GERLIENE MARIA SILVA ARAÚJO
Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Natal/RN
2013
GERLIENE MARIA SILVA ARAÚJO
Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Saúde Coletiva do Departamento
de Odontologia, Centro de Ciências da Saúde da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
como requisito parcial para obtenção do título de
Mestre em Saúde Coletiva.
Área de Concentração: Saúde Coletiva
Orientador: Prof. Dr. Angelo Giuseppe Roncalli
Natal/RN
2013
Dedico este trabalho a meu pai, exemplo
maior de amor à profissão; “médico dos
pobres” que há muito praticava, simples
e naturalmente, o que hoje chamamos de
humanização da Saúde.
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, agradeço a Deus por sua bondade constante, perceptível em todos os dias
da minha vida, me cumulando de bênçãos e da graça de saber o quanto me ama e cuida de
mim.
À minha mãe, ser mais nobre que conheço, mulher guerreira e meu apoio incondicional em
todas as horas. A ela devo o apreço pelos estudos e meu exemplo mais marcante de ser
humano.
Às minhas irmãs, minhas pérolas, as melhores que eu poderia ter, por todo o incentivo e por
acompanharem minha trajetória com torcida e generosidade constantes.
A toda minha família, por ser o berço onde pude vivenciar o que tantos não podem, onde
sempre houve beleza e verdade nos relacionamentos.
Aos meus amigos, flores no meu caminho, por serem fonte certa de estímulo e solidariedade
em tudo que faço.
A Sidharta Augusto, que me adotou como “irmã mais nova”, sempre se antecipando e
tentando resolver minhas necessidades sem que eu sequer precisasse pedir.
À gráfica 100%, na pessoa da minha amiga Clarissa Queiroz, pela disponibilidade para me
ajudar na corrida contra o tempo.
Ao meu cunhado Paulo Rocha que me emprestou um pouco da sua extrema habilidade com os
idiomas, pronta e generosamente.
A todos que fazem o PPGScol da UFRN - coordenadores, professores, funcionários e alunos -
e que contribuíram para a realização deste momento ímpar de crescimento em minha vida, em
todos os âmbitos.
À Maísa Rodrigues, Ângela Ferreira e Luiz Noro, pelo dom de educar com humanidade,
proximidade e franqueza.
Ao professor Ângelo Roncalli, que sempre admirei como pesquisador e educador, pela
simplicidade e gentileza com que me orientou no caminho a trilhar.
A Rubens Júnior, por me acompanhar nas renúncias, compreender minhas ausências e sempre
torcer por mim. Seu amor foi o combustível que renovou minhas forças a cada semana,
ajudando-me a prosseguir.
RESUMO
Muitas pesquisas são realizadas confrontando condições de saúde bucal com variáveis
individuais, como fatores socioeconômicos e demográficos. No entanto, da mesma forma que
os indivíduos divergem entre si, os grupos também possuem características próprias e os
efeitos dessa diferenciação precisam ser pesquisados. O Brasil, apesar de ser uma das maiores
potências econômicas do mundo e vir apresentando uma melhoria no valor médio de seus
indicadores de saúde, é também um dos mais desiguais e permanece entre os países com
maiores iniquidades em saúde. A proposta deste estudo foi pesquisar a importância dos
determinantes sociais a nível contextual na saúde bucal de adolescentes brasileiros, população
pouco pesquisada na literatura. A pesquisa foi feita através de uma abordagem ecológica, no
intuito de identificar possíveis desigualdades entre municípios e capitais. Utilizando dados do
SBBrasil 2010, foram avaliados desfechos menos comuns (perda do 1º molar, índice de
cuidados odontológicos e T-Health) que fornecem informações sobre o grau de morbidade da
cárie e o nível de saúde dos tecidos dentários, além de abordar aspectos relacionados aos
serviços. A associação destes indicadores de saúde bucal com fatores socioeconômicos como
renda, emprego, educação e desigualdade, coletados do CENSO 2010, foi analisada por meio
de regressão linear simples e múltipla. Os domínios do estudo incluíram as 27 capitais
brasileiras e 4 clusters representativos dos municípios do interior do país. Foi possível
constatar um melhor acesso aos serviços em localidades com melhor distribuição de renda.
No entanto, a forte associação de fatores contextuais relativos à pobreza, baixos níveis de
educação e más condições de moradia e emprego com piores níveis de saúde bucal em
adolescentes parece ofuscar os efeitos das desigualdades de renda sobre os agravos bucais no
país. Em algumas localidades, em especial no interior das regiões Norte e Nordeste, continua
prevalecendo uma odontologia mutiladora, cujos efeitos são perceptíveis já em sua população
adolescente. O acesso aos serviços restauradores no Brasil ainda permanece limitado e
desigual. Os resultados deste estudo evidenciam as iniquidades em saúde bucal no país e
mostram a necessidade da inclusão de novas perspectivas na abordagem tradicional da
Odontologia Preventiva e nos modelos de educação em Odontologia. O combate a essas
iniquidades requer a cooperação dos vários autores envolvidos no processo e a inclusão da
saúde bucal no contexto da saúde geral. A abordagem dos determinantes sociais, bem como a
avaliação da distribuição das doenças bucais no território brasileiro e sua inclusão no contexto
da saúde em geral, devem nortear a implementação de programas e ações em saúde bucal, de
forma a contribuir para a redução das desigualdades.
Palavras-chave: Saúde Bucal. Adolescente. Desigualdades em Saúde. Fatores
Socioeconômicos.
ABSTRACT
Many surveys are conducted comparing oral health conditions with individual variables, such
as socioeconomic and demographic factors. However, in the same way that individuals differ
among themselves, the groups also have their own characteristics and the effects of this
differentiation must be researched. Brazil, despite being one of the major economic powers of
the world and shows an improvement in the average value of its health indicators, is also one
of the most unequal and remains among the countries with the greatest health inequities. The
purpose of this study was to investigate the importance of social determinants on the
contextual level oral health among Brazilian adolescents, population not much researched by
the literature. The research was made using an ecological approach in order to identify
possible inequalities between cities and capitals. Using data from SBBrasil 2010 it was
evaluated less common outcomes (loss of first molar, dental care index and T-Health) which
provide information on the degree of morbidity of caries and health level of dental tissues, in
addition to analyze the related services. The association of these oral health indicators with
socioeconomic factors such as income, employment, education and inequality, collected from
Census 2010, was analyzed by simple and multiple linear regressions. The study included the
27 state capitals and four clusters representing the municipalities of the country. It was
possible to see better access to services in locations with better income distribution. However,
the strong association of contextual factors related to poverty, low levels of education and
poor housing and jobs with poorer levels of oral health in adolescents seems to overshadow
the effects of income inequalities on dental caries in the country. In some locations,
particularly within the North and Northeast, whichever one keeps dentistry mutilating, whose
effects are already noticeable in its adolescent population. Access to restorative services in
Brazil remains limited and unequal. The results of this study highlight the inequities in oral
health in the country and show the need of the inclusion of new perspectives on the traditional
approach of Preventive Dentistry and education models in Dentistry. Tackling health
inequalities in oral health in the country requires the cooperation of various actors involved in
the process and the inclusion of oral health in the context of overall health. The social
determinants approach, as well as evaluating the distribution of oral diseases in the country
and its inclusion in the context of overall health, should guide the implementation of
programs and oral health practices in order to contribute to the reduction of inequalities.
Key Words: Oral Health. Adolescent. Health Inequalities. Socioeconomic Factors.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 - Modelo de determinação social da saúde proposto por Dahlgren e
Whitehead (1991)................................................................................
24
Figura 2 - Distribuição do Índice de Cuidados Odontológicos de acordo com
os domínios do estudo. Brasil, 2013....................................................
46
Figura 3 - Distribuição do Índice de Perda do 1o Molar Permanente de acordo
com os domínios do estudo. Brasil, 2013............................................
47
Figura 4 - Distribuição do Índice T-Health (6) de acordo com os domínios do
estudo. Brasil, 2013.............................................................................
48
Quadro 1 - Principais características dos quatro levantamentos epidemiológicos
realizados no Brasil. (Brasil, 2012).....................................................
32
Quadro 2 - Variáveis independentes incluídas no estudo. Brasil, 2013................. 38
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Componentes obtidos a partir dos dados socioeconômicos dos
municípios do interior do Brasil. Brasil, 2013........................... 40
Tabela 2 - Distribuição dos municípios do interior em cada cluster, por
região brasileira. Brasil, 2013.................................................... 42
Tabela 3 - Valores dos componentes da ACP em cada cluster. Brasil,
2013............................................................................................ 42
Tabela 4 - Estatística descritiva dos indicadores socioeconômicos dos 31
domínios estudados. Dados referentes ao ano de 2010. ............ 44
Tabela 5 - Estatística descritiva dos desfechos de saúde bucal referentes
aos 31 domínios estudados. Dados referentes ao ano de
2010............................................................................................ 45
Tabela 6 - Análise de Regressão Linear Simples para o desfecho “Índice
de Cuidados Odontológicos”. Brasil, 2013................................ 49
Tabela 7 - Modelo final para a análise de regressão linear múltipla do
desfecho "Índice de Cuidados Odontológicos". Brasil,
2013............................................................................................. 49
Tabela 8 - Análise de Regressão Linear Simples para o desfecho “Perda
do 1º Molar Permanente”. Brasil, 2013...................................... 50
Tabela 9 - Modelo final para a análise de regressão linear múltipla do
desfecho "Perda de 1o. Molar Permanente". Brasil,
2013............................................................................................ 50
Tabela 10 - Análise de Regressão Linear Simples para o desfecho “T-
Health (6)”. Brasil, 2013............................................................. 51
Tabela 11- Modelo final para a análise de regressão linear múltipla do
desfecho "T-Health (6)". Brasil, 2013......................................... 51
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
PNUD = Programa das Nações Unidas pelo Desenvolvimento
T-health = Índice de Equivalência de Dentes Saudáveis (Tissue-Health)
CPO-D = índice de Dentes Cariados, Perdidos e Obturados
CNDSS = Comissão Nacional de Determinantes Sociais de Saúde
CEBES = Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
OMS = Organização Mundial da Saúde
DSS = Determinantes Sociais da Saúde
CDSS = Comissão sobre os Determinantes Sociais da Saúde
SUS = Sistema Único de Saúde
PIB = Produto Interno Bruto
ICNTP = Índice Comunitário de Necessidades de Tratamento Periodontal
SBBrasil = Pesquisa Nacional de Saúde Bucal
CPI = Índice Periodontal Comunitário
DAI = Índice de Estética Dentária (Dental Aesthetic Index)
CTA = Comitê Técnico Assessor
IADR = Associação Internacional de Pesquisa Odontológica (International Association for
Dental Research)
FDI = Federação Dentária Internacional
GOHP = Programa Mundial de Saúde Bucal da OMS (Global Oral Health Programm)
IBGE = Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
Gini = Medida de Desigualdade criada pelo estatístico italiano Conrado Gini.
DATASUS = Banco de Dados do Sistema Único de Saúde
RIPSA = Rede Interagencial de Informações para a Saúde
PEA = População Economicamente Ativa
SPSS = Pacote Estatístico para Ciências Sociais (Statistical Package for Social Science)
ACP = Análise de Componentes Principais
KMO = teste de Kaiser-Meyer-Olkin
ANOVA = Análise de Variância
CONEP = Comissão Nacional de Ética em Pesquisa
CNS = Conselho Nacional de Saúde
TCLE = Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
IDH = Índice de Desenvolvimento Humano
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 12
2 REVISÃO DA LITERATURA.................................................................................... 14
2.1 DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE ................................................................. 14
2.1.1 Determinação social ....................................................................................................... 14
2.1.2 Os significados da Saúde ................................................................................................ 15
2.1.3 Determinação social da saúde......................................................................................... 15
2.2 DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE E SAÚDE BUCAL ................................. 24
2.3 LEVANTAMENTOS EPIDEMIOLÓGICOS EM SAÚDE BUCAL NO BRASIL...... 27
2.3.1 SBBrasil 2010 ................................................................................................................. 29
3 OBJETIVOS ................................................................................................................. 36
3.1 OBJETIVO GERAL ....................................................................................................... 36
3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ......................................................................................... 36
4 MÉTODO ...................................................................................................................... 37
4.1 CARACTERÍSTICAS DA PESQUISA ......................................................................... 37
4.2 VARIÁVEIS DO ESTUDO ............................................................................................... 37
4.2.1 Variáveis Independentes .................................................................................................. 37
4.2.2 Variáveis Dependentes .................................................................................................... 39
4.3 AMOSTRA ........................................................................................................................ 40
4.4 ESTRATÉGIAS DE ANÁLISE ......................................................................................... 40
4.4.1 Análise de Componentes Principais ................................................................................ 40
4.4.2 Análise de Clusters .......................................................................................................... 41
4.4.3 Regressão Linear ............................................................................................................. 43
4.5 ASPECTOS ÉTICOS ......................................................................................................... 43
5 RESULTADOS .................................................................................................................... 44
5.1 RESULTADOS DA ANÁLISE DESCRITIVA DAS VARIÁVEIS ................................. 44
5.2 RESULTADOS DA REGRESSÃO LINEAR ................................................................... 48
6 DISCUSSÃO ........................................................................................................................ 52
7 CONCLUSÕES .................................................................................................................... 61
REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 63
12 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
1 INTRODUÇÃO
A distribuição da saúde e da doença em uma sociedade não é um processo aleatório.
Ele está associado à posição social, que por sua vez define as condições de vida e trabalho de
indivíduos e grupos (COMISSÃO NACIONAL SOBRE DETERMINANTES SOCIAIS DA
SAÚDE, 2008).
A questão da determinação social em saúde não é bem uma novidade, mas nos últimos
anos voltou a ocupar um lugar de prestígio nas pesquisas em todo o mundo (CEBES, 2009). O
conhecimento científico tem caráter provisório e, com o passar do tempo, novos conceitos vão
sendo criados, ao passo que novos desafios vão sendo gerados, exigindo respostas que
satisfaçam aos anseios atuais (VOLPATO, 2007). Dessa forma, em 2005, a OMS criou a
Comissão sobre os Determinantes Sociais da Saúde, cujo trabalho resultou na divulgação de
um impactante relatório sobre o tema em 2008. O objetivo maior deste empreendimento foi
promover uma tomada de consciência sobre a importância dos determinantes sociais na
situação de saúde de indivíduos e populações e também da necessidade de combate às
iniquidades em saúde por eles geradas (COMISSÃO NACIONAL SOBRE
DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE, 2008).
O Brasil, apesar de ser uma das maiores potências econômicas do mundo e vir
apresentando uma melhoria no valor médio de seus indicadores de saúde, é também o 3º em
desigualdade social, segundo dados do PNUD (2011), e permanece entre os países com
maiores iniquidades em saúde, que surgem como produto de grandes desigualdades entre os
diversos estratos sociais e econômicos da população brasileira.
As iniquidades em saúde entre grupos e indivíduos, ou seja, as desigualdades de saúde
que além de sistemáticas e relevantes são também evitáveis, injustas e desnecessárias,
segundo a definição de Margareth Whitehead (1992), são um dos traços mais marcantes da
situação de saúde brasileira. Aprofundar o seu conhecimento é importante não apenas porque
o Brasil possui uma grande parte da população pobre da América Latina, mas porque
apresenta um grande potencial para erradicar essa pobreza (NERI; SOARES, 2002).
Contribuir com a investigação dos determinantes sociais com reflexo na saúde bucal e as
iniquidades geradas a partir deles no país, produto de grandes desigualdades entre os diversos
estratos sociais e econômicos da população brasileira, constitui o principal objetivo deste
estudo. Enquanto os valores médios dos índices socioeconômicos do Brasil apresentam
tímidos progressos, amplos setores da sua população permanecem vivendo em precárias
13 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
condições de vida e de saúde, sendo submetidos a privações de liberdade que limitam sua
capacidade de optar entre diferentes alternativas, de ter voz frente às instituições do Estado e
da sociedade e até mesmo de ter maior participação na vida social (BUSS; PELLEGRINI
FILHO, 2006; COMISSÃO NACIONAL SOBRE DETERMINANTES SOCIAIS DA
SAÚDE, 2008).
Tratando-se especificamente do campo da Saúde Bucal Coletiva, são facilmente
encontrados, na literatura brasileira, estudos pesquisando relações entre a condição bucal de
crianças, em especial tratando-se da cárie, e fatores a nível individual, como gênero, etnia,
idade, condições socioeconômicas, entre outros (GUSHI et al., 2005b; BARATA et al., 2007;
SALES-PERES et al., 2008; BASTOS et al.; 2009). Estudos com adolescentes são menos
comuns na literatura e, mesmo nestes, são utilizados indicadores tradicionais, havendo poucos
que se aventuram pesquisando desfechos inovadores como os presentes neste estudo. Da
mesma forma, estudos de natureza ecológica são menos usuais, a despeito de propiciarem
uma visão mais ampla sobre a importância dos determinantes sociais, especificamente
contextuais, na condição de saúde bucal no país, em especial a dos adolescentes. Os grupos
sociais são unidades legítimas de análise e suas propriedades diferem daquelas dos seus
membros individuais. As variáveis grupais ou contextuais podem ter efeitos independentes
das características individuais, as quais incluem a capacidade de escolha de cada indivíduo
(PELLEGRINI FILHO, 2004). Os estudos ecológicos possuem a particularidade de,
investigando os efeitos do meio sobre a saúde de uma população, servir como auxiliar na
gestão de políticas públicas direcionadas a reduzir desigualdades em saúde, em especial no
tocante ao acesso e utilização dos serviços. Estudos nacionais e internacionais têm mostrado
que a experiência de enfermidades bucais é suscetível às desigualdades sociodemográficas e
geográficas, sugerindo a existência de iniquidades em saúde bucal (FERNANDES; PERES,
2005; FISCHER et al., 2010; HJERN et al., 2001; NGUYEN; HAKKINEN; ROSENQVIST,
2005; PALMIER et al., 2012).
14 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
2 REVISÃO DA LITERATURA
2.1 DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE
2.1.1 Determinação social
Para melhor entender o significado e a importância dos determinantes sociais da saúde
(DSS), faz-se necessário partir do pensamento original que sustenta tudo que exploraremos a
seguir - a teoria da determinação social dos indivíduos. Começar por ela é necessário porque a
saúde, seja qual for o significado que lhe seja atribuído, não pode estar dissociada da
determinação geral da vida das pessoas.
No âmbito do pensamento social contemporâneo, é difícil contestar a ideia de que os
indivíduos são fortemente determinados por sua posição na sociedade e que essa
determinação atravessa todas as dimensões da vida social. No entanto, é possível considerar
essa determinação até níveis mais amplos, onde se encontram as relações econômicas e
macrossociais. As possibilidades para o desenvolvimento e realização de capacidades
individuais, as expectativas, os valores e o próprio caráter das pessoas são profundamente
marcados pela estrutura econômico-social geral, que é progressivamente mais mundial. Este
modo de se fazer presente na vida das pessoas passa por uma série de mediações, o que
explica as diferenças nas condições materiais e culturais de diversas famílias de uma mesma
classe ou grupo social. Da mesma maneira, existem diferenças nos valores éticos, gostos
estéticos, características das relações interpessoais de cada subgrupo, de cada família e de
cada indivíduo. Esta, portanto, é a última mediação na determinação de cada indivíduo: ele
mesmo. Isso quer dizer que a sequência de determinações sociais, desde as características
mais gerais da sociedade até as mais particulares, conforma as individualidades, mas essas são
ativas na escolha de seus atos. Essa escolha e o comprometimento individual e coletivo que
daí podem derivar são momentos críticos para a transformação da própria estrutura social, dos
padrões de relações e valores que conformam uma dada sociedade (FLEURY-TEIXEIRA,
2009).
15 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
2.1.2 Os significados da Saúde
Os significados da saúde são muitos e sua compreensão é primordial para um maior
aprofundamento no estudo sobre seus determinantes. A definição mais tradicional de saúde é
puramente negativa, considerada como a simples ausência de doenças. Amplamente
contestada, como componente de uma visão restritiva, puramente biológica e médica da
questão da saúde, certamente não se aplica a uma análise da determinação social da saúde.
Outra definição, mais moderna, está presente na Constituição da Organização Mundial
de Saúde (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2006), de 1946, que considera a saúde
como um estado de perfeito bem-estar. Apesar de ser uma concepção positiva, apresenta
alguns inconvenientes. Em primeiro lugar, há a indeterminação, a incapacidade de especificar
o objeto que se pretende definir. Em segundo lugar, está o fato de postular a saúde como um
estado ideal de plenitude e, portanto, inatingível. Evidentemente, não é este o sentido concreto
que a saúde representa na vida cotidiana das pessoas (DEJOURS, 1986).
Chega-se, então, no final da década de 80, a uma terceira definição, que tem
conquistado progressivamente mais espaço no setor saúde. Ela visualiza a saúde como um
meio, um recurso para a vida das pessoas. Aqui vigora uma definição positiva, sem elevá-la a
patamares utópicos. Este último conceito permite a clara distinção da saúde em relação aos
outros recursos e condições da realização da vida humana, determinando o seu espaço dentro
dos objetivos de vida das pessoas. Assim, ela pode ser considerada como meio para a vida ou
para a realização dos indivíduos, sendo tomada como um dos elementos da qualidade de vida
e uma das condições objetivas para o desenvolvimento humano, e não como o seu conjunto.
Saúde, capacidade psicobiológica é, certamente, uma condição parcial para a realização dos
indivíduos na vida que, ao mesmo tempo, abrange e é condicionada pelas determinações de
sua existência como ser biológico (FLEURY-TEIXEIRA, 2009; ORGANIZAÇÃO
MUNDIAL DA SAÚDE, 1986).
2.1.3 Determinação social da saúde
2.1.3.1 Os Determinantes Sociais da Saúde e seus conceitos
Os Determinantes Sociais da Saúde (DSS), ao longo do tempo, foram sendo
conceituados de diversas formas. Tarlov, em 1996, definiu resumidamente os DSS como “as
16 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
características sociais dentro das quais a vida transcorre”. De acordo com a Comissão de
Determinantes Sociais de Saúde da OMS, eles são “as condições sociais nas quais as pessoas
vivem e trabalham”. Em 2008, a Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais de Saúde
publicou, em seu relatório final, um conceito mais detalhado, passando a defini-los como “os
determinantes vinculados aos comportamentos individuais e às condições de vida e trabalho,
bem como os relacionados com a macroestrutura econômica, social e cultural”. Acrescentou
ainda que são “produto da ação humana e, portanto, podem e devem ser transformados pela
ação humana” (COMISSÃO NACIONAL SOBRE DETERMINANTES SOCIAIS DA
SAÚDE, 2008).
Faz-se importante diferenciar aqui desigualdades e iniquidades em saúde. Para isso,
vamos utilizar o conceito proposto por Margareth Whitehead, em 1992, em um documento de
consultoria, elaborado a pedido da OMS. Para a autora, “desigualdade” conota as principais
diferenças dimensionais, sistemáticas e evitáveis entre os membros de uma dada população.
Já a “iniquidade” corresponde às diferenças e variações que são não apenas desnecessárias e
evitáveis, mas também desleais e injustas.
Almeida-Filho (2009) diferencia de forma mais prática esses conceitos, ao dizer que:
A ocorrência de variação natural ou genética, expressa em diferenças
individuais, advindas da interação de processos sociais e biológicos,
produz diversidade nos espaços coletivos sociais e desigualdades nas
populações humanas. Por outro lado, estruturas sociais, processos políticos
perversos e políticas de governo sem equidade, geram desigualdades
relacionadas à renda, educação e classe social, portanto inequidades,
correspondendo à injustiça social. Algumas dessas desigualdades, além de
injustas, são iníquas e, portanto, moralmente inaceitáveis, constituindo
iniquidades que geram indignação e, potencialmente, mobilização social.
2.1.3.2 O Campo da Determinação Social da Saúde
O fato de ter voltado à baila a questão da determinação social em saúde
como tema para discussão crítica no campo da saúde coletiva é motivo de
muito regozijo e esperança. Esta é uma temática que nos permite pensar,
compreender melhor e avaliar a relação saúde-sociedade e inclusive indagar
se nosso trabalho, como profissionais da saúde, tem sido capaz de contribuir
para que esta relação seja conduzida a um ancoradouro no qual o bem-estar,
a autorrealização e a felicidade individual e coletiva possam superar os
sofrimentos e as perdas de capacidade e potência inerentes aos seres
humanos (TAMBELLINE; SCHUTZ, 2009).
17 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
As condições sociais são efetivamente a base para o padrão sanitário de um povo,
assim como a posição de cada indivíduo na sociedade é uma base da própria saúde. É mais do
que evidente o grande diferencial de risco ambiental ou físico a que estão submetidos os
indivíduos conforme a sua posição social. Esse gradiente social se manifesta na comparação
entre países e no interior dos países, na comparação entre os diversos estratos sociais. A
exposição a agentes biológicos, químicos ou físicos danosos, a deficiência nutricional, o
desgaste físico generalizado ou o esforço repetitivo no trabalho são características das
condições sociais de pobreza ou miséria que ainda acometem a maior parte da população
mundial. Além da maior exposição aos riscos, a vulnerabilidade das populações carentes é
ampliada pela deficiência no acesso à educação e aos serviços de saúde, o que reduz a sua
capacidade de lidar com tais riscos. No entanto, a determinação social da saúde não está
circunscrita aos males provenientes da exposição aos riscos de dano fisiológico, que são
característicos da pobreza. Há, ainda, um campo de determinantes sociais sobre a saúde mais
sutil, mas igualmente intenso. Trata-se do campo comumente chamado de determinantes
psicossociais. Nele se encontram o grau de reconhecimento, o nível de autonomia e de
segurança, assim como o balanço entre esforço e recompensa e entre expectativas, realizações
e frustrações que os indivíduos obtêm no curso de suas vidas (FLEURY-TEIXEIRA, 2009).
O campo da determinação social da saúde é cada vez mais relevante, estando na base
da série causal dos principais problemas de saúde da atualidade no mundo em geral (Fleury-
Teixeira, 2009). As crianças têm chances de vida dramaticamente diferentes dependendo de
onde nasceram. No Japão ou na Suécia as pessoas podem viver mais de 80 anos; no Brasil, 74
anos; na Índia, 63 anos; e em um de vários países africanos, menos de 50 anos (NOGUEIRA,
2009). Segundo estatísticas da OMS (2009), foi encontrada uma diferença de mais de 40 anos
na expectativa de vida da Islândia (80 anos), na Europa, e em Serra Leoa (menos de 40 anos),
situada na África Ocidental. Uma diferença sem fundamentos biológicos que a justifiquem.
Além da diferença entre países, podemos encontrar dados chocantes no interior de um
mesmo país ou até de uma cidade, como acontece em Glasgow, na Escócia. Em sua parte
mais rica, a expectativa de vida para os homens é de 82 anos, ao passo que na parte mais
pobre é de apenas 54 anos, menor do que a média da Índia. Chamamos a atenção para o fato
de que, em Glasgow, ninguém vive em situação de pobreza, ou seja, com menos de dois
dólares por dia. No entanto, as desigualdades parecem afetar e causar iniquidades mesmo em
países não considerados de baixa renda (MARMOT; BELL, 2011).
18 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
O campo da determinação social da saúde, fundamentando-se nas mais amplas
evidências, seja na análise histórica, seja dentro dos próprios padrões da pesquisa
epidemiológica contemporânea, vai de encontro a uma concepção liberal da economia e da
sociedade que pretende que as atitudes e os comportamentos individuais são essencialmente
frutos da escolha individual e determinados pela natureza. Obviamente, não se trata de negar a
determinação genética das condições de saúde, mas de precisar o seu peso em face dos
determinantes comportamentais e sociais (FLEURY-TEIXEIRA, 2009).
É preciso, também, uma nova maneira de entender a pobreza e como ela pode
influenciar a saúde do indivíduo. Para isso, são pertinentes as palavras de Buss e Pellegrini
Filho (2006):
A pobreza não é somente a falta de acesso a bens materiais, mas também a
falta de oportunidades e de possibilidades de opção entre diferentes
alternativas. Pobreza é também falta de voz frente às instituições do Estado e
da sociedade e uma grande vulnerabilidade frente a imprevistos. Nessa
situação, a capacidade dos pobres de atuar em favor de sua saúde e da
coletividade está bastante diminuída.
2.1.3.3 Abordagens
Há várias abordagens para o estudo dos mecanismos através dos quais os DSS
provocam as iniquidades de saúde, cada um com um enfoque particular. A primeira delas
refere-se aos “aspectos físico-materiais” na produção da saúde e da doença, entendendo que
as diferenças de renda influenciam a saúde pela escassez de recursos dos indivíduos e pela
ausência de investimentos em infraestrutura comunitária (educação, transporte, saneamento,
habitação, serviços de saúde, etc), decorrentes de processos econômicos e de decisões
políticas. Outra abordagem privilegia os “fatores psicosociais”, explorando as relações entre
percepções de desigualdades sociais, mecanismos psicobiológicos e situação de saúde, com
base no conceito de que as percepções e as experiências de pessoas em sociedades desiguais
provocam estresse e prejuízos à saúde. Uma forma mais abrangente de compreensão é através
dos enfoques “ecossociais” e os chamados “enfoques multiníveis” que buscam integrar as
abordagens individuais e grupais, sociais e biológicas numa perspectiva dinâmica, histórica e
ecológica. Finalmente, há a abordagem que enfoca o desgaste do chamado “capital social”,
que busca analisar as relações entre a saúde das populações, as desigualdades nas condições
de vida e o grau de desenvolvimento da trama de vínculos e associações entre indivíduos e
19 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
grupos. Em outras palavras, analisa as relações de solidariedade e confiança entre pessoas e
grupos, como um importante mecanismo através do qual as iniquidades de renda impactam
negativamente a situação de saúde (BUSS; PELEGRINI FILHO, 2007).
Segundo vários autores, o desgaste do capital social em sociedades iníquas explicaria
em grande medida porque sua situação de saúde é inferior à de sociedades em que as relações
de solidariedade são mais desenvolvidas. Ao contrário do capital físico ou humano, que são
bens privados, o capital social é um bem público, criado pelas relações sociais. A debilidade
dos laços de coesão social ocasionada pelas iniquidades de renda corresponde a baixos níveis
de capital social e de participação política. Países com grandes iniquidades de renda, escassos
níveis de coesão social e baixa participação política são os que menos investem em capital
humano e em redes de apoio social fundamentais para a promoção e proteção da saúde
individual e coletiva (KAWACHI et al., 1997).
Estudos mostram, ainda, que não são as sociedades mais ricas as que possuem
melhores níveis de saúde, mas as que são mais igualitárias e com alta coesão social (BUSS;
PELEGRINI FILHO, 2007). O Japão não é o país com maior expectativa de vida no mundo
por ser o mais rico ou pelos japoneses possuírem hábitos mais saudáveis como não fumar ou
praticar exercícios, mas pelo fato do Japão ser um dos países mais igualitários do mundo
(BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2006).
2.1.3.4 Os DSS, a Saúde Pública e aspectos históricos
Para alguns autores, fatores como o desgaste do modelo neoliberal de
desenvolvimento, as tensões geradas pela crescente iniquidade socioeconômica e até mesmo
as mudanças climáticas com efeitos sobre a saúde, em especial de grupos populacionais mais
pobres e vulneráveis, contribuíram para o redirecionamento do foco das atenções da Saúde
Pública para o tema dos determinantes sociais. No entanto, a preocupação de entender as
condições sociais e ambientais e suas relações com o processo saúde-doença para poder
intervir sobre elas sempre fez parte, de diversas maneiras, de diferentes momentos da história
do desenvolvimento do que hoje se denomina “Saúde Pública”. Desde o século V a.C, com o
Tratado “Ares, Águas e Lugares” de Hipócrates, passando pela teoria miasmática do século
XIX até os movimentos sanitários do século passado, muito tem-se discutido sobre o assunto.
No entanto, ao longo do século XX houve um permanente embate entre os diferentes
enfoques da saúde pública, havendo momentos com enfoques mais centrados em aspectos
20 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
biológicos, individuais e tecnológicos, com outros onde foi destacada a importância dos
determinantes sociais e ambientais (SOBRAL; FREITAS, 2010).
Ainda hoje, falar sobre “determinação social da saúde” requer, para muitos, a quebra
de um paradigma. É o questionamento do senso comum, segundo o qual a qualidade da saúde
de um determinado lugar é equivalente à qualidade de atenção médica instalada. Dr. Marc
Lalonde foi um dos destaques no rompimento dessa crença. Em 1974, ele elaborou um
documento que discutia reformas no sistema de saúde do Canadá, diante do fracasso de um
modelo de atenção médico-sanitária voltado aos doentes. Propôs, assim, a criação de uma
nova abordagem para o campo de saúde, dividindo-o em quatro grandes elementos: a biologia
humana, o entorno ambiental, os estilos de vida e a organização do sistema de saúde pública.
Em outras palavras, fatores determinantes da saúde que existem fora da assistência médica
(TAMBELLINE; SCHUTZ, 2009).
No final da década de 1970, as discussões acerca da determinação da saúde passaram a
incluir a questão social como elemento de peso, o que pôde ser constatado na Declaração de
Alma-Ata, em 1978 e na Primeira Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde, em
1986 (TAMBELLINE; SCHUTZ, 2009).
No Brasil, o Movimento da Reforma Sanitária, com ampla participação popular,
trouxe conquistas permanentes para o país, a partir de propostas elaboradas no relatório final
da 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986). A Constituição Federal do Brasil, aprovada em
1988, determina em seu artigo 196 que “a saúde é direito de todos e dever do Estado,
garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e
de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção,
proteção e recuperação.” Além disso, um novo Sistema Nacional de Saúde é criado, o SUS,
fundado nos princípios da solidariedade, equidade e universalidade (BRASIL, 1986;
BRASIL, 1988; COMISSÃO NACIONAL SOBRE DETERMINANTES SOCIAIS DA
SAÚDE, 2008).
A Organização Mundial da Saúde, com o objetivo de promover uma tomada de
consciência sobre a importância dos determinantes sociais na situação de saúde de indivíduos
e populações, bem como da necessidade de combate às iniquidades em saúde por eles
geradas, criou a Comissão sobre os Determinantes Sociais da Saúde (Comission on Social
Determinants of Health) em março de 2005. No ano seguinte, o Brasil foi o primeiro país a
criar a sua própria comissão – Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais da Saúde
(CNDSS) – com mandato de dois anos (COMISSÃO NACIONAL SOBRE
21 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE, 2008). E foi aqui no Brasil, na cidade do Rio de
Janeiro, que aconteceu a 1ª Conferência Mundial sobre Determinantes Sociais da Saúde, em
outubro de 2011, com o tema “Todos pela Equidade”.
Como bem resumiu a CEBES, em 2009:
O enfoque de determinantes sociais procura alertar as autoridades dos países sobre
a necessidade de se chegar a uma solução coletiva dos problemas da desigualdade
social em saúde. Portanto, as políticas públicas nessa área não devem se limitar a
promover incentivos de mudança de comportamento individual diante dos riscos
das enfermidades. As pessoas estão morrendo por falta de justiça social, e esta é
uma das conclusões mais salientes no relatório da OMS (COSTA, 2009).
2.3.1.5 O estudo dos DSS e suas interpretações
A relação de determinação não é uma simples relação direta de causa e efeito. Logo, o
principal desafio dos estudos sobre os determinantes sociais de saúde consiste em estabelecer
uma hierarquia de determinações entre os fatores mais gerais, de natureza social, econômica e
política e as mediações através das quais esses fatores incidem sobre a situação de saúde de
grupos e pessoas. Os fatores individuais são importantes para identificar que indivíduos no
interior de um grupo estão submetidos a um maior risco, enquanto que as diferenças nos
níveis de saúde entre grupos e países estão mais relacionadas com outros fatores,
principalmente o grau de equidade na distribuição de renda (BUSS; PELLEGRINI FILHO,
2007).
Tem crescido bastante, nos últimos anos, a literatura científica internacional dedicada
ao estudo das iniquidades em saúde e seus determinantes. Este aumento se deu em quantidade
e qualidade, e abordagens metodológicas diferentes vêm sendo utilizadas para análise dos
problemas em nível populacional, como é o caso da análise contextual. Ela se fundamenta no
reconhecimento de que os grupos sociais são unidades legítimas de análise e que as
propriedades destes grupos diferem daquelas dos seus membros individuais. Em outras
palavras, é o mesmo que dizer que as variáveis grupais ou contextuais podem ter efeitos
independentes das características individuais ou modificar a maneira como estas
características individuais incidem sobre a situação de saúde (KRIEGER, 1994; SUSSER,
1998).
O clássico estudo de Rose e Marmot (1981) sobre a mortalidade por doença
coronariana ilustra muito bem esta situação. Pesquisando funcionários públicos ingleses, eles
22 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
detectaram que os de níveis hierárquicos inferiores tinham um risco relativo maior de
desenvolver a doença de, aproximadamente, duas, três e quatro vezes quando comparados aos
funcionários do mais alto nível da hierarquia. Os autores encontraram que os fatores de risco
individuais, como colesterol, hábito de fumar, hipertensão arterial e outros explicavam apenas
35 a 40% da diferença, sendo os restantes 60-65% basicamente relacionados aos DSS.
Outro ponto que merece destaque é a influência que a riqueza de um país e a forma
como ela está distribuída têm sobre a saúde da população. É evidente que o volume de riqueza
gerado por uma sociedade é um elemento fundamental para proporcionar melhores condições
de vida e de saúde, mas há inúmeros exemplos onde países com PIB total ou per capita menor
possuem melhores indicadores de saúde que outros com PIB maiores (BUSS; PELLEGRINI,
2006). Corroborando este fato, estudos constatam que, uma vez superado um determinado
limite de crescimento econômico de um país (cerca de 8.000 a 10.000 dólares per capita), um
crescimento adicional da riqueza não se traduz em melhorias significativas das condições de
saúde. A partir desse nível, o fator mais importante para explicar a situação geral de saúde de
um dado país não é sua riqueza total, mas a maneira como ela se distribui (WILKINSON,
1997).
A desigualdade na distribuição de renda não é prejudicial apenas à saúde dos grupos
mais pobres, desprivilegiados, como muitos de grupos mais abastados podem pensar. Ela
prejudica a sociedade como um todo. Grupos de renda média em um país com alto grau de
iniquidade de renda possuem uma situação de saúde pior que a de grupos com renda inferior
vivendo em uma sociedade mais equitativa. (BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2006;
NOGUEIRA, 2009).
2.1.3.6 Modelos de Referência
Os diversos estudos sobre os DSS e as iniquidades em saúde permitiram a construção
de modelos que procuram esquematizar a trama de relações entre os vários níveis de
determinantes sociais e a situação de saúde. Apesar da existência de outros modelos mais
complexos, que buscam explicar com maiores detalhes as relações e mediações entre os
diversos níveis de DSS (SOBRAL; FREITAS, 2010) e a gênese das iniquidades, foi escolhido
o de Dahlgren e Whitehead (1991), por ser de fácil compreensão e mais clara visualização
gráfica, além de ser também um dos mais conhecidos e utilizados.
23 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Este modelo dispõe os DSS em diferentes camadas, segundo seu nível de abrangência,
desde uma camada mais próxima aos determinantes individuais até uma camada distal onde se
situam os macrodeterminantes (Figura 1). Na base do modelo estão os indivíduos, com suas
características individuais de idade, sexo e fatores genéticos que exercem influência sobre seu
potencial e suas condições de saúde.
Na camada imediatamente externa, aparecem o comportamento e os estilos de vida
individuais. Esta camada representa o limiar entre os fatores individuais e os DSS, uma vez
que os comportamentos dependem não apenas de opções feitas pelo livre arbítrio das pessoas,
mas também de DSS, quer sejam o acesso a informações, propaganda, pressão de pares,
possibilidades de acesso a alimentos saudáveis e espaços de lazer, entre outros.
A próxima camada destaca a influência das redes comunitárias e de apoio, cuja maior
ou menor riqueza expressa o nível de coesão social, de fundamental importância para a saúde
da sociedade como um todo.
No nível seguinte, estão representados os fatores relacionados às condições de vida e
de trabalho, disponibilidade de alimentos e acesso a ambientes e serviços essenciais, como
saúde e educação, indicando que as pessoas em desvantagem social apresentam diferenciais
de exposição e de vulnerabilidade aos riscos à saúde, como consequência de condições
habitacionais inadequadas, exposição a condições mais perigosas ou estressantes de trabalho e
acesso menor aos serviços.
Finalmente, no último nível, estão situados os macrodeterminantes que possuem
grande influência sobre as demais camadas e estão relacionados às condições econômicas,
culturais e ambientais da sociedade, o que inclui também determinantes supranacionais como
o processo de globalização.
24 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Figura 1 - Modelo de determinação social da saúde proposto por Dahlgren e Whitehead (1991)
Fonte: Dahlgren e Whitehead (1991)
2.2 DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE E SAÚDE BUCAL
Na área de saúde bucal, muitos estudos nacionais e internacionais têm apontado a
associação entre condições bucais e determinantes sociais, desde o nível individual até às
condições socioeconômicas, culturais e ambientais de caráter mais geral. Estes trabalhos têm
constatado que a experiência de tais agravos é susceptível às desigualdades sociodemográficas
e geográficas, sugerindo a existência de iniquidades em saúde bucal (FISCHER et al., 2010;
GARCIA; TABAK, 2011; JOHNSON et al., 2011; MOREIRA; NICO; TOMITA, 2011).
A cárie dentária, principal causa de perdas dentárias, é um bom exemplo para
evidenciar este quadro de iniquidade. Vem ocorrendo um declínio acentuado e real deste
agravo entre crianças nos países industrializados e em alguns países em desenvolvimento,
inclusive no Brasil, tendo como possíveis causas: o aumento e a universalização da exposição
das pessoas ao flúor em suas variadas formas de aplicação, com destaque para a água de
abastecimento e os dentifrícios fluoretados; as melhorias nas condições de vida e saúde das
25 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
populações; alterações nos padrões dietéticos; maior ênfase nas atividades de prevenção e
promoção de saúde; e mudanças nos critérios de diagnóstico da doença (SALES-PERES;
BASTOS, 2002; BALDANI; VASCONCELOS; ANTUNES, 2004; GUSHI et al., 2005b).
Contudo, esta diminuição na incidência e prevalência da cárie não está ocorrendo de forma
homogênea. O que se observa é que um pequeno grupo concentra a grande maioria dos
problemas em saúde bucal, e um percentual maior se apresenta livre de cárie ou com poucas
lesões, demonstrando a ocorrência do fenômeno chamado “polarização” da cárie. Este
fenômeno tem sido documentado, tanto em crianças como em adultos, em inúmeros países
industrializados como a Finlândia, o Reino Unido, a Austrália e também em nações em
desenvolvimento como a Arábia Saudita e o Brasil (SALES-PERES; BASTOS, 2002; GUSHI
et al., 2005b).
Nos grupos mais desfavorecidos, independente da faixa etária estudada, a cárie é mais
prevalente e ocorre com maior extensão e gravidade. Estes indivíduos têm menor acesso e
utilizam menos serviços preventivos e assistenciais, possuem padrão alimentar mais rico em
sacarose, têm piores hábitos de higiene bucal e menor acesso e utilização de fluoretos
(BARBATO; PERES, 2009). No caso particular do Brasil, o quadro epidemiológico de saúde
bucal reflete com nitidez algumas das principais características de sua sociedade, como
agudas desigualdades sociais, sistema educacional com ênfase na formação de nível superior e
um grande número de pessoas de baixa renda e em estado de pobreza relativa ou absoluta
(SALES-PERES; BASTOS, 2002).
A atribuição da redução da cárie a melhorias nos serviços de saúde bucal é
questionada por ter ocorrido em países distantes uns dos outros e com diferentes sistemas de
serviços de saúde bucal. Além disso, seu papel é considerado bastante inferior quando
comparado às mudanças socioeconômicas (BALDANI; VASCONCELOS; ANTUNES,
2004).
GUSHI et al. (2005b), pesquisando a prevalência e severidade da cárie entre
adolescentes no estado de São Paulo e sua associação com o acesso aos serviços
odontológicos, encontraram que sujeitos que nunca foram ou não frequentavam regularmente
ao dentista, apresentaram baixos valores de CPO-D, indicando que um maior acesso aos
serviços não parece estar diretamente relacionado a uma redução no ataque da cárie. Já um
estudo ecológico conduzido por Antunes et al., em 2008, identificou associação significativa
entre a utilização de serviços odontológicos e melhores condições de saúde gengival em
adolescentes, independente das características sociodemográficas individuais e contextuais.
26 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
É possível constatar os mesmos gradientes sociais encontrados em estudos da saúde
geral no âmbito da saúde bucal. Blas e Kurup (2010), pesquisando dados provenientes do
Reino Unido, encontraram um declínio na prevalência da perda dentária em adultos com mais
de 20 anos de 1993 a 2003. No entanto, um gradiente social da perda dentária persistiu.
Reforçando esse achado, um estudo sobre a prevalência da cárie dentária em crianças, na
Escócia, encontrou uma associação com o grau de privação encontrado nos bairros onde
moravam. Crianças com cinco anos vivendo em áreas menos carentes foram mais propensas a
não possuir nenhum dente afetado pela cárie (LEVIN et al., 2009).
Estudos que investigam a influência da raça na saúde bucal no Brasil têm encontrado
resultados contraditórios. Ela é percebida, em especial, em agravos como bolsas periodontais
mas, enquanto os adolescentes negros são menos acometidos no Nordeste, a situação se
inverte no sudeste sugerindo que esta região, a despeito de ser a de maior provisão de serviços
odontológicos do país, não parece estar estendendo esses benefícios de forma igual para
pardos, negros e brancos (BASTOS et al., 2009).
Em relação aos fatores socioeconômicos individuais, os estudos nacionais, de forma
geral, têm relatado associação entre altos valores de CPO-D e de perda dentária em
adolescentes com baixa renda, baixa escolaridade, provenientes de escola pública e de baixo
nível social (GUSHI et al., 2005a; VIANA et al., 2009). Pesquisando fatores contextuais,
Kolterman, Giordani e Pattussi (2011) relacionaram altas taxas de funcionalidade dentária em
adultos a municípios com alta renda, alta escolaridade, alto IDH, fluoretação há mais de 10
anos e locais de residência em áreas urbanas.
Fatores de risco biológicos e comportamentais têm sido privilegiados nas pesquisas de
saúde bucal. Mais recentemente, os determinantes psicossociais começaram a ser estudados,
em um esforço para melhor compreender e enfrentar os processos subjacentes às iniquidades.
Finlayson et al., pesquisando adultos americanos em 2010, encontraram que o estado de saúde
bucal autorrelatada era influenciado negativamente por níveis elevados de estresse crônico,
sintomas depressivos e dificuldades materiais. Níveis mais elevados de autoestima e
religiosidade foram considerados protetores.
Em relação à saúde bucal autorelatada, Sanders e Spencer (2004), em um estudo
investigando a distribuição sócioeconômica da percepção em saúde bucal em uma amostra
populacional na Austrália, constataram que adultos socioeconomicamente desfavorecidos
percebem um maior impacto negativo por problemas de origem bucal e relatam mais
frequentemente a perda dentária.
27 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
A saúde bucal parece receber influência dos determinantes sociais distribuídos desde
as camadas proximais às mais distais, como pode ser constatado na literatura que vem
abordando o tema com ênfase nos aspectos físicos, materiais e psicossociais até enfoques
multiníveis.
De uma perspectiva global, esta busca recente pela pesquisa sobre os determinantes
sociais parece ter recebido seu primeiro impulso na Conferência Mundial de Ottawa, sobre
Promoção da Saúde, em 1986, onde foi debatida a importância de ambientes e estilos de vida
saudáveis, bem como de sistemas de saúde orientados para a promoção de saúde e prevenção
de doenças. Em 2009 ocorreu a 7ª Conferência Mundial da OMS sobre Promoção da Saúde
em Nairóbi, no Quênia e, pela primeira vez na história, a saúde bucal foi abordada através de
uma sessão especial organizada pelo Programa Mundial de Saúde Bucal (GOHP) da OMS.
Nesta ocasião, a saúde bucal foi reconhecida como direito humano e fundamental para a saúde
geral e para a qualidade de vida. A importância de incluir a promoção de saúde bucal e
prevenção de doenças na atenção primária foi reconhecida, bem como a necessidade de
capacitação, políticas e recursos financeiros para reduzir o fosso entre pobres e ricos
(PETERSEN, 2010).
Entre as 4 orientações da GOHP para o século XXI, encontra-se a promoção de estilos
saudáveis e redução de fatores de risco à saúde bucal cujas causas são ambientais,
econômicas, sociais e comportamentais. No tocante à pesquisa em saúde bucal, são claras as
orientações da OMS para que uma maior ênfase seja dada sobre os determinantes sociais,
qualidade de vida, sistemas de saúde bucal, evidências das intervenções em saúde pública e
pesquisa operacional, de forma a preencher a lacuna das pesquisas em saúde bucal entre
países desenvolvidos e em desenvolvimento. Recentemente, a Associação Internacional de
Pesquisa Odontológica (IADR) iniciou um projeto promissor sobre o desenvolvimento de
uma agenda mundial para a pesquisa sobre desigualdade social em saúde bucal, sendo
destinada a cobrir as principais doenças bucais e seus determinantes sociais e as implicações
para a pesquisa em saúde pública (PETERSEN, 2010; WILLIAMS, 2011).
2.3 LEVANTAMENTOS EPIDEMIOLÓGICOS EM SAÚDE BUCAL NO BRASIL
A realização de inquéritos nacionais periódicos e regulares torna possível conhecer a
realidade epidemiológica de uma população a partir de cortes transversais periódicos e
sequenciados. Este tipo de levantamento abrange um amplo espectro de problemas de saúde,
28 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
permitindo correlacionar os resultados com as condições de vida das populações, conhecer a
distribuição dos fatores de risco e a percepção das pessoas a respeito do seu estado de saúde.
É possível obter informações sobre determinantes geográficos, sociais, econômicos e culturais
da saúde-doença, além de seus comportamentos relacionados. Os inquéritos nacionais são
meios eficazes para se conhecer a realidade do acesso aos múltiplos serviços e podem dar voz
aos seus usuários, possibilitando conhecer seu grau de satisfação. Por fim, são ferramentas
importantes para formular e avaliar programas e políticas públicas de saúde implementadas, o
que é de interesse de todos os níveis de governo e também da sociedade em geral, na busca de
melhores patamares de saúde (BARROS, 2008; WALDMAN, 2008).
Com relação ao uso dos inquéritos populacionais, têm sido apontadas suas
potencialidades para o estudo e o monitoramento das desigualdades sociais em saúde e seus
determinantes. Para isso, é importante que os bancos gerados sejam públicos e possam ser
analisados por vários grupos de pesquisadores, de diferentes perspectivas, fornecendo
inúmeras análises para utilização pelos gestores do sistema de saúde. É fundamental, também,
que haja rigor metodológico que garanta reprodutibilidade, validade e confiabilidade, e que
haja uniformidade de procedimentos para permitir comparações nacionais e internacionais
(VIACAVA, 2002; WALDMAN, 2008; RONCALLI et al., 2012).
No Brasil, o primeiro levantamento de saúde bucal de base nacional só foi realizado
em 1986 pelo Ministério da Saúde. As limitações orçamentárias foram determinantes para
definir a abrangência geográfica, a população alvo e a abrangência do exame bucal. Foram
utilizadas algumas recomendações da OMS, como as faixas etárias, a aferição de doença
periodontal pelo ICNTP (Índice Comunitário de Necessidades de Tratamento Periodontal) e
alguns critérios de diagnóstico de cárie. Entretanto, tal metodologia não seguiu uma
normatização básica oficial e única. Realizou-se um inquérito na área urbana de 16 capitais,
distribuídas entre as cinco macrorregiões do país, incluindo crianças (6 a 12 anos),
adolescentes (15 a 19 anos) e adultos (35 a 44 anos e 50 a 59 anos). A justificativa para não
considerar os idosos na pesquisa, como proposto pela OMS e adotado em países
desenvolvidos (65 a 74 anos), foi baseada no fato de a esperança de vida ao nascer ser, à
época, de 65,5 anos no Brasil. Ocorrência de cárie e doença periodontal, necessidade e uso de
prótese dentária foram observados, além de informações sobre acesso aos serviços de saúde
(RONCALLI, 1998; QUEIROZ; PORTELA; VASCONCELLOS, 2009).
Dez anos depois, em 1996, com o Sistema Único de Saúde (SUS) já implantado, foi
realizado o segundo inquérito com o objetivo de verificar as alterações ocorridas no perfil de
29 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
saúde bucal da população brasileira, tomando como referência o inquérito de 1986, para obter
um referencial para as ações preventivas do SUS. No entanto, pode-se considerar que houve
um retrocesso. Apesar de aumentar sua abrangência, utilizando as 27 capitais brasileiras, o
levantamento se restringiu a escolares de 6 a 12 anos, avaliando somente cárie dentária. O
plano amostral, uma adaptação linear e acrítica da metodologia proposta pela OMS em 1987,
era extremamente deficiente, com definição inadequada do tamanho e com processos de
composição da amostra a partir de critérios não-probabilísticos. Dessa forma, foi alvo de
muitas críticas e não tornou possível a comparação com os dados do levantamento anterior,
seu principal objetivo (RONCALLI, 2006a; QUEIROZ; PORTELA; VASCONCELLOS,
2009).
A terceira experiência de levantamentos epidemiológicos em saúde bucal, o Projeto
SBBrasil 2003 – Condições de Saúde Bucal da População Brasileira, nasceu com o intuito de
realizar um amplo levantamento epidemiológico que avaliasse os principais agravos em
diferentes grupos etários e que incluísse tanto a população urbana como a rural, recuperando
as deficiências de levantamentos anteriores, gerando dados mais confiáveis e contribuindo
para o estabelecimento de uma normatização em termos de pesquisas epidemiológicas
transversais. O objetivo maior, no entanto, era obter informações epidemiológicas capazes de
subsidiar a elaboração das diretrizes para uma política nacional de saúde bucal, bem como
ações para o fortalecimento da gestão dos serviços públicos de saúde bucal nas diferentes
esferas de governo (MARTINS et al., 2005; QUEIROZ; PORTELA; VASCONCELLOS,
2009; RONCALLI, 2006b; RONCALLI; CORTES; PERES, 2012).
Os resultados do SBBrasil 2003 mostraram uma distribuição heterogênea da doença,
registrando diferenças entre as regiões e os grupos sociais, sendo que a experiência da doença
foi mais severa nos grupos populacionais mais submetidos à privação social. Os índices de
cárie entre adolescentes foram mais elevados do que na infância, sendo expressivo o aumento
da doença num período crítico de transição para a fase adulta e que, quando não controlada,
pode progredir até a velhice, com aumento do número de dentes perdidos (BRASIL, 2004;
FRIAS et al., 2007).
2.3.1 SBBrasil 2010
Dentro das estratégias para a construção do eixo da vigilância em saúde da Política
Nacional de Saúde Bucal, foi sugerida a edição 2010 do SBBrasil, que aperfeiçoou e
30 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
modernizou a proposta metodológica do SBBrasil 2003. O projeto sofreu alterações no
tocante à análise dos dados e em relação à técnica de pesquisa em domicílios. Alguns índices
foram acrescentados, como a avaliação de traumatismo dentário, e outros foram modificados
como o CPI (Índice Periodontal Comunitário) e a avaliação da necessidade de prótese. Com
relação ao plano amostral, em 2010 as capitais passaram a ser consideradas como domínios do
estudo. Uma maior racionalidade foi dada à pesquisa nos municípios do interior, compondo
uma amostra de 30 municípios em cada região (totalizando 150), e o levantamento foi feito
somente em domicílios da zona urbana, por considerar a pouca representatividade da zona
rural no universo amostral (RONCALLI; CORTES; PERES, 2012).
Seguindo as recomendações da 4ª edição do Manual da OMS, de 1997, com algumas
modificações, a amostra do SBBrasil 2010 incluiu as seguintes idades e faixas etárias: 5 anos,
12 anos, 15 a 19 anos, 35 a 44 anos, e 65 a 74 anos. As condições de saúde bucal pesquisadas
foram: cárie dentária (CPO-D), condição periodontal (CPI), traumatismo dentário (fraturas
coronárias e avulsão dentária), oclusão dentária (DAI), fluorose dentária (índice de Dean) e
edentulismo (uso e necessidade de prótese). Além de investigar tais agravos, assim como na
edição anterior, foram coletados dados acerca das condições socioeconômicas, utilização de
serviços odontológicos e autopercepção de saúde bucal A amostra, estatisticamente
representativa da população brasileira, foi de aproximadamente 38 mil pessoas (BRASIL,
2011b; RONCALLI et al., 2012).
Os resultados do SBBrasil 2010 confirmam a ocorrência de melhoras significativas
nos níveis de saúde bucal da população, principalmente no que se refere à severidade da cárie
dentária e da doença periodontal. Segundo a classificação adotada pela OMS, o Brasil saiu de
uma condição de média prevalência de cárie aos 12 anos em 2003 (CPO entre 2,7 e 4,4), para
uma condição de baixa prevalência em 2010 (CPO entre 1,2 e 2,6), apresentando a melhor
média entre os países da América do Sul, acompanhado da Venezuela.
Segundo o relatório final do projeto, para a faixa específica dos 15 aos 19 anos, houve
uma diminuição de 1,92 pontos na média do CPO-D, passando de 6,17 em 2003 para 4,25 em
2010. De qualquer forma, este valor permanece maior que o dobro do encontrado na faixa dos
12 anos (2,01). Esta evolução do CPO entre infância e adolescência tem sido um achado
comum em outros estudos no Brasil e no mundo. Um avanço importante deu-se na redução do
componente “cariado”, que representava 2,8 dentes em 2003 e passou para 1,7 em 2010, uma
diminuição de 39%, que corresponde a mais de 18 milhões de dentes livres da doença. A
31 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
proporção de adolescentes livres de cárie (CPO=0) foi de 23,9% e caiu pela metade o número
de adolescentes que sofreram algum tipo de perda dentária (BRASIL, 2011b).
Quanto à condição periodontal, mais da metade (50,9%) dos adolescentes não
apresentaram nenhum problema periodontal. A presença de cálculo foi encontrada em 28,4%
dos adolescentes e 1/3 deles apresentaram sangramento gengival, com diferenças regionais
marcantes. O percentual de adolescentes sem problemas gengivais variou de 30,8% na região
Norte a 56,8% na região Sudeste.
Menores prevalências estão relacionadas às oclusopatias severa e muito severa, com
valores de 6,6% e 10,3%, respectivamente. A necessidade de reabilitação protética começa a
surgir nessa faixa etária, onde 13,7% precisam e 3,7% já utilizam algum tipo de prótese
dentária. Comparando aos resultados de 2003 (27%), houve uma redução de 52% da
necessidade de prótese entre adolescentes.
Um dado curioso refere-se à utilização dos serviços. Os resultados da 1ª e 2ª edição do
SBBrasil mostraram que quase 14% dos adolescentes brasileiros nunca consultaram um
dentista. Apesar de este percentual ter se mantido estável durante este período, ocorreram
diferenças regionais, diminuindo no Nordeste (de 21,6% para 16%) e aumentando no Sudeste
(de 10,1% para 14%) e Centro-Oeste (de 12% para 19,4%).
A despeito de melhores resultados em nível de Brasil e também de cada região do país,
as disparidades regionais persistem. De forma geral, o Sudeste e Sul apresentam condições
significativamente melhores do que as demais regiões do país, em especial o Norte e
Nordeste.
O Quadro 1 resume as principais características dos quatro levantamentos
epidemiológicos realizados no Brasil, dando informações acerca do cenário político-sanitário,
cenário epidemiológico, metodologias, articulação com as políticas de saúde e capilarização.
32 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Quadro 1 - Principais características dos quatro levantamentos epidemiológicos realizados no Brasil.
(Brasil, 2012)
Categorias de Análise
1986 1996 2003 2010
Cenário político-sanitário
Redemocratização do país (Nova República);
Crescimento e amadurecimento do
Movimento Sanitário; VIII Conferência Nacional de Saúde; Divisão Nacional de Saúde Bucal (DNSB)
Primeiro mandato de Fernando Henrique
Cardoso; Democracia representativa aparentemente
consolidada; Avanço na implantação de
uma vertente econômica neoliberal;
Saúde Bucal como Área Técnica no
Ministério da Saúde
Início do projeto no segundo mandato de Fernando
Henrique Cardoso e conclusão no início do governo Luiz
Inácio Lula da Silva; Pouca ou nenhuma mudança na política macroeconômica; Política de Saúde Bucal priorizada no
conjunto de políticas públicas; Rearticulação da
Coordenação Nacional de Saúde Bucal; III Conferência
Nacional de Saúde Bucal
Projeto desenvolvido ao longo do segundo mandato de Luiz
Inácio Lula da Silva; Manutenção da política
macroeconômica; Política de Saúde Bucal ainda priorizada
no conjunto de políticas públicas
Cenário epidemiológico
Alta prevalência e severidade de cárie
dentária em escolares; Alto índice de
edentulismo em adultos e idosos
1;
Desigualdades regionais no perfil epidemiológico
Tendência de queda da cárie da
população escolar; Persistência de desigualdades
regionais
Confirmação da tendência de declínio da cárie dentária na população escolar (12 anos);
Persistência de grandes desigualdades regionais;
Concentração do declínio e de melhores condições de saúde
bucal em área urbana de capitais do Sul e Sudeste e
em alunos de escola privada; Quadro de edentulismo ainda
alarmante; Surgimento de outras necessidades como as
oclusopatias
Confirmação da tendência de declínio da cárie dentária na
população de 12 anos; Queda de 25% em relação a 2003,
maior que o declínio entre 1996 e 2003; Persistência das desigualdades regionais;
Edentulismo ainda alto, mas com resultados positivos já perceptíveis em população
adulta
Características metodológicas
Delineamento amostral probabilístico com
representatividade em nível macrorregional;
Avaliação de cárie dentária, doença
periodontal e edentulismo; Zona
urbana de 16 capitais; Grupos etários de escolares a idosos
Modelo amostral não probabilístico;
Avaliação somente de cárie dentária em escolares de 6 a 12
anos; Zona urbana de 27 capitais e Distrito
Federal
Delineamento amostral probabilístico com
representatividade em nível macrorregional; Avaliação de
cárie dentária, doença periodontal, edentulismo, oclusopatias e fluorose.
Verificação de condições socioeconômicas e acesso a serviços; Zona urbana e rural
de 250 municípios de diferentes portes
populacionais (de menos de 5 mil a mais de 100 mil
habitantes); 6 grupos etários, de bebês a idosos
Manteve a estratégia geral do modelo de 2003, ou seja, delineamento amostral
probabilístico com representatividade em nível
macrorregional e para capitais; Pesquisa somente em
domicílios e não mais em escolas para 5 e 12 anos; Zona urbana de 177 municípios (30
do interior em cada região mais as 27 capitais); 5 grupos etários
(5, 12, 15-19, 35-44 e 65-74 anos); Melhorias nas técnicas de pesquisa de campo e nas
estratégias de análise
Articulação com a política de
saúde
Vinculado ao Programa de Prevenção de Cárie Dentária (PRECAD);
Sem continuidade
Nenhuma política de saúde bucal definida;
Sem continuidade
Articulado à Política Nacional de Saúde Bucal (Brasil
Sorridente); Continuidade ainda indefinida
Projeto inserido na Política Nacional de Saúde Bucal
(PNSB) como componente relativo aos dados primários do
eixo da Vigilância em Saúde Bucal; Continuidade
estabelecida e vinculada à manutenção da PNSB
Capilarização para estados e municípios e
incorporação da metodologia
Nenhuma Nenhuma
Restrita inicialmente à fase de execução nos 250 municípios sorteados; Indícios claros de
incorporação metodológica em estados do Nordeste, Sudeste
e Sul que ampliaram a amostra estadual; Absorção e incorporação da metodologia
pela Academia
Expansão da amostra em alguns estados e municípios; Absorção e incorporação da
metodologia consolidada
Fonte: Roncalli, Cortes e Peres, 2012.
1 Na tabela, os chamados “idosos” do levantamento de 1986 são, na realidade, adultos entre 50 e 59 anos.
33 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
2.4 INDICADORES EM SAÚDE BUCAL
Um indicador é uma ferramenta importante, pois informa sobre o progresso em
direção a uma determinada meta. Ele não é um elemento explicativo ou descritivo, mas uma
informação pontual no tempo e no espaço, cuja integração e evolução permitem o
acompanhamento dinâmico da realidade, sendo utilizado como recurso para deixar mais
perceptível uma tendência ou fenômeno não imediatamente detectável através dos dados
isolados. Os indicadores são ferramentas essenciais no processo de tomada de decisões e de
grande auxílio para o controle social (SOBRAL; FREITAS, 2010).
Tratando-se de saúde bucal, de uma maneira geral, a maior parte dos países, mesmo os
que mantêm bases de dados perenes e têm longa tradição na produção de informações
epidemiológicas de saúde bucal, limita-se a trabalhar com indicadores clássicos como o CPO
aos 12 anos. Leituras diferentes não são produzidas e raramente se incluem outras doenças
além da cárie dentária. No Brasil, no âmbito da Política Nacional de Saúde, a criação do
Comitê Técnico Assessor (CTA) em Vigilância da Saúde Bucal iniciou um importante debate
a respeito da construção de indicadores de saúde bucal, com base em dados de inquéritos e do
uso dos mesmos em modelos de vigilância nos diferentes níveis de gestão (RONCALLI;
CORTES; PERES, 2012).
Uma crítica aos atuais indicadores do Pacto da Atenção Básica refere-se à forma
variada com que os dados brutos são coletados nos diferentes municípios, gerando grandes
variações. Outro aspecto falho deve-se à pouca aplicação em nível local, além do
desconhecimento e da não apropriação da tecnologia da informação pela área de Saúde Bucal.
(RONCALLI, 2009).
Barros (2008) cita a necessidade de criar indicadores diferenciados e distintos métodos
de mensuração que acompanhem o avanço e a complexidade do conceito de saúde e suas
subdimensões. Estes novos indicadores não devem ter caráter substitutivo, mas complementar
aos anteriormente utilizados.
Como citado anteriormente, a melhor ferramenta para obtenção de informações
epidemiológicas (o que se aplica perfeitamente às doenças bucais, dadas as suas
características) são os inquéritos. Dessa forma, o SBBrasil proporciona uma leitura bastante
consistente do perfil epidemiológico de saúde bucal no país. No entanto, os índices utilizados
(CPO-D, CPI, DAI, entre outros) deixam a desejar em alguns quesitos e não orientam de
forma clara as decisões a serem tomadas a partir de suas informações (RONCALLI, 2009).
34 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Dentre eles merece destaque o CPO-D, que mensura a doença bucal mais comum no
país e, portanto, oferece também outras informações importantes além da morbidade em si –
cárie dentária -, como as relativas à oferta e qualidade de serviços.
Os dados do SBBrasil possibilitaram a obtenção de outros indicadores a partir do
CPO-D. Alguns deles estavam presentes na proposta da OMS/FDI para as metas de saúde
bucal para o ano 2000, como a proporção de livres de cárie e a funcionalidade dentária.
Outros, entretanto, podem também ser obtidos e oferecem uma contribuição interessante,
como a cárie não tratada, o índice de cuidados odontológicos, a mutilação dentária e a perda
do 1º molar permanente. Uma característica peculiar destes novos índices está no seu poder de
mostrar desigualdades regionais de forma bastante clara. Tomando como exemplo a
funcionalidade dentária, verificamos que a manutenção de um maior número possível de
dentes naturais na boca expressa a qualidade dos serviços do ponto de vista preventivo e
terapêutico, e desonera de modo bastante significativo os serviços de atenção secundária e
reabilitadora. A perda do 1º molar permanente, quando alta, demonstra não apenas uma maior
prevalência e severidade da cárie, mas também uma baixa qualidade na assistência,
essencialmente mutiladora. O índice de Cuidados Odontológicos foi proposto por Walsh, em
1970, e, sinaliza aspectos relacionados ao acesso aos serviços restauradores, identificando
desigualdades (RONCALLI, 2009; VAZ et al., 2010; RONCALLI; CORTES; PERES, 2012).
Proposto em 1987 na Inglaterra e posteriormente modificado por Marcenes e Sheiham
em 1993, o Índice de Equivalência de Dentes Saudáveis, conhecido como T-Health
(abreviatura para Tissue ou Tecido-Saúde, correspondendo a tecido saudável) foi construído
com o objetivo de encontrar alternativas ao CPO. O CPO, formulado por Klein e Palmer em
1937, constitui-se em um índice de ataque de cárie, sendo o mais utilizado em todo o mundo
e, mantendo-se como o ponto básico de referência para o diagnóstico das condições dentárias
e para formulação e avaliação de programas de saúde bucal. Entretanto, ele atribui pesos
idênticos a seus componentes, ou seja, dentes perdidos têm o mesmo valor que dentes
cariados e restaurados, o que pode mascarar a influência dos fatores sociais (VAZ et al.,
2010). O T-Health propõe uma maneira de contornar essa limitação atribuindo pesos
diferentes aos dentes restaurados e cariados e incluindo os dentes hígidos neste cálculo,
buscando representar a quantidade de tecido dentário saudável em cada indivíduo e, por
extensão, em cada grupo populacional (AQUILANTE, 2005).
Na sua concepção original, o cálculo do T-Health atribuiu, arbitrariamente, peso 4
para dentes hígidos, 2 para restaurados e 1 para cariados, refletindo a capacidade de cada
35 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
dente funcionar satisfatoriamente; isto é, um dente sadio apresentaria uma melhor função
estética e mastigatória que um dente obturado, que, por sua vez, funcionaria melhor que um
dente cariado (FERREIRA, 1999).
Marcenes e Sheinam, em 1993, sugeriram a mudança nesta ponderação, atribuindo
peso 4 para dentes hígidos e peso 1 para restaurados e cariados. No pensamento dos autores,
se a intenção era medir quantidade de tecido saudável, não era possível afirmar diferença
neste valor em dentes afetados pela cárie, apenas pelo fato de estarem ou não restaurados.
Dessa forma, surgiu o T-Health modificado, que atribui valores iguais para dentes restaurados
e cariados.
Mais recentemente, em 2009, Bernabé et al. publicaram um estudo cujo objetivo foi
determinar qual o conjunto de pesos mais apropriados para o cálculo do T-Health, de forma a
realmente medir saúde bucal. Testando 36 possibilidades, eles encontraram dois conjuntos de
peso que satisfizeram os dois critérios estabelecidos: possuir forte associação com os níveis de
percepção de saúde bucal (independente de outros fatores como características demográficas,
condição socioeconômica, etc) e não variar de acordo com a extensão do tratamento
restaurador. Os pesos mais apropriados foram: 1 para dentes hígidos, 0,2 (ou 0,1) para dentes
restaurados, 0,1 (ou 0,5) para dentes cariados e 0 para dentes perdidos, mantendo, assim, o
dobro do valor para dentes restaurados em relação aos cariados.
O índice T-Health apresenta a grande vantagem de medir saúde, e não doença. Além
disso, tem um caráter de reversibilidade: a intervenção de serviços pode ser observada pela
mudança no seu valor, quando da transformação do componente cariado em obturado. Dessa
forma, além de indicar prevenção primária, é possível também medir a melhoria na qualidade
de saúde bucal, o que não acontece quando se usa o CPO-D. Benigeri, Payette e Brodeur
(1998) destacam, ainda, sua maior capacidade de identificar divergências na saúde bucal de
pessoas com diferentes condições socioeconômicas e a facilidade em sua obtenção, sem
necessidade de medidas adicionais.
36 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
3 OBJETIVOS
3.1 OBJETIVO GERAL
Analisar a associação entre fatores socioeconômicos contextuais e a condição bucal de
adolescentes no Brasil.
3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Determinar índices relativos à cárie, complementares ao CPO-D, e avaliar caráter
preventivo e mutilador dos serviços odontológicos no Brasil, bem como o acesso a
tratamento restaurador na faixa etária de 15 a 19 anos;
Analisar desigualdades socioeconômicas e de saúde bucal entre capitais e municípios
do interior;
Definir quais fatores socioeconômicos contextuais estão mais associados às condições
bucais dos adolescentes no Brasil;
Definir o poder explicativo das variáveis socioeconômicas, em conjunto, sobre os
desfechos de saúde bucal em adolescentes;
Investigar iniquidades em saúde bucal.
37 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
4 MÉTODO
4.1 CARACTERÍSTICAS DA PESQUISA
Foi realizado um estudo ecológico com dados secundários, de natureza exploratória,
procurando identificar o grau de associação entre as condições socioeconômicas contextuais e
índices de saúde bucal em adolescentes. Para isso, foram utilizados dados da última pesquisa
nacional de saúde bucal do Ministério da Saúde, o SBBrasil 2010 e do Censo 2010 do IBGE.
4.2 VARIÁVEIS DO ESTUDO
4.2.1 Variáveis Independentes
As variáveis independentes foram obtidas do Censo 2010 do IBGE para todas as
capitais brasileiras e para os 150 municípios do interior participantes do SBBrasil 2010.
Procurou-se incluir variáveis que englobassem os diferentes aspectos socioeconômicos,
indicando as condições de educação, renda, trabalho, moradia e economia das cidades
estudadas. Ao todo, foram nove variáveis, a saber: Taxa de analfabetismo; Produto Interno
Bruto (PIB); Proporção de crianças em situação domiciliar de baixa renda; Renda média
domiciliar per capita; Taxa de Desemprego; Taxa de Trabalho Infantil; Índice de Gini; Razão
de Renda; e Proporção de domicílios com Saneamento Inadequado. O conceito de cada uma
delas, bem como seu método de cálculo, encontram-se no Quadro 2.
38 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Quadro 2 - Variáveis independentes incluídas no estudo. Brasil, 2013.
Variável Conceito Método de cálculo
Taxa de Analfabetismo: mede o grau de analfabetismo da população adulta
Percentual de pessoas com 15 e mais anos de idade que não sabem ler e escrever pelo menos um bilhete simples, no idioma que
conhecem, na população total residente da mesma faixa etária.
Número de pessoas residentes de 15 e mais anos de idade que não sabem ler e escrever
um bilhete simples, no idioma que
conhecem x 100
População total residente desta faixa etária
PIB – Produto Interno Bruto: indica o nível de produção econômica em um
território, em relação ao seu contingente populacional.
Valor médio agregado por indivíduo, em moeda corrente e a preços de mercado, dos
bens e serviços finais produzidos em determinado espaço geográfico.
Valor do PIB em moeda corrente, a preços
de mercado
População total residente
Proporção de crianças em situação domiciliar de baixa renda
Proporção de crianças (menores de 14 anos de idade) residentes em domicílios com renda domiciliar mensal per capita de até ½ salário
mínimo
Nº de crianças residentes em domicílios com renda domiciliar per capita de até ½
salário mínimo x 100
Total de crianças
Renda média domiciliar per capita: mede a capacidade de aquisição de
bens e serviços
Soma dos rendimentos mensais dos moradores de um domicílio, em reais, dividida
pelo número de seus moradores
Soma das rendas domiciliares per capita
População total residente
Taxa de desemprego: mede o grau de insucesso das pessoas que
desejam e não conseguem trabalhar
Percentual da População Economicamente Ativa2 (PEA) sem trabalho na semana de
referência
Nº de residentes de 10 anos ou mais que se encontram desocupados e procurando
trabalho, na semana de referência
Nº da PEA desta faixa etária
Taxa de Trabalho Infantil : expressa a magnitude da ocupação laboral de crianças de 10 a 15 anos de idade
Percentual da população residente de 10 a 15 anos que se encontra trabalhando ou
procurando trabalho na semana de referência.
Nº de crianças residentes de 10 a 15 anos trabalhando ou procurando emprego na
semana de referência x 100
População total residente desta mesma faixa etária
Índice de GINI: varia de 0 (indivíduos com rendas iguais) até 1 (desigualdade
máxima)
Grau de desigualdade na distribuição de renda domiciliar per capita entre os indivíduos
Área entre a curva de Lorenz 3 e a linha perfeita de igualdade
Área sob a linha de perfeita igualdade
Razão de Renda: expressa a concentração de renda pessoal e o
desnível de renda entre grupos populacionais.
Nº de vezes que a renda do quinto superior da distribuição de renda (20% mais ricos) é
maior do que a renda do quinto inferior (20% mais pobres)
Valor agregado do quinto superior de renda domiciliar per capita
Valor agregado do quinto inferior de renda domiciliar per capita
Proporção de domicílios com Saneamento Inadequado
Percentual de domicílios que não possuem nenhuma das seguintes condições:
- abastecimento de água por rede geral
- esgotamento sanitário por rede geral ou fossa séptica
- lixo coletado direta ou indiretamente
Total de domicílios com saneamento considerado inadequado
Total de domicílios
Fontes: REDE INTERAGENCIAL DE INFORMAÇÕES PARA A SAÚDE, 2008; DATASUS, 2010;
IBGE, 2010.
2 A PEA é composta pelas pessoas de 10 a 65 anos de idade classificadas como ocupadas ou desocupadas na semana
de referência da pesquisa. (IBGE, 2010) 3 A Curva de Lorenz é formada em um plano cartesiano onde no eixo X dispõem-se os percentuais acumulados da
população, sempre em ordem crescente de renda, e no eixo Y os percentuais acumulados de renda. (Nishi, 2010)
39 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
4.2.2 Variáveis Dependentes
As variáveis dependentes ou de desfecho foram obtidas a partir dos dados do SBBrasil
2010. A partir dos componentes do CPO-D, foram calculados os indicadores de saúde bucal:
Índice de Cuidados Odontológicos – Representa a proporção do componente
Restaurado (O) em relação ao CPO-D total, expressando a cobertura para serviços
restauradores. Quanto mais próximo de 100, maior acesso a procedimentos
restauradores. É calculado a partir da fórmula:
Perda do 1º Molar Permanente – Originalmente, representa a média dos 1os molares
(elementos dentários 16, 26, 36 e 46) perdidos por cárie para a idade de 12 anos.
Neste estudo, foi feita uma categorização entre os indivíduos que haviam perdido o 1º
molar e os que não haviam. Foi obtida a proporção dos que haviam perdido na faixa
etária de 15 a 19 anos. Este indicador complementa a leitura das características
mutiladoras do modelo, acrescentando uma medida mais recente que o edentulismo
em adultos. Expressa a incapacidade do serviço de preservar as estruturas dentárias e
prevenir a cárie.
T-Health ou Índice de Equivalência de Dentes Saudáveis – Representa a média da
quantidade de tecido dentário saudável na população estudada. É um indicador de
saúde que mede prevenção primária e, indiretamente, a intervenção dos serviços.
Neste estudo, foi utilizado o conjunto de pesos referente à 6ª tentativa proposta por
Bernabé et al. (2009), sendo, por isso, chamado de T-Health (6). Para o seu cálculo,
foi utilizada a fórmula a seguir:
40 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
4.3 AMOSTRA
Os domínios do estudo foram as 27 capitais brasileiras e 4 clusters representativos dos
municípios do interior do país.
4.4 ESTRATÉGIAS DE ANÁLISE
O delineamento do SBBrasil permite que seus resultados sejam representativos para o
Brasil, suas 5 regiões e 27 capitais. Para que esta pesquisa contemplasse também os demais
municípios do interior do país, em uma perspectiva diferente da regional, adotamos a
estratégia de agrupá-los em clusters. Para isso, algumas etapas foram necessárias, como
demonstrado a seguir. Todas as análises do presente estudo foram realizadas utilizando o
software SPSS (Statistical Package for Social Science), na sua versão 17.0.
4.4.1 Análise de Componentes Principais
Utilizando um banco com os dados socioeconômicos de todos os 5.539 municípios do
interior do Brasil, para os quais se têm dados disponíveis, foi realizada uma análise de
componentes principais (ACP), objetivando a redução de dados. A adequação dos dados foi
demonstrada pelos testes de esfericidade de Barlett (p<0,001) e de Kaiser-Meyer-Olkin
(0,748). Todas as variáveis apresentaram comunalidade maior que 0,68, com exceção do PIB
(0,4) e do índice de GINI (0,47). No entanto, optou-se por mantê-las no modelo devido aos
resultados satisfatórios obtidos na matriz de correlação e nos componentes principais. O
método de rotação, procedimento empregado com a finalidade de ajustar os valores e
melhorar a correlação entre as variáveis e o número de componentes, foi a Equamax, por
possibilitar a resolução de cargas cruzadas no modelo (índice de Gini). Ao final da análise,
foram obtidos três componentes principais, conforme a Tabela 1.
Tabela 1 - Componentes obtidos a partir dos dados socioeconômicos dos municípios do interior do
Brasil. Brasil, 2013.
Padrão Eigenvalues (autovalores)
Proporção Proporção Acumulada
Variáveis*
1. Condições de Renda e Educação
3,88 43,21 43,21 Proporção de Crianças em Situação
Domiciliar de Baixa Renda (0,9)
Renda Média Domiciliar per capita (-
41 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
0,9)
Taxa de Analfabetismo (0,87)
Proporção de domicílios com saneamento inadequado (0,73)
PIB (-0,63)
2. Condição de trabalho 1,49 16,59 59,81 Trabalho Infantil (-0,83)
Taxa de Desemprego (0,8)
3. Desigualdade 1,03 11,49 71,31 Razão de Renda (0,9)
Índice de GINI (0,5)
* Variáveis em ordem descendente de importância em cada componente, após rotação Equamax, com sua respectiva carga fatorial.
A fim de validar esta análise, foi realizada uma nova ACP, desta vez incluindo apenas
os 150 municípios do interior participantes do SBBrasil 2010. Nesta nova tentativa, o teste de
esfericidade de Barllet também foi significante e encontrou-se um KMO de valor 0,64, sendo
mais baixo do que o anterior, mas ainda satisfatório. A variância total explicada foi de 48,6%
e todas as comunalidades foram superiores a 0,58. A disposição das nove variáveis nos três
componentes foi ainda mais evidente, não sendo encontrada carga cruzada usando-se os
métodos de rotação Varimax e Equamax.
4.4.2 Análise de Clusters
A etapa seguinte foi a redução do número de casos através da técnica não-hierárquica
do tipo K-means. Para a escolha das sementes a partir das quais seriam formados os
aglomerados, optou-se por tomar como base o “Fator Geral”. Este fator geral foi obtido
somando-se os 3 componentes da ACP para cada município do interior do Brasil. Dessa
forma, foi obtido um fator representativo da condição socioeconômica geral de cada cidade.
Após verificar-se a boa distribuição deste novo fator em um gráfico do tipo Box-Plot, foram
escolhidos os municípios do SBBrasil cujos valores encontravam-se aproximadamente no
centro de cada quartil deste fator socioeconômico geral. Os municípios foram Niterói-RJ,
Ribeirão Pires-SP, São Francisco do Pará-PA e Mãe do Rio-PA, respectivamente. Foi
realizada a análise de clusters com as 4 sementes escolhidas, incluindo nela apenas os
municípios do nosso interesse, ou seja, os participantes do SBBrasil. Selecionou-se um
número máximo de 10 interações e critério de convergência igual a 0,5.
Foram feitas, também, tentativas com 3 e 5 clusters. No entanto, quando se tentou
formar apenas 3 aglomerados, o componente 3 da ACP (desigualdade) não apresentou
42 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
significância no teste de variância (ANOVA). Por outro lado, na tentativa de formar 5 grupos,
não foi obtida uma distribuição harmoniosa dos municípios em cada um dos clusters, mesmo
após várias tentativas com variações nas sementes. Dessa forma, os melhores resultados
foram conseguidos com a formação de 4 clusters.
Os clusters agruparam, respectivamente, 26, 28, 55 e 40 municípios4, conforme mostra
a Tabela 2. O 1º cluster agrupou cidades, em sua maioria, do Sul e Sudeste, apresentando
condições de renda e educação bem superiores aos demais. No 2º cluster, onde foram
encontradas as melhores condições de trabalho e os menores índices de desigualdade, há
predomínio das cidades do Sul e Centro-Oeste. No 3º cluster, há representações de todas as
regiões, apresentando um quadro geral intermediário, porém com as piores condições de
trabalho. No último cluster, municípios das regiões Norte e Nordeste são predominantes,
sendo destacadamente o que apresentou as piores condições de renda e educação, e o mais
desigual. O valor de cada componente da ACP em cada aglomerado está expresso na Tabela
3.
Tabela 2 - Distribuição dos municípios do interior em cada cluster, por região brasileira. Brasil, 2013.
Clusters Interior n municípios Norte Nordeste Sul Sudeste Centro-Oeste
Interior 1 26 0 0 12 12 2
Interior 2 28 1 1 12 0 14
Interior 3 55 8 14 6 15 12
Interior 4 40 20 15 0 3 2
Tabela 3 - Valores dos componentes da ACP em cada cluster. Brasil, 2013.
Componentes Cluster 1 Cluster 2 Cluster 3 Cluster 4
1. Más Condições de Renda e Educação -1,839 -0,480 -0,640 0,825
2. Más Condições de Trabalho 0,500 -0,860 0,887 0,073
3. Desigualdade 0,198 -0,005 0,004 0,373
4 Apesar da amostra do SBBrasil incluir 150 cidades do interior, o município São Félix do Xingu não dispunha de dados
sobre sua razão de renda, sendo excluído da ACP e estando, portanto, ausente nos clusters.
43 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
4.4.3 Regressão Linear
Incluindo apenas a faixa etária de 15 a 19 anos, foram calculadas as médias das
proporções de cada indicador de saúde bucal (variáveis dependentes) para os 31 domínios do
estudo. As variáveis socioeconômicas, no caso dos clusters, corresponderam à média dos
dados de cada município que compunha o cluster. Foi obtida a matriz de correlação das
variáveis independentes (socioeconômicas) e verificou-se que não houve colinearidade
perfeita (>0,95) entre nenhuma delas. A variável “proporção de crianças em situação
domiciliar de baixa renda” apresentou valores que sugerem certa colinearidade com taxa de
analfabetismo (0,81) e renda média (0,85), mas por ser uma variável que indica com mais
precisão aspectos diretamente ligados à pobreza, foi mantida no modelo. Em seguida, foi feita
inicialmente uma análise de regressão linear simples entre os 3 desfechos e as 9 variáveis
socioeconômicas e, finalmente, uma análise de regressão linear múltipla, utilizando o método
forward stepwise.
4.5 ASPECTOS ÉTICOS
O Projeto SBBrasil 2010 foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa do Ministério
da Saúde. Tendo sido aprovado, recebeu registro na Comissão Nacional de Ética em Pesquisa
(CONEP), do Conselho Nacional de Saúde (CNS), sob o número 15.498 em 7 de janeiro de
2010, conforme a Resolução 196/96 do CNS, relativa às pesquisas em seres humanos. Os
objetivos e procedimentos a serem realizados foram explicados a todos os participantes do
estudo, que assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). No sítio
eletrônico do projeto estão disponíveis a Cópia do Projeto, do TCLE utilizado e do parecer do
CONEP (BRASIL, 2011b).
44 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
5 RESULTADOS
5.1 RESULTADOS DA ANÁLISE DESCRITIVA DAS VARIÁVEIS
Em relação às variáveis socioeconômicas, de forma geral, as melhores condições
foram encontradas em domínios localizados no Sul do Brasil, com destaque para
Florianópolis, Curitiba e Porto Alegre, seguidos da região Sudeste, representada por Vitória e
Belo Horizonte. O 1º cluster, formado por cidades do interior destas duas regiões apresentou,
de forma semelhante, boas condições socioeconômicas. Entre os domínios com pior situação
socioeconômica destacaram-se as capitais pertencentes às regiões Norte e Nordeste, de forma
especial Maceió, Macapá e Rio Branco, bem como o 4º cluster do interior, composto por
municípios predominantemente destas regiões. Em relação ao indicador razão de renda, que
mede desigualdade, sua média no país foi bastante alta. Cidades como Rio de Janeiro e São
Paulo chamaram a atenção porque, apesar de estarem entre as que apresentaram as melhores
taxas referentes à educação, renda, produção econômica e saneamento, estão situadas entre as
mais desiguais no país. Enquanto isso, os clusters 1, 2 e 3, referentes ao interior do Brasil,
exibiram os mais baixos índices de desigualdade entre os domínios do estudo. Na capital de
Pernambuco, foi encontrada a maior razão de renda entre os domínios pesquisados. Em
Recife, o quintil mais rico da população ganha cinquenta vezes mais que o quintil mais pobre
(Tabela 4) seguido do cluster 4, cuja razão de renda é de 45,12.
Tabela 4 - Estatística descritiva dos indicadores socioeconômicos dos 31 domínios estudados. Dados
referentes ao ano de 2010.
Variáveis Independentes Mínimo Máximo Média Mediana DP Q 25 Q 75
Analfabetismo 1,90 20,76 5,75 4,50 3,83 3,20 7,50
Renda Média 234,57 1596,36 925,01 810,54 354,47 652,38 1.253,49
PIB per capita 5.301,03 61.791,17 19.269,50 15.422,36 11.770,12 12.578,70 22.540,88
Prop Crianças Baixa Renda 14,91 81,05 42,17 47,50 14,09 30,23 51,95
Desemprego 3,93 12,72 8,07 7,33 2,53 6,21 10,05
Trabalho Infantil 4,40 20,05 7,55 7,16 2,99 5,76 8,11
Saneam. Inadequado 0,00 30,97 2,83 0,70 6,26 0,12 2,34
Índice de Gini 0,50 0,69 0,60 0,61 0,04 0,58 0,63
Razão de Renda 15,98 50,22 30,33 31,07 8,36 24,99 35,68
Fonte: IBGE, 2010.
45 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Os clusters do interior, com exceção do primeiro, apresentaram altos índices de
analfabetismo e trabalho infantil, e os menores valores de renda média domiciliar per capita.
As mais altas taxas de saneamento inadequado também foram encontradas nestes clusters,
com ênfase para o cluster 4, cuja taxa chegou a mais de 30%, enquanto a média no país é de
2,83%. Outro índice alarmante foi encontrado neste mesmo cluster, cuja proporção de
crianças residentes em domicílios com renda domiciliar per capita inferior a meio salário
mínimo chegou a mais de 80%. Não obstante, a média entre os domínios do estudo (42%)
também pode ser considerada alta. Entre os 10 domínios com as menores taxas de trabalho
infantil, 6 referem-se a capitais nordestinas: Aracaju, João Pessoa, Recife, Natal, São Luís e
Teresina.
Tabela 5 - Estatística descritiva dos desfechos de saúde bucal referentes aos 31 domínios estudados.
Dados referentes ao ano de 2010.
Variáveis Dependentes Mínimo Máximo Média Mediana DP Q 25 Q 75
Cuidados Odontológicos 22,58 70,02 47,85 47,45 11,54 41,31 55,20
Perda do 1º Molar 1,46 39,69 15,23 13,23 8,45 8,01 19,91
T-Health (6) 22,65 26,84 24,71 24,64 1,13 23,96 25,71
Fonte: BRASIL, 2011a.
Em relação aos desfechos do estudo, o cluster 4, onde há uma predominância de
municípios do Norte e do Nordeste com as piores situações socioeconômicas, apresentou os
piores resultados nos 3 índices pesquisados. Em relação ao T-health, verificamos uma maior
homogeneidade nos valores, fato que não se repetiu nos demais.
Observou-se grande discrepância quanto ao índice de cuidados odontológicos, que
mede a proporção de dentes restaurados e, indiretamente, o acesso aos serviços. Enquanto em
Campo Grande superou os 70%, no cluster 4 foi de apenas 22,58% (Tabela 5). A média para
o país revela que menos da metade dos elementos dentários acometidos por cárie recebem o
tratamento restaurador adequado. Os domínios situados no Centro-Oeste e no Sul
apresentaram os maiores percentuais de dentes tratados no país.
No Sudeste do Brasil foram encontrados os menores índices de perda de 1º molar na
faixa de 15 a 19 anos, seguido da região Sul. Em Vitória, por exemplo, menos de 2% dos
adolescentes perderam algum primeiro molar permanente. Já no cluster 4, esse valor
aproximou-se dos 40%. Isso representa uma perda dentária vinte vezes maior em duas
localidades de um mesmo país.
46 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
De forma abrangente, os melhores resultados quanto aos desfechos pesquisados neste
estudo foram encontrados nos domínios referentes ao Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil.
Em contrapartida, a região Norte destaca-se com os piores índices, seguida da região Nordeste
(Figuras 2, 3 e 4).
Figura 2 - Distribuição do Índice de Cuidados Odontológicos de acordo com os domínios do estudo.
Brasil, 2013.
70,02
66,54
65,45
61,15
61,09
59,63
57,25
55,20
53,74
53,44
52,85
52,45
51,39
50,00
48,09
47,85
47,45
47,09
45,45
45,38
43,57
42,92
42,32
41,72
41,31
40,53
37,31
36,08
33,97
33,63
23,77
22,58
0,00 10,00 20,00 30,00 40,00 50,00 60,00 70,00 80,00
Campo Grande
Interior 1
Goiânia
Curitiba
Florianópolis
Cuiabá
Palmas
Brasília
Interior 3
São Paulo
João Pessoa
Teresina
Interior 2
Porto Alegre
São Luís
Brasil
Natal
Maceió
Rio de Janeiro
Recife
Fortaleza
Belo Horizonte
Vitória
Porto Velho
Aracaju
Rio Branco
Macapá
Manaus
Salvador
Boa Vista
Belém
Interior 4
47 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Figura 3 - Distribuição do Índice de Perda do 1o Molar Permanente de acordo com os domínios do
estudo. Brasil, 2013.
1,46
6,45
6,60
6,88
6,90
7,46
7,60
8,01
8,83
9,30
10,66
10,79
11,84
12,07
12,78
13,23
14,09
15,23
15,30
16,72
19,03
19,35
19,78
19,84
19,91
20,07
21,13
22,31
22,92
28,62
32,50
39,69
0,00 5,00 10,00 15,00 20,00 25,00 30,00 35,00 40,00 45,00
Vitória
Interior 1
Brasília
Salvador
Porto Alegre
Belo Horizonte
Curitiba
Florianópolis
Rio de Janeiro
São Luís
Goiânia
Cuiabá
Campo Grande
São Paulo
Interior 3
Fortaleza
Aracaju
Brasil
Macapá
Maceió
Teresina
Interior 2
Rio Branco
Palmas
Natal
Belém
João Pessoa
Recife
Manaus
Boa Vista
Porto Velho
Interior 4
48 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Figura 4 - Distribuição do Índice T-Health (6) de acordo com os domínios do estudo. Brasil, 2013.
5.2 RESULTADOS DA REGRESSÃO LINEAR
Nas tabelas 6, 8 e 10 estão os resultados das análises de regressão linear simples para
os três desfechos. As variáveis socioeconômicas foram ordenadas de acordo com sua
significância (p) e coeficiente de determinação (r2). Nas tabelas 7, 9 e 11 encontram-se os
resultados das análises de regressão linear múltipla para cada um dos indicadores de saúde
bucal. Ao final de cada uma delas, estão descritas as equações finais dos modelos.
26,84
26,37
26,14
26,08
25,93
25,93
25,87
25,71
25,53
25,42
25,24
25,14
25,11
25,01
24,93
24,71
24,64
24,55
24,39
24,37
24,28
24,25
24,18
24,16
23,96
23,71
23,65
23,21
23,09
22,94
22,78
22,65
20 21 22 23 24 25 26 27 28
Salvador
Aracaju
Belo Horizonte
Florianópolis
Porto Alegre
Rio de Janeiro
Interior 1
Fortaleza
Recife
Brasília
Macapá
Teresina
Vitória
São Luís
São Paulo
Brasil
Cuiabá
Natal
Rio Branco
Palmas
Goiânia
Belém
Interior 3
Manaus
Campo Grande
Boa Vista
Curitiba
João Pessoa
Interior 2
Maceió
Porto Velho
Interior 4
49 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Na análise de regressão simples, o Índice de Cuidados Odontológicos apresentou
associação significativa (p < 0,05) com 6 das 9 variáveis. Na análise múltipla, o coeficiente de
determinação (R2) foi 0,567 e o R
2 ajustado 0,536.
Tabela 6 - Análise de Regressão Linear Simples para o desfecho “Índice de Cuidados Odontológicos”.
Brasil, 2013.
Variáveis Independentes β0 β1 Beta
padronizado R2 P
Prop Crianças Baixa Renda 71,291 -0,556 -0,678 0,460 <0,001
Razão de Renda 74,448 -0,877 -0,635 0,404 <0,001
Desemprego 64,928 -2,116 -0,464 0,215 0,009
Renda Média 34,577 0,014 0,441 0,194 0,013
Analfabetismo 54,470 -1,151 -0,382 0,146 0,034
Saneamento Inadequado 49,781 -0,681 -0,370 0,137 0,041
Índice de Gini 103,047 -91,579 -0,341 0,116 0,060
PIB 43,785 0,000 0,215 0,046 0,245
Trabalho Infantil 46,978 0,116 0,030 0,001 0,873
Tabela 7 - Modelo final para a análise de regressão linear múltipla do desfecho "Índice de Cuidados
Odontológicos". Brasil, 2013.
Não-padronizado Padronizado
Variável E.P. T p I.C. (95%)
Constante 80,387 5,694 14,119 <0,001 68,724-92,049
Prop Crianças Baixa Renda -0,390 0,120 -0,476 -3,251 0,003 (-0,635)-(-0,144)
Razão de Renda -0,531 0,202 -0,385 -2,629 0,014 (-0,945)-(-0,117)
Como equação final para o índice de cuidados odontológicos ( ), temos:
= 80,387 – 0,39 (crianças com baixa renda) – 0,531 (razão de renda)
A perda do 1º molar permanente teve associação significativa com 5 das variáveis na
análise de regressão simples. Na análise múltipla, o coeficiente de determinação (R2) foi
0,572 e o R2 ajustado 0,542.
50 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Tabela 8 - Análise de Regressão Linear Simples para o desfecho “Perda do 1º Molar Permanente”.
Brasil, 2013.
Variáveis Independentes β0 β1 Beta
padronizado R2 P
Renda Média 30,586 -0,017 -0,697 0,485 <0,001
Analfabetismo 6,674 1,488 0,675 0,455 <0,001
Prop Crianças Baixa Renda -1,617 0,400 0,666 0,444 <0,001
Saneamento Inadequado 12,840 0,843 0,625 0,391 <0,001
PIB 22,702 0,000 -0,540 0,292 0,002
Trabalho Infantil 8,943 0,833 0,295 0,087 0,108
Razão de Renda 7,227 0,264 0,261 0,068 0,156
Desemprego 11,599 0,459 0,135 0,018 0,470
Índice de Gini 20,494 -8,734 -0,044 0,002 0,812
Tabela 9 - Modelo final para a análise de regressão linear múltipla do desfecho "Perda de 1o. Molar
Permanente". Brasil, 2013.
Não-padronizado Padronizado
Variável E.P. T P I.C. (95%)
Constante 25,054 3,722 6,731 <0,001 17,430-32,679
Renda Média -0,012 0,004 -0,506 -3,444 0,002 (-0,019)-(-0,005)
Saneamento Inadequado 0,473 0,198 0,351 2,387 0,024 0,067-0,879
Como equação final para a perda do 1º molar permanente ( ), temos:
= 25,054 - 0,012 (renda média) + 0,473 (saneamento inadequado)
Por fim, houve associação significativa entre o indicador T-Health e apenas 4 das nove
variáveis possíveis. Na análise múltipla, o coeficiente de determinação (R2) foi 0,361 e o R
2
ajustado 0,315.
51 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Tabela 10 - Análise de Regressão Linear Simples para o desfecho “T-Health (6)”. Brasil, 2013.
Variáveis Independentes β0 β1 Beta
padronizado R2 P
Saneamento Inadequado 24,980 -0,095 -0,525 0,276 0,002
Analfabetismo 25,585 -0,152 -0,515 0,265 0,003
Trabalho Infantil 26,149 -0,190 -0,503 0,253 0,004
Renda Média 23,329 0,001 0,468 0,219 0,008
Índice de Gini 19,442 8,742 0,332 0,110 0,068
Prop Crianças Baixa Renda 25,705 -0,024 -0,293 0,086 0,109
PIB 24,234 0,000 0,258 0,066 0,161
Razão de Renda 24,014 0,023 0,170 0,029 0,360
Desemprego 24,111 0,074 0,166 0,028 0,371
Tabela 11 - Modelo final para a análise de regressão linear múltipla do desfecho "T-Health (6)".
Brasil, 2013.
Não-padronizado Padronizado
Variável E.P. T P I.C. (95%)
Constante 24,823 0,766 32,396 <0,001 23,254-26,393
Trabalho Infantil -0,150 0,060 -0,396 -2,490 0,019 (-0,273)-(-0,027)
Renda Média 0,001 0,001 0,345 2,173 0,038 0,000-0,002
Como equação final para o T-Health ( ), temos:
= 24,823 - 0,15 (trabalho infantil) + 0,001 (renda média)
Taxa de analfabetismo, proporção de domicílios com saneamento inadequado e renda
média apresentaram associação significativa nas análises simples de todos os desfechos,
sendo que esta última permaneceu nos modelos múltiplos para perda do 1º molar e T-Health.
A variável que indica a proporção de crianças vivendo em situação domiciliar de baixa renda
foi significativa para dois dos desfechos estudados na análise de regressão simples,
permanecendo no modelo múltiplo para o índice de cuidados odontológicos. O trabalho
infantil esteve bastante associado ao índice relativo à saúde dos tecidos dentários (T-Health) e
a razão de renda ao índice de cuidados odontológicos. O índice de Gini não apresentou
associação significativa com nenhum dos desfechos do estudo.
52 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
6 DISCUSSÃO
Antes de entrarmos na discussão propriamente dita, são necessárias algumas
considerações preliminares acerca da metodologia utilizada nesta pesquisa. Estudos
ecológicos possuem limitações relacionadas à utilização de dados secundários, tais como
fragilidade dos registros e dificuldade do controle de qualidade. Neste estudo, foram
utilizados dados do IBGE, de qualidade e confiabilidade reconhecidas nacionalmente, e da
Pesquisa Nacional de Saúde Bucal - SBBrasil 2010 – com dados coletados através de exames
clínicos e cujo rigor metodológico lhe confere alta validade interna (PINTO; MATOS;
LOYOLA FILHO, 2012). Uma outra limitação deste tipo de pesquisa está na impossibilidade
de fazer inferências para o nível individual, a partir de resultados obtidos em nível
populacional; e, por seu delineamento transversal, não é possível estabelecer relação causal
entre indicadores e fatores socioeconômicos, mas apenas levantar hipóteses sobre as
associações encontradas (FISCHER et al., 2010; MACHADO et al., 2012).
A despeito dessas considerações, a análise de dados contextuais viabiliza o estudo de
associações entre níveis de agravo e seus possíveis fatores causais, em diversas situações nas
quais não é possível a obtenção de informações pessoais. Estudos ecológicos chamam a
atenção para o efeito do lugar sobre a vida e a saúde das pessoas. Constatam o papel do
território na reprodução das iniquidades em saúde, superando a concepção natural do espaço
apenas como um ambiente inerte e passivo e referenciando-o como espaço geográfico
socialmente construído e relevante para a compreensão dos fenômenos envolvidos no
processo saúde-doença. Além disso, são de grande auxílio no planejamento das ações dos
serviços de saúde, na formulação de programas socialmente adequados e no direcionamento
de recursos para as áreas mais carentes (BALDANI; VASCONCELOS; ANTUNES, 2004;
CAMPOS et al., 2012; JUNQUEIRA et al., 2012).
Utilizar a faixa etária de 15 a 19 anos para pesquisas em saúde bucal permite avaliar
aspectos relacionados aos serviços e detectar mudanças no perfil odontológico dessa
população em um curto espaço de tempo. No entanto, foram encontradas dificuldades
relativas à pouca literatura com abordagem semelhante à utilizada neste estudo, de forma
especial utilizando os mesmos indicadores. Gushi et al. (2005b) relataram este problema,
alertando para a falta de uniformidade em relação aos critérios de diagnóstico e
procedimentos amostrais nos estudos epidemiológicos realizados em adolescentes, tanto no
Brasil como em países desenvolvidos.
53 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Apesar do objetivo inicial deste estudo não incluir a identificação das desigualdades
regionais do país, a análise descritiva dos resultados torna inevitável discutir essas
disparidades, cujas raízes são históricas. As regiões brasileiras apresentam, reconhecidamente,
grandes contrastes geográficos, climáticos, culturais e socioeconômicos (FRIAS et al., 2007).
Os resultados deste trabalho revelaram que discrepâncias nos indicadores socioeconômicos
das regiões Sul e Sudeste, em comparação aos das regiões Norte e Nordeste são evidentes, e
isso inclui capitais e municípios do interior.
Os indicadores que medem desigualdade, em especial a razão de renda, identificaram
algumas contradições. As cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, situadas entre as que
apresentaram melhores níveis de educação, renda, saneamento e produção econômica, estão,
também, entre as mais desiguais, o que sugere que o seu crescimento não beneficiou a
população de forma homogênea. Já em cidades como Florianópolis e Curitiba este
crescimento se deu de forma mais homogênea mostrando que, mesmo no Brasil, o
desenvolvimento não precisa, necessariamente, ser acompanhado de desigualdade.
Os clusters 1, 2 e 3 ocuparam os primeiros lugares em termo de igualdade entre os
domínios, o que sugere que nas capitais do Brasil há uma maior diferenciação entre ricos e
pobres. No entanto, com exceção do cluster 1, todos os demais apresentaram altas taxas de
analfabetismo, trabalho infantil, saneamento inadequado e baixa renda. O cluster 4, onde
estão a maioria dos municípios do interior do Norte e metade dos situados no Nordeste,
congrega os piores índices socioeconômicos, inclusive a 2ª maior razão de renda. Isso quer
dizer que neste cluster se encontram os municípios mais pobres, menos desenvolvidos e,
ainda assim, com as maiores concentrações de renda.
Em relação à média dos indicadores socioeconômicos entre todos os domínios, é
preciso destacar o alto valor da razão de renda (30,33%) e da proporção de crianças vivendo
em situação domiciliar de baixa renda (42,17%). A razão de renda é um medidor de
desigualdade de fácil entendimento. Mede quantas vezes o quintil mais rico ganha em relação
ao quintil mais pobre da população. Em um país como o Brasil, com vasto histórico de
desigualdade, este resultado não poderia ser diferente. O outro indicador é influenciado por
dois fatores: a renda (até ½ salário mínimo) e aglomeração domiciliar. Esta alta proporção
fornece dados relativos a crianças vivendo em situação de pobreza no país.
De forma geral, os índices relativos à renda (renda média domiciliar per capita) e
educação (taxa de analfabetismo) estiveram associados a todos os desfechos de saúde bucal na
análise de regressão simples. Muitos estudos na literatura confirmam a associação destes
54 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
fatores a agravos bucais como dor de dente (BORGES et al., 2008), sangramento gengival
(ANTUNES et al., 2008) e cárie dentária (GUSHI et al., 2005a).
Os indicadores “proporção de domicílios com saneamento inadequado” e “proporção
de crianças vivendo em situação domiciliar de baixa renda”, muito pouco utilizados na
literatura, estiveram associados com a maioria dos desfechos, sugerindo a viabilidade da sua
utilização em pesquisas com metodologia semelhante. Por outro lado, o PIB e a taxa de
desemprego não se mostraram boas variáveis de associação com a condição de saúde bucal de
adolescentes. O Gini, de forma particular, não apresentou associação com nenhum desfecho.
Os desfechos pesquisados neste estudo tratam, direta ou indiretamente, da cárie
dentária, fornecendo informações complementares sobre aspectos relacionados à saúde bucal.
Sabemos que a doença bucal é a quarta doença mais dispendiosa para tratar no mundo e a
cárie, de forma particular, está entre as doenças crônicas mais comuns. Ela leva à perda de
milhões de dias úteis de escolarização e ao absenteísmo do trabalho em adultos, trazendo
impactos de curto e longo prazo sobre a economia de um país. Este efeito é ainda mais
acentuado em locais de renda baixa e média, onde a prevenção é ineficaz e o acesso ao
tratamento dentário não supre toda a demanda (GLICK et al., 2012; WILLIAMS, 2011).
O primeiro desfecho abordado, o Índice de Cuidados Odontológicos, possibilita
avaliar o acesso e a qualidade dos serviços em relação ao tratamento da cárie dentária, mas
não mede a gravidade da doença. Um indivíduo com 1 dente restaurado de um CPO-D igual a
2 e outro com 5 dentes restaurados de um CPO-D de valor 10, apresentarão a mesma
proporção no índice de cuidados, ou seja, 50%. Da mesma forma, o seu cálculo não inclui os
indivíduos com CPO-D igual a zero, sendo incapaz de medir prevenção primária. Ele indica o
percentual tratado da doença, uma vez que o restante refere-se a elementos que permanecem
cariados ou que foram perdidos.
Sob este prisma, encontramos uma alta discrepância entre os domínios, que foram de
22,6 a 70%, o que revela uma grande desigualdade no acesso e/ou qualidade desses serviços.
Além disso, verificamos que mais da metade dos elementos dentários atacados pela cárie no
país são extraídos ou permanecem cariados. Na análise multivariada, 53,6% da variação do
desfecho pôde ser explicada por apenas duas variáveis, relativas à pobreza e desigualdade,
demonstrando a íntima ligação entre as disparidades de renda e sua associação com um menor
acesso ao tratamento da cárie dentária. Entre outras conclusões, este resultado sugere que a
oferta de serviços odontológicos de caráter conservador, especialmente na esfera pública,
55 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
ainda não tem alcançado de forma satisfatória a população mais pobre do país, na faixa de 15
a 19 anos.
Frias et al. (2007), pesquisando fatores contextuais da cárie não tratada em
adolescentes no Brasil, encontrou associação com IDH, proporção de domicílios com ligação
ao sistema de água e presença de flúor na água de abastecimento por um período ininterrupto
de 5 anos. A despeito das diferenças metodológicas, é possível observar a presença de fatores
ligados à renda e educação nos dois estudos, uma vez que o Índice de Desenvolvimento
Humano agrega informações sobre renda, escolaridade e longevidade, além dos relativos a
saneamento.
Com relação à perda de pelo menos um molar permanente, este é um indicador que
agrega dados relativos à gravidade da cárie em adolescentes e complementa informações
acerca da qualidade dos serviços. A erupção do 1º molar permanente acontece por volta dos 6
anos de idade, sendo fundamental para o estabelecimento da primeira chave de oclusão da
criança. No entanto, este elemento é normalmente acometido por cárie devido a vários fatores
como seu posicionamento mais posterior, que dificulta a escovação; sua erupção ainda na
infância, sendo confundido com dentes decíduos e não recebendo a devida importância por
parte dos pais; e pela sua própria anatomia, mais propensa ao acúmulo de biofilme (MELO et
al., 2011). Dessa forma, a manutenção destes elementos em adolescentes sinaliza, entre outros
fatores, a capacidade dos serviços de prevenir e preservar os elementos dentários.
Foram identificadas grandes desigualdades relativas a esse indicador, evidenciadas na
análise dos quartis e na diferença de mais de 20 vezes entre dois domínios estudados. Na
análise multivariada, 54,2% da variação deste indicador foi explicada pelas variáveis “renda
média domiciliar per capita” e “proporção de saneamento inadequado”, o que nos leva a
concluir que, em locais de baixa renda e más condições de saneamento - o que inclui falta de
água tratada, esgoto e coleta de lixo - a prevenção em saúde bucal e a preservação dos
elementos dentários estão bastante prejudicadas, tendo como consequência uma alta gravidade
da cárie e perda dentária em adolescentes.
A associação com o saneamento inadequado abre uma discussão sobre sua possível
relação com a presença de flúor na água de abastecimento. Este é um fator bem mais
explorado na literatura, mas seus resultados são controversos. Fernandes e Peres (2005) não
encontraram associação significativa entre o acesso à água fluoretada e proporção de
exodontias em municípios brasileiros. Contraditoriamente, em um estudo individual, Barbato
56 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
e Peres (2009) apontaram uma prevalência 40% maior de perda dentária em adolescentes
residentes em áreas que não dispunham de água fluoretada.
Tratando-se de outros desfechos, Gushi et al. (2005b) não encontraram diferença entre
o CPO-D dos municípios com e sem água fluoretada, mas houve maior porcentagem de livres
de cárie nos que dispunham. Já Frias et al. (2007) constataram relação entre a presença de
flúor na água de abastecimento (há 5 anos ou mais) e cárie não tratada em adolescentes no
Brasil. De forma geral, há uma tendência a reconhecer o efeito benéfico do acesso ao flúor na
água de abastecimento em relação à prevalência e morbidade da cárie.
A comprovação da associação do saneamento inadequado na análise linear dos 3
desfechos desta pesquisa e sua permanência no modelo múltiplo da perda dentária em
adolescentes é importante por dois motivos. O primeiro, por tratar-se de um indicador
facilmente associado a prejuízos na saúde geral, sendo aqui constatado seu reflexo negativo
especificamente na saúde bucal. E em segundo lugar, por ser um fator que indica más
condições de moradia, evidenciando a negligência do Estado em cumprir seu papel, dever
constitucional, de garantir moradia digna aos cidadãos brasileiros.
A maioria dos estudos ecológicos têm apontado maiores índices de perdas dentárias e
proporções de exodontias relacionados a municípios com maior concentração de renda e
menor acesso aos serviços odontológicos (FERNANDES; PERES, 2005; FISCHER et al.,
2010; PALMIER et al., 2012). Apesar deste estudo não ter contemplado nenhuma variável
diretamente relacionada à cobertura dos serviços odontológicos, os resultados sugerem que a
população de baixa renda concentra a maior carga de doença em estágio avançado, para a qual
não são oferecidas outras possibilidades terapêuticas que não a extração dentária.
O último desfecho pesquisado tem a particularidade de não medir doença, mas a saúde
dos tecidos dentários. O T-Health exige uma mudança de conceito, pois é um indicador
positivo e está associado ao que traz saúde, ao invés daquilo que a prejudica. Apesar de
parecer um CPO-D às avessas, tem maior poder discriminatório acerca do quanto foi
preservado dos tecidos dentários, uma vez que dá um grande valor aos dentes hígidos e
considera com importância decrescente os restaurados e cariados, mas ainda presentes na
boca. Entretanto, devemos tratar a representatividade desse índice com certa cautela, ou
estaremos remetendo a questão da qualidade de saúde bucal a uma relação, nem sempre
verdadeira, de que quanto maior a quantidade de dentes hígidos, melhor a qualidade da saúde
bucal (FERREIRA, 1999).
57 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Dentre os desfechos utilizados, o T-Health foi o que apresentou menores variações
entre os domínios. Encontrar uma menor variação nos valores de tecido dentário saudável
entre os domínios não significa que este valor esteja adequado ou que haja igualdade no
interior dos domínios. Não fornece, também, informações acerca da morbidade da cárie entre
os jovens afetados; sugere, apenas, que parcelas semelhantes da população adolescente de
cada domínio estão sendo capazes de manter dentes hígidos na boca. Uma das possíveis
explicações para este resultado pode ser a influência do fenômeno da polarização da cárie que
acontece no país. Da mesma forma que ocorre uma maior prevalência da doença em um grupo
restrito, parece existir, na outra extremidade, uma proporção semelhante de livres de cárie.
Na análise multivariada, permaneceram as variáveis “trabalho infantil” e “renda média
domiciliar per capita” com poder de explicação igual a 31,5%. Além da renda, variável de
associação mais frequente em todo este estudo, a correlação negativa com o trabalho infantil
pode indicar duas possibilidades. A primeira, mais simplista, seria que o fato das crianças
trabalharem indevidamente as levaria a um menor cuidado com sua saúde bucal, refletido em
mais dentes acometidos por cárie ao chegar na adolescência. Uma outra seria a de que
localidades com uma melhor condição de emprego, de forma geral, estão relacionadas a uma
melhor capacidade de prevenção e manutenção de tecido dentário saudável nesta faixa etária,
seja pelo maior poder aquisitivo da população, por possuírem um melhor sistema de serviços
odontológicos, ou até mesmo por exigências impostas pelo mercado de trabalho.
O poder de explicação dos modelos múltiplos, encontrado neste estudo, pode estar
relacionado ao pequeno número de unidades amostrais utilizado, uma vez que parece ser uma
característica dos estudos ecológicos que fazem uso de um grande número de unidades
amostrais no Brasil encontrarem baixos valores de correlação, porém significativos
(BALDANI; VASCONCELOS; ANTUNES, 2004).
Foi observado que, com exceção da associação mais forte entre razão de renda e o
índice de cuidados, os indicadores relativos à desigualdade foram menos importantes quando
comparados aos relativos à renda, educação, saneamento e emprego. Uma das possíveis
explicações para o pouco poder discriminatório desses índices é a de que, em países com altas
taxas de pobreza e miséria como o Brasil, a influência da desigualdade seria ofuscada pelos
indicadores que medem renda e más condições de vida e educação. Isso pode ser verificado
quando se observa as diferenças entre os quartis destes fatores. Os quartis 25 das variáveis
renda média, analfabetismo e desemprego correspondem, praticamente, à metade do valor
encontrado no quartil 75. Em relação à proporção de saneamento inadequado, essa diferença
58 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
chega a quase 20 vezes. O mesmo não acontece com as variáveis relativas à desigualdade,
cujas diferenças são mais atenuadas entre os quartis. De qualquer forma, a maior
homogeneidade nos índices relativos à desigualdade pode indicar, apenas, que os domínios
são igualmente desiguais, ou seja, que a desigualdade dentro dos domínios supera a medida
entre os domínios (BALDANI; VASCONCELOS; ANTUNES, 2004; PALMIER et al.,
2012).
Apesar de algumas exceções, os resultados mostraram uma clara tendência onde os
piores valores encontrados (nos dois primeiros desfechos) pertenceram a domínios localizados
no Norte e Nordeste do país. O T-Health, de forma muito peculiar, apresentou essa tendência
de uma forma bem mais diluída, com uma melhor distribuição das regiões entre os melhores e
piores valores. Ainda assim, o cluster 4 apresentou os piores resultados em todos os desfechos
pesquisados. Os adolescentes que residem em municípios do interior do Norte e Nordeste, que
agregam os piores índices de renda, educação e desigualdade, são os que mais sofrem com a
cárie dentária, sendo que apenas 23% dos seus dentes afetados são satisfatoriamente
restaurados, e quase 40% destes jovens entre 15 e 19 anos já perderam algum 1º molar. Por
outro lado, aqueles que moram no interior do Sul e Sudeste estão entre os menos afetados pela
cárie, possuem um percentual tratado de 66% e apenas 8% já perderam algum 1º molar. Estes
dados revelam uma desigualdade evitável, injusta e desnecessária.
A saúde bucal, atualmente, é considerada um componente essencial da saúde geral e,
um índice elevado de saúde bucal, um direito humano fundamental. No entanto, as doenças
bucais ainda representam um grave problema global e as desigualdades em saúde bucal, tal
como na saúde geral, persistem entre os países e no seu interior, apesar dos seus agravos
serem de fácil prevenção, através de métodos simples e eficazes (GLICK et al., 2012). O
Brasil enquadra-se nesse perfil, como já esperado, precisamente considerando-se sua
localização em uma das regiões mais inequitativas do planeta, segundo relatório da ONU-
Habitat (2012). As cidades latino-americanas e do Caribe são consideradas as mais divididas
do mundo, e essa segregação se expressa tanto espacial como socialmente. Por outro lado, a
Comissão Nacional Sobre Determinantes Sociais Da Saúde (2008) concluiu que a maior parte
das desigualdades encontradas no mundo se deve a uma combinação cruel de arranjos
econômicos injustos, políticas e programas pobres, e a governos ineficientes. As iniquidades
em saúde e em saúde bucal existentes, hoje, no país, são reflexo de séculos vivendo sob o
jugo dessa “combinação cruel” citada pela OMS.
59 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
Há uma percepção crescente de que conduzir o mundo a uma saúde bucal ótima
significa tratar os seus determinantes sociais subjacentes. Esses determinantes da saúde bucal,
que incluem não só fatores genéticos, biológicos e ambientais, mas também determinantes
comportamentais e sociais da saúde e bem-estar, formam uma complexa teia que, apesar de
ter apresentado grandes progressos em todo o mundo, ainda permanece um grande desafio de
saúde pública. A eliminação das desigualdades em saúde bucal não pode ser feita isolando-a
da saúde em geral ou sem reconhecer que ela é influenciada por outros níveis como a família,
a comunidade e o sistema de saúde (GARCIA; TABAK, 2011; GLICK et al., 2012).
Esta nova concepção, que considera os determinantes sociais em saúde bucal, requer
uma mudança nos tradicionais modelos de educação em Odontologia, que se mostraram
incapazes de lidar adequadamente com as desigualdades em saúde bucal (GLICK et al.,
2012). Da mesma forma, é preciso mudar a maneira de se trabalhar prevenção em
Odontologia. Tradicionalmente, a atuação da Odontologia Preventiva tem o seu foco na
adoção de comportamentos saudáveis. Apesar de não estar errada, é uma proposta limitada.
Este limite encontra-se no fato de que pouco contribui com a redução das desigualdades em
saúde, pois há evidencias de que o foco no comportamento individual, na prática, acentua as
desigualdades. Quem tem mais educação e riqueza também dispõe de maior controle sobre
suas vidas e estão mais propensos a responder a esta abordagem individualista (MARMOT;
BELL, 2011).
Nos últimos anos, ocorreu uma notável mudança epidemiológica mundial, onde
doenças agudas e transmissíveis deixaram de ser as maiores causadoras de morte e
morbidade, sendo substituídas por doenças crônicas como diabetes, cardiopatias e câncer.
Neste sentido, é salutar observar que várias doenças bucais estão ligadas a doenças crônicas
não transmissíveis ou condições que compartilham fatores de risco comuns. Da mesma forma,
doenças sistêmicas, muitas vezes, apresentam manifestações orais. Seguindo este raciocínio,
temos que uma série de condições podem ser resolvidas ao mesmo tempo, através de uma
prevenção mais eficiente e eficaz em longo prazo, desde que sejam modificados fatores de
risco comuns a várias delas. Trata-se de interferir nas condições e estilo de vida das pessoas,
garantindo um melhor acesso à água potável, saneamento, nutrição adequada e cuidados de
saúde. Medidas como essas previnem doenças e deficiências, beneficiando a saúde geral e
bucal (GARCIA; TABAK, 2011; PETERSEN; KWAN, 2009).
O Brasil deu um importante passo ao definir uma política nacional de saúde bucal. O
Brasil Sorridente, pautado em levantamentos epidemiológicos e procurando investir na
60 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
prevenção, promoção e recuperação da saúde, trouxe ao país a oportunidade de melhorar os
índices de saúde bucal, conhecidamente negativos, e de diminuir as desigualdades. Para que o
Brasil sepulte definitivamente o peso de ser "o país dos desdentados”, é preciso considerar as
oportunidades de integração da saúde bucal em programas mais abrangentes de saúde geral,
como prevenção do tabagismo, controle do álcool, prevenção de HIV/AIDS, prevenção de
câncer, prevenção de diabetes, dieta e nutrição, água e saneamento (PETERSEN; KWAN,
2009).
Combater as desigualdades em saúde bucal geral exigirá criatividade, diligência e um
forte compromisso de cooperação com os muitos atores envolvidos no processo, como
instituições de pesquisa e ensino superior, organizações públicas e privadas, associações
profissionais, agentes de saúde, empresas e fundações que promovam a saúde. A comunidade
de saúde bucal deve "estar à mesa" com estes e outros parceiros, e estar disposta a enquadrar
as necessidades de saúde bucal no contexto da saúde em geral, desenvolvendo objetivos
claramente articulados e impulsionados por fortes evidências acerca do impacto das doenças e
condições bucais (GARCIA; TABAK, 2011)
Segundo definição de Bommier e Stecklov (2002), a distribuição da saúde numa
sociedade igualitária ideal é aquela onde o acesso à saúde não foi determinado pelo status ou
pela renda socioeconômica, fator este que se mostrou imperativo em todos os desfechos
pesquisados neste estudo. A abordagem dos determinantes sociais, bem como a avaliação da
distribuição das doenças bucais no país, são recursos imprescindíveis para combater as
iniquidades evidentes neste estudo, e devem nortear a implementação de programas e ações
em saúde bucal.
61 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
7 CONCLUSÕES
A utilização do conhecimento sobre os determinantes sociais não produz uma resposta
imediata na formulação de ações políticas porque esse uso não depende exclusivamente da
dimensão técnica e sim da dimensão política. Alguns determinantes não são manipuláveis no
campo da saúde, mas é preciso divulgar esse conhecimento para a sociedade.
No presente estudo, não foi possível constatar forte relação entre indicadores de
desigualdade e saúde bucal, exceto no tocante ao percentual tratado de cárie, abrindo uma
discussão sobre o grau de sensibilidades desses indicadores. As iniquidades em saúde bucal,
para a população adolescente, foram evidenciadas pela grande variação nos índices de
cuidados odontológicos e perda do 1º molar nos domínios estudados, bem como pela
frequente associação de fatores contextuais relativos à pobreza, baixos níveis de educação e
más condições de moradia e emprego com piores níveis de saúde bucal. A avaliação destes
resultados, em conjunto com a maior homogeneidade encontrada nos valores do T-Health,
sugere que o grande gargalo da desigualdade em saúde bucal não está na comparação dos
saudáveis, mas principalmente na forma como são tratados os que adoecem no país.
As más condições socioeconômicas de um lugar parecem compor, com a saúde de sua
população, uma equação onde a pobreza gera uma saúde precária e a saúde precária aumenta
a pobreza. A associação entre pobreza, má condição bucal e dificuldade de acesso ao serviço
leva a população a uma condição penalizante que potencializa as desigualdades sociais e,
complementarmente, gera para o Estado um gasto adicional direcionado ao tratamento de
doenças, conhecidamente de fácil prevenção, como é o caso das doenças bucais mais comuns.
O Brasil passa por um processo de transição da Odontologia curativa e mutiladora,
historicamente hegemônica no acesso aos diferentes grupos populacionais, para outra com
ênfase na prevenção e na promoção equânime da saúde. Infelizmente, esse processo não
parece estar ocorrendo de forma homogênea no país onde, em algumas localidades, em
especial no interior das regiões Norte e Nordeste, continua prevalecendo uma Odontologia
mutiladora, cujos efeitos são perceptíveis já em sua população adolescente. O acesso aos
serviços restauradores no Brasil também se mostrou limitado e desigual. Isso vai de encontro
às expectativas que vinculam os serviços públicos à equidade na atenção à saúde.
Os resultados deste estudo evidenciam as iniquidades em saúde bucal no país e
mostram a necessidade da inclusão de novas perspectivas na abordagem tradicional da
Odontologia Preventiva e nos modelos de educação em Odontologia. O combate às
62 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
iniquidades em saúde bucal no país requer a cooperação dos vários autores envolvidos no
processo e a inclusão da saúde bucal no contexto da saúde geral. A abordagem dos
determinantes sociais, bem como a avaliação da distribuição das doenças bucais no país e sua
inclusão no contexto da saúde em geral, devem nortear a implementação de programas e
ações em saúde bucal, de forma a contribuir para a redução das desigualdades.
63 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
REFERÊNCIAS
ALMEIDA-FILHO, N. A problemática teórica da determinação social da saúde (nota breve
sobre desigualdades em saúde como objeto de conhecimento). Saúde em debate, v. 33, n. 83,
p. 349-70, 2009.
ANTUNES, J. L. F. et al. Saúde gengival de adolescentes e a utilização de serviços
odontológicos, Estado de São Paulo. Revista de Saúde Pública, v. 42, n. 2, p. 191-9, 2008.
AQUILANTE, A. G. Proposta de utilização do índice de equivalência de dentes saudáveis
para análise da condição de saúde bucal de escolares de 12 anos de idade do município
de Bauru-SP, no período entre 1976 e 1981. 2005. 135 f. Dissertação (Mestrado) –
Universidade de São Paulo, Bauru, 2005.
BALDANI, M. H.; VASCONCELOS, A. G. G.; ANTUNES, J. L. F. Associação do Índice
CPO-D com indicadores sócio-econômicos e de provisão de serviços odontológicos no Estado
do Paraná, Brasil. Caderno de Saúde Pública, v. 20, n. 1, p. 143-152, 2004.
BARATA, R. B. et al. Gender and health inequalities among adolescents and adults in Brazil,
1998. Revista Panamericana de Salud Publica, v. 21, n. 5, p. 320-327, 2007.
BARBATO, P. R.; PERES, M. A. Perdas Dentárias em adolescentes brasileiros e fatores
associados: estudo de base populacional. Revista de Saúde Pública, v. 43, n. 1, p. 13-25,
2009.
BARROS, M. B. A. Inquéritos domiciliares de saúde: potencialidades e desafios. Revista
Brasileira de Epidemiologia, v. 11, p. 6-19, 2008. Suplemento 1.
BASTOS, J. L. et al. Color/race inequalities in oral health among Brazilian adolescents.
Revista Brasileira de Epidemiologia, v.12, n.3, p. 313-24, 2009.
BENIGERI, M.; PAYETTE, M.; BRODEUR, J. M. Comparison between the DMF indices
and two alternative composite indicators of dental health. Community Dentistry and Oral
Epidemiology, v. 26, n. 5, p. 303-9, 1998.
BERNABÉ, E. et al. The T-health index: a composite indicator of dental health. European
Journal Oral Sciences, v. 117, n. 4, p. 385-9, 2009.
BLAS, E.; KURUP, A. S. (Ed.). Equity, social determinants and public health programmes.
Geneva: World Health Organization, 2010.
BOMMIER, A.; STECKLOV, G. Defining health inequality: why Rawls succeeds where
social welfare theory fails. Journal of Health Economics, v. 21, n. 3, p. 497-513, 2002.
64 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
BORGES, C. M. et al. Dor nos dentes e gengivas e fatores associados em adolescentes
brasileiros: análise do inquérito nacional de saúde bucal SB-Brasil 2002-2003. Caderno de
Saúde Pública, v. 24, n. 8 p. 1825-1834, 2008.
BRASIL. Ministério da Saúde. Relatório da 8ª Conferência Nacional de Saúde. Brasília,
1986. Disponível em: < http://conselho.saude.gov.br/biblioteca/Relatorios/relatorio_8.pdf>.
Acesso em: 15 ago. 2012.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal,
1988.
BRASIL. Ministério da Saúde. Divisão Nacional de Saúde Bucal. Fundação Serviços de
Saúde Pública. Levantamento epidemiológico em saúde bucal: Brasil, zona urbana, 1986.
Brasília: Centro de Documentação do Ministério da Saúde, 1988. 137 p. (Série C. Estudos e
Projetos, 4).
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção a Saúde. Departamento de Atenção
Básica. Projeto SB Brasil 2003: Condições de Saúde Bucal da População Brasileira 2002-
2003: Resultados Principais. Brasília: Ministério da Saúde, 2004.
BRASIL. Ministério da Saúde. Coordenação Geral de Saúde Bucal. Banco de dados da
Pesquisa Nacional de Saúde Bucal – Projeto SBBrasil 2010. Brasília: Ministério da Saúde,
2011ª. Disponível em:<www.saude.gov.br/bucal>. Capturado em 12 nov. 2012.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção a Saúde. Departamento de Atenção
Básica. Projeto SB Brasil 2010: Resultados Principais. Brasília: Ministério da Saúde, 2011b.
BRASIL. Ministério da Saúde. Coordenação Nacional de Saúde Bucal. Indicadores do
Sistema de Informações da Atenção Básica. Disponível em:
<http://dab.saude.gov.br/CNSB/indicadores_sistema.php> Acesso: 12 dez. 2012.
BUSS, P. M.; PELLEGRINI FILHO, A. A Saúde e seus Determinantes Sociais. Physis:
Revista de Saúde Coletiva, v. 17, n. 1, p. 77-93, 2007.
BUSS, P. M.; PELLEGRINI FILHO, A. Iniquidades em saúde no Brasil, nossa mais grave
doença: comentários sobre o documento de referência e os trabalhos da Comissão Nacional
sobre Determinantes Sociais da Saúde. Caderno de Saúde Pública, vol. 22, n. 9, p. 2005-
2009, 2006.
CAMPOS, A. C. V. et al. Indicadores socioeconômicos e de saúde da Atenção Básica nos
municípios da região metropolitana de Belo Horizonte. Arquivos em Odontologia, v. 48, n.
1, p.6-12, 2012.
COSTA, A. M. Determinação Social da Saúde. Saúde em debate, v. 33, n. 83, P. 443-446,
2009.
COMISSÃO NACIONAL SOBRE DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE. As causas
sociais das iniquidades em saúde no Brasil: Relatório Final da Comissão Nacional sobre
Determinantes Sociais da Saúde. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2008.
65 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
DAHLGREN, G.; WHITEHEAD, M. Policies and Strategies to promote social equity in
health. Stockholm: Institute for Future Studies, 1991.
DATASUS. Ministério da Saúde. IDB 2010 Brasil: Indicadores e Dados Básicos para a
Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2010. Disponível em:
<http://www.ripsa.org.br/fichasIDB/> Acesso em: 12 dez. 2012.
DEJOURS, C. Por um novo conceito de saúde. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, v.
14, n. 54, 1986.
FERNANDES, L. S.; PERES, M. A. Associação entre atenção básica em saúde bucal e
indicadores socioeconômicos municipais. Revista de Saúde Pública, v. 39, n. 6, p. 930-936,
2005.
FERREIRA, R. C. Uma aproximação da relação entre saúde bucal e determinantes
sociais: um estudo da relação entre indicadores de saúde-doença bucal e índice de
vulnerabilidade à saúde em usuários do SUS-BH. 1999. 164 f. Dissertação (Mestrado) –
Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 1999.
FINLAYSON, T. L. et al. Oral Health Disparities and Psychosocial Correlates of Self-Rated
Oral Health en the Nacional Survey of American Life. American Journal of Public Health,
v. 100, p. 246-255, 2010. Suplemento 1.
FISCHER, T. K. et al. Indicadores de atenção básica em saúde bucal: associação com as
condições sócio-econômicas, provisão de serviços, fluoretação de águas e a estratégia da
saúde da família no Sul do Brasil. Revista Brasileira de Epidemiologia, v. 13, n. 1, p. 126-
38, 2010.
FLEURY-TEIXEIRA, P. Uma introdução conceitual à determinação social da saúde. Saúde
em debate, v. 33, n. 83, p. 380-387, 2009.
FRIAS, A. C. et al. Determinantes individuais e contextuais da prevalência de cárie dentária
não tratada no Brasil. Revista Panamericana de Salud Pública, v. 22, n. 4, p. 279-85, 2007.
GARCIA I.; TABAK L.A. Global Oral Health Inequalities: The View from a Research
Funder. Advances in Dental Research, n. 23, v. 2, p. 207-10, 2011.
GLICK, M. et al. FDI Vision 2020: shaping the future of oral health. International Dental
Journal, v. 62, n. 6, p. 278-291, 2012.
GUSHI L. L. et al. Relationship between dental caries and socio-economic factors in
adolescents. Journal of Applied Oral Science, v. 13, n. 3, p. 305-11, 2005a.
GUSHI, L. L. et al. Cárie dentária em adolescentes de 15 a 19 anos de idade no Estado de São
Paulo, Brasil, 2002. Caderno de Saúde Pública, v. 21, n. 5, p. 1383-1391, 2005b.
HJERN, A. et al. Social inequality in oral health and use of dental care in Sweden.
Community Dentistry and Oral Epidemiology., v 29, n. 3, p. 167-174, 2001.
66 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
IBGE. Censo Demográfico 2010. 2010. Disponível em: <http://www.censo2010.ibge.gov.br>.
Acesso: 10 nov. 2012.
JOHNSON, N. W. et al. Global Oral Health Inequalities in Incidence and Outcomes for Oral
Cancer: Causes and Solutions. Advances in Dental Research, v. 2, n. 23, p. 237-46, 2011.
JUNQUEIRA, S. R. et al. Saúde Bucal e uso dos serviços odontológicos em função do Índice
de Necessidades em Saúde: São Paulo, 2008. Ciência e Saúde Coletiva, v. 17, n. 4, p. 1015-
1024, 2012.
KAWACHI, I. et al. 1997. Social capital, income inequality and mortality. American
Journal of Public Health, v. 87, n. 9, p.1491-1498, 1997.
KOLTERMANN, A. P.; GIORDANI, J. M. A.; PATTUSSI, M. P. The association between
individual and contextual factors and functional dentition status among adults in Rio Grande
do Sul State, Brazil: a multilevel study. Caderno de Saúde Pública, v. 27, n. 1, p. 173-182,
2011.
KRIEGER, N. Epidemiology and the web of causation: has anyone seen the spider? Social
Sciences and Medicine, v. 39, n. 7, p. 887-903, 1994.
LEVIN, K. A. et al. Inequalities in dental caries of 5-year-old children in Scotland, 1993-
2003. European Journal of Public Health, v. 19, n. 3, p. 337-342, 2009.
MACHADO, L. P. et al. Uso regular de serviços odontológicos entre adultos e idosos em
região vulnerável no sul do Brasil. Revista de Saúde Pública, v. 46, n. 3, p. 526-33, 2012.
MARCENES, W. S.; SHEIHAM, A. Composite indicators of dental health: functioning teeth
and the number of sound-equivalent teeth (T-Health). Community Dentistry Oral
Epidemiology, v. 21, n. 6, p. 374-8, 1993.
MARMOT, M.; BELL, R. Social Determinants and Dental Health. Advances in Dental
Research, n. 23, v. 2, p. 201-216, 2011.
MARTINS, A. M. E. B. L. et al. Levantamentos epidemiológicos brasileiros das condições de
saúde bucal. Unimontes Cientifica, v. 7, n. 1, 2005.
MELO, F. G. C. et al. Perda precoce de molares permanentes e fatores associados em
escolares de 9, 12 e 15 anos da rede pública municipal de Campina Grande, Estado da
Paraíba, Brasil. Acta Scientiarum. Health Sciences, v. 33, n. 1, p. 99-105, 2011.
MOREIRA, R. S.; NICO, L. S.; TOMITA, N. E. O risco espacial e fatores associados ao
edentulismo em idosos em municípios do Sudeste do Brasil. Caderno de Saúde Pública, v.
10, n. 27, p. 2041-2053, 2011.
NERI, M.; SOARES, W. Desigualdade social e saúde no Brasil. Caderno de Saúde Pública,
v. 18, p. 77-87, 2002. Suplemento 1.
67 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
NGUYEN, L.; HAKKINEN, U.; ROSENQVIST, G. Determinants of dental service
utilization among adults: the case of Finland. Health Care Management Science, v. 8, n. 4,
p. 335-345, 2005.
NISHI, L. F. Coeficiente de GINI: uma medida de distribuição de renda. Florianópolis, 2010.
Disponível em: <http://portalantigo.esag.udesc.br/arquivos/Apostila_Gini.pdf>. Acesso em:
12 dez. 2012.
NOGUEIRA, R. P. Determinantes, determinação e determinismo sociais. Saúde em debate,
v. 33, n. 83, p. 397-406, 2009.
ONU-HABITAT. Estado de las ciudades de América Latina y el Caribe 2012: rumbo a
una nueva transición urbana. Kenia: Programas de Las Naciones unidas para los
Asentamentos Humanos, 2012. 194 p.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Constitution of the World Health
Organization. 2006. Disponível em: <http://apps.who.int/gb/bd/PDF/bd47/EN/constitution-
en.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2012.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Ottawa Charter for Health Promotion. 1986.
Disponível em: <http://www.naspa.org/2012_Chicago_Hdts_1(1).pdf>. Acesso em: 9 dez.
2012.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. World Health Statistics 2009. Geneva: World
Health Organization. 2009.
PALMIER, A. C. et al. Indicadores socioeconômicos e serviços odontológicos em uma região
brasileira desfavorecida. Revista Panamericana de Salud Pública, v. 32, n. 1, p. 22-9, 2012.
PELLEGRINI FILHO, A. Pesquisa em saúde, política de saúde e equidade na América
Latina. Ciência e Saúde Coletiva, v. 9, n.2, p. 333-350, 2004.
PETERSEN, P. E. Improvement of global oral health – the leadership of the World Health
Organization. Community Dental Health, n. 27, p. 194-9, 2010.
PETERSEN, P. E.; KWAN, S. World Health Organization global oral health strategies for
oral health promotion and disease prevention in the twenty-first century. Präv Gesundheitsf,
v. 4, p. 100-104, 2009.
PINTO, R. S.; MATOS, D. L.; LOYOLA FILHO, A. I. Características associadas ao uso de
serviços odontológicos públicos pela população adulta brasileira. Ciência e Saúde Coletiva,
v. 17, n. 2, p. 531-44, 2012.
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Relatório de
Desenvolvimento Humano. Sustentabilidade e equidade: um futuro melhor para todos. Nova
Iorque, 2011.
QUEIROZ, R. C. S.; PORTELA, M. C.; VASCONCELLOS, M. T. L. Pesquisa sobre as
Condições de Saúde Bucal da População Brasileira (SB Brasil 2003): seus dados não
68 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
produzem estimativas populacionais, mas há possibilidade de correção. Caderno de Saúde
Pública, v. 25, n. 1, p. 47-58, 2009.
REDE INTERAGENCIAL DE INFORMAÇÕES PARA A SAÚDE. Indicadores básicos
para a saúde no Brasil: conceitos e aplicações. 2. Ed. Brasília: OPAS, 2008.
RONCALLI, A. G. Epidemiologia e saúde bucal coletiva: um caminhar compartilhado.
Ciência e Saúde Coletiva, v. 11, n. 1, p. 105-114, 2006a.
RONCALLI, A. G. Levantamentos Epidemiológicos em Saúde Bucal no Brasil. In:
ANTUNES, J. L. F.; PERES, M. A. (org.). Epidemiologia da saúde bucal. Rio de Janeiro,
Editora Guanabara Koogan, p. 32-48, 2006b.
RONCALLI, A. G. Indicadores de Saúde e de Saúde Bucal: Desafios para seu uso em
modelos assistenciais. In: Pereira, A. C. (org.). Tratado de saúde coletiva em odontologia.
São Paulo: Napoleão, 2009. p. 414-430.
RONCALLI, A. G. et al. Levantamentos epidemiológicos em saúde bucal: análise da
metodologia proposta pela Organização Mundial da Saúde. Revista Brasileira de
Epidemiologia, v. 1, n.2, 1998.
RONCALLI, A. G. et al. Aspectos metodológicos do Projeto SB Brasil 2010 de interesse para
inquéritos nacionais de saúde. Caderno de Saúde Pública, v. 28, p. S40-S57, 2012.
Suplemento.
RONCALLI, A. G.; CORTES, M. I. S.; PERES, K. G. Perfis epidemiológicos de saúde bucal
no Brasil e os modelos de vigilância. Caderno de Saúde Pública, v. 28, p. S58-S68, 2012.
Suplemento.
ROSE, G.; MARMOT, M. Social class and coronary heart disease. British Heart Journal, p.
v. 45, n. 1, p. 13-19, 1981.
SALES-PERES, S. H. C. et al. Polarização da cárie dentária em adolescentes, na região
sudoeste do Estado de São Paulo, Brasil. Ciência e Saúde Coletiva, v. 13, p. 2155-2162,
2008. Suplemento 2.
SALES-PERES, S. H. C.; BASTOS, J. R. M. Perfil epidemiológico de cárie dentária em
crianças de 12 anos de idade, residentes em cidades fluoretadas e não fluoretadas, na Região
Centro-Oeste do Estado de São Paulo, Brasil. Caderno de Saúde Pública, v. 18, n. 5, p.
1281-88, 2002.
SANDERS, A. E., SPENCER, A. J. Social inequality in perceived oral health among adults in
Australia. Australian and New Zealand Journal of Public Health, n. 2, v. 28, p. 159-66,
2004.
SOBRAL, A.; FREITAS, C. M. Modelo de organização para operacionalização dos
Determinantes Socioambientais da Saúde. Saúde Social, v. 19, n. 1, p. 35-47, 2010.
SUSSER, M. Does risk factor epidemiology put epidemiology at risk? Peering into the future.
Journal of Epidemiology and Community Health, v. 52, n. 10, p. 608-611, 1998.
69 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
TAMBELLINI, A. T.; SCHUTZ, G. E. Contribuição para o debate do CEBES sobre a
“Determinação Social da Saúde”: repensando processos sociais, determinações e
determinantes da saúde. Saúde em debate, v. 33, n. 83, p. 371-379, 2009.
TARLOV, A. Social determinants in health: the sociobiological translation.In: BLONE, D;
BRUNNER, E.; WILKINSON, R. (orgs). Health and Social Oganization. Londres:
Routhledge, 1996. p. 11-43
VAZ, P. R. M. et al. Condições de saúde bucal de pré-escolares analisadas por indicadores
diversos nas medidas em epidemiologia. Pesquisa Brasileira em Odontopediatria e Clinica
Integrada, v. 10, n. 2, p. 189-93, 2010.
VIACAVA, F. Informações em Saúde: a importância dos inquéritos populacionais. Ciência e
Saúde Coletiva, v. 7, p. 607-21, 2002.
VIANA, A. R. P. et al. Prevalência de cárie dentária e condições socioeconômicas em jovens
alistandos de Manaus, Amazonas, Brasil. Revista Brasileira de Epidemiologia, v. 12, n. 4, p.
680-687, 2009.
VOLPATO, G. L. Bases Teóricas para Redação Científica. São Paulo: Cultura Acadêmica,
2007.
WALDMAN E. A. et al. Inquéritos populacionais: aspectos metodológicos, operacionais e
éticos. Revista Brasileira de Epidemiologia, v. 11, p. 168-79, 2008. Suplemento 1.
WHITEHEAD, M. The concepts and principles of equity and health. Internacional Journal
of Health Services, v. 22, n. 3, p. 429-455, 1992.
WILKINSON, R. Unhealthy societies: the afflictions of inequality. Nova York: Routledge,
1997.
WILLIAMS, D. M. Global Oral Health Inequalities: The Research Agenda. Journal of
Dental Research, v. 90, n. 5, p. 549-51, 2011.
70 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
APÊNDICES
71 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
APÊNDICE A – Listas dos municípios integrantes dos 4 clusters representantes do interior
do Brasil, por Estado e Região.
CLUSTER 1
CLUSTER 2
NOME ESTADO REGIÃO
NOME ESTADO REGIÃO
Betim MG SE
Seringueiras RO N
Uberlândia MG SE
Jupi PE NE
Niterói RJ SE
Francisco Beltrão PR S
Bauru SP SE
Lobato PR S
Bragança Paulista SP SE
Planalto PR S
Campinas SP SE
Vera Cruz do Oeste PR S
Osasco SP SE
Rio das Antas SC S
Ribeirão Pires SP SE
São Joaquim SC S
Rio Claro SP SE
São José do Cedro SC S
Santos SP SE
Erval Grande RS S
São João da Boa Vista SP SE
Ibirubá RS S
Taboão da Serra SP SE
Santo Antônio da Patrulha RS S
Arapongas PR S
Sinimbu RS S
Foz do Iguaçu PR S
Teutônia RS S
Londrina PR S
Aparecida do Taboado MS CE
Quatro Barras PR S
Santa Rita do Pardo MS CE
São José dos Pinhais PR S
Juara MT CE
Blumenau SC S
Marcelândia MT CE
Itajaí SC S
Mirassol d'Oeste MT CE
Tubarão SC S
Nova Santa Helena MT CE
Carazinho RS S
São José do Rio Claro MT CE
Gravataí RS S
Campinorte GO CE
Novo Hamburgo RS S
Edealina GO CE
Rio Grande RS S
Goianésia GO CE
Anápolis GO CE
Itaberaí GO CE
Morrinhos GO CE
Itapuranga GO CE
Mundo Novo GO CE
Uruana GO CE
72 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
CLUSTER 3
CLUSTER 4
NOME ESTADO REGIÃO
NOME ESTADO REGIÃO
Vilhena RO N
Machadinho D'Oeste RO N
Ananindeua PA N
Cruzeiro do Sul AC N
Mãe do Rio PA N
Manoel Urbano AC N
Parauapebas PA N
Barreirinha AM N
Santarém PA N
Ipixuna AM N
Tucuruí PA N
Iranduba AM N
Santana AP N
Parintins AM N
Gurupi TO N
Tefé AM N
Imperatriz MA NE
Breves PA N
Aracati CE NE
Cametá PA N
Juazeiro do Norte CE NE
Capitão Poço PA N
Alto do Rodrigues RN NE
Concórdia do Pará PA N
Parnamirim RN NE
Igarapé-Miri PA N
Sousa PB NE
Jacareacanga PA N
Abreu e Lima PE NE
Juruti PA N
Caruaru PE NE
Oeiras do Pará PA N
Gameleira PE NE
Rondon do Pará PA N
Salgueiro PE NE
São Francisco do Pará PA N
Viçosa AL NE
Brejinho de Nazaré TO N
Camaçari BA NE
Goiatins TO N
Itapetinga BA NE
Cururupu MA NE
Teixeira de Freitas BA NE
Luís Domingues MA NE
Curvelo MG SE
Trizidela do Vale MA NE
Oliveira MG SE
Castelo do Piauí PI NE
Paraopeba MG SE
Catunda CE NE
Passos MG SE
Marco CE NE
Sete Lagoas MG SE
Mauriti CE NE
Linhares ES SE
Alagoinha PB NE
Duque de Caxias RJ SE
Arauá SE NE
Maricá RJ SE
Aiquara BA NE
Pinheiral RJ SE
Cafarnaum BA NE
Bento de Abreu SP SE
Caldeirão Grande BA NE
Cosmópolis SP SE
Ibirapitanga BA NE
Dois Córregos SP SE
Livramento de N. Senhora BA NE
Engenheiro Coelho SP SE
Serra do Ramalho BA NE
Guarujá SP SE
Alvorada de Minas MG SE
Presidente Epitácio SP SE
Claro dos Poções MG SE
Goioerê PR S
Grão Mogol MG SE
Lapa PR S
Terenos MS CE
Laguna SC S
Ribeirão Cascalheira MT CE
Alegrete RS S
Bagé RS S
Pelotas RS S
Aquidauana MS CE
Corumbá MS CE
Coxim MS CE
Alta Floresta MT CE
Cáceres MT CE
Várzea Grande MT CE
Aparecida de Goiânia GO CE
Campos Belos GO CE
Luziânia GO CE
Novo Gama GO CE
Planaltina GO CE
Trindade GO CE
73 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
APÊNDICE B – Gráficos dos índices socioeconômicos utilizados no estudo para cada um
dos 31 domínios.
0,00
5,00
10,00
15,00
20,00
25,00
Flo
rian
óp
olis
Cu
riti
ba
Po
rto
Ale
gre
Vit
óri
a
Rio
de
Jan
eiro
Bel
o H
ori
zon
te
São
Pau
lo
Go
iân
ia
Bel
ém
Bra
sília
Pal
mas
Cam
po
Gra
nd
e
Inte
rio
r 1
Man
au
s
Salv
ado
r
Cu
iab
á
São
Lu
ís
Po
rto
Vel
ho
Bo
a V
ista
Mac
apá
Ara
caju
Fort
alez
a
Rec
ife
João
Pes
soa
Nat
al
Tere
sin
a
Rio
Bra
nco
Inte
rio
r 3
Inte
rio
r 2
Mac
eió
Inte
rio
r 4
ANALFABETISMO
0,00
500,00
1000,00
1500,00
2000,00
Flo
rian
óp
olis
Vit
óri
a
Po
rto
Ale
gre
Bra
sília
Cu
riti
ba
São
Pau
lo
Rio
de
Jan
eiro
Bel
o H
ori
zon
te
Go
iân
ia
Cu
iab
á
Rec
ife
Cam
po
Gra
nd
e
Pal
mas
Inte
rio
r 1
Ara
caju
João
Pes
soa
Salv
ado
r
Nat
al
Po
rto
Vel
ho
Bel
ém
Fort
alez
a
Bo
a V
ista
Mac
eió
São
Lu
ís
Man
aus
Rio
Bra
nco
Tere
sin
a
Mac
apá
Inte
rio
r 2
Inte
rio
r 3
Inte
rio
r 4
RENDA MÉDIA
0,0010000,0020000,0030000,0040000,0050000,0060000,0070000,00
Vit
óri
a
Bra
sília
São
Pau
lo
Rio
de
Jan
eiro
Inte
rio
r 1
Po
rto
Ale
gre
Cu
riti
ba
Man
aus
Flo
rian
óp
olis
Bel
o H
ori
zon
te
Cu
iab
á
Po
rto
Vel
ho
Go
iân
ia
Rec
ife
Pal
mas
Cam
po
Gra
nd
e
São
Lu
ís
Bo
a V
ista
Inte
rio
r 2
Ara
caju
Nat
al
Mac
apá
Fort
alez
a
Rio
Bra
nco
João
Pes
soa
Inte
rio
r 3
Bel
ém
Mac
eió
Salv
ado
r
Tere
sin
a
Inte
rio
r 4
PIB
74 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
0,0010,0020,0030,0040,0050,0060,0070,0080,0090,00
Flo
rian
óp
olis
Cu
riti
ba
Go
iân
ia
Vit
óri
a
Inte
rio
r 1
Bra
sília
Bel
o H
ori
zon
te
Po
rto
Ale
gre
Cam
po
Gra
nd
e
São
Pau
lo
Cu
iab
á
Pal
mas
Rio
de
Jan
eiro
Po
rto
Vel
ho
Inte
rio
r 2
Bo
a V
ista
João
Pes
soa
Ara
caju
Nat
al
Salv
ado
r
Be
lém
Inte
rio
r 3
Man
aus
Fort
alez
a
São
Lu
ís
Mac
apá
Rio
Bra
nco
Rec
ife
Tere
sin
a
Mac
eió
Inte
rio
r 4
CRIANÇAS BAIXA RENDA
0,002,004,006,008,00
10,0012,0014,00
Inte
rio
r 2
Cu
riti
ba
Flo
rian
óp
olis
Go
iân
ia
Po
rto
Ale
gre
Po
rto
Vel
ho
Inte
rio
r 1
Bel
o H
ori
zon
te
Cam
po
Gra
nd
e
Pal
mas
Cu
iab
á
Vit
óri
a
Inte
rio
r 4
Rio
de
Jan
eiro
São
Pau
lo
Bo
a V
ista
Fort
alez
a
Bra
sília
Rio
Bra
nco
Inte
rio
r 3
Tere
sin
a
João
Pes
soa
Nat
al
Bel
ém
Ara
caju
Man
aus
Mac
apá
São
Lu
ís
Mac
eió
Rec
ife
Salv
ado
r
DESEMPREGO
0,00
5,00
10,00
15,00
20,00
25,00
Rio
de
Jan
eiro
Ara
caju
João
Pes
soa
Rec
ife
Nat
al
São
Lu
ís
Po
rto
Ale
gre
Bel
ém
Flo
rian
óp
olis
Tere
sin
a
Mac
eió
Fort
alez
a
Bra
sília
São
Pau
lo
Bel
o H
ori
zon
te
Rio
Bra
nco
Man
aus
Vit
óri
a
Inte
rio
r 1
Salv
ado
r
Bo
a V
ista
Inte
rio
r 3
Cu
riti
ba
Mac
apá
Pal
mas
Cam
po
Gra
nd
e
Cu
iab
á
Po
rto
Vel
ho
Go
iân
ia
Inte
rio
r 4
Inte
rio
r 2
TRABALHO INFANTIL
75 Fatores socioeconômicos contextuais associados à condição bucal de adolescentes no Brasil
0,005,00
10,0015,0020,0025,0030,0035,00
Rio
de
Jan
eiro
Flo
rian
óp
olis
Bel
o H
ori
zon
te
Vit
óri
a
Cu
riti
ba
Po
rto
Ale
gre
São
Pau
lo
Salv
ado
r
Go
iân
ia
João
Pes
soa
Nat
al
Fort
alez
a
Ara
caju
Rec
ife
Mac
eió
Cam
po
Gra
nd
e
Inte
rio
r 1
Man
aus
Cu
iab
á
Bra
sília
Bel
ém
Tere
sin
a
Bo
a V
ista
Pal
mas
Mac
apá
São
Lu
ís
Rio
Bra
nco
Inte
rio
r 3
Po
rto
Vel
ho
Inte
rio
r 2
Inte
rio
r 4
SANEAMENTO INADEQUADO
00,10,20,30,40,50,60,70,8
Inte
rio
r 2
Inte
rio
r 1
Inte
rio
r 3
Flo
rian
óp
olis
Inte
rio
r 4
Cu
riti
ba
Cam
po
Gra
nd
e
Po
rto
Vel
ho
Go
iân
ia
Pal
mas
Bo
a V
ista
Cu
iab
á
Mac
apá
Bel
o H
ori
zon
te
Rio
Bra
nco
Vit
óri
a
Po
rto
Ale
gre
Tere
sin
a
Nat
al
São
Lu
ís
Fort
alez
a
Bel
ém
João
Pes
soa
Man
aus
Ara
caju
Bra
sília
Mac
eió
Rio
de
Jan
eiro
Salv
ado
r
São
Pau
lo
Rec
ife
GINI
0,00
10,00
20,00
30,00
40,00
50,00
60,00
Inte
rio
r 2
Inte
rio
r 1
Inte
rio
r 3
Flo
rian
óp
olis
Cam
po
Gra
nd
e
Cu
riti
ba
Go
iân
ia
Pal
mas
Cu
iab
á
Po
rto
Vel
ho
Ter
esi
na
Bel
o H
ori
zon
te
Bo
a V
ista
Nat
al
Fort
alez
a
Po
rto
Ale
gre
Mac
eió
João
Pes
soa
Bel
ém
Vit
óri
a
Mac
apá
São
Lu
ís
Rio
Bra
nco
Bra
sília
Man
aus
Ara
caju
Rio
de
Jan
eiro
Salv
ado
r
São
Pa
ulo
Inte
rio
r 4
Rec
ife
RAZÃO DE RENDA