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Olá a todos!Aqui está a tradução do terceiro diário de Ulysses Moore.O que descobri é incrível, mas não me quero adiantar demais...Antes que comecem a lê-lo, tenho mesmo de vos contar o queme aconteceu na semana passada.

Descobri que em Ermington, uma aldeia que não fica muito longedo meu Bed and Breakfast, há uma livraria especializada emturismo. Fui lá com a intenção de encontrar mais algumainformação sobre Kilmore Cove.Folheei livros, mapas grandes e pequenos, planos dos caminhosda costa, lendas e histórias da Cornualha, mas não descobri nada.Desesperado, pedi ajuda à empregada. Passámos a tarde a abrire a fechar os livros mais poeirentos da loja, guardados naquelasestantes sabe-se lá há quantos anos, mas... nada.

Andei à procura de um café com esplanada para acalmar osnervos. Na praça central estavam bastantes pessoas, por isso, aprincípio, não reparei no senhor elegante que se sentara ao meulado. E agora, por mais que me esforce, não consigo visualizarmais do que um bigode e uma camisa branca de linho. Pedi umaágua com menta e, mais tarde, entrei no café para pagar.Quando voltei a sair encontrei na minha mesa o seguinte livro:

O VIAJANTE CURIOSOpequeno guia

de Kilmore Cove e arredores

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Abri o livrinho com as mãos a tremer de emoção. Na primeira página,numa caligrafia que agora reconheço perfeitamente, estava escrito:

BIBLIOTECA PRIVADA MOOREVivenda Argo, Kilmore Cove

Só então reparei que o homem que, havia pouco, estava sentadoao meu lado tinha desaparecido. E percebi que... podia ser opróprio Ulysses Moore! A meio metro de mim! E que, infelizmente,tinha fugido...

Mando uma fotografia do livro para que sejam, vocês também,testemunhas de que isto tudo está a acontecer realmente. Dentrodo livro também vinha uma fotografia da antiga estação ferroviáriade Kilmore Cove...O livro é a prova de que Kilmore Cove existe! E que fica perto daqui!Juro que, se for preciso, corro a Cornualha de uma ponta à outrapara a encontrar...

Mando-vos notícias brevemente,

Pierdomenico

«O Viajante Curioso»Pequeno guia de KilmoreCove e arredores

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– ULYSSES MOORE –

A CASA DOS ESPELHOS

terceiro caderno

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Capítulo 1

– PEQUENO-ALMOÇO –

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L ento e penetrante, difundiu-se pela casa ocheiro a bacon frito com ovos. Julia virou-sena cama, empertigando o nariz. Sorriu, ainda

meio adormecida, e enfiou a cara na almofada. Sus-teve a respiração, completamente imóvel, e, quandolhe começou a faltar o fôlego, abriu um olho e olhouà sua volta.

Onde estava?A memória voltou-lhe aos poucos, numa ordem

especial. Estava em Kilmore Cove, na Vivenda Argo,num quarto.

E como tinha chegado à Vivenda Argo?Enquanto observava os pormenores do quarto, o

seu coração começou a bater mais depressa.Bacon frito com ovos.No fundo da cama estava um monte de roupas que

tinham formado uma poça de água à sua volta. Eraa sua roupa.

Reconhecendo-a, outras imagens se precipitaramna sua mente: a tempestade, a chegada de Manfred, oprecipício e, por fim, o salto no vazio que engolira oescravo de Olívia Newton para o fundo do mar...

Julia saltou da cama como uma mola.— Jason! — gritou.Sentiu debaixo dos pés a moleza confortável de um

tapete. Reparou que usava um pijama que não se lem-

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brava de ter vestido. Baixou-se para apanhar a roupa eesvaziou os bolsos das calças, constatando que as quatrochaves da Porta do Tempo ainda ali estavam, intactas.

Pegou nelas e pousou-as em cima da cama, ten-tando perceber que horas poderiam ser.

Bacon frito com ovos.Pelas persianas passavam raios de luz intensa.

Manhã. Ou tarde?Incapaz de dominar o seu nervosismo, Julia saiu do

quarto vestida tal como estava.— Jason? — perguntou ela ao corredor deserto.O andar da casa ainda estava completamente es-

curo, a não ser um dos quartos, onde as persianastinham sido abertas. Julia aproximou-se da porta naponta dos pés descalços e enfiou-se no quarto. Viua cama por fazer, uns pares de ténis no chão, cadaqual para seu lado, e um monte de camisolas enrodi-lhadas em cima de uma mesinha redonda.

Podia ter reconhecido aquela desordem de olhosfechados: era do Jason.

O seu coração bateu mais depressa quando, pela ja-nela aberta, Julia ouviu a voz do irmão vinda da cozinha.

— Siiim! — exultou a rapariga, louca de alegria.— O meu irmão voltou!

Virou-se, atravessou o corredor a correr, atirou-sepelas escadas abaixo e catapultou-se até à cozinha.

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Jason e Rick estavam à volta do fogão.— Jason! Rick! — exclamou Julia, saltando contra

eles e abraçando-os. — Voltaram! Voltaram! Estavatão preocupada com vocês...

— Então, maninha! — disse Jason com um sorriso,afastando-se. — É claro que voltámos... Calma, estátudo bem!

Quanto a Rick, retribuiu-lhe o abraço com muitoprazer e ainda ganhou um beijinho na bochecha. Malcruzou o olhar de Julia, as pernas tremeram-lhe deemoção.Virou-se de repente, para ela não reparar queestava a corar.

Julia olhou para os dois como se tivessem desapa-recido havia vinte anos ou como se, pela roupa deles,pudesse perceber tudo o que acontecera por trás daPorta do Tempo. Mas não conseguiu obter grandeinformação: Rick estava vestido como no dia anterior,e Jason tinha tirado da mala uma camisola e um parde calças lavados que não condiziam minimamenteuma com o outro.

— Como é que estão? — perguntou ela depoisdaquela primeira fase de reconhecimento.

— Estamos chateadíssimos! — respondeu Jason.— Porquê?— Não conseguimos perceber durante quanto

tempo deve cozer o bacon. A princípio está cru. E um

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segundo depois está carbonizado! — explicou Rick,usando uma colher de pau para verificar a consis-tência do toucinho queimado. — Eu vou tentar comê--lo assim mesmo.

A rapariga não conseguia desviar os olhos, comose quisesse ter a certeza de que eram mesmo eles.Seguiu-os para fora da cozinha, sempre a rir-se, até aojardim, onde Rick dividiu o bacon e os ovos pelos três.Mas Julia deu a sua parte, de boa vontade, ao irmão:a ansiedade tirara-lhe o apetite. — Pode saber-se oque vos aconteceu por trás daquela porta?

Jason encolheu os ombros. Sentou-se na cadeira deferro do jardim e provou o toucinho. — Uma bomba,Rick! Uma autêntica bomba, a sério. — Quando re-parou na boca vibrante da irmã, respondeu-lhe, antesque ela explodisse de raiva: — Oh, Julia, demora tantoa contar que, se começar, arrefecem os ovos! — E co-meçou a comer avidamente sem dizer mais nada.

— Vimos um sítio incrível — disse Rick enquantomastigava, engolindo uma garfada e engasgando-se.

— Vais ver que encontramos a porcaria do mapa!— continuou Jason, enquanto o amigo saltitava à voltada mesa, a tossir. Limpou o prato com um pedaço depão do dia anterior, serviu-se de um copo de leite gi-gantesco e bebeu-o em quatro goladas. — Não é ver-dade, Rick?

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— Nem que seja preciso procurar na aldeia toda!— confirmou o amigo, muito vermelho e com o ca-belo todo despenteado.

Julia respirou fundo. O ar estava húmido e fresco.Achou melhor não insistir nas perguntas, de mo-

mento, deixando que as coisas acontecessem natural-mente. Estendeu o braço para se servir de um copode leite e reparou que tinha a mão a tremer.

— Está tudo bem? — perguntou Rick.Ela abanou a cabeça. — Está tudo bem, só estou

feliz por estar de novo com vocês.— Também nós — disse Rick. — Nem sabes até

que ponto. Foi uma loucura... Mas, vendo o estadodo jardim, acho que também diria que não ficaram demãos nos bolsos.

— Parece que passou por aqui um ciclone! — ex-clamou Jason.

Julia olhou à sua volta: as flores e as plantas se-culares ainda pareciam estar atordoadas pela chuvae despenteadas pelo vento. Havia um não sei quê dedesconsolado naquelas folhas e nos ramos caídos narelva e no caminho de pedra.

No meio do pátio ainda se viam as marcas do carrode Manfred.

Julia sentiu o coração a bater com força ao fixar aque-les pormenores e relembrou cada instante, um a um, a

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partir do momento em que empurrara Manfred e lheroubara a chave. Olhou para o alto do precipício, para oazul enganador do mar e para a silhueta do farol ao longe.

Fechou os olhos.— O que foi Julia? — perguntou Jason, reparando

que a irmã empalidecera de repente.— Eu não tive culpa: voou por ali... — murmurou ela.— Quem é que voou? — perguntou Jason com um

bigode de leite por baixo do nariz.

Julia contou tudo o que acontecera na VivendaArgo. Falava lentamente e sem qualquer inflexão devoz, como se estivesse a recitar uma lição. Contouas confissões de Nestor sobre o antigo proprietário e assuas viagens a bordo do Metis. E descreveu a tentativade Manfred entrar na casa e a maneira como ela e Nes-tor lhe tinham resistido, até ao final trágico.

— Tenho pena... — concluiu Julia, perguntando asi própria por que razão decidira atirar ao mar a chaveque Manfred queria à viva força.

— Não, é bem feito — comentou Jason, satisfeito.— Afinal, era um ladrão, igual à patroa — pros-

seguiu Rick, que acordara especialmente enervadocontra Olívia Newton, talvez por a ter achado, da pri-meira vez que a viu, absolutamente... espantosa.E ainda não conseguira aceitar tal coisa.

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Julia recompôs-se um pouco e conseguiu fi-nalmente servir-se de um grande copo de leite.E ficou à espera de ouvir a parte da história dosrapazes.

Interrompendo-se um ao outro, Jason e Rick con-taram-lhe sobre a Casa da Vida, sobre Maruk, e sobrecomo tinham descoberto o esconderijo dos QuatroPaus mesmo antes de Olívia o encontrar.

— A Olívia Newton estava lá? — perguntou Julia,estupefacta. — E... mas como é possível?

— Deixa lá. Nem podes imaginar a nossa surpresaquando a encontrámos lá, no Egipto... ou seja, lá ondeestávamos.

— Hoje de manhã, o Jason elaborou uma nova teo-ria — explicou Rick. — Não está completamente con-vencido de ter viajado no tempo.

— Pois — confirmou ele. — Um dia li uma bandadesenhada do doutor Mesomero que falava de umacoisa deste género: não se chama viagem no tempo,mas viagem no continuum do espaço... qualquer coisaassim... Agora não me lembro muito bem, mas sei queera no número quinze.

— E porque é que não podiam ter viajado notempo?

Jason fez uma careta, qual cientista a quem foi feitauma pergunta pouco precisa. — É só uma sensação,

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mas... não senti que estava numa época completa-mente diferente da nossa. Quase me sentia em casa...

— Ora, não exageres!— Imagina que não só falávamos a mesma língua

que as pessoas de lá, mas que eu e o Rick até líamosos hieróglifos.

Julia esbugalhou os olhos.Rick pegou no Dicionário das Línguas Esquecidas,

um grande livro já bastante maltratado, com a capasuja e páginas rasgadas. Abriu-o na página das línguasdo Egipto Antigo, passou o indicador da mão direitapor cima de uns hieróglifos e disse: — Enquanto agora,se tentarmos ler isto... não percebemos nada.

Julia tentou não perder o fio da história. — E a Olí-via? Reconheceu-vos? — perguntou a Jason.

— Não. Estávamos escondidos. Mas foi nessa al-tura que falou de Ulysses Moore...

— E do mapa.— Que mapa?— O mapa que nos roubou.— Que mapa? — insistiu Julia.— Primeiro e único mapa da aldeia da Cornualha

chamada Kilmore Cove — recitou Rick de memória.— De Thos Bowen. Londres, mil...

Foi interrompido por um espirro violentíssimo,que vinha directamente da falésia.

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— Ah, então sempre acordaram! — exclamou Nes-tor aparecendo nas escadinhas e parando para re-cuperar o fôlego.

— Nestor! — cumprimentaram-no os rapazes.— De onde vens?

O jardineiro caminhou a manquejar até onde elesestavam, sem responder. — E vocês, donde vêm?Nem sequer oferecem uma cadeira a um pobre...AAAATCHIIIIM!... velhinho?

— Apanhaste uma bela constipação — disseJason.

— A culpa foi da chuva — murmurou Nestor, olhan-do para Julia com um olhar carregado de subenten-didos. — Como é que está isso?

— Estavam a contar-me da Olívia Newton e domapa.

Os olhos de Nestor toldaram-se de repente. — Ah,pois. O roubo — disse ele sentando-se à mesa.

Jason e Rick prosseguiram a história, descrevendominuciosamente a Sala que não existe e o altar porbaixo do qual estava escondido o mapa.

— Se visses as cobras, Julia!— Desmaiavas logo!À medida que iam contando, Nestor parecia cada

vez mais assombrado.

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— Já devia ter imaginado — comentou. — Aquelamulher é muito mais perigosa e inteligente do quepensávamos.

— Mas porque é que o mapa é assim tão impor-tante, Nestor?

— Não faço a mínima ideia — resmungou o jar-dineiro.

— Mas o antigo proprietário deve fazer — respon-deu Jason. — Se nos mandou até lá para o irmos bus-car, por algum motivo foi. E estou convencido de queele tinha a certeza de que o encontrávamos antesde Olívia Newton.

— Em teoria, encontrámo-lo antes dela — insistiuRick. — O problema foi que ela no-lo roubou imedia-tamente.

Jason suspirou. — Que desilusão! Quem sabe seteremos outra possibilidade...

— O que é que isso quer dizer? — perguntouJulia.

Jason debruçou-se por cima da mesa do pequeno--almoço e murmurou: —Talvez o proprietário já nãoconfie em nós.

— Como é que tens a certeza de que ele ainda estávivo?

— Há duas possibilidades: ou ainda vive na Vi-venda Argo, num quarto secreto... ou então deixou-

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-nos indícios para o encontrarmos, indícios que semo mapa vão ser muito difíceis de seguir...

— E como é que vamos saber? — perguntou Julia.Os três jovens viraram-se para Nestor, que tentou

imediatamente evitar as perguntas.— Bem, eu vou andando, tenho de tratar do jardim.— Não te atrevas a sair daqui! — gritou Jason.— Ai não? E quem é que me impede?Nestor levantou-se com firmeza, segurando as cos-

tas doridas e respirando ruidosamente para oxigenaros pulmões.

— Precisamos da tua ajuda! — suplicou Jason. — Eleainda está aqui, não está?

Nestor riu-se. — Rapaz, andas a ler histórias de-mais. O antigo proprietário... — Voltou a espirrar.

— Jura. Jura que já não vive cá.O jardineiro pôs as mãos nas ancas, dobrando as

costas para trás. Tinha um aspecto ainda mais can-sado do que na véspera: tinha os olhos pequenose brilhantes, olhos de quem tem febre.

— Jason, ouve... — interrompeu Julia. — Não meparece que seja o momento ideal para...

— Por acaso acho que é — interrompeu-a o irmão.— Temos de descobrir alguma coisa, pelo menos umaverdade, e é se queremos perceber o que está a acon-tecer! Há demasiadas coisas que não sabemos! Mis-

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térios a mais sobre esta casa, sobre o proprietário,sobre os seus amigos e sobre os seus inimigos! Nós,por exemplo, o que é que somos? Amigos ou inimigosdo inacessível Ulysses Moore?

Nestor olhou para a casinha no meio do jardim e,a seguir, para os jovens. Jason tinha razão: estavama andar às cegas no meio de muitas dúvidas. Entãomurmurou: — Se isso te servir para alguma coisa,rapaz, então... posso jurar que já nenhum Mooremora na Vivenda Argo. Satisfeito?

Dito isto, afastou-se com a perna manca a arrastar,assoando o nariz com um grande lenço de algodãogrosseiro.

— Em teoria — insistiu Rick alguns segundos de-pois —, não nos disse que estava morto.

Um quarto de hora mais tarde, os jovens levaramos pratos e os copos para a cozinha e despacharam-separa organizar o programa do dia.

Rick aproximara-se das escadas da falésia e con-templava o mar, aproveitando a brisa ligeira que lheacariciava o cabelo. Julia tinha voltado para o quartoe enfiara um par de calças de ganga, levando com elaas quatro chaves com a cabeça em forma de animal.Quando voltou para baixo, encontrou Jason na ca-deira onde o deixara, ocupado a escrever.

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— Não sei por onde começar — explicou.— Sabemos onde vive Olívia Newton? — pergun-

tou Julia em voz alta, ao ler a folha que o irmão se-gurava.

— Estão a voltar dois barcos de pescadores — anun-ciou Rick ao chegar junto deles. — Podíamos desceraté ao portão e comprar camarões para o almoço.

Só de pensar na subida de Salton Cliff com as duasbicicletas pesadíssimas do casal Moore, Jason abanoua cabeça. — Agora não, por favor. Sabes onde moraOlívia Newton?

— Não, porquê?Jason mostrou-lhe o que escrevera.

1. encontrar o mapa de Olívia2. descobrir o que tem esse mapa de tão interessante

(antes mesmo de o encontrar)3. descobrir TUDO sobre a Porta do Tempo4. explorar a Vivenda Argo TODA, de cima a baixo

— Nunca te vi tão organizado — comentou a irmã.— A viagem ao Egipto transformou-te.

Rick arrastou a cadeira e sentou-se perto deles.— Quanto tempo temos para fazer isso?

— Só o dia de hoje.— E porquê?

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— Porque logo à noite chegam os nossos pais.E o Rick terá de voltar para casa dele.

O rapaz de Kilmore Cove entristeceu de repente,como se nunca tivesse considerado a possibilidade deabandonar a Vivenda Argo.

— Ainda falta uma coisa — murmurou Julia obser-vando a lista dos afazeres.

Jason levantou os olhos para o céu, exasperado.— Pronto, lá está, chegou a minha irmã! Vamos lásaber o que é que falta?!

— Não sabemos o que aconteceu a... — Julia limi-tou-se a indicar as escadas, esperando que os rapazespercebessem.

Rick assentiu com a cabeça e teve o tacto de nãodizer nada enquanto Jason acrescentava à lista:

5. Procurar o CADÁVER de Manfred.

— Muito gentil... — resmungou a irmã.Nesse momento ouviram um ataque de tosse. Nestor

chegou ao pé deles puxando um ancinho vermelho como qual apagou os vestígios dos pneus deixados no saibro.

— Eu não vi nada lá em baixo na praia — murmu-rou o jardineiro, respondendo à pergunta dos rapazes.— Nos rochedos não está. Já vos disse, pessoas comoele têm sete vidas. — E espirrou.

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— E acrescenta aí: Comprar um xarope para o Nestor— disse Julia em voz alta.

— Hoje é domingo — lembrou-lhe Rick. — A far-mácia do doutor Bowen está fechada.

— Não quero xarope nenhum — resmungou Nes-tor. — Isto não passa de uma simples constipação...

— Nunca se deve subestimar uma constipação —declarou Julia. — E ainda menos com a tua idade.

— O que é que estavas a dizer? — perguntou Jasona Rick.

— Que é domingo — repetiu ele —, e que...— Doutor Bowen? Disseste doutor Bowen? Não

é o mesmo nome de quem desenhou o mapa de Olí-via?

— Se cheguei a esta idade — interrompeu Nestor,respondendo a Julia —, é porque nunca tomei me-dicamentos na minha vida. E não penso começaragora.

— Primeiro e único mapa daquela aldeia da Cornua-lha chamada Kilmore Cove. Será possível?! — repetiuRick, admirado.

— Volto a lembrar-te que sabemos que nesta his-tória não existem coincidências... — disse Jason.

— Rapazes! — interrompeu Julia. — Porque é quevocês também não dizem ao Nestor que...

Rick e Jason saltaram das cadeiras, eufóricos.

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— Thos Bowen podia ser o avô do doutor Bowen.— Ou o bisavô.— Ou o trisavô! Onde mora? Onde estão as bici-

cletas?— Que horas são? Talvez pudéssemos ir lá antes do

almoço...— Rapazes! — chamou-os à ordem Julia, obri-

gando-os a ouvir o que tinha para dizer.— O que foi?— Telefone — disse Nestor, apontando para den-

tro da Vivenda Argo. — Está a tocar!

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