O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
Produção Didático-Pedagógica 2007
Versão Online ISBN 978-85-8015-038-4Cadernos PDE
VOLU
ME I
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IDENTIFICAÇÃO:
Professor PDE : Lucilena Aparecida Biscalchim
Disciplina / Área : Língua Portuguesa
IES: Universidade Estadual de Londrina
Orientador : Luiz Carlos Migliozzi Ferreira de Mello
Material Didático: OAC
Título : Leitura de Histórias em Quadrinhos em uma Perspectiva Semiótica
RECURSO DE EXPRESSÃO
LEITURA DE HISTÓRIAS EM QUADRINHOS EM UMA PERSPECTIVA
SEMIÓTICA.
A universalização da Educação Básica trouxe para as salas de aula o
benefício de poder atender a todos, sem distinção. No entanto, trouxe também um
grande problema: a diversidade social, econômica, cultural, disciplinar. O professor
passou a gerenciar realidades múltiplas, para as quais o seu material didático -
quase sempre o livro didático - não se aplica satisfatoriamente, por distanciar-se da
linguagem infantil e por apresentar seqüências didáticas de difícil compreensão para
crianças não habituadas à leitura.
Neste contexto, cabe ao professor ir ao encontro das necessidades
pedagógicas dessas crianças. Para tanto, precisa buscar gêneros textuais que lhes
despertem interesse, envolva-os na leitura na tentativa de "fisgá-los”, de forma a
despertar nelas o gosto por uma atividade que, em princípio distanciada de sua
realidade, é das mais prazerosas. Espera-se que, uma vez que as crianças tenham
aprendido a reconhecer no texto escrito os sentidos construídos por sujeitos
socialmente ativos e que compreendam que também elas, leitoras, constroem
sentidos na interação com o texto, possam enxergar-se sujeitos socialmente ativos,
tal como aqueles com quem interagiram. Em resumo, o material de leitura que se
tem disponível, muitas vezes, é contrário ao gosto e ao interesse dos alunos,
principalmente na quinta série do ensino fundamental, o que torna necessária a
busca por materiais e estratégias alternativas para o trabalho com a leitura.
Este trabalho pretende investigar a eficácia da leitura de Histórias em
Quadrinhos, na perspectiva da Semiótica Discursiva, como estratégia de leitura nas
turmas de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental, a partir da compreensão de
Semiótica como uma das teorias derivadas das chamadas Teorias da Enunciação,
que se ocupa da busca pelos sentidos do texto. De acordo com uma análise à luz da
Semiótica, o percurso que leva ao sentido completo de um texto deve começar no
nível mais simples para o mais complexo (nível profundo). Isso porque o autor, ao
construir seu enunciado, baseia-se numa idéia, algo abstrato e amplo e, para
expressá-la, explicita-a em figuras cada vez mais concretas e simples (nível
discursivo). O leitor deve fazer o percurso inverso ao apropriar-se dos sentidos do
texto: partir das figuras, para alcançar a idéia mais ampla que deu origem ao
enunciado. Um dos pressupostos mais importantes é que todo enunciado é
composto por temas e/ou figuras. Nos temas, estão idéias, abstrações; nas figuras,
as palavras da linguagem que remetem aos elementos concretos do mundo natural.
No texto mais figurativo, caso, por exemplo, das narrativas, as figuras são explícitas
e os temas, implícitos. O leitor competente deve saber encontrar temas por meio das
figuras.
Ao trabalhar com Histórias em Quadrinhos, na sala de aula, pretende-se
ensinar o aluno a perceber os conteúdos temáticos, tanto no texto verbal como nas
imagens que compõem as histórias. Segundo Antônio Vicente Pietroforte, no livro
Semiótica Visual - os percursos do olhar (Contexto, 2004), a linguagem gráfica
seqüencial faz uma articulação entre e coerência semântica e a coerência plástica, e
explica: elementos de sentido podem ser representados figurativamente na forma
visual dos personagens.
Outra autora, Valéria Rodrigues Silveira (2003), defende o status de gênero
discursivo, e não textual, para as Histórias em Quadrinhos. Clarícia Akemi Eguti
(Dissertação de 2001), procurou mostrar que as Histórias em Quadrinhos se
convertem em terreno fértil de representação da oralidade, visto esta dentro de uma
perspectiva abrangente, englobando a língua falada e os demais elementos que a
constituem como gestos e voz. Os quadrinhos simulariam várias características da
língua falada. Nos balões, em discurso direto, teríamos representados as
conversações, pausas, hesitações, truncamentos, sobreposições de vozes. O código
visual indicaria aspectos extra-verbais da conversação: expressões faciais e
movimentos do corpo. Formatos das letras, contornos, indicam tom de voz e
emoções do falante. Ou seja, seria uma atividade completa de leitura, tanto no plano
do conteúdo como no da expressão.
Uma boa opção para esse tipo de trabalho com os alunos é a escolha de
histórias com a turma do Tio Patinhas, composta de diversos personagens, cada
qual com suas características bem marcadas, que criam um simulacro bastante
lúdico de uma realidade inegável: o modelo capitalista de economia. Pode-se, então,
analisar a representatividade do dinheiro para cada personagem.
Com o objetivo de tratar da materialidade deste trabalho, será necessário que
se faça uma posterior seleção de revistas em quadrinhos que tragam os
personagens da turma em situações que evidenciem suas características
intrínsecas. Para isso, o professor, ao se propor realizar tal tipo de atividade, deverá
empreender ampla pesquisa sobre o assunto, a partir dos materiais sugeridos nos
recursos deste OAC.
Espera-se, com este tipo de leitura, conquistar o leitor infanto-juvenil ao
mesmo tempo em que se procura mostrar que a leitura de Histórias em Quadrinhos
não precisa ser apenas um passatempo, embora cumpra muito bem tal papel, mas
pode ser também uma forma interessante de observar as relações humanas
permeadas por interesses, neste caso, o dinheiro, e desvelar assim o mundo dos
adultos sem perder a inocência da criança.
A estratégia escolhida para desenvolver o trabalho é a do uso de materiais
impressos originais, em que se leve para a sala de aula o gibi de verdade, e não
fotocópias ou fragmentos em livros didáticos, pois o manuseio da revista em
quadrinhos proporciona ao leitor um prazer extra, além de acrescentar a noção de
leitura da vida real e não de exercício de sala de aula. Este trabalho poderá ainda
programar futuramente a criação de uma Gibiteca na escola, com o objetivo de
proporcionar ao aluno a oportunidade de continuar suas leituras autonomamente.
Referências:
BARROS , Diana Luz Pessoa de. Teoria Semiótica do Texto. São Paulo,
Ática, 1990.
EGUTI, Clarícia Akemi. A representatividade da oralidade nas histórias em
quadrinhos. São Paulo, USP, 2001. Dissertação de Mestrado.
SILVEIRA, Valéria Rodrigues. A palavra-imagem nos gestos de leitura: os
quadrinhos em discussão. São Paulo, PUC, 2003. Dissertação de Mestrado.
PIETROFORTE, Antônio Vicente. Semiótica Visual – Os Percursos do Olhar.
São Paulo, Contexto, 2004.
RECURSOS DIDÁTICOS
Sítios
Wikipédia
http://pt.wikipedia.org Acessado em 15/11/2007
Dentre os muitos assuntos deste site, há informações bastante completas
sobre a história do personagem Tio Patinhas, desde sua criação em 1947 até hoje, e
a ligação entre esse personagem e Ebenezer Scrooge, da obra Um Conto de Natal,
de Dickens. O site informa também sobre toda a família Pato e seus quadrinistas ao
longo do tempo. Traz ainda muitas informações sobre Histórias em Quadrinhos de
modo geral.
Planeta Educação
http://www.planetaeducação.com.br Acessado em 15/11/2007.
Revista eletrônica voltada para educadores. Suas seções e colunas trazem
notícias, reportagens e artigos que tratam dos temas mais atuais da Educação
brasileira. Funciona como um excelente suporte para a formação e informação de
professores de todas as áreas e níveis.
Nova Escola on-line
http://www.ensino.net/novaescola Acessado em 15/11/2007
O site da revista Nova escola on-line mostra a Edição Abril de1998 que, em
uma reportagem de capa, ensina a criar histórias em quadrinhos na escola, com
técnicas de desenho, criação de personagens, argumento e roteiro, como desenhar
as letras e colorização. Além disso, há, em link, muitas informações sobre o uso dos
gibis na sala de aula.
Sons e vídeos
Vídeo: Um Conto de Natal (filme em VHS)
Diretor: David Hugh Jones. Produtora: Hallmark Entertainment. EUA. 1999. 01h35min.
Trata-se de uma adaptação para o cinema da obra de Charles Dickens, e
conta a história de Ebenezer Scrooge, um homem muito rico e muito avarento que,
em certa noite de natal, encontra-se solitário, pois, durante toda a vida, deu
importância apenas ao acúmulo de riquezas e afastou de si as pessoas.
A trama central do filme constrói-se na visita dos espíritos do natal passado,
do natal presente e do natal futuro, que aparecem ao velho naquela noite para
mostrar-lhe seus erros passados e presentes e como seu futuro será tenebroso,
morrendo sozinho. A partir dessa noite, Scrooge resolve corrigir seus erros e mudar
de vida.
A história de Dickens sofreu diversas adaptações para o cinema, para a
televisão, para o teatro e até para o desenho animado. A primeira adaptação ocorreu
em 1910 e era uma animação. O filme citado acima é de 1999.
Um Conto de Natal do Mickey
Diretor: Burny Mattinson. Produtora: Walt Disney Pictures. EUA. 1983. 00h49min.
Adaptação da obra homônima de Charles Dickens, para animação de curta-
metragem dos Estúdios Disney, traz o Tio Patinhas vivendo o personagem em que
foi inspirado quando de sua criação: Ebenezer Scrooge. Toda a turma de
personagens Disney participam do curta, que, inclusive, recebeu uma indicação ao
Oscar. O mesmo filme animado pode ser encontrado inserido em outra obra Disney,
O natal mágico do Mickey.
PROPOSTA DE ATIVIDADES
As propostas deste OAC são dirigidas principalmente para o trabalho com
turmas de 5ª série. No entanto, podem ser estendidas também para as outras séries
do Ensino Fundamental.
A principal atividade recomendada é a leitura por prazer, das histórias em
quadrinhos em sala de aula, oportunidade para mostrar às crianças os recursos
utilizados em sua criação, com relevância, no primeiro momento, para os elementos
visuais: disposição dos quadros, seqüenciação, expressões faciais e corporais dos
personagens, indicadores de movimento, balões, onomatopéias. No segundo
momento, trabalhar-se com os recursos da linguagem, vocabulário, elementos que
garantem coesão lingüística de uma cena para outra, narratividade, falas do
narrador e dos personagens, elementos de oralidade.
A segunda atividade indicada é a interpretação da história a partir da análise do
conjunto formado pelos textos verbal e não-verbal. As contribuições da Semiótica
são importantes no momento de mostrar ao aluno as “pistas” que levam à
compreensão do que o texto diz, quem diz, porque, para quem e como diz. Somente
assim se poderá chegar ao sentido completo dos enunciados da história. Tome-se
como exemplo, a história “O bicho-preguiça adivinho”, publicada na revista Tio
Patinhas nº. 487, pela Editora Abril, em 2006. A história narra um episódio em que
Tio Patinhas, ao saber que foi descoberto uma espécie de bicho-preguiça que prevê
acontecimentos, reúne seus sobrinhos e parte em busca do animal, na esperança de
que, possuindo-o, saberá com antecedência os movimentos da bolsa de valores e
poderá ganhar mais dinheiro. É possível analisar com os alunos, nas expressões
faciais dos personagens, a intransigência do Tio Patinhas e o espanto seguido de
revolta dos sobrinhos, ao saberem que o tio não quer abrir mão do animal, e,quando
os sobrinhos lhe pedem que o deixe na selva, o Tio responde “Vocês têm que ser
mais duros! O dinheiro sempre vem primeiro! Não posso deixar uma fortuna dessas
para trás!” No texto, encontra-se uma oposição semântica fundamental que sustenta
uma das principais características do personagem e do capitalismo: ganância x
desapego na preservação das espécies naturais. Há algumas décadas, mais
modernamente, o personagem tem sido mostrado como um homem de negócios
aventureiro e ousado, sempre em busca de novos objetivos a alcançar, novos
desafios a enfrentar. Seu lema é “Sempre há um novo arco-íris”. Ao saber que o
bicho-preguiça adivinho foi encontrado na América do Sul, ele não hesita em partir
em busca da raridade, e arrasta consigo os sobrinhos. Pode-se analisar a força de
comando desse personagem, a resistência do Pato Donald e como os sobrinhos do
Donald, Huguinho, Zezinho e Luisinho se parecem com o Tio-avô, Patinhas, não
hesitando nem diante do perigo. Há aqui a defesa de uma idéia de que para se dar
bem, é preciso não temer o desconhecido, estar sempre disposto a vencer qualquer
desafio. Originalmente, segundo concepção de seu criador, Carl Barcks, Patinhas
possuía senso de ética muito próxima à da época em que construiu sua fortuna, ou
seja, vale quase tudo para ganhar dinheiro, exceto ser desonesto ( mesmo que seu
conceito de honestidade seja bastante relativizado). Essa é uma filosofia que
defende o capitalismo, onde aqueles que têm “garra” incansável conseguem vencer
na vida, contrária à filosofia Marxista, defensora da igualdade em todos os aspectos.
Barcks não acreditava que todos possam ser iguais. Esse modo de defender o
capitalismo sofre críticas, no mundo todo, por parte daqueles que vêem nas histórias
do Tio Patinhas uma forma de imposição das idéias imperialistas dos Estados
Unidos aos países pobres. Na seqüência de história, percebe-se a ética disfarçada
do Tio Patinhas, que solta o bicho-preguiça às escondidas, para não demonstrar
enfraquecimento perante os sobrinhos.
Outra atividade interessante é a leitura das cartas dos leitores presentes em todas
as revistas de histórias em quadrinhos. São cartas que os leitores das revistinhas,
principalmente crianças, enviam para a editora como se falassem com seus
personagens preferidos, e recebem respostas no número seguinte da revista. Além
da leitura e análise das cartas, os alunos podem escrever também as suas próprias.
A leitura na perspectiva da Semiótica, no caso das histórias do Tio Patinhas,
levará à reflexão e ao debate sobre o modo de vida no capitalismo, à crítica da
acumulação de riquezas e da má distribuição de renda, ou outros temas percebidos
na análise das figuras textuais.
Como complementação, pode se propor reescrita das histórias em outros
formatos narrativos, a dramatização, a criação de outras histórias em quadrinhos...
Para efeitos de avaliação, seria interessante observar a participação do aluno
na leitura, seus comentários, as relações que conseguem fazer com a realidade,
suas próprias produções escritas, orais ou desenhos.
IMAGEM
Fonte: Banco de Imagens
A leitura deve representar para a criança, antes de tudo, uma fonte de prazer, e,
somente depois, um meio para se atingir outros fins. Por esse motivo, as histórias
em quadrinhos devem ser vistas como importante instrumento para iniciar o aluno no
universo da leitura, a princípio pelo gosto ao lúdico e, aos poucos, pela percepção
das significações, implícitas ou explícitas, presentes na união do texto verbal com o
não-verbal.
As imagens, selecionadas do Banco de Imagens, ilustram os recursos visuais e
textuais passíveis de serem explorados na leitura de histórias em quadrinhos.
RECURSOS DE INFORMAÇÃO
Sugestões de Leitura
Teoria Semiótica do Texto.
Diana Luz Pessoa de Barros
Essa obra traz os principais conceitos relacionados à Semiótica, em uma
linguagem clara e acessível, com exemplos em textos literários e outros. É uma
leitura recomendável a todos os professores, não somente os de Língua Portuguesa.
BARROS , Diana Luz Pessoa de. Teoria Semiótica do Texto. São Paulo,
Ática, 1990.
Editorial do sítio Planeta Educação “Releitura de um Conto de Natal”
João Luís Almeida Machado
O autor do editorial, João Luís Almeida Machado, doutorando pela PUC-SP,
Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana
Mackenzie-SP, professor universitário e pesquisador, faz, nessa releitura da obra
Um conto de Natal, uma crítica social e política ao sobrepor o personagem central,
Scrooge, a políticos corruptos e maus empresários brasileiros que enriquecem
ilicitamente.
MACHADO , João Luís Almeida. Um Conto de Natal (Releitura). Editorial Rev.
Planeta Educação. Dez. 2005.
A Contribuição das Histórias em Quadrinhos na Formação de Leitores
Competentes.
Adriana Galvão Fogaça.
Neste artigo para a Revista PEC, de Curitiba, a professora Adriana Galvão
Fogaça, do Colégio Bom Jesus e pedagoga da Rede Municipal de Curitiba, trabalha
com a idéia de que o leitor de hoje deve ser capaz de encontrar os sentidos em
diversos gêneros de textos, para o que se faz necessário ultrapassar a simples
decodificação e extração de informações. A autora defende a tese de que as
histórias em quadrinhos são um ótimo material de leitura por aproximar-se do
universo da criança, seduzir sua imaginação e romper as barreiras que as afastam
dessa prática.
FOGAÇA , Adriana Galvão. A Contribuição das Histórias em Quadrinhos na
Formação de Leitores Competentes. Rev.PEC, Curitiba, v.3, n1, p.121-131, jul.
2002-jul. 2003.
Notícias :
Professor precisa ser alfabetizado em quadrinhos, diz especialista.
RAMOS, Paulo. Blog dos Quadrinhos UOL.
No texto do blog, Paulo Ramos comenta as opiniões de Waldomiro Vergueiro,
professor da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo. O
renomado professor afirma, em entrevistas e palestras, que os professores da
Educação Básica estariam despreparados para explorar os quadrinhos em sala de
aula, seja por falta de interesse,seja por não estarem familiarizados com a
linguagem desse tipo de material. Paulo Ramos comprova essa idéia, citando
resultados ruins de exames nacionais que utilizaram quadrinhos para interpretação,
e chama a atenção para a necessidade de que os professores preparem-se para
ensinar aos alunos esse tipo de leitura.
Professor precisa ser alfabetizado em quadrinhos, d iz especialista.
RAMOS, Paulo. Blog dos Quadrinhos UOL. 02/11/2007. (texto integral, com mesma formatação do original)
Só comprar histórias em quadrinhos e distribuir nas escolas do ensino fundamental, como faz o governo federal, não significa que a obra seja bem utilizada na sala de aula.
A opinião é de Waldomiro Vergueiro, professor da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo e coordenador do Núcleo de Pesquisas de Histórias em Quadrinhos da USP.
"Chegar à escola e colocar na estante não é suficiente, mas é alguma coisa", diz.
"É preciso que os professores tenham seu projeto pessoal de aplicação dos quadrinhos."
No entender dele, os responsáveis pelo ensino precisam ser instruídos sobre a linguagem dos quadrinhos para, a partir daí, pensar as práticas pedagógicas.
"Eu diria que boa parte dos professores ainda não pensou seriamente a respeito", diz.
"Eles precisam se informar sobre as histórias em quadrinhos."
Esse "informar" é o que o pesquisador tem chamado de "alfabetização em quadrinhos".
O assunto foi pontuado por ele em "Como Usar as Histórias em Quadrinhos na Sala de Aula", livro organizado por ele e por Ângela Rama (e do qual sou um dos co-autores). A primeira edição da obra foi lançada em 2004.
A falta de familiaridade com o tema pode resultar em práticas que usem os quadrinhos apenas de forma superficial.
Um exemplo disso foi visto no mês passado num colégio da cidade de São Paulo.
O professor do terceiro ano do ensino fundamental usou uma história curta de Suriá, personagem infantil desenhada por Laerte. A narrativa foi extraída de "Folha de S.Paulo" de 28 de setembro de 2002.
Havia dois balões na história, um no primeiro quadrinho e outro no terceiro.
A professora pediu aos alunos como lição de casa que reescrevessem "as falas dos balões usando travessões". E só.
A deficiência docente ecoa no processo de leitura dos alunos, em especial com textos que envolvem imagens, como os quadrinhos.
Pesquisa divulgada pelo jornal "Folha de S.Paulo" há um mês mostrava que alunos paulistas dos ensinos fundamental e médio apresentavam nível de leitura aquém da série que cursavam.
Os dados, baseados no Saeb (exame federal de averiguação de aprendizagem), indicavam, por exemplo, que 43,1% dos estudantes do terceiro ano do ensino médio demonstravam processo de leitura semelhante ao esperado dos alunos do oitavo ano do fundamental.
De cada dez estudantes do colegial, quatro não conseguiam entender o humor de uma tira cômica.
A inclusão dos quadrinhos na escola foi oficializada no PCN (Parâmetro Curricular Nacional), elaborado pela administração do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
O parâmetro sugeria conteúdos a serem usados pelos professores em sala de aula.
Os quadrinhos são citados especificamente nas disciplinas de artes e língua portuguesa.
Depois disso, tiras e charges têm sido tema de questões do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) desde a criação da prova.
No Enem deste ano, o exame usou uma charge de Angeli e uma tira de "Níquel Náusea", de Fernando Gonsales.
Na administração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os quadrinhos têm sido vistos como forma de estímulo à leitura.
O raciocínio do governo é que os quadrinhos podem ser uma forma de os alunos ingressarem no mundo da leitura.
É por isso que os quadrinhos passaram a integrar a lista do PNBE (Programa Nacional Biblioteca na Escola), que distribui livros às escolas do ensino fundamental.
O PNBE incluiu quadrinhos pela primeira vez na lista de 2006. O material foi distribuído neste ano.
Na mais recente lista, referente às obras para 2008, figuram oito títulos em quadrinhos.
Leia os selecionados na postagem abaixo.
Quadrinhos incluídos na lista do PNBE/2008
• A Turma do Xaxado - Volume 2 (Cedraz) • Courtney Crumrin & As Criaturas da Noite (Devir) • Hans Staden (Conrad) • Mitos Gregos - O Vôo de Ícaro e Outras Lendas (Clássicos em Quadrinhos /Ática) • Os Lusíadas em Quadrinhos (Peirópolis) • Pequeno Vampiro Vai à Escola (Jorge Zahar) • Rei Artur e os Cavaleiros da Távola Redonda (Clássicos em Quadrinhos/Ática) • 25 Anos do Menino Maluquinho (Globo)
Tio Patinhas e a Nova Economia
SARAMELLI, Alexandre. Hqmaniacs.com
Neste sítio, o economista e consultor de contabilidade Alexandre Saramelli
faz uma análise de histórias do Tio Patinhas e demonstra que uma simples história
em quadrinhos consegue aglutinar dezenas de informações a respeito das
transformações econômicas vivenciadas em todo o mundo nos últimos anos. Por
esse motivo, ele recomenda a leitura de quadrinhos, em especial, as do Tio
Patinhas.
Tio Patinhas e a Nova Economia
SARAMELLI, Alexandre. Hqmaniacs.com. 09/02/2006. (texto integral, com
mesma formatação do original)
As histórias em quadrinhos são excessivamente ligadas ao universo infantil
no Brasil. Nos últimos anos, com os mangás e com a introdução de novos títulos, as
editoras estão utilizando a tática de segmentar os títulos para fugir dessa ligação
histórica. Assim, temos as chamadas revistas adultas, as revistas para adolescentes
e as revistas infantis. Essa segmentação traz um efeito muito indesejado. As
pessoas ficam presas a um único universo e não conseguem comentar sobre esses
universos com as outras pessoas, o que é uma limitação.
Mas com as revistas Disney nós temos um fenômeno diferenciado: não são revistas
infantis, não são teens, não são adultas, e muito menos as pessoas da terceira
idade deixam de ler. A mensagem que elas passam é universal e simples. Um
entretenimento com conteúdo que traz criatividade e emoção a todo mundo,
independente da idade.
Apesar disso, raramente alguém comenta as histórias Disney, o que apenas ajuda a
manter essa imagem de que são "coisas para crianças". Neste artigo, para quebrar
esse estado de coisas, eu comento uma das melhores histórias do Tio Patinhas dos
últimos anos e que passa uma mensagem que não tem nada de infantil.
Em 2002, o italiano Giorgio Pezzin produziu “Tio Patinhas e a Nova Economia”
(Zio Paperone e la New Economy), publicada no Brasil na revista Tio Patinhas nº. 465
em abril de 2004, pela Editora Abril. Na Itália, a aventura foi publicada na edição
#2440 da revista Topolino, de setembro de 2002. A história começa com os tradicionais
milionários reunidos no "Clube dos Milionários" e apresentados a um novo sócio que
em poucas semanas conseguiu chegar ao terceiro lugar na classificação do clube. E
se nada fosse feito, iria alcançar o primeiro lugar ainda naquele ano!
Esse sócio não tinha o perfil tradicional de um milionário. Tratava-se de um
adolescente, um menino, que a todos assustou e surpreendeu. O motivo de tanto
sucesso era uma pequena empresa de comércio eletrônico que teve suas ações
hipervalorizadas em pouquíssimo tempo. Quando perguntado sobre o que era esse
tal de "comércio eletrônico", esse menino arrogantemente disse que não tinha tempo
para explicar.
Esse foi o ponto inicial de uma vibrante aventura do Tio Patinhas com o Patacôncio . Com
a ajuda de Huguinho, Zezinho e Luisinho , que conheciam alguma coisa de informática e
de patonet (sim, a internet de Patópolis é a patonet), Tio Patinhas entra no ramo do
comércio eletrônico. E é seguido de perto pelo Patacôncio, que oferece um serviço
ainda melhor, e com a vantagem de ser gratuito.
Logo, Tio Patinhas se vê na necessidade de procurar por especialistas para
encontrar melhores alternativas para os seus negócios. E vê que precisa lançar mão
de novos profissionais, pessoas que entendam das novas tecnologias. Um desses
novos profissionais foi “João Kilobyte", um sujeito muito maluco que trabalhava on-line
dentro de um carro, um rapaz ultra-ocupado prestando serviços por um alto valor e
atendendo diversos clientes ao mesmo tempo.
E esse profissional aconselhou que Tio Patinhas lançasse novos e originais
serviços, mas com a necessidade de serem novos, surpreendentes. Patinhas então
procura diversos pequenos empreendedores e obtém um sucesso muito grande.
Mas Patacôncio, atento ao que estava acontecendo, procurou tecnologias ainda
mais surpreendentes de patonet móvel, que superaram as empresas do Tio
Patinhas.
Em pouco tempo, as ações das empresas de tecnologia do Tio Patinhas estavam
nas alturas, mas as suas empresas da "velha economia" estavam perdendo valor.
Como o próprio Tio Patinhas disse, “o que eu ganho de um lado perco do outro".
Patacôncio teve a mesma percepção, e vendeu antes as suas empresas da "velha
economia”, transformando as ações do Patinhas em papel velho.
Exausto com os acontecimentos, Tio Patinhas se recolhe e toma uma das decisões
mais surpreendentes dos últimos anos. Lança um programa de televisão, "O Grande
Fardo" onde mostra ao vivo na televisão e na patonet a sua vida. Um programa ao
estilo Big Brother. Nesse programa, demonstra os prazeres que os produtos
produzidos pelas suas empresas da "velha economia" podem proporcionar para as
pessoas que os compram.
As pessoas, que já estavam esgotadas com tantas novidades do mundo frio e sem
emoções que se criou na patonet, se empolgaram com a novidade e voltaram a
consumir produtos da "velha economia", o que trouxe enormes prejuízos ao
Patacôncio.
Ao final da história Tio Patinhas diz que aprendeu com essa situação que deve usar
sim a patonet, mas não como um fim, mas como uma ferramenta. Nas suas
palavras: "A Patonet é uma ferramenta como um martelo ou uma furadeira!
Podemos usá-la pra construir coisas ótimas, mas não serve pra nada, se não tiver
por trás a mente e o trabalho de quem a usa!”
O que essa história tem a ver com a nossa vida real? O famoso incidente do “Estouro
da Bolha” é um dos grandes fatos na história da economia mundial, comparável ao
crack da bolsa de valores de 1929. Esse incidente deixou as suas marcas e
principalmente os seus ensinamentos. Numa situação muito parecida com uma
corrida ao ouro, os homens de negócios, em nome de uma rapidez nas operações
para aproveitar o momento, esqueceram fundamentos básicos do mundo dos
negócios e se lançaram a situações inaceitáveis:
- Bancos começaram a aceitar orçamentos de empresas que já eram planejadas
intencionalmente desde o início para não dar lucro.
- Planejaram operações até possíveis, mas muito complexas até para a tecnologia
atual, como a possibilidade de um revendedor não manter estoques, apenas
intermediar operações de vendas, entregando pedidos aos produtores antes dos
produtos serem produzidos, e serem entregues individualmente pelo próprio
produtor ao consumidor.
- Disseram que pessoas com menor idade e menos experiência só porque sabiam
apertar alguns botões a mais, igualavam-se com pessoas que tinham maior
experiência profissional.
- Diversos especialistas produziram artigos onde acreditavam realmente que se
tratava de uma “nova economia”, e ingenuamente procuravam ouro em terrenos
imaginários em um ambiente sem limites.
- Os novos negócios, principalmente “as empresas.com”, esqueceram dos controles
tradicionais, que qualquer empresa deve manter, e passaram a gastar
desenfreadamente para atrair consumidores.
- Disseram que qualquer empresa poderia vender às pessoas de todo o mundo, mas
esqueceram que os produtos precisam ser transportados em navios ou aviões reais,
e que as aduanas de qualquer país cobram impostos.
- Esqueceram que as pessoas têm emoções, necessidades, cultura, e que são elas
que formam essa coisa complexa que chamamos de “economia”.
Esse fenônemo foi muito complexo. Assim como o “Crack da bolsa de Nova York”, em
1929, que ainda hoje é lembrado, o Estouro da Bolha será lembrado por muito
tempo.
No meio de tudo isso, vemos na obra de Giorgio Pezzin, uma história que comenta
esse fenômeno de uma maneira muito simples, descontraída e extremamente lúcida,
o que chama a atenção. O autor, além de escritor, é um engenheiro e especialista
em internet, por isso, ele conseguiu produzir um roteiro tão correto e criativo ao
mesmo tempo. O que particularmente me surpreendeu em sua história, é a exatidão
com que os fatos vão sendo apresentados ao leitor, e o relacionamento que ele
propõe com a retomada da nova economia através do fenômeno dos programas de
observação "Big Brothers”.
Essa história, intencionalmente ou não, também traz uma lição de atendimento ao
consumidor. Um desenho que chama muito a atenção é o Tio Patinhas ao entrar em
sua loja de queijos, ser recepcionado com um belo e generoso pedaço de queijo
como amostra. Simplesmente, delicioso! É realmente maravilhoso você entrar numa
loja, ser bem recepcionado e tratado com todo o carinho. Uma visita a uma loja com
esse serviço é muito melhor que uma visita a um site, onde apenas pode-se ver uma
foto com o preço embaixo. As pessoas têm emoções, e o ato de comercializar
produtos é uma arte que não pode deixar as emoções humanas de lado.
Mas esse assunto, o estouro da bolha, é um assunto do mundo infantil? Não seria
uma trama extremamente sofisticada para essa faixa de idade? Para responder a
essas perguntas temos que lembrar que algumas obras de Carl Barcks , o criador da
Família Pato, também tratavam de assuntos sofisticados do mundo dos negócios e
da economia de uma maneira muito criativa.
Então a mensagem que essas histórias passam é muito maior do que a nossa
percepção de “coisa de criança”. Sem medo de incorrer em erro, eu classifico as
histórias como adultas, universais, que permitem que as crianças também possam
ler e se divertir, tanto quanto um adulto.
Quanto a isso, a diretora de redação da Disney Itália, Claretta Muci, diz que a intenção
é justamente a de fazer uma ponte entre o mundo infantil e o mundo dos adultos,
para que essa ponte possa trazer bons frutos no futuro. Meu colega italiano, Roberto
Grimaldi , que também escreveu um artigo sobre a história, disse que iria manter
sempre atualizada a
sua assinatura de “Topolino”, já avisando a seu jornaleiro para lhe ligar imediatamente
após a revista chegar na banca.
Eu não posso deixar de ler Tio Patinhas! E você?
Destaque:
Importância dos Quadrinhos na Educação
NALIATO, Samir. Artigo do sítio Universo HQ. 17/06/2003.
Merece destaque neste trabalho a pesquisa feita pela Universidade de
Brasília chamada Retrato da Escola, cujos resultados foram divulgados em 2001,
que teve por objetivo analisar fatores que afetam a qualidade de ensino.
A pesquisa mostrou que os alunos leitores de quadrinhos têm melhor
desempenho escolar do que aqueles que usam apenas o livro didático, e, em alguns
casos, até melhor do que aqueles que têm contato com livros e revistas. Com isso
ficou comprovado que os quadrinhos colaboram com o desenvolvimento intelectual
dos alunos.
Paraná :
Gibiteca de Curitiba Comemora 25 anos com extensa programação
Guimarães , Lucília. Gazeta do Povo on-line, 07/10/2007.
A primeira biblioteca brasileira especializada em quadrinhos, foi a Gibiteca de
Curitiba, que completou 25 anos de existência em outubro de 2007. Possui 25 mil
títulos de revistas em quadrinhos, porém não é apenas um centro de leitura, mas um
espaço cultural que reúne ilustradores, designers, artistas plásticos, pesquisadores,
professores, estudantes e leitores. Lá são oferecidos cursos, oficinas de criação,
exposições, palestras e lançamentos. Durante todo o mês de outubro houve intensa
programação de eventos em comemoração ao aniversário da gibiteca.
INVESTIGAÇÃO DISCIPLINAR
Os Quadrinhos e a Realidade Social
Com o objetivo de aprofundar o conteúdo tratado neste trabalho, sugere-se
que o professor, ao discutir com as crianças determinada história em quadrinhos, ou
personagem, ou tema da história, procure estabelecer relações entre o que se está
lendo e a realidade local ou a fatos acontecidos no país ou a conteúdos veiculados
na mídia e que torne mais fácil para o aluno compreender a atividade.
No caso da leitura das histórias do Tio Patinhas, é possível estabelecer um
paralelo entre esse personagem e o modo de vida no capitalismo, não apenas para
fazer a crítica social, que será muito oportuna, mas também para mostrar a
importância de se lutar e trabalhar para alcançar objetivos de vida, profissional ou
financeiramente, que, afinal, é a base do desenvolvimento na sociedade em que
vivemos.
Perspectiva Interdisciplinar
Quadrinhos: Uma Leitura Interdisciplinar
A proposta de trabalho com histórias em quadrinhos abre inúmeras
possibilidades de diálogo com outras áreas do conhecimento. É possível organizar
atividades relacionadas à disciplina de Arte, a partir da leitura de imagens, dos
planos, caracterização, cenários; da produção de imagens para compor histórias,
criação de balões, estudo de cores.
Propõe-se, ainda, no caso das histórias do Tio Patinhas, relacionar o
conteúdo à disciplina de História, por meio de pesquisa sobre o período
correspondente ao início do capitalismo, marcado pela Revolução Industrial e todas
as conseqüências positivas e negativas da urbanização que se iniciou no século XIX
na Europa, e que no Brasil, são relevantes ainda hoje. Essa temática histórica será
enriquecida com a leitura da obra do escritor inglês Charles Dickens, Um Conto de
Natal, onde se tem o exemplo de como se organizava desigualmente a sociedade na
época ambientada. O conhecimento literário será complementado com o filme, ou se
for mais adequado às crianças, com o desenho animado Um Conto de Natal do
Mickey, em que o personagem Scrooge é representado pelo seu correspondente
nos quadrinhos, o próprio Tio Patinhas.
Contextualização
Histórias em Quadrinhos no Contexto Escolar
A leitura de histórias em quadrinhos está prevista tanto nos Parâmetros
Curriculares Nacionais quanto nas Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná para
a Educação Básica. Ela oferece uma das melhores ferramentas que se tem
disponível para desenvolver o gosto pela leitura em crianças que, em sua maioria,
provêm de grupos sociais pouco letrados, não tendo recebido estímulos de leitura e
escrita desde muito pequenos, como seria ideal, muitas vezes tendo estado à
margem dessas atividades na Educação Infantil e nos primeiros anos da
alfabetização.
Embutidos no casamento perfeito e lúdico, dos signos verbal e não-verbal que
constituem os quadrinhos, estão presentes elementos que podem remeter a
conhecimentos relevantes de diversas áreas, da ciência à filosofia, bastando que o
professor seja o intermediador, ajudando o pequeno leitor a descobrir os sentidos
desses conhecimentos, primeiramente por proporcionar o acesso a eles e depois por
oportunizar discussões e atividades que levem à compreensão da realidade.
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