, 2001, p. 73.
20 ADPF n.º 45 MC/DF, decisão monocrática, Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 4.5.2004, Informativo n.º 345-STF.
21 Também admitindo o controle de políticas, ante omissões ilícitas do Poder Executivo: STF – 2ª Turma – RE n.º 436996/SP – Rel. Min. Celso de Mello – unânime – Julgado de 26/10/2005 – DJ de 07/11/2005, p. 0003; STJ-1ª Turma – Resp. 575.280-SP – Rel. p/ acórdão Min. Luiz Fux – maioria – J. de 02.09.2004 – DJ de 25.10.2004.
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21
Diante do atual avanço doutrinário e jurisprudencial,
absurdo considerar juridicamente impossível pedido formulado em ação civil
pública que vise debelar omissão escancarada quanto ao direito coletivo
fundamental. Como já dito, também não é justificado o apego exagerado ao
princípio da separação das funções estatais (art. 2.º, da Constituição Federal de
1988) e da discricionariedade administrativa, nos moldes adotados pela doutrina
clássica e pré-Constituição Federal de 1988, principalmente quando se pende
por resgatar concepção clássica de tais postulados, que, na verdade, tem
servido de escudo contra os avanços no sentido da efetividade dos direitos
fundamentais, tanto individuais como coletivos.
Ora, no sistema constitucional brasileiro, como em
qualquer democracia moderna, à luz do sistema dos freios e contrapesos
(checks and balances), o Judiciário exerce controle de legalidade sobre os atos
do Poder Executivo, cumprindo sua missão constitucional. Então, quando um
Juiz declara a nulidade de uma licitação, a reintegração de um servidor público,
reconhece justa causa para uma rescisão contratual ou anula um contrato ou,
agindo no controle positivo, ordena a realização de uma prestação que implique
em despesas, mas que tenha por fim garantir um direito fundamental (garantir o
transporte escolar, o fornecimento de medicamentos, etc., p. ex.), não se quer
dizer que esteja administrando, mas, sim, garantindo o império da Lei e dos
direitos, individuais ou coletivos, que foram violados.
É que no sistema de tripartição dos Poderes, cada um
deles realizam funções típicas e atípicas e se entrelaçam e se controlam
mutuamente. O Executivo também interfere (legitimamente) no Judiciário
quando, por exemplo, nomeia Desembargadores pela regra do quinto
constitucional, ou quando unifica a proposta orçamentária ou ainda quando veta
projetos de lei de iniciativa e interesse do Judiciário. O Legislativo interfere no
Judiciário quando aprecia projetos como de criação de cargos etc., e no
Executivo quando cria uma CPI. E o Executivo interfere no Legislativo quando
veta um projeto de Lei, por exemplo.
Em suma, no sistema democrático os poderes se
entrelaçam como forma de controle, de frear e contrabalancear os limites
recíprocos. E poder sem controle – a história comprova – transforma-se em
arbítrio.
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22
A efetivação de uma política pública de transparência da
gestão nesta ação é consequência do controle de legalidade e não o fim da
atividade do Judiciário, e ocorrerá porque indissociável do controle para
preservar a ordem jurídica.
Desnecessário, portanto, alongar a discussão. Salta aos
olhos que a separação de poderes e a discricionariedade administrativa não
podem servir de argumentos retóricos para impedir, em tese, o pedido de
controle de omissões inconstitucionais ou ilícitas da Administração Pública.
Em casos semelhantes, o Egrégio Superior Tribunal de
Justiça vem sustentando a possibilidade jurídica do pedido em casos que
envolvem omissões ilícitas.22
VI. DO PEDIDO Diante do exposto, o Ministério Público do Estado do
Paraná pede a esse r. Juízo Cível:
1. Seja o município de Foz do Iguaçu condenado a garantir
aos usuários do Sistema Único de Saúde que por qualquer motivo não venham a
ser atendidos quando procurarem o serviço público de saúde o fornecimento
imediato, mediante solicitação verbal e/ou requerimento, de certidão ou
documento equivalente através do qual sejam informados, no mínimo, o nome
do usuário, a identificação da unidade de saúde, a data, a hora e o motivo da
recusa e/ou impossibilidade do atendimento.
2. Quanto ao fornecimento destas certidões (ou documento
equivalente), seja o município de Foz do Iguaçu condenado a fazer com que sua
disponibilização se dê por intermédio de servidor público, ainda que
eventualmente os serviços de recepção e outros das unidades de saúde venham
a ser terceirizados.
22 REsp 811.608/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15.05.2007, DJ 04.06.2007 p. 314; REsp 753.565/MS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27.03.2007, DJ 28.05.2007 p. 290); REsp 575.998/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07.10.2004, DJ 16.11.2004 p. 191; REsp 485.969/SP, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23.08.2006, DJ 11.09.2006 p. 220; REsp 790.175/SP, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05.12.2006, DJ 12.02.2007 p. 249.
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23
3. O município de Foz do Iguaçu deverá ser compelido a
não impor nenhum embaraço ou condicionante ao usuário que solicitar ou
requerer a certidão supra, a não ser aquelas expressamente previstas pela
legislação.
4. Seja o município de Foz do Iguaçu condenado a afixar
em todas as suas unidades de saúde, em local facilmente visível aos usuários do
Sistema Único de Saúde, orientações sobre o direito ao fornecimento da certidão
mencionada no item “1”, bem como a forma de solicitá-la.
5. Seja fixado em 90 (noventa) dias o prazo máximo para a
efetivação de todas estas providências, a contar do trânsito em julgado da
sentença ou, sendo o caso, da intimação da decisão judicial cujo recurso não
possua efeito suspensivo.
VII. DOS REQUERIMENTOS Complementarmente, requer-se:
a) Seja a presente ação autuada, distribuída e em seguida
ordenada a citação do réu preambularmente qualificado para que, no prazo
legal, querendo, ofereça sua manifestação por escrito a respeito dos fatos
contidos na presente inicial.
b) Caso a tutela antecipatória/ordem liminar ou a sentença
condenatória não sejam cumpridas, seja cominada multa diária (astreinte) no
valor de R$ 1.000,00 (mil reais), conforme o art. 461, § 4.º, do CPC, bem como
multa civil por ato atentatório ao exercício da jurisdição, com base no art. 14,
parágrafo único, do CPC, na importância de 20% sobre o valor da causa,
aplicados cumulativamente.
b.1) Neste tópico, impõe-se que a multa diária seja
direcionada ao senhor Prefeito Municipal - que, afinal, é a pessoa responsável
por dar cumprimento àquilo que vier a ser determinado por Vossa Excelência.
Merece destaque a posição adotada por LEONARDO CARNEIRO DA CUNHA,
pautando-se em recente decisão do Superior Tribunal de Justiça: Para conferir efetividade ao comando judicial, cabe, portanto, a fixação de multa,
com esteio no parágrafo 4º do art. 461 do CPC, a ser exigida do agente público
responsável, além de se a exigir da própria pessoa jurídica de direito público.
Realmente, segundo anotado em precedente do STJ, 'A cominação de astreintes
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24
prevista no art. 11 da Lei nº 7.347/85 pode ser direcionada não apenas ao ente
estatal, mas também pessoalmente às autoridades ou aos agentes responsáveis
pelo cumprimento das determinações judiciais' (Acórdão unânime da 2ª Turma do
STJ, REsp 1.111.562/RN, rel. Min. Castro Meira, . 25/08/2009, DJe 18/9/2009).
O referido precedente do STJ alude a dispositivo da lei
da ação civil pública, que também prevê as astreintes para forçar o cumprimento
de obrigação específica. Tal precedente, que se refere ao art. 11 da Lei nº
7.347/1985, aplica-se, por idênticas razões, à hipótese do art. 461, parágrafo 4º
do CPC, que trata da mesma multa cominatória, destinada a forçar o
cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.23 (gn).
Sobre multa pessoal aos Gestores Públicos, o mestre
Hugo de Brito Machado defende que quando seja parte no processo a Fazenda
Pública, ou uma outra pessoa jurídica, a multa prevista no parágrafo único do art.
14, do Código de Processo Civil, deve ser aplicada àquele que a corporifica, ao
agente público, ao dirigente ou representante da pessoa jurídica ao qual caiba a
conduta a ser adotada em cumprimento da decisão judicial. Diz o mestre: Não é razoável sustentar-se, que, sendo o Estado responsável pela prestação
jurisdicional, cuja presteza lhe cabe preservar, tutelando e defendendo o interesse
público primário, possa ele próprio, cometer um ato atentatório a dignidade da
jurisdição. Quem comete esse ato na verdade é o servidor público que não está
realmente preparado para o desempenho de suas atribuições em um Estado de
Direito. A esse, portanto, cabe suportar a sanção correspondente24.
No mesmo sentido são as palavras de Talamini, para
quem "cabe ainda considerar a possibilidade de a multa ser cominada
diretamente contra a pessoa do agente público, e não contra o ente público que
ele 'presenta' - a fim de a medida funcionar mais eficientemente como
instrumento de pressão psicológica"25.
Por fim, Cândido Rangel Dinamarco – ao tratar, em
parecer, da questão da efetividade da tutela jurisdicional no que tange ao
mandado de segurança – observa, verbis:
23 CARNEIRO DA CUNHA, Leonardo. A fazenda pública em juízo, 9. ed., São Paulo: Dialética, 2011, p. 162-163. 24 Descumprimento de Decisão Judicial e Responsabilidade Pessoal do Agente Publico in Revista Dialética de Direito Tributário n. 86, p. 50 usque 59, Oliveira Rocha, São Paulo, 2002 25 in Tutela Relativa aos Deveres de Fazer e de Não Fazer. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2ª ed., 2003, p. 247.
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25
O § 4º do art. 461, que as contempla [astreintes], tem a
força de autorizar pressões psicológicas sem a necessidade de instaurar
processo executivo, de modo que o próprio juiz emissor de um mandamento
possa cuidar de dar efetividade ao mandamento que emitiu. É de plena
legitimidade a imposição das multas diárias ao Banco Central ou ao Tesouro
Nacional, entidades representadas pelos funcionários impetrados, e também a
estes, separadamente e em nome pessoal, para que cumpram. A multa deverá
ter valor significativo (percentual sobre o valor devido), sob pena de não exercer
sobre os espíritos dos recalcitrantes a desejada motivação a obedecer26.
Atento às orientações da doutrina processualista civil, o
Superior Tribunal de Justiça firmou em novel precedente a juridicidade do
direcionamento das astreintes contra as autoridades estatais responsáveis pelo
cumprimento das determinações judiciais: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONTRADIÇÃO E
OMISSÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ASTREINTES. FIXAÇÃO CONTRA AGENTE
PÚBLICO. VIABILIDADE. ART. 11 DA LEI Nº 7.347/85 (...)
2. Como anotado no acórdão embargado, o art. 11 da Lei nº 7.347/85 autoriza o
direcionamento da multa cominatória destinada a promover o cumprimento de
obrigação de fazer ou não fazer estipulada no bojo de ação civil pública, não
apenas ao ente estatal, mas também pessoalmente às autoridades ou aos
agentes públicos responsáveis pela efetivação das determinações judiciais,
superando-se, assim, a deletéria ineficiência que adviria da imposição desta
medida exclusivamente à pessoa jurídica de direito público (...)
(EDcl no REsp 1111562/RN, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA,
julgado em 01/06/2010, DJe 16/06/2010).
b.2) Contudo, se ainda assim as medidas pretendidas
no item anterior não surtirem os efeitos desejados, pugna-se seja determinado o
bloqueio das verbas publicitárias do município de Foz do Iguaçu, suficientes para
custear o pagamento da multa cominatória, com a exigência da imediata
reversão ao pagamento neste processo, devendo tal obrigação permanecer até
que o município de Foz do Iguaçu adote as providências cabíveis no sentido de
sanar a mencionada omissão.
26 in "Execução de Liminar em Mandado de Segurança - Desobediência - Meios de Efetivação da
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ 9ª Promotoria de Justiça da comarca de Foz do Iguaçu Proteção aos Direitos Constitucionais, à Saúde Pública e ao Meio Ambiente
26
b.3) Por oportuno, convém relembrar que o art. 1º, XIV
do Decreto-lei 201/1967 diz ser "crime(s) de responsabilidade dos prefeitos
municipais, sujeito(s) ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do
pronunciamento da Câmara de Vereadores (...) XIV – (...) deixar de cumprir
ordem judicial, sem dar o motivo da recusa ou da impossibilidade, por escrito, à
autoridade competente".
Ademais, o art. 14, inciso V, do Código de
Processo Civil estipula como um dos deveres das partes e de todos aqueles que
de qualquer forma participam do processo "cumprir com exatidão os provimentos
mandamentais e não criar embaraços à efetivação de provimentos judiciais, de
natureza antecipatória ou final". No mesmo sentido, o art. 600, inciso III, do CPC.
A violação dos dispositivos em questão configura ato atentatório à dignidade da
jurisdição e jamais deve ser tolerada no âmbito de um Estado Democrático de
Direito.
Não se pode olvidar, ainda, que a Lei 8.429/1992
(Lei de Improbidade Administrativa) enquadra como ato de improbidade
administrativa atentatório aos princípios da Administração Pública "qualquer
ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade,
legalidade e lealdade às instituições, e notadamente: (...) II – retardar ou deixar
de praticar, indevidamente, ato de ofício".
Em suma, o consciente e voluntário
descumprimento, pelo gestor público, de uma decisão judicial pode, em tese,
configurar um ato de improbidade administrativa, ao menos – desde que
inexistentes o enriquecimento ilícito ou o prejuízo ao erário – na modalidade de
improbidade por violação aos princípios da Administração Pública, dando, por
conseguinte, ensejo às sanções estabelecidas no art. 12 da Lei de Improbidade
Administrativa.
c) A observância do art. 18 da Lei 7.347/85 e do art. 27 do
Código de Processo Civil quanto aos atos processuais requeridos pelo Ministério
Público.
d) A condenação do réu ao pagamento das custas
processuais, dos honorários advocatícios e demais verbas de sucumbência, a
Liminar", Revista de Direito Administrativo, n. 200, junho de 1995, p. 321 – grifos acrescidos.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ 9ª Promotoria de Justiça da comarca de Foz do Iguaçu Proteção aos Direitos Constitucionais, à Saúde Pública e ao Meio Ambiente
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serem revertidos em favor do Fundo Especial do Ministério Público (Lei Estadual
n. 12.241/98).
e) Seja o titular 9ª Promotoria de Justiça da comarca de
Foz do Iguaçu intimado pessoalmente para todos os atos e audiências a serem
realizados durante o trâmite da presente ação.
f) Considerando a manifesta desnecessidade da produção
de qualquer prova em audiência de instrução e julgamento, pugna-se desde já
pelo JULGAMENTO CONFORME O ESTADO DO PROCESSO, na sua
modalidade JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE (art. 330, inciso I, CPC).
Contudo, diante da preclusão consumativa, caso não seja esse o entendimento
do Juízo, o autor se manifesta pela produção de todas as provas em direito
admitidas, inclusive o depoimento pessoal da parte ré. Mostrando-se necessário,
também devem ser ouvidas testemunhas, realizadas perícias e juntados novos
documentos ao processo.
Dá-se a causa o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Foz do Iguaçu, 26 de setembro de 2014.
Ródney André Cessel Promotor de Justiça
DOCUMENTOS ANEXOS: Cópia dos autos do Inquérito Civil MPPR n. º 0053.13.000547-2