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Roland Saldanha Página 1 05/05/2005

EEccoonnoommiiaass ddee EEssccaallaa,, CCoonnccoorrrrêênncciiaa IImmppeerrffeeiittaa ee CCoomméérrcciioo IInntteerrnnaacciioonnaall

KRUGMAN & OBSTFELD, CAP. 6; WTP, CAP. 8

OBS.: ESTAS NOTAS DE AULA NÃO FORAM SUBMETIDAS A REVISÃO, TENDO COMO ÚNICA FINALIDADE A ORIENTAÇÃO DA APRESENTAÇÃO EM CLASSE. COMENTÁRIOS SÃO BEM VINDOS E PODEM SER ENVIADOS A

[email protected]. REPRODUÇÃO SOB QUAISQUER MEIOS OU DISTRIBUIÇÃO PROIBIDA SEM AUTORIZAÇÃO PRÉVIA DO AUTOR.

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INTRODUÇÃO

o A compreensão da lógica subjacente ao comércio internacional moderno exige que se avaliem, além das motivações tecnológicas e de dotações/qualidade dos recursos em um ambiente concorrencial, as estruturas não concorrenciais de mercado.

o Efetivamente, existem e são importantes internacionalmente as estruturas de mercado em que os agentes não são meros tomadores de preços. Nestes casos, utilizam-se os elementos teóricos básicos da Organização Industrial e da Microeconomia para ajudar a compreender a realidade.

o As economias de escala, internas e externas, têm papel fundamental para justificar as diferentes estruturas de mercado domésticas e internacionais. O estudo inicia pela discussão desse conceito, associando-o ao comportamento não competitivo.

o A seguir, uma breve análise da concorrência monopolística em seu impacto no comércio internacional e, por fim, a discussão do conceito e lógica de dumping, a prática de venda de bens e serviços no exterior a preços inferiores aos observados na economia doméstica.

Economias de Escala

o O conceito de economias de escala se refere a uma classificação para o tipo de comportamento dos custos com o qual se defronta uma empresa à medida em que sua escala de produção varia.

o As economias de escala podem ser medidas pela elasticidade Custo da Escala (quantidade) de Produção, definida como na fórmula abaixo:

1)(<==

CMeCMg

CQ

dQQdCEc

o Percebe-se na fórmula que as economias de escala implicam uma redução dos custos médios de produção à medida em que a escala

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aumenta. Lembre-se que os custos médios estarão caindo sempre que forem maiores que os custos marginais.

o Aproveitando o ensejo, haveriam deseconomias de escala se Ec > 1, ou seja, se os custos médios aumentassem à medida em que a escala de produção também aumentasse.

o Presume-se que o aumento nas quantidades utilizadas de insumos seja ótimo, quer dizer, que as empresas estejam sempre escolhendo seus insumos de forma a minimizar os custos para as diferentes escalas de produção (sempre na tangência da isocusto mais baixa com a isoquanta que define uma escala de produção ou quantidade produzida).

o As economias de escala podem ser de dois tipos:

Internas: a redução de custos à medida em que a escala de produção aumenta depende apenas de aspectos internos à firma (tecnologia);

Quando existem economias de escala internas, uma empresa consegue reduzir seus custos (e ter produtos mais baratos/competitivos), com o aumento de sua escala produtiva. Assim, as economias de escala estimulam a especialização e concentração na produção: em vez de produzir muitos produtos em escala menor, a produção de um único produto, sob as economias de escala, implica uma alternativa mais interessante.

Externas: a redução de custos da firma decorre do aumento no tamanho da indústria (conjunto de firmas), normalmente associada à redução nos preços dos insumos quando há mais fornecedores.

O crescimento da indústria pode implicar reduções de custos para a firma por diversos motivos:

Especialização dos fornecedores de insumos;

Agrupamento da mão de obra;

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Transbordamentos tecnológicos.

o As economias de escala internas costumam determinar estruturas de mercado com um ou poucos fabricantes, operando em escalas bastante grandes, já as economias externas costumam implicar indústrias grandes, não necessariamente compostas por empresas grandes. É possível, entretanto, que haja simultaneamente economias de escala internas e externas.

o Outra fonte possível de redução de custos, que não se confunde com as economias de escala, são os retornos com o aprendizado (learning by doing). Tratam-se de ganhos de produtividade dinâmicos, que dependem da experiência na produção, número de unidade produzidas historicamente, e não da escala de produção, número de unidade de produção possíveis.

o Os ganhos dinâmicos são transitórios, mas podem explicar a proteção que alguns países dão a determinadas indústrias sob a justificativa de se tratar de uma indústria nascente. De fato, este tipo de proteção presta-se a permitir que a indústria acumule experiência na produção, de forma que possa participar do comércio internacional, quando a proteção for eliminada, de forma mais competitiva.

Concorrência Imperfeita: Aspectos Básicos

o Uma estrutura de mercado é dita “de concorrência imperfeita” quando os agentes envolvidos não são tomadores de preços, ou seja, conseguem afetar os preços de mercado propositalmente com suas ações. Os casos extremos de concorrência imperfeita costumam ser associados ao monopólio, em que existe um único ofertante no mercado, e ao monopsônio, em que há um único demandante. Vale notar que a quantidade de agentes envolvidos é importante, mas não é condição suficiente para que possam interferir nos preços de mercado. De fato, um monopolista diante de uma demanda perfeitamente preço-elástica não tem poder de mercado algum.

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o Pelo lado da oferta, entre a concorrência perfeita e o monopólio encontram-se duas outras estruturas de mercados típicas: a concorrência monopolística e os oligopólios. A tabela abaixo apresenta as principais características destas diferentes estruturas de mercado, lembrando que se tratam de estruturas ideais, teóricas, deve-se esperar na realidade estruturas de mercado intermediárias:

Estrutura Número de Ofertantes

Características Básicas

Concorrência Perfeita

Muitos, “atomizados”

Agentes tomadores de preços, produtos homogêneos, ausência de barreiras à entrada/saída.

Concorrência Monopolística

Alguns, especializados

Produtos diferenciados, no curto-prazo agem como monopolistas, no longo-prazo, agem como firmas concorrenciais. Barreiras à entrada/saída baixas.

Oligopólio poucos Produtos homogêneos ou diferenciados, altas barreiras à entrada/saída, problemas estratégicos entre os participantes.

Monopólio um Produto único, altas barreiras à entrada.

Monopólio - Revisão

o O problema típico do monopolista é o de encontrar a quantidade ótima a ser produzida (aquela que maximiza seus lucros), dados:

As características da demanda em seu mercado (a curva de demanda); e,

Os custos de produção.

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o Graficamente, o problema é posto na figura abaixo. O monopolista “enxerga” uma curva de demanda de mercado e seus custos, se deseja maximizar os lucros precisa encontrar a quantidade produzida (ou ofertada) que faz com que suas receitas marginais se igualem aos custos marginais.

o Para encontrar a produção compatível com o lucro máximo, o monopolista precisa levar em consideração o seu poder sobre o preço de mercado. O preço recebido por unidade vendida (receita média) é definido pela quantidade que o monopolista oferta no mercado: é o preço definido na curva de demanda para aquela quantidade ofertada pelo monopolista. De forma mais geral, a receita total do monopolista é dada por RT = PQ, mas o preço é função da própria quantidade ofertada, ou seja, RT = P(Q) Q. Assim, a Receita Marginal do monopolista é dada por:

PdQdQQ

dQdP

dQdRTRMg

PQRT

+==

=

ou, multiplicando e dividindo o primeiro termo do lado direito por P:

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PPQ

dQdPP

dQdRTRMg 1+==

recordando a definição da elasticidade preço da demanda:

+=+=

=

DD

D

PQPQ

PQ

PPPRMg

PQ

dQdP

εε

ε

111

logo, ,1

assim, para maximizar os lucros, o monopolista deve ofertar a quantidade que faz valer a igualdade RMg = CMg:

CMgPRMgDPQ

=

+=ε

11

o Note que o poder de mercado do monopolista decorre da faculdade de cobrar preços superiores aos custos marginais. A elasticidade-

preço da demanda, DPQε, situa-se entre 0 (bens cuja demanda é

completamente inelástica aos preços), e - ∞ (bens de demanda completamente preço-elástica). Assim, se a elasticidade preço da demanda tender a - ∞, mesmo que o produtor seja o único ofertante do mercado (monopólio), não terá poder de mercado, vale dizer, cobrará um preço igual a seus custos marginais, ou, no máximo,

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igual aos seus custos totais médios (caso de economias de escala). Já se a demanda for pouco preço-elástica, digamos, com uma elasticidade igual a – 4, o preço que maximiza os lucros será igual a 1,33 vezes os custos marginais. (cheque os cálculos!).

o Note, ainda, que a Receita Marginal estará sempre abaixo da curva de demanda, que representa a Receita Média. Isto pode ser

entendido diretamente pela fórmula acima, onde DPQε

é a elasticidade preço da demanda (negativa), ou graficamente, pois quando a Receita Média está caindo, a Receita Marginal precisa ser menor do que a média.

o Krugman & Obstfeld trabalham com uma função demanda de mercado linear, da forma

bPaQD −=

mas, o Preço é função da quantidade ofertada, pelo que a equação da demanda poderia ser reescrita como:

Qbb

aP 1−=

como a Receita Total é produto entre preço e quantidade, multiplicando a expressão para P por Q:

21Qb

QbaPQRT −==

de forma que, a receita marginal, para esta curva de demanda específica é dada por:

Qb

PQbb

aQRT 112 −=−=∂∂

o A firma maximiza os lucros quando RMg = CMg. De fato, o monopolista escolherá a quantidade produzida de acordo com esta regra, o preço a ser cobrado por unidade, entretanto, normalmente será maior do que os custos marginais (lembre-se que o Preço na

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derivação acima saiu da curva de demanda), podendo ser encontrado pela substituição da quantidade escolhida na curva de demanda ou receita média.

o O raciocínio da comparação dos custos marginais com as receitas marginais precisa ser complementado quando existem economias de escala (custos marginais menores do que os custos médios). De fato, sempre que houver custos fixos, os custos médios terão um componente que não entra no raciocínio marginalista, vale dizer, a regra RMg = CMg não leva em consideração os custos fixos. Assim, não há garantia de que a Receita Média seja igual ou maior do que os custos totais médios quando se está na presença de economias de escala. Este teste precisa ser feito e:

Se os custos médios forem menores do que as receitas médias, o monopolista aufere lucros positivos;

Se os custos médios forem iguais às receitas médias, o monopolista tem lucro econômico igual a zero, o mesmo de empresas competitivas;

Se os custos médios forem maiores que o preço, o monopolista teria prejuízo produzindo aquela quantidade. Neste caso, o preço mínimo que o monopolista estaria disposto a receber para participar do mercado seria aquele que cobrisse os custos totais médios. Normalmente, este problema é raro na prática dos monopólios, mas é importante levá-lo em consideração, especialmente em estruturas de concorrência monopolística (discutidas abaixo).

o Os lucros do monopolista são dados pela diferença RT-CT, ou, (RMe-CTMe)Q. Graficamente, o retângulo com altura igual a PM (P = RMe) e base igual a QM têm uma área igual às Receitas Totais. O retângulo de altura AC (CTMe) e base QM, têm área igual aos Custos Totais. Assim, os lucros do monopolista podem ser encontrados pela diferença entre as áreas dos dois retângulos.

o Os lucros econômicos positivos do monopolista são “anormais”, ou seja, excedem a rentabilidade normal derivada do uso concorrencial dos recursos. Assim, há um estímulo à entrada de empresas neste mercado, procurando compartilhar estes lucros acima do normal. No

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monopólio, enquanto as barreiras à entrada/saída forem altas, os lucros anormais do monopolista poderão ser preservados. Se, entretanto, as barreiras diminuírem, a entrada de novas firmas será inevitável.

o Com a eventual entrada de novas firmas, como acontece normalmente em mercados de concorrência monopolística, melhor analisados abaixo, o efeito básico percebido pelo monopolista é o de um deslocamento para a esquerda (ou para baixo) de sua curva de demanda. Tente fazer um gráfico do problema do monopolista comparando a situação sem concorrência e a decorrente da entrada de novas empresas no mercado. Os lucros de monopólio tendem a diminuir e o interesse de entrantes neste mercado só para de existir quando os lucros econômicos deixarem de ser positivos. A situação concorrencial é a de lucro econômico zero!

Concorrência Monopolística

o Na concorrência monopolística, os participantes do mercado detêm um monopólio transitório, de curto-prazo, que perdura enquanto os consumidores perceberem os produtos como diferenciados. Como as barreiras à entrada são baixas, a imitação dos produtos que tenham diferenciais lucrativos faz com que seus preços diminuam, levando, em última instância, à saída de alguns participantes do mercado e eliminando os lucros de “monopólio”.

o Têm-se, assim, uma estrutura de mercado parecida com os monopólios no curto-prazo, tendendo a uma solução concorrencial no longo-prazo. Em linhas gerais, esta estrutura de mercado induz o aparecimento permanente de novidades, invenções, produtos diferenciados, na proporção em que são estes diferenciais que justificam os lucros positivos de curto-prazo. Normalmente, entretanto, o excesso de diferenciação pode impedir o aproveitamento de economias de escala, causando uma diferenciação

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excessiva. O comércio internacional, ampliando as dimensões dos mercados consumidores, pode diminuir o problema de excesso de diversificação e melhorar os benefícios de economias de escala.

o Um modelo estilizado, apresentado por Krugman e Obstfeld, supõe que uma firma em concorrência monopolística se depara com uma curva de demanda negativamente inclinada (tem poder de mercado), mas que depende

Do número de empresas participantes do mercado, n. A participação de mercado da empresa considerada, supondo que todas as empresas tenham o mesmo tamanho e que as vendas totais neste mercado tenham o valor S, será igual a (1/n)S;

Da substitutibilidade entre o produto da empresa considerada e os dos demais fabricantes. Supõe-se, de forma genérica, que uma redução no preço dos bens concorrentes,P , diminua a demanda pelo bem fabricado pela empresa de acordo com o parâmetro b.

o A função demanda linear, dadas estas suposições, tem a seguinte especificação:

( )

−−= PPbn

SQD 1

o No que concerne aos custos de produção, supõe-se que todas as empresas trabalhem com estruturas de custos idênticas, com:

Custos Totais: cQFCT += , onde F são os custos fixos e c os custos variáveis por unidade;

Custos Totais Médios: c

QFCMe

QQc

QF

QCT

+==+=, ou, lembrando

que a quantidade produzida pela firma corresponde à sua fatia de mercado, Q = S/n:

( ) cSFncFc

QFCMe

nS

+=+=+=

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o Dado o tamanho do mercado, S, os custos médios de uma empresa participante aumentam à medida em que o número de participantes aumenta (a escala de produção de cada empresa diminui, pois sua fatia de mercado se reduz).

o Dados os preços cobrados pelas demais empresas, o problema de maximização dos lucros pela empresa considerada consiste da escolha da quantidade produzida que iguala RMg e CMg, cobrando, então, o preço máximo por aquela quantidade. Os passos são:

Encontrar a RT, a partir da função demanda:

Isola-se P, expressando-o em função de Q:

( )

SbQP

bnQPSb

nS

SbP

PSbSbPnSPPb

nSQD

−+=

−+=

⇒+−=

−−=

11

1

Multiplica-se P por Q, para obter a expressão para a RT:

SbQQPQ

bnPQ

21−+=

Encontra-se a Rmg:

SbQP

SbQQPSb

nS

SbSbQP

bnQRT

−=−

−+=−+=

∂∂ 121

Encontra-se o CMg:

cdQdCT

=

Iguala-se Cmg a Rmg:

CMgcSbQPRMg ==−=

ou,

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SbQcP +=

o Lembrando que S = Qn, pode-se reescrever a condição de maximização de lucro de forma a perceber que um aumento no número de empresas (n) implica uma redução dos preços cobrados pelas formas individualmente:

QnbQcP +=

o A equação dos custos totais médios e da maximização de lucros em função do número de empresas podem ser representadas graficamente:

o No ponto em que o número de firmas iguala os custos médios aos preços, os lucros econômicos são nulos, ou seja, o mercado tende a ter, no longo-prazo, n2 firmas. Quando há apenas n1 firmas, os preços são maiores do que os custos e, com lucros de monopólio, novas firmas são atraídas ara o mercado. Com n3 firmas, as participantes do mercado têm prejuízos econômicos, tendendo a sair do mercado até que se atinja o número n1 de firmas.

Concorrência Monopolística e Comércio

o Como já se aventou, uma economia fechada limita as possibilidades de especialização. No modelo de concorrência

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monopolística, esta restrição aparece na variável S, o montante de vendas. Uma elevação em S desloca a curva CC para a direita, ampliando o número de firmas que podem participar do mercado em equilíbrio, pois os custos médios diminuem.

o Note que a mera expansão dos mercados envolvidos, pelas economias de escala associadas, viabilizam um maior comércio internacional. Este fenômeno não depende da existência de vantagens comparativas, é uma nova explicação para o comércio internacional.

o Veja este efeito na figura abaixo e examine o exemplo numérico apresentado por Krugman e Obstfeld.

Comércio Inter-industrial e Intra-industrial

o A existência das economias de escala, internas e externas, dá razão a um tipo de comércio que não precisa ser amparado nas vantagens comparativas. De fato, pelas vantagens comparativas um país tende a exportar os bens para os quais tenha custos relativos de produção menores, importando os outros tipos de bens. Este tipo de comércio envolve transações com bens diferentes, produzidos em indústrias diferentes. Chama-se comércio INTER-industrial.

o O comércio baseado em economias de escala, a seu turno, depende fundamentalmente da existência de demanda suficiente para justificar a produção especializada, de produtos diferenciados e

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em larga escala. Uma economia fechada não teria condições de produzir os todos os diferentes bens de uma indústria aproveitando as economias de escala, a variedade seria limitada pela demanda doméstica e os custos de produção seriam mais altos, pois as escalas seriam menores. Com a ampliação de mercados trazida pela abertura comercial, portanto, torna-se factível a especialização mais profunda, cada país produzindo uma pequena variedade de bens similares, mas diferenciados, em grande escala e a custos médios baixos. A variedade dos bens disponíveis aos consumidores, entretanto, aumentaria através das importações. Trata-se de um comércio de bens similares, de uma mesma indústria, manufaturas, por exemplo, denominado comércio INTRA-industrial.

o O comércio intra-industrial, ao prescindir de fatores que justifiquem as vantagens comparativas (diferenças de tecnologias, dotações, especificidade de fatores...) pode ser realizado entre países estruturalmente bastante parecidos. De fato, a maior parte do comercio entre países desenvolvidos é da modalidade intra-industrial, um exemplo típico sendo o observado na União Européia. Este tipo de comércio não tem implicações importantes em termos de redistribuição de renda interna aos países que os realizam, os setores crescerão em todos os países participantes, ainda que de forma especializada em determinados produtos.

o A especialização na produção decorrente do comércio intra-industrial, vale dizer, não segue qualquer padrão pré-definido. De fato, a probabilidade de que um país se especialize na produção de uma determinada variedade de um bem depende muito da sorte e contingência histórica. O país que iniciar antes sua especialização em um bem que tenha ampla demanda internacional perceberá, pelas economias de escala, vantagens concorrenciais sobre os demais.

o Finalmente, uma fórmula usada para calcular a importância do comercio intra-industrial em relação ao comércio inter-industrial relativo a um determinado setor, i, seria:

ii

iii

MX

MXI

+

−−= 1

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Se a indústria i realiza apenas comércio inter-industrial, será uma exportadora ou uma importadora de bens, não ambos. Assim. X ou M serão nulos na fórmula acima e I será igual a 0 para a indústria i.

Se a indústria i realiza apenas comércio intra-industrial, exportando exatamente o mesmo valor importado, o valor do numerado será igual a 0, e o índice I será igual a 1.

Quanto mais próximo de 1 (mais distante de 0) estiver I, maior a importância do comércio intra-industrial para a indústria em questão. Vide a Tabela 6-3 para exemplos.

Dumping

o A prática de dumping consiste da discriminação internacional de preços, mediante a qual o preço do produto no mercado importador é fixado a menor do que o observado no mercado do país de origem. As notas abaixo extrapolam um pouco o texto de Krugman & Obstfeld, aprofundando a análise.

o Trata-se de conduta de âmbito comercial, mais especificamente, de expediente condenado pela boa prática do comércio internacional. Existindo alguma indústria ou empresa doméstica no país importador que se perceba prejudicada pelo dumping, o tema costuma ganhar destaque e o interesse das autoridades domésticas competentes.

o Para entender os possíveis motivos pelos quais uma empresa tentaria colocar seus produtos em mercados estrangeiros a preços menores do que os praticados no país de origem recorre-se, ainda hoje, às lições de Jacob Viner . Segundo o autor, três razões poderiam subjazer à prática de dumping:

i) a conveniência de escoar eventuais e inesperados excedentes produtivos domésticos, sem reduzir os preços praticados no mercado de origem (dumping esporádico);

ii) a estratégia de entrar em determinado mercado, conquistando participação significativa ou expulsando os concorrentes lá existentes. Para justificar esta linha de ação, a entrada e

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monopolização do mercado estrangeiro precisariam permitir, num segundo momento, a elevação dos preços no mercado estrangeiro a níveis até maiores do que os observados antes do dumping (dumping de curto-prazo, ou dumping predatório); e,

iii) a intenção de alcançar, ou manter, larga escala de produção no país de origem, aproveitando as reduções nos custos de produção associadas (dumping de longo-prazo).

o A viabilidade da prática de dumping, qualquer seja sua motivação, deve ser bem apreendida. Trata-se de conduta cuja viabilidade é condicionada, inexoravelmente, pela possibilidade de discriminação entre mercados, de separação de regiões comerciais estanques em que serão cobrados preços diferentes para produtos iguais. Efetivamente, não é possível, sob qualquer hipótese, realizar dumping entre mercados que se mostrem interligados. De fato, se existe em certo país produto idêntico (ou muito similar) disponível a preços menores do que em outro, os consumidores não estarão dispostos a adquiri-los aos preços mais altos. Há que se ter claro, portanto, que condições especialíssimas – mormente quando se considera a alta integração dos mercados internacionais na modernidade – são necessárias para que a prática de dumping seja logicamente possível e economicamente interessante. Para que haja a chance da prática de dumping é necessário que barreiras artificiais (tarifas, cotas, restrições administrativas) ou naturais (custos de transporte, seguros, problemas informacionais) logrem isolar os mercados doméstico e estrangeiro.

o No caso do dumping esporádico, o exportador procura vender produtos a preços maiores em seu próprio país, desviando para outro as eventuais sobras de produção. A oferta dos excedentes no país de origem faria seus preços diminuírem, razão do direcionamento do mesmo a outros mercados. Isso traz prejuízos tanto aos consumidores do país de origem quanto aos produtores (de bens substitutos) do país de destino. Os consumidores do país de destino, contudo, apreciam a redução dos preços das mercadorias estrangeiras e suas substitutas domésticas, ainda que eventual. O dumping aqui tratado é de caráter esporádico, interessante apenas quando a produção no país de origem é maior, por erro de previsão, do que demanda doméstica. A constatação da prática desta

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modalidade de dumping depende da detecção de variabilidade eventual e transitória de preços e quantidades exportadas do produto em questão, não exibindo caráter prolongado.

o O dumping de curto-prazo, por sua vez, implica estratégia análoga à prática de preços predatórios, ou underselling. Pode-se antecipar, contudo, que neste caso a venda de produtos a preços inferiores aos praticados no mercado de origem constitui uma forma de “investimento” estratégico. Com efeito, o produtor no país de origem estaria disposto a sofrer prejuízos (ou redução de lucros) transitórios com a redução de seus preços, enquanto fragiliza e elimina a concorrência no país de destino. Após ter logrado a monopolização do mercado de destino, precisa recuperar os custos da dominação do mercado, elevando os preços a patamares maiores que os praticados antes da estratégia de dumping.

o Na situação de dumping predatório, o interesse econômico na realização do “investimento” estratégico representado pelos prejuízos contabilizados durante o período de predação exige que - após a ulterior elevação dos preços - inexista a possibilidade de retorno dos participantes expulsos do mercado (re-entrada) ou de entrada de novos participantes. Efetivamente, caso a expulsão ou fragilização dos concorrentes fosse apenas transitória, a recuperação dos gastos com a predação seria inviável, tornando a estratégia ilógica e inconveniente sob o ponto de vista econômico. Somente na hipótese da existência de barreiras à entrada e re-entrada em determinado mercado suficientemente altas, portanto, a estratégia de dumping de curto-prazo poderia interessar ao produtor do país de origem. Sendo factível, o dumping predatório é pernicioso tanto aos produtores quanto aos consumidores do país importador.

o Finalmente, o dumping de longo-prazo encontra amparo lógico no intuito de um fabricante no país de origem aproveitar ao máximo sua capacidade produtiva instalada quando esta é sujeita a economias de escala. Nessa situação, os produtores no país de origem perceberiam diminuições de custos com a elevação de sua escala de produção. A oferta de mais produtos no próprio país de origem poderia ser pouco interessante, na medida em que implicasse a redução dos preços daquele mercado. Assim, sendo possível estabelecer preços diferentes no país de origem e em outras nações, a prática de

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dumping teria algum respaldo lógico: os preços no país de origem permaneceriam altos e os custos de produção diminuiriam, com as economias de escala, pela ampliação das quantidades vendidas em mercados estrangeiros.

o Novamente, essa última modalidade de dumping depende da possibilidade de isolar os mercados de origem e destino, praticando preços diferentes em cada qual. Ainda, mostra-se benéfica aos consumidores do país de destino e aos produtores no país de origem, prejudicando os produtores do país de destino e os consumidores do país de origem. Baseada na utilização eficiente dos recursos exige análise mais detalhada para que se possam avaliar os resultados líquidos, em termos de bem-estar, nas sociedades produtoras e importadoras das mercadorias envolvidas.

o O grande dilema que se coloca às autoridades responsáveis pela política comercial dos países submetidos à eventual prática de dumping e às entidades internacionais de composição dos litígios envolvidos encontra-se na dificuldade em discernir entre as situações em que o dumping efetivamente ocorre e aquelas em que se observa a simples e salutar operação da concorrência de mercado. De fato, produtores domésticos ineficientes, utilizando escalas de produção pouco competitivas ou tecnologias ultrapassadas sentem-se pressionados pela concorrência de produtores estrangeiros mais eficientes, sendo comum a tentativa de eliminar a incômoda competição alienígena mediante o apelo à tutela estatal, argüindo, ainda que com tíbia fundamentação, a prática de dumping pelos concorrentes estrangeiros.

o Na proporção em que empresas menos eficientes são mais expostas à concorrência internacional, as acusações de práticas de dumping, especialmente as infundadas, tendem a aumentar. Paradoxalmente, a maior exposição ao comércio internacional, com a redução das barreiras que separam os mercados, reduz a possibilidade da efetiva prática de dumping.

o A tendência mundial no sentido da diminuição da proteção aos mercados nacionais ressurge com a constituição do Acordo Geral de Tarifas e Comércio - GATT, em 1947. Após a elaboração do referido Acordo, diversas rodadas de negociação multilateral entre os países

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signatários foram realizadas , tendo a última ficado conhecida como a "Rodada do Uruguai", iniciada em 1986 e concluída em 1993. O sentido claro dessas mesas de negociação é o de procurar reduzir os esquemas de proteção tarifária e não tarifária entre os países, incrementando o comércio internacional e favorecer todas as comunidades envolvidas. Nessa linha, o processo internacional de liberalização comercial, ao reduzir e expor os mercados dos diferentes países à concorrência internacional, facilita a ocorrência de ocorrências de acusações infundadas de prática de dumping, ainda que diminua a possibilidade de discriminação entre mercados.

o Finger (1999) atesta que, atualmente, cerca de 40 países contam com regulamentação doméstica para combater o dumping. É neste contexto que se deve compreender a regulamentação imposta sob o Artigo VI da GATT - 1994 , que cuida dos procedimentos de investigação e proteção das indústrias domésticas ao dumping.

o Na referida legislação encontram-se parâmetros para orientar a detecção e dimensionar a magnitude do dumping eventualmente praticado. Em termos procedimentais, com base em denúncia de empresa doméstica interessada, ou ex officio, as autoridades competentes - no Brasil a SECEX -, iniciam procedimento de investigação antidumping. Nessa investigação importa averiguar:

i) a efetiva ocorrência de dumping;

ii) a eventual ocorrência de dano à indústria doméstica; e,

iii) a existência de nexo causal entre o possível dumping e eventual dano à indústria doméstica.

o Finalmente, é conveniente notar que a constatação da prática de dumping normalmente enseja combate pela imposição de direitos antidumping definitivos. Estes representam montantes pecuniários, usualmente definidos sob a forma de taxas ad valorem sobre os preços de importação, que são recolhidos, como se fossem impostos, aos cofres públicos. A magnitude dos direitos antidumping é determinada a partir da diferença entre os preços "normais" - aqueles que, segundo os cálculos, não configurariam dumping, - e os preços de "exportação". Potencialmente, a imposição de direitos antidumping tem dois efeitos: (i) aumentar os preços dos produtos

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por eles atingidos para os consumidores domésticos; e (ii) estimular as empresas estrangeiras afetadas pelos direitos antidumping a, no futuro, diminuírem as exportações para o país que as penaliza, numa modalidade de restrição comercial denominada "Restrição Voluntária às Exportações" (RVE). As RVE fazem com que, pela menor oferta de produtos no mercado de destino, lá sejam praticados preços maiores, compatíveis com os interesses dos produtores domésticos. Deixando de incomodar aos produtores tutelados no país de destino, no decorrer do tempo as empresas estrangeiras passam a lá disponibilizar produtos a preços mais altos, imunes aos direitos antidumping. Por esta via, as RVEs redundam na cobrança, pela própria empresa estrangeira, dos valores correspondente aos direitos antidumping anteriormente impostos. É notável e inconteste a inconveniência social trazida pela tutela, quando este for o caso, dos interesses de uma indústria doméstica ineficiente: conforta-se um estreito e incompetente ramo industrial às custas de milhares de consumidores e do próprio bem-estar da sociedade, valor último a merecer efetivo amparo estatal.

o O gráfico abaixo mostra a lógica geral da precificação no dumping. Note que há discriminação entre o mercado doméstico e estrangeiro, identificam-se duas curvas de demanda distintas, uma negativamente inclinada (a domestica) e, neste caso, outra horizontal ( a estrangeira). No mercado internacional o produtor não tem poder de mercado, mas domesticamente se depara com uma curva de demanda negativamente inclinada. Assim sendo, se conseguir praticar preços diferentes no mercado doméstico e no mercado internacional, ofertará QDOM unidades na economia doméstica, praticando um preço superior ao internacional, e ofertará a quantidade (QMonopoly – Q Dom) no mercado internacional, aos preços internacionais..

Roland Saldanha Página 22 05/05/2005

o Uma curiosidade interessante é o caso do dumping recíproco, em que e,presas produtores do mesmo bem em países diferentes discriminam entre seus mercados domésticos e os estrangeiros. Se isto ocorrer, cada produtor domestico estará contestando o mercado do produtor do outro país, e vice-versa. Evidentemente, o dumping recíproco limita a possibilidade de exercer preços domésticos muito superiores aos internacionais que, no limite, só poderiam diferir pelos custos de transporte e eventuais tarifas. Esta possibilidade é interessante na medida em que serve para explicar o fato (raro) de um país exportar e importar exatamente o mesmo bem.

Perguntas

o Problemas do Capítulo 6 – Krugman & Obstfeld: Todas

Bibliografia

Caves, Richard E., Frankel, Jeffrey A., Jones, Richard W. World, Trade and Payments: An Introduction. USA: Addison Wesley, 1999. Finger, J. Michael. "GATT EXPERIENCE WITH SAFEGUARDS:Making Economic and Political Sense of the Possibilities That the GATT allows to Restrict Imports." World Bank. 1999 Krishna, Raj. "Antidumping in Law and Practice." World Bank Economic Papers. 1823. 37 p: World Bank, 09/1997

Roland Saldanha Página 23 05/05/2005

Krugman, Paul R., Obstfeld, Maurice. Economia Makron Books, 1999.


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