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Ncleo de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica

Cadernos NAEProcessos estratgicos de longo prazo Nmero 2 / 2004 NAE-Secom/PR, 2004

Biocombustveis

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Cadernos NAE: n. 2, agosto 2004 Projeto grfico e diagramao: Anderson L. de Moraes Reviso: Nathlia Kneipp Ncleo de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica Presidente: Luiz Gushiken, Ministro-Chefe da Secretaria de Comunicao de Governo e Gesto Estratgica (Secom) Coordenador: Glauco Arbix, Presidente do Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada (Ipea) Secretrio Executivo: Oswaldo Oliva Neto - Coronel EB SCN Q. 2 Bl. A Corporate Financial Center, sala 1102 70712-900 Braslia, DF - Tel: (55.61) 424-9600 - Fax: (55.61) 424-9661 http://www.planalto.gov.br/secom/nae/ e-mail: [email protected] ou [email protected]

Cadernos NAE / Ncleo de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica. no. 2 (jul. 2004). - Braslia: Ncleo de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica, Secretaria de Comunicao de Governo e Gesto Estratgica, 2004Irregular ISSN 1806-8588 1. Estudos estratgicos Brasil. 2. Desenvolvimento. 3. Energia. 4. Polticas pblicas e setoriais. 5. Biocombustveis CDU: 35(81)

Impresso em Braslia, 2004

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SumrioApresentao Seo 1 - Avaliao do Biodiesel no Brasil Resumo executivo Introduo Programas de Biodiesel no Mundo Aspectos Tecnolgicos Aspectos Ambientais Histrico de uso energtico de leos vegetais no Brasil Mercado para Biodiesel no Brasil Matria-Prima para o Biodiesel no Brasil As Escalas de Produo e o Sistema de Produo Agrcola Aspectos Econmicos Concluses Recomendaes Observao final Nota 1 - Rotas tecnolgicas e matrias-primas Nota 2 - Especificaes e testes Nota 3 - Uso energtico de leos vegetais como combustveis no Brasil Nota 4 - Palmeiras e biodiesel no Brasil Nota 5 - Glicerol: mercados e perspectivas Nota 6 - Gerao de empregos e rendas: dend Nota 7 - Formao do preo do leo diesel no Brasil Seo 2 - Avaliao da Expanso da Produo de Etanol no Brasil Resumo executivo Introduo Parte A. Evoluo e estgio atual da produo no Brasil A cadeia produtiva hoje Aspectos tecnolgicos e ambientais Gerao de emprego e renda Aspectos econmicos Parte B. Perspectivas de evoluo e competitividade para exportao, prximos dez anos 161 3 5 9 11 17 19 23 29 31 33 35 43 49 65 73 80 81 87 93 99 103 107 109 111 113 119 123 123 128 153 158

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Produo de etanol no mundo Custos de produo e competitividade Mercados para o etanol: Brasil e exterior, prximos dez anos Mercados de acar e evoluo da produo de cana Impactos de um aumento substancial da produo nos prximos anos Vises retrospectiva e prospectiva e recomendaes Nota 1 - Correo dos custos de produo, abril 2001 janeiro 2003 Nota 2 - Custos de produo de etanol de lignocelulsicos Nota 3 - Custos de produo de etanol de milho (EUA), e de beterraba e trigo (UE) Nota 4 Polticas para a produo de etanol em algumas regies selecionadas Coordenadores tcnicos Especialistas consultados Ncleo de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica

161 162 168 173 177 179 201 203 209 213 219 227 229

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ApresentaoO contedo deste nmero dos Cadernos NAE reflete o desenvolvimento de uma anlise tcnica de temas estratgicos, tal como determinado pelo Senhor Presidente da Repblica ao Ncleo de Assuntos Estratgicos, no incio de 2003. Apresentamse as concluses preliminares de dois estudos abrangentes sobre a produo e o uso do biodiesel, bem como uma avaliao da expanso da produo de etanol no Brasil, conduzida sob a coordenao de consultores mobilizados pelo Centro de Gesto e Estudos Estratgicos (CGEE). Este diagnstico sobre biocombustveis no Brasil envolveu uma consulta a vrios especialistas nestes temas, dos setores empresarial, governamental e acadmico, alm da anlise de publicaes recentes sobre os temas, referenciados no texto. Trata-se, portanto, de material dotado de slida metodologia de pesquisa, embasado em estudos empricos e em consultas extensivas e preparado como subsdio para alimentar um debate mais amplo com vistas produo de elementos factuais e conceituais. Contribui, desta maneira, para uma informao sobre aspectos importantes da formao de uma viso governamental sobre o tema. Estas concluses preliminares indicam que o biodiesel pode ser produzido a partir de diversas matrias-primas e ser utilizado em estado puro ou em mistura com o diesel mineral, em diversas

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propores; quanto ao etanol, existem resultados efetivos desde sua incorporao matriz energtica brasileira, em 1975, com o aumento de sua produo e oportunidade de que sua utilizao colabore para a reduo de emisses de gases de efeito estufa no setor de transportes, em todo o mundo. A evoluo tecnolgica relativa ao biodiesel mostra a tendncia para a adoo da transesterificao como processo principal (com metanol ou etanol) e para o uso em mistura com o diesel, possibilitando a sua introduo na frota atual de veculos automotivos sem nenhuma modificao dos motores. A diversidade de matrias-primas, processos e usos so uma grande vantagem, mas traz consigo a responsabilidade de analisar, adequadamente, os parmetros que variam muito dependendo da escolha feita, tais como os custos totais envolvidos em sua produo; as emisses no ciclo de vida; as possibilidades de gerao de emprego; as disponibilidades de rea e mo-de-obra adequadas, entre muitos outros fatores que foram considerados neste estudo. Se h uma concluso geral a ser tirada de ambos os estudos sobre as diversas possibilidades de produo e uso do biodiesel e etanol no Brasil a de que cada caso precisa ser analisado de acordo com as suas especificidades. O Governo Federal instituiu, por meio de Decreto Presidencial, em 23 dezembro de 2003, a Comisso Executiva Interministerial, encarregada de implantar aes direcionadas produo e ao uso de leo vegetal - biodiesel, como fonte alternativa de energia.

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A Comisso se reporta Casa Civil da Presidncia da Repblica e tem uma unidade executiva coordenada pelo Ministrio de Minas e Energia. O presente trabalho se insere no conjunto de contribuies sobre os temas, na perspectiva da referida Comisso e outras iniciativas correlatas, ao analisar, avaliar e propor recomendaes e aes, diretrizes e polticas pblicas necessrias ao processo de implementao da produo e uso de biocombustveis.

Braslia, agosto de 2004 Jos Dirceu de Oliveira Ministro-Chefe da Casa Civil Dilma Roussef Ministra de Minas e Energia Eduardo Campos Ministro da Cincia e Tecnologia Luiz Gushiken Ministro-Chefe da Secretaria de Comunicao de Governo e de Gesto Estratgica

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Seo 1 Avaliao do Biodiesel no BrasilIsaas de Carvalho Macedo Luiz Augusto Horta Nogueira

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Resumo Executivo

1. Aspectos tecnolgicos, econmicos e ambientaisO diesel combustvel pode ser complementado, para fins de economia do meio ambiente, por leos vegetais modificados, sem alterao dos motores. No existem obstculos tcnicos ou normativos para o incio da utilizao de biocombustveis em adio ao diesel, mas sua utilizao implica disponibilidade dos insumos, segurana no abastecimento, capacidade de processamento pela indstria e integrao final aos circuitos de distribuio. A economia da utilizao do novo combustvel depende de uma relao positiva entre a energia consumida no processo de produo e a disponibilizada pelo combustvel produzido. Por exemplo, no caso do etanol produzido a partir da cana-de-acar, essa relao de 8,3 para um (comparativamente, o etanol nos EUA tem uma relao de apenas 1,3). No Brasil, alguns estudos efetuados para fins de biodiesel indicam uma relao de 1,4 no caso da soja, de aproximadamente 5,6 no caso do dend e de 4,2 para a macaba, o que confirma o potencial das palmceas como fonte de matria-prima (maior produtividade e disponibilidade de resduos de valor energtico). O uso do biodiesel reduz as emisses associadas ao diesel de base fssil. Trata-se de um produto no txico e biodegradvel.11

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Comparado ao diesel, o biodiesel puro reduz as emisses de gases de efeito estufa em 40-60% (informe estudos efetuados na Europa, biodiesel produzido com canola). As redues no Brasil, a partir da soja, no seriam maiores.

2. Aspectos de mercadoA demanda total de diesel no Brasil em 2002 foi de 39,2 milhes de metros cbicos (76% para transportes), com importao de 16,3% (US$ 1,2 bilho). Uma utilizao de biodiesel a 5%, no Brasil, demandaria, portanto, 2 milhes de metros cbicos de biodiesel (total).

3. Matrias-primas, tecnologia agrcola e disponibilidade de reas no BrasilMuitas oleaginosas podem ser usadas para a produo de biodiesel. A rea para suprir 5% do diesel (B5) com oleaginosas locais, e usando apenas soja, dend e mamona, seria cerca de 3 milhes de hectares. A rea de expanso possvel para gros de pelo menos 90 milhes de hectares. As reas aptas para dend atingem, na Amaznia, cerca de 70 milhes de hectares, dos quais cerca de 40% com alta aptido. A mamona pode ser uma opo agrcola rentvel para as regies rida e semi-rida do Nordeste, independentemente do uso para

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biodiesel, considerando o valor do produto. A mamona uma cultura pequena (130.000 hectares, em 2002), e principalmente de pequenas unidades (~15 hectares). Considerando apenas um programa de substituio a 1% do leo diesel a partir da mamona, seria preciso multiplicar por oito a produo atual, sendo neste caso essencial o fortalecimento da base agrcola (maior nmero de variedades). Isto seria teoricamente possvel, mas neste caso o programa visaria muito mais a atender aspectos sociais do que as necessidades de energia. O modelo proposto para a produo (familiar assistido, assentamentos) deve ser bem avaliado nos seus mltiplos aspectos, com nfase em custos totais e renda; e deve considerar a alternativa de exportao do leo de mamona (usos no energticos). A soja tem base agrcola adequada, (variedades, tecnologias) e uma enorme experincia acumulada na produo, como cultura extensiva, de grandes reas. Utiliza 20 milhes de hectares, havendo cerca de 100 milhes de hectares aptos para a expanso. No h limitaes (tcnicas, ou de reas) para suportar um programa de biodiesel para misturas. O dend (independentemente de programas para biodiesel) merece muita ateno. A produo mundial de leo de dend dever ultrapassar a de soja no final da dcada; o Brasil produz apenas 0,5% do total mundial, embora tenha o maior potencial (reas com aptido agrcola) do mundo. Tecnologia de produo agrcola moderna praticada no pas, h tambm uma experincia em curso (agricultura familiar, assistida) que deve ser bem13

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avaliada. A atual oferta de variedades adequada para a pequena produo, mas a expanso da cultura exigir fortalecimento da pesquisa agronmica.

4. Emprego e rendaO agronegcio da soja gera empregos diretos para 4,7 milhes de pessoas em diversos segmentos (insumos, produo, transporte, processamento e distribuio) e nas cadeias produtivas de sunos e aves; a produo correspondente de 52 milhes de toneladas, em 20 milhes de hectares (no total, diretos e indiretos, 4 hectares por pessoa). Um exemplo para dend indica 33 mil hectares plantados (25 mil em produo) utilizando 3 mil empregos diretos; e em agricultura familiar assistida, uma famlia para 10 hectares. Os assentamentos previstos para mamona consideram um trabalhador para cada 10-15 ha. Estas estimativas no so muito precisas.

5. Custos, custos de oportunidade e competitividadeNa Europa e nos Estados Unidos o custo do biodiesel hoje 1,5 a 3 vezes maior que o do diesel mineral; no se prev redues importantes ao custo no futuro. Biodiesel justificado por externalidades positivas (meio ambiente, gerao de emprego, segurana, balano de pagamentos). O mesmo ocorreria no14

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Brasil. Seria preciso conhecer de modo mais detalhado os custos atuais e esperados no futuro, valorizar as externalidades importantes (aqui, a gerao de empregos e renda), dimensionar os nveis de subsdio necessrios (no caso da mamona, subsdios diretos, nos demais produtos, em geral, renncia fiscal) e decidir sobre sua adequao, ou considerar alternativas. A diferena entre custos de produo (sem impostos) e custos de oportunidade (valores pagos no mercado internacional) para os leos vegetais indica o valor do subsdio a ser pago (renncia fiscal e subsdios diretos). Mesmo no caso da soja (subsdio mnimo), apenas a renncia fiscal no seria suficiente para atingir o valor ideal para a incorporao do biodiesel como alternativa econmica ao leo mineral. O leo de dend apresenta custo de produo baixo (equivalente ao do diesel mineral, sem impostos) mas o maior custo de oportunidade do leo torna necessrio um subsdio direto mais elevado que o da soja. A mamona parece ser um caso de difcil viabilizao comercial para fins de biodiesel, uma vez que o leo de mamona tem alto valor de mercado e este potencial deve ser explorado, com ganhos bem superiores aos da produo de biodiesel. Uma comparao entre essas trs alternativas indicaria um valor de indiferena para o produtor (diferena entre custo de produo e o custo de oportunidade) de 47 centavos de dlar para a soja, de 65 centavos no caso do dend e de 1,01 dlar para a mamona. Ainda assim, os custos dos dois produtos mais rentveis so superiores aos do diesel mineral.15

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1. IntroduoO biodiesel pode ser produzido a partir de diversas matrias primas, tais como leos vegetais, gorduras animais, leos e gorduras residuais, por meio de diversos processos. Pode, tambm, ser usado puro ou em mistura com o diesel mineral, em diversas propores. A evoluo tecnolgica nos ltimos anos mostra tendncias para adoo da transesterificao como processo principal (com metanol e etanol) e para o uso em mistura com o diesel, possibilitando a introduo na frota atual de veculos automotivos sem nenhuma modificao dos motores. A diversidade de matrias primas, processos e usos uma grande vantagem, mas traz consigo a responsabilidade de analisar, adequadamente, parmetros que variam muito dependendo da escolha feita, tais como os custos totais envolvidos na produo da matria-prima; emisses no ciclo de vida; possibilidades de gerao de emprego; disponibilidades de rea e mo de obra adequadas, dentre muitos outros. Cada caso precisa ser analisado de acordo com as suas especificidades.

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2. Programas de biodiesel no mundoDe forma a contextualizar alguns dos pontos que consideramos essenciais, resumimos algumas anlises muito recentes (2004) sobre o maior programa de biodiesel do mundo, que ocorre na Unio Europia; e apresentamos dados concisos sobre programas selecionados em outros pases.

a. Unio EuropiaA capacidade instalada na Europa (ocidental e oriental) era de cerca de 2,5 2,7 M t no final de 2003, com expectativas de atingir 3,3 M t no final de 2004. O direcionamento do programa1

IEA, Biofuels for transport: an international perspective, IEA/EET, Paris, maio 2004; comunicao ao CGEE

de biodiesel da Unio Europia1 objetiva a substituio de 2% do diesel usado para transportes em 2005; 5,75% em 2010, e 20% em 2020. A maior parte do leo vegetal empregado neste programa vem do cultivo da colza. No momento, os custos de produo de leo vegetal so, em mdia, cerca de duas vezes superiores ao do diesel mineral (1,5 a 3 vezes). Para atingir a meta de 2010, nas condies atuais, o nvel de subsdios (iseno de impostos) seria de aproximadamente 2,5 bilhes / ano. Anlises recentes deste programa concluem que: O biodiesel uma alternativa tecnicamente vivel para o diesel mineral, mas seu custo hoje (1,5 a 3 vezes maior) o torna no

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competitivo, se externalidades positivas (meio ambiente local, clima global, gerao e manuteno de emprego, balano de pagamentos) no forem consideradas. Estes custos j consideram todos os crditos por subprodutos (uso da torta residual; glicerina). No so previstas possibilidades de redues significativas no custo de produo, por se tratar de processos (agrcolas e industriais) muito conhecidos, maduros e eficientes. O custo de referncia (diesel mineral, sem impostos ) utilizado nesta anlise de US$ 0.22 / litro; Vantagens: melhora a lubricidade do diesel; menores emisses de poluentes locais e de gases de efeito estufa; no txico e biodegradvel; em baixas concentraes, no exige mudana nos motores; o balano energtico sempre (na Europa) positivo, embora varie muito com a matria-prima e com o uso dos subprodutos; Os grandes volumes de glicerina previstos s podero ter mercado a preos muito inferiores aos atuais; todo o mercado de leo-qumicos poder ser afetado. No h uma viso clara sobre os possveis impactos potenciais desta estratgia. As reas envolvidas so muito grandes. A UE precisaria mobilizar cerca de 5,5 M ha para atingir 3,2 a 4 % de biodiesel no diesel mineral.

b. Estados UnidosO programa americano de biodiesel bem menor que o europeu e apresenta diferenas importantes. A principal matria-prima utilizada a soja, complementada com leos de fritura usados. De acordo com o National Biodiesel Board, foram produzidos em20

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2002 aproximadamente 50 milhes de litros de biodiesel, usados basicamente como B20 (mistura com 20% de biodiesel). Existem atualmente mais de 12 companhias produzindo este combustvel nos Estados Unidos, com uma capacidade de produo da2

McKeehan,A., National Biodiesel Board, citado na ref. 3

ordem de 200 mil toneladas anuais2. Como o diesel americano possui uma menor carga tributria, apenas a renncia fiscal no permite viabilizar o biodiesel. Alm das medidas de carter tributrio, tm sido adotados incentivos diretos produo como o Commodity Credit Corporation Bioenergy Program, que subsidia a aquisio de matrias-primas para fabricao de etanol e biodiesel, e atos normativos que determinam um nvel mnimo de consumo de biocombustveis, por rgos pblicos e frotas comerciais, como definido no Energy

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Mixon,J., Dack,J., Kraucunas,I., Feng, J., The case for biodiesel, Report to Washington State Government, Seattle, June 2003

Policy Act (EPAct)3.

c. Outros pasesEntre outros pases que desenvolvem programas de biodiesel, dois exemplos so interessantes e so comentados a seguir. Durante os anos 90 se desenvolveu na Nicargua um projeto para biodiesel a partir do leo de pinho-manso (Jotropha Curcas), uma euforbicea bastante similar mamona e que ocorre no Nordeste brasileiro, capaz de produzir cerca de 1.100 litros de biodiesel por hectare. Com apoio financeiro e capacitao austraca, bem como envolvendo entidades pblicas e universidades nicaragenses, implantaram-se 1.013 ha de cultivos em pequenas unidades produtoras (distribudas em 40021

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km2) e uma planta industrial para produzir 8 mil toneladas anuais de biodiesel4. O projeto apresentava bons indicadores de viabilidade, foram realizados estudos agrcolas prvios, seleo de variedades, formao de viveiros de mudas e capacitao de extensionistas. Aps os dois primeiros anos de colheita e alguma produo de biodiesel, o projeto foi considerado invivel e encerrado. Segundo os gestores do projeto, o principal responsvel pelo insucesso foi o modelo de produo agrcola, envolvendo muitos agentes, uma logstica complexa e uma gesto ineficiente. Como os produtores haviam recebido financiamento estatal para formar os cultivos, mediante hipotecas de suas propriedades, o trmino do projeto provocou uma demorada crise social, resolvida com o perdo pelo Estado das dvidas existentes.

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Entrevista com Prof. Ji Xing, citada na referncia 3

Na China, segundo informaes do Professor Ji Xing5, cinco unidades transesterificadoras de leo de colza e leo de fritura usado produzem um volume de biodiesel superior produo americana e inferior produo europia, atendendo as especificaes similares americana, definidas pela norma ASTM D6751. A empresa Hainan Zhenghe Bio Energy Company investiu US$ 5 milhes em uma planta industrial para uma produo anual de 45 mil toneladas de biodiesel, utilizando leo de fritura usado e prevista para ser inaugurada no final de 2003.

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Nogueira, L.A.H., Perspectivas de un Programa de Biocombustibles en Amrica Central, CEPAL/GTZ, Ciudad de Mxico, 2004

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3. Aspectos tecnolgicosPara converter leos vegetais em combustveis adequados o processo predominante a transesterificao em meio alcalino, onde se fazem reagir os triglicrides com um lcool (etanol ou metanol), produzindo glicerina e steres dos cidos graxos componentes do leo vegetal. A diversidade de matrias primas (leos) e as alternativas de processo levam a diversos programas de pesquisa e desenvolvimento tecnolgico. Durante a dcada passada, a Comunidade Europia aplicou cerca de 100 milhes no Projeto de Demonstrao de Biodiesel, considerado o mais6

Mangan, C.L., Non-Food Crops and Non-Food Uses in EC Research Programs, Biomass for Energy and Industry, 7th. E.C.Conference, Florena, 1995

relevante entre todos os programas europeus de bioenergia6. O programa americano de biodiesel, mesmo sendo de menor porte, tem recebido expressivo apoio. Apenas durante o perodo 1992 a 1997 foram desenvolvidos cerca de 350 projetos de pesquisa sobre biodiesel nos Estados Unidos, em um impressionante conjunto de estudos sobre produo, comercializao, uso e suas implicaes7.

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Thyson, K.S., Biodiesel Research Progress 1992-1997, National Renewable Energy Laboratory, Golden, 1998

De um modo geral, pode-se dizer que biodiesel um produto comercial; h tecnologias para a produo, embora ainda com custo no competitivo com o diesel mineral, e estas esto em contnuo avano.

a. Rotas tecnolgicasSimplificando, os processos para converso de leos vegetais em combustveis podem usar transesterificao ou craqueamento.23

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A transesterificao por sua vez pode empregar catalisadores alcalinos, cidos ou enzimticos; e etanol ou metanol. Com as tecnologias atuais, pode-se concluir que a transesterificao alcalina a rota mais interessante, embora haja desenvolvimentos em processos trmicos8. A transesterificao etlica apesar de mais complexa que a rota metlica, poder atingir nveis equivalentes de qualidade. A matria-prima importante na deciso sobre o uso de catlise cida ou bsica; a catlise enzimtica, prometendo algumas vantagens (menos subprodutos), ainda est em fase inicial de desenvolvimento. Temas relevantes quanto a tecnologias so discutidos na Nota 1.8

Grupo GUASCOR, Potencial de Tecnologia de Craqueamento para Produo de Diesel Vegetal (Biodiesel), apresentao Power Point, 2003

b. Balano energticoPara a utilizao racional de vetores fotossintticos como combustveis, um aspecto essencial ter um balano energtico positivo, isto , a energia consumida no processo de produo (de forma direta e indireta, incorporada nos materiais de consumo e equipamentos), deve ser menor que a energia disponibilizada pelo combustvel produzido. Por exemplo, estudos detalhados de custos energticos conduzidos para o etanol no contexto brasileiro, indicam que para cada unidade de energia investida na agroindstria canavieira, so produzidas cerca de 8,3 unidades de energia renovvel9. Para o biodiesel foram efetuadas diversas avaliaes do balano energtico considerando o uso de soja e colza como matria249

Macedo, I.C., Lima Verde Leal, R., Silva, J.E.A.R, Assessment of greenhouse gas emission in the production and use of fuel ethanol in Brazil, Secretariat of the Environment, Government of the State of So Paulo, 2004

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prima, nas condies europias e americanas, indicando relaes produo/consumo de energia sempre entre 2 e 31. Para as condies brasileiras, alguns estudos precursores do balano energtico na produo de biodiesel foram realizados10

Goldemberg, J., Balano energtico da produo de combustveis de leos vegetais, Instituto de Fsica/ USP pre-print no. 323, So , Paulo, 1982

nos anos 80. Avaliando o biodiesel de soja, Goldemberg10 determinou uma relao produo/consumo de 1,42. Uma avaliao preliminar mais recente para o biodiesel de soja (sem ter em conta os subprodutos), estimou uma demanda energtica de 30 MJ por litro de biodiesel, resultando em uma relao

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Informado ao CGEE por Luciano Basto Oliveira, IVIG/ COPPE, 200412

produo/consumo de 1,4311. Para o dend e a macaba, Martins e Teixeira12 apresentaram respectivamente 5,63 e 4,20. Estes valores so bastante interessantes e confirmam o potencial das palmceas como fonte de matria-prima, pela maior produtividade e pela disponibilidade de resduos com valor energtico. O biodiesel no Brasil apresenta ainda poucos estudos sobre o balano energtico; este um tema importante a ser melhor explorado para fundamentar decises corretas.

Martins, H., Teixeira, L.C., Balano energtico da produo de leos vegetais transesterificados, III Congresso Brasileiro de Energia, Rio de Janeiro, 1985

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Nicol, B. (European Board of Biodiesel), The vegetable oils industry and biodiesel, apresentao na International Association of Seed Crushers, Rio de Janeiro, 200314

c. Especificao do biodieselA especificao do biodiesel para uso comercial considerada uma etapa essencial para o desenvolvimento de programas de biodiesel, como atestam a experincia europia13 e americana14. Nestas condies, mesclas de diesel com biodiesel25

Weber, J.A., Biodiesel Poised to be a Major Contributor to the US Economy, apresentao na Agncia Nacional do Petrleo, Rio de Janeiro, 2003

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adequadamente especificado, em teores at 20%, podem ser empregadas sem problemas operacionais ou de desempenho em motores convencionais, sem qualquer ajuste ou modificao. H poucas excees, que limitam o emprego de biodiesel ao B5; praticamente todos os fabricantes de motores mantm a garantia de seus equipamentos quando operando com B2015. Tais condies pressupem sempre o atendimento da especificao do combustvel, cabendo observar que a determinao dos teores de biodiesel no diesel ainda requer mtodos laboratoriais sofisticados, ao contrrio da avaliao dos teores de etanol na gasolina, que pode ser efetuada em campo com relativa facilidade. A estabilidade oxidao e a cetanagem so parmetros do biodiesel que merecem especial ateno, tendo em vista sua importncia e a virtual ausncia de disponibilidade laboratorial para sua avaliao no pas. A estabilidade, sobretudo em climas quentes, relevante para assegurar que mesmo depois de algumas semanas armazenado em condies normais, o biodiesel mantenha sua adequada especificao. J a cetanagem, medida que assegura a boa combusto em motores de ignio por compresso, medida em poucos laboratrios (algumas refinarias da Petrobras, Cenpes e IPT/SP), adotando-se na falta de medies diretas uma correlao com a densidade, expresso de naturalmente vlida apenas para o diesel mineral.15

Lockart, M., Growmark Corporation Press Release, 2002, citado na Ref. 1

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No Brasil, uma especificao preliminar do biodiesel foi definida (Portaria 255/2003 da ANP), atendendo a algumas premissas e considerando o uso em misturas at 20% (B-20). uma especificao similar europia e americana, com alguma flexibilizao para atender a especificidades de matrias primas nacionais. A mistura com diesel deve atender a especificao do diesel, principalmente as exigncias do sistema de injeo, do motor, do sistema de filtragem e de exausto. Esta especificao preliminar apresentada pela ANP considerada adequada para evitar alguns problemas observados, inclusive na Europa. Programas de testes, envolvendo fabricantes de motores e autopeas e cobrindo as principais tecnologias em uso, foram projetados em 2003/2004 para esclarecer alguns pontos:a) Desempenho e durabilidade, nos motores da frota brasileira, com biodiesel (at B20), oriundo de diferentes matrias primas . b) Estabilidade das misturas com os diferentes leos diesel nacionais, em distintos perodos do ano. c) Impactos ambientais, em especial emisses de NOx. d) Viabilidade do processo etlico atingir a especificao do processo metlico (viscosidade, glicerina total e estabilidade oxidao) e) Possibilidades de simplificao e eventuais modificaes nos parmetros da especificao.

Estes programas de testes ainda no foram iniciados. Os aspectos que ainda apresentam dvidas e a determinao dos testes a realizar so descritos na Nota 2.27

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4. Aspectos ambientaisProporcionalmente a seu teor em uma mistura com diesel, o biodiesel promove uma reduo das principais emisses associadas ao derivado de petrleo,com a exceo notvel dos xidos de nitrognio (NOx). O incremento observado nas emisses16

United States Environmental Protection Agency , A Comprehensive Analysis of Biodiesel Impacts on Exhaust Emissions, Draft Technical Report. EPA420-P-02-001, Washington, 200217

deste poluente, como indicado na Figura 116, no elevado, (2% a 4% para B20) mas deve ser considerado porque um dos principais precursores do oznio troposfrico, atualmente o mais grave problema de qualidade do ar na maior cidade brasileira17. O aumento das emisses de NOx associado ao biodiesel tem sido confirmado por muitos estudos; sua atenuao tem sido sugerida com o uso de aditivos e alteraes nos motores18. No consta desta figura o importante efeito sobre os xidos de enxofre (SOx). Como o biodiesel no contm enxofre, as emisses destes xidos so reduzidas com o uso do biodiesel. As emisses de gases de efeito estufa associadas ao biodiesel tm sido avaliadas na ltima dcada, nas condies europias, considerando o uso de colza e soja como matrias primas e steres metlicos como B10 e B20. Os resultados, expressos em biodiesel puro (B100), indicam redues de 40% a 60% das emisses correspondentes ao diesel puro1. Resultados mais recentes mostram variao ainda maior para ster metlico de colza, em funo das condies de rotao de culturas, uso de

CETESB, Relatrio de Qualidade do Ar/ 2003, disponvel no site www.cetesb.sp.gov.br18

Ver por exemplo: Marshall,W., Schumacher, L.G., Howell, S., Engine Exhaust Emissions Evaluation of a Cummins L10E When Fueled with a Biodiesel Blend, Society of Automotive Engineers, SAE Paper # 952363, 1995

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GM at all, GM Well-to-Wheel Analysis of Energy Use and Greenhouse Gas Emissions of Advanced Fuel/Vehicle Systems, 2002, citado pela Ref. 1.

fertilizantes e uso ou no da glicerina19.

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Figura 1. Efeito do biodiesel sobre as emisses associadas ao diesel16

A reduo das emisses de gases de efeito estufa podem ser relevantes, contudo os valores monetrios associados a possveis crditos de carbono so pequenos. Para valores de crdito entre US$ 1 e 5/ t de carbono evitado, estes valores corresponderiam a cerca de 3% do custo de produo.

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Biocombustveis

5. Histrico do uso energtico de leos vegetais no BrasilAlgumas tentativas foram efetuadas no pas ao longo das ltimas dcadas para implementar o uso de leos vegetais como combustvel sucedneo ao diesel derivado de petrleo. Na Nota 3, v-se que recorrentemente os leos vegetais foram propostos como vetores energticos (programas em 1950; Pro-leo, 1980; Programa OVEG, 1980) e como sucessivamente, obstculos no superados (principalmente custos) impediram sua viabilizao. Mais recentemente foi criada pelo MCT a Rede de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnolgico Probiodiesel, reunindo instituies atuantes ou interessadas no tema. Estas tentativas trazem lies e apontam caminhos.

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Biocombustveis

6. Mercado para biodiesel no BrasilComo um sucedneo do leo diesel, o mercado potencial para o biodiesel determinado pelo mercado do derivado de petrleo. A demanda total de leo diesel no Brasil em 2002 foi da ordem de 39,2 milhes de metros cbicos, dos quais 76% foram consumidos no setor de transporte, 16% no setor agropecurio e20

MME/DNDE, Balano Energtico Nacional 2003, Braslia, 2003

5% para gerao de energia eltrica nos sistemas isolados20. A importao de diesel correspondeu em 2002 a 16,3% do mercado e significou nos ltimos anos um dispndio anual da ordem de US$ 1,2 bilho, sem considerar o diesel produzido com petrleo

21

ANP Anurio Estatstico , 2002, Rio de Janeiro, 2003

importado, cerca de 8% do total de diesel consumido21. No setor de transporte, 97% da demanda ocorre no modal rodovirio, ou seja caminhes, nibus e utilitrios, j que no Brasil esto proibidos os veculos leves a diesel. Em termos regionais, o consumo de diesel ocorre principalmente na regio Sudeste (44%), vindo a seguir o Sul (20%), Nordeste (15%), Centro-Oeste (12%) e Norte (9%). O diesel para consumo veicular no Brasil pode ser o diesel interior, com teor de enxofre de 0,35% ou o diesel metropolitano, com 0,20% de enxofre, que responde por cerca de 30% do mercado21. Para gerao de energia eltrica nos sistemas isolados da regio amaznica informa-se terem sido consumidos 530 mil metros cbicos de diesel, para a gerao de 2.079 GWh, no Amazonas (30%), Rondnia (20%), Amap (16%), Mato Grosso (11%), Par

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(11%), Acre (6%), Roraima (3%), alm de outros pequenos sistemas em outros estados22. Estes nmeros se referem demanda do servio pblico; existem ainda grandes consumidores privados de diesel para gerao de energia eltrica, como as empresas de minerao localizadas na regio Norte. Como um exerccio e sem considerar eventuais dificuldades de logstica ou de produo, podem ser inicialmente considerados os seguintes mercados:1. uso de B5 no diesel metropolitano: 0,45 Mm322

Informado ao CGEE por Manoel Nogueira, SE/MME, 2004

2. uso de B5 no diesel consumido no setor agropecurio: 0,31 Mm3 3. uso de B5 para gerao nos sistemas isolados: 4. uso de B5 em todo o mercado de diesel: 0,10 Mm3 2,00 Mm3

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7. Matrias primas para biodiesel no Brasil

a. IntroduoQuanto s matrias primas mais promissoras para utilizao,23

Peres, J. R., Oleaginosas para biocombustveis, Embrapa, 2003

deve-se referir aos estudos recentes da Embrapa23 para levantar os cultivos e as aptides regionais. De uma forma geral, tm sido mencionados a soja para as regies Sul, Sudeste e Centro-Oeste, a mamona para o Nordeste e o dend para a regio Amaznica. Girassol, amendoim e outros tambm tm sido considerados. Igualmente, as palmceas tropicais de alta produtividade so sempre mencionadas como potencialmente produtores viveis de biodiesel e so comentadas na Nota 4. Alguns estudos ainda apontam perspectivas interessantes para oleaginosas aparentemente inusitadas e pouco citadas, como o abacate (Persea americana), com uma produtividade estimada

24

Costa, A., Agronomia aplicada s matrias primas para produo de biodiesel, Instituto Agronmico do Paran, 200325

em 1200 litros de biodiesel por hectare24. A Tabela 1 indica para as espcies mais mencionadas o potencial para produo de leo, considerando valores de produtividade e teor de leo de variedades comuns25. A pesquisa agronmica tem mostrado que esses valores podem ser considerados conservadores.

adaptado de Nogueira, L.A.H., Lora, E.S., Dendroenergia: fundamentos e aplicaes, Intercincia, Rio de Janeiro, 2003

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Tabela 1 Caractersticas de alguns vegetais com potencial para produo de biodiesel Espcie Dend (Elaeis guineensis N.) Babau (Attalea speciosa M.) Girassol (Helianthus annus) Colza (Brassica campestris) Mamona (Ricinus communis ) Amendoim (Arachis hipogaea) Soja (Glycine max) Origem Contedo Meses de Rendimento do leo de leo colheita em leo (%) (t/ha) Amndoa Amndoa Gro Gro Gro Gro Gro 26 66 38-48 40-48 43-45 40-50 17 12 12 3 3 3 3 3 3,0-6,0 0,4-0,8 0,5-1,5 0,5-0,9 0,5-1,0 0,6-0,8 0,2-0,6

Tabela 2 - reas estimadas para a produo de B5 Regio Sul Sudeste Nordeste Norte Centro-Oeste Total leo vegetal para B5, 1.000 m3 7.200 15.840 5.400 3.240 4.320 36.000 MatriaPrima Soja Soja Mamona Dend Soja rea, 1.000 ha 600 1.320 600 35 360 2.916

A Tabela 2 ilustrativa quanto s necessidades de reas, nas diversas regies do Brasil, para suprir 5% do diesel (B5) com oleaginosas locais, de acordo com o zoneamento da EMBRAPA23. Para comparao, a rea de expanso possvel para gros avaliada (nos cerrados) em cerca de 90 M ha; e as reas aptas para dend atingem, na Amaznia, cerca de 70 M ha, dos quais cerca de 40% com alta aptido26. A mesma referncia menciona 20 M ha desmatados e sem uso atual na Amaznia, e 2,5 M ha em terras j com infra-estrutura. A mamona teve seu zoneamento para o Nordeste concludo recentemente, sendo determinada sua aptido em mais de 450 municpios.26

Campos, I.A. e Azevedo, G., Formulaes estratgicas em energia renovvel, no Frum Sudene Energia, Campina Grande, 2003

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Como no caso da cana, onde o bagao representa um subproduto importante, os resduos das matrias primas para biodiesel tambm podem representar um diferencial significativo entre as diversas biomassas para aplicao energtica. Analisamos a seguir a situao de cada uma das oleaginosas mais mencionadas (soja, mamona, dend).

b. As escalas de produo e o sistema de produo agrcolab.1 Mamona A mamona tem sido cultivada no Nordeste do Brasil principalmente em condies de sequeiro. A Bahia responsvel por cerca de 60% da produo regional. A produo nacional chegou a 150 mil t de bagas em 1990, caindo para nveis prximos a 40 mil t (1993 a 1999) e voltando em 2002 para cerca de 100 mil t. A rea plantada em 2002 foi de cerca de 130 mil ha (ver a Figura 2). O teor de leo de cerca de 48%. A produo atual do Brasil corresponde a cerca de 50 mil t/ano de leo. Ela obtida, na sua maioria, em unidades pequenas de produo agrcola (at 15 ha). Estima-se que existam cerca de 250 mil ha plantados no NE, com produtividades mdias inferiores aos 1000 kg/ha de bagas (muitos entre 500 e 800). As oscilaes de plantio e produo so evidenciadas na Figura 2, da Embrapa.

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As variedades em uso comercial (BRS 149 e BRS 188) so adequadas para altitudes entre 300 e 1500 m; temperaturas entre 20C e 30C; e precipitao acima de 500 mm / ano, com chuvas na fase vegetativa apenas. So estas as condies que orientam o zoneamento da cultura no Nordeste. De fato a mamona tem sido indicada como uma das poucas opes agrcolas rentveis para as regies rida e semi-rida do Nordeste. O zoneamento concludo recentemente pela Embrapa indica que h 458 municpios no Nordeste em condies de produzir mamona (sendo 189 na Bahia)27. Por outro lado, as escalas de produo para sistemas que visem um programa agressivo de produo de biodiesel sero muito maiores. Se considerarmos, por exemplo, um programa para apenas 1% de substituio de diesel no pas por mamona (B1), seria necessrio multiplicar por oito a produo atual. Certamente isto possvel, aps a resoluo de alguns problemas, mas, neste caso, o programa visaria muito mais atender aos aspectos sociais (importantes) do que as necessidades de energia. Como uma referncia para programas maiores que o nosso atual, importante notar que a ndia tinha uma rea plantada de 0,69 M ha, com produo de leo de 0,84 M t, em 200226.27

Beltro, N. E. M. e outros; Zoneamento e poca de cultiva da mamoneira no Nordeste Brasileiro, Embrapa, 2004

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Figura 2. rea colhida e produo de mamona no Brasil

b.2 Soja A produo mundial de soja em 2003/02 foi de 194 M t, com28

Ambrose, A.; GMO: Threat or Opportunity?, Int. Assoc. Seed Crushers Congress, Rio de Janeiro, 2003

crescimento de 87% sobre 199028, ocupando cerca de 15% da rea das 15 maiores culturas agrcolas. Destas, trigo aparece com 43%, milho com 27%, colza com 5%, cana com 4%23. A maior parte do crescimento ocorreu na Amrica do Sul. A soja, originalmente de clima temperado, foi tropicalizada e hoje pode ser plantada no Brasil em qualquer latitude, com limitaes apenas em agroecossistemas adversos (caatinga) ou a preservar

29

Informado ao CGEE por Vnia Beatriz Rodrigues Castiglioni; Embrapa Soja, 2004

(Amaznia e Pantanal), ou reas com excesso de declividade29. O cultivo da soja ocupa no Brasil pouco mais de 20 M ha; h cerca de 100 M ha aptos expanso da agricultura de espcies de ciclo anual (como o caso da soja). Adicionalmente, estimase uma liberao potencial de rea equivalente quela plantada no momento com soja, com a elevao do nvel tecnolgico na pecuria.

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Cerca de 70% da soja brasileira destinada exportao; o teor de leo de 18% - 20% do peso dos gros. Para a produo de 52 M t soja, em 2003, com produtividade de 2,8 t/ha, a parcela convertida em leo resultou em 5,4 M t leo. A utilizao de B5 no Brasil (todo o diesel), se baseada em soja apenas, utilizaria cerca de 9 M t gros (3 M ha) para 1,8 M m3 leo; resultaria tambm em 7,2 M t torta26. As limitaes climticas, edficas e sanitrias para expanso da soja, ocorrendo a taxas consideradas exeqveis ou razoveis, no horizonte dos prximos 20 anos, so possveis de serem superadas tecnologicamente; deve-se buscar continuar na liderana da gerao de tecnologia, garantindo a competitividade da cultura e a sua sustentabilidade. Embora as cultivares atuais tenham sido desenvolvidas objetivando obter o maior teor de protena, existe variabilidade gentica (inclusive com recurso biotecnologia, se necessrio) para obteno de cultivares mais adequadas para a produo de biocombustveis29. O Brasil praticamente auto-suficiente no desenvolvimento tecnolgico para a cultura da soja em regies subtropicais e tropicais, e a continuidade desta situao necessria continuar na liderana da produo mundial. Dependncia em C&T est relacionada com a gerao de conhecimentos bsicos (fisiologia vegetal, biologia molecular e outros) e com os conhecimentos associados com pragas exticas (normalmente obtidos com parcerias). A partir de 2000 as produtividades no Brasil suplantaram as da Argentina e Estados Unidos. A Argentina usava40

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em 2003 93% de soja transgnica, e os Estados Unidos 73% (a mdia mundial era de 50%). Quanto aos sistemas de produo, cerca de 60% da soja no Brasil utiliza o plantio direto. H variantes importantes nos sistemas usados, em funo de diferenas em topografia, escalas de produo, tipo de solos, e forma de comercializao (cooperativas ou tradings). b.3 Dend Em 2002 a produo mundial de leo de dend atingiu 25,4 M t (cinco vezes maior que a de 1980). Este aumento se mantm nos ltimos anos, com forte tendncia para que o leo de dend ultrapasse o de soja no final da dcada. No conjunto, os leos vegetais (principalmente soja e dend) tm tido demanda crescente muito alm do crescimento populacional no mundo (notadamente na China e ndia). O Brasil produz ainda apenas cerca de 0,5% do total mundial, embora seja freqentemente citado como tendo o maior potencial (reas com aptido agrcola) do mundo. Como referncia, o maior produtor (Malsia) usa 3,3 M ha para produzir 11,2 M t leo; o Brasil, com cerca de 0,05 M ha, produz 0,10 M t leo26. Outros grandes produtores so a Indonsia e Colmbia. Estas consideraes indicam que o dend (independentemente de programas para biocombustveis) deve merecer ateno especial ao se planejar desenvolvimento na Amaznia.

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Mesmo com pequena participao na produo mundial, a tecnologia brasileira no manejo agrcola respeitada e algumas de nossas inovaes so hoje copiadas em plantios de todo o mundo34. O custo de produo do Brasil (mdio) ainda maior quando comparado com os maiores do mundo (Malsia, Indonsia e Colmbia), mais por diferenas nas taxaes de produtos e servios (exemplo, os encargos trabalhistas: Malsia cerca de 50% sobre o salrio, Indonsia 30%; Colmbia, 60%; no Brasil, acima de 100%). Relevantes so ainda os custos de adubao e impostos diretos sobre o produto. Na comparao dos custos sem taxas somos extremamente competitivos.

c. A base gentica e a produo de sementes / mudas comerciaisc.1 Mamona A Embrapa desenvolveu e lanou comercialmente, em colaborao com a Empresa Bahiana de Desenvolvimento Agrcola (EBDA), duas variedades de mamona a saber: BRS 149 Nordestina e BRS 188 Paraguau, que encontram-se disponveis para plantio no pas em quantidades ainda limitadas30. Trata-se de materiais adaptados para a cultura familiar no Nordeste, pois apresentam frutos semi-deiscentes (no liberam totalmente as sementes aps maduros, facilitando a colheita manual), so moderadamente resistentes seca, tm porte mdio (1,7 a 2,0 m30

Beltro, N.E.M.B., Cultivo da mamona consorciada com feijo caupi para o semi-rido nordestino em especial o Piau, Documentos, 97 Embrapa, Campina Grande, 2002

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de altura, o que tambm facilita a colheita manual) e apresentam produtividade anual de at 1400 kg/ha, se plantadas em reas adequadas, de acordo com zoneamento e estudo de poca de plantio feito para o Nordeste do pas pela Embrapa. Observaes atuais, feitas por tcnicos da Embrapa, indicam produtividades de 500 a 800 kg/ha/ano, em condies normais de cultivo por pequenos produtores na Paraba e de cerca de 1.200-1.300 kg/ha/ano em plantios comerciais da Bahia. Estas duas variedades apresentam cerca de 47%-48% de leo em relao ao peso total dos frutos (bagas) depois de colhidos e tm-se mostrado tolerantes s principais doenas que atacam a mamona, dentre as quais se destaca o mofo cinzento (fungo, Botrytis ricini) que ataca e destri as flores e frutos da planta em condies de altas umidade e temperatura, provocando prejuzos de at 100% na colheita. Nos plantios de mamona do Nordeste, em adio s variedades comerciais lanadas pela Embrapa, so utilizadas sementes de variedades de origens pouco conhecidas, alm de hbridos introduzidos no Brasil de outros pases. O programa de melhoramento gentico da Embrapa Algodo, em parceria com outras empresas de pesquisa agropecuria, encontra-se em sua fase inicial e est sendo planejado para desenvolver tanto variedades como hbridos comerciais. As variedades so obtidas por meio de seleo e multiplicao de materiais genticos selecionados em amostras de populaes43

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subespontneas coletadas no Nordeste do pas (o Banco de Germoplasma de mamona da Embrapa Algodo possui cerca de 400 amostras, majoritariamente coletadas no pas), portadoras de caractersticas que atendem a especificaes tanto de pequenos como de mdios e grandes produtores. Foi por meio desta estratgia que as variedades Nordestina e Paraguau foram desenvolvidas. Trata-se de um programa em fase inicial de seleo, havendo expectativas de ganhos elevados em produtividade e resistncia s pragas e doenas nos prximos ciclos de seleo. O programa de produo de hbridos simples encontra-se em estgio muito preliminar de desenvolvimento, em fase de introduo, seleo e testes de capacidade de combinao de materiais genticos selecionados, para produo das linhagens melhoradas que sero utilizadas para a produo de hbridos. Os programas de melhoramento gentico vegetal da Embrapa tm como principais objetivos a produo de sementes genticas dos materiais produzidos (variedades, hbridos, etc.) que, por sua vez, sero multiplicados por unidades do servio de transferncia de tecnologia da Embrapa para produo de sementes bsicas. Estas so repassadas para produtores de sementes para a obteno de sementes certificadas e comerciais, para compra pelos produtores rurais. Trata-se de uma cadeia de multiplicao de sementes genticas oriundas de programas de melhoramento gentico, regulamentada

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por legislao especfica e fiscalizada pelo Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento (Mapa). Atualmente, so poucos os produtores de sementes comerciais de mamona no Nordeste. No momento, a Embrapa possui uma quantidade muito limitada de sementes genticas (cerca de 2 mil a 3 mil Kg de sementes da variedade Nordestina) para multiplicao e produo de sementes bsicas, se possvel ainda este ano. Caso esta previso se confirme, seria possvel o plantio de no mximo 500 ha para a produo de sementes bsicas, rea capaz de ofertar ao mercado cerca de mil toneladas de sementes, suficientes para o plantio de cerca de 200 mil ha em 2005. Mesmo com esta limitao de sementes genticas no momento, seria possvel oferecer um volume considervel de sementes ao produtor em um perodo de 2-3 anos, havendo melhoria significativa no apoio e financiamento das operaes requeridas da Embrapa e de seus parceiros na multiplicao de sementes. No se trata, portanto, da maior limitante em atender s necessidades do produtor em quantidade, dado um prazo adequado. Por outro lado, a expanso desta cultura centrada em um nmero muito reduzido de variedades incorre em grande risco para o produtor, em funo de potencial frustrao de safra causada por ataque de doenas e pragas sobre base gentica to uniforme (poucas variedades, pouca variabilidade gentica, maior risco de ataque generalizado de pragas e doenas). Vale mencionar, neste aspecto, recente frustrao total de safra em plantios45

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de mamona em Sergipe, realizados fora das recomendaes tcnicas preconizadas pela Embrapa. c.2 Soja A oferta de cultivares de soja atende o espectro de diversidade de clientes, abrangendo desde a questo geogrfica at as caractersticas especficas de determinados nichos de mercado. O desenvolvimento de cultivares e os vrios aspectos tecnolgicos envolvidos na produo da soja tm merecido a ateno das instituies de pesquisa, o que demonstrado pelo crescimento espetacular da produtividade de soja brasileira, a uma taxa geomtrica anual superior a 1%, ao longo dos ltimos 30 anos. Eventuais limitaes tecnolgicas ao cultivo podem advir de restries sanitrias, como a introduo de pragas exticas ou a resistncia de pragas aos agrotxicos utilizados para seu controle. A capacidade de pesquisa instalada no pas rene as qualificaes necessrias para oferecer solues adequadas para estes problemas. No caso especifico do biodiesel, a Embrapa Soja, atravs do banco gentico dos materiais de soja sob seu domnio, do conhecimento acumulado ao longo dos anos e de sua estrutura de pesquisa capaz de conduzir estudo de cultivares de soja com maior teor de leo e com perfil de cidos graxos mais adequados ao uso como substrato energtico29.

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c.3 Dend O setor produtivo considera que o trabalho realizado pela Embrapa Manaus no desenvolvimento de variedades de dend de muito boa qualidade; so variedades de alta produtividade, nada deixando a desejar em relao as sementes importadas neste particular34. Para uma expanso rpida da cultura no Brasil ser necessrio redimensionar os recursos da Embrapa para ampliar as pesquisas; tpicos julgados importantes so a resistncia a doenas e o desenvolvimento de outras espcies com diferentes picos de produo, para reduzir os investimentos em usinas de extrao. Houve grande progresso nos ltimos anos, mas ser necessrio um maior investimento voltado especificamente para a base gentica da planta34.

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8. Aspectos econmicos

a. O custo de produo do biodieselComo na Europa ou EUA, no se deve esperar que o biodiesel (de mamona ou outra fonte) seja competitivo com o diesel mineral, no Brasil, hoje. preciso conhecer muito bem os custos atuais e esperados no futuro, para dimensionar corretamente os nveis de subsdio envolvidos e decidir sobre sua adequao, ou considerar alternativas. Para que seja possvel se estabelecer comparaes, as estimativas de custo do biodiesel e do diesel mineral devem considerar os dois combustveis sem impostos. Estas devem, ainda, no caso do biodiesel, incluir todos os custos da produo agrcola e industrial (no apenas custos operacionais, mas, tambm, os custos relativos ao capital, custos da terra e, se for o caso, o custo dos assentamentos e suas benfeitorias). Em casos onde haja outras culturas consorciadas com a mamona (tipicamente, agricultura familiar) deve-se considerar todos os custos associados a estas e seus retornos. S assim possvel avaliar corretamente o valor do subsdio alocado ao biodiesel. No caso da mamona nem todos estes dados esto disponveis (no h experincia suficiente, por exemplo, com agricultura familiar assistida, como se comea a fazer no Piau). Da mesma forma, a experincia j mais avanada da Agropalma nesta modalidade (com dend) mostra que h inmeras variantes a explorar.49

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Os custos de produo do biodiesel dependem essencialmente do custo da matria-prima (leo vegetal ou outra substncia graxa) e dos custos de processamento industrial, podendo subtrair-se os crditos decorrentes da comercializao do glicerol. Em geral, o custo do leo vegetal corresponde a cerca de 85% do custo do biodiesel, quando este produzido em plantas de alta capacidade (custos sem impostos). Decorre disto o interesse em reduzir os custos da matria-prima e eventualmente obter o material graxo a partir de rejeitos industriais, leo de fritura usado, sebo e guas servidas H uma grande variao de conceitos nos clculos que temos encontrado no caso da mamona. At certo ponto isto normal, mas ser preciso avaliar estes custos com maior preciso e em bases mais realistas em muitos casos. Algumas avaliaes, especificamente para o biodiesel de soja, apontam valores marginalmente factveis ao comparar custos do biodiesel, sem tributos, com preos com tributos do derivado de petrleo. Tambm freqente usar-se o custo de oportunidade do leo vegetal (valor no mercado, para outros fins) como sendo o custo do insumo (e no o seu custo de produo); todos estes procedimentos tm sentido, dependendo de ticas especficas, mas no podem ser usados sem as devidas consideraes para avaliar a competitividade do biodiesel e a sustentabilidade econmica do programa. Dentre as avaliaes disponveis, atualizadas, destacamos algumas para situar os valores relativos e as magnitudes esperadas de subsdios, diretos e/ou por renncia fiscal.

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a.1 Mamona No momento tem-se considerado a produo de mamona no Nordeste evoluindo das unidades muito pequenas (familiares) para assentamentos, ou unidades cooperativas onde um suporte comum (sementes, insumos, comercializao) seria disponvel. Foi estimado um custo de produo da mamona neste31

Informado ao CGEE por Napoleo E. Beltro; Custo de produo da mamona em agricultura familiar, com e sem consorciamento com feijo, Embrapa, Campina Grande, 2004

sistema pela Embrapa31; nos moldes propostos, (cerca de 15 ha/ trabalhador) estima-se uma renda de R$ 200,00 / ha (contra custos de operaes agrcolas e insumos) com pagamento de R$ 0,50/ kg bagas (pratica-se hoje cerca de R$ 0,67, e tem-se como objetivo limite R$ 0,60). H em alguns casos garantias de preo mnimo de R$ 0,40/ kg bagas. O consorciamento com feijo reduz a produo de mamona / ha mas aumenta a renda para R$ 700,00/ ha. Estes nmeros so apenas indicativos; tambm no se considera o custo da infra-estrutura (inclusive da terra). Levam a uma estimativa de custo de biodiesel de R$ 1,33/ l (US$ 0,47/ l) com R$ 0,50/ kg bagas e na faixa de US$ 0,43/ l a US$ 0,57/ l, para custos de bagas entre R$ 0,45 e R$ 0,60/ kg (assumindo que 25% do custo final corresponde ao esmagamento, transporte e produo do biodiesel). Esta ltima hiptese tambm precisa ser avaliada. Anlise do Ivig-Coppe, 2002: com leo de mamona a R$2.075/ t, o biodiesel custaria US$ 0,80 / l (Planta de 40.000 t / ano; sem os crditos pelo glicerol). Estes valores foram baseados em

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preos de venda de leo de mamona, na ocasio (custos de oportunidade); no no custo de produo. a.2 Soja Os custos de produo da soja (varivel mais fixo) esto atualmente entre 8 e 10 dlares por saca (essa variao ocorre em funo dos aspectos relacionados com arrendamento da terra e controle da ferrugem asitica), o que permite rentabilidade da ordem de 30% a 40%29. Custos histricos de produo so de US$ 150 US$ 250/ t. difcil fazer projees de custos futuros, destacando-se a influncia da taxa de cmbio (custo de insumos). Ainda so necessrios no pas grandes investimentos em infraestrutura, sobretudo, de transporte e armazenamento do produto, que atualmente so responsveis por aumentos nos custos de produo. No processamento para leo, a soja produz o leo e a torta; a partio de custos do insumo entre os dois produtos sempre arbitrria, uma das formas usuais de distribuir os custos comuns considera o valor de mercado. Os estudos do custo do biodiesel da soja sempre usam o custo de oportunidade do leo (o valor de mercado). Isto leva a uma enorme flutuao do custo do biodiesel, mas a tica correta para o produtor.32

A Abiove tem avaliado os custos de produo de biodiesel do leo de soja na Brasil nas condies dos ltimos anos. Os valores de 200232 foram atualizados com o aumento do preo do leo de soja no mercado internacional11. Estimativas33 de custos52

Oliveira, L.B., Resduos slidos urbanos e leos vegetais, Workshop CEEA Coppe, Rio de Janeiro, 200233

Informado ao CGEE por Juan Diego Ferres, ABIOVE - Associao Brasileira das Indstrias de leos Vegetais, 2004

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de processamento da ordem de US$ 10 a tonelada podem ser consideradas otimistas, embora se trate de plantas de grande porte (400 t / dia), ao comparar com os valores de outras fontes como:1. US$ 88 a tonelada, no estudo de uma planta na Costa Rica para 20 mil ton/ano de ster metlico de palma, com investimento de US$ 5 milhes, adotando Processo AXENS Esterfip, do Instituto Francs34

RECOPE, Competitividad del Biodiesel obtenido de aceite de palma: el caso costarricense, San Jos, 2003

do Petrleo34. 2. US$ 62 a 250 a tonelada, na avaliao da Agencia Internacional de Energia, respectivamente para plantas de grande e pequeno

35

IEA, Liquid Fuels from Biomass: North America; Impact of Non-Technical Barriers on Implementation, prepared for the IEA Bioenergy Implementing Agreement, Task 27 Final Report, Paris, 2000

porte35.

Preliminarmente, para as condies brasileiras, (considerando os custos de investimento e operao de uma unidade produtora de biodiesel para cerca de 20 mil toneladas anuais), parece razovel adotar um custo de processamento de US$ 80,00 por tonelada de biodiesel produzido. O fator mais importante , no entanto, o custo atribudo ao leo de

36

Ferres, J., Competitividade econmica e marco regulatrio para o biodiesel, Workshop SMA, So Paulo, 2004

soja. Os valores atuais da Abiove36, so um custo do biodiesel de R$1,11 a R$1,35 / l (base: valor de mercado do leo de soja), estimado para as seguintes condies: unidade produtora de 400 t dirias; no interior do Sudeste, sem impostos (ICMS); custo do leo de soja bruto (valor de mercado): US$ 427/ t (2002) a US$ 522/ t (2003).

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a.3 Dend Para leo de palma, segundo informaes da Agropalma37, nas plantaes j implantadas e em produo hoje no Brasil, principalmente as do Par, por se encontrarem em zona apta de produo, o custo de produo se encontra em um patamar prximo a mdia mundial, atualmente cerca de US$ 200-230 por tonelada de leo bruto. Nas melhores plantaes, com grandes investimentos em tecnologia, como o caso da Agropalma, este custo j inferior aos US$ 200/ t, com uma meta de alcanar em cinco anos um custo igual ou inferior a US$ 170/ t, nvel de atingido por alguns plantios na Malsia. No se tem informao do custo esperado para a produo de biodiesel (poderia ser muito competitivo, se o processamento ficasse em 15-20% do custo final) mas o maior problema aqui seria o custo de oportunidade, como veremos adiante. A indstria do dend est se tornando muito sofisticada, com um grande nmero de subprodutos importantes; segundo a Agropalma37 o setor produzir seu combustvel a partir de um resduo do refino e destilao do leo de palma, com tecnologia inovadora. Os custos nesse caso ainda no so conhecidos. Outro interessante co-produto do leo de palma, que pode ainda melhorar as condies de viabilidade a energia eltrica, gerada mediante sistemas de co-gerao com turbinas a vapor e utilizando os resduos slidos atualmente sem aplicao. Os potenciais disponveis para esta tecnologia apontam para a auto-suficincia energtica das plantas de produo de leo e a gerao de excedentes comercializveis de eletricidade.5437

Informado ao CGEE por Marcelo Brito, Agropalma, 2004

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a.4 Referncia: diesel mineral Para efeitos desta comparao, o custo do diesel mineral (refinaria, sem impostos) estava entre US$ 0,24 e US$ 0,26/ l, com petrleo a aproximadamente US$ 25 / barril, entre janeiro e junho de 2003. O valor nos EUA no mesmo perodo oscilou entre US$ 0,29 e US$ 0,22, para leos com alto ou baixo teor de enxofre. A formao do preo mdio no Brasil est simplificadamente descrita na Nota 7. Como os preos dos combustveis esto liberados no Brasil, existe uma razovel variao entre as regies, que pode abrir oportunidades mais interessantes para o uso de biocombustveis nos mercados onde os diferenciais de preo frente ao diesel forem menores. Nesta direo deve-se observar que os valores de realizao do diesel (aos quais se agregam os tributos estaduais, fretes e margens na formao do preo para o consumidor) tem sido cerca de 5% inferiores no Nordeste e 4% maiores no CentroOeste, devido paridade de preos com o mercado internacional e a distncia destes mercado das fontes de fornecimento.

b. O custo de oportunidade para os leos vegetaisb.1 Mamona O leo de mamona muito utilizado no mundo, em diversos segmentos da indstria qumica e de alimentos. Os preos atingidos no mercado internacional so relativamente estveis nos ltimos dez anos. Em 1996, o preo para o leo bruto era de55

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US$ 0,90/ kg e de US$ 1,03/ kg em 200238. O leo processado (refinado ou desodorizado) atingia pelo menos 50% a mais. O mercado mundial de centenas de milhares de toneladas (~800.000 t). Portanto, o valor alternativo do leo quatro vezes maior que o custo do diesel mineral e praticamente o dobro do custo de produo estimado. b.2 Soja O leo de soja uma commodity, com preos muito bem conhecidos no mercado internacional. Entre 1996 e 2002 as oscilaes foram: cerca de US$ 550/ t no incio do perodo, caindo para US$ 315/ t (2000) subindo novamente em 2002 para US$ 427/ t e atingindo US$ 527/ t em 2003. Este valor (US$ 0,53/ kg) usado na composio do custo do biodiesel na atualidade. Convm lembrar que efetivamente se trata de um custo de oportunidade, no do custo de produo. b.3 Dend O leo de dend tambm uma commodity e os preos so conhecidos, com suas flutuaes. O mercado tem apresentado altas nos ltimos anos; no segundo semestre de 2003 o leo de palma cru subiu de US$ 400/ t para US$ 500/ t39 e o leo refinado (RBD) ficou em US$ 0,70/ kg (posto EUA). O leo refinado tem grande nmero de aplicaes (oleina, estearina, etc) e a demanda est muito forte em razo da entrada dos mercados asiticos (China e ndia).

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Chemical Market Reporter, Market Prices; volumes de 1990 a 2004

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Chemical Market Reporter,volumes 1 a 12, 2003

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c. Uso da glicerinaOs excedentes de glicerina derivada do biodiesel podero levar a grandes redues no preo, eliminando parte da produo de glicerina de outras fontes (hoje: 0,8 1,0 M t/ ano). Devero tambm, com redues substanciais de preo, entrar no mercado de outros poliis (em particular o sorbitol). Na Europa1, o aumento de biodiesel para atingir apenas alguns pontos porcentuais do diesel cobriria grande parte da demanda atual por glicerol. Buscam-se novas aplicaes de grandes volumes para glicerina no mundo, e isto provavelmente se dar nos intermedirios para plsticos (como o propanodiol - PDO), contudo no so solues de curto prazo. O cuidado a ser tomado (juntamente com o desenvolvimento de outros usos) no usar nos estudos de custos os crditos para40

Informao ao CGEE por Gabriela A. Macedo, Unicamp

glicerina com base nos valores de mercado de hoje (Ver Nota 5)40.

d. Gerao de empregoAs estimativas disponveis para emprego em geral referem-se com preciso maior aos empregos diretos, tanto no campo (produo agrcola) como na produo industrial do leo, especialmente para soja e dend. Para a cultura da mamona, como se busca uma alternativa agrcola nova (agricultura familiar, sustentada nos insumos, assistncia tcnica e comercializao) os valores so

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muito preliminares. Tambm a estimativas de empregos indiretos no precisa. d.1 Soja29 Estima-se que o agronegcio da soja responsvel pelo emprego direto de cerca de 4,7 milhes de pessoas em diversos segmentos (insumos, produo, transporte, processamento e distribuio) e nas cadeias produtivas de sunos e aves. A produo correspondente de 52 M t, em 20 M ha. Devido aos bons resultados tcnicos e aos preos pagos, muitos produtores, na ltima safra, tm conseguido rentabilidades superiores a 40% (em torno de R$ 1.000,00/ha). A soja responde por quase metade da produo brasileira de gros, tendo portanto grande participao tanto na macro como na microeconomia do pas; cerca de 70% exportada, contribuindo com 11% da receita de exportaes. Uma estimativa da Abiove33 indica para o uso de B5 (cerca de 1,5 M t) a gerao de 200 mil empregos diretos e indiretos, com base no Modelo de Gerao de Empregos do BNDES para a Indstria de leos Vegetais. d.2 Dend So muito adequados dois exemplos apresentados por uma empresa com tecnologia avanada, no Par, quantificando as operaes em unidade de cultura extensiva e no esquema de assentamentos familiares com participao dos Governos Federal e Estadual37. Os exemplos esto detalhados na Nota 6.58

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- Agropalma: 33 mil hectares plantados com 25 mil em produo plena; opera com 3 mil empregos diretos, e em 2003 pagou mais de R$ 100 milhes em impostos, salrios, compras de insumos etc. Os valores no incluem os empregos e recursos indiretos. - Parceria Agropalma / Governo: Projeto de assentamento para 150 famlias, em que 100 j foram contempladas. A preos de hoje, estima-se que numa rea de 10 hectares, cada famlia obtenha uma renda bruta anual de R$ 40.000,00. Caso o manejo seja realizado somente por ele e sua famlia, a renda lquida anual poder ultrapassar os R$ 15.000,00.

Uma estimativa da Embrapa23 indica a possibilidade de uma renda lquida anual, para uma famlia, de R$ 18.000,00, em 5 ha. d.3 Mamona Avaliando a proposta de produo de mamona no Nordeste, ao se considerar a evoluo das unidades muito pequenas (familiares) para assentamentos, ou unidades cooperativas onde um suporte comum (sementes, insumos, comercializao) estaria disponvel, foi estimada pela Embrapa a utilizao de 15 ha/ trabalhador. Isto geraria uma renda lquida de R$ 200,00 / ha (receita de R$ 0,50/ kg bagas, menos custos de operaes agrcolas e insumos). Pratica-se hoje cerca de R$ 0,67 e coloca-se como um objetivo um preo de R$ 0,60. H em alguns casos garantias de preo mnimo de R$ 0,40/ kg bagas. O consorciamento com feijo reduz a produtividade de mamona mas aumenta a renda para R$ 700,00/ ha31.

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e. CompetitividadeAs informaes acima sobre custos de produo do leo vegetal, custos da transformao para biodiesel, custos de oportunidade do leo vegetal e dos custos do diesel (sem impostos) no Brasil foram utilizadas para construir a tabela e o grfico a seguir. Tratase de uma abordagem preliminar, no trazendo valores exatos (h faixas de variao em quase todos os itens) mas suficiente para uma primeira anlise da competitividade do biodiesel no Brasil. Os custos de produo dos leos vegetais (em verde) so os custos sem impostos; os custos de oportunidade para os leos vegetais (em amarelo) so os valores pagos ao produtores no mercado internacional. O Valor de Indiferena para o Produtor (VIP) de biodiesel a soma do custo de oportunidade do leo com os custos de processamento do leo para biodiesel. Em princpio, este o valor que um produtor de biodiesel espera receber por seu produto, para no ter perdas na comercializao da matria-prima e ainda ter de agregar algum custo de processamento para vend-lo. A diferena entre o custo do diesel na refinaria, sem impostos, e o preo do diesel ao consumidor (duas linhas vermelhas) corresponde aos impostos, custos de logstica e margens. A diferena entre o VIP e o custo do diesel sem impostos (na refinaria) o valor do subsdio a ser pago; parte como renncia fiscal, mas uma parte significativa (no caso da mamona) como subsdios mais diretos.60

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Mesmo no caso da soja (mnimo subsdio) apenas a renncia fiscal no seria suficiente para atingir o VIP O dend um caso . muito interessante: o custo de produo baixo (equivalente ao do diesel mineral, sem impostos) mas o custo de oportunidade do leo torna necessrio um subsdio direto mais elevado que o da soja. Mamona parece ser um caso de difcil viabilizao, mas por excelentes razes: o produto tem alto valor de mercado, competindo com a aplicao como biodiesel.Tabela 3. Custos de produo, de oportunidade e valor de indiferena para leos vegetais de mamona, soja e dend (valores mximos e mnimos, US$/ l). MatriaPrima Mamona Soja Dend 0,43 0,17 Custo de produo 0,57 0,20 Custo de oportunidade 0,92 0,37 0,44 0,94 0,46 0,52 Valor de indiferena para o produtor 0,99 0,38 0,55 1,01 0,47 0,65

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Figura 3. Estimativas de custos para biodiesel no Brasil

Segundo esta avaliao preliminar e considerando apenas o nvel inferior da faixa de valores de indiferena para o produtor de biodiesel, frente a um preo de realizao (ex-impostos) do leo diesel de US$ 0,25 por litro (vide Nota 7), tem-se que a viabilizao do B5, sem afetar os preos dos combustveis ao consumidor, implica em um subsdio respectivamente de US$ 0,74; US$ 0,13 e US$ 0,30 para cada litro de biodiesel produzido de mamona, soja e dend. relevante observar que a estimativa destes valores de subsdio utilizou o valor mdio do diesel no Brasil, onde ocorre grande variao de preos, principalmente nas regies mais isoladas. Na Europa ou nos EUA, os preos diferentes do diesel modificam os resultados e as condies de viabilidade para o biodiesel.

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Os preos (ao consumidor) de diesel na Alemanha e EUA41

Ferres, J. D.; Competitividade Econmica e o marco regulatrio para o biodiesel no Brasil; Workshop SMA, S. Paulo, 2004

so respectivamente da ordem de 0,96 e 0,39 US$/l41; e os custos (sem impostos) de biodiesel (colza e soja) so tambm respectivamente 0,63 e 0,58 US$/l. Em outras palavras, por conta dos elevados impostos, o diesel mineral to caro na Alemanha que basta a renncia fiscal para viabilizar o biodiesel; o mesmo no ocorre nos EUA, onde como visto anteriormente, existe uma poltica de uso compulsrio de biodiesel.

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9. ConclusesComo uma sntese do presente estudo, as concluses a seguir esto apresentadas segundo a seqncia desenvolvida anteriormente e mais do que a opinio dos autores, representam uma viso do estado-da-arte e dos principais consensos existentes na comunidade atuante em biodiesel no Brasil.

a. TecnologiasTecnicamente, o biodiesel hoje uma alternativa possvel para o diesel mineral no setor de transportes, que muitos pases vm crescentemente adotando. Atualmente seria mais indicada a adoo da transesterificao como processo principal (com metanol ou etanol) e o uso em mistura com o diesel, sem nenhuma modificao dos motores. Desenvolvimentos tecnolgicos podem tornar importantes outras rotas (craqueamento) e processos (catlise enzimtica). muito importante assegurar que o biodiesel atenda s especificaes, para evitar problemas aos motores. A especificao preliminar brasileira (Portaria 255/2003 da ANP) adequada para o incio de um programa; a implementao do programa de testes poder esclarecer dvidas (qualidade; efeitos nos motores; estabilidade) e permitir eventuais simplificaes da especificao.

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O balano energtico da produo depende muito da matriaprima e processos; tem sido positivo na Europa e nos Estados Unidos, com soja e colza, ficando a relao (output renovvel)/ (input fssil) entre 2 e 3. No Brasil, h poucos estudos (e incompletos), que indicam valores entre 1,4 (soja) e ~5,6 (dend). Comparativamente, o etanol no Brasil apresenta 8,3; nos EUA, 1,3.

b. Impactos ambientaisO uso do biodiesel reduz as principais emisses locais associadas ao diesel (PM, CO, HC e SOx), exceto dos NOx. (+2 a 4%, com B20). no txico e biodegradvel. Estas caractersticas so muito importantes no Brasil (centros urbanos). Com relao a emisses de GEE, resultados para biodiesel puro (B100), indicam redues de 40 a 60% das emisses correspondentes ao diesel (colza, Europa). Dependem muito da matria-prima e do tratamento dado aos subprodutos. Os balanos energticos indicam que as redues no Brasil, com soja, no seriam maiores. So relevantes, mas o valor associado a possveis crditos de carbono pequeno; para crdito entre US$ 1 e 5/ t carbono evitado, corresponderiam a cerca de 3% do custo de produo.

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c. Mercados no BrasilA demanda total de diesel no Brasil em 2002 foi de 39,2 Mm3 (76% para transportes) com importao de 16,3% (US$ 1,2 bilhes). Como exemplo, o uso de B5 em todo o mercado necessitaria 2,00 Mm3 biodiesel (0,45 no diesel metropolitano; 0,31 no agropecurio; 0,10 para energia eltrica nos sistemas isolados). Em termos regionais, o consumo de diesel ocorre principalmente na regio Sudeste (44%), seguida do Sul (20%), Nordeste (15%), Centro-Oeste (12%) e Norte (9%).

d. Matrias-Primas, tecnologia agrcola e disponibilidade de reas no BrasilNo Brasil h um grande nmero de oleaginosas que poderiam ser usadas para produzir biodiesel. Considerando reas a cultivar para suprir 5% da demanda de diesel (B5), com oleaginosas locais, de acordo com o zoneamento da Embrapa, e tomando simplificadamente apenas soja, dend e mamona, estima-se uma necessidade de cerca de 3 M ha. A rea de expanso possvel para gros de 90 M ha; e as reas aptas para dend atingem, na Amaznia, cerca de 70 M ha, dos quais cerca de 40% com alta aptido. A mamona parece ser uma opo agrcola rentvel para as regies rida e semi-rida do Nordeste, independentemente do uso para biodiesel, considerando o atraente valor do produto.67

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Mamona uma cultura relativamente pequena (130.000 ha, 2002); principalmente em pequenas unidades (~15 ha), no Nordeste. Um programa significativo de biodiesel exigir fortalecimento substancial da base agrcola (suporte para desenvolvimento e disseminao de novas variedades, para um mnimo de sustentabilidade). O modelo proposto para a produo (familiar assistido, assentamentos) deve ser cuidadosamente avaliado nos seus mltiplos aspectos, com nfase em custos totais e renda; e deve considerar a alternativa de exportao do leo (usos no energticos). A soja brasileira apresenta forte base agrcola (variedades, tecnologias) e uma enorme experincia acumulada na produo. Usa 20 M ha, havendo cerca de 100 M ha aptos para a expanso. No h limitaes (tcnicas, ou de reas) para suportar um programa de biodiesel para misturas. O dend, independentemente de programas para

biocombustveis, merece muita ateno. A produo mundial de leo de dend atingiu 25,4 M t (2002); devendo ultrapassar a de soja no final da dcada. O Brasil produz ainda apenas 0,5% do total mundial (em 50.000 ha), embora seja freqentemente citado como tendo o maior potencial do mundo, por suas reas com aptido agrcola para esta cultura. Uma tecnologia de produo agrcola moderna praticada no pas; h tambm uma experincia em curso (agricultura familiar, assistida) que deve ser muito bem avaliada. A oferta de variedades adequada para a pequena produo de hoje, mas uma expanso da cultura exigir fortalecimento da pesquisa (resistncia a doenas, caractersticas da produo).68

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e. Emprego e rendaO agronegcio da soja gera empregos diretos para 4,7 milhes de pessoas em diversos segmentos (insumos, produo, transporte, processamento e distribuio) e nas cadeias produtivas de sunos e aves; a produo correspondente de 52 M t, em 20 M ha. Um exemplo para dend indica 33 mil hectares plantados (25 mil em produo), utilizando 3 mil empregos diretos; e em agricultura familiar assistida, uma famlia para 10 ha. Os assentamentos previstos para mamona consideram um trabalhador para cada 10-15 ha. Adotando uma mdia de 0,09 emprego por ha (valor aproximado entre os observados para a agricultura familiar e a agroindstria) e considerando as projees de rea a ser cultivada conforme a Embrapa (Tabela 2), tem-se uma gerao aproximada de 260 mil empregos diretos na fase agrcola, para a plena implementao do B5. A esta demanda de mo-de-obra devem ser agregadas as necessidades da fase industrial e de logstica do biodiesel.

f. Custos, custos de oportunidade e competitividadeNa Europa e EUA o custo do biodiesel hoje 1,5 a 3 vezes maior que o do diesel mineral; no se esperando redues importantes no custo, por se tratar de processos (agrcolas e industriais) maduros e eficientes. O biodiesel no competitivo se externalidades positivas (meio ambiente local, clima global,69

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gerao e manuteno de emprego, balano de pagamentos) no forem consideradas. Como nos casos acima, atualmente, no Brasil, o biodiesel no competitivo com o diesel mineral. Portanto, preciso conhecer bem os custos atuais e esperados no futuro, para dimensionar corretamente os nveis de subsdio envolvidos; assim como cabe determinar o valor das externalidades a serem eventualmente consideradas (no Brasil, a mais importante seria a gerao de empregos e renda); e decidir sobre sua adequao, ou considerar alternativas de viabilizao deste biocombustvel. Um estudo apenas indicativo dos custos de produo dos leos vegetais, do biodiesel derivado e dos valores de indiferena para o produtor (VIP) (considerando o valor de mercado dos leos vegetais) permite avaliar a competitividade do biodiesel, nas condies brasileiras. A diferena entre o VIP e o custo do diesel sem impostos (na refinaria) o valor do subsdio a ser pago (como renncia fiscal e subsdios diretos). Segundo este estudo, preliminarmente, os subsdios mnimos seriam de cerca de US$ 0,74; US$ 0,13 e US$ 0,30 para cada litro de biodiesel produzido de mamona, soja e dend, frente ao preo mdio do diesel no pas. Sempre como um exerccio referente ao B5, considerando todo o mercado estimado de 2,00 Mm3 sendo abastecido com biodiesel de soja , que aparentemente demanda o menor subsdio, seria necessrio um suporte anual de US$ 260 milhes. Evidentemente, deve-se considerar que o VIP do biodiesel de soja depende essencialmente dos preos da soja no mercado internacional.

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Mesmo no caso da soja, apenas a renncia fiscal no seria suficiente para atingir o valor de indiferena e seria necessrio algum aporte adicional para que a adoo do biodiesel no afete o preo ao consumidor. O dend apresenta um custo de produo baixo (equivalente ao do diesel mineral, sem impostos) mas o custo de oportunidade do leo torna necessrio um subsdio direto mais elevado que o da soja. Mamona parece ser um caso de difcil viabilizao, mas por excelentes razes: o produto tem alto valor de mercado, competindo vantajosamente com a sua eventual aplicao para biodiesel. Como a avaliao dos teores ou mesmo da simples presena de biodiesel no diesel mineral no pode ser efetuada de forma expedita ou simplificada, a adoo de mecanismos de subsdio deve necessariamente contemplar procedimentos de acompanhamento e monitoramento.

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10. RecomendaesAs recomendaes a seguir, elaboradas com base nas potencialidades detectadas no Brasil, na experincia internacional e nos diversos comentrios coligidos durante a preparao deste estudo, devem ser consideradas como ponto de partida para uma discusso mais ampla. Foram agrupadas considerando os aspectos relacionados ao mercado para biodiesel; sua produo; produo das matrias primas, e ao desenvolvimento tecnolgico necessrio. Naturalmente estas medidas devem ser consideradas dentro de um programa articulado, com outras aes de governo pertinentes.

a. Mercado de biodieselUm bom sinalizador para o mercado poderia ser a implementao do programa de testes j acordado e a autorizao para uso irrestrito de misturas at B2, no compulsria, sempre com biodiesel necessariamente atendendo as especificaes. Mediante regulamentao da ANP as distribuidoras poderiam , passar a fornecer leo diesel com at 2% de biodiesel, ficando sob sua responsabilidade o cumprimento das especificaes do produto entregue ao revendedor ou ao consumidor. Desta forma a diversidade de contextos de demanda de diesel no Brasil pode proporcionar o surgimento de mercados precursores, ainda na presente situao de custos / preos. Exemplos seriam73

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as regies afastadas das refinarias e com bom potencial produtor de biodiesel, como o interior do Centro-Oeste; a gerao de eletricidade em sistemas isolados na Amaznia; e mesmo junto a grandes centros consumidores, quando eventualmente utilizada matria-prima de baixo preo, como leos de fritura e outros resduos graxos (onde a tecnologia permitir e os custos de aquisio e coleta justificarem). O efeito lubrificante e o impacto ambiental positivo (centros urbanos) do biodiesel podem ser as primeiras externalidades visveis para o consumidor, podendo ajudar na aceitao de um custo mais elevado. O necessrio equacionamento dos aspectos tributrios (definio de alquotas ou sua eventual iseno) deve considerar a dificuldade de se assegurar com avaliaes in loco se existe efetivamente biodiesel em um combustvel derivado de petrleo. Em funo dos entendimentos com os produtores e dentro da viso do governo, a crucial questo dos subsdios (prximo tpico) poderia oportunamente ser definida, mas as medidas para a criao do mercado seriam sinalizadoras de um suporte concreto ao biodiesel, com um reduzido impacto fiscal.

b. Produo de biodieselEm quase todos os casos no mundo o biodiesel no pode competir com o diesel mineral sem contabilizar suas externalidades positivas (meio ambiente local, clima global, gerao e manuteno de

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emprego, balano de pagamentos, segurana). Tambm no h evidncias de possibilidades de reduo de custos significativas. No Brasil, possivelmente a externalidade mais importante seria a gerao de empregos. Embora no Brasil duas das matrias-primas mais consideradas (mamona e dend) apresentem custos de produo razoavelmente prximos dos custos do diesel mineral, os respectivos custos de oportunidade exigiriam um subsdio elevado para o uso como biodiesel. Visando estabelecer um mercado sustentvel de longo prazo, a principal recomendao seria estabelecer claramente com os produtores (em cada caso) sua expectativa de remunerao pelo biodiesel nos prximos anos, e como conseqncia estimar os valores de subsdios e avali-los considerando os objetivos de um programa de biodiesel no Brasil: emprego e renda; divisas; benefcios ambientais, etc., bem como o volume prospectivo de recursos necessrios e as provveis fontes de financiamento. Subsdios, renncia fiscal e outros mecanismos de suporte, so legtimos em funo de uma poltica energtica e de desenvolvimento; podem ser concedidos de diversas formas, com diferentes eficcias. Talvez estmulos aos investimentos e formao de capital sejam mais adequados que a introduo de eventuais desajustes nos preos, com implicaes em todo o setor energtico.

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c. Produo de oleaginosasEm princpio uma dificuldade para o biodiesel, o elevado custo de oportunidade dos leos de dend e mamona no deve ser considerado um problema, mas uma importante oportunidade. Notamos que, embora com condies excepcionais para a sua produo, o Brasil tem presena muito pequena no mercado internacional, em ambos os casos. Independentemente dos usos eventuais para biodiesel, os mesmos programas de produo poderiam ser implementados a partir de um trabalho voltado para a exportao e outros usos no pas. Recomendase um trabalho inicial de avaliao dos mercados e das nossas condies de competitividade (ndia, mamona; Malsia, dend); e das estratgias para participar destes mercados em muito maior escala. As aes necessrias ao nvel de produo, em qualquer caso (biodiesel ou mercados externos para os leos) seriam: Mamona: fortalecer o programa da Embrapa, no sentido de aumentar a oferta de material gentico (maior nmero de variedades e hbridos comerciais) com avanos (produtividade, resistncia a pragas e doenas, ampliao das condies de plantio). Capacitar para o apoio produo. Dend: capacitar a Embrapa Manaus para retomar plenamente o desenvolvimento de variedades, desde os bancos de germoplasma at o melhoramento visando resistncia a pragas e doenas, distribuio de picos de produo, etc. Analisar as implicaes da atual legislao ambiental, especificamente para 76

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a expanso dos cultivos de dend, buscando alternativas de reduo dos custos implicados pela legislao.

d. Apoio ao desenvolvimento tecnolgico do biodieselPara dar efetiva consistncia a um programa de implementao de biodiesel no Brasil, importante reforar a base de conhecimento existente e fomentar estudos bsicos e o desenvolvimento tecnolgico neste campo. Estas medidas so particularmente importantes para o aperfeioamento dos processos de produo, incluindo os processos de produo alternativos (craqueamento, catlise enzimtica), bem como para promover pesquisas aplicadas na utilizao deste biocombustvel, em particular por meio do programa de testes mnimo, para dar suporte s especificaes e sua evoluo.

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Observao finalO biodiesel pode eventualmente cumprir um papel importante no fortalecimento da base agroindustrial brasileira e no incremento da sustentabilidade da matriz energtica nacional, com gerao de empregos e benefcios ambientais relevantes. sempre til lembrar a experincia do etanol, evoluindo de uma situao de necessidade de grandes subsdios em 1975 para uma forte posio competitiva hoje. H disponibilidade de terras, clima adequado e tecnologia agronmica, mas no h competitividade (no sentido convencional), necessrio um reforo da base de variedades e cultivares (exceto para a soja) e algum aperfeioamento dos processos produtivos (particularmente para a rota etlica). O planejamento para implementao do biodiesel requer aes de curto prazo, com a introduo cuidadosa deste biocombustvel no mercado, que poder induzir progressiva superao das dificuldades apontadas. importante que a grande expectativa j criada em torno do biodiesel no se frustre e coloque em risco uma alternativa de efetivo interesse.

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Nota 1 - Rotas tecnolgicas e matrias-primasEmbora para a produo de combustveis automotivos a partir de leos vegetais existam iniciativas baseadas em rotas distintas da transesterificao, e considervel esforo tenha sido aplicado ao uso direto de misturas leo vegetal e diesel mineral, microemulses e processos de pirlise, como o processo termo-cataltico desenvolvido no Brasil pela Guascor8, nas palavras de um especialista, tecnicamente, no h dvidas que a transesterificao via catlise bsica empregando-se alcxidos metlicos de curta cadeia ou hidrxido sdico ou potssico como catalisador, seja o caminho que melhor combina eficincia de converses, cinticas favorveis a produes em larga escala e minimizao de formao de subprodutos, desde que as matrias-primas empregadas mantenham um mnimo nvel de42

Informado ao CGEE por Lincoln Camargo Neves Neto,Westfalia Separator do Brasil, 2004

qualidade42. A transesterificao ocorre em uma seqncia de trs subreaes consecutivas e reversveis, com di e monoglicerdeos como intermedirios, e as propores estequiomtricas so trs moles de lcool por mol de triglicerdeo (leo vegetal), entretanto algum excesso de lcool necessrio para aumentar o rendimento da converso e permitir a posterior separao dos steres do glicerol43. Aps a obteno e purificao do leo vegetal a partir das sementes ou amndoas, geralmente mediante operaes de triturao, laminao, cozimento e extrao do leo bruto44, pode ser81

43

Schuchardt, U., Sercheli, R., Vargas,R.M., Transesterification of Vegetables Oils: a review, Journal of Brazilian Chemistry Society, Vol.9, No. 1, 199844

Para informaes sobre a tecnologia de produo de leos vegetais, ver, por exemplo, Moretto, E., Alves,R.F., leos e Gorduras Vegetais: processamento e anlises, Editora da UFSC, Florianpolis, 1986

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efetuada sua converso em biodiesel. De uma forma simplificada, as etapas tpicas em um processo de transesterificao45, no presente estado de desenvolvimento, so:a. lcool e o catalisador so misturados em um tanque com um agitador. b. leo vegetal colocado em um reator fechado contendo a mistura lcool/catalisador. O entre 1 a 8 horas. c. Ao final da reao, quando se considera convertido um nvel suficiente de leo vegetal, os steres (biodiesel) e a glicerina so separados por gravidade, podendo ser adotadas centrfugas para agilizar o processo. d. O lcool em excesso separado do biodiesel e da glicerina por evaporao sob baixa presso (evaporao flash) ou por destilao. O lcool recuperado volta ao processo. e. O biodiesel deve ser purificado e em alguns casos, lavado com gua morna para remover resduos de catalisador e sabes. reator usualmente aquecido aproximadamente 70C para aumentar a velocidade da reao, que leva45

Schuchardt,U., Sercheli, R., Vargas,R.M., Transesterification of Vegetables Oils: a review, Journal of Brazilian Chemistry Society, Vol.9, No. 1, 1998

A transesterificao etlica significativamente mais complexa que a metlica. O aumento do tamanho da cadeia do lcool acarreta uma maior sofisticao ao proc