A ADOÇÃO DO SISTEMA ACUSATÓRIO NO DIREITO BRASILEIRO,
COM ENFOQUE NA IMPARCIALIDADE DO JULGADOR.
Soraya Moradillo Pinto1
SUMÁRIO: 1. Introdução, 2. Do Processo Penal. 3. Garantias Constitucionais do Processo
Penal. 4. Imparcialidade. 5. Sistema Acusatório. Considerações Finais. Referências.
RESUMO
À vista da limitação da iniciativa probatória do juiz brasileiro, ressalvada a
possibilidade de produção de prova ex officio para a demonstração da inocência do
acusado, a legislação processual penal brasileira adotou o modelo do sistema
acusatório, implícito na Constituição Federal por força das garantias individuais, das
quais derivam os princípios constitucionais penais nela recepcionados.
Palavras chaves: processo penal, imparcialidade, acusatório.
1 Juíza de Direito da 4ª vara crime da Comarca de Salvador – Ba ,Pós-Graduada em Direito Penal e Processual Peal pela UES-RJ, Pós-Graduada em Ciências Criminais pela UNAMA-AM, Doutoranda em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino - UMSA - Argentina, Pós-Graduanda em Direito Penal e Processual Penal pela Faculdade Baiana de Direito, Acadêmica de Psicologia da Faculdade Ruy Barbosa, cursando o 8º semestre, autora do livro Infiltração Policial nas Organizações Criminosas ISBN:978-85-7453-636-1.
4
ABSTRACT
In view of the limited evidence of the initiative of Brazilian judge, except for the
possibility of evidence ex officio to demonstrate the innocence of the accused, the
Brazilian legislation, adopted the model of the adversarial system, as implied by the
Federal Constitution, under individual guarantees approved upon it.
Keywords: criminal proceedings, impartiality, accusatory.
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho objetiva a apresentação de um Artigo Científico no qual se
objetiva demonstrar que o Processo Penal, como forma de realização do direito
material, deve caminhar em paridade com o texto constitucional, posto que a
Constituição de 1988 consagrou Princípios como garantia dos direitos do cidadão e
contra o arbítrio do Estado.
Desse modo, tem o Processo Penal sofrido alterações, a exemplo das
implementadas pelas leis 11.719/08 e 11.690/08 que trouxeram significativas
alterações na ritualística processual e na parte probatória, com escopo de ajustar a
norma processual penal às exigências do texto constitucional, colocando os
litigantes em paridade de armas, impondo ao órgão acusador, o ônus da prova e
favorecendo ao acusado o direito de defender-se de forma ampla, das provas contra
ele produzidas.
À vista disto, pode-se notar que o Direito brasileiro, adotou o sistema acusatório,
pois reservou papéis específicos a órgãos distintos, afastando o juiz da coleta da
prova, garantindo assim a sua imparcialidade; elemento imprescindível na realização
do objetivo da norma sancionatória penal.
5
2 DO PROCESSO PENAL
A palavra processo deriva do verbo procedere, que significa avançar, caminhar em
direção a um fim, envolvendo portanto, a idéia de temporalidade, o que reafirma o
entendimento de Carnelluti2
O processo penal é o instrumento, consistente em um conjunto de atos
sistematizados, utilizado para a realização do direito material e que somente poderá
ser posto em prática pelo órgão jurisdicional quando este for provocado. Desse
modo, o órgão jurisdicional o recepcionará se houver indícios de prova sobre a
existência do fato imputado e a sua autoria.
(apud LOPES, 2007, p. 7) de ser “algo que se opera no
tempo” .
Apesar do Código de Processo Penal (CPP) brasileiro (ainda vigente) ter sido
elaborado em 1941, sobre bases autoritárias, haja vista ter sido inspirado na
legislação processual italiana, produzida na época do regime fascista e tendo como
principio fundamental norteador a presunção da culpabilidade, o texto constitucional a
ele caminhou em direção diametralmente oposta.
Goldschimit3
Com efeito. Ao instituir um sistema de amplas garantias individuais, a começar pela
afirmação da situação jurídica de quem ainda não tiver reconhecida a sua
responsabilidade penal por sentença condenatória passada em julgado (art. 5o, LVII
da Constituição Federal)
(apud Lopes, 2007, p. 8) defende a idéia de que o processo penal de
uma nação nada mais é que um “termômetro” dos elementos “autoritários e
democráticos da sua Constituição”. Desse modo, uma Constituição autoritária terá um
processo penal de eficiência antigarantista, enquanto uma Constituição democrática
possuirá um processo penal embasada em princípios garantidores dos direitos
fundamentais.
4
2 CARNELUTTI, Francesco Derecho Procesal Civil y Penal. Tradução de Enrique Figueroa Alfonso. Mexico: Episa, 1997, p. 12.
, a nova ordem passou a exigir a condução do processo não
3 GOLDSCHIMIDT, J. Problemas Jurídicos y Políticos del Proceso Penal. Barcelona: Bosch, 1935, p. 67. 4 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, a Igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]
6
mais como mero veículo de aplicação da lei penal, mas como um instrumento de
garantia do indivíduo em face do Estado.
Assim, não obstante seja considerado atual, no que tange a sua vigência, alguns dos
dispositivos do CPP5, como os relativos à prova, foram alterados pela Lei no 11.690,
de 10 de junho de 20086 e a ritualística, alterados pela Lei. 11.719 de 20 de junho de
20087
Em sendo o processo penal, um procedimento a ser provocado pelo órgão
acusador, visando à apuração de um fato criminoso e conseqüente punição do seu
autor, àquele caberá provar a imputação através de provas testemunhal, pericial,
documental etc. Enquanto ao imputado, por força do principio constitucional da
presunção de inocência, competirá defender-se amplamente da imputação,
reservando-se ao magistrado a função de garantir a realização do processo com
obediência as garantias e princípios constitucionais.
.
Segundo Oliveira (2007, p. 8), para ser justo, deve o processo penal ser realizado sob
instrução contraditória, perante o juiz natural da causa e com a exigência da
participação efetiva da defesa técnica, como única forma de construção válida do
convencimento judicial, que por sua vez deverá ser sempre motivado.
O referido autor, ainda assinala que o processo deve ser construído sob os rigores da
Lei, da conduta ética e do Direito, cuja observância é imposta a todos os agentes do
Poder Público, de maneira que a verdade judicial seja também a verdade das provas
obtidas. Nesse sentido, tanto o Ministério Público quanto o Poder Judiciário devem
atuar com imparcialidade.
LVII – Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. 5 Código de Processo Penal. 6 Foram alterados com a Lei no 11.690/2008 os artigos: 155, 156, 157, 159, 201, 210, 212, 217 e 386 do CPP. 7 Foram alterados com a Lei. 11.719/08 os atigos: 63, 257, 265, 363, 366, 383, 384, 387, 394 a 405, 531 a 538 todos do CPP , acrescentando-se o art. 396-A.
7
3 GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO PENAL
Dentro de um Estado Democrático de Direito, baseado em uma Constituição que
regulamenta e ao mesmo tempo limita o poder, legitimando-o pelo respeito aos
direitos fundamentais, a finalidade precípua do ordenamento punitivo deve ser a de
proteger os direitos humanos e os bens jurídicos essenciais à sua coexistência. E
esse é o objetivo do sistema garantista (SG) no ordenamento jurídico brasileiro.
Ferrajoli (2006) assinala que o SG trata-se de um modelo-limite, jamais
perfeitamente satisfatível, cuja axiomatização resulta da adoção de dez princípios
fundamentais, não deriváveis entre si, denominados: princípio da retributividade;
princípio da legalidade; princípio da necessidade; princípio da lesividade; princípio
da materialidade; princípio da culpabilidade; princípio da jurisdicionariedade;
princípio acusatório; princípio do ônus da prova ou da verificação; e, princípio do
contraditório. De acordo com o foco deste trabalho se discorrerá apenas sobre os
cinco princípios considerados mais relevantes, iniciando pelo princípio da legalidade.
Conforme assinala o supramencionado autor, de todos os princípios garantistas, o da
legalidade é aquele que caracteriza especificamente o sistema cognitivo, ocupando um
lugar central no SG. Em sentido lato ele se limita a exigir a lei como condição
necessária da pena e do delito. Por outro lado, no estrito, exige todas as demais
garantias como condições necessárias da legalidade penal. Disso infere-se que a
legalidade estrita, tal como resulta de sua conformidade para as demais garantias, por
hipótese de hierarquia constitucional, é uma condição de validade ou de legitimidade
das leis vigentes.
Pelo princípio da lesividade, somente os comportamentos que lesionem direitos de
outrem e que não sejam apenas pecaminosos ou imorais podem ser penalizados; o
direito penal só pode assegurar a ordem pacífica externa da sociedade, não estando
legitimado, nem adequado, para a educação moral dos cidadãos. As condutas
essencialmente internas ou individuais, caracterizadas por serem escandalosas,
imorais ou pecaminosas, sem, contudo afetar nenhum bem jurídico tutelado pelo
Estado, não possuem a lesividade necessária para legitimar a intervenção penal
(LOPES JR, 1997, p. 27).
8
Resumidamente, o princípio da culpabilidade estabelece a obrigatoriedade de se
provar a culpa do acusado no cometimento de um ato considerado criminoso.
Pelo princípio acusatório as funções de acusação e de julgamento são reservadas a
pessoas (ou órgãos) distintos. Tal princípio é considerado como um dos pilares do
sistema de garantias individuais postos pela Constituição de 1988 (OLIVEIRA, 2007,
p. 185).
O Princípio do Contraditório, por sua vez, contém o enunciado de que todos os atos e
termos processuais devem primar pela ciência bilateral das partes, e pela possibilidade
de tais atos serem contrariados com alegações e provas (PORTANOVA, 2001, p. 23).
Uma forma sintetizada deste princípio é apresentada por Greco Filho (1996, p. 90):
O contraditório se efetiva assegurando-se os seguintes elementos: a) o conhecimento da demanda por meio de ato formal de citação; b) a oportunidade, em prazo razoável, de se contrariar o pedido inicial; c) a oportunidade de produzir prova e se manifestar sobre a prova produzida pelo adversário; d) a oportunidade de estar presente a todos os atos processuais orais, fazendo consignar as observações que desejar; e) a oportunidade de recorrer da decisão desfavorável.
Pode-se notar que a citação supramencionada abarca, entre os elementos que
compõem o Princípio do Contraditório, os próprios elementos do Princípio da Ampla
Defesa – de fato indissociáveis haja vista a natureza dos princípios fundamentais do
Estado Democrático de Direito. Em um processo, a Ampla Defesa abre espaço para
que o litigante exerça, sem qualquer restrição, seu direito de defender-se.
Outrossim, esses princípios limitam o poder punitivo do Estado, principalmente no
que tange a liberdade do réu. Assinala Macedo (2005, p. 6) que:
A própria existência de um processo judicial limita o poder coercitivo do Estado, para tanto devem ser respeitadas as normas, os princípios constitucionais e as garantias dadas ao indivíduo, para que não haja abusos e violações aos seus direitos, a sua dignidade enquanto ser humano.
Os princípios constitucionais são considerados como pilares do ordenamento
jurídico, pois orientam o intérprete de como agir diante das normas jurídicas, e das
situações concretas que lhe são apresentadas em seu cotidiano.
9
4 DA IMPARCIALIDADE DO JULGADOR
O Juiz julgará de acordo com o seu livre convencimento, formado pela livre
apreciação da prova produzida em contraditório judicial conforme preceitua o art.
155 do Código de Processo Penal com a alteração dada pela Lei. 11.690/08.
Destarte, o processo penal é uma verdadeira guerra técnica entre as partes
(acusador e defensor) em que cada um usará de suas habilidades para ter uma
prestação jurisdicional que lhe seja favorável.
Desse modo a prova produzida pelas partes tem um “valor de garantia” e não um
“valor de verdade”, porque vista como norma da esfera pessoal de liberdade.
Vale ressaltar, que a busca da verdade material em direito processual penal é uma
utopia, porque a verdade que se busca no processo é a verdade que surge do
embate entre acusação e defesa e foi por isso que o legislador adotou o sistema
cross-examination ao editar o art. 212 do Código de Processo Penal com a
modificação introduzida pela Lei. 11.690/2008, nele inserindo o método da pergunta
ou repergunta diretamente à testemunha, réu ou vítima.
Ada Pelegrini (2008, p. 58) guarda o entendimento sobre a verdade material, no
sentido de que o termo deve ser tomado no sentido da verdade da qual se deve
subtrair a influência que as partes “por seu comportamento processual exercem
sobre ela” e no sentido da verdade que há de ser tomada como “judicial” prática, que
mesmo não sendo absoluta ou ontológica há de ser processualmente válida.
Ora. Se a verdade irá surgir, para o Magistrado, da forma como se lhe apresente as
partes, obviamente não poderá ele interferir na busca dessa verdade gerindo a
prova, sob pena de comprometer a sua imparcialidade.
Com efeito. O processo é uma sucessão de atos tendentes a descobrir, a
reconstituir a realidade passada. Para isto, se utiliza a técnica judiciária do relato
humano, feito pelo réu, pelas vítimas e pelas testemunhas. Esses relatos, entretanto
que é trazido ao Juiz, raramente se fazem de modo corrente, natural, como simples
e sincera narração de fatos memorizados.
10
Assim, as testemunhas e a vítima, narrarão os fatos de acordo com a sua
percepção, não podendo elas, nem o Magistrado que as inquire, se livrar da
subjetividade e ver as coisas “como são”, aquilo que é o real, uma vez que em toda
experiência de consciência está envolvido o que é informado pelos sentidos e
também, o modo como a mente enfoca ou trata, aquilo que é informado.
Ao inquirir a testemunha o Magistrado já faz um prejulgamento daquele depoimento
e, inconscientemente, irá gerir a prova de acordo com aquilo que lhe ditou a sua
subjetividade. Contudo, se ele se posiciona como espectador na investigação da
prova, será capaz de fazer o “epoché”8
A epoché propõe “ir-à-coisa-mesma”, o que significa não assumir concepções prévias, deixar que o fenômeno se mostre como é de fato; é a colocação do mundo entre parêntese, quando o exclui do campo valorativo, quando substitui o mundo julgado, pensado, avaliado, pelo mundo em seu estado bruto, anti-depreciativo. Quando assim se procede, não é mais o mundo que aparece, mas o seu sentido, a sua essência (PEIXOTO, 2003, p. 23).
, ou seja, é capaz de deixar de lado, todos os
seus pré-conceitos, suspender provisoriamente as suas convicções, os seus
conhecimentos preestabelecidos e os seus julgamentos, para somente assim,
apreender a “coisa em si” e nisto consiste a sua imparcialidade.
A imparcialidade do órgão jurisdicional é, portanto, um “princípio supremo do
processo” e como tal imprescindível para o seu normal desenvolvimento e obtenção
do reparto judicial justo, ficando evidentemente comprometida quando estamos
diante de um Juiz instrutor ou quando lhe atribuímos poderes de gestão ou de
iniciativa probatória. Contraste que se estabelece entre a posição totalmente ativa e
atuante do instrutor e a inércia que caracteriza o julgador.
O juiz deve então, manter-se afastado da atividade probatória, para ter o alheamento
necessário para valorar a prova testemunhal. A figura do Juiz-espectador em
oposição a figura inquisitória do Juiz-ator é o preço a ser pago para termos um
sistema acusatório. Mas que isto, é uma questão de respeito às esferas de exercício
de poder. Crer na imparcialidade de quem está absorvido pelo investigador é um
“erro psicológico”; incompatibilidade psicológica que levou ao descrédito do modelo
inquisitório.
8 Contemplação desinteressada, deixar de lado o racional, os julgamentos e os pré-conceitos, sendo para os céticos gregos a única forma de levar a imperturbabilidade.
11
O Jurista Aury Lopes Júnior (2008) já citado, declarou com propriedade, que o Juiz
para estar consciente do seu mister precisa “ racionalizar” seus medos e fazer valer
a “ função democrática-garantidora” que a Carta Magna lhe atribui, não se arvorando
no papel de justiceiro, responsável pela defesa da sociedade, agindo como se
policial fosse , exercendo o poder de polícia do Estado ou seu poder acusador.
Afirma o citado doutrinador que “tolerância, humanidade e humildade, são atributos
que não podem ser despidos pela toga e tampouco asfixiados pelo poder”
revelando-se o sistema acusatório na imparcialidade do julgador.
5 DO SISTEMA ACUSATÓRIO
Segundo Oliveira (2007, p.11), a doutrina costuma, de um modo geral, separar o
sistema processual inquisitório do modelo acusatório pela titularidade atribuída ao
órgão da acusação. Inquisitorial, seria, assim, o sistema em que as funções de
acusação e de julgamento estariam reunidas em uma só pessoa (ou órgão).
No sistema acusatório a gestão da prova está nas mãos das partes, o que torna o
Juiz um “espectador”, enquanto que no sistema inquisitório a gestão da prova está
nas mãos do julgador, o que torna o Juiz “ator”. Desse modo, não podemos
conceber a existência conjunta de dois sistemas (inquisitório e acusatório), porque
cada um dos deles são informados por um princípio unificador.
Quem dita os elementos essenciais para a identificação de determinado sistema é o
modelo do Estado, se garantista ou autoritário e a nossa Constituição adota o
modelo garantista, tão bem delineado por Ferrajoli.
[...] todo sistema processual que tem o juiz como um sujeito passivo rigidamente separado das partes e o julgamento como um debate paritário, iniciado pela acusação, à qual compete o ônus da prova, desenvolvida com a defesa mediante um contraditório público e oral e solucionado pelo juiz, com base em sua livre convicção (FERRAJOLI, 2006, p. 519).
As palavras do referido autor, permitem notar que esse sistema favorece modelos de
juiz popular e procedimentos que valorizam o contraditório como método de busca
da verdade. Portanto, considerando que o modelo inquisitório está superado no
tempo, diz-se que o modelo brasileiro é mesmo o acusatório.
12
Ferrajoli, já citado, aponta ainda a separação entre juiz e acusação como o mais
importante elemento constitutivo do modelo teórico acusatório, por ser estrutural e
logicamente pressuposto de todos os outros. Segundo o autor, essa separação
forma a primeira das garantias orgânicas estipuladas no modelo teórico brasileiro.
Isso, para nós, está bem delineado na exposição de motivos do anteprojeto do novo
Código de Processo Penal Brasileiro9
Outrossim, conforme estabelece o art. 156 do CPP, com a alteração dada pela Lei.
11.690/08, a iniciativa probatória do juiz deve limitar-se ao esclarecimento de questões
ou pontos duvidosos sobre o material já trazido pelas partes. O que não significa que
o juiz deva ficar preso apenas na investigação dos fatos. Defende-se aqui, a
afirmação de um modelo acusatório igualitário que vede a atuação judicial em
substituição ao Ministério Público possibilitando a realização do efetivo equilíbrio de
forças na relação processual penal.
.
Corrobora essa assertiva Tourinho Filho (2007) quando, além de reafirmar que no
Direito pátrio, o sistema adotado é o acusatório, assinala também que a acusação,
nos crimes de ação pública, está a cargo do Ministério Público (MP).
Nessa mesma linha está o pensamento de Jardim (1997, p. 323) o qual leciona: “O
juiz somente pode desempenhar sua atividade propriamente jurisdicional, após o
exercício da demanda, que pressupõe um processo de partes: ne procedat iudex ex
officio e os seus consectários lógicos”10
Ocorre que, os aplicadores do direito processual penal têm feito tábula rasa
.
11
9 Anteprojeto do Código Penal Brasileiro, disponível em:
do que
prescreve A Magna Carta naquilo que se refere à privatividade da ação penal
pública, particularmente quanto às medidas de cunho cautelar.
http://www.juareztavares.com/Textos/anteprojeto.pdf, acesso em 19.07.2010. 10 Neste sentido, veja-se art. 129, inc. I, da C.F.
11 Santo Tomás de Aquino chegou a cunhar a expressão Tábula Rasa para descrever a constituição do homem, ou seja, uma “folha em branco” onde, ao longo da vida, o homem escreve sua própria história e define, a partir de suas impressões, sua essência e natureza. Esta visão admite e consolida, portanto, a noção de que a construção do ser humano está intimamente,
13
Por isso, embora este trabalho concorde com o que preceituam Tourinho Filho (2007)
e Jardim (1997) acredita-se que não se trabalha, no âmbito da legislação processual
penal, com o declarado sistema acusatório absolutamente puro. Isso porque, pode-se
verificar sem nenhum esforço, que o texto constitucional, em seu art. 129, I,
estabelece que a promoção da ação penal pública é tarefa de inteira exclusividade
do MP.
Provavelmente o legislador não quis, com isso, referir-se apenas à ação penal
condenatória, mas também às outras modalidades nas quais se possam deduzir
pretensões penais, incluindo-se aquelas de caráter cautelar, tais como as
modalidades de prisão preventiva e outras.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Carta Magna atrela a intervenção penal às garantias individuais e como tal,
através dos princípios processuais penais como os da: legalidade, acusatório,
contraditório, culpabilidade e ampla defesa, recepciona o modelo acusatório, pelo
qual o atribui a órgãos distintos as funções de acusar, defender e julgar, abrindo ao
acusado a possibilidade de amplamente de defender da imputação que lhe é feita e
contrariar a prova produzida pelo órgão acusador, cujo ônus lhe compete, enquanto
o Juiz se limita a decidir, deixando a interposição de solicitações e o recolhimento do
material, àqueles que perseguem interesses opostos e sustentam opiniões
divergentes, sendo-lhe vetado se encarregar de atividades inerentes às partes, a fim
de ter assegurada a sua imparcialidade.
indissociavelmente, ligada ao meio em que esse homem se insere. Expressão erroneamente atribuída a John Locke (SANTOS, 2008).
14
REFERÊNCIAS
ARAS, Vladimir. Princípios do Processo Penal. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n.
52, nov. 2001. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2416>. Acesso em: 20. Jul. 2010.
BRASIL. Decreto Lei no 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Rio de Janeiro, out. de 1941.
CARNELUTTI, Francesco Derecho Procesal Civil y Penal. Tradução de Enrique
Figueroa Alfonso. Mexico: Episa, 1997.
15
FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias, LOPES, Maurício Antônio Ribeiro. Comentários à Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. 2. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997.
GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. 11. ed. V. II. São
Paulo: Saraiva, 1996.
GOLDSCHIMIDT, J. Problemas Jurídicos y Políticos del Proceso Penal. Barcelona:
Bosch, 1935, p. 67.
GRINOVER, Ada Pelegrini, O Processo em Evolução. Rio de Janeiro. Forense
Universitária. 1988.
LOPES, Aury Jr. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional,
vol.1, 2ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008.
16
MACÊDO, Taihana Fernandes de. Os princípios constitucionais no processo penal e limite ao poder punitivo do Estado. 17/11/2005. Disponível em
<http://www.direitonet.com.br/artigos/x/23/37/2337/>. Acesso em 19.jul. 2010.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal comentado. 6. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 8. ed. Rio de Janeiro:
Lúmen Júris, 2007.
PEIXOTO, Adão José. Concepções sobre Fenomenologia. Goiânia. Editora
Universidade Federal de Goiás. 2003.
PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2001.