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Disciplina: Bases Neurológicas da Aprendizagem e Neuropsicopedagogia
Autores: M.e Jefferson Souza Santos
Revisão de Conteúdos: Carolinne Prado Engelhardt
Revisão Ortográfica: Jacqueline Morissugui Cardoso
Ano: 2017
Copyright © - É expressamente proibida a reprodução do conteúdo deste material integral ou de suas páginas em qualquer meio de comunicação sem autorização escrita da equipe da Assessoria de Marketing da Faculdade São Braz (FSB). O não cumprimento destas solicitações poderá acarretar em cobrança de direitos autorais.
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Jefferson Souza Santos
Bases Neurológicas da Aprendizagem e
Neuropsicopedagogia 1ª Edição
2017
Curitiba, PR
Editora São Braz
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FICHA CATALOGRÁFICA
SANTOS, Jefferson Souza. Bases Neurológicas da Aprendizagem e Neuropsicopedagogia/ Jefferson Souza Santos – Curitiba, 2017. 54 p.
Revisão de Conteúdos: Carolinne Prado Engelhardt.
Revisão Ortográfica: Jacqueline Morissugui Cardoso.
Material didático da disciplina de Bases Neurológicas da Aprendizagem e Neuropsicopedagogia – Faculdade São Braz (FSB), 2017.
ISBN: 978-85-94439-51-2
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Apresentação da Disciplina
Na disciplina de Bases Neurológicas da aprendizagem e
neuropsicopedagogia serão feitas abordagens relacionadas as atividades
neurológicas, desde o ponto de vista do desenvolvimento do ser
humano, indo em direção às implicações educacionais decorrentes.
Aspectos de anatomia, fisiologia e, especialmente, de funcionamento da
atividade nervosa serão abordados aqui, além das bases neuropsicológicas de
percepção, movimentação, atenção, memória, fala e pensamento como formas
eminentemente humanas de organização, processamento e desenvolvimento
mental. E por fim, serão abordadas as bases neurobiológicas do fenômeno da
atenção e como sua compreensão pode contribuir para o aprimoramento do
ensino e da aprendizagem.
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AULA 1 – DESENVOLVIMENTO CEREBRAL E NEUROPLASTICIDADE
Apresentação da Aula 01
Nesta aula você terá a oportunidade de ir mais a fundo nos
conhecimentos relacionados ao sistema nervoso, seu desenvolvimento e seus
mecanismos básicos de plasticidade nervosa. Esse último caracteriza um
fenômeno bem interessante quando refere-se ao momento da aquisição de
informações e o aprendizado de crianças e adolescentes na escola.
1 DESENVOLVIMENTO CEREBRAL E NEUROPLASTICIDADE
Para entender os mecanismos neurais da aprendizagem e sua aplicação
no meio educacional torna-se importante estudar o desenvolvimento cerebral e
a plasticidade das conexões neurais no cérebro humano. O comportamento
humano é gerado a partir da maneira que as informações são recebidas e
interpretadas no cérebro, considerando a existência das diferenças individuais
que caracterizam a diversidade de comportamentos encontrados na população.
Portanto, o professor deve estar engajado em entender como acontece a
expressão dos comportamentos a nível de sistema nervoso central, e como
direcionar esses comportamentos com a finalidade de aprimorar a
aprendizagem de seus alunos, ferramenta essa de estudo da
neuropsicopedagogia.
1.1 Revisando o Sistema Nervoso
Todo corpo dos seres humanos é composto de células. Os músculos, o
intestino, ossos, pele e o cérebro possuem bilhões dessas unidades básicas.
Cada célula tem uma tarefa específica a desempenhar. As células que
constituem o sistema nervoso central (SNC) compõem o cérebro e a medula
espinhal que junto com o sistema endócrino (responsável pela secreção dos
hormônios) são responsáveis por controlar todo o funcionamento do
organismo. Os neurônios e as células gliais compõem basicamente o SNC.
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Saiba Mais
As células gliais garantem o suporte e nutrição aos neurônios. Ela atua como uma “cola” no momento do posicionamento e síntese de novas conexões neuronais. Ao contrário da maior parte das células nervosas, as células gliais reproduzem-se por toda a vida.
O Sistema Nervoso é dividido em Sistema Nervoso Central e Sistema
Nervoso Periférico:
Sistema Nervoso Central → Localizado dentro do esqueleto axial
(cavidade craniana e canal vertebral);
Sistema Nervoso Periférico → Se localiza fora desse esqueleto axial.
O desenvolvimento cerebral e a neuroplasticidade dependem do sistema
nervoso (neurônios e córtex cerebral).
1.2 Unidade Básica Funcional do SNC – Neurônio
Os neurônios estão presentes predominantemente no cérebro e na
medula espinhal (que compõem nosso sistema nervoso central) em um número
aproximado de 100 bilhões. Eles diferem da maioria das outras células do
organismo em dois pontos principais. No primeiro, pode-se destacar a
incapacidade de regeneração programada dos neurônios, o que não é visto
nas demais células do organismo. Quando se corta um dedo, por exemplo, o
processo de cicatrização acontece rapidamente, e por essa razão, as células
do corpo estão se renovando continuamente. Se por acaso ocorre alguma
lesão dos neurônios resultante de um AVC ou trauma craniano, sua
regeneração torna-se bastante comprometida. O segundo ponto diferencial do
neurônio está na sua habilidade de transmitir informações. Os neurônios se
comunicam por sinais elétricos e químicos, e isso caracteriza a distinta
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anatomia que é notada quando os comparamos com outras células do nosso
corpo.
Importante
O neurônio difere das maioria das células do corpo:
Incapacidade de regeneração programada;
Transmissão de informações por meio de sinais elétricos ou químicos.
Os neurônios possuem diferentes formas que variam de acordo com a
localização e sua função no sistema nervoso. Independente da sua forma, os
neurônios são compostos de um corpo celular (também chamado de soma)
que contém um núcleo - projeções mais curtas que recebem os sinais elétricos
dos neurônios das proximidades, chamadas de dendritos - um axônio que
propaga todo esse sinal, o qual geralmente possui uma camada de lipídios
chamada de bainha de mielina, e por fim, o terminal do axônio que tem o papel
de transmitir o impulso nervoso aos neurônios adjacentes.
Figura 1 – Tipos de neurônios encontrados no sistema nervoso central Fonte: http://docplayer.com.br/docs-images/25/5040672/images/7-0.png
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Figura 2 – Estrutura de um neurônio Fonte: http://www.ebah.com.br/content/ABAAAgweEAI/tecido-nervoso
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SUGESTÃO DE LEITURA
Para uma leitura mais aprofundada e atualizada sobre o sistema nervoso, recomenda-se o livro Cem Bilhões de Neurônios? Conceitos Fundamentais de Neurociência (2 ed) do Roberto Lent. O autor aborda tópicos atualizados em neurociência, além de abordar a plasticidade do sistema nervoso de uma maneira muito didática.
1.3 O Córtex Cerebral
Compondo maior parte do cérebro, o néocortex compreende toda Massa
Cinzenta Cerebral formada por seis camadas de células, sendo que além
dessa, o cérebro internamente também possui a Massa Branca. Cada camada
ou lobo cerebral possui diferentes funções.
Vocabulário
Massa cinzenta: compõe a região externa do cérebro, contendo geralmente um maior número de corpos neuronais.
Massa branca: compõe em maior parte a região interna do cérebro, contendo feixes de dendritos e axônios.
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Fonte: http://escolaeducacao.com.br/sistema-nervoso/
1.3.1 Lobos Occipitais
Localizados na parte posterior do cérebro, os lobos occipitais são os
centros de processamento dos estímulos visuais no cérebro. Sendo referidos
também como córtex visual, têm a função de processar as informações visuais
advindas do meio externo (ambiente) dentro do cérebro. Uma vez que as
informações chegam à região occipital, as mesmas são identificadas pela área
associativa (córtex visual secundário), a qual compara informações visuais
prévias com a informação recente. Isso permite distinguir rapidamente uma
laranja de uma árvore, por exemplo.
Fonte: Acervo do Autor.
Duas pessoas que olham uma mesma imagem, por exemplo, podem
focar em diferentes detalhes e descrever a imagem de diferentes maneiras. A
área de percepção visual que realiza o foco em determinada imagem se
comunica com outras redes neurais do cérebro que tem a finalidade de
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classificar tal imagem como nova ou antiga. Os estímulos visuais tornam-se
significantes apenas quando são marcados e comparados com informações
visuais previamente adquiridas. Quando se foca a atenção a determinado
estímulo, como acontece em situações em que professores exibem
previamente os objetivos de uma atividade em sala de aula, facilita o aluno
antecipar ações ou ideias para solucioná-las, aumentando a probabilidade do
cérebro focar apenas numa informação essencial. A ação de se concentrar
mentalmente para realizar uma tarefa com êxito requer foco e atenção,
recursos processados primeiramente no córtex visual, exigindo um bom
funcionamento do córtex occipital.
1.3.2 Lobo Temporais
No outro lado do cérebro, logo abaixo das orelhas, estão localizados os
dois lobos que se curvam para frente dos lobos occipitais, para baixo dos lobos
frontais. Os lobos temporais têm a função principal de processar e
compreender os estímulos auditivos, a linguagem e alguns aspectos
relacionados à memória, especialmente a memória auditiva.
Importante
A audição é considerada um dos sentido mais importante no ser humano, permitindo nos comunicar com outras pessoas, ter o equilíbrio e perceber perigos eminentes, o que garantiu a sobrevivência no processo evolutivo.
O som de um trem chegando informa que é preciso manter distância do
mesmo para evitar danos ao organismo, assim como o som de qualquer coisa
que está atrás de nós, fazendo-nos virar para conferir rapidamente quem ou o
que está emitindo o som.
Como visto nos lobos occipitais, os lobos temporais possuem muitas
subdivisões. Quando a região auditiva primaria é estimulada por um som, a
região associativa que mantêm conexões neurais com outras regiões do
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cérebro também é ativada, auxiliando a percepção e o reconhecimento do que
está sendo ouvido. Essas duas regiões principais do córtex auditivo têm o
papel de identificar a altura, timbre e o tom dos sons.
Fonte: Acervo do Autor.
1.3.3 Lobos Parietais
Em alguns casos clínicos de AVC localizados no hemisfério cerebral
direito, os indivíduos são acometidos por uma estranha doença chamada de
anosognosia, na qual o paciente desconsidera que é doente e aparentemente
tenta levar uma vida normal. Essas pessoas têm o lado esquerdo do corpo
paralisado, sem terem a consciência disso. Essa ausência de sensibilidade do
lado esquerdo do corpo induz a um comportamento de esquecimento desse
lado, fazendo com que, por exemplo, o doente deixe de pentear os cabelos e
vestir roupas nesse lado do corpo. Essa doença foi ocasionada pela lesão dos
neurônios do córtex parietal que são responsáveis pela consciência e
orientação espacial do corpo.
Os lobos parietais são subdivididos nas partes anterior e posterior. A
região anterior é chamada de córtex somatossensorial, encarregada de enviar
informações aos músculos do corpo relacionadas a motricidade e receber
estímulos táteis do ambiente, sensações de dor e pressão na pele, além de
detectar a posição dos membros (propriocepção). Cada parte do corpo que
está em contato com o meio externo é representada por uma área específica
na superfície do córtex somatossensorial. A parte posterior do lobo parietal
analisa e integra todas essas informações sensoriais com a finalidade de
fornecer consciência espacial. O cérebro precisa estar atento sobre o que cada
parte do corpo está localizada no ambiente em sua volta, portanto, um dano na
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região parietal frequentemente causa prejuízos na manipulação de objetos
(destreza), também chamada de apraxia.
1.3.4 Lobos Frontais
A maior parte do cérebro é composta pelos lobos frontais, os quais
desempenham funções bastante complexas. Localizados na frente do cérebro,
essa região tem se expandido muito rapidamente nos últimos 20.000 anos do
processo evolutivo das espécies, fato que distingue dos ancestrais. As
habilidades de movimento consciente do corpo, de relembrar o passado,
planejar o futuro, focar a atenção, refletir, tomar decisões, resolver problemas e
participar de uma roda de conversa são possíveis graças a essa desenvolvida
parte do cérebro. De todas essas habilidades, pode-se destacar o fato de que a
presença dos lobos frontais no córtex cerebral permite ter consciência de todos
os pensamentos e ações.
Fonte: Acervo do Professor
As funções do lobo frontal são subdivididas em duas categorias: de
processamento motor e cognição. Logo atrás dos lobos frontais há um
conjunto de neurônios que formam o córtex motor, onde toda atividade
neuronal dirigida ao movimento muscular voluntário se origina. Similar ao
córtex somatossensorial, cada parte do corpo possui uma região
correspondente no córtex motor. Os músculos que realizam movimentos mais
finos ocupam uma maior área de atividade no córtex motor, como os que
controlam o movimento dos dedos, dos lábios e da língua.
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Vocabulário
Cognição: processo de aquisição de conhecimento e entendimento através do pensar, experienciar e sentir, intrínseco ao sistema nervoso central.
Logo à frente do córtex motor, o córtex pré-frontal é caracterizado pelo
seu tamanho muito maior em humanos, do que em outras espécies. Essa
região cerebral é a que claramente nos define como humanos e o que separa
dos outros animais, como dos primatas, o grupo de animais mais aparentados
com os seres humanos na escala evolutiva.
Parte do córtex pré-frontal está engajada na regulação da emoção nos
seres humanos. A sub-região orbitofrontal (chamada assim devido à
proximidade com as orbitas oculares) é responsável por avaliar e regular os
impulsos emocionais que emanam de áreas cerebrais mais inferiores. Essa
evidência nos ajuda a explicar a frequência de violência no trânsito em adultos
e as flutuações emocionais diárias em crianças. Provavelmente, esses
comportamentos socialmente negativos são fruto de um dano cerebral que
causa uma série de curtos-circuitos na região orbitofrontal do córtex pré-frontal.
Ainda assim, algumas pesquisas na área de neuropsicologia destacam que o
principal determinante na deficiência de regulação emocional nos humanos
seria devido ao descontrole emocional dos pais durante os primeiros anos de
vida do indivíduo.
Todas as partes do cérebro devem trabalhar em conjunto para que até
mesmo uma ação simples de piscar os olhos, aconteça. Embora se tenha
abordado a estrutura e função das principais regiões do córtex cerebral
separadamente, é de suma importância lembrar que nenhuma delas
desempenham suas funções isoladamente num sistema extremamente
complexo, que é o cérebro humano.
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SUGESTÃO DE LEITURA
Um dos livros mais conceituados na área de neuropsicologia, a obra do António Damásio, O Erro de Descartes, enfatiza alguns casos clínicos que estimularam os estudos da região pré-frontal do cérebro humano.
1.4 Neurodesenvolvimento Fetal e Neonatal
Acredita-se que grande parte do crescimento em número dos neurônios
aconteça no período fetal. Durante esse período, os neurônios são gerados a
partir de células-tronco que migram de um tubo nervoso simples para posições
finais, geneticamente determinadas. Essa migração para distintas áreas do
crânio irá diferenciar as várias regiões cerebrais (nos córtices frontal, parietal,
occipital e temporal).
Após a fase de diferenciação e migração dos neurônios é dado início a
formação das conexões neuronais, gerando à criação das primeiras redes
neurais no cérebro humano. Esse contato íntimo entre os neurônios é crucial
para sincronização dos sinais elétricos no sistema nervoso, e esse padrão de
organização na transmissão da informação é diferenciada na maioria das
regiões cerebrais. Graças as sinapses, os neurônios têm a capacidade de
comunicar entre si, decodificar e transmitir informações que irão gerar os mais
variados comportamentos na espécie humana.
No período fetal, a síntese de neurônios é muito maior em relação à sua
demanda necessária ao funcionamento normal do sistema nervoso. Um grande
número de células é perdido, as quais não conseguiram se localizar na região
correta ou realizaram sinapses sem utilidade funcional ao cérebro. A figura
abaixo exemplifica, de uma forma didática, o processo de refinamento do
sistema nervoso (“poda” sináptica, ou, do inglês prunning) que se inicia na fase
fetal e se prolonga no período pós-natal. Como numa brincadeira infantil das
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cadeiras, os participantes que não conseguiram uma cadeira para sentar ficam
de fora. Aplicando isso ao sistema nervoso em formação, muitas sinapses
serão consolidadas, enquanto outras serão descartadas, numa espécie de
“poda” dos prolongamentos sinápticos, que consequentemente levará a
degeneração dos neurônios “desconectados”.
Figura 4 – Os neurônios que não se estabelecem em conexões sinápticas são
descartados do sistema nervoso em formação Fonte: Cosenza; Guerra (2011).
A sinaptogênese (formação de novas sinapses), prevalente no sistema
nervoso fetal e neonatal, permite a aquisição de novas habilidades cognitivas
na criança. A criança nasce com um cérebro de aproximadamente 400g que,
ao final do primeiro ano de vida, terá duplicado, pesando cerca de 800g. Nesse
período não há formação de novas células nervosas, entretanto, a
sinaptogênese é a responsável por esse crescimento cerebral maciço.
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Figura 4 – Sinaptogênese do recém-nascido até os 2 anos de idade. Fonte: Cosenza; Guerra (2011)
O sistema nervoso infantil em desenvolvimento precisa estar em
constante interação com o ambiente, pois é nesse momento que as novas
conexões nervosas geram o aparecimento de novos comportamentos. A
estimulação ambiental é tão importante para o desenvolvimento do sistema
nervoso que experimentos constataram que animais criados em ambientes
com pouca estimulação ambiental desenvolviam um cérebro menos sofisticado.
Portanto, o desenvolvimento inicial do sistema nervoso é de suma
importância para o funcionamento normal das estruturas cerebrais durante toda
a vida. Qualquer anormalidade nesse percurso advinda de fatores ambientais
ou genéticos oportuniza o surgimento de distúrbios comportamentais. Crianças
com má formação do sistema nervoso, em algum momento da vida, irão
necessitar de intervenções pedagógicas especiais para realizar atividades
cognitivas na escola.
1.4 Plasticidade Cerebral
O sistema nervoso central nos primeiros anos de vida é extremamente
plástico. A sinaptogênese é prevalente na infância e se estende por toda
adolescência. O aumento das conexões entre as células corticais é prevalente
na infância e declina na adolescência até atingir um padrão adulto,
potencializando a aprendizagem. Na adolescência a aquisição de novas
informações em curta faixa de tempo diminui, porém, a capacidade e usar e
elaborar o que já foi aprendido é aprimorado. O cérebro adulto não tem essa
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mesma facilidade de modificação, porém a plasticidade sináptica acontece
durante toda a vida, em grau diminuído. Na fase adulta a plasticidade neural
garante que a função cognitiva de aquisição de habilidades motoras, por
exemplo, aconteça no momento do treino de direção de um automóvel.
A plasticidade cerebral consiste na capacidade de realizar novas
conexões neuronais fruto de constante estimulação ambiental. O treino de
direção citado anteriormente leva ao surgimento de novas sinapses e a criação
de novas redes neuronais dedicadas a execução e aprimoramento da tarefa
motora. O treinamento constante de um pianista promove modificações nas
redes neurais motoras e cognitivas que permite refinar o controle e expressão
musical. Se porventura o indivíduo for acometido de doença que impeça de
praticar a atividade motora ou simplesmente interromper seu treino, as
sinapses nervosas dessa memória motora podem ser desfeitas, e, portanto, a
habilidade motora será perdida. A capacidade de promover conexões plásticas
entre neurônios caracteriza a aquisição de memórias e a consolidação da
aprendizagem por toda vida. Com a senilidade, esses fenômenos demandam
mais tempo para acontecer, necessitando maior esforço para que a
aprendizagem ocorra.
A medida que as sinapses encarregadas de desempenhar uma atividade
motora nova são utilizadas, a aprendizagem torna-se mais efetiva. Quanto mais
frequente for o contato com o conteúdo de estudo por um estudante, por
exemplo, num ponto de vista neurobiológico, ocorrerá maior formação e
consolidação de conexões sinápticas entre os neurônios. Os professores
podem facilitar esse processo até certo ponto, pois a aprendizagem acontece
de uma maneira individual no ser humano. As circunstâncias ambientais atuam
diferentemente em cada indivíduo, portanto cada um responderá de maneira
positiva ou negativa a um novo estímulo que é chegado ao sistema nervoso
humano.
Saiba Mais
Você sabe o que significa Brainstorming? Traduzido do inglês como “tempestade cerebral”, é uma dinâmica de
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grupo facilmente aplicada numa sala de aula. Tem o objetivo de desenvolver novas ideias e estimular o pensamento criativo em determinado tema. Portanto, estimule sempre seus alunos realizando periodicamente esse tipo de tarefa, a qual o professor expõe um tema no quadro e os alunos desenvolvem as ideias em cima do tema proposto.
O sistema nervoso central é um órgão bastante plástico e diferenciado
nos seres humanos, capaz de expressar os comportamentos mais complexos
já vistos no reino animal. Todo esse órgão, apesar de visualmente dividido,
funciona de uma maneira integrada para desempenhar desde um mínimo
movimento de um dedo, até pensamentos mais complexos, como numa
resolução de uma equação matemática. Portanto, os educadores devem ter a
noção que esse sistema é extremamente plástico e diferente em cada
indivíduo, e que a aprendizagem ocorrerá de diferentes maneiras num contexto
escolar.
Resumo da Aula 01
Na aula abordou-se o funcionamento e estrutura do sistema nervoso
central, dando enfoque nas suas subdivisões corticais. Foi tratado também
sobre o neurodesenvolvimento fetal e neonatal e a importância das sinapses na
constituição do sistema nervoso nos primeiros anos de vida. Por fim, foram
abordados aspectos relacionados à plasticidade cerebral, dando relativa
importância a esse fenômeno mais frequente na infância e adolescência, com
diminuição de sua intensidade nas fases adulta e senil.
Atividade de Aprendizagem
Considerando as diferenças individuais na aquisição de informações e aprendizado, haveria um método didático “ideal” para transmitir informação de forma efetiva aos alunos de uma classe?
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AULA 2 – MEMÓRIA, APRENDIZAGEM E AS UNIDADES FUNCIONAIS
Apresentação da Aula 02
Na aula serão abordados alguns aspectos neurobiológicos para
entendimento do processo de aquisição de memórias e consolidação da
aprendizagem. Essa fusão das áreas de conhecimento da neurociência e
educação promove o esclarecimento de conceitos, auxiliando a atuação do
professor na sala de aula.
2 MEMÓRIA
“O que definiria memória?” Memória seria a habilidade de lembrar
informações ou experiências do passado e trazê-las para o presente. As
memórias são lembradas a todo tempo e são baseadas no reconhecimento de
eventos similares que de alguma forma tornaram-se conectados. Isso acontece
o tempo inteiro, fato que não seria diferente nos estudantes, os quais têm o
poder de planejar o que aprenderão e como aprenderão os conteúdos
escolares. O contexto de como o conteúdo de classe é passado para o aluno
pode estimular a aquisição de diferentes tipos de memória de uma maneira
individual, conduzindo a uma miríade de reflexões que podem positivamente ou
não exercerem impacto na aprendizagem.
Cognitivamente, a memória envolve o reconhecimento, lembrança e
reflexão. Você sabia que a memória pode ser estimulada antes mesmo do
nascimento? Inúmeras evidencias apontam que recém-nascidos conseguem
reconhecer cheiros e sons que a eles foram apresentados ainda na fase fetal.
As emissões sonoras dos bebês são interpretadas pelos pais e dizem respeito
a momentos de fome, dor, simplesmente gesticulação. No amadurecimento, as
emissões sonoras dão lugar à linguagem, que expressam as vontades e
necessidades da criança. Nos anos seguintes, uma maior aquisição de
memórias tende a ocorrer na criança e no adolescente, portanto, diferentes
pontos de vista e perspectivas são traçados graças a experiências anteriores
de memória. A memória é uma poderosa guia da aprendizagem e
frequentemente fornece auxílio em todas as ações cotidianas das pessoas.
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2.1 Tipos de Memória
As memórias são operadas por mecanismos e regiões cerebrais
diferentes e podem ser classificadas quanto ao tempo de retenção: memória
ultrarrápida ou imediata (dura fração de segundos a alguns segundos),
memória de curta duração (dura minutos ou horas e garante o sentido de
continuidade do presente) e memória de longa duração (duas horas, dias ou
anos, garantindo o registro do passado autobiográfico e dos conhecimentos do
indivíduo).
Na aula, serão abordadas com mais profundidade a memória quanto à
sua natureza: explícita ou declarativa, implícita ou não-declarativa e
operacional ou memória de trabalho, assim como se dá a amnésia.
2.1.1 Memória Explícita (Declarativa)
Toda informação sensorial pode ser temporariamente armazenada na
memória de curta duração, mas “como essa informação pode ser retida por
uma faixa maior de tempo?” Para entender as bases neurais do
armazenamento de memória declarativa, primeiro será analisado em qual local
do cérebro que fica retida tal informação. Em outras palavras, serão explorados
os engramas ou traços de memória. Por exemplo, quando aprende o
significado de uma palavra em uma língua estrangeira, em qual local do
cérebro ela ficará armazenada, ou seja, “onde ficará essa engrama?”
Vocabulário
Engrama é o traço permanente deixado no tecido nervoso por um estímulo muito forte, podendo também ser uma marca permanente deixadas na psique de um indivíduo por experiências psíquicas por ele sofridas.
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O lobo temporal normalmente participa do processamento da linguagem
e memória. Uma lesão qualquer nessa região pode afetar o conteúdo de
memórias de palavras estrangeiras, mas deixar intactas as memórias da língua
mãe. Logo, as memórias declarativas podem residir em várias partes do
neocórtex, mas primeiramente, elas precisam em algum momento passar pelos
lobos temporais.
O lobo temporal fica localizado sobre o osso temporal do crânio. O fato
dos cabelos da região das têmporas (laterais do crânio) tornarem-se brancos
com mais rapidez do que as outras regiões do couro cabeludo caracterizou
esse lobo como local engajado no registro de eventos passados. Acredita-se
que a porção medial do lobo temporal (neocórtex temporal) armazena boa
parte das memórias de longa duração, e conexões nervosas com o neocórtex
são críticas para a formação de memórias declarativas.
Figura 1 – Lobo temporal medial no cérebro humano Fonte: https://www.mccare.com/images/temporal_lobe.png
A memória declarativa caracteriza a habilidade em armazenar e lembrar
informações as quais pode-se declarar (fala e escrita). Requer um processo
consciente que permite lembrar e discutir algo ou simplesmente lembrar e
descrever um evento que ocorreu no passado. Essa dupla função conduz a
uma subdivisão da memória declarativa em duas outras categorias: memória
episódica e semântica.
A memória episódica, chamada também de memória das origens,
envolve as lembranças de onde e quando a informação foi adquirida. Permite
lembrar do(a) colega que você foi apaixonado(a) no colégio, ou detalhes da sua
festa surpresa de 15 anos de idade. É composta de registros faciais, musicais,
fatos e experiências individuais (um conjunto de referências autobiográficas).
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Da mesma maneira que se torna muito importante (como lembrar em qual vaga
você estacionou seu carro), às vezes pode ser problemática. O cérebro não
abriga memórias numa maneira linear, como uma câmera de vídeo, e sim em
circuitos neurais. Quando lembramos de algo, normalmente reconstruímos um
cenário mental o qual nos escapam detalhes, e nesse caso, o cérebro
preenche os detalhes numa espécie de união de fragmentos de memória.
Quando conta-se a lembrança normalmente a “embelezamos”, adiciona-se
informações, tornando-a mais elaborada. Portanto, mesmo pensando que a
dita memória caracterizou um evento vívido, os detalhes geralmente são
imprecisos.
A memória semântica, por outro lado, é bastante precisa. Inclui a
memorização de palavras, seus símbolos associados e de como manipular as
palavras para se comunicar. Consiste na memorização de regras da gramática,
fórmulas matemáticas e seu conhecimento geral sobre o mundo. Esses fatos
geralmente são independentes de uma condição particular de tempo e espaço.
O fato de saber que “6 x 7 = 42” é um exemplo de memória semântica, porém
lembrar em qual série da escola memorizou a tabela de multiplicação trata-se
de memória episódica.
2.1.2 Memória Implícita (Não-Declarativa)
Tratada também como memória procedural, geralmente não necessita
“declarar” algo para que a informação seja armazenada. Ela envolve a
habilidade de armazenamento de ações automáticas de cunho rotineiro.
Compreende os simples procedimentos de caminhar, escovar os dentes,
amarrar o tênis, até os mais complexos, como dirigir um carro ou decifrar
palavras. Após um número considerável de repetições, consegue-se executar
tarefas procedurais sem o pensamento consciente.
A maioria das habilidades mencionadas acima envolvem atividade
motora, mas alguns tipos de comportamento hábil não são baseados na
aprendizagem de movimentos. Um exemplo claro seria a leitura. Quando
aprende-se a ler, os olhos movem-se lentamente, de palavra em palavra, mas
com a prática, consegue movê-los com mais rapidez numa leitura. Os leitores
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mais habilidosos conseguem mover seus olhos por cerca de quatro vezes por
segundo, gerando uma média de mais de 300 palavras lidas por minuto.
A formação da memória implícita pode se dar de duas maneiras: por
aprendizagem não associativa ou associativa.
A aprendizagem não associativa pode ser descrita como uma mudança
na resposta comportamental que ocorre num período de tempo, em resposta a
um simples estímulo. Podem ser de dois tipos: habituação e sensibilização.
Considere a situação hipotética, supondo que está em casa e toque seu
telefone fixo. Quando atende, percebe que a chamada era para outra pessoa, a
qual não se encontra na casa, porém, o telefone torna a chamar inúmeras
vezes tentando falar com essa pessoa. A partir de um momento, você
simplesmente para de atender o telefone, pois adquiriu aprendizagem por meio
da habituação, a qual caracteriza ignorar um estímulo insignificante.
Provavelmente, ao ler esse texto, deverá estará ignorando o barulho dos carros
que passam na sua rua, um latido de um cachorro no bairro, ou mesmo o
barulho da TV quem vem da sala, pois todos esses estímulos estão fora da sua
realidade consciente devido a habituação.
Supondo que esteja caminhando na rua, a noite, e acontece um
blackout. Você começa a ouvir passos de pessoas vindo atrás, o que lhe dá
bastante tensão (o que geralmente, caminhando numa rua iluminada, não
sentiria). Luzes de carro se destacam na escuridão e, inconscientemente,
recua mais ainda para a lateral da calçada. Essa forte estimulação sensorial
ocasionada pelo blackout causou sensibilização, que seria uma forma de
aprendizagem que intensifica sua resposta a todos os estímulos, mesmo
considerando que o estímulo prévio normalmente causa pouca ou nenhuma
reação.
A aprendizagem associativa deriva de um comportamento alterado pela
associação de eventos, a qual é distinguida em dois tipos: condicionamento
clássico e instrumental.
O condicionamento clássico caracterizado pelo russo Ivan Pavlov
envolve a associação de um estímulo que gera uma resposta, com um
segundo estímulo que geralmente não gera resposta. O primeiro, que evoca
uma resposta, é normalmente chamado de estímulo não condicionado (EnC),
pois o mesmo não necessita de treinamento para gerar a resposta. Nos
25
experimentos de Pavlov, o EnC foi a visão de um pedaço de carne, a qual
gerava salivação num cachorro. O segundo, que não evoca resposta, é
chamado de estímulo condicionado (EC), pois o mesmo requer treinamento
(condicionamento) antes de gerar a resposta. No experimento de Pavlov, o EC
era um sinal sonoro de um sino. O treinamento consistiu em parear a visão do
pedaço de carne com o sinal sonoro, repetidas vezes. Depois de inúmeras
repetições, a carne foi retirada do pareamento, e o animal salivou apenas com
a presença do sinal sonoro. Portanto, o cachorro aprendeu que ganhará um
pedaço de carne toda vez que ouvir tal estímulo sonoro, gerando uma resposta
a um estímulo condicionado chamado de resposta condicionada.
Figura 2 – Condicionamento clássico paviloviano Fonte: http://2.bp.blogspot.com/-tM-
vE6or8SU/UP_Fb4HmcmI/AAAAAAAAAUg/o4ZLUvXZXio/s1600/c%C3%A3o.png
No condicionamento instrumental, o indivíduo aprende a associar um
estímulo ocasionado por uma ação motora com uma recompensa. Num
experimento hipotético, um rato em jejum é colocado numa caixa que contém
uma alavanca, a qual está suspensa num recipiente com comida. Por acidente,
a rato pressiona essa alavanca e recebe uma quantidade de comida. Depois de
várias ocorrências desse acidente, o rato aprende que toda vez que pressionar
a alavanca ele será recompensado. Portanto, no condicionamento instrumental,
o indivíduo aprende que um particular comportamento (pressionar uma
alavanca) sempre estará associado a uma particular consequência
(recompensar alimentar).
26
Figura 3 – Condicionamento instrumental Fonte: http://slideplayer.com.br/slide/3053850/11/images/12/Aprendizagem+por+Condicionamento+Operante.jpg
2.2 Amnésia
Como todos sabem, o esquecimento acontece tão frequentemente
quanto a aprendizagem. De ocorrência menos comum, certas doenças
cerebrais podem causar sérias perdas de memória, a qual é chamada de
amnésia, como no alcoolismo crônico, encefalite, tumores cerebrais e AVC.
Provavelmente já deve ter ouvido falar de uma pessoa que sofreu acidente e
acordou sem lembrar dela mesma ou do passado. Esse tipo de amnesia
absoluta é extremamente rara. Porém, dependendo do trauma no cérebro,
pode-se diferenciar dois tipos de amnésia: retrógrada e anterógrada.
Na amnésia retrograda ocorre a perda da memória relacionada a
eventos bem próximos ao trauma (como coisas que o indivíduo aprendeu
recentemente). Em casos mais severos, pode haver amnesia completa para
todas as memórias declarativas anteriores ao trauma. Geralmente, ela provoca
esquecimento de eventos na faixa de meses ou anos que precederam o
trauma, preservando as memórias mais antigas.
Na amnésia anterógrada há uma perda da habilidade em formar novas
memórias após o trauma. Se for severa, o indivíduo pode ser completamente
incapaz de aprender e lembrar algo novo. Em graus mais leves, a
aprendizagem pode se tornar mais lenta e exigir mais repetições que o normal.
Em casos clínicos, os dois tipos de amnesia são mais frequentes, com
diferentes graus de severidade.
27
2.3 Memória, Aprendizagem e a Abordagem Luriana
Até agora tem-se enfatizado a anatomia e fisiologia da principal função
cognitiva que tem impacto direto no processo de aprendizagem do aluno, a
memória. Irá agora considerar um assunto mais familiar aos educadores, o qual
possui uma maior integração entre ensino e neurociência cognitiva.
Esse assunto abrange a abordagem das unidades funcionais de
Alexander Romanovich Luria. O sistema nervoso, segundo Luria, estaria
organizando verticalmente, no qual áreas cerebrais inferiores serviriam de base
para as estruturas superiores. As funções mentais superiores estariam mais
vulneráveis pelo fato de se dedicarem a atividades mais complexas e por
serem mais recentes na evolução do sistema nervoso central nas espécies.
Essa divisão vertical, mais tarde daria origem às três unidades funcionais
lurianas. A primeira seria dedicada à manutenção do alerta e da atenção
(vigília). A segunda seria responsável pelo processamento de todos estímulos
externos e internos, relacionados à visão, audição e sensibilidade tátil. A
terceira se encarregaria de monitorar e manipular comportamentos
relacionados às ações conscientes, relativos à mente.
Figura 4 – Primeira, segunda e terceira unidades funcionais lurianas Fonte: Kruszielski (s.d.)
2.3.1 Primeira Unidade Funcional – Alerta e Atenção
28
Essa unidade é dependente do tronco cerebral (situado entre a medula e
o cérebro) no qual possui uma estrutura dorsal chamada de formação reticular
encarregada na regulação do ciclo sono-vigília. O estado de vigilância (ou
alerta) está relacionado com o reflexo de orientação fruto de um confronto com
um estímulo novo. O alerta possui relação próxima com a atenção, pois o
mesmo está engajado na manutenção dos disparos neuronais responsáveis
pela postura e pela atividade cortical. Mais especificamente, a atenção está
relacionada à seletividade e a sustentação de todas funções mentais
superiores. Tanto o alerta quanto a atenção são interdependentes, pois
selecionam, focalizam, alocam e refinam a integração dos estímulos.
Há um feixe de neurônios que conecta a primeira unidade funcional com a terceira, chamado de Sistema Reticular Ascendente. Este sistema leva impulsos para o córtex pré-frontal, ou seja, para o topo da hierarquia neural: por isto ascendente. Há também um grupo de feixe neuronal que faz o caminho inverso, do córtex pré-frontal para o tronco, o Sistema Reticular Ascendente. É a partir deles que conseguimos regular uma certa intenção para nos mantermos despertos, atentos ou Adormecidos (KRUSZIELSKI, s.d.).
2.3.2 Segunda Unidade Funcional – Recepção, Integração, Codificação e
Processamento Sensorial
Composta pela parte posterior do cérebro, compreende os lobos
occipitais, temporais e parietais, os quais processam a visão, percepção tátil,
audição, orientação espacial e linguagem. Essa unidade recebe e analisa as
informações que chegam aos órgãos sensoriais, interpretando-os e atribuindo
significados.
A memória é o componente cognitivo mais relacionado à essa unidade funcional.
A codificação é um evento estritamente relacionado à memória e refere-
se a toda análise, síntese, armazenamento e recuperação de informações
29
relativas a significação e a associação com memórias já integradas no cérebro.
A informação pode ser codificada de duas formas: simultânea ou sequencial.
No processamento simultâneo, a informação é sintetizada em unidades
espaciais ou relacionais, que quando integradas, geram os processos
cognitivos de leitura, escrita e aritmética. Qualquer disfunção nesse
processamento poderá gerar uma miríade de dificuldade de aprendizagem, tais
como as disnomias, disfasias, disartrias, dislexias, disortografias e disgrafias.
No processamento sequencial, a informação é codificada numa unidade por
vez (como no momento que um número de telefone é ditado). A codificação,
que caracteriza um processo puramente cognitivo, depende da combinação
desses dois tipos de processamento presentes na segunda unidade funcional
do Luria.
2.3.3 Terceira Unidade Funcional – Execução Motora, Planificação e
Avaliação
Composta pelos lobos frontais, tem o papel de programar, regular e
verificar toda atividade mental. A motricidade, intencionalidade, planejamento e
linguagem expressiva são as principais funções mentais controladas por essa
unidade. O ser humano é a espécie que proporcionalmente ao tamanho do
corpo, possui os lobos frontais mais desenvolvidos, tanto em relação ao seu
tamanho quanto a qualidade das redes neurais. Essa região é a última a se
desenvolver nos humanos, consolidando suas conexões entre os 6 anos e 12
anos de idade, concluindo somente no início da fase adulta.
Para descrever as nuances que cercam o processo de aprendizagem,
geralmente o conceito das funções executivas torna-se um assunto pertinente.
As ditas funções mentais superiores que ajudam a controlar o pensamento,
aprendizagem e comportamentos são referidas como funções executivas. Um
exemplo seria a memória operacional, que influencia o controle de memórias
numa situação específica, como na resolução de problemas. Considere um
estudante que está resolvendo um problema complexo de multiplicação. Para
sua resolução, o estudante precisa manipular algumas informações ao mesmo
tempo que tenta resolver o problema. A habilidade de reter e manipular
30
informações temporárias na memória (também chamado de problem-solving)
caracteriza a memória operacional.
Para finalizar essa discussão, Kruszielski (s.d.) enfatiza o estudo das
unidades funcionais em conjunto:
Por mais que estudemos as unidades funcionais e mesmo as funções mentais isoladamente, sempre é necessário que fique claro que todas elas atuam sempre em conjunto. Uma função mental nunca é o resultado de apenas uma unidade funcional, mas das três. A percepção, por exemplo. É necessário que a primeira unidade forneça o tônus cortical necessário, a segunda realize a análise e a síntese das informações que chega e a terceira execute os movimentos de busca controlados que conferem à percepção o seu caráter ativo.
2.4 Implicações Educacionais
Algumas pesquisas científicas estão sendo dedicadas em saber a
relação da memória e da consolidação da aprendizagem na sala de aula.
Certamente, seria interessante que os professores soubessem o tempo
necessário para seus estudantes consolidarem determinado conteúdo, para
assim partirem para um próximo.
O que se sabe é que a consolidação de novas informações é
dependente do tempo e pode ser prejudicada de informações precocemente
transmitidas, antes mesmo de consolidar as anteriores, podem prejudicar a
aquisição de memória tanto anterior quanto a recente. Como não se sabe o
tempo necessário para consolidar um conteúdo específico, deve-se ter cuidado
no momento de introduzir novos conhecimentos nos alunos. Portanto, utilizar
dos conhecimentos neuropsicopedagógicos no planejamento das aulas é de
suma importância na consolidação da aprendizagem de conteúdos da
disciplina. Uma maneira de aprimorar essa consolidação seria incorporar as
novas informações de uma maneira gradual e repeti-las em intervalos
regulares.
As informações recentes são raramente consolidadas no cérebro se
conteúdos novos são introduzidos tão prontamente. A maioria das memórias
desaparecem em minutos, porém as informações que são relembradas
periodicamente conseguem ser consolidadas em memórias de longa duração,
por meses ou anos.
31
O professor precisa ter o conhecimento sobre como as memórias são
adquiridas no sistema nervoso, e como a aprendizagem de conteúdo pode
acontecer de uma maneira mais simples e duradoura, nos seus alunos.
Dominando esses aspectos, os educadores não irão encontrar dificuldades em
lidar com a transmissão de conteúdos escolares, os quais necessitam de ser
aplicados de maneira gradual e dinâmica, com o intuito de maximizar o
conhecimento de longa duração.
Resumo da Aula 02
A memória envolve o reconhecimento, lembrança e reflexão de
conteúdos que aconteceram no passado. São classificadas em memória
ultrarrápida ou imediata, memória de curta duração e memória de longa
duração quanto ao tempo de retenção, ou em memória explícita, implícita ou
operacional, quanto à sua natureza. A memória é passível de esquecimento, a
qual é chamado de amnésia, que podem ser de dois tipos: retrógrada ou
anterógrada. As três unidades funcionais criadas por Luria dividem o sistema
nervoso central em setores dedicados ao alerta e atenção; recepção,
integração, codificação e processamento sensorial; e execução motora,
planificação e avaliação.
Atividade de Aprendizagem
Na sua opinião, o ensino baseado nos princípios da neurociência tem a possibilidade de ressignificar o processo de ensino-aprendizagem na escola? A partir do conhecimento sobre os conceitos em neurociência, você estaria habilitado em iniciar um processo de ensino-aprendizagem baseado na repetição e transmissão fragmentada do conteúdo?
AULA 3 – FUNÇÕES EXECUTIVAS E IMPLICAÇÕES EDUCACIONAIS
32
Apresentação da Aula 03
O sucesso acadêmico na nova era digital não está ligado apenas a
facilidade com o que os estudantes lidam com a tecnologia, mas com seu
domínio na estipulação de metas, planejamento, prioridades, organização,
flexibilidade mental e o poder de manipular informações na sua memória
operacional. Todos esses processos juntos compõem as funções executivas.
3.1 O Caso de Phineas Gage, o Córtex Pré-Frontal e as Funções
Executivas
Apesar dos conceitos sobre funções executivas estarem consolidados
há algum tempo, relatos médicos anteriores sobre mudanças comportamentais
após lesão cerebral já indicavam relações entre danos na região frontal do
cérebro a alterações no funcionamento executivo. O caso de Phineas Gage é
registrado como o mais famoso fato clínico sobre modificações
comportamentais associadas a danos na região do córtex pré-frontal.
Gage, que trabalhava na construção de uma linha férrea na região da
Nova Inglaterra-EUA em 1848, tinha a função de detonar explosivos em
buracos para abrir caminho em uma linha férrea. Utilizava-se de uma barra de
ferro para empurrar a pólvora do explosivo para cavidades mais profundas da
terra. Em mais um dia de realização desse procedimento rotineiro, Gage
acidentalmente gerou uma faísca entre a barra e a pólvora, detonando todo o
explosivo. A barra de ferro entrou no seu crânio, de baixo para cima, destruindo
seu olho esquerdo, atravessando a parte frontal do encéfalo saindo pelo topo
do crânio. Apesar da gravidade do acidente, Gage sobreviveu devido à
cauterização que a barra de ferro quente causou na ferida. Fisicamente ele
recuperou-se muito bem, porém foram identificadas mudanças no seu
comportamento social e na tomada de decisões. John Hallow, o médico que
acompanhou o tratamento de Gage, havia especulado que a lesão no córtex
pré-frontal teria sido a causa do comprometimento na execução de
planejamentos mentais e comportamentos adequados. Utilizando-se de
ferramentas de neuroimagem, foi possível reconstituir a trajetória da barra de
ferro no crânio de Gage e concluíram que a lesão cerebral atingiu os córtices
33
pré-frontal direito e esquerdo. Mais tarde, foi elucidado com mais detalhes os
danos causados pela barra de ferro em Gage e constataram que as massas
cinzenta e branca do córtex pré-frontal esquerdo foram as mais afetadas,
sendo responsável pela desconexão neuronal entre áreas corticais e regiões
de codificação de memória emocional episódica, o que pode ter sido a principal
causa das flutuações emocionais presente após o acidente de Gage.
Figura 1 – Desenho esquemático sobre a trajetória da barra de ferro que atravessou o
crânio de Gage (a esquerda) e Phineas Gage, após o acidente, segurando a barra de ferro que se acidentou (a direita). Fonte: http://skeptikai.com/wp-content/uploads/2015/11/Phineas-Gage-with-skull-picture.png
3.2 Funções Executivas
No início da vida escolar os estudantes começam a ter maiores
responsabilidades pelo seu próprio processo de aprendizagem. Os professores
tendem a fornecer uma grande quantidade de atividades que envolvem
habilidades cognitivas de leitura e escrita, bem como trabalhos escolares de
longa duração, os quais dependem, para sua execução, de todos os processos
mentais que caracterizam as funções executivas. O sucesso acadêmico,
portanto, se origina na habilidade de planejar e priorizar seu tempo, organizar
materiais e informações, destacar as principais ideias e ter diferentes
abordagens de um texto, perceber e refletir seu próprio progresso. Portanto, é
de suma importância que os educadores ensinem estratégias voltadas ao
desenvolvimento das funções executivas com a finalidade de auxiliar seus
alunos a entenderem como eles pensam e porque eles aprendem.
34
As funções executivas constituem um conjunto de habilidades que
possibilitam uma reflexão atenta, isto é, deliberada e intencionada a alcançar
um objetivo. Um bom funcionamento executivo permite o indivíduo refletir antes
de agir, trabalhar diferentes ideias mentalmente, solucionar desafios
inesperados, pensar sob diferentes perspectivas, reconsiderar opiniões e evitar
distrações. Essas habilidades são fundamentais para tomar decisões, viver e
pensar com autonomia. Seu principal desenvolvimento ocorre de zero a seis
anos de idade, período que corresponde a primeira infância, e é fortemente
influenciado pela qualidade e quantidade de experiências que as crianças
podem ter, inclusive relacionadas aos aspectos biológico e emocional.
Diversas evidências apontam que o núcleo das funções executivas se
encontra nos córtex pré-frontal, a região mais anterior do lobo frontal. Essa
região expandiu-se ao longo da evolução das espécies, e no ser humano ela se
desenvolveu de uma maneira mais intensificada. A região pré-frontal demora a
amadurecer no desenvolvimento infantil, continuando a modificar-se até o final
da adolescência. Logo, as funções executivas não estão em perfeito
funcionamento até o início da fase adulta.
Fonte: Acervo do Autor.
Com relação às atividades cognitivas, as funções executivas podem ser
divididas em três extratos: inibição (ou controle inibitório), memória operacional
(ou memória de trabalho) e flexibilidade cognitiva. Esses extratos compõem as
chamadas funções executivas de alto-nível, as quais envolvem o raciocínio,
resolução de problemas e planejamento.
3.2.1 Controle Inibitório
35
Torna-se importante para o controle do comportamento, por exemplo, na
substituição de respostas habituais por ações que caracterizam autocontrole
(como no momento de resistir a tentações alimentares, como doces ou
salgados, ou simplesmente dar uma resposta mais branda e menos impulsiva
numa discussão calorosa). Outro comportamento típico que demanda controle
inibitório é exercer disciplina, ou seja, resistir a vontade de desistir de uma
tarefa. Portanto, o controle inibitório possibilita controlar e filtrar pensamentos,
ter o domínio sobre atenção e comportamento. Conseguir ler um texto, mesmo
na presença de barulhos incômodos, é um exemplo de uso dessa habilidade.
É possível destacar três aspectos relevantes do controle inibitório: o
controle inibitório da atenção, a inibição cognitiva e o autocontrole.
O controle inibitório da atenção é importante para manter o foco sem
ceder a estímulos exteriores que distraiam. Alguns estímulos visuais ou
auditivos mais proeminentes atraem voluntariamente a atenção, mas há certos
estímulos aos quais é possível escolher dar atenção ou não. Assim, por
exemplo, é possível manter uma conversa com alguém, mesmo em um
ambiente com som elevado.
Na inibição cognitiva, o controle inibitório fará o indivíduo resistir a
pensamentos e memórias não intencionais, capazes de tirar o foco. Essa
habilidade é necessária para o bom funcionamento da memória de trabalho.
Ela possibilita manter o foco nas informações desejadas, mesmo na presença
de algum pensamento involuntário.
Finalmente, o autocontrole é o aspecto que está relacionado a ter
domínio sobre o comportamento, apesar da presença de impulsos e emoções,
estimulando determinadas condutas. Ter autocontrole significa ter a
possibilidade de agir de forma diferente da desejada intimamente, como ter
disciplina para terminar atividades não prazerosas, mas necessárias para se
atingir um objetivo desejado. Além disso, ter autocontrole significa também
evitar cometer erros devido à impulsividade, como tirar conclusões
precipitadas, falar algo sem pensar antes, ou não calcular as consequências de
uma ação ou decisão.
3.2.2 Memória Operacional
36
A também chamada de memória de trabalho permite integrar memórias
atualizadas com as antigas, para conscientemente manipular todo tipo de
informação disponível. Dessa maneira, pode-se pensar que a memória de
trabalho é uma condutora fiel para as memórias de curta duração, contudo, a
maioria das informações que chegam até as pessoas é mantida
temporariamente ou descartada do cérebro. Alguns cientistas a tratam como
uma “área computacional do cérebro”, pois todas as informações recém-
chegadas podem ser mantidas ou manipuladas conscientemente. Um exemplo
disso é quando um aluno resolve uma conta de multiplicação rapidamente,
como 24 x 8 = 192. Portanto, essa função executiva de alto-nível nos permite
planejar e organizar ações.
Importante
A memória de trabalho é composta de dois conjuntos de habilidades: o de representações verbais, que possibilita reter informações e também relacioná-las e pensá-las no curto prazo. Com isso, podem-se armazenar distintos fatos e acontecimentos para, em seguida, manipulá-los. Dessa forma, essa habilidade permite armazenar durante um tempo diversas estratégias de prontidão a serem utilizadas como respostas a diferentes estímulos e circunstâncias (por exemplo, dizer obrigado após uma gentileza). O outro, de representações visuais, auditivas, táteis, olfativas e gustativas, que possibilita imaginar objetos, ações, acontecimentos não disponíveis de forma direta, ou seja, perceptiva. Tem-se, portanto, dois tipos distintos de memória de trabalho, de acordo com o conteúdo memorizado: a verbal e a não verbal (visual-espacial).
Conectar diferentes informações, relacionar acontecimentos que
ocorreram em momentos diferentes, reordenar itens mentalmente, considerar e
incorporar alternativas ao planejamento, todas essas ações dependem do
funcionamento da memória de trabalho. Essa habilidade é também essencial
para a criatividade, ao tornar possível que se separe um todo em partes e
reorganize as partes de uma nova sequência.
37
A memória de trabalho e o controle inibitório são mutuamente
dependentes e dificilmente funcionam separadamente. Ter em mente o objetivo
é indispensável para avaliar o que deve ser filtrado ou inibido. Mas, também,
para trabalhar com informações mentalmente, é preciso ter a capacidade de
resistir a distrações. E para manipular as ideias de forma criativa deve-se evitar
repetir padrões habituais.
3.2.3 Flexibilidade Cognitiva
Como terceira dimensão fundamental das funções executivas, ao lado
da memória de trabalho e do controle inibitório, a flexibilidade cognitiva está
relacionada à possibilidade de mudar de perspectiva no momento de pensar e
agir. Essa habilidade existe quando o indivíduo é capaz de analisar uma
mesma informação, considerando ângulos diferentes ou visões de outras
pessoas. O desenvolvimento da flexibilidade cognitiva depende da evolução
prévia da memória de trabalho e da inibição cognitiva, pois para mudar de
perspectiva é necessário inibir a forma de pensar utilizada anteriormente e
inserir na memória de trabalho uma nova forma de analisar a questão. Sem a
flexibilidade cognitiva, os indivíduos não conseguiriam tentar resolver um
problema de outra forma, ajustar-se a mudanças de prioridades, reconhecer
erros e aproveitar oportunidades inesperadas.
Durante a fase infantil, a flexibilidade cognitiva contribui para
compreender distintas formas de jogar um jogo ou para tentar diversas
estratégias na solução de conflitos com outras crianças ou adultos. Quanto à
aprendizagem escolar, a flexibilidade cognitiva importa por possibilitar à criança
experimentar diferentes ações até chegar a um resultado desejado de um
experimento de ciências ou um problema de matemática.
Considera-se que a partir dos três extratos que compõem as funções
executivas (memória de trabalho, controle inibitório e flexibilidade cognitiva),
são construídas as funções executivas de alto-nível, que envolvem a
capacidade de raciocínio, solução de problemas e planejamento. Além disso,
os três extratos são essenciais para a construção de diversas habilidades
fundamentais para a autonomia individual, como criatividade, perseverança,
cooperação, respeito mútuo, disciplina e flexibilidade.
38
Vídeo
Sobre a importância das funções cognitivas para o desenvolvimento da criança em adulto, assista ao vídeo Funções Executivas: Habilidades para a Vida e Aprendizagem,
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=6gIY_X9IXH8
3.3 Testes Utilizados na Avaliação das Funções Executivas
Diante das observações sobre o comportamento em indivíduos com
lesões no córtex pré-frontal foram desenvolvidos testes que buscaram dissociar
os componentes cognitivos envolvidos no funcionamento executivo afetado
nessa condição. Dentre os vários testes empregados na atualidade, destacam-
se o Wisconsin Card Sort Task (WCST) e o Iowa Gambling Test (IGT) que
avaliam a tomada de decisões sobre os componentes de flexibilidade mental,
formação de conceitos abstratos e planejamento de ações. As principais áreas
do córtex pré-frontal afetadas e que consequentemente geram déficits
cognitivos estão situadas no córtex pré-frontal dorsomedial, córtex pré-frontal
ventromedial e córtex pré-frontal orbitofrontal, que, dependendo do local
específico da lesão pode comprometer um ou mais componentes cognitivos da
tomada de decisões do indivíduo. Estudos ainda destacam que lesões no
córtex pré-frontal ventromedial provocam um comportamento que induz os
indivíduos a fazerem escolhas de alto ganho monetário a curto prazo que
resultam em grandes perdas monetárias no montante final no IGT. Essa
estrutura provavelmente pode estar encarregada de perceber o risco de
determinadas tomadas de decisão integrando informações sobre memória de
trabalho, escolhas vantajosas da decisão e inibição de respostas negativas no
futuro.
Nas últimas décadas, têm-se destacado também a avaliação da função
executiva de inibição de respostas realizada pelos testes Stop Signal e Go/No-
Go os quais avaliam componentes cognitivos de atenção seletiva, flexibilidade
e velocidade de processamento de estímulos. Os indivíduos são submetidos a
39
responderem rapidamente a determinado estímulo que lhes é apresentado
(estímulo Go) e em intervalos irregulares, inibir sua resposta frente a uma
minoria de respostas inibitórias que surgem (estímulo No-Go). Geralmente,
pacientes com lesões no córtex pré-frontal ventrolateral, região
anatomicamente próxima do giro pré-frontal inferior, possuem um pobre
controle motor inibitório nesses testes. Considerando ainda um estudo que
envolveu a aplicação de uma modificação do teste Go/No-Go, no qual os
indivíduos recebiam recompensas negativas após cada erro, foi identificada
participação do córtex pré-frontal orbitofrontal na modulação da recompensa.
Indivíduos com lesões no córtex pré-frontal orbitofrontal não conseguiam
esboçar reação de autojulgamento frente as recompensas negativas recebidas
e continuaram a errar de uma maneira constante, por todo o teste.
Considerando outro teste que busca avaliar o controle inibitório pode-se
destacar a ampla utilização do teste Stroop. A inibição de estímulos não
relevantes nesse teste é exibida em representações conflitantes as quais é
necessária a inibição de uma resposta prepotente para resolver esses conflitos
“mentais”. As estruturas do córtex pré-frontal envolvidas nesse teste diferem
dos outros testes de controle inibitório, pois no momento que o indivíduo
procura resolver essa interferência mental, regiões do córtex pré-frontal dorso e
ventromediais são solicitadas. O indivíduo que possui lesão nessa região
específica tem uma grande dificuldade de resolver conflitos mentais e passam
a errar com mais frequência quando lhes é apresentado um estímulo não
inibitório associado a um inibitório.
Figura 2 – sub-regiões do córtex pré-frontal Fonte: Szczepanski; Knight (2014)
3.4 Por que o Estudo das Funções Executivas é Importante?
40
O sucesso acadêmico de todos estudantes, e particularmente o que
possui alguma dificuldade de aprendizagem, está intrinsecamente ligado com a
motivação, esforço, persistência e autoavaliação. Esses processos cognitivos e
motivacionais estão conectados ciclicamente com as funções executivas e
desempenho acadêmico dos estudantes. Quando os estudantes aprendem e
aplicam estratégias de aprendizagem com eficácia, eles se tornam mais
independentes na aquisição do conhecimento. Portanto, o sucesso acadêmico
depende da confiança em si próprio e no automonitoramento de seu próprio
desempenho, o que resulta num esforço a mais em tarefas que exigem
complexidade na escola.
O ambiente de aprendizagem e os materiais e métodos instrucionais
assumem importante responsabilidade em mediar essa relação cíclica. Para
todos os estudantes, e mais especificamente aos que possuem dificuldades de
atenção e aprendizagem, a inclusão de atividades pedagógicas voltadas a
criação de estratégias e manutenção do foco auxilia-os a obter habilidades
necessárias para suprir as demandas acadêmicas. De fato, o aluno com
dificuldade de aprendizagem precisa de mais horas para produzir algo, e
provavelmente a série escolar a que está inserido não reflete a sua capacidade
executiva. Quando esses estudantes utilizam estratégias de organização,
prioridades e checagem de ideias, frequentemente tornam-se capazes de
flexibilizar seu pensamento para entender uma ideia em diferentes abordagens.
Na busca de gerar motivação, persistência e ética nos estudantes, torna-
se necessário que os mesmos entendam seus pontos fortes e fracos. Isso os
permite determinar quais estratégias serão mais eficazes para resolver um
problema, bem como o porquê, onde, quando e como aplicar estratégias
específicas. Esse entendimento é conhecido como metacognição.
Saiba Mais
Metacognição é a habilidade de pensar sobre seu próprio pensamento e aprendizagem. A metacognição se refere ao próprio entendimento de como aprender algo, bem como a manipulação de estratégias que podem ser usadas para resolver determinada tarefa. Estudantes com consciência
41
metacognitiva conhecem e entendem seus próprios perfis de aprendizagem, além de relacionarem os extratos das funções executivas em seus pontos fortes e fracos, auxiliando-os na resolução das diversas tarefas escolares.
As habilidades que compõem as funções executivas são essenciais para
o controle consciente e deliberado sobre ações, pensamentos e emoções. Tais
capacidades possibilitam ao indivíduo gerenciar seu comportamento e suas
ideias de forma autônoma e independente. Sem um bom desenvolvimento das
funções executivas, os indivíduos podem apresentar dificuldade para se
lembrar de ideias e de fatos a fim de relacioná-los no curto prazo, ou para
evitar que pensamentos ou evento externos distraiam a atenção ou ainda, para
refletir sob diferentes ângulos. Dessa forma, o funcionamento executivo está
relacionado a diferentes dimensões da vida das pessoas.
Resumo da Aula 03
Nesta aula foram abordados aspectos relacionados ao córtex pré-frontal,
o papel das funções executivas na consciência e na aprendizagem, além de
ser parte primordial na formação social do ser humano. Ficou constatado que
as funções executivas podem ser decompostas em três extratos, e que cada
um deles podem ser cuidadosamente treinados na criança ou adolescente, no
ambiente escolar.
Atividade de Aprendizagem
As funções executivas dependem exclusivamente da mediatização do educador com o aluno? Na sua opinião, os pais podem assumir um papel no desenvolvimento das funções executivas dos seus filhos?
AULA 4 – ATENÇÃO E APRENDIZAGEM
42
Apresentação da Aula 04
Todos os estímulos que chegam ao sistema nervoso passam por um
filtro elaborado através de diversos mecanismos. Antes mesmo da informação
ser processada no cérebro, algumas redes neuronais que estão levando essa
informação podem ser bloqueadas, auxiliando esse filtro. Alguns centros
reguladores da atenção participam desse processo, e isso permite focar a
atenção em determinados estímulos, ao mesmo tempo que se ignora outros.
Portanto, a atenção se responsabiliza primariamente na aquisição de
informações e no processo de aprendizagem. Os aspectos neurobiológicos da
atenção merecem destaque quando se discute métodos de ensino-
aprendizagem eficazes no campo escolar.
4.1 Conceito de Atenção
A atenção é uma habilidade cognitiva que permite focar em determinada
informação ou estímulo. A partir da aquisição dos cinco sentidos, o ser humano
tornou-se capaz de processar mentalmente todas informações que o ambiente
tem a lhe fornecer, e grande parte desse montante informativo é filtrado no
cérebro sem ao menos percebermos.
A atenção é uma função cognitiva complexa que é essencial para o
comportamento humano. Reúne basicamente a seleção de informações
externas (sons, imagens, cheiros) com internas (pensamentos) que podem ser
mantidas no cérebro com certo grau de consciência. Ela não é estável, e,
portanto, pode sofrer flutuações, pelo fato de não ser facilmente sustentada e
frequentemente perdida inconscientemente durante uma tarefa.
4.2 Neurobiologia da Atenção
Com a finalidade de manter a função cognitiva da atenção no sistema
nervoso, é necessário que diversas áreas corticais e sub-corticais se
comuniquem. Estudos de neuroimagem cerebral têm evidenciado que o
43
fenômeno da atenção estimula diversas áreas corticais em várias porções do
cérebro.
No momento em que se presta atenção a algo, neurônios do lobo frontal
e do colículo superior (onde localizam-se um feixe de neurônios da visão) têm
sua atividade aumentada. O processamento visual e a associação, que
acontecem nos lobos occipitais e parietais, respectivamente, seguem o mesmo
padrão de aumento de disparos neuronais, sugerindo que a atenção tem o
poder de aguçar o processamento sensorial, facilitando as ações cotidianas de
tomada de decisão. Os lobos corticais que mais contribuem para o
processamento da atenção são o parietal, área pré-motora e córtex pré-frontal.
Considerando que essas áreas trabalham em sincronia, pode-se destacar que
o lobo frontal detecta o alvo e gera uma resposta adequada, ao mesmo tempo
que o lobo parietal orienta e foca nossa atenção.
Algumas áreas sub-corticais estão também envolvidas na atenção. A
formação reticular do tronco encefálico tem a função de definir qual estímulo
deve ser evidenciado, selecionando as informações que chegam, eliminando
ou diminuindo algumas e concentrando-se em outras, gerando o que é
chamado de atenção seletiva. A atuação do lobo frontal seleciona o que deve
ou não passar para o néocortex, caracterizando-o como um filtro primário. Esse
filtro atencional seleciona as informações mais relevantes ao indivíduo, os
quais teriam prioridade de serem processadas na região da formação
reticulada, permitindo o indivíduo focar e se concentrar com mais intensidade
nessa informação. Em alguns casos, determinadas informações podem furar
esse filtro e se tornarem “salientes” o suficiente para serem elevadas a
categoria de foco de atenção.
Como a capacidade atencional é limitada, esses estímulos salientes
facilmente atrapalham o foco em determinada atividade, como no caso de um
aluno que não consegue se concentrar em uma leitura (foco primário da
atenção) na sala de aula, a qual possui um ventilador barulhento desviando seu
foco (estímulo saliente).
A atenção pode ser regulada de duas formas: de “baixo para cima” e “de
cima para baixo”. No primeiro, os estímulos ambientais, bem como suas
características (se é um novo estímulo ou causa algum contraste) podem ser
tratadas como atenção reflexa, de cunho mais inconsciente. No segundo, a
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consciência é mais evidente, o que permite ser regulada por processos
mentais, a qual será chamado de atenção voluntária. A todo tempo as
informações sensoriais trafegam do néocortex para regiões inferiores e vice-
versa, com o intuito de realizar a seleção final dos estímulos que realmente são
relevantes para o organismo.
Fonte: Elaborado pelo Autor.
Em uma típica situação do cotidiano para explicar o processamento
atencional, está no momento que, por exemplo, numa reunião, escutamos
nosso nome ser pronunciado num grupo de conversa próximo. Imediatamente,
mudamos o foco da atenção para àquele grupo que entoou nosso nome, com a
finalidade de captar informações que são de interesse. Alguns aspectos da
atenção podem ser destacados nesse caso. Um estímulo externo (ambiental)
de alta saliência surge e desvia o foco da nossa atenção; logo, ajustamos o
foco da atenção para essa nova direção com o intuito de captar a maior
quantidade de informação possível. A partir da observação desse padrão de
desvio atencional foram originados dois sistemas que regulam esses
processos.
O sistema orientador, localizado no córtex parietal, permite o desvio da
atenção de um ponto para outro, como também realizar ajustes para que os
estímulos sejam claramente recebidos. Permite também que o foco da atenção
seja dedicado a outros sistemas sensoriais, como na ação voluntária de aguçar
mais a audição do que a visão numa conversa distante.
O sistema executivo permite a manutenção da atenção por um período
maior de tempo, ao mesmo tempo que inibe estímulos que podem causar
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distração. A área cerebral dedicada a essa função cognitiva localiza-se no giro
do cíngulo, localizada numa região mais interna do lobo frontal. A atenção
executiva está engajada em mecanismos de autorregulação que são capazes
de modular o comportamento de acordo com o contexto emocional e social da
situação. Ela torna-se importante na aquisição e manipulação da aprendizagem
consciente. Isso torna-se mais claro quando deparamos com alunos com
transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), que possuem uma
grande dificuldade em focar e manipular a atenção, e consequentemente, a
aprendizagem.
4.3 Atenção e Alerta
Uma importante consideração sobre o pleno funcionamento das redes
neurais da atenção pode ser feita quando se diz que o nível de vigilância ou
alerta que o indivíduo se encontra é determinante para manter atenção em
algo. O cérebro passa por variações de atividade e repouso todos os dias
(vigília e sono) e o estado de vigilância provoca flutuações consideráveis na
atenção. Durante a sonolência ou o sono, a atenção é prejudicada, e, portanto,
o sono torna-se componente crucial para o desempenho atencional. A privação
de sono, a qual gera sonolência é muito frequente na sala de aula, gerando
uma diminuição generalizada da atenção e prejuízos na aprendizagem.
Ao contrário disso, o alto estado de alerta tende a ocasionar um quadro
de ansiedade que prejudica, além da atenção, outras diversas funções
cognitivas. Para o cérebro realizar o processamento da atenção, portanto,
torna-se essencial um nível adequado de vigília para preservação das
habilidades de foco e eliminação de distrações.
No cérebro há um grupo de neurônios dedicados em regular os níveis de
vigilância. O núcleo dessa rede neuronal possui um pigmento azulado, o qual
foi nomeado de locus ceruleus (local azul), localizado logo abaixo do cérebro.
O neurotransmissor dessa rede neuronal é a noradrenalina, importante na estimulação e regulação do estado de alerta do organismo.
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4.4 Tipos de Atenção
Há dois tipos de atenção que são necessárias para se manter o foco em
uma determinada informação por vez: atenção sustentada e atenção seletiva.
Os outros dois tipos são necessários para manter o foco em múltiplas
informações ao mesmo tempo: atenção alternada e atenção dividida.
4.4.1 Atenção Sustentada
É a habilidade de focar em uma tarefa específica por uma longa duração
de tempo sem que nenhum fator de distração intervenha. A atenção sustentada
provavelmente reflete quando se escuta palavras de incentivo como: Atenção!
Foco! Concentre-se! Usa-se a atenção sustentada quando precisa-se manter o
foco em uma determinada tarefa ou se concentrar em uma atividade por um
período prolongado de tempo, as quais exigem distração mínima. Alguns
exemplos compreendem assistir uma aula, ler um livro ou assistir um vídeo.
É um tanto desafiador manter esse tipo de atenção por um período
extenso de tempo, considerando que a sociedade está cada vez mais saturada
de informações e situações frequentes que causam distração. Porém, o nível
de atenção sustentada pode variar, a partir do momento que se está
intensamente focados, e que, de repente, inicia-se um lapso (perda abrupta da
atenção). Contudo, uma grande vantagem da atenção sustentada é a sua
habilidade de retornar rapidamente ao foco após uma situação de lapso ou de
distração.
4.4.2 Atenção Seletiva
É a habilidade de selecionar e focar um dentre vários fatores ou
estímulos disponíveis. Todo dia se está exposto a um grande número de
estímulos ambientais, porém o cérebro realiza uma filtragem elaborada de
aspectos particulares que são relevantes para manter o foco. A atenção
seletiva basicamente permite ter a habilidade para selecionar o que necessita
realmente de atenção. Utiliza-se esse tipo de atenção quando, por exemplo, se
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está em uma multidão e se deseja ouvir apenas a voz de uma pessoa, ou
quando se tenta estudar num ambiente barulhento.
Quando utiliza-se a atenção seletiva, está tentando evitar que distrações
externas (barulho) e internas (o próprio pensamento) venham a prejudicá-la.
Portanto, pessoas que conseguem utilizar com eficácia a atenção seletiva são
muito boas em ignorar distrações e focar com mais facilidade, além de
manterem um nível estável de desempenho e produção mesmo na presença
de estímulos que a distraiam.
Vídeo
Assista ao vídeo Selective Attention Test, e verifique como a atenção seletiva funciona no cérebro.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=vJG698U2Mvo
4.4.3 Atenção Alternada
É a habilidade ligada à flexibilidade mental que permite mudar o foco da
atenção e transitar entre tarefas que exigem diferentes recursos cognitivos.
Nesse caso, torna-se possível alternar facilmente a atenção entre duas tarefas
que requisitam diferentes regiões cerebrais.
Utiliza-se a atenção alternada quase a todo momento. Frequentemente
se tem que fazer mudanças repentinas no cotidiano das atividades e ações, as
quais exigem mudanças no foco. Um exemplo disso é quando se está lendo
uma receita, ao mesmo tempo que cozinha o que está descrito (pois em um
momento o foco está na receita, e em outro, focado no cozimento dos
alimentos), ou quando se está alternando tarefas distintas, como cozinhar e
ajudar na tarefa do filho ao mesmo tempo.
4.4.4 Atenção Dividida
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É a habilidade de processar duas ou mais respostas ao mesmo tempo,
dividindo a atenção entre duas ou mais tarefas. Frequentemente refere-se à
atenção dividida com a capacidade multitarefa. Um exemplo seria quando se lê
um e-mail e ouve pessoas numa reunião, quando se está conversando ao
mesmo tempo que se alimenta, ou quando fala ao telefone ao mesmo tempo
que se veste.
Diferente da atenção alternada, na atenção dividida não permite que se
mude o foco de uma tarefa para outra, completamente diferente. Nesse caso,
se tenta realizar todas ao mesmo tempo, fato que permite dizer que está
dividindo a atenção.
Apesar da atenção dividida ser pensada como a habilidade de focar em
duas ou mais atividades ao mesmo tempo, torna-se quase impossível se
concentrar em duas tarefas distintas simultaneamente. O cérebro tem a
capacidade de processar apenas uma tarefa por vez, portanto, é mais factível
aceitar que se consegue focar em apenas uma tarefa por vez, o que indica que
a todo momento se está alternando entre tarefas. Isso explica o porquê é tão
difícil e perigoso estar ao telefone e dirigir ao mesmo tempo.
4.4.5 Alterações da Atenção e Suas Consequências
Grande parte das alterações nos processos atencionais são oriundas de
quadros lesionais e disfuncionais orgânicas, as quais podem sofrer alterações
de intensidade, como: alterações simples, brandas, oscilatórias e flutuantes. As
alterações relacionadas aos aspectos quantitativos da atenção são
classificadas como distração, hiperprosexia, hipoprosexia e aprosexia:
A distração é a dificuldade para concentrar a atenção sobre um estímulo
mais significativo. Ela pode ser frequente em pessoas com alto grau de
ansiedade, pelo fato de exibirem excesso de concentração. Ocorre
também em situações de hipervigilância, as quais envolvem focos
emocionais, como assistir filmes de terror, no terror noturno, condições
paranoides, fobia e uso de cocaína. Nessas situações, há uma flutuação
da atenção com qualquer estímulo ambiental.
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A hiperprosexia refere-se ao aumento significativo da atenção e
diminuição dos aspectos qualitativos da mesma. O indivíduo se
interessa por diversos estímulos sensoriais, possuindo dificuldade em
focar em um estímulo específico, sem conseguir processar com mais
complexidade os estímulos que realmente necessitam atenção. Nesse
estado torna-se comum quadros de excitação psicomotora, episódios
maníacos, transtorno hipercinético da infância e intoxicações por
cocaína ou estimulantes.
Na hipoprosexia ocorre o indivíduo é acometido de diminuição da
capacidade de atenção. Inclui quadros de depressão, embriaguez aguda
e patológica, autismo, demências, paralisias, esquizofrenia, transtorno
cognitivo leve, epilepsia, paralisia geral e deficiências mentais.
A aprosexia é caracterizada pela perda dos processos atencionais,
mesmo se os estímulos possuírem alto grau de intensidade. É
observada em quadros de deficiência mental, distúrbios metabólicos e
tóxicos, traumas cranioencefálicos subcorticais, inibição cortical e na
demência grave.
4.5 Atenção e Intervenções Pedagógicas
É importante frisar o fato de que o cérebro é especializado na detecção
de estímulos que possuem relevância para sobrevivência da espécie, pois o
mesmo está sempre pronto para o aprendizado. Essa informação é importante
para os professores, porém um grande desafio no meio escolar. O cérebro é
motivado a todo tempo para o aprendizado, mas apenas está disposto a isso
se reconhecer que o estímulo é significante. Logo, a principal estratégia de
atrair a atenção dos alunos é transmitir o conhecimento de maneira atrativa,
para que os alunos o julguem como importante.
Se o conhecimento em questão será significante ele precisa ter um certo
grau de ligação com o conhecimento já consolidado no aluno, que atenda suas
expectativas ou que seja estimulante e agradável. Uma boa estratégia para
atingir esse objetivo é apresentar previamente o conteúdo a ser abordado,
tentando sempre aplicá-lo ao cotidiano do aluno com a finalidade de criar
expectativas.
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A busca por um ambiente estimulante e agradável é possível se o
educador se preocupar sempre em envolver seus alunos em atividades que
assumam papel ativo, não os limitando como meros expectadores. Atividades
centradas no papel do aluno, usando a interatividade, apresentação e
supervisão de metas a serem alcançadas são também recursos utilizados para
otimizar o foco e a concentração dos alunos.
O ambiente escolar tem importante contribuição na manutenção do foco
e da concentração do aluno. Minimizar elementos que causam distração e
flexibilizar os recursos didáticos, usando adequadamente a voz, postura, e até
o bom humor são essenciais. O conteúdo com elevado grau de novidade e
contraste tende a se destacar no momento de focar a atenção do aluno.
Para manter a atenção por tempo prolongado é necessária ativação de
redes nervosas específicas, as quais depois de um certo tempo, tendem a
facilmente desviar a atenção a qualquer outro estímulo ambiental (externo) ou
qualquer pensamento que venham a sua mente (interno). Aulas muito extensas
com conteúdos complexos tendem a desviar o foco e a concentração dos
alunos, tornando necessário dividi-las em intervalos. Isso pode ser feito por
meio de pausas para descanso, os quais provocam relaxamento, ou dividindo o
tempo para abordar os conteúdos em módulos. Nessa situação, os recursos
atencionais são direcionados com mais eficácia aos assuntos abordados na
sala de aula.
Importante
A grande parte do conhecimento abordado na sala de aula é gerado graças ao funcionamento normal do processo atencional. Portanto, a atenção é a função cognitiva de maior importância no processo de aprendizagem. Qualquer situação adversa que venha comprometer o processamento da atenção poderá refletir em consequências nos outros domínios cognitivos, como na memória, linguagem e nas funções executivas.
Resumo da Aula 04
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A atenção é uma habilidade cognitiva que permite focar em determinada
informação ou estímulo. É uma função cognitiva complexa que é essencial para
o comportamento humano. Reúne basicamente a seleção de informações
externas (sons, imagens, cheiros) com internas (pensamentos) que podem ser
mantidas no cérebro com certo grau de consciência. Estudos de neuroimagem
cerebral têm evidenciado que o fenômeno da atenção estimula diversas áreas
corticais em várias porções do cérebro. Durante a sonolência ou o sono, a
atenção é prejudicada, e, portanto, o sono torna-se componente crucial para o
desempenho atencional.
Atividade de Aprendizagem
Na sua opinião, em uma aula de 50 minutos, os alunos conseguem permanecer em seu máximo estado de concentração por toda a aula? Por que algumas disciplinas conseguem manter os alunos focados por até 100 minutos e outras não conseguem nem em 30 minutos? Além disso, porque na mesma disciplina alguns professores conseguem manter o foco máximo dos alunos por longa duração de tempo, enquanto que outros não conseguem?
Resumo da Disciplina
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O cérebro humano foi feito para a aprendizagem, e isso é claramente o
seu papel no organismo. Desde o início da vida, na aquisição da visão, audição
e tato, até o momento das adaptações ao meio ambiente, crescimento e vida
adulta, o cérebro sempre está mudando, num processo intenso de
reconstrução e aprendizagem. Quando dormimos, o cérebro é bem diferente do
cérebro do início do dia, e, portanto, toda aprendizagem adquirida nesse
período diurno é consolidada no sono, para que um novo dia de intensa
estimulação cognitiva venha a modificar constantemente nosso cérebro.
A neurociência tem descoberto como o cérebro adquire, armazena e usa
as informações adquiridas no dia a dia, e ajuda a entender quais fatores
intrínsecos e extrínsecos limitam a otimização da aprendizagem. O
conhecimento do educador sobre os principais benefícios da neurociência na
aprendizagem torna-se de suma importância para direcionar estratégias mais
eficazes para o desenvolvimento pleno do conhecimento de seus alunos.
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Referências
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