Cronistas do Descobrimento
O Brasil do século XVI é uma terra recém descoberta e, como
tal, não tem ainda condições de produzir uma literatura própria.
Os primeiros escritos foram feitos por estrangeiros que revelavam
particular interesse pelos aspectos exóticos de nossa terra. A
estes relatos damos o nome de Literatura Informativa ou dos
Viajantes, que se ocupava da terra e suas riquezas naturais e, é
claro, do elemento nativo e seus costumes. São, portanto, textos
documentais que servem de registro de um momento da
formação cultural brasileira.
Em suma, são textos sobre o Brasil e representam fonte de
informação sobre os primeiros tempos da colonização:
Possuem caráter descritivo;
Mostram a olhar do europeu;
Retratam com a visão do paraíso.
Pero Vaz
de Caminha 1. Descrição da viagem
2. Descrição dos índios:
“A feição deles é serem pardos, quase avermelhados, de rostos
regulares e narizes bem feitos; andam nus sem nenhuma
cobertura; nem se importam de cobrir nenhuma coisa, nem de
mostrar suas vergonhas. E sobre isto são tão inocentes, como em
mostrar o rosto. Traziam, ambos, os beiços de baixo furados e,
cada um, metidos neles ossos de osso mesmo, brancos, medindo
uma mão travessa e da grossura de um fuso de algodão e agudo
na ponta, como furador. Metem-nos pela parte de dentro do beiço
e o que lhes fica entre o beiço e os dentes é feito como castelo de
xadrez. E de tal maneira o trazem ali encaixado que não os
magoa, nem estorva a fala, nem o comer ou o beber.”
3. Descrição da terra:
“Mas, a terra em si é muito boa de ares, tão frios e temperados,
como os de Entre-Douro e Minho, porque, neste tempo de agora,
assim os achávamos como os de lá. Águas são muitas e infindas.
De tal maneira é graciosa que, querendo aproveitá-la, dar-se-á
nela tudo por bem das águas que tem.”
4. Salvação:
“Mas o melhor fruto que nela se pode fazer, me parece que será
salvar esta gente; e esta deve ser a principal semente que Vossa
Alteza nela deve lançar. E que não houvesse mais do que ter
aqui esta pousada para esta navegação de Calecute, bastaria,
quanto mais disposição para se cumprir nela o fazer o que Vossa
Alteza tanto deseja, ou seja: acrescentamento da nossa Santa
Fé.”
Pero de Magalhães Gândavo
“História da província de Santa Cruz”: primeira historiografia
sobre o Brasil. Foi o incentivador da migração para o Brasil bem
como o primeiro a defender a importância do Brasil no contexto
econômico português.
“Uma planta se dá também nesta província, (...) com a fruta da
qual se ajudam muitas pessoas a sustentar na terra. Esta planta é
mui tenra e não muito alta, não tem ramos senão umas folhas
que serão seis ou sete palmos de comprido. A fruta dela se
chama banana. Parecem-se na feição de pepinos, e criam-se em
cachos: alguns deles há tão grandes que têm de cento e
cinqüenta bananas para cima, e muitas vezes é tamanho o peso
dela que acontece quebrar a planta pelo meio.”
“Outra fruta há nesta terra muito melhor
e mais prezada dos moradores de todas,
que se cria em uma planta humilde junto do chão: a qual planta
tem umas pencas como de erva babosa. A esta fruta chamam
ananases, e nascem como alcachofras, os quais parecem
naturalmente pinhas, e são do mesmo tamanho, e alguns
maiores.”
“(A língua Tupi-Guarani) ... carece de três letras, convém
saber, não se acha nela F, nem L, nem R, coisa digna de
espanto, porque assim não têm Fé, nem Lei, nem Rei.”
Gabriel Soares de Sousa
“Tratado descritivo do Brasil em 1587”: considerado um
trabalho preciso, minucioso e “enciclopédico” sobre o Brasil.
“São os tupinambás tão luxuriosos que não há pecado de luxúria
que não cometam; os quais sendo de muito pouca idade têm
conta com mulheres, e bem mulheres; porque as velhas, já
desestimadas dos que são homens, granjeiam estes meninos,
fazendo-lhes mimos e regalos, e ensinam-lhes a fazer o que eles
não sabem, e não os deixam de dia, nem de noite. É este gentio
tão luxurioso que poucas vezes têm respeito às irmãs e tias, e
porque este pecado é contra seus costumes, dormem com elas
pelos matos, e alguns com suas próprias filhas; e não se
contentam com uma mulher, mas têm muitas, como já fica dito
que morrem muitos de esfalfados.”
Jean de Léry Viagem à terra do Brasil (1578): enfoque dos momentos iniciais
da chamada França Antártica, detendo-se nas descrições da terra
e do modo de vida dos nativos. Seu texto pode ser considerado
um referencial para os estudos antropológicos brasileiros.
“Note-se que sendo a poligamia permitida podem os homens ter
quantas mulheres lhes apraz e quanto maior o número de
esposas mais valentes são considerados, o que transforma vício
em virtude. (...) O que me parece admirável é que havendo
sempre uma, entre elas, mais amada do marido, não se revoltem
as outras e nem sequer demonstrem ciúmes (...) E deixo aos
meus leitores considerarem se, ainda que não fosse proibido por
Deus ter mais de uma mulher, se acomodariam as européias com
esse regime matrimonial. Melhor seria condenar um homem às
galés do que metê-lo no meio de tanta intriga e ciumeira.”
“Entretanto, mesmo não falando por metáforas, não
encontramos aqui, nem na Itália e alhures, pessoas,
condecoradas com o título de cristãos, que não satisfeitas com
trucidar seu inimigo ainda lhes devoram fígado e coração? Não
abominemos portanto demasiado a crueldade dos selvagens
antropófagos. Existem entre nós criaturas tão abomináveis, se
não mais, e mais detestáveis do
que aquelas que só investem
contra nações inimigas de que têm
vingança a tomar. Não é preciso ir
à América, nem mesmo sair de
nosso país, para ver coisas
tão monstruosas.
Hans Staden
“A verdadeira história dos selvagens, nus e ferozes
devoradores de homens, encontrados no novo mundo, a
América, e desconhecidos antes e depois do nascimento de
Cristo na terra de Hessen, até os últimos dois anos passados,
quando o próprio Hans Staden de Homberg, em Hessen, os
conheceu, e agora os traz ao conhecimento do público por meio
da impressão deste livro” ou “Duas viagens ao Brasil” (1557) ,
saborosa narrativa repleta de aventuras do alemão entre os
Tupinambás, incluindo a sua quase deglutição por esses mesmos
índios e o que fez ele para não ser morto. Capturado pelos
antropófagos, o autor conseguiu sobreviver ao cativeiro e
escapar. Registrou vários aspectos da cultura indígena em seus
relatos, descrições e ilustrações.
Eles não comem seus inimigos porque têm fome,
mas sim por ódio e grande hostilidade, sendo que, nos combates
entre eles, durante a guerra, gritam cheios de raiva: “Que todo
infortúnio caia sobre você, minha comida, minha refeição. Quero
arrebentar a sua cabeça ainda hoje. Antes que o sol se ponha
vou ter assado a sua carne.” E assim por diante. Fazem tudo isso
por causa de sua grande inimizade.
Mas são as mulheres que levam
as vísceras, das quais, depois de
cozidas, fazem uma papa
denominada mingau, que elas e
as crianças bebem.
José de Anchieta
Os jesuítas escreveram textos que tinham o objetivo
de auxiliar na conversão dos nativos. Anchieta veio para
o Brasil nos primeiros anos da colonização a fim de se dedicar
aos índios e fundar São Paulo. Aprendeu as regras da língua tupi
e esboçou sua gramática, publicada anos mais tarde. Sua obra
é composta de poesias e peças teatrais de caráter religioso.
“Carta ao padre mestre” e “A Santa Inês”
Padre Manuel da Nóbrega
“Carta ao Padre Mestre”: sobre a defesa e evangelização das
almas indígenas.
“Diálogo sobre a conversão do gentio”: discute aspectos práticos,
morais e religiosos da relação entre os colonizadores e os índios,
defendendo que estes não devem ser escravizados, pois têm
alma como os cristãos.
Pero Lopes de Sousa
“Diário de Navegação”: posse e defesa da costa
brasileira contra os franceses.
André Thevet
“Singularidades da França Antártica” : Visão errônea sobre o
Brasil e outras viagens, aspectos geográficos e antropológicos.
Fernão Cardim
“Tratado da terra e gente do Brasil”. Conceitos “quase”
dicionarizados das coisas do Brasil. Em forma de verbetes sobre
a fauna, a flora e os habitantes do Brasil, o autor busca traçar um
painel completo da Colônia.
Piloto Anônimo
Este relato reconstitui a travessia do oceano
Atlântico pela frota de Cabral, com
informações que complementam e às vezes
contradizem o texto de Caminha.