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EDUCAÇÃO CORPORATIVA: UMA ESTRATÉGIA PARA DESENVOLVER
COMPETÊNCIAS NO MERCADO IMOBILIÁRIO
Julyane Cardozo de Souza*
RESUMO
O presente artigo objetiva conhecer o perfil dos corretores atuantes no mercado imobiliário de
Porto Alegre, identificando as estratégias que as imobiliárias adotam para desenvolvê-los e
como eles se sentem com relação às mesmas. A fim de responder a estas questões, aplicou-se
uma pesquisa quantitativa em 473 alunos de seis escolas técnicas de formação de corretores
localizadas em Porto Alegre e Região Metropolitana (sendo todos eles já atuantes no
mercado). A análise de dados se baseou nas informações obtidas de entidades de referência
para o setor como COFECI e CRECI’s regionais e, além destas, utilizou como referencial
teórico pesquisadores de renome no campo da Educação Corporativa e do Desenvolvimento
Profissional. Os resultados apontaram que o maior percentual dos entrevistados é do sexo
masculino e com ensino superior; possui menos de um ano na profissão e se concentra na
intermediação de empreendimentos em lançamento. O que os motivou a ingressar neste
mercado foi a falta de oportunidade de trabalho em seus ramos de formação e a promessa de
altos ganhos financeiros. Em suas imobiliárias, a principal exigência está na captação de
clientes, porém não há treinamentos a fim de preparar os profissionais para isso, o que faz
com que os mesmos se sintam inseguros e desejosos de algum programa efetivo de
desenvolvimento. Além disso, percebem seus líderes sem competência para auxiliá-los e,
nesse contexto não pretendem construir uma carreira sólida e longeva na corretagem.
Palavras-Chave: Mercado imobiliário. Corretagem. Diferenciais competitivos.
Desenvolvimento. Educação corporativa.
1 INTRODUÇÃO
Nos tempos atuais, os profissionais têm se deparado com um mercado de trabalho
* Discente do curso MBA em Gestão de Pessoas e Liderança Coach da Universidade La Salle – Unilasalle,
matriculada na disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso. E-mail: [email protected], sob
orientação da Profª. Mª Beatriz Prange Martini. E-mail: [email protected]. Data de entrega: 09 jul.
2018.
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altamente competitivo e acelerado (tanto em inovações tecnológicas quanto em produção de
conhecimentos). O Ensino Superior, que antes era a formação necessária para se conseguir
espaço de destaque em alguma empresa de nosso país, já não é mais suficiente para garantir
nem mesmo a empregabilidade do indivíduo. Vivemos num mundo em que os conhecimentos
precisam ir além dos diplomas acadêmicos; e a capacidade de construí-los e saber utilizá-los a
favor dos objetivos das organizações é um grande diferencial; e, mesmo que os indivíduos se
preparem para poder concorrer aos melhores cargos, nem sempre as competências que
possuem são suficientes ou compatíveis às necessidades específicas do negócio em que
querem ingressar.
Por outro lado, as organizações precisam inovar, se desenvolver e diferenciar para
poderem sobreviver à concorrência acirrada do mercado em que estão inseridas. Elas não têm
tempo suficiente para esperar “surgir” o profissional mais talentoso ou completamente
conhecedor do negócio, com as habilidades essenciais para o sucesso do mesmo. Esses fatores
reunidos provocaram o surgimento do conceito de Educação Corporativa - forma de
promover, estimular, desenvolver e capacitar os profissionais já inseridos na organização,
viabilizando-lhes o desenvolvimento de competências que serão, além de benéficas para suas
qualificações pessoais, grandes impulsionadoras das performances empresariais. Além desses
aspectos, é preciso considerar que cada mercado tem as suas necessidades, exigências,
potencialidades e desafios; e cada empresa tem o seu posicionamento, seus processos e sua
cultura.
A economia brasileira, mesmo que esteja tentando reagir a um período de grande
recessão pelo qual tem passado nos últimos três anos, apresentou crescimento em muitos
segmentos nas últimas décadas, sendo que um dos mercados que mais se destacou foi o
mercado imobiliário. Com a construção civil em pleno aquecimento e o surgimento de
inúmeros imóveis para a comercialização, houve a necessidade crescente da atuação de
corretores de imóveis para o alinhamento das intermediações. Atualmente, existe um déficit
de cento e cinquenta mil profissionais, para os trezentos mil corretores de imóveis ativos e
devidamente regularizados em todo o Brasil.
Percebe-se claramente uma grande preocupação por parte das imobiliárias em atrair
profissionais qualificados e capazes de transformar os recursos disponíveis em resultados.
Como este perfil está em falta, a alternativa é abrir a oportunidade para
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indivíduos de diferentes áreas que tenham o desejo de tornarem-se corretores de imóveis.
Essa é uma associação autônoma, sem salários, benefícios ou ajuda de custo, a qual exige
investimentos básicos que iniciam com a matrícula em um curso Técnico em Transações
Imobiliárias e o pagamento da taxa da carteira de estagiário do CRECI. Portanto, atrair
indivíduos dispostos a arcarem com estes custos é o primeiro desafio, tendo as imobiliárias
que inovarem em seus processos para despertarem o interesse dos “candidatos” à
associação.
Feita a associação, surge o segundo desafio: a execução. É necessário que o
profissional conheça esse mercado e todo o processo de intermediação de um imóvel, desde a
prospecção do cliente até a entrega do contrato e o recebimento da comissão. Quanto mais
lento o entendimento desse processo, mais gastos se geram para as imobiliárias (que investem
sem retorno) e para esses profissionais (que despendem de recursos próprios para garantir
deslocamento, alimentação, vestimenta, etc.). Para tentar minimizar o período de espera e
encurtar o tempo entre o ingresso na profissão e a primeira intermediação, as imobiliárias
buscam desenvolver estratégias de preparação e treinamentos pontuais para capacitar e
transmitir segurança aos que estão ingressando. Esse é outro ponto que merece atenção, pois
nem sempre as propostas oferecidas são efetivas para que esse profissional desenvolva as
habilidades, conhecimentos e atitudes necessários. Ficando sempre a dúvida do quanto estão
contribuindo para o resultado final.
Pela falta de preparação consistente e a demora no acontecimento da primeira
intermediação (fatos que vão afetando não somente a parte financeira, mas também o
emocional dos corretores; e gerando um alto turnover no mercado), surge o terceiro grande
desafio: reter os profissionais pelo máximo de tempo possível.
Por isso, o presente artigo tem por objetivo conhecer o perfil dos corretores atuantes
no mercado imobiliário de Porto Alegre, identificando as estratégias que as imobiliárias
adotam para desenvolvê-los e como eles se sentem com relação às mesmas.
Visando encontrar a resposta para esta problemática, este trabalho propõe-se a: a)
Identificar o perfil do corretor de imóveis em exercício nos dias atuais; b) Conhecer as
estratégias que as imobiliárias adotam para desenvolvê-los e potencializar as intermediações
e; c) Mensurar como os corretores se sentem com relação a essas estratégias. Ao ser capaz de
esclarecer estas questões, este material torna-se relevante porque propõe uma reflexão pouco
debatida, mesmo se tratando de um mercado deficitário e, ao mesmo tempo, que está
retomando o crescimento no nosso país, aquecendo a economia e dando resultados em meio a
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grandes desafios.
A estrutura do artigo inicia refletindo duas grandes temáticas: 1) a Educação
Corporativa, seus fundamentos e sua proposta de desenvolvimento de profissionais em
diferentes empresas e em diversos segmentos e; 2) o crescimento do Mercado Imobiliário nas
últimas décadas e a situação do mesmo com relação ao número de seus profissionais atuantes;
também visando refletir a necessidade de formação dessa mão- de-obra e a legislação que
orienta este processo.
Para responder à problemática trazida, o presente trabalho apoiou-se numa pesquisa de
caráter quantitativo, com um formulário de pesquisa estruturado e aplicado em quatrocentros
e setenta e três corretores que atuam nas principais imobiliárias de Porto Alegre e região
metropolitana, sendo a pesquisadora, uma observadora participante por ainda atuar neste
segmento.
Por fim, a terceira parte visa apresentar os resultados da pesquisa, refletindo sobre os
dados obtidos e comparando-os com o referencial teórico descrito.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Cenário atual do mercado de trabalho e sua relação com os profissionais
O atual mercado de trabalho se encontra numa fase nunca antes registrada na história.
Além da alta presença da tecnologia nos diferentes tipos de relações, a globalização se
desenvolveu de tal forma que as fronteiras dos países praticamente inexistem, criando um
ambiente onde as culturas interagem e as empresas se tornam cada vez mais
internacionalizadas, através de parcerias, fusões, aquisições, etc.
Organizações de diferentes portes e segmentos não se vêem mais competindo apenas
com outras organizações locais. Pelo contrário, cada vez mais, multinacionais adentram os
territórios com processos complexos, produtos e serviços diversificados; além de oferecerem
menores custos.
Este ambiente competitivo faz com que as empresas busquem se desenvolver
desenfreadamente, não apenas para combater a crise econômica em que se encontra nosso
país, mas também buscando a sobrevivência e a diferenciação entre as demais. As que
conseguem adquirir vantagem competitiva, melhor se posicionam no mercado, pois segundo
Grisci e Dengo (2005, p. 63), “uma vantagem competitiva não é facilmente copiável”.
A estes fatores, soma-se o advento da informação e da conexão das coisas, onde é
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possível acompanhar os acontecimentos em tempo real. A produção de conhecimento se dá de
forma acelerada e, na mesma velocidade em que informações são produzidas, elas também se
tornam obsoletas, obrigando empresas, universidades e profissionais a buscarem
constantemente a atualização em diferentes aspectos. A educação passa a fazer parte do
cotidiano.
As empresas mais bem sucedidas, ao invés de esperar que as escolas tornem seus
currículos mais relevantes para a realidade empresarial, resolveram percorrer o
caminho inverso e trouxeram a escola para dentro da empresa (...). Passaram (...) a
entender que o diferencial decisivo de competitividade reside no nível de
capacitação em todos os níveis de seus funcionários, fornecedores principais,
clientes e até mesmo membros das comunidades onde atuam. (MEISTER, 1999, p.
15).
Na organização de uma empresa, já não se fazem presentes apenas os setores básicos
de Finanças, Marketing, Comercial, Recursos Humanos, etc. Cada vez mais, CRM, Pesquisa,
Desenvolvimento e Inovação têm ganhado espaço com o intuito de estimular, dentro do
ambiente de negócios, a antecipação de tendências futuras e assim, “sair à frente” da
concorrência. Para Quartiero e Cerny (2005), isso faz com que as organizações sejam vistas
como modernas e inovadoras, trazendo ganhos à imagem, até maiores do que seus resultados
efetivos.
Entretanto, não adianta a empresa ter os melhores setores, maquinários, produtos e
processos se ela não tiver as melhores pessoas, uma vez que são estas últimas que operam
sobre os outros quatro. Os chamados “talentos” passam a ser buscados no mercado de
trabalho; e o setor de Recursos Humanos passa a ocupar o centro de muitas estrátegias.
Na medida em que a empresa começa a se dar por conta de que o grande diferencial
competitivo que ela pode oferecer ao mercado são os seus profissionais, começa a buscar, no
próprio mercado, essa equipe diferenciada. Segundo Quartiero e Cerny (2005, p. 32), o perfil
do trabalhador do século XXI é complexo, pois o mercado busca “um sujeito com uma
formação que vá além do conhecimento específico ou instrumental, abrangendo atitudes,
motivação, capacidade de cooperar e trabalhar em grupo”.
Neste momento, surge um grande ruído, pois, para dar conta das complexas atividades
que os cargos vêm exigindo, espera-se encontrar profissionais altamente preparados- o que
muitas vezes não acontece e acaba por gerar um questionamento sobre o papel da Educação
Superior em nosso país. Em tese, como campo teórico, de produção de conhecimento e de
incentivo à prática, ela seria a grande responsável por formar a mão-de-obra esperada pelo
mercado. Entretanto, as empresas têm culturas, valores, conhecimentos e atividades muito
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específicas- campos onde nem sempre a universidade formal consegue chegar.
Como não é possível encontrar profissionais “prontos” no mercado de trabalho, nem
trocar de equipe a cada vez que ocorrem mudanças significativas, o setor de Recursos
Humanos tem buscado variadas estratégias e ferramentas para potencializar o subsistema de
Treinamento e Desenvolvimento, objetivando suprir as carências de conhecimento e
desenvolver competências que sejam essenciais ao sucesso do negócio. Meister (2005, p. 01)
reforça esta ideia ao afirmar que “a educação, os programas de capacitação, o
desenvolvimento de competências e as pesquisas sempre estarão relacionados às áreas do
negócio da organização e, fundamentalmente, ao seu posicionamento estratégico”.
Entende-se por competências essenciais as habilidades fundamentais e necessárias
para o desenvolvimento e a sustentação do negócio. Pouco adiantará para a empresa ter
profissionais competentes e estratégicos, se estes não estiverem em sintonia com a sua cultura
e contribuindo para o alcance da sua visão.
2.2 A educação corporativa como elemento que propõe o desenvolvimento de
competências para diferentes mercados
A evolução tecnológica, a rápida produção de informações, a queda de muitas
barreiras comerciais e a maior interação entre os países, criaram uma realidade nunca antes
vista na história da humanidade. Entretanto, incentivaram um cenário de alta competitividade
e obrigaram as organizações a buscarem formas de se manterem atualizadas e diferenciadas
das demais.
Foi no intuito de acompanhar este contexto que, em 1955, o então presidente da
General Eletric dos Estados Unidos, fundou a primeira Universidade Corporativa da história-
a Cotronville. Para Meister:
Muitas empresas testemunharam uma redução radical no prazo de validade do
conhecimento e começaram a perceber que não mais podiam depender das
instituições de ensino superior para desenvolver sua força de trabalho. Decidiram
então partir para a criação de suas próprias “Universidades Corporativas” com o
objetivo de obter um controle mais rígido sobre o processo de aprendizagem,
vinculando de maneira mais estreita os programas de aprendizagem a metas e
resultados estratégicos reais da empresa. (MEISTER, 1999, p. 27).
Ou seja, atentando para a necessidade de formar e desenvolver a mão-de-obra para
manter a empresa atualizada e competitiva, o principal objetivo da Educação Corporativa é
estimular o desenvolvimento das competências essenciais para o negócio, agregando valor a
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toda a cadeia de stakeholders.
A sua proposta se insere no planejamento estratégico da organização e é de
responsabilidade de todos os gestores, embora normalmente seja associada ao setor de
Recursos Humanos (RH). Segundo Eboli (2010, p. 122), nesta proposta “destaca-se a
importância da responsabilidade compartilhada: o gestor da educação corporativa e os líderes
empresariais atuando de forma integrada”.
É importante ressaltar que, embora diga respeito e envolva o RH, a proposta da
Educação Corporativa difere-se do Treinamento e Desenvolvimento (T&D), subsistema mais
comum praticado nas empresas. O T&D tem foco em resolver necessidades pontuais,
normalmente envolvendo sala de aula, programa conteudista e grupos que apresentam
defasagens na execução de atividades. Neste modelo, busca-se desenvolver habilidades,
focando no aprendizado individual, no âmbito tático, voltado para o interno.
Já a Educação Corporativa é uma ferramenta que objetiva assistir a organização no
alcance de sua missão pela condução de atividades que cultivam o aprendizado, o
conhecimento e a sabedoria, tanto do indivíduo quanto da empresa. Para Eboli (2004), sua
proposta busca ter um alcance estratégico para desenvolver competências críticas e essenciais
ao sucesso do negócio, visando também o futuro do mesmo. Ocorre um aprendizado em nível
organizacional, onde o colaborador é capaz de enxergar o todo e não somente sua função,
saindo do âmbito tático e entrando no campo estratégico para logo em seguida envolver toda a
comunidade.
É também uma unidade de negócios, assim como todas as outras. Interage com o
ambiente externo e interno e, além disso, tem cursos estruturados voltados não somente para
os colaboradores. Tem calendário de atividades, direção, corpo docente, indicadores,
orçamento e avaliação de impacto nos resultados da organização.
Meister (1999) apresenta sete princípios que norteiam todo o processo de criação da
Educação Corporativa: 1) competitividade- desenvolvendo os colaboradores e tornando- os o
diferencial da empresa frente aos seus concorrentes; 2) perpetuidade- entendendo que um
programa de fomentação do conhecimento tende a garantir a durabilidade da cultura e a
existência da empresa; 3) conectividade- incentivando a interação entre os públicos interno e
externo; 4) disponibilidade- oferecendo atividades e recursos de ensino que sejam acessíveis
aos colaboradores quando estes sentirem o desejo de estudar; 5) cidadania- formando sujeitos
capazes de refletir criticamente sobre a realidade da organização e operarem sobre a mesma;
6) parceria- estabelecendo relações com outras instituições para o melhor desenvolvimento
das competências e; 7) sustentabilidade- buscando fontes que permitam recursos financeiros
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próprios e capazes de fazerem a proposta durar.
Para contemplar esses sete pilares, a Educação Corporativa se utiliza de diferentes
ferramentas a fim de alcançar o maior número possível de colaboradores e tornar-se presente
no momento em que eles desejarem aprender. Para isso, assume duas frentes: a real, física,
evidenciada em prédios, salas de aula, cursos presenciais, grupos de estudo, laboratórios,
bibliotecas, livros, seminários, etc.; e a virtual, através da intranet e da internet,
proporcionando atividades, chats de bate-papo, tutoria online, vídeos, textos, entre outros.
Segundo Quartiero e Cerny (2005), o modelo físico remonta um cenário de seriedade e, ao
mesmo tempo, de visibilidade, funcionando como uma grife para a imagem da empresa. Já o
modelo virtual acaba com a limitação imposta pelo espaço físico, superando distâncias e
otimizando espaços, além do tempo menor e da redução de custos.
Ela avalia os participantes através de suas interações nos espaços de aprendizagem,
instrumentos oficiais (como exercícios, provas e testes), presenças nos eventos promovidos
pelo curso, horas online e, principalmente, através de seus desempenhos no trabalho.
Assim, a Educação Corporativa contribui para a empresa mantendo-a atualizada,
respeitando sua tradição e, ao mesmo tempo, olhando para o futuro. Desde a sua criação, tem
ganhado força e se disseminado por todos os países do mundo. “É um guarda-chuva
estratégico para o desenvolvimento e a educação de funcionários, clientes e fornecedores (...),
além de um laboratório de aprendizagem para a organização e um polo de educação
permanente.” (MEISTER, 1999, p. 8).
Atualmente, existem mais de duas mil universidades corporativas nos Estados Unidos,
país berço desta proposta. No Brasil, este número já superou a casa dos trezentos e ainda tem
grandes chances de crescimento, uma vez que existem mais de dois milhões de empresas
distribuídas ao longo de nosso território.
2.3 O desenvolvimento do mercado imobiliário nas últimas décadas
A fim de acelerar o desenvolvimento do país, entre os anos de 1994 e 2014, o governo
criou ou potencializou uma série de incentivos para diferentes segmentos. O mercado
imobiliário foi um dos contemplados com estas propostas. Dentre elas, podemos citar a
política de financiamentos de imóveis, que aumentou o tempo de parcelamento e reduziu a
taxa de juros, bem como o programa “Minha Casa Minha Vida”, que incentivou a
popularização de bens imobiliários e a aquisição da casa própria por parte das famílias de
baixa renda. De acordo com o relatório Construção Civil: Desempenho e Perspectivas,
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emitido pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção em 2011, tal crescimento é
explicado por sete razões:
a) maior oferta de crédito imobiliário (aliado à redução da taxa de juros dos
financiamentos imobiliários e a prazos maiores para pagamento); b) aumento do
emprego formal; c) crescimento da renda familiar; d) estabilidade macroeconômica
(Plano Real); e) mudanças no marco regulatório do mercado imobiliário (Lei
10.931/2004), resultando em maior segurança, transparência e agilidade; f) melhor
previsibilidade da economia, tornando mais factíveis os negócios imobiliários; g)
obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e Programa Minha Casa,
Minha Vida. (PMCMV).
Além dos diferentes incentivos e facilidades para o desenvolvimento deste setor,
também se evidenciou:
A ampla divulgação da lei do Patrimônio de Afetação que, segundo Coutinho
(2015), afima que o adquirente detém segurança jurídica no negócio, pois o imóvel
não se comunica com as demais obrigações, bens e direitos da incorporadora da
obra, inclusive na hipótese de falência desta, ou seja: o valor pago pelo comprador é
diretamente direcionado para a construção do próprio empreendimento.
O afastamento da hipótese de bolha imobiliária no Brasil. Segundo Celeiro (2015),
em reportagem à revista Exame, “As últimas evidências são de que a bolha está
desinflando sem estourar. Os preços não caem, mas já crescem menos do que a
inflação”.
O aumento do poder aquisitivo da população e a consequente ascensão da classe C
(denominada nova classe média) que, com maior poder de compra, focou em quatro
principais aspectos: casa própria, veículo próprio, educação particular e viagens.
A este cenário, também se somou o desenvolvimento das diferentes regiões, que fez
com que os espaços urbanos ficassem cada vez mais disputados. Dentro de suas
possibilidades, as famílias buscaram morar mais próximas às capitais, o que ocasionou não
somente o crescimento destas, mas também dos seus entornos- as chamadas regiões
metropolitanas.
De acordo com o RAIS (Relação Anual de Informações Sociais) publicado pela CBIC
(Câmara Brasileira da Indústria da Construção), no ano de 2014 havia 237.919 empresas
ligadas à construção civil em todo o território brasileiro. Em nível de curiosidade, no ano de
2005, quando ganharam mais força todos os incentivos imobiliários, o número era de 96.662.
Num espaço de nove anos, ocorreu um crescimento superior a 246% neste setor.
Este crescimento também se deu porque o foco da construção e intermediação de
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imóveis deixou de ser apenas a moradia. Visando o crescimento exponencial do mercado
imobiliário, houve a procura por moradia, mas também cresceram as aquisições para
investimento tanto patrimonial (foco no acúmulo de bens), quanto para conversão em aluguel
e capital de giro. Neste processo, foram envolvidos os imóveis de lançamento (considerados
“na planta” e ainda a serem construídos) e entraram em evidência os imóveis avulsos (já
prontos, que possuíam um dono que objetivava desfazer-se).
Segundo o IBGE, em 2015, as atividades imobiliárias de nosso país atingiram uma
parcela do PIB de 9,9%. No ano de 2016, elas caíram para 6,6%; e finalizaram o ano de 2017
em 8,7%, o que demonstra retomada do crescimento. No ano de 2010, início do “boom” do
mercado imobiliário, elas representavam 8,3%, ou seja, apesar da crise econômica em que se
encontra o país, este setor não deixou de crescer, mesmo que a passos lentos. Para dar conta
deste crescimento, há 64.600 imobiliárias credenciadas em todo o país, segundo dados do
COFECI (Conselho Federal dos Corretores de Imóveis):
O Brasil conta atualmente com 300 mil corretores de imóveis legalizados. O número
pode até parecer alto, mas a realidade é bem diferente disso: está faltando
profissionais para atender a demanda cada vez maior do mercado imobiliário
brasileiro. De acordo com a Federação Nacional dos Corretores de Imóveis
(FENACI), o déficit é de 150 mil profissionais, e o principal motivo é o boom do
mercado imobiliário. Entre 2006 e 2013, o número de imóveis vendidos aumentou
em 350%, passando de 68 mil unidades vendidas para 310 mil. (CRECIES, 2016).
É importante suprir esta falta, pois com a baixa no valor dos imóveis, os consumidores
com condições financeiras, seguem desejando adquirir a casa própria; e as perspectivas para
este setor, após passarmos pela crise econômica é de grande retomada do crescimento e forte
retorno dos lançamentos.
A retomada de lançamentos e do comércio de unidades novas só deve vir com uma
recuperação de cenário macroeconômico, quando a oferta de financiamento for
ampliada e os consumidores se sentirem mais seguros frente às oscilações de renda e
emprego. Até lá, a estratégia das incorporadoras é evitar riscos e adotar uma postura
mais cautelosa, concentrada principalmente na geração de caixa e redução de
unidades em estoque. (ÉPOCA, 2015).
Foi o que aconteceu nos anos de 2016 e 2017. Muito timidamente, as incorporadoras
“seguraram” seus lançamentos para sentir a economia. No ano de 2018, com o registro de um
pequeno crescimento no primeiro semestre e a queda da taxa CELIC, que é uma taxa de
financiamento interbancária, capaz de interferir diretamente nos juros de financiamento
imobiliário, a procura por imóveis aumentou e as incorporadoras anunciaram ao mercado um
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volume de lançamentos 86% maior do que no segundo semestre de anos anteriores.
2.4 O tempo de maturação e a formação do corretor de imóveis
Conforme já mensionado, atualmente existe um déficit de cento e cinquenta mil
profissionais no mercado imobiliário. Diante desta realidade, as imobiliárias percebem que
precisam encontrar alternativas ou seus resultados serão afetados significativamente. Segundo
Viegas (2005), não encontrando trabalhadores em quantidade suficiente no mercado de
trabalho, as empresas se viram obrigadas a encaminharem os candidatos para os cursos.
A saída encontrada foi justamente desenvolver o corretor de imóveis, buscando
profissionais de diferentes áreas que, em função da crise econômica do país, se encontrassem
desempregados ou no desejo de iniciar uma nova carreira, transição esta que é muito comum
no mercado de trabalho atual.
Entretanto, o grande desafio é despertar o encantamento e o desejo de ingressar em
uma profissão de regime de associação autônomo. Para Gitahy (2000), quando o espectro do
desempregro torna-se uma realidade cada vez mais presente em muitos setores, cria ansiedade
e faz com que os profissionais se vejam obrigados a encontrar alguma alternativa de
sobrevivência, pois precisam levar dinheiro para casa.
Segundo o artigo 511 da Consolidação das Leis do Trabalho e o artigo 11 da Lei nº
8.213/91, o profissional autônomo é aquele que faz a gestão do seu próprio trabalho e tempo,
não tendo um gestor que lhe oriente, organize sua rotina e direcione suas atividades. Por outro
lado, ele não tem nenhum vínculo empregatício, não possui um salário base ou benefícios,
tampouco o acúmulo de FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) e tempo de
contribuição ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). Se este candidato a corretor de
imóveis não tiver uma reserva financeira ou alguém que lhe auxilie até a primeira
intermediação, dificilmente se manterá tranquilo para fazê-la com serenidade e segurança. Ser
autônomo exige uma disciplina e dedicação muito maior do que um profissional que possui a
chamada “carteira assinada”, pois se não houver gestão de tempo e empenho para o
aprendizado da nova profissão, o profissional corre o risco de se dispersar de seu foco,
fazendo com que as intermediações não aconteçam e ele disperdice seu tempo e dinheiro,
além do grande sentimento de frustração que pode sentir.
Segundo a legislação estabelecida pelo COFECI, a partir dos anos 2000, o processo de
regularização de um indivíduo na profissão é: matrícula num curso técnico em Transações
Imobiliárias (grau mínimo), estágio com carteira provisória pelo período de seis meses e, após
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a conclusão do curso acima, a emissão da carteira definitiva mediante cerimônia de formatura
nos CRECIs regionais. A partir da posse desta carteira definitiva é que o profissional pode
realizar a intermediação de imóveis em seu nome, uma vez que ele responde legalmente pelos
empreendimentos que ofereceu e negociou, independente do tipo. (CRECICE, 2014).
Como o curso técnico em Transações Imobiliárias é condição mínima para o ingresso
nesta profissão, ouve um “boom” no surgimento de escolas a fim de oferecê-lo, em diferentes
valores e modalidades. Existem atualmente 481 instituições legalizadas em todo o país.
Curiosamente, destas, 85 se encontram no estado do Rio Grande do Sul (o que representa
17,6%), superando até mesmo o estado de São Paulo, que possui 67 escolas credenciadas,
junto ao COFECI. Entretanto, “a comprovação do grau de escolaridade não assegura que o
candidato possua as competências requeridas para as funções a serem desenvolvidas na
empresa”. (BUENO; PELANDRÉ, 2005, p. 142).
Apesar de credenciadas, muitas destas escolas foram abertas com intuito puramente
econômico (aproveitar o momento do país e lucrar em cima disso) e não com o objetivo de
oferecer uma formação de qualidade. Os empresários do ramo educacional viram neste nicho
uma oportunidade de crescimento, fazendo o que fosse preciso para conquistar alunos e
vender os cursos de TTI (Técnico em Transações Imobiliárias). Na realidade gaúcha,
costuma-se dizer que instituições que assumem este perfil são “tiradoras de matrículas” e não
instituições de ensino comprometidas com a educação e a real formação de um corretor de
imóveis. Freitas (2005, p. 7), afirma que “o aumento da participação do setor privado no
mundo educacional tem gerado uma forte competição e levantado alguns questionamentos
sobre as finalidades da educação”.
Este cenário de escassez de profissionais somado à falta de qualidade na formação
inicial faz com que haja uma concorrência acirrada entre as imobiliárias na busca pelos
melhores corretores de imóveis em atividade no mercado. Neste evento, o assédio entre elas é
extremamente comum, intensificando ainda mais a concorrência e impulsionando-as a
oferecerem cada vez mais diferenciais.
Em muitas ocasiões, para conquistar um novo profissional, acabam ocorrendo
“promessas” de crescimento ou rápidas intermediações. Além disso, como neste segmento o
incentivo dado é apenas estrutural e motivacional (pois financeiramente é o corretor que se
mantém), ocorre de, muitas vezes, as expectativas não se concretizarem e o profissional não
permanecer na atividade por muito tempo, gerando neste mercado um turnover altíssimo.
A fim de minimizar este fato e conter a ocorrência elevada deste número, as
imobiliárias buscam diferentes estratégias para formarem seus corretores internamente e
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mantê-los vinculados a elas pelo máximo de tempo possível. Segundo Viegas (2005), elas
treinam os novos funcionários em habilidades que os mais antigos já possuem. As ferramentas
e programas utilizados para que isso aconteça ainda não são consistentes e existem na
minoria.
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A fim de esclarecer à problemática e responder aos objetivos propostos neste artigo,
optou-se pela pesquisa de caráter participante, uma vez que a pesquisadora atua neste
mercado e acompanha diretamente o crescimento do mesmo, observando seus sucessos e
desafios junto ao público-alvo. Segundo Demo (2004), neste tipo de trabalho, o pesquisador
participa de forma sistemática, compartilhando as vivências com os sujeitos pesquisados e
acompanhando criticamente suas ações.
O tipo de abordagem para o levantamento de dados foi quantitativa, pois a mesma
oferece informações mais precisas e tem o seu tempo de aplicação e de resposta melhor
delimitados.
Diferentemente da pesquisa qualitativa, os resultados da pesquisa quantitativa
podem ser quantificados. (...) A pesquisa quantitativa se centra na objetividade.
Influenciada pelo positivismo, considera que a realidade só pode ser compreendida
com base na análise de dados brutos, recolhidos com o auxílio de instrumentos
padronizados e neutros. A pesquisa quantitativa recorre à linguagem matemática
para descrever as causas de um fenômeno, as relações entre variáveis, etc.
(FONSECA, 2002, p. 20).
Para o levantamento das informações, foi realizada uma pesquisa com Survey,
utilizando-se a aplicação de um questionário com questões fechadas.
A pesquisa com survey pode ser referida como sendo a obtenção de dados ou
informações sobre as características ou as opiniões de determinado grupo de
pessoas, indicado como representante de uma população-alvo, utilizando um
questionário como instrumento de pesquisa. (FONSECA, 2002, p. 33).
A pesquisadora visitou seis escolas técnicas de Porto Alegre, objetivando aplicar o
questionário em alunos do Curso Técnico em Transações Imobiliárias que já estivessem
atuando como corretores de imóveis.
Durante as oito semanas de coleta, 473 profissionais de 17 imobiliárias diferentes e
presentes em Porto Alegre e região metropolitana responderam à pesquisa proposta. Com
posse dos questionários preenchidos, optou-se pela técnica de codificação e tabulação para a
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análise de dados, uma vez que, para Gerhardt e Silveira (2009), as perguntas eram fechadas e,
para a pesquisa levantar os dados de que necessitava, bastava apenas contar o número de
ocorrências e agrupá-los em categorias para a análise final.
4 RESULTADOS OBTIDOS E CONCLUSÕES
Com o objetivo de conhecer o perfil do corretor de imóveis atuante no mercado
imobiliário de Porto Alegre e região metropolitana, foi possível perceber que os 473
entrevistados estavam distribuidos entre as 17 principais imobiliárias e construtoras da região-
o que nos leva a concluir que a estratégia de buscar novos corretores no mercado é algo
presente na totalidade das empresas que operam sobre o mesmo; e que todas as que estão
contempladas nesta pesquisa, independente do seu tempo de mercado ou porte, estão
objetivando captar clientes através do volume de captadores; e não necessariamente da
qualidade dos profissionais.
Estes estão distribuidos em diversos setores, porém a maioria está voltada para a venda
de empreendimentos em lançamento, conforme o gráfico abaixo:
Gráfico 1 – Setores em que atuam os corretores entrevistados
Fonte: Elaborado pelo autor, 2018.
Tendo em vista que 266 dos entrevistados atuam sobre o mercado de lançamentos e
102 atuam tanto em lançamentos quanto em imóveis avulsos (usados), conclui-se que 77,8%
dos profissionais que estão ingressando neste mercado, têm vindo para reforçar as
intermediações de novos empreendimentos, o que confirma o crescimento do setor e chama a
atenção para o seguinte aspecto: a maioria dos imóveis que estão sendo lançados e vendidos
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na região da grande Porto Alegre são negociados por profissionais com pouco conhecimento
ou pouco tempo de atuação no mercado imobiliário, pois, quando questionados sobre o tempo
de atuação na corretagem, a maioria informou ter até um ano de experiência na profissão,
conforme o gráfico abaixo:
Gráfico 2 – Tempo de atuação na profissão
Fonte: Elaborado pelo autor, 2018.
Além disso, a população de entrevistados ainda está fazendo o curso Técnico em
Transações Imobiliárias. Isso significa que eles NÃO POSSUEM a carteira de CRECI
definitivo e sim, a carteira de CRECI provisória de estágio, ou seja, ainda não são
efetivamente profissionais formados na área. Será que nós faríamos uma cirurgia com um
médico que não é formado? Projetaríamos nossa casa com um estudante de engenharia que
está no segundo semestre?
Estas reflexões se tornam pertinentes e sérias à medida em que entendemos que
qualquer transação imobiliária envolve altos valores financeiros, toda a documentação do
comprador e o corretor responde legalmente pela venda. Será que estes profissionais têm
noção disso?
Até que ponto eles estão sendo preparados e assessorados? Até que ponto suas
informações são sólidas e embasadas para serem repassadas ao consumidor final?
Também nos chama a atenção o fato de haver profissionais que atuam há entre 1 e 3
anos na profissão e que ainda estão estudando para tirar o CRECI definitivo. Segundo as
regras do conselho, o profissional que possui o CRECI de estagiário recebe uma carteira com
validade de 6 meses, podendo ser renovada por mais 6 meses (totalizando no máximo um
ano); ou seja, se há pessoas ainda estudando, mesmo tendo mais de um ano na profissão, as
mesmas exerceram a função sem ter liberação do CRECI, o que é extremamente proibido para
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o setor. Desta forma, podemos deduzir que os clientes podem estar comprando imóveis de
profissionais que nem legalizados na profissão estão.
Quanto às idades, os respondentes se distribuem de forma equilibrada a partir dos 18
anos, ficando a maioria dos entrevistados entre 18 e 35 anos de idade. Entretanto, há
profissionais até acima dos 60 anos- aspecto este que pode ser explorado em outro trabalho de
pesquisa: como se desenvolve a convivência tão diversificada entre as gerações neste
mercado? Quais os elementos que motivam cada uma das gerações a ingressarem neste ramo?
Com relação ao gênero, 74,4% dos entrevistados são homens e 25,6% se dizem do
sexo feminino, o que reforça a ideia de ser um mercado predominantemente masculino. Este
fato foi muito observado pela pesquisadora durante o seu período de atuação no mesmo. Na
empresa em que trabalhava apenas 21% da equipe era formada por mulheres.
Esses 21%, em termos de comissão, tinha as mesmas possibilidades de ganho que os
homens, porém enfrentavam diariamente o desafio de se firmarem como profissionais sérias,
com conhecimentos e vestimentas adequadas ao ramo. Em muitos casos, era necessário deixar
bem claros os limites das relações para que pudessem se sentir respeitadas e valorizadas.
Ainda é possível observar que poucas mulheres desenvolviam o negócio inteiramente
sozinhas. Em alguma das etapas sempre acabava aparecendo a figura masculina para conferir
e fazer o fechamento. O número feminino de lideranças também é escasso. Na empresa da
pesquisadora, todos os membros da diretoria eram homens. Os cargos de gestão ficavam com
as mulheres apenas nos setores de apoio, como Recursos Humanos, Marketing, Secretaria de
Vendas, etc.
No aspecto formação, mesmo sendo o Ensino Médio o grau mínimo exigido para a
obtenção do título de corretor de imóveis (já tramita a discussão de o grau mínimo vir a ser o
Ensino Superior), é curioso observar que 57,3% dos entrevistados possuem Ensino Superior e
são provenintes de outras áreas, o que confirma a informação trazida pelo referencial teórico
ao apontar essa “migração” para o mercado imobilíario em virtude de sua atratividade
financeira e da elevada taxa de desemprego no país. Os cursos mais citados foram:
Administração (62 entrevistados), Direito (28), Gestão Comercial e Letras (13 entrevistados
cada) e Engenharia e Publicidade e Propaganda (11 entrevistados cada).
Se comparadas as faixas salariais médias, pode-se concluir que não são profissões que
pagam valores baixos (exceto Letras, quando analisados os salários do Ensino Público).
Entretanto, são profissões que foram afetadas diretamente pela crise, uma vez que, com o
baixo faturamento das empresas, as demandas de trabalho diminuiram e os empresários se
viram obrigados a reformularem seus quadros de funcionários e “enxugarem” custos.
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Logicamente que estes profissionais foram e continuarão sendo extremamente necessários
para o desenvolvimento dos negócios, porém uma das estratégias adotadas foi o desligamento
de funcionários com salários e benefícios altos, substituindo-os por profissionais de
formações similares, porém com custos e salários menores.
Se vendo em busca de novas oportunidades e em processos de seleção extremamente
concorridos ou com salários muito abaixo do esperado, muitos profissionais no Brasil viram
na mudança de carreira uma alternativa para manterem seus padrões de vida ou suas
empregabilidades. O setor imobiliário, como estamos vendo, se beneficiou com este
movimento.
Ainda nesta linha, pode-se perceber que os profissionais que estão chegando são, a
princípio, preparados para entender o mercado e com capacidade de desenvolverem
competências específicas dos negócios. Não lhes falta estudo ou entendimento de carreira. Se
as imobiliárias forem estratégicas a ponto de prepará-los, mas também aproveitarem os
conhecimentos prévios que possuem, podem encontrar neste aspecto uma oportunidade de
diferenciação da concorrência. É importante observar que, se bem feita a gestão dos talentos e
habilidades de cada um, o mercado imobiliários é uma fonte riquíssima de informações e
diversidade.
O gráfico abaixo apresenta os principais motivos apontados pelos entrevistados para a
troca de profissão:
Gráfico 3 – Motivos da troca de profissão
Fonte: Elaborado pelo autor, 2018.
Este gráfico reforça a ideia anterior de que os principais motivos que levam as pessoas
a buscarem o mercado imobiliário são a oportunidade de altos ganhos financeiros, bem como
a falta de vagas atrativas em suas áreas de atuação. Apenas 6% dos entrevistados (e que estão
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atuando) realmente almejavam a profissão Corretor de Imóveis. Este dado é passível de
reflexão quando, do ponto de vista de Recursos Humanos, se fala do amor pela profissão para
o efetivo engajamento e compromentimento com os resultados do negócio. Certamente as
imobiliárias apresentam defasagens em seus programas de desenvolvimento; mas até que
ponto estes profissionais querem realmente ser corretores? Será que não estariam apenas
aguardando a crise passar para abandonarem a profissão?
Diante destes dados, é possível concluir que o perfil do corretor de imóveis atuante na
Grande Porto Alegre é de um indivíduo que busca integrar as equipes das principais
imobiliárias da região, focando-se no setor de lançamentos. Estes profissionais atuam há
menos de um ano neste mercado e são, em sua maioria, homens de diversas idades e com
Ensino Superior, que buscaram a corretagem como meio de obter maiores ganhos financeiros
ou porque não conseguiram se recolocar em suas áreas de formação e atuação. Ulyssea (2006)
afirma que a informalidade pode estar ligada a uma preferência dos trabalhadores pelo
mercado informal, uma vez que possuem um rendimento maior em curto prazo, ainda que
abdiquem da proteção da legislação.
Para responder ao segundo objetivo, que é conhecer as estratégias que as imobiliárias
adotam para desenvolver seus corretores e potencializar as intermediações, 40% dos
entrevistados afirmaram que ainda não conseguem realizar uma “venda sozinhos” e, por isso,
recorrem frequentemente à estratégia do “fifty”, onde um corretor mais antigo e com maior
conhecimento os auxilia, porém a comissão da venda é dividida igualmente entre os dois. Em
alguns casos, esta estratégia chega a ser uma imposição por parte da imobiliária. Além disso,
os entrevistados afirmaram que o que as imobiliárias mais lhe solicitam é: captar novos
clientes (para 133 deles), se vestirem adequadamente (para 89), conhecerem o que tem de
novidade no mercado (para 81), comparecerem às reuniões e eventos promovidos pelas
construtoras (para 61), tirarem o CRECI definitivo o mais rápido possível (para 53), não
faltarem ao trabalho (para 32) e respeitarem a hierarquia e os mais antigos (para 24).
Nestas respostas, dois aspectos chamam a atenção. O primeiro deles é o fato de apenas
53 entrevistados falarem da importância da obtenção do CRECI definitivo (o que representa
11% da população estudada). Ressaltando novamente, a obtenção da carteira definitiva ao
término do curso é condição para que eles se tornem efetivamente Corretores de Imóveis e
consigam realizar transações neste mercado. O outro aspecto é o: “respeitar a hierarquia e os
mais antigos”. A questão hierárquica, segundo a lei 8312/91, citada anteriormente, não pode
haver em relações onde o profissional é caracterizado como autônomo. Além disso, esta
orientação reforça a ideia descrita no referencial teórico de que não há um padrão e uma
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proposta de treinamento consistente para os profissionais ingressantes neste mercado, pois
eles não podem ser “obrigados” a participarem. Seus recursos e modelos de aprendizagem
acabam sendo os colegas mais antigos e mais bem sucedidos dentro da organização, que em
virtude dessas características exercem liderança e exemplo natural sobre os demais.
Quando questionados sobre o que já viram ou participaram de práticas de
desenvolvimento em suas imobiliárias, 43,1% responderam que nunca tomaram conhecimento
deste tipo de prática ou receberam o convite para as mesmas. Dos 56,9% que afirmaram já
terem tido algum contato com isso, a maioria disse que participa de reuniões periódicas, onde
o objetivo principal é avaliar o volume de intermediações da equipe e passar informações
operacionais para a semana, ou seja, não são reuniões com caráter formador. Apenas 4%
afirmaram ter recebido algum tipo de material que pudesse servir de suporte às suas
formações.
Dos 473, 60 entrevistados disseram ter participado de um encontro de integração, onde
o único objetivo era informar sobre as regras comportamentais da empresa. Apenas 34 dos
entrevistados disseram já ter recebido algum tipo de treinamento a respeito da profissão e do
mercado. Esse número representa 7% de todo o grupo com quem a pesquisadora trabalhou e
é, por ela, considerado muito baixo, uma vez que, somente o curso Técnico em Transações
Imobiliárias não é capaz de formar o profissional em sua completude. A prática e o
desenvolvimento diário são fundamentais na formação de qualquer profissional.
Esses dados reforçam o que o referencial teórico vem apresentado: “a comprovação do
grau de escolaridade- ou o título do CRECI- não assegura que o candidato possua as
competências requeridas para as funções a serem desenvolvidas na empresa”(BUENO;
PELANDRÉ, 2005, p. 142). Infelizmente, a preocupação com a formação e o
desenvolvimento dos corretores de imóveis é algo que ainda não está consolidado na maioria
das imobiliárias. As estratégias até existem, mas não contemplam o desenvolvimento de
habilidades e competências essenciais ao sucesso do profissional e ao crescimento do negócio.
Para finalizar e responder ao terceiro objetivo, que é mensurar como os corretores se
sentem com relação a estas estratégias, 79,9% afirmaram que se sentem parcialmente ou
totalmente despreparados para o exercício da função e que necessitam de treinamento para
entenderem o mercado e dominarem todas as competências exigidas pelo mesmo.
Quando questionados o que pensam sobre as imobiliárias em que atuam, 23,2%
consideram-nas despreparadas para receber profissionais ingressantes neste mercado, 48,6%
afirmam que o RH deveria ser mais ativo e propor um programa consistente de treinamentos;
e 28,2% consideram que, mesmo que pouco eficientes, as ações promovidas pelas imobiliárias
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onde atuam contribuem de alguma forma. Esta percepção retoma o referencial teórico quando
afirma que o RH deveria ser mais ativo dentro da empresa. Entretanto, é necessário reforçar
que, segundo Eboli (2010), deve haver a responsabilidade compartilhada: os líderes
empresariais atuando de forma integrada para o desenvolvimento das equipes.
Um dado curioso foi percebido quando questionados a respeito da corretagem: apenas
28,5% afirmou que pretende construir uma carreira sólida nesta profissão. Os outros 71,5%
comentaram que a trocariam facilmente ou que estão na mesma apenas enquanto não
conseguem colocação em suas áreas. Havendo a oportunidade de retorno, deixarão de ser
corretores de imóveis. Esta informação reforça novamente o conteúdo trazido no referencial
teórico, quando o mesmo afirma que a profissão tem um alto turnover por ser vista como uma
alternativa para o desemprego, ou como uma forma rápida de acúmulo financeiro.
Ainda nesta ideia, 73% dos entrevistados afirmaram que suas lideranças seriam mais
efetivas se dessem mais treinamentos, tivessem mais conhecimentos e participassem mais do
processo de gestão e desenvolvimento de pessoas. Além disso, 82,2% dos entrevistados
participariam dos treinamentos se a empresa oferecesse algum programa estruturado e com
impacto direto nos resultados do profissional e do negócio.
Diante desta última afirmação e do cenário apresentado pelo mercado imobiliário, é
evidente que o desenvolvimento de uma proposta de Educação Corporativa contribuiria
significativamente para a qualificação dos profissionais e o aumento das intermediações,
tornando-se uma grande vantagem competitiva neste mercado. Ainda segundo Quartiero &
Cerny (2005, p.36), “a principal inovação conceitual proposta pelas universidades
corporativas é que o aprendizado passa a ser planejado e administrado para que ocorra de
maneira rápida, sistemática e alinhada aos objetivos estratégicos da empresa”, o que reflete
diretamente no resultado e na performance da empresa no mercado.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pensar o mercado imobiliário, seu rápido crescimento, sua necessidade de
profissionais e os desafios que o mesmo encontra nos dias atuais é uma tarefa altamente
complexa e capaz de levantar inúmeros aspectos de reconhecimento e de melhorias. A
demanda do mercado atual ainda é significativa e, como em qualquer outro segmento, se faz
necessária a presença de profissionais qualificados para a sustentação e o crescimento do
negócio.
A estratégia de buscar o corretor de imóveis no mercado, incentivando-o a lançar-se na
21
profissão e desenvolver-se dentro da mesma é, sem dúvida nenhuma, iniciativa inteligente,
ousada e inovadora. Entretanto, a mesma precisa ser qualificada e melhor estruturada para que
as empresas ligadas, de alguma forma, à construção civil alcancem os seus objetivos.
A educação corporativa nasceu justamente com o intuito de auxiliar a empresa a
atingir seus objetivos através da qualificação e do desenvolvimento de competências da sua
equipe- competências essas que sejam essenciais ao sustento do negócio. Uma vez que este
recurso surge como ferramenta de auxílio, crescimento e consolidação da cultura; além de já
ter sua identidade definida e de já ter comprovado a sua enorme contribuição para as
organizações que a adotam; não há porque não se considerar todos os benefícios que ela seria
capaz de oferecer para este mercado.
O presente artigo buscou abrir este espaço de reflexão e diálogo para que, abertas ao
experimento de uma nova proposta, comprovadamente eficaz, as imobiliárias consigam
repensar suas atuações, qualificando de forma consistente e efetiva os seus recursos mais
importantes: as pessoas que as compõem, criando também um vínculo mais profundo com as
mesmas, diminuindo assim, o turnover que é significativo neste mercado.
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