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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
DEPARTAMENTO DE DIREITO CURSO DE DIREITO
PABLO GURGEL FERNANDES
FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL: A INTERPRETAÇÃO
SEDIMENTADA NO RESP 1.141.990/PR E A SUA
(IN)CONFORMIDADE COM A CONSTITUIÇÃO.
Orientador: Dr. Luiz Alberto Gurgel de Faria
NATAL / RN
2014
PABLO GURGEL FERNANDES
FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL: A INTERPRETAÇÃO
SEDIMENTADA NO RESP 1.141.990/PR E A SUA
(IN)CONFORMIDADE COM A CONSTITUIÇÃO.
Monografia apresentada ao Curso de Direito
sob a orientação do Professor Dr. Luiz Alberto
Gurgel de Faria como requisito parcial para
obtenção do título de bacharel em Direito, do
Centro de Ciências Sociais Aplicadas, da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
NATAL / RN
2014
4
Catalogação da Publicação na Fonte.
UFRN / Biblioteca Setorial do CCSA
Fernandes, Pablo Gurgel.
Fraude à execução fiscal: a interpretação sedimentada no Resp 1.141.990/PR e a sua
(in)conformidade com a constituição / Pablo Gurgel Fernandes. - Natal, RN, 2014.
111 f.
Orientador: Prof. Dr. Luiz Alberto Gurgel de Faria.
Monografia (Graduação em Direito) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Departamento de Direito.
1. Direito – Monografia. 2. Direito tributário – Monografia. 3. Execução fiscal –
Monografia. 4. Processo tributário – Monografia. I. Faria, Luiz Alberto Gurgel de. II.
Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.
RN/BS/CCSA CDU 34:336.2
5
PABLO GURGEL FERNANDES
FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL: A INTERPRETAÇÃO
SEDIMENTADA NO RESP 1.141.990/PR E A SUA
(IN)CONFORMIDADE COM A CONSTITUIÇÃO.
Monografia apresentada ao Curso de Direito, da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em
Direito.
Aprovado em: 14/11/2014.
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________________________
Professor Dr. Luiz Alberto Gurgel de Faria – Orientador
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
______________________________________________________________
Professor Dr. Marco Bruno Miranda Clementino – Examinador
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
______________________________________________________________
Professora Dra. Flávia Sousa Dantas Pinto – Examinadora
Escola Superior da Magistratura do Estado do Rio Grande do Norte
6
7
A Deus, por ter me guiado até aqui
e revelado o caminho pelo qual
deveria andar;
A minha mãe, que mesmo
nascendo em uma casa de taipa e
tendo que conciliar os estudos com
o trabalho, venceu na vida e pôde
investir em meus estudos;
A Juliane Assunção Paiva, pelo
grande apoio e auxílio, sem os
quais este trabalho
indubitavelmente não seria o
mesmo;
Ao Juiz Federal Marco Bruno
Miranda Clementino e a todos os
servidores da 6ª (sexta) Vara
Federal, pela confiança, torcida e,
sobretudo, lições de vida e de
Direito;
A Aparecida, pela amizade,
disponibilidade e grande atenção
despendidas em meus pequenos
ensaios jurídicos.
A minha querida avó Mary Almeida
de Lima;
Ao meu orientador, Ministro do
Superior Tribunal de Justiça e
professor doutor Luiz Alberto
Gurgel de Faria, pelo exemplo de
responsabilidade e pela
disponibilidade, solicitude e
confiança projetadas neste trabalho
monográfico.
8
AGRADECIMENTOS
A Deus, por nunca ter se esquecido de mim e sempre ter preparado
minha trajetória até aqui.
A minha mãe, Vera Lúcia Gurgel da Costa, que nunca mediu esforços
em me incentivar e investir nos meus estudos.
A Juliane Assunção Paiva, pelo carinho, paciência, amor e apoio
incondicionais.
Ao professor Doutor Marco Bruno Miranda Clementino pela confiança
e apoio durante minha formação acadêmica e profissional, em nome de quem
estendo minha gratidão a todos os servidores da secretaria da 6º Vara Federal
pela receptividade e votos de sucesso.
Ao professor Dr. Iur. Leonardo Martins, pelas preciosas lições sobre
direitos fundamentais.
A Maria Aparecida Bonfim Fernandes, pela solicitude com a qual se
dispôs a corrigir minhas minutas mais elaboradas de estagiário e,
recentemente, o presente ensaio monográfico.
A Valter Lázaro, Mariana Lustosa, Nádia Cortez e todos os que
compuseram o gabinete da 6ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio Grande
do Norte por terem contribuído na minha eterna jornada de aprendizado
jurídico.
A minha avó Mary Almeida de Lima pela motivação, confiança e grande
torcida.
A meu amigo de infância Daniel Maia, pelos incentivos, confiança,
torcida e valioso apoio que transcendem a academia jurídica. Verdadeiramente,
um amigo mais chegado que irmão!
9
Aos meus amigos Túlio Jales e Geailson Soares Pereira, pelos
diálogos jurídicos e exemplos de vida.
Ao escritório Seabra de Moura Advogados Associados, pelo apoio e
disponibilização da infraestrutura e acervo bibliográfico necessários na
finalização deste trabalho acadêmico.
Aos amigos conquistados durante esse período: colegas de curso,
coordenação, administração e demais professores da graduação.
Por fim agradeço a todos que ajudaram direta ou indiretamente na
elaboração deste trabalho.
10
“A segurança jurídica é um daqueles
objetivos maiores do Direito, que,
abstratamente, a todos apela, mas
que a todos incomoda, no instante de
sua aplicação concreta. De início,
incomoda ao legislador, pois a função
legislativa contemporânea é
fragmentária, apressada e, muitas
vezes, atécnica, quando não caótica.
Incomoda ao administrador, pois a
velocidade do tráfego dos negócios
que devem ser regulados exige
atuação imediata e, amiúde, com
desvios radicais de rota e de ponto de
destino. Incomoda ao juiz, já que a
complexidade e a diversidade dos
conflitos, individuais e coletivos, estão
permanentemente conclamando-o a
explorar novos territórios na aplicação
da lei, o que leva, inexoravelmente, à
alteração das decisões e posições
jurisprudenciais consolidadas.
Finalmente, incomoda à doutrina e
aos próprios jurisdicionados que, ora
festejam inovações judiciais em temas
polêmicos, ora criticam o
conservadorismo do magistrado,
quando esse se apega aos
precedentes e à letra da lei.”.
(Herman Benjamin).
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RESUMO
O presente trabalho tece uma análise geral do processo de execução, a partir de seu conceito, finalidade, evolução histórica, princípios e espécies. Aborda a origem, generalidades e especificidades do processo de execução fiscal. Estuda as fraudes do devedor, notadamente, a fraude contra credores e a fraude à execução. Elucida as diferenças entre a natureza jurídica e reflexos das diferentes espécies dessas fraudes. Expõe as peculiaridades da fraude à execução fiscal, a depender do crédito exequendo, e analisa a evolução de sua interpretação jurisprudencial, tomando como marco o Recurso Especial Representativo de Controvérsia 1.141.990/PR, julgado nos termos do artigo 543-C, do Código de Processo Civil. Explica o efeito vinculante dos precedentes judiciais a partir das evoluções legislativas do direito processual civil. Analisa os limites e conformações de sua aplicação à luz do princípio constitucional da segurança jurídica. Demonstra os problemas e interesses a serem ponderados na interpretação do instituto processual da fraude à execução fiscal de dívidas tributárias. Revela a necessidade de a interpretação da fraude à execução fiscal tributária observar o mesmo regime jurídico aplicável à retroatividade normativa. Defende a manutenção da eficácia dos negócios jurídicos celebrados ao tempo em que a súmula de n.º 375, do Superior Tribunal de Justiça era pacificamente aplicada à fraude à execução fiscal de créditos de natureza tributária, tanto na redação original do artigo 185, do Código Tributário Nacional, quanto em sua atual redação, dada pela Lei Complementar 118/2005. Traça limites temporais para uma adequada interpretação jurídica da fraude à execução fiscal tributária. Conclui que às alterações jurisprudenciais de interpretações jurídicas já consolidadas e que induziram legítima e essencial confiança para a criação, modificação ou extinção de relações jurídicas - como a que se procedeu no Recurso Especial Repetitivo 1.141.990/PR - deve-se aplicar a modulação dos efeitos, atribuindo-lhes, a priori, efeitos puramente prospectivos.
Palavras-chave: Processo de execução fiscal. Fraudes do devedor. Fraude à execução fiscal tributária. Precedentes judiciais. Segurança jurídica. Modulação dos efeitos.
12
ABSTRACT
The current work consists in a general analysis of the enforcement process,
starting from its concept, purpose, historical evolution, principles and kinds. It
approaches the origin, generalities and specificities of the tax enforcement
process. This paper studies defaulters’ frauds, specially the one against lenders
and fraud of tax enforcement. The differences of the legal character and the
reflexes of the different kinds of these frauds are also mentioned. Furthermore,
it shows the peculiarities of the fraud enforcement, depending on the enforced
credit, and analyses the evolution of its judicial interpretation, taking as starting
point the Special Controversy Representative Appeal 1.141.990/PR, judged in
terms of the article 543-C, that is in the Code of Civil Procedure. This work also
explains the binding effect of the judicial precedents beginning from the
legislative evolutions of the civil procedural law. It analyses the limits and
conformations in light of the constitutional principle of judicial security.
Moreover, the presented paper demonstrates the problems and interests that
should be weighted up in the interpretation of the procedural institute of the
fraud of tax enforcement in regards to tax debts. It reveals the need of the
interpretation of the fraud of tax enforcement in observing the same legal
regime applicable to law retroactivity. This paper also defends the maintenance
of the legal transactions’ efficacy that happened in the time when the National
Tax Code’s docket nº 375 was peacefully applied to fraud of tax enforcement of
tax credits, in its original text of the National Tax Code’s 185th article and in its
current form, given by the Supplemental Law 118/2005. This dissertation also
gives temporal limits for an adequate juridical interpretation of the fraud of tax
enforcement. It concludes that to the jurisprudence alterations of juridical
interpretations already consolidated and that caused legitimate and essential
confidence for its creation, modification or extinction of juridical relations – as
the one in Repetitive Special Feature 1.141.990/PR – should apply the
modulation of the effects, giving them, at first, purely prospective effects.
Keywords: Tax enforcement process. Defaulter’s fraud. Fraud of tax
enforcement. Judicial precedents. Legal certainty. Modulation of the effects.
13
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO..............................................................................................................14
2 GENERALIDADES SOBRE O PROCESSO DE EXECUÇÃO...............................17
2.1 Conceito e finalidade......................................................................................................17
2.2 Origem e evolução histórica..........................................................................................19
2.3 Princípios..... ...................................................................................................................22
2.4 Espécies............................................................................................................................27
2.5 O processo de execução fiscal........................................................................................33
2.5.1 Considerações gerais........................................................................................................33
2.5.2 Especificidades.................................................................................................................36
3 AS FRAUDES DO DEVEDOR: FRAUDE CONTRA CREDORES E FRAUDE À
EXECUÇÃO...................................................................................................................40
3.1 Fraude contra credores..................................................................................................40
3.2 Fraude à execução..........................................................................................................42
3.3 A fraude à execução fiscal..............................................................................................48
3.3.1 Fraude à execução fiscal de créditos de natureza não tributária......................................49
3.3.2 Fraude à execução fiscal de créditos de natureza tributária.............................................50
3.3.2.1 Antes do REsp 1.141.990/PR...........................................................................................53
3.3.2.2 Depois do REsp 1.141.990/PR.........................................................................................55
4
4.1
4.2
4.3
4.4
5
A SEGURANÇA JURÍDICA NA APLICAÇÃO DO RESP 1.141.990/PR...............60
O efeito vinculante dos precedentes judiciais..............................................................60
Os recursos repetitivos...................................................................................................70
A segurança jurídica e a mudança jurisprudencial....................................................73
A aplicação (ir)retroativa do REsp 1.141.990/PR.......................................................92
CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................96
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................99
14
1 - INTRODUÇÃO
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), através de sua Primeira Seção, ao julgar
o Recurso Especial Representativo de Controvérsia n.º 1.141.990/PR1, firmou o novo
entendimento de que a aplicação de sua súmula de n.º 375 deveria ser afastada, pelo
critério da especialidade, para se interpretar o artigo 185 do Código Tributário Nacional
de modo objetivo, atribuindo presunção iure et iure de fraude à execução quando se
tratar de execuções fiscais de dívida tributária.
Em suas razões de decidir, ao ponderar que o processo de execução fiscal de
créditos tributários é o legítimo meio pelo qual uma pessoa jurídica de direito público
busca a satisfação de um crédito destinado ao atendimento das necessidades públicas, o
referido Órgão Jurisdicional (re)interpretou o artigo 185 do Código Tributário Nacional,
para assentar que a fraude à execução fiscal tributária se opera in re ipsa, sendo
constatada de modo objetivo, sem necessidade de se identificar o consilium fraudis.
A partir de então, considerando a vinculação decorrente desse entendimento
firmado na sistemática dos recursos repetitivos, pelo rito do artigo 543-C do Código de
Processo Civil e a partir das (novas) premissas estabelecidas, os juízes e tribunais
passaram a declarar a ineficácia dos negócios jurídicos de modo objetivo e absoluto,
sem abrir espaço para discussões acerca da boa-fé do adquirente ou dos reflexos na
eficácia de negócios jurídicos celebrados antes da alteração jurisprudencial ocorrida.
Sucede, todavia, que até o julgamento do paradigmático recurso repetitivo,
restava pacífica e inequivocamente assentado que, mesmo para negócios jurídicos
celebrados após o início da vigência da nova redação do artigo 185 do Código
Tributário Nacional, dada pela Lei Complementar n.º 118/2005, aplicava-se à espécie a
súmula nº 375, do Superior Tribunal de Justiça, não bastando a mera constatação da
alienação de bens ou rendas capaz de frustrar a satisfação do débito previamente inscrito
em Dívida Ativa2, para que se presumisse, de modo absoluto, a configuração de fraude à
execução.
1 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial Representativo de Controvérsia n.º 1.141.990.
Primeira Seção. Relator: Ministro Luiz Fux. Brasília, DF, 10 de novembro de 2010. Diário de Justiça
Eletrônico. Brasília, 19 nov. 2010, v. 907, p. 583. 2 Nos termos do art. 39, §2º, da Lei 4.320/1964, “Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública
dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e
Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de
empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multa de qualquer origem ou natureza,
exceto as tributárias, foros, laudêmios, alugueis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de
serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos
15
Com efeito, os precedentes do Superior Tribunal de Justiça3 revelam que sua
jurisprudência se consolidou no sentido de decidir pela imprescindibilidade do registro
da constrição judicial, ou prova da ciência, por parte do adquirente, do trâmite da
execução fiscal, para que se presumisse a má-fé ou se comprovasse o consilium fraudis
e, consequentemente, pudesse incidir a moldura legal da fraude à execução em todos os
seus efeitos.
No entanto, a partir das (novas) premissas estabelecidas pela Primeira Seção do
Superior Tribunal de Justiça - de que basta(ria) a constatação da alienação de bens ou
rendas capaz de comprometer a satisfação de débito previamente inscrito em dívida
ativa ou em fase de execução, a depender da redação vigente à época da celebração do
negócio jurídico – o Poder Judiciário passou a declarar a ineficácia relativa dos bens ou
direitos negociados em momento anterior à própria alteração jurisprudencial, ao passo
que os Tribunais de instância ordinária e o Superior Tribunal de Justiça começaram a
reformar as decisões ou sentenças em conflito com o novo parâmetro interpretativo.
Neste contexto, fazem-se necessários dois questionamentos.
Primeiramente, Ao se declarar a ineficácia dos negócios jurídicos havidos em
fraude à execução fiscal sem se perquirir acerca da boa-fé do adquirente e das nuances
do caso concreto, não se estaria descurando dos efeitos jurídicos deletérios à eficácia
dos negócios jurídicos celebrados em conformidade com o entendimento jurisprudencial
até então vigente?
Em segundo lugar, não se olvidando que o Superior Tribunal de Justiça,
quando da vigência da redação anterior do artigo 185 do CTN, sempre decidiu
diferentemente, assentando ser indispensável o registro da penhora ou prova da má-fé, e
que, inclusive, que dentre os precedentes que ensejaram a edição da súmula n.º 375,
alguns tinham por objeto justamente a fraude à execução fiscal tributária, aplicar o novo
entendimento do referido Recurso Especial aos negócios jurídicos anteriores à sua
vigência não macularia a segurança jurídica?
responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda
estrangeira, de subrogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras
obrigações legais.” 3(REsp 865.974/RS. Primeira Turma. Relator: Min. Teori Albino Zavascki. DJe 10.09.2008); (REsp
810.170/RS. Segunda Turma. Relator: Min. Mauro Campbell Marques. DJe 26.08.2008); (AgRg no REsp
1046004⁄MT. Segunda Turma. Relator: Min. Humberto Martins. DJe 23.06.2008); (AgRg no EREsp
719.949-RS. Segunda Seção. Relator: Min. Fernando Gonçalves. DJ 08.11.2007).
16
Diante dessas problematizações atinentes aos limites e conformações da nova
interpretação jurídica do paradigma estudado à luz do princípio constitucional da
segurança jurídica é que o presente trabalho acadêmico se desenvolverá.
Será a partir da evolução legislativa procedida na esfera do processo civil
brasileiro, que o aproximou da lógica processual do common law ao conferir crescente
importância para os precedentes judiciais, que se analisará o cabimento da modulação
dos efeitos à nova interpretação jurisprudencial do artigo 185 do Código Tributário
Nacional, de modo a harmonizá-la com o mandamento constitucional da segurança
jurídica.
Para cumprir a proposta desse trabalho, o primeiro capítulo tratará noções
gerais sobre o processo de execução, especialmente a partir de seu conceito e finalidade,
origem e evolução histórica, princípios e espécies. O segundo capítulo tecerá
considerações acerca das generalidades e especificidades do processo de execução
fiscal. O terceiro capítulo se ocupará do estudo das fraudes do devedor, sobretudo da
análise do instituto material da fraude contra credores até a fraude à execução fiscal
tributária e sua nova tendência interpretativa adotada na jurisprudência. O quarto
capítulo esmiuçará a fraude à execução fiscal tributária e não tributária, assentando o
regime jurídico aplicável e interpretação jurisprudencial vigente. E o quinto capítulo
analisará a evolução legislativa no processo civil para, a partir da eficácia dos
precedentes judiciais, observar a segurança jurídica nos efeitos da mudança
jurisprudencial nos recursos repetitivos e o seu desdobramento na modulação dos
efeitos do Recurso Especial Representativo de Controvérsia 1.141.990/PR.
O método utilizado para a obtenção de informações consistiu nas pesquisas
legislativa, jurisprudencial e doutrinária, no âmbito do Direito Constitucional,
Tributário e Processual Civil.
17
2 GENERALIDADES SOBRE O PROCESSO DE EXECUÇÃO
O estudo do direito e sua precisa aplicação dependem, para que se atinjam os
fins desejados, da adoção de certos “pontos de partida”, premissas fundamentais e
noções propedêuticas. Portanto, para o regular e satisfatório desenvolvimento do
presente trabalho acadêmico, fazem-se necessárias algumas digressões iniciais.
2.1 Conceito e finalidade
O processo de execução pode ser definido como o conjunto de atos judiciais
deflagrados a partir da propositura de uma ação autônoma ou do início de uma nova
fase procedimental e através do qual o Estado, sub-rogando-se no interesse do credor e
aplicando medidas coativas contra a vontade do executado, busca satisfazer determinada
pretensão jurídica do exequente em conformidade com o direito.
No ordenamento jurídico pátrio, o processo executivo é o meio legítimo - e via
de regra exclusivo4 - pelo qual o credor deve, dentro das balizas legais e sob o controle
do Estado-Juiz, satisfazer suas pretensões relativas ao inadimplemento de obrigações de
dar, fazer, não fazer ou pagar quantia certa aquilatadas em títulos executivos judiciais
(artigo 475-N, do CPC5) ou extrajudiciais (artigo 585, do CPC
6).
4 A despeito de ser taxativo o rol estabelecido pelo artigo 92, da Constituição Federal, de órgãos e
organismos autorizados ao imperativo exercício da jurisdição, subsistem, em nosso ordenamento jurídico,
como exceção, hipóteses de execuções extrajudiciais, como aquelas “instituídas em favor do Banco
Nacional da Habitação e das entidades ligadas ao Sistema Financeiro de Habitação;”, e a que a Lei dos
Condomínios e Incorporações disciplina nas incorporações a preço de custo (DINAMARCO, 2009, p.
65). 5 “Art. 475-N. São títulos executivos judiciais: I – a sentença proferida no processo civil que reconheça a
existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar quantia; II – a sentença penal
condenatória transitada em julgado; III – a sentença homologatória de conciliação ou de transação, ainda
que inclua matéria não posta em juízo; IV – a sentença arbitral; V – o acordo extrajudicial, de qualquer
natureza, homologado judicialmente; VI – a sentença estrangeira, homologada pelo Superior Tribunal de
Justiça; VII – o formal e a certidão de partilha, exclusivamente em relação ao inventariante, aos herdeiros
e aos sucessores a título singular ou universal.” 6 “Art. 585. São títulos executivos extrajudiciais: I - a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a
debênture e o cheque; II - a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o
documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas; o instrumento de transação
referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores; III - os
contratos garantidos por hipoteca, penhor, anticrese e caução, bem como os de seguro de vida; IV - o
crédito decorrente de foro e laudêmio; V - o crédito, documentalmente comprovado, decorrente de
aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, tais como taxas e despesas de condomínio; VI - o
crédito de serventuário de justiça, de perito, de intérprete, ou de tradutor, quando as custas, emolumentos
ou honorários forem aprovados por decisão judicial; VII - a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública
da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, correspondente aos créditos
18
Ao se analisar o Código de Processo Civil vigente, percebe-se que, ao lado do
processo de conhecimento e do processo cautelar, o processo de execução se projeta
como uma das espécies autônomas de tutela jurisdicional dotada de regras, princípios e
lógica própria, em virtude de seus objetivos e procedimentos específicos, mas que, à
similitude das mencionadas espécies, destina-se à pacificação social.
Conquanto as mencionadas espécies de tutela jurisdicional tenham âmbitos de
abrangência distintos e, por muito tempo, segregados, todas devem ser consideradas
como facetas de uma necessária atuação jurisdicional do Estado. Afinal, como se
resguardará o direito material sem as medidas acautelatórias pertinentes, quando
necessário for? Que serventia haverá em um provimento judicial condenatório ou título
extrajudicial a ele equiparado sem posterior execução? Em verdade, não há pacificação
social ou prevalência do interesse público se a aplicação do direito objetivo ao caso
concreto for despida de utilidade e efetividade.
Digno de menção é o posicionamento de Cândido Rangel Dinamarco (2009, p.
55), segundo o qual:
É jurisdicional a tutela oferecida mediante a execução forçada e também
jurisdicionais as próprias atividades do juiz que a comanda – quer se trate de
execução realizada em processo autônomo, quer mediante mera fase
executiva, quer com preponderância de medidas de sub-rogação, quer de
medidas coercitivas. O resultado institucional desse processo (satisfação do
credor) constitui um modo de pacificar as pessoas envolvidas em crises de
adimplemento, eliminando os conflitos pendentes entre elas – o que é
inerente à função jurisdicional.
Contudo, o monopólio estatal da jurisdição e dos meios coercitivos legais que
lhes são inerentes nos moldes atualmente conhecidos não é uma experiência antiga. Ao
revés, é fruto de uma longa evolução histórica que substituiu gradativamente a justiça
privada e o exercício arbitrário das razões pessoais pela precedência da “vontade da lei”.
Embora o direito e a sociedade nutram uma relação vital de interdependência
(“ubi societas ibi ius”), não é certo dizer que este permaneceu imutável ou hermético à
realidade social. Antes, o direito é fato social e histórico (REALE, 2002), produto
cultural de interesses politicamente eleitos (CLEMENTINO, 2006) e, sob essa ótica,
inconstante, mutável e relativo, motivo pelo qual, nesse estudo monográfico, deve-se
atentar, inicialmente, à evolução dos meios de satisfação dos créditos em algumas
sociedades.
inscritos na forma da lei; VIII - todos os demais títulos a que, por disposição expressa, a lei atribuir força
executiva.”.
19
2.2 Origem e evolução
No direito romano, a execução de determinado débito deveria ser precedida e
lastreada por uma sentença condenatória em face do devedor, com vistas a resguardar os
particulares de constrangimentos por dívidas incertas. Afinal, naquela quadra histórica,
em princípio a própria pessoa do devedor poderia se tornar meio ou objeto de satisfação
de eventuais créditos, sendo apoderada pelo devedor a partir da manus iniecctio.
No período arcaico7, em que vigorou o sistema processual das legis actionis,
após o julgado ser proferido, ao devedor era concedido o prazo de 30 (trinta) dias para
adimplir a obrigação aquilatada na condenação, em conformidade com a lei das XII
Tábuas. Mas, nas ocasiões em que este não satisfizesse seu débito, o credor poderia
conduzi-lo a juízo para que pagasse a importância devida ou oferecesse um vindex,
espécie de fiador (MENDES, A., 2009).
Na hipótese de o devedor não proceder nenhuma dessas duas medidas iniciais,
o magistrado autorizava o devedor “(...) a lançar-lhe a mão (manus iniectio) e encarcera-
lo”, como explica Moacyr Amaral Santos (2011, p. 266).
Após esse procedimento, o credor deveria “(...) apregoar o prisioneiro em três
feiras, de nove em nove dias, visando a obter o seu resgate, pelo valor correspondente à
condenação e, quando ninguém se dispusesse, vendê-lo fora da cidade ou mesmo matá-
lo.” (SANTOS, 2011, p. 266), sendo certo ainda que, na hipótese de haverem múltiplos
credores, o corpo do devedor seria esquartejado e dividido (MENDES, A., 2009).
Desse modo, por um longo período de tempo, a manus iniectio perdurou como
instrumento de execução, permanecendo a própria pessoa do devedor como garantia
para o credor. A pessoa humana era subjugada e “coisificada” em virtude de uma
obrigação econômica inadimplida.
Após a Lei das XII Tábuas, com o advento da Lei Poetelia, ampliaram-se os
casos abarcados pela manus iniectio, mas, por outro lado, estabeleceu-se que, nos casos
em que o devedor não fosse arrematado ou resgatado, seria adjudicado ao credor para
que seus débitos fossem pagos com o produto de seu trabalho. De todo modo, esta
realidade processual ainda se encontrava distante de um sistema jurídico hoje concebido
7 O processo civil romano vivenciou três sistemas, que foram o das legis actiones, o das formulae e o da
cognitio extra ordinem, situados, respectivamente, nos períodos que a história interna designou como pré-
clássico, clássico e pós-clássico (MENDES, A., 2009).
20
como racionalmente adequado à valorização constitucional da pessoa humana e
embasada na responsabilidade patrimonial (artigo 591, do CPC8).
No período clássico, do processo formulário, após o trintídio acima explicado,
caso o devedor não satisfizesse voluntariamente o crédito existente, o credor deveria
propor a actio iudicati, através da qual requereria a execução pela manus iniectio ou
pela pignoris capio, ocasião em que os bens do devedor seriam vendidos em praça
pública (bonorum venditio) e o resultado das negociações aprouveria ao credor. Por
outro lado, caso o devedor impugnasse a ação executiva, redigia-se a fórmula, que era
entregue às partes (litiscontestatio) e inaugurava-se o procedimento in iudicium
(SANTOS, 2011).
Por fim, no período pós-clássico, sob a égide do regime da cognitio extra
ordinem, apenas os bens suficientes para a satisfação da condenação eram constrangidos
para a satisfação do débito. E desse modo, progressivamente o direito foi evoluindo,
assemelhando-se aos contornos executivos atuais e suplantando o caráter pessoal da
execução pela patrimonialidade.
Após a queda de Roma, o processo executivo germano-barbárico passou a
divergir consideravelmente do romano.
Enquanto no sistema romano protegia-se o devedor, que somente podia ser
executado quando plenamente convencido da sua obrigação e com
fundamento em sentença condenatória, no sistema germânico, considerado o
inadimplemento da obrigação como ofensa à pessoa do credor, era este, sem
dependência de qualquer autoridade, a quem não precisava dirigir-se,
autorizado a penhorar, mesmo usando das próprias forças, os bens do devedor
a fim de pagar-se ou constrangê-lo ao pagamento. (SANTOS, 2011, p. 268).
Com o passar do tempo, a penhora passou a depender de prévia autorização
judicial. Todavia, esta se adstringia ao exame das formalidades do pedido, e não da
regularidade e validade da relação obrigacional (MARINONI; ARENHART, 2010).
Já na Idade Média, os juristas combinaram o sistema de execução romano com
o germânico, criando o procedimento per officium iudicis. Reconheceu-se o requisito da
prévia condenação como pressuposto para uma execução legítima, ao passo que se
dispensou a actio iudicati, em homenagem à celeridade da execução no sistema
germano-barbárico (MARINONI; ARENHART, 2010).
Após a sentença, a requerimento do credor se iniciava um novo processo, no
8 “Art. 591. O devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens
presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei.”
21
qual se observava uma execução aparelhada (executionem paratam) pelos poderes
executórios do juiz, com vistas a realizar a pretensão reconhecida por decisão judicial.
Com o desenvolvimento comercial e sua dinâmica, surgiu a necessidade de
uma célere satisfação de determinados créditos. Assim, passou-se a estender a eficácia
executiva própria das sentenças condenatórias para certos instrumentos de dívida
reconhecidos e lavrados perante tabelião (instrumenta guarentegiata) e se criou, ao lado
da execução aparelhada, um outro processo executivo, para estes novos títulos
executivos extrajudiciais, reservando-se a actio iudicati para situações excepcionais,
como a liquidação de sentença (SANTOS, 2011).
Em outros termos,
Com o passar do tempo e a sofisticação das relações comerciais, novos
documentos foram qualificados como títulos executivos extrajudiciais,
sempre com o objetivo de facilitar a execução, tornando-a algo que, ao invés
de se basear em uma declaração judicial posterior à verificação do direito,
fundava-se apenas em um documento que, visto em abstrato (letra de câmbio,
nota promissória etc.), era suficiente para fazer crer que existia um direito de
crédito (MARINONI; ARENHART, 2010, p. 30).
No regime das Ordenações do velho direito português, continuou-se a
disciplinar os três mencionados procedimentos, a saber, a actio iudicati para situações
nas quais ainda não havia condenação, a execução de sentença e a ação executiva, esta
última fundada em créditos do fisco e outros créditos privilegiados (SANTOS, 2011).
Já na realidade jurídica brasileira, o Código de Processo Civil de 1939
preservou tão somente a execução de sentença e incluiu a ação executiva, fundada em
créditos aos quais a lei atribui eficácia executiva, entre as ações especiais (SANTOS,
2011).
Por fim, o Código de Processo Civil vigente, após as reformas introduzidas
pelas Leis 11.232/2005 e 11.382/2006, trouxe uma nova sistemática, segundo a qual a
execução de sentença não mais se daria por um processo autônomo, mas por uma nova
fase procedimental, criando o que se denominou de processo sincrético. Aos títulos
executivos extrajudiciais, reservou-se o processo autônomo de execução.
Então, no atual estágio do direito objetivo brasileiro, a partir do
descumprimento de uma obrigação certa, líquida e exigível (artigo 580, do CPC9),
9 “Art. 580. A execução pode ser instaurada caso o devedor não satisfaça a obrigação certa, líquida e
exigível, consubstanciada em título executivo.”
22
circunscrita a um título executivo, chancela-se ao credor o direito de ajuizar uma
execução para provocar o Estado a empregar as medidas coativas necessárias à
satisfação do crédito existente.
Desse modo, ao contrário da sistemática executiva inicial do direito germano-
barbárico e seguindo a que na Idade Média se iniciou, para satisfazer seu direito
creditício, o credor deve provocar o Poder Judiciário para conferir efetividade ao título
executivo (SANTOS, 2011).
A partir do momento em que o Estado criminaliza o exercício arbitrário das
próprias razões (artigo 345 do Código Penal) e passa a monopolizar os meios legítimos
e racionais de execução, movendo o aparato estatal em face de um devedor e
independente de sua cooperação e vontade, uma série de princípios ganha relevo, tudo
com vistas a equacionar interesses e resguardar valores constitucionalmente assentados.
2.3 Princípios
Os princípios são fundamentos do próprio sistema e vetores interpretativos, que
irão contribuir para que a produção, interpretação e aplicação do direito objetivo ao caso
concreto se deem de modo preciso, adequado e acertado.
Como ramo do direito dotado de autonomia, o processo civil e, mais
especificamente, o processo de execução são dotados de princípios próprios, expressos
ou implícitos, normativos ou supralegais, inerentes à sua natureza e relevantes para a
correta compreensão e aplicação de seus instrumentos.
Inicialmente, deve-se atentar ao princípio da nulla executio sine titulo, nascido
nas concepções processuais liberais do final do século XIX, com vistas a debelar a
possibilidade de se deflagrar uma execução sem a certeza quanto à existência do direito,
como elucidam Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (2010).
Desse modo, reputa-se indispensável a existência de um título executivo para
lastrear uma execução, mas não apenas isso. Este título executivo deve se lograr dos
23
atributos da certeza10
, liquidez11
e exigibilidade12
, sob pena de a execução ser
considerada nula (artigos 58613
e 618, I14
, ambos do CPC).
No processo de execução, ao contrário do que se presencia nos processos
cautelar e de conhecimento, o demandado, doravante denominado executado, é sempre
colocado em uma situação de desvantagem processual e material.
Considerado como devedor na execução, sua citação não se dá com o fito de
ofertar contestação, reconvir, propor ação declaratória incidental, impugnar ou recorrer,
mas para cumprir uma obrigação a ele imputada. Caso se trate de processo autônomo de
execução, o prazo, em regra, será de 3 (três) dias, conforme prevê o artigo 652 do CPC.
Em se tratando de cumprimento de sentença, por seu turno, o prazo será de 15 (quinze)
dias, sob pena de multa, nos termos do artigo 475-J, do CPC15
.
Como se percebe, do ponto de vista processual, o executado já é tratado como
devedor e não é por outra razão que a execução se desenvolve no interesse do credor16
,
com atos materiais de restrição de direitos e constrição de bens, respeitadas as balizas
legais de ordem pública, tais como a impenhorabilidade, que adiante será retomada.
Portanto, para justificar este desnível entre as partes e legitimar os atos
executórios, exige-se o título executivo, que presumidamente comprova a existência de
uma pretensão creditício-executória digna de tutela e afasta os efeitos da revelia pela
ausência de impugnação do credor na ação incidental autônoma de embargos à
execução17
.
10
O atributo da certeza atine à existência da obrigação. 11
O atributo da liquidez diz respeito à determinação do quantum debeatur ou precisão do objeto
obrigacional. 12
O atributo da exigibilidade impõe a inexistência de termo, condição ou óbice à cobrança. 13
“Art. 586. A execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título de obrigação certa,
líquida e exigível.” 14
“Art. 618. É nula a execução: I - se o título executivo extrajudicial não corresponder a obrigação certa,
líquida e exigível (art. 586)” 15
“Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não
o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez
por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á
mandado de penhora e avaliação.” 16
Conforme o artigo 612, do CPC, “Ressalvado o caso de insolvência do devedor, em que tem lugar o
concurso universal (art. 751, III), realiza-se a execução no interesse do credor, que adquire, pela penhora,
o direito de preferência sobre os bens penhorados”. 17
“A não impugnação dos embargos do devedor não induz os efeitos da revelia, pois que, no processo de
execução, diferentemente do processo de conhecimento em que se busca a certeza do direito vindicado, o
direito do credor encontra-se consubstanciado no próprio título, que se reveste de presunção de
veracidade, até porque já anteriormente comprovado, cabendo, assim, ao embargante-executado o ônus
quanto à desconstituição da eficácia do título executivo” (STJ. REsp n.º 601.957/RJ. Relator: Ministro
Hamilton Carvalhido. Sexta Turma. Votação unânime. Julgado em 23 de agosto de 2005. DJe de
14/11/2005).
24
É o título executivo que irá qualificar as pessoas do credor e devedor,
fundamentar e delimitar o direito daquele e impondo ao Estado o dever de satisfazê-lo
mediante os atos processuais constritivos e expropriatórios necessários. Tais “(...)
atividades se voltam contra o executado, que não pode impedi-las, não lhe cabendo
senão o poder de exigir que se realizem na conformidade e nos limites da lei”
(SANTOS, 2011, p. 273).
Na esteira deste raciocínio, exsurge o princípio da nulla titulus sine lege,
segundo o qual o rol de títulos executivos deve ser interpretado restritivamente e
considerado exauriente, numerus clausus. Apenas a lei, enquanto manifestação do
estado democrático de direito, é que pode criar novas espécies de título executivo e
conferir-lhes eficácia executiva, tudo com vistas a legitimar as desvantagens processual
e material do executado no trâmite do processo executivo.
Uma vez proposta uma ação autônoma de execução fundada em título
executivo extrajudicial ou deflagrada a fase procedimental de cumprimento de sentença,
os atos executórios se assentarão no princípio da patrimonialidade, conforme já
mencionado. Encontrando-se positivado no artigo 591, do Código de Processo Civil, o
referido princípio não se restringe a determinar que os bens presentes e futuros do
devedor responderão pelo débito. Antes, é fruto de uma lenta e gradativa evolução
histórica que extirpou a morte e escravidão do devedor, transferindo a responsabilidade
pessoal e corpórea do devedor para o seu patrimônio.
No atual Estado Democrático de Direito, com a precedência normativa da
Constituição Federal, que se pauta no fundamento principiológico da dignidade da
pessoa humana (artigo 1º, caput e inciso III, da CF18
) e no respeito aos invioláveis
direitos fundamentais à vida e à liberdade (artigo 5º, caput, da CF19
), o processo de
execução deve recair sobre coisas, ao invés de “coisificar” a pessoa humana, vedando-se
a possibilidade de esta responder por seus débitos com o próprio corpo, liberdade, vida
e dignidade.
O patrimônio do devedor, portanto, passou a ter importância central para a
satisfação dos débitos havidos, a partir da tutela jurisdicional executiva. Em verdade, na
18
“Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e
do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] III – a
dignidade da pessoa humana”. 19
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.”
25
ausência de bens suficientes e hábeis para satisfazer a execução, quer por uma vida
financeiramente abastada do devedor ou pela adoção de medidas perniciosas, não
haverá efetividade do processo executivo lato sensu.
Indo além, no direito objetivo vigente, ainda que a execução seja norteada
pelos princípios da responsabilidade patrimonial e da disponibilidade20
, superou-se a
noção de vingança privada da execução, para que esta se desse na justa medida do
necessário para a satisfação do devedor. Só se procederão as expropriações necessárias
até o limite do valor da dívida.
Ademais, com vistas a resguardar a dignidade da pessoa humana e preservar-
lhe um patrimônio mínimo, o legislador instituiu um rol de impenhorabilidades, nos
termos do artigo 649, do Código de Processo Civil e da Lei do Bem de Família
(8.009/90), reconhecendo a prevalência de uma vivência minimamente digna do
devedor em detrimento do interesse patrimonial do credor, salvo raras exceções, como
no caso da execução de alimentos, que admite penhora de salário, inclusive com
desconto em folha, nos termos do artigo 734, do Código de Processo Civil.
Neste aspecto, cumpre informar, inclusive, que a Segunda Seção do Superior
Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do AgRg no EREsp 888.654/ES21
,
assentou que a impenhorabilidade do bem de família é irrenunciável, por ser matéria de
ordem pública.
Prosseguindo nessa tendência de racionalização do processo de execução e
vedação de seu emprego como instrumento de vingança privada pelo credor, positivou-
se, no artigo 620, do Código de Processo Civil22
, o princípio da menor onerosidade.
Com base neste princípio, passou-se a proibir os meios executivos que não
gerem a satisfação do débito, a exemplo da vedação ao emprego de atos executivos que
gerem pouca efetividade para muito prejuízo ao devedor, como na hipótese legal
contemplada no artigo 659, §2º, do CPC23
. Portanto, se houver diferentes meios de se
proceder à execução, escolher-se-á o menos oneroso.
20
Nos termos do artigo 569, caput, do CPC, “o credor tem a faculdade de desistir de toda a execução ou
de apenas algumas medidas executivas”. 21
“A proteção legal conferida ao bem de família pela Lei n.º 8.009/1990 não pode ser afastada por
renúncia do devedor ao privilégio, pois é princípio de ordem pública, prevalente sobre a vontade
manifestada” (STJ. AgRg no EREsp n.º888.654/ES. Segunda Seção. Relator: Min. João Otávio de
Noronha. Votação unânime. DJe de 18/03/2011). 22
“Art. 620. Quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça
pelo modo menos gravoso para o devedor.” 23
“Não se levará a efeito a penhora, quando evidente que o produto da execução dos bens encontrados
será totalmente absorvido pelo pagamento das custas da execução.”
26
Contudo, o princípio da menor onerosidade, conforme leciona Cândido Rangel
Dinamarco (2009), deve ser analisado em conjunto com o princípio da efetividade da
tutela executiva, não o precedendo in abstrato.
O princípio da efetividade na prestação da tutela jurisdicional, decorrente dos
princípios constitucionais da inafastabilidade da jurisdição, do devido processo legal e
da celeridade processual, impõe ao Estado, ao exercer o monopólio legítimo da
jurisdição e dos meios coativos, o dever de proceder de modo mais efetivo e adequado
na satisfação dos interesses dos jurisdicionados que lhes forem submetidos à apreciação,
independentemente da necessidade jurídica envolvida.
Conforme elucida Carlos Alberto Álvaro de Oliveira (2009, p. 87),
a efetividade está consagrada na Constituição Federal, art. 5º, XXXV, pois
não é suficiente tão-somente abrir a porta de entrada do Poder Judiciário, mas
prestar jurisdição tanto quanto possível eficiente, efetiva e justa, mediante um
processo sem dilações temporais ou formalismos excessivos, que conceda ao
vencedor no plano jurídico e social tudo a que faça jus.
Portanto, notadamente quando se trata de obrigações de pagar quantia certa,
cujo provimento judicial condenatório ou título executivo a ele equiparado não são auto
satisfativos - ao contrário das sentenças declaratórias e (des)constitutivas - impõe-se a
observância dos meios de execução como desdobramento lógico da efetiva e satisfatória
tutela do direito material.
Por fim, dentre os muitos outros princípios processuais, deve-se frisar o
princípio da boa-fé processual, que impõe aos integrantes da relação jurídico-processual
o dever de agir com lealdade, cooperação e integridade. A sua inobservância caracteriza
ato atentatório à dignidade da jurisdição (contempt of court) e enseja a cominação de
multas, nos termos dos artigos 14, parágrafo único, 601 e 538, parágrafo único, todos do
Código de Processo Civil.
Ao deduzir pretensões manifestamente infundadas, alegar informações
inverídicas, fraudar a execução e opor embargos de declaração com intuito meramente
protelatório, as partes processuais estão desrespeitando a própria atividade jurisdicional
do Estado, maculando o regular, devido e ideal trâmite processual e, por isso, merecem
reprimendas processuais sancionatórias próprias.
Para o processo de execução, especificamente, há disciplina legal para atos de
má-fé eventualmente praticados pela pessoa do executado com vistas a fraudar a
27
efetividade que deve se verificar nos atos executivos e, por conseguinte, frustrar a
legítima pretensão econômica do credor. A saber, nos termos do artigo 600, do CPC,
Art. 600. Considera-se atentatório à dignidade da Justiça o ato do executado
que:
I - frauda a execução;
II - se opõe maliciosamente à execução, empregando ardis e meios
artificiosos;
III - resiste injustificadamente às ordens judiciais;
IV - intimado, não indica ao juiz, em 5 (cinco) dias, quais são e onde se
encontram os bens sujeitos à penhora e seus respectivos valores.
Caso se verifique alguma dessas hipóteses, o executado que se imbuiu de má-fé
se sujeitará à sanção de até 20% (vinte por cento) do valor da causa, a depender da
intensidade de sua conduta perpetrada, nos termos do artigo 601, do Código de Processo
Civil.
Portanto, como se depreende da moldura legal transcrita, o instituto da fraude à
execução, objeto de análise da presente monografia e que será melhor trabalhada
posteriormente, enquadra-se como ato atentatório à dignidade da justiça, por não
frustrar apenas a legítima pretensão do credor, como também – e principalmente – o
respeito que o próprio Poder Judiciário deve lograr, motivo pelo qual além de sanção
processual, o legislador penal tipificou este ato de má-fé como crime (vide artigo 179,
do Código Penal).
2.4 Espécies
Como se viu na evolução histórica (vide item 2.2), o processo de execução, ao
longo do tempo, sempre foi sendo modelado a partir da realidade e das necessidades
sociais, conforme a cultura, valores e interesses envolvidos. Entretanto, tais
modificações e evoluções não ficaram adstritas ao decurso do tempo.
No direito processual civil brasileiro, a depender das situações jurídicas
substanciais envolvidas, constatam-se tratamentos normativos diferenciados, e é a partir
dessa noção que surgem os estudos doutrinários acerca das espécies de execução. Não
se pretende neste momento, todavia, tecer as minúcias nesta dogmática, mas assentar
novas premissas para a compreensão do trabalho, a partir de nuances objetivas e
subjetivas relevantes.
28
Assim como a dinâmica dos atos atentatórios à posse levou o legislador a
positivar o princípio da fungibilidade das ações possessórias24
e as peculiaridades da
Administração Pública levaram à criação de um conjunto de regras materiais e
processuais específicas - como as cláusulas exorbitantes, no âmbito dos contratos
administrativos, e a prerrogativa de intimação pessoal do representante da Fazenda
Pública25
, no ramo que a doutrina denomina de Direito Processual Público26
-, a origem
e espécie da obrigação exequenda, bem como a natureza dos créditos executados e os
atributos dos sujeitos da relação obrigacional demandaram tratamentos procedimentais
executivos diferenciados para as suas satisfações.
A saber, dentre as diversas classificações criadas pela doutrina, inicialmente
pode-se destacar a distinção entre a execução por processo autônomo e a execução por
fase procedimental.
A execução por processo autônomo se dá quando, pela origem do título
executivo ou faculdade legal conferida ao credor, este deva propor uma ação autônoma
para executar seus créditos. Sempre que se tratar de um Título Executivo Extrajudicial
(exs: cheque, contrato assinado por duas testemunhas, Certidão de Dívida Ativa, etc.)
sua execução se dará por processo autônomo, à similitude da execução da instrumenta
guarentegiata27
e da ação executiva fundada em créditos do fisco e outros créditos
privilegiados, na vigência das Ordenações do antigo direito português.
Sucede que, pelo fato de os títulos executivos extrajudiciais prescindirem de
ação condenatória prévia para lograrem de eficácia executiva, sendo equiparados, por
força de lei, a um título executivo judicial, a medida processual adequada e necessária
para a satisfação dos créditos neles consubstanciados é apenas a propositura de ação
executiva própria.
Em outros termos, não há interesse em deduzir uma pretensão condenatória
através da propositura de uma ação cognitiva própria, haja vista que os títulos
24
Preceitua o artigo 920, do Código de Processo Civil, que “A propositura de uma ação possessória em
vez de outra não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção correspondente àquela,
cujos requisitos estejam provados”. 25
Nos termos do artigo 25, da Lei 6.830/80, “Na execução fiscal, qualquer intimação ao representante
judicial da Fazenda Pública será feita pessoalmente”. O artigo 38, da Lei Complementar 70/93, por seu
turno, ampliou esta prerrogativa, ao estabelecer que “As intimações e notificação são feitas nas pessoas
do Advogado da União ou do Procurador da Fazenda Nacional que oficie nos respectivos autos”. 26
“A sistematização e o incremento das normas relativas à Fazenda Pública em Juízo vem ressaltando a
atenção de alguns estudiosos, que consideram, inclusive, já haver um regime próprio relativo ao tema,
denominando-o de Direito Processual Público”. (CUNHA, 2014, p. 11). 27
Como já explicitado no tópico 2.2, tratava-se de documento lavrado por tabelião ao qual se conferiu, no
contexto de desenvolvimento comercial, eficácia similar à de uma sentença condenatória.
29
executivos extrajudiciais, previstos taxativamente no artigo 585, do Código de Processo
Civil, têm por força de lei eficácia executiva análoga à de uma sentença condenatória.
Desse modo, proposta a ação autônoma de execução, o executado será citado para, no
prazo de 3 (três) dias, efetuar o pagamento da dívida (artigo 652, caput, do CPC) e/ou,
querendo, defender-se por meio da ação incidental autônoma de embargos à execução
(artigo 736 e seguintes, do CPC).
Durante certo período histórico, como já foi relatado, no ordenamento jurídico
brasileiro se exigia a propositura de uma nova ação para a execução das sentenças
condenatórias prolatadas em processos de conhecimento. Contudo, após a reforma
processual introduzida a partir da Lei 11.232/2005, estabeleceu-se uma nova
sistemática, segundo a qual, de regra, após o trânsito em julgado da sentença
condenatória e mediante requerimento do vencedor, instaura-se uma nova fase
procedimental, intimando-se a parte sucumbente na pessoa de seu advogado para, nos
termos do artigo 475-J, caput28
, do Código de Processo Civil, cumprir voluntariamente
a obrigação29
.
Assim, dentro desse fenômeno do sincretismo processual, a regra para a
execução de um título executivo judicial passou a ser a fase procedimental executiva de
cumprimento de sentença, nos termos do artigo 475-I, do Código de Processo Civil,
podendo o executado se defender através da impugnação ao cumprimento de sentença,
para a qual é imprescindível a garantia do juízo e cujo âmbito cognitivo se restringe ao
taxativo elenco do artigo 475-L, do mesmo diploma normativo, pelo fato de a questão
jurídica de fundo já ter sido apreciada pelo Poder Judiciário, atraindo o respeito
conferido ao atributo da coisa julgada material.
Quando o sujeito passivo da obrigação de pagar quantia certa for a Fazenda
Pública, entretanto, a execução se dará de forma especial, em atenção aos atributos da
impenhorabilidade e inalienabilidade dos bens públicos. A saber, observar-se-ão os
28
“Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no
prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e,
a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, experdir-se-á mandado
de penhora e avaliação”. 29
“O cumprimento da sentença não se efetiva de forma automática, ou seja, logo após o trânsito em
julgado da decisão. De acordo com o art. 475-J combinado com os arts. 475-B e 614, todos do CPC, cabe
ao credor o exercício de atos para o regular cumprimento da decisão condenatória, especialmente requerer
ao juízo que dê ciência ao devedor sobre o montante apurado, consoante memória de cálculo discriminada
e atualizada”. (STJ. REsp 940.274/MS. Corte Especial. Relator para acórdão: Min. João Otávio de
Noronha. DJe de 31/05/2010).
30
termos do artigo 73030
, do Código de Processo Civil e o adimplemento da obrigação de
pagar quantia certa se submeterá ao regime de precatórios ou requisição de pequeno
valor, previstos no artigo 100, da Constituição Federal.
Todavia, caso se trate de execução de obrigações de fazer, não fazer ou
entregar coisa, não haverá qualquer procedimento especial distinto para a Fazenda
Pública e particulares31
, casos nos quais se observarão as disposições dos artigos 461 e
461-A, ambos do Código de Processo Civil.
Desse modo, caso uma sentença condene a Fazenda Pública em obrigação de
fazer e de pagar quantia certa, o capítulo que a condenou na tutela específica será
executado nos termos do artigo 461, do Código de Processo Civil, ao passo que apenas
e tão somente o capítulo condenatório de obrigação de pagar quantia certa é que será
executado por processo autônomo.
Em se tratando de execução de alimentos, por seu turno, o credor terá a
faculdade de escolher entre a modalidade executiva cujo rito se encontra previsto no
artigo 732, do Código de Processo Civil, ou a execução especial insculpida no artigo
733, do mesmo diploma normativo, ocasião em que se deparará com única hipótese de
prisão civil por dívida atualmente admitida32
. Caso se escolha a primeira modalidade, a
execução se desenvolverá por fase procedimental, aplicando-se as regras comuns ao
30
“Art. 730. Na execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, citar-se-á a devedora para opor
embargos em 10 (dez) dias; se esta não os opuser, no prazo legal, observar-se-ão as seguintes regras: I - o
juiz requisitará o pagamento por intermédio do presidente do tribunal competente; II - far-se-á o
pagamento na ordem de apresentação do precatório e à conta do respectivo crédito.” 31
“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO
IMEDIATO DA DECISÃO JUDICIAL QUE DETERMINA A IMPLANTAÇÃO DE BENEFÍCIO
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL DO INS DESPROVIDO. 1. O julgamento que condena
o INSS ao pagamento de novo benefício ou à revisão da renda mensal do benefício já concedido
estabelece: a) uma obrigação de pagar, relative ao pagameno das parcelas vencidas, que será objeto de
execução autônoma, regulada pelo art. 730 do CPC; e b) uma obrigação de fazer, consistente na
determinação de implantação do benefício ou da nova renda mensal, regulada pelo art. 461 do CPC. 2.
Sendo a execução da parte da sentença que determina a implantação do benefício regulada pelo art. 461
do CPC, não há que se falar em execução provisória, como pretende o INSS. A partir do trânsito em
julgado da sentença, ou da admissão de recurso desprovido de efeito suspensivo, o juiz, de ofício ou a
requerimento da parte, determinará a intimação do réu para que cumpra, no prazo fixado pelo título
executive, a obrigação de implantar o benefício. 3. Agravo Regimental desprovido.”. (STJ. AgRg no
REsp 1.056.742/RS. Quinta Turma. Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Votação unânime.
Julgado em 14/09/2010. DJe de 11/10/2010). 32
O Supremo Tribunal Federal reconheceu o status hierárquico de norma supralegal ao Pacto de San José
da Costa Rica e, ao interpretar o artigo 7º, §7º, da referida Convenção, declarou a insubsistência da prisão
civil do depositário infiel. Em virtude disso, editou a Súmula Vinculante n.º 25, que declara, in verbis: “é
ilícita a prisão civil, qualquer que seja a modalidade de depósito”. Portanto, atualmente, apenas a prisão
civil do devedor de alimentos permanece válida. Para maiores aprofundamentos, vide os julgamentos do
Supremo Tribunal Federal nos RE n.º 349.703/RS, RE n.º 466.343/SP, HC n.º 87.585/TO e HC n.º
92.566/SP.
31
cumprimento de sentença. Entretanto, caso o credor opte pela segunda espécie
executiva, iniciar-se-á um processo autônomo de execução e com rito específico.
Tal distinção, por imposição do artigo 5º, LXVII33
, da Constituição Federal,
demonstra a excepcionalização da área de proteção do direito fundamental à liberdade
de locomoção (artigo 5º, caput e inciso XV, da CF) com vistas a resguardar a
subsistência minimamente digna e satisfatória dos alimentandos. Há, portanto, uma
adequação constitucional do processo civil em atenção aos interesses especificamente
envolvidos, diga-se, a maior relevância social do crédito perseguido.
De todo modo, independente da natureza da “crise de satisfação” do direito
material, observar-se-á o caráter substitutivo da jurisdição executiva, com vistas a
conferir efetividade às pretensões do exequente e, ao mesmo tempo, substituir a vontade
particular do executado pela vontade da lei, a partir da observância dos parâmetros
legais estabelecidos.
A esta atuação do Estado-Juiz na aplicação dos meios executivos que lhes são
disponibilizados, dentre os quais podem-se mencionar a busca e apreensão (artigos 461,
§5 e 461-A, §2º e 625, do CPC), penhora e expropriação (artigos 612, 646 e 647, do
CPC), dá-se o nome de execução por sub-rogação, por prescindirem da voluntariedade
do devedor.
Entretanto, ao lado desse caráter substitutivo comum a toda execução judicial,
com atos materiais de execução, incorporaram-se outras medidas executivas que
compõem o que se passou a denominar execução indireta. A saber, para a resolução da
crise de satisfação da relação obrigacional subjacente, o legislador também previu
mecanismos para compelir psicologicamente o devedor a, voluntariamente, adimplir a
sua obrigação.
As medidas de execução indireta, por seu turno, consistem em hipóteses de
piora da situação do devedor ou oferta de melhoras, a partir da projeção volitiva do
executado, sendo certo que, em um mesmo processo de execução, podem conviver
ambas as modalidades executivas, não havendo ordem abstrata de precedência.
A forma clássica dessa modalidade executiva é a possibilidade de piora da
situação do devedor, podendo ser dado, a título de exemplo, a cominação – inclusive de
33
“Não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e
inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel”.
32
ofício e em face da Fazenda Pública34
- de astreintes35
para aqueles que têm o dever
imediato de fazer ou não fazer determinado ato36
, nos termos do artigo 461, §4º, do
Código de Processo Civil37
, e a prisão civil do devedor de alimentos já mencionada
alhures.
Na execução judicial de uma obrigação de entregar coisa, o juízo tanto pode se
valer de execução indireta, através da aplicação de astreintes, como também determinar
atos materiais de execução por sub-rogação, tais como a busca e apreensão, quando o
objeto obrigacional mediato for um bem móvel, ou determinar a imissão na posse, caso
o objeto mediato do vínculo obrigacional seja um bem imóvel.
De igual modo, em se tratando de obrigação de fazer fungível, será lícito ao
juízo da execução, a requerimento do exequente/credor, determinar que um terceiro
satisfaça a prestação econômica à custa do executado, conforme estabelecido pelo
legislador no artigo 63438
, do Código de Processo Civil.
A multa de 10% (dez por cento) pelo inadimplemento voluntário na fase
procedimental executiva do cumprimento de sentença, prevista no artigo 475-J39
, do
Código de Processo Civil, contudo, é vista pela jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça como sanção processual, tendo, portanto, natureza diversa das astreintes.
Por fim, podem-se destacar a “sanção premial” prevista para a ação monitória,
segundo a qual se o réu cumprir a obrigação no prazo de 15 (quinze) dias, estará isento
do pagamento de custas e honorários advocatícios sucumbenciais, nos termos do artigo
34
“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIO. SERVIDOR CIVIL. REVISÃO DE PENSÃO.
OBRIGAÇÃO DE FAZER E ENTREGAR COISA. COMINAÇÃO DE MULTA DIÁRIA CONTRA A
FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido
de ser possível ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, fixar multa diária cominatória – astreintes -,
ainda que seja contra a Fazenda Pública, em caso de descumprimento de obrigação de fazer. Agravo
regimental improvido” (STJ. AgRg no AREsp 7.869/RS. Segunda Turma. Relator: Ministro Humberto
Martins. Votação unânime. Julgado em 09/08/2011. DJe de 17/08/2011). 35
Por ser uma forma de execução indireta, o FONAJE editou o enunciado cível n.º 144, segundo o qual
“a multa cominatória não fica limitada ao valor de 40 salários mínimos, embora deva ser razoavelmente
fixada pelo Juiz, obedecendo ao valor da obrigação principal, mais perdas e danos, atendidas as condições
econômicas do devedor”. 36
Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça (vide REsp 1.036.968/DF. Primeira Turma.
Relator: Ministro Teori Albino Zavascki), a multa cominatória diária ou periódica do artigo 461, do
Código de Processo Civil não se aplica às obrigações de pagar quantia certa. 37
“§ 4º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu,
independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe
prazo razoável para o cumprimento do preceito.” 38
“Art. 634. Se o fato puder ser prestado por terceiro, é lícito ao juiz, a requerimento do exeqüente,
decidir que aquele o realize à custa do executado.” 39
“Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não
o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez
por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á
mandado de penhora e avaliação.”
33
1.102-C, § 1º40
, do Código de Processo Civil, e a redução da verba honorária pela
metade, caso, no prazo de 3 (três) dias, o devedor solvente pague integralmente o débito
exequendo no processo autônomo de execução, nos termos do artigo 652-A, parágrafo
único41
, do Código de Processo Civil.
Ultrapassadas as digressões iniciais realizadas neste primeiro capítulo, passar-
se-á ao estudo do processo de execução fiscal, modalidade especial de processo
autônomo de execução de título executivo extrajudicial.
2.5 – A execução fiscal
2.5.1 – Considerações gerais
A execução fiscal pode ser conceituada como o processo autônomo de
execução vocacionado à satisfação dos créditos inscritos na dívida ativa da Fazenda
Pública, de natureza tributária (impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos
compulsórios ou contribuições especiais) ou não tributária (preços públicos, multas
administrativas, etc.), através das regras procedimentais especialmente estabelecidas
pela Lei 6.830/1980.
A Lei 6.830/1980, também conhecida como Lei de Execução Fiscal (LEF), foi
editada após a promulgação do Código de Processo Civil de 1973 com vistas a
estabelecer um mecanismo jurídico-processual diferenciado para a “cobrança judicial”42
da Dívida Ativa, imprimindo maior celeridade na tramitação processual e possibilitando
maior efetividade na consecução dos créditos da Fazenda Pública43
, cujo conceito
compreende União, Estados, Municípios, Autarquias e Fundações44
.
Por ser lastreada por um título executivo extrajudicial, a saber, a Certidão de
Dívida Ativa, a execução fiscal será sempre um processo autônomo de execução,
40
“§ 1o Cumprindo o réu o mandado, ficará isento de custas e honorários advocatícios.”
41 “No caso de integral pagamento no prazo de 3 (três) dias, a verba honorária será reduzida pela metade.”
42 A despeito de a Lei 6.830/1980 se referir ao termos “cobrança judicial”, “(...) não se refere à ação de
cobrança, como ação de conhecimento que busque a formação de um título executivo judicial
consubstanciado em sentença condenatória. Diferentemente, prevê a constituição, pela própria Fazenda
Pública, de um título executivo extrajudicial com suporte no qual venha, então, deduzir pretensão de
cobrança – no sentido de buscar a satisfação compulsória – do montante a ela devido, ou seja, de
execução”. (PAULSEN; ÁVILA; SLIWKA, p.145). 43
Nos termos do artigo 1º, da Lei de Execuções Fiscais (Lei n.º 6.830/1980), “A execução judicial para
cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas
autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil”. 44
“A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal equipara as fundações públicas a autarquias, por se
qualificarem como entidades governamentais dotadas de capacidade administrativa, integrantes da
Administração Pública descentralizada (...)”. (PAULSEN; ÁVILA; SLIWKA, p.147).
34
motivo pelo qual serão a ela aplicadas subsidiariamente as disposições do Código de
Processo Civil, sobretudo as relativas à execução dos títulos executivos extrajudiciais,
bem como também todo o regime principiológico (vide item 2.3). Afinal, na Exposição
de Motivos n.º 223 enviada para o Presidente da República, em 2 de junho de 1980,
consignou-se que
a par de não revogar as linhas gerais e a filosofia do Código, disciplina a
matéria no essencial, para assegurar não só os privilégios e garantias da
Fazenda Pública em juízo, como também a agilização e racionalização da
cobrança da dívida ativa.
Todavia, com vistas a precisar o regime jurídico aplicável às questões
incidentais ao rito específico em comento, deve-se atentar à natureza jurídica do crédito
exequendo, porquanto, não se olvidando que as regras e princípios processuais
abstraídos da Lei de Execuções Fiscais e do Código de Ritos pátrio, de regra, aplicar-se-
ão ao procedimento executivo dos créditos de ambas as naturezas (tributários e não
tributários), será o direito material que solucionará as questões atinentes à
responsabilização patrimonial secundária, à análise de eventuais matérias conhecidas de
ofício, arguidas por meio de exceção de pré-executividade ou ação autônoma e,
sobretudo, à aplicação do instituto processual denominado fraude à execução, que será
analisado com maior atenção nos próximos capítulos.
Inicialmente, pode-se destacar que, a despeito de a Súmula n.º 43545
, do
Superior Tribunal de Justiça, ter sido editada para conferir presunção de dissolução
irregular para fins de redirecionamento da execução fiscal tributária para os gestores da
pessoa jurídica inicialmente executada, nos termos do artigo 135, III, do Código
Tributário Nacional, recentemente a sua Primeira Seção estendeu, em sede de recurso
repetitivo, a legitimidade desse redirecionamento também para execuções fiscais não
tributárias, sob o fundamento de que “o suporte dado pelo artigo 135, III46
, do CTN, no
âmbito tributário é dado pelo art. 10, do Decreto n.º 3.078/19 e art. 158, da Lei n.º
6.404/78 – LSA no âmbito não-tributário, não havendo, em nenhum dos casos, a
45
“presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixa de funcionar no seu domicílio fiscal, sem
comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-
gerente”. 46
“Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias
resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: (...)
III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado”.
35
exigência de dolo” (STJ. REsp 1.371.128/RS. Primeira Seção. Relator: Ministro Mauro
Campbell Marques. Votação unânime. Julgado em 10 de/09/2014. DJe de 17/09/2014).
Prosseguindo, pode-se informar que, para as execuções de créditos de natureza
não tributária, a inscrição em Dívida Ativa implicará na suspensão do prazo
prescricional por 180 (cento e oitenta) dias, nos termos do artigo 2º, §3º47
, da Lei de
Execuções Fiscais. Tal suspensão, entretanto, não alcançará os créditos tributários, pelo
fato de as normas gerais tributárias demandarem uma produção legislativa qualificada,
através de lei complementar, conforme artigo 146, III48
, da Constituição Federal49
.
É, também, justamente com base nessa regra constitucional, segundo a qual as
normas gerais em direito tributário devem ser estabelecidas por Lei Complementar, que,
no conflito entre os artigos 45 e 46, da Lei 8.212/1991, e os artigos 173 e 174, do
Código Tributário Nacional, prevaleceu este diploma normativo, pela
inconstitucionalidade formal daquela lei ordinária ao estabelecer os prazos decadenciais
e prescricionais decenais para as contribuições previdenciárias50
.
Já em se tratando de cobrança da Taxa Anual por Hectare, cuja natureza
jurídica é de preço público, deve-se observar o prazo decadencial de 10 (dez) anos,
conforme a lei específica (Lei n.º 9.636/1998), ao passo que, para a pretensão
constitutiva do Fisco, observar-se-á a perda do direito potestativo de efetuar
validamente o lançamento fiscal após o transcurso do lustro decadencial (artigo 173,
caput, do CTN).
Por fim, ainda a título de exemplificação, no caso de cobrança judicial de multa
administrativa aplicada por autarquias para infrações praticadas em período anterior à
edição da Lei n.º 9.873/1999, que estabeleceu prazo prescricional para o exercício da
47
“A inscrição, que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, será feita pelo órgão
competente para apurar a liquidez e certeza do crédito e suspenderá a prescrição, para todos os efeitos de
direito, por 180 dias, ou até a distribuição da execução fiscal, se esta ocorrer antes de findo aquele prazo.” 48
“Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação
tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos
impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e
contribuintes; b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; c) adequado
tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas. 49
Nesse sentido, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento da Arguição de
Inconstitucionalidade no Ag 1.037/765/SP, sedimentou entendimento. A saber, asseverou-se que “são
ilegítimas, em relação aos créditos tributários, as normas estabelecidas no §2º, do art. 8º e do §3º do art. 2º
da Lei 6.830/80, que, por decorrerem de lei ordinária, não podiam dispor em contrários às disposições
anteriores, previstas em lei complementar”. (STJ. AI no Ag n.º 1.037.765/SP. Corte Especial. Relator:
Min. Teori Albino Zavascki. DJe de 17/10/2011). 50
Em sentido contrário, encontra-se o posicionamento de Roque Antônio Carraza (2007), segundo o qual
o conceito de normas gerais não abarcaria a chamada “economia interna”, englobando assuntos de
peculiar interesse dos entes políticos, como a própria fixação dos prazos prescricionais e decadenciais.
36
ação punitiva pela Administração Pública Federal, não se aplicarão as disposições do
Código Civil, mas sim o artigo 1º, do Decreto n.º 20.910/1932, por analogia e em
respeito ao princípio da simetria, dada a natureza administrativa da relação jurídica que
a originou.
2.5.2 – Especificidades
Adentrando nas especificidades procedimentais da execução fiscal, cabe trazer
o posicionamento de Humberto Theodoro Júnior (2007) que, ao se debruçar sobre a Lei
de Execução Fiscal, concluiu ter havido excessos na criação de privilégios por ele
considerados como “exagerados” e “injustificáveis” para a Fazenda Pública. Todavia,
por serem plenamente vigentes e constantemente aplicáveis, cabe mencionar algumas
peculiaridades legais conferidas a este feito executivo.
Tratando-se de modalidade executiva na qual pessoas jurídicas de direito
público se encontram na relação jurídico-processual, buscando a satisfação de seus
créditos, a Lei de Execução Fiscal concedeu-lhes a prerrogativa de intimação pessoal
dos atos processuais e atribuiu presunção iuris tantum de certeza e liquidez às Certidões
de Dívida Ativa51
- único título executivo extrajudicial, na realidade jurídica pátria,
“confeccionado unilateralmente pelo credor” (COSTA, 2009, p. 425) -, tornando-as, de
pronto, exigíveis judicialmente.
Não por outra razão é que, em se tratando de execução fiscal de créditos de
natureza tributária, quando o nome do sócio constar na Certidão de Dívida Ativa, deve-
se presumir a sua responsabilidade pelo débito encartado, nos termos do artigo 135, III,
do Código Tributário Nacional, conforme assentado pela Primeira Seção do Superior
Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento dos Embargos de Divergência no
Recurso Especial n.º 702.232/RS52
.
Prosseguindo no estudo das peculiaridades da execução fiscal, deve-se frisar
também que, com vistas a imprimir maior celeridade ao procedimento executivo, o
51
Nos termos do artigo 3º, da Lei de Execuções Fiscais, “a Dívida Ativa regularmente inscrita goza da
presunção de certeza e liquidez.”. 52
“Se a execução foi proposta contra a pessoa jurídica e contra o sócio-gerente, a este compete o ônus da
prova, já que a CDA goza de presunção relative de liquidez e certeza, nos termos do art. 204 do CTN c/c
o art. 3º da Lei n.º 6.830/80”. (STJ. EREsp n.º 702.232/RS. Primeira Seção. Relator: Ministro Castro
Meira. Primeira Seção. Votação unânime. Julgado em 14/09/2005. DJe de 26/09/2005).
37
legislador estabeleceu tratamento diferenciado para a citação, autorizando sua realização
via postal, a partir do serviço dos correios (artigo 8º, I53
, da Lei 6.830/1980).
Ademais, para os casos nos quais o trâmite processual não tenha sido efetivo
para localizar o devedor ou bens hábeis a satisfação da dívida executada, estabeleceu-se
a possibilidade de suspensão da execução pelo prazo de até 1 (um) ano para a realização
de diligências, sem importar na deflagração do prazo prescricional, conforme o artigo
4054
, do referido diploma normativo.
Assim como nos processos autônomos de execução, a defesa do executado na
execução fiscal será deduzida na ação de embargos à execução. Contudo, em atenção às
disposições específicas do artigo 16, § 1º55
, da Lei 6.830/1980, dever-se-á observar a
prévia garantia do juízo, como condição de procedibilidade, ao contrário do regime
geral estabelecido pelo Código de Processo Civil56
, que dispensa tal exigência.
A saber, a despeito das divergências doutrinárias existentes, a Primeira Seção
do Superior Tribunal de Justiça, para dirimir essa antinomia, aplicou o critério da
especialidade (lex especialis derrogat lex generalis) ao assentar, por ocasião do
julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia n.º 1.272.827/PE57
, que
a condição de procedibilidade específica do artigo 16, da Lei 6.830/80 deveria
prevalecer nas execuções fiscais. Por outro lado, porém, estabeleceu que a concessão de
efeito suspensivo à ação incidental autônoma em comento não seria automática, mas
sim ope judicis, motivo pelo qual se deveriam observar os requisitos do mencionado
artigo 739-A, §1º, do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente à questão.
De todo modo, à míngua de previsão legal expressa, doutrina e jurisprudência
pátrias delinearam hipóteses de cabimento do instrumento endoprocessual de defesa
denominado de exceção/objeção de pré-executividade, em atenção aos princípios
constitucionais da inafastabilidade da jurisdição (artigo 5º, XXXV, da CF), do
contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LV, da CF), de modo a harmonizá-lo com a
restrição cognitiva inerente à natureza dos processos de execução.
53
Nos termos do artigo 8º, I, da Lei de Execuções Fiscais, “a citação será feita pelo correio, com aviso de
recepção, se a Fazenda Pública não a requerer por outra forma”. 54
“O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens
sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição.” 55
“Não são admissíveis embargos do executado antes de garantida a execução.” 56
Nos termos do artigo 736, caput, do CPC, “O executado, independentemente de penhora, depósito ou
caução, poderá opor-se à execução por meio de embargos” (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006). 57
(STJ. REsp n.º 1.272.827/PE. Primeira Seção. Relator: Min. Mauro Campbell Marques. DJe de
31/05/2013).
38
A saber, não se olvidando que, nas execuções fiscais, as Certidões de Dívida
Ativa gozam de presunção legal de certeza e liquidez, o Superior Tribunal de Justiça, ao
editar a súmula n.º 393, assentou que “a exceção de pré-executividade é admissível na
execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício, que não demandem
dilação probatória”.
Em outros termos, passou-se a admitir o manejo da objeção de pré-
executividade para que os executados pudessem arguir matérias de ordem pública,
pressupostos processuais, manifesta ausência das condições da ação e vícios objetivos
do título executivo, enfim, matérias que pudessem ser conhecidas de plano pelo juiz
sem a necessidade de dilação probatória, para repelir eventual lesão ou ameaça de lesão
ao seu patrimônio jurídico de modo célere e econômico processualmente, sem, por outro
lado, prejudicar a efetividade e celeridade devidas na tutela jurisdicional executiva ao
presumidamente legítimo interesse econômico da Fazenda Pública.
Prosseguindo na análise do ordenamento jurídico pátrio, pode-se verificar a
criação de outros instrumentos finalisticamente projetados para assegurar desfecho
prático efetivo para os processos autônomos de execução judicial da Dívida Ativa da
Fazenda Pública, de natureza tributária ou não, como a medida cautelar fiscal, instituída
pela Lei 8.397/1992.
Através da ação cautelar fiscal, a Fazenda Pública poderá obter, através de
provimento jurisdicional, a decretação de indisponibilidade de bens e direitos dos
sujeitos passivos da obrigação tributária, até o limite de sua satisfação (artigo 4º, caput e
§1º, da Lei 8.397/1992), principalmente quando é evidenciada a projeção de condutas
aptas a frustrar o seu adimplemento (artigo 2º, I a IX, da Lei 8.397/199258
).
A despeito de haver posições doutrinárias contrárias à criação deste
instrumento processual, por já existir o procedimento específico para a execução fiscal,
nos moldes da Lei 6.830/1980, leciona Marco Bruno Miranda Clementino (2006, p.
58
“Art. 2º A medida cautelar fiscal poderá ser requerida contra o sujeito passivo de crédito tributário ou
não tributário, quando o devedor: I - sem domicílio certo, intenta ausentar-se ou alienar bens que possui
ou deixa de pagar a obrigação no prazo fixado; II - tendo domicílio certo, ausenta-se ou tenta se ausentar,
visando a elidir o adimplemento da obrigação; III - caindo em insolvência, aliena ou tenta alienar
bens; IV - contrai ou tenta contrair dívidas que comprometam a liquidez do seu patrimônio; V - notificado
pela Fazenda Pública para que proceda ao recolhimento do crédito fiscal: a) deixa de pagá-lo no prazo
legal, salvo se suspensa sua exigibilidade; b) põe ou tenta por seus bens em nome de terceiros; VI - possui
débitos, inscritos ou não em Dívida Ativa, que somados ultrapassem trinta por cento do seu patrimônio
conhecido; VII - aliena bens ou direitos sem proceder à devida comunicação ao órgão da Fazenda Pública
competente, quando exigível em virtude de lei; VIII - tem sua inscrição no cadastro de contribuintes
declarada inapta, pelo órgão fazendário; IX - pratica outros atos que dificultem ou impeçam a satisfação
do crédito.”
39
134) que “não é o fato de já existir um procedimento que impede a instituição de outro,
ainda que mais rígido, para complementar ou aprimorar a tutela do interesse eleito como
legítimo”.
Certo ou errado, deve-se atentar ao fato de que, entre o lançamento fiscal
(artigo 142, do CTN) e a inscrição em Dívida Ativa do débito, pode ocorrer, espontânea
ou premeditadamente, a suspensão da exigibilidade dos créditos fiscais por intermédio
de recursos administrativos ou parcelamentos fiscais (artigo 151, III e VI, do CTN),
ocasiões nas quais o Fisco não poderá propor a execução fiscal.
Desse modo, no período em que os créditos se encontram com exigibilidade
suspensa, o devedor pode vir a dilapidar seu patrimônio para frustrar futura execução
fiscal e, nesses casos, satisfeitos os requisitos objetivos legalmente estabelecidos,
apenas a conservação da eficácia da decretação de indisponibilidade através de medida
cautelar fiscal (artigo 12, parágrafo único, da Lei 8.397/1992) poderá evitar tais fraudes.
Contudo, mesmo com o trabalho legislativo projetado para conferir as
condições materiais necessárias à satisfação da Dívida Ativa da Fazenda Pública e o
tratamento jurisprudencial diferenciado para as matérias subjacentes, não se logrou
êxito ao objetivo de conferir maior efetividade às execuções fiscais. A saber, conforme
recente estudo do Conselho Nacional de Justiça, o relatório da Justiça em Números de
2014, relativo ao ano-base 201359
, demonstrou que
dos 4,6 milhões de processos em tramitação na fase de execução da Justiça
Federal no ano de 2013, aproximadamente 3,7 milhões (81%) correspondem
às execuções fiscais, sendo que os processos dessa classe processual aqueles
são com maior taxa de congestionamento. De cada 100 processos que
tramitam durante um ano, apenas 10 são baixados dentro do mesmo período.
Ou seja, 90 tornam-se pendentes para o exercício seguinte.
Então, diante da inconteste inefetividade dos processos de execução fiscal,
cabe estudar, no presente momento, dois atos fraudulentos praticados pelos devedores
que impedem a satisfação dos créditos em geral - incluindo-se os créditos fiscais da
Fazenda Pública - a partir dos atos materiais de execução por sub-rogação praticados
pelo Poder Judiciário. São eles: os institutos da fraude contra credores e da fraude à
execução.
59
Documento on-line, não datado, p. 257-258. Disponível em:
<ftp://ftp.cnj.jus.br/Justica_em_Numeros/relatorio_jn2014.pdf>. Acesso em: 12 out. 2014.
40
3 – FRAUDES DO DEVEDOR: FRAUDE CONTRA CREDORES E
FRAUDE À EXECUÇÃO
Tomando-se por base o conceito atual e dinâmico de Clóvis do Couto Silva
(2007), pode-se considerar a relação obrigacional – para além de um vínculo jurídico
entre credor e devedor, cujo objeto corresponde a uma prestação econômica de dar,
fazer ou não fazer – como um processo, composto por um conjunto de fases
interdependentes que, norteadas pelo princípio da boa-fé, projetam-se para o
adimplemento.
Entretanto, entre a criação da relação jurídica obrigacional e o adimplemento
da sua prestação de caráter econômico, o sujeito passivo pode direcionar determinadas
condutas de encontro à boa-fé e frustrar a legítima pretensão do credor, quer em
momento anterior ao próprio vencimento da prestação devida ou mesmo após o regular
início de um processo judicial de execução, casos que caracterização o instituto material
da fraude contra credores ou o instituto processual da fraude à execução,
respectivamente, a depender das peculiaridades do caso concreto.
3.1 – Fraude contra credores
A fraude contra credores é o ato de alienar gratuita ou onerosamente bens, ou
remir dívidas, praticado pelo devedor insolvente ou por este reduzido à insolvência, com
o nefasto intuito de frustrar a satisfação de um débito que ainda não se encontra em
execução judicial. A priori, portanto, o termo inicial para a sua configuração é o
vencimento da obrigação60
, momento a partir do qual a dívida se torna exigível.
Contudo, como bem pontuou a Ministra do Superior Tribunal de Justiça Nancy
Andrighi, ao julgar o Recurso Especial n.º 1.092.134/SP61
,
Não há como negar que a dinâmica da sociedade hodierna, em constante
transformação, repercute diretamente no Direito e, por consequência, na vida
de todos nós. O intelecto ardiloso, buscando adequar-se a uma sociedade em
ebulição, também intenta – criativo como é – inovar nas práticas ilegais e
60
Nos termos do artigo 158 e 159 do Código Civil, “art. 158. Os negócios de transmissão gratuita de bens
ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda
quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como lesivo dos seus direitos. §1º
Igual direito assiste aos credores cuja garantia se tornar insuficiente. §2º Só os credores que já o eram ao
tempo daqueles atos podem pleitear a anulação deles. art. 159. Serão igualmente anuláveis os contratos
onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser conhecida
do outro contratante”. 61
(STJ. REsp 1.092.134/SP. Terceira Turma. Relatora: Min. Nancy Andrighi. DJe de 18/11/2010).
41
manobras utilizadas com o intuito de escusar-se do pagamento ao credor. Um
desses expedientes é o desfazimento antecipado de bens, já antevendo, num
futuro próximo, o surgimento de dívidas, com vistas a afastar o requisito da
anterioridade do crédito, como condição da ação pauliana.
Portanto, concluiu que, “embora a anterioridade do crédito seja, via de regra,
pressuposto de procedência da ação pauliana, ela pode ser excepcionada quando for
verifica a fraude predeterminada em detrimento de credores futuros”.
Este instituto de direito material se encontra regulamentado nos artigos 158 a
165, do Código Civil e, quando configurado, constitui causa de anulação do negócio
jurídico celebrado62
, sujeitando-se, em todo caso, ao prazo decadencial de 4 (quatro)
anos, contados da data de sua realização63
.
Para a caracterização da fraude contra credores, faz-se necessária a presença
cumulativa de dois requisitos, quais sejam, o intento fraudulento (consilium fraudis) e o
dano ao credor consubstanciado na insolvência (eventus damni).
O consilium fraudis, conforme leciona Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz
Arenhart (2010, p. 267), deve ser entendido como “o propósito de fraudar os créditos
por meio do negócio jurídico com a ciência do terceiro beneficiário”, ao passo que o
eventus damni consubstancia-se na redução patrimonial que leva o
devedor/alienante/cessionário à insolvência, prejudicando a pretensão econômica do
credor.
Presentes esses elementos, o credor deverá se valer de uma ação ordinária de
conhecimento denominada de pauliana ou revocatória, em face do devedor e do terceiro
adquirente (litisconsórcio passivo necessário) para desconstituir o negócio jurídico
fraudulento celebrado. O exequente que se encontre na condição de réu em ação de
embargos de terceiro não pode, portanto, pleitear incidentalmente em sua defesa a
anulação de ato jurídico, por fraude contra credores, como estabeleceu o Superior
Tribunal de Justiça em seu enunciado sumular de n.º 19564
.
62
Conforme artigo 171, caput e inciso II, do Código Civil, “Além dos casos expressamente declarados na
lei, é anulável o negócio jurídico: [...] II – por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo,
lesão ou fraude contra credores.”. 63
Nos termos do artigo 178, caput e inciso II, do Código Civil, “É de quatro anos o prazo de decadência
para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado: [...] II – no de erro, dolo, fraude contra credores,
estado de perigo ou lesão, do dia em que se realizou o negócio jurídico.”. 64
Nos termos da súmula 195, do Superior Tribunal de Justiça: “Em embargos de terceiro não se anula ato
jurídico, por fraude contra credores”.
42
Julgada procedente, essa pretensão constitutiva negativa terá o condão de
restaurar ao patrimônio do devedor o(s) bem(ns) ou direito(s) alienados e, desse modo,
dar concretude ao princípio da responsabilidade patrimonial.
Em que pese o Código Civil ser expresso no sentido de que a fraude contra
credores é um ato anulável, a simples desconstituição do negócio jurídico não
conferiria, a priori, nenhuma garantia em favor do autor da ação revocatória. Afinal, até
mesmo um credor que não houvesse sido prejudicado pela fraude contra credores
poderia ter preferência na penhora/expropriação do bem, caso detivesse um crédito
privilegiado, a exemplo do trabalhista.
Então, em virtude disso, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao
julgar o Recurso Especial n.º 971.884/PR65
, reconheceu que a natureza da ação pauliana
é anulatória, por previsão expressa do Código Civil. Porém, estabeleceu que essa
anulação só beneficia o autor da ação.
É certo que há uma incongruência técnica no julgado, porquanto ou um
negócio jurídico ou é válido ou nulo, e que, para aproveitar somente o autor, o
provimento jurisdicional deveria ser declaratório de ineficácia. Todavia, como adiante
se verá, os precedentes do Superior Tribunal de Justiça, quando reiterados ou julgados
por amostragem, revestem-se de efeito expansivo, passando a orientar o julgamento de
causas similares pelos órgãos jurisdicionais ordinários.
3.2 – Fraude à execução
Nos termos do artigo 593, do Código de Processo Civil,
Art. 593. Considera-se em fraude de execução a alienação ou oneração de
bens:
I – quando sobre eles pender ação fundada em direito real;
65
Informativo nº 467/STJ: “FRAUDE CONTRA CREDORES. EFEITOS. SENTENÇA. Trata-se, na
origem, de ação pauliana (anulatória de doações) contra os recorrentes na qual se alega que um dos réus
doou todos seus bens aos demais réus, seus filhos e sua futura esposa, todos maiores e capazes, por meio
de escrituras públicas, de modo que, reduzindo-se à insolvência, sem nenhum bem em seu nome, infringiu
o disposto no art. 106 do CC/1916. O Min. Relator entendeu, entre outras questões, que estão presentes os
requisitos do citado artigo ensejadores da fraude contra credores e que chegar a conclusão diversa
demandaria o reexame do conjunto fático-probatório. Quanto aos efeitos da declaração de fraude contra
credores, consignou que a sentença pauliana sujeitará à excussão judicial o bem fraudulentamente
transferido, mas apenas em benefício do crédito fraudado e na exata medida desse. Naquilo que não
interferir no crédito do credor, o ato permanecerá hígido, como autêntica manifestação das partes
contratantes. Caso haja remissão da dívida, o ato de alienação subsistirá, não havendo como sustentar a
anulabilidade. Assim, a Turma, ao prosseguir o julgamento, deu parcial provimento ao recurso.
Precedente citado: REsp 506.312-MS, DJ 31/8/2006. REsp 971.884-PR, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado
em 22/3/2011.”
43
II – quando ao tempo da alienação ou oneração, corria contra o devedor
demanda capaz de reduzi-lo à insolvência;
III – nos demais casos expressos em lei.
Desse modo, assim como na fraude contra credores, na fraude à execução o
devedor aliena ou onera bens. Todavia, a despeito de ser um instituto de direito
processual, é considerada uma fraude mais grave do que a fraude contra credores, por
não macular apenas um interesse individual do credor, mas principalmente por atentar
contra o próprio Poder Judiciário, frustrando a satisfação de um débito que já se
encontra em vias de execução judicial.
Não por outra razão, é que este ato fraudulento além de ser considerado como
atentatório à dignidade da justiça (artigo 600, I66
, do CPC) sujeitando o devedor à multa
processual de até 20% (vinte por cento) do valor atualizado da execução (artigo 601,
caput67
, do CPC), encontra-se tipificado do artigo 179, do Código Penal, segundo o
qual:
Art. 179 - Fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando
bens, ou simulando dívidas:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
Parágrafo único - Somente se procede mediante queixa.
Conquanto o inciso II, do retromencionado artigo 593, estabeleça, como marco
temporal, a existência de demanda capaz de reduzir o devedor à insolvência, o ato de
fraudar a execução pode ser praticado antes da existência de um processo de execução,
quando ainda pende um processo de conhecimento ou cautelar, desde que o sujeito
passivo da relação obrigacional paute sua conduta fraudulenta de alienar seu patrimônio
na ciência de uma futura execução, com o intuito de frustrá-la.
Desse modo, o critério temporal reconhecido pela jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça para a configuração da fraude à execução é a citação em qualquer
processo que discuta, direta ou indiretamente, a dívida havida68
. Excepcionalmente,
66
“Art. 600. Considera-se ato atentatório à dignidade da Justiça o ato do executado que: (Redação dada
pela Lei nº 11.382, de 2006). I – Frauda a execução; (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973).”. 67
“Art. 601. Nos casos previstos no artigo anterior, o devedor incidirá em multa fixada pelo juiz, em
montante não superior a 20% (vinte por cento) do valor atualizado do débito em execução, sem prejuízo
de outras sanções de natureza processual ou material, multa essa que reverterá em proveito do credor,
exigível na própria execução. (Redação dada pela Lei nº 8.953, de 13/12/1994).”. 68
“para configurar fraude à execução, é necessário que a alienação do bem tenha se dado após ocorrida a
citação válida, não importando o tipo de ação proposta – se cautelar, cognitiva ou executória”. (STJ.
AgRg no EDcl no REsp n.º 649.139/SP. Quarta Turma. Relator: Ministro João Otávio de Noronha. DJe
de 08/03/2010).
44
porém, pode-se reconhecer a natureza fraudulenta do negócio jurídico celebrado em
momento anterior à própria citação, desde que se comprove a prévia ciência do devedor
quanto à existência da demanda judicial69
.
Ao contrário do que ocorre na fraude contra credores, o reconhecimento da
fraude à execução, como instituto processual que é, dar-se-á de forma incidental no
próprio processo de execução – ou mesmo em sede de embargos de terceiro70
- e não
trará reflexos no plano da validade do negócio jurídico, mas sim em sua eficácia, de
modo relativo.
Uma vez reconhecida, a fraude à execução ensejará uma declaração ineficácia
relativa, ou seja, o negócio jurídico celebrado continuará válido, mas os pactuantes não
poderão opor seus efeitos perante o credor, no que atine ao crédito exequendo frustrado.
Como sintetiza Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (2010, p. 270), “é
como se, para a execução, a alienação ou oneração do bem não tivesse ocorrido”.
A lei estabeleceu como único requisito para a configuração da fraude à
execução o eventus damni, dispensando o consilium fraudis. Entretanto, com vistas a
resguardar a boa-fé do terceiro adquirente, desde o início da década de 90 (noventa) se
encontram precedentes do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a prova da
má-fé ou registro da penhora seriam imprescindíveis para que se operassem os efeitos
judiciais do reconhecimento da fraude à execução71
.
Desde então, diversos outros julgados foram reproduzindo esta posição,
compreendendo não ser razoável tornar ineficaz um negócio jurídico cujo objeto
69
“De regra, a caracterização da fraude de execução exige a ocorrência de litispendência, esta
caracterizada pela citação válida do devedor no processo de conhecimento ou de execução. In casu, há
que se ater à peculiaridade levada em conta pela decisão recorrida, qual seja, quando da alienação do
bem, portanto, no momento caracterizador da fraude, o devedor-executado tinha pleno conhecimento do
ajuizamento da execução e, como forma de subtrair-se à responsabilidade executiva decorrente da
atividade jurisdicional, esquivou-se da citação de modo a impedir a caracterização da litispendência e
nesse período adquiriu um bem imóvel em nome dos filhos”. (STJ. REsp 799.440/DF. Quarta Turma.
Relator: Ministro João Otávio de Noronha. Votação unânime. DJe de 02/02/2010). 70
“Independentemente do nomen iuris utilizado pelo Tribunal de origem, é certo que foram considerados
presentes os pressupostos para o reconhecimento da fraude à execução, o que é suficiente para embasar a
improcedência dos embargos de terceiro, não havendo espaço, portanto, para falar em ofensa ao disposto
na súmula nº 195/STJ” (STJ. AgRg no REsp n.º 1.384.682/SP. Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas
Cueva. Terceira Turma. Votação unânime. Julgado em 14/10/2014. DJe de 21/10/2014). 71
“SOMENTE APOS O REGISTRO A PENHORA FAZ PROVA QUANTO A FRAUDE DE
QUALQUER TRANSAÇÃO POSTERIOR (LEI N. 6.015, ARTIGO 240). Vale reafirmar o asseverado
na decisão recorrida, eis que comprovadamente o adquirente agiu de boa-fé, adquirindo bem que figurava
no registro imobiliário como livre e desimpedido, não podendo imaginar que em outra comarca, em outro
Estado, corria ação contra anterior proprietário do bem." (AgRg no Ag 4602 PR, Rel. Ministro ATHOS
CARNEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 04/03/1991, DJ 01/04/1991)
45
mediato figurava no registro imobiliário como livre e desembaraçado e impor ao
adquirente o dever de supor que em outra comarca e/ou outro Estado havia ação movida
em face do alienante, situações interpretativas que atrairiam completa insegurança aos
negócios jurídicos ou paralisaria sua dinâmica natural e essencial.
Em outros termos, nas precisas palavras do então Ministro Eduardo Ribeiro,
por ocasião do julgamento do EREsp 1.114.415/MG,
Efetivamente, é exigir o inexigível e supor como razoável o que nunca
acontece, entender-se deva alguém, que vá adquirir um bem, além de levantar
a cadeia dominial, averiguar se pende processo, interessando a algum dos
anteriores proprietários. Havendo, deverá pesquisar quanto à solvência.
Que isso se faça quanto àquele com quem se negocia, admita-se como de se
esperar. Estender a pesquisa por uma cadeia às vezes longa significa a
paralisia na vida dos negócios. Em verdade, é sabido que ninguém assim
procede e a conseqüência é simplesmente fazer com que alguém que agiu na
mais absoluta boa-fé termine por pagar a dívida de outrem, com quem não
teve qualquer contato. Poder-se-á objetar com a possibilidade de se
facilitarem as fraudes. Não me parece exista aí motivo suficiente para a
adoção do entendimento contrário. Não se haverá de prejudicar quem age
lisamente, apenas por ser possível que outros não se comportem com
correção. E a má-fé pode ser provada por indícios, existindo, ainda,
providências acauteladoras de que se pode valer o exeqüente.
(STJ. EREsp 114415/MG. Relator: Ministro Eduardo Ribeiro. Segunda
Seção. Julgado em 12/11/1997, DJ de 16/02/1998).
Portanto, por considerar que é o registro da penhora que tem o efeito de gerar a
ciência erga omnes da constrição judicial e a presunção da fraude de qualquer transação
posterior (artigo 24072
, da Lei 6.015/1973 e artigo 659, §4º73
, do CPC)74
, e não se
olvidar que existem medidas judiciais acautelatórias à disposição dos cidadãos e das
quais o exequente poderia ter se valido, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o
entendimento de que, nos casos em que o terceiro adquirente tenha figurado de boa-fé, a
72
“O registro da penhora faz prova quanto à fraude de qualquer transação posterior”. (renumerado do art.
245 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975). 73
“A penhora de bens imóveis realizar-se-á mediante auto ou termo de penhora, cabendo ao exequente,
sem prejuízo da imediata intimação do executado (art. 652, §4º), providenciar, para presunção absoluta de
conhecimento por terceiros, a respectiva averbação no ofício imobiliário, mediante a apresentação de
certidão de inteiro teor do ato, independentemente de mandado judicial”. (Redação dada pela Lei nº
11.382, de 2006). 74
“Em nossa lei processual, a determinação de registro da penhora de bem imóvel surgiu, formalmente,
com a inclusão, pela Lei 8.953/1994, do §4º ao art. 659. Entretanto, mesmo antes disso, a
jurisprudência já considerava que o registro constituía prova segura e suficiente para elidir a
presunção de boa-fé do adquirente do bem imóvel penhorado. Nesse sentido, aliás, dispunha o art.
245 da Lei 6.015/1973 (a inscrição da penhora faz prova quanto à fraude de qualquer transação posterior).
A esse respeito, a jurisprudência dessa Corte consolidou-se no sentido de que, ante a ausência do
registro da penhora, para que seja caracterizada fraude à execução, impõe-se ao credor o ônus de
provar que o adquirente tinha ciência da constrição que pesava sobre o imóvel”. (STJ. REsp
865.974/RS. Relator: Ministro Teori Albino Zavascki. Primeira Turma. DJe 10/09/2008) (grifos não
constantes do original).
46
só existência de ato negocial de alienação tornasse o devedor insolvente não ensejaria a
declaração de ineficácia relativa própria do reconhecimento da fraude à execução.
Acresça-se ainda que a Lei nº 11.382, de 2006, incluiu o artigo 615-A, ao
Código de Processo Civil, possibilitando ao exequente, no ato da distribuição, obter
certidão comprobatória do ajuizamento da ação executiva para proceder à averbação
premonitória no registro de imóveis, veículos ou outros bens sujeitos à penhora ou
arresto (caput) e, desse modo, fazer presumir a fraude à execução na alienação ou
oneração de bens posteriormente efetuada (§4º).
Atenta a todas essas nuances e em conformidade com a jurisprudência
consolidada, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça editou a súmula n.º 375,
estatuindo, in verbis:
O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do
bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente.
(Súmula 375, CORTE ESPECIAL, julgado em 18/03/2009, DJe 30/03/2009)
Como sintetiza a súmula em comento, tornou-se imprescindível, para a
incidência dos efeitos decorrentes do reconhecimento da fraude à execução, que o
adquirente tivesse prévia ciência da penhora ou comprovadamente agido de má-fé, em
conluio com o devedor insolvente. Por óbvio, esses requisitos não obstam que, em
certos casos, se possa presumir a má-fé do terceiro, antes, reafirma tal possibilidade.
Nas situações em que se alienam bem tangível ou intangível após o registro de
uma constrição judicial no órgão competente, presume-se a ciência erga omnes do ato e
que o terceiro que posteriormente adquiriu o bem, no mínimo, assumiu o risco de perdê-
lo pela atividade estatal de execução por sub-rogação ao não atentar ao estado de
insolvência do alienante. Contudo, este não é apenas o único caso.
A própria jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reconhece, em
determinados casos concretos, que a fraude à execução se operará in re ipsa, sendo
subjacente ao próprio ato, como nas situações em que o terceiro adquirente é parente ou
amigo e/ou a alienação se dá a título gratuito75
ou por um valor muito inferior ao de
75
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. IMÓVEL PENHORADO. DOAÇÃO DOS EXECUTADOS A
SEUS FILHOS MENORES DE IDADE. AUSÊNCIA DE REGISTRO DA PENHORA.
IRRELEVÂNCIA. FRAUDE À EXECUÇÃO CONFIGURADA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA
N. 375/STJ. 1. No caso em que o imóvel penhorado, ainda que sem o registro do gravame, foi doado aos
filhos menores dos executados, reduzindo os devedores a estado de insolvência, não cabe a aplicação do
47
mercado. Enfim, situações nas quais as excepcionais condições do caso concreto
apontam para a violação da boa-fé objetiva.
Nesse sentido, caso um executado doe uma fazenda para seu neto com cláusula
de usufruto, terá alienado graciosamente para um parente de 2º (segundo) grau um bem
passível de satisfazer o seu débito, sem, contudo, perder o poder de ingerência
socioeconômica sobre este, em clara violação à boa-fé objetiva e afronta à própria
lógica do direito civil, que repudia o exercício da autonomia privada em prejuízo de
credores.
Outrossim, suponha-se que um ex-agente político, com condenações prolatadas
pelo Tribunal de Contas da União e pelo Tribunal de Contas Estadual76
e cujas
repercussões midiáticas foram incontestes, divorcia-se através de acordo judicial
celebrado após sua citação em uma execução movida com o fito de obter o devido
ressarcimento ao erário, deixando todas as dezenas de imóveis adquiridos na constância
do casamento para a sua ex-esposa. Neste caso, resta evidente a ocorrência de fraude à
execução, seja pelo fato de o cônjuge virago ter ciência dos débitos do marido ou pela
atipicidade de acordos familiares com este teor77
, combinados com a opção pela sigilosa
verbete contido na súmula 375, STJ. É que, nessa hipótese, não há como perquirir-se sobre a ocorrência
de má-fé dos adquirentes ou se estes tinham ciência da penhora. 2. Nesse passo, reconhece-se
objetivamente a fraude à execução, porquanto a má-fé do doador, que se desfez de forma graciosa
de imóvel, em detrimento de credores, é o bastante para configurar o ardil previsto no art. 593, II,
do CPC. 3. É o próprio sistema de direito civil que revela sua intolerância com o enriquecimento de
terceiros, beneficiados por atos gratuitos do devedor, em detrimento de credores, e isso
independentemente de suposições acerca da má-fé dos donatários (v.g. arts. 1.997, 1.813, 158 e 552
do Código Civil de 2002). 4. Recurso especial não provido.(STJ. REsp 1.163.114. Quarta Turma.
Relator: Min. Luis Felipe Salomão. DJe 01.08.2011). 76
Nos termos do artigo 71, §3º, da Constituição Federal, “As decisões do Tribunal de que resulte
imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo”. 77
“FRAUDE DE EXECUÇÃO. SEPARAÇÃO CONSENSUAL CONTEMPORÂNEA DA
EXECUÇÃO AJUIZADA, MAS NÃO EFETIVADA A CITAÇÃO. RENUNCIA DO PATRIMÔNIO
DECORRENTE DA MEAÇÃO.1. Não servem os precedentes da Corte sobre a necessidade da citação
para a configuração da fraude de execução em caso de alienação a terceiro, diante de circunstância
específica, destacada pelo Acórdão recorrido, assim a manobra da separação judicial consensual, com
renúncia pelo executado da parte que lhe cabia em decorrência da meação, reduzindo o executado a
um quadro de insolvência, sem nenhuma razão para tal. O Poder Judiciário não pode cobrir
cenário evidente de fraude construído pelos próprios interessados na preservação do patrimônio.2.
Recurso especial não conhecido.”(STJ. REsp 167.920. Terceira Turma. Rel. Min. CARLOS ALBERTO
MENEZES DIREITO. DJ de 22/05/2000). Cumpre atentar, neste caso, que o Órgão Jurisdicional que
prolatou este precedente estendeu o critério temporal do instituto processual da fraude à execução para
momento anterior à própria citação.
48
via judicial (artigo 155, II78
, do CPC), em detrimento do público divórcio consensual
em cartório (artigo 17, caput79
, da Lei 6.015/1973).
Entretanto, nos casos em que o bem não tenha penhora registrada ou que, pela
sua natureza, não se sujeita a registro em órgão competente, incumbirá ao credor
comprovar a má-fé do adquirente ou cessionário, para que o ato fraudulento seja
declarado ineficaz perante a execução.
Pelo fato de o ordenamento jurídico pátrio disponibilizar aos credores meios
acautelatórios para coibir ou neutralizar a fraude à execução, de ordinário o Superior
Tribunal de Justiça distribuiu aos credores em geral a incumbência de adotar uma
conduta mais proativa na perseguição de seus interesses creditícios, a partir do manejo
da cautelar de arresto (artigo 813, caput, I e II, “a” e “b”, do CPC80
), ou realização de
averbações premonitórias, nos termos do artigo 615-A81
, do Código de Processo Civil,
que estabelece presunção absoluta de fraude à execução, não se podendo interferir
incontinenti na eficácia de negócios jurídicos celebrados por terceiros de boa-fé.
Portanto, pode-se concluir que, quando se tratar de alienação ou oneração de
bens por devedor sujeito à execução judicial ou já efetivamente integrante da relação
processual executiva, aplicar-se-á, de regra, a referida súmula de n.º 375, do Superior
Tribunal, com vistas a resguardar a boa-fé do terceiro adquirente/cessionário ante a
inércia do credor, que não promoveu a ação cautelar cabível ou procedeu à averbação
premonitória que lhe é facultada.
Há, contudo, uma recente exceção feita pela Primeira Seção do Superior
Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Recurso Repetitivo n.º 1.141.990/PR,
quando se trata de fraude à execução fiscal tributária. Desse modo, para melhor
78
“Art. 155. Os atos processuais são públicos. Correm, todavia, em segredo de justiça os processos: [...] II
– que dizem respeito a casamento, filiação, separação dos cônjuges, conversão desta em divórcio,
alimentos e guarda de menores. (Redação dada pela Lei nº 6.515, de 26.12.1977)”. 79
“Art. 17. Qualquer pessoa pode requerer certidão do registro sem informal ao oficial ou ao funcionário
o motivo ou interesse do pedido”. 80
“Artigo 813. O arresto tem lugar: I – quando o devedor sem domicílio certo intenta ausenta-se ou
alienar os bens que possui, ou deixa de pagar a obrigação no prazo estipulado; II – quando o devedor, que
tem domicílio: a) se ausenta ou tenta ausentar-se furtivamente; b) caindo em insolvência, aliena ou tenta
alienar bens que possui; contrai ou tenta contrair dívidas extraordinárias; põe ou tenta pôr os seus bens em
nome de terceiros; ou comete outro qualquer artifício fraudulento, a fim de frustrar a execução ou lesar
credores;”. 81
“Art. 615-A. O exequente poderá, no ato da distribuição, obter certidão comprobatória do ajuizamento
da execução, com identificação das partes e valor da causa, para fins de averbação no registro de imóveis,
registro de veículos ou registro de outros bens sujeitos à penhora ou arresto.”
49
elucidação do tema, cabe, no presente momento, estudar o tratamento deste instituto
processual nas execuções fiscais.
3.3 – A fraude à execução fiscal
Como relatado na exposição de motivos da Lei de Execuções Fiscais, esta não
revogou, em linhas gerais, a lógica do Código de Processo Civil, disciplinando as
matérias atinentes a execuções da Dívida Ativa da Fazenda Pública apenas no essencial.
Desse modo, no que não contradizer a disciplina específica dessa espécie executiva, o
Código de Ritos será aplicável subsidiariamente, como regra geral que se estende
inclusive ao instituto da Fraude à Execução, por não estar disciplinado de maneira
diversa na Lei 6.830/1980.
Entretanto, o próprio Código de Processo Civil, por seu turno, estabeleceu que
a fraude à execução pode se configurar a partir da alienação ou oneração de bens “nos
demais casos expressos em lei” (artigo 593, III), ocasiões nas quais, pelo critério da
especialidade, incidirá o texto normativo específico. Desse modo, para precisar a
adequada incidência do instituto em comento, deve-se atentar para a existência de texto
normativo especial. Em caso afirmativo, este o disciplinará, caso contrário, aplicar-se-á
o regime geral do Código de Processo Civil.
Como já relatado, no âmbito das execuções fiscais o legislador não assentou
uma disciplina específica, tampouco se encontram no ordenamento jurídico vigente
outras previsões, à exceção da disciplina específica dada pelo Código Tributário
Nacional, em seu artigo 185, motivo pelo qual se faz necessária a distinção da natureza
dos créditos fiscais executados para compreender o regime aplicável ao instituto em
estudo.
3.3.1 – Fraude à execução fiscal de créditos de natureza não tributária
Para as execuções fiscais de créditos de natureza não tributária, a exemplo das
multas administrativas oriundas do exercício regular do Poder de Polícia82
estatal, como
82
A definição do Poder de Polícia se encontra no artigo 78, caput, do Código Tributário Nacional, por
constituir uma dos elementos da hipótese de incidência da espécie tributária “taxa”. A saber, nos termos
do mencionado texto normativo. “Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração
pública que, limitando ou disciplinando direito, interêsse ou liberdade, regula a prática de ato ou
50
as aplicadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis - IBAMA, e de preços públicos, como a Taxa Anual por Hectare, cobrada
pelo Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM, a ausência de previsão
legal específica atrai a incidência do regime estabelecido pelo Código de Processo Civil,
sendo imprescindível, para a aplicação da declaração de ineficácia do negócio jurídico e
posterior sujeição do bem ao binômio sub-rogatório penhora/expropriação, a
observância da súmula n.º 375, do Superior Tribunal de Justiça, conforme já
explicitado.
3.3.2 – Fraude à execução fiscal de créditos de natureza tributária
Quando se trata de execuções fiscais de créditos de natureza tributária,
contudo, a temática adquire novos contornos, sobretudo pela existência do artigo 185,
do Código Tributário Nacional, tanto em sua redação anterior às alterações promovidas
pela Lei Complementar 118/2005, que entrou em vigor, após o período de vacância da
lei (vacatio legis), em 09 de junho de 2005, quanto em sua novel redação.
A saber, nos termos do referido artigo 185, do Código Tributário Nacional, em
sua antiga redação:
Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas,
ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública
por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa em fase de
execução.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem
sido reservados pelo devedor bens ou rendas suficientes ao total pagamento
da dívida em fase de execução.
Após a vigência das alterações dadas pela mencionada Lei Complementar
118/2005, o texto normativo passou a vigorar com a seguinte redação:
Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas,
ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública,
por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa.(Redação dada
pela Lcp nº 118, de 2005).
abstenção de fato, em razão de intêresse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos
costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de
concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos
direitos individuais ou coletivos.” (Redação dada pelo Ato Complementar nº 31, de 1966).
51
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem
sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento
da dívida inscrita. (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005).
Desse modo, pelo princípio do direito temporal tempus regit actum, para que os
negócios jurídicos celebrados até 08 de junho de 2005 configurem fraude à execução,
salvo anterior e comprovada ciência do devedor tributário, o marco temporal a ser
considerado, na visão jurisprudencial da época, será o ato processual de citação no feito
executivo, já que a presunção de fraude na alienação ou oneração de bens ou rendas, ou
seu começo, se operaria “por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa
em fase de execução”83
. Para os negócios jurídicos efetivados a partir de 09 de junho de
2005, portanto, é que o critério temporal de incidência será a inscrição em Dívida Ativa.
Embora os marcos temporais da fraude à execução fiscal tributária e das
demais fraudes à execução, não tributárias, fossem dissimilares, e doutrinadores como
Aliomar Baleeiro (1996) e Hugo de Brito Machado (2008) de há muito compreenderem
que, enquanto garantia do crédito tributário, tal presunção encartada no Código
Tributário Nacional seria absoluta, não admitindo prova em contrário, ambas as
espécies do mesmo instituto processual sempre foram interpretadas de forma uníssona
pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de resguardar o
adquirente ou cessionário de boa-fé.
Esta assertiva não é desprovida de dados empíricos, ao revés, encontra guarida
dentre os próprios precedentes que ensejaram a edição da súmula de n.º 375, do
Superior Tribunal de Justiça, dentre os quais figuraram casos regidos pelo artigo 185, do
Código Tributário Nacional, tanto em sua redação pretérita, quanto em sua redação
posterior à edição da Lei Complementar 118/2005, conforme ementas abaixo
colacionadas.
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL.
NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL NÃO CONFIGURADA.
EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA EM IMÓVEL. INEXISTÊNCIA DE
REGISTRO EM CARTÓRIO. AUSÊNCIA DE PROVA DE MÁ-FÉ DO
ADQUIRENTE. FRAUDE NÃO CARACTERIZADA. RECURSO
ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
(STJ. REsp 865.974/RS. Primeira Turma. Relator: Min. Teori Albino
Zavascki. DJe 10.09.2008)
83
Em sentido contrário, Hugo de Brito Machado (2008, p. 239), a despeito de não desconhecer posições
doutrinárias e jurisprudenciais diversas, defende que “estar o crédito tributário em fase de execução não
significa já haver sido proposta a ação de execução. A fase de execução começa com a inscrição do
crédito como dívida ativa”.
52
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. FRAUDE À
EXECUÇÃO FISCAL. CITAÇÃO. ALIENAÇÃO DE BEM. PENHORA
NÃO-GRAVADA NO REGISTRO DE IMÓVEIS. INSUBSISTÊNCIA.
1. Não basta o ajuizamento do executivo fiscal e a citação válida do devedor
para configurar a fraude à execução quando o bem penhorado foi adquirido
por terceiro. É necessário que haja a gravação da constrição judicial no
respectivo Cartório de Registro de Imóveis para que a indisponibilidade do
bem gere efeitos de eficácia erga omnes, o que não ocorreu no caso dos
autos. Precedentes.
2. Recurso especial não-provido.
(STJ. REsp 810.170/RS. Segunda Turma. Relator: Min. Mauro Campbell
Marques. DJe 26.08.2008)
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – EMBARGOS DE TERCEIRO –
ALIENAÇÃO DE IMÓVEL SEM REGISTRO NO CARTÓRIO –
FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL NÃO CARACTERIZADA –
PRECEDENTES.
1. Ausente o registro de penhora ou arresto efetuado sobre o imóvel, não se
pode supor que as partes contratantes agiram em consilium fraudis.
2. Não-demonstrado que o comprador tinha conhecimento da existência de
execução fiscal contra o alienante ou agiu em conluio com o devedor-
vendedor, sendo insuficiente o argumento de que a venda foi realizada após
a citação do executado. Precedentes.
Agravo regimental improvido
(STJ. AgRg no REsp 1046004⁄MT. Segunda Turma. Relator: Min.
Humberto Martins. DJe 23.06.2008).
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. FRAUDE À EXECUÇÃO.
REQUISITOS. ACÓRDÃO EMBARGADO EM CONSONÂNCIA COM
ENTENDIMENTO DESTA CORTE. SÚMULA 168⁄STJ.
1 - O acórdão embargado em consonância com o entendimento pacífico
desta Corte assevera que ante a ausência do registro da penhora a decretação
de fraude à execução depende da prova do conhecimento, por parte do
adquirente do imóvel, de ação pendente contra o devedor capaz de reduzi-lo
à insolvência. Incidência da súmula 168⁄STJ.
2 - Agravo regimental desprovido.
(STJ. AgRg no EREsp 719.949-RS. Segunda Seção. Relator: Min. Fernando
Gonçalves. DJ 08.11.2007).
No mesmo sentido, inclusive, encontra-se recente precedente do Tribunal
Superior do Trabalho, nos termos do acórdão proferido no Recurso de Revista n.º 894-
47.2011.5.10.0084, cujos créditos envolvidos preferem inclusive os créditos tributários,
nos termos artigo 186, caput84
, do Código Tributário Nacional:
RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. EMBARGOS
DE TERCEIRO. PENHORA.
A configuração de fraude à execução não pode ser absolutamente objetiva.
Não se deve presumir que a adquirente do imóvel tivesse conhecimento de
que o negócio jurídico em questão era viciado, para enquadrar-se, em tese,
nos requisitos da fraude à execução. A ciência, pelo adquirente, da existência
de demanda contra o alienante, constitui elemento subjetivo essencial para se
perquirir sua qualidade, ou não, de terceiro de boa-fé. Na hipótese em
84
“O crédito tributário prefere a qualquer outro, seja qual for sua natureza ou o tempo de sua constituição,
ressalvados os créditos decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente de trabalho.” (Redação dada
pela Lcp nº 118, de 2005).
53
questão, não há prova de que o ato alienatório foi praticado com a finalidade
de frustrar a execução e de que a adquirente do bem tivesse conhecimento de
procedimentos executórios os quais pudessem reduzir o devedor à
insolvência, segundo a previsão do art. 593, II, do CPC. Dessa forma, torna-
se irrelevante a ausência de registro do contrato particular no cartório. O
Tribunal Regional deixou expressamente consignado que a terceira
embargante reside no imóvel desde a cessão de direitos e tudo indica que é
adquirente de boa-fé. A configuração de adquirente de boa-fé torna-se mais
concreta com a transferência do imóvel penhorado para a referida parte em
28/1/2013, nos termos do registro realizado no 2º Ofício do Registro de
Imóveis de Brasília – DF, em virtude de sentença prolatada nos autos da
Ação de Obrigação de Fazer nº 2010.01.1.152651-2, que tramitou na 10ª
Vara Cível de Brasília/DF. Nesse passo, entende-se evidente o caráter de
boa-fé da terceira embargante. Recurso de revista conhecido e provido.
(TST. RR 894-47.2011.5.10.0014. Relatora: Ministra Dora Maria da Costa.
DJe de 13/12/2013).
Entretanto, o entendimento selado pelo mencionado enunciado de n.º 375, da
súmula da jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça foi
inexoravelmente afastado para execuções fiscais tributárias pela sua Primeira Seção (
composta pelas duas Turmas de Direito Público) em 19/11/2010, por ocasião do
julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia n.º 1.141.990/PR, pelo
rito do artigo 543-C, do Código de Processo Civil.
Desse modo, nos moldes em que se propõe o presente trabalho acadêmico, o
instituto processual de fraude à execução fiscal tributária deve ser compreendido em
dois períodos, cuja divisa temporal é o julgamento do paradigmático Recurso
Repetitivo.
3.3.2.1 – Antes do REsp 1.141.990/PR
Antes do julgamento do Recurso Especial 1.141.990/PR, pode-se afirmar com
precisão que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, enquanto tribunal
competente para uniformizar a interpretação jurídica das normas infraconstitucionais,
inclinava-se pacificamente sentido de que, para a configuração da fraude à execução
fiscal de créditos de natureza tributária, seria imprescindível o prévio registro da
penhora ou a prova da má-fé do terceiro adquirente.
Em pesquisa jurisprudencial realizada no sítio virtual do referido Tribunal
Superior, inclusive, verifica-se que os últimos julgados sobre fraude à execução fiscal
nos termos do artigo 185, do Código Tributário Nacional, foram o Agravo Regimental
no Agravo nº 1.019.882/PR, pela Primeira Turma, e o Recurso Especial nº 726.323/SP,
54
pela Segunda Turma, cujas publicações se deram, respectivamente, em 31/08/2009 e
17/08/2009.
Como se depreende das ementas abaixo transcritas, ambos os julgados
seguiram a então pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e aplicaram a
súmula nº 375 na espécie:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO
AGRAVO DE INSTRUMENTO. FRAUDE À EXECUÇÃO. ART. 185 DO
CTN. TERCEIRO DE BOA-FÉ. AUSÊNCIA DE REGISTRO DA
PENHORA. SÚMULA 375 DO STJ.
1. Hipótese em que a Fazenda Nacional busca a penhora de bem imóvel
alienado pelo devedor no curso da execução fiscal.
2. Tendo em vista que o registro da alienação em apreço no Ofício de
Imóveis ocorreu em data anterior (17/8/2004) ao início da vigência da LC
118/05, deve ser aplicada a redação original do art. 185 do CTN, em
conformidade com o princípio tempus regit actum.
3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a fim de resguardar o
direito de terceiro de boa-fé, consolidou o entendimento de que a constatação
de fraude em execução decorrente de alienação de imóvel exige, além do
ajuizamento da ação executiva e a citação do devedor, o registro da penhora
no ofício de imóveis (para que a indisponibilidade do bem gere efeitos de
eficácia erga omnes), salvo se evidenciada a má-fé dos particulares
(consilium fraudis), o que, conforme consignado pelo Corte de origem, não
ficou demonstrado neste feito.
4. Rever as conclusões do Tribunal a quo a respeito da falta de comprovação
pelo exequente acerca da má-fé do adquirente implica reexame do conjunto
fático-probatório, inviável ante o óbice da Súmula 7/STJ.
5. Agravo regimental não provido.
(STJ. AgRg no Ag 1.019.882/PR. Relator: Min. Benedito Gonçalves.
Primeira Turma. DJe de 31/08/2009).
PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO
FISCAL. FRAUDE À EXECUÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 185, DO
CTN. BEM ALIENADO APÓS A CITAÇÃO VÁLIDA E ANTES DO
REGISTRO DA PENHORA. APLICAÇÃO DO ENUNCIADO DA
SÚMULA N. 375, DO STJ. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO
RELATOR.
1. "O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora
do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente" (Enunciado n.
375 da Súmula do STJ, Rel. Min. Fernando Gonçalves, em 18/3/2009).
2. Ressalva do ponto de vista do relator que tem a seguinte compreensão
sobre o tema: a) Na redação anterior do art. 185 do CTN, exigia-se apenas a
citação válida em processo de execução fiscal prévia à alienação para
caracterizar a presunção relativa de fraude à execução em que incorriam o
alienante e o adquirente (regra aplicável às alienações ocorridas até
8.6.2005); b) Na redação atual do art. 185 do CTN, exige-se apenas a
inscrição em dívida ativa prévia à alienação para caracterizar a presunção
relativa de fraude à execução em que incorrem o alienante e o adquirente
(regra aplicável às alienações ocorridas após 9.6.2005); c) A averbação no
registro de imóveis da certidão de inscrição em dívida ativa, ou da certidão
comprobatória do ajuizamento da execução, ou da penhora cria a presunção
absoluta de que a alienação posterior se dá em fraude à execução em que
incorrem o alienante e o adquirente; d) A presunção relativa de fraude à
55
execução pode ser invertida pelo adquirente se demonstrar que agiu com boa-
fé na aquisição do bem, apresentando as certidões de tributos federais e
aquelas pertinentes ao local onde se situa o imóvel e onde tinha residência o
alienante ao tempo da alienação, exigidas pela Lei n. 7.433/85, e
demonstrando que, mesmo de posse de tais certidões, não lhe era possível ter
conhecimento da existência da execução fiscal (caso de alienação ocorrida
até 8.6.2005), ou da inscrição em dívida ativa (caso de alienação ocorrida
após 9.6.2005); e) Invertida a presunção relativa de fraude à execução, cabe
ao credor demonstrar o consilium fraudis, a culpa ou a má-fé; f) A incidência
da norma de fraude à execução pode ser afastada pelo devedor ou pelo
adquirente se demonstrado que foram reservados pelo devedor bens ou
rendas suficientes ao total pagamento da dívida, ou que a citação não foi
válida (para alienações ocorridas até 8.6.2005), ou que a alienação se deu
antes da citação (para alienações ocorridas até 8.6.2005), ou que a alienação
se deu antes da inscrição em dívida ativa (para alienações posteriores a
9.6.2005).
3. Hipótese em que a alienação se deu após a citação válida, contudo, antes
do registro da penhora, não tendo sido comprovada a má-fé do terceiro
adquirente, o que afasta a ocorrência de fraude à execução nos moldes do
enunciado n. 375 da Súmula do STJ.
4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.
(STJ. REsp 726.323/SP. Relator: Min. Mauro Campbell Marques. Segunda
Turma. DJe de 17/08/2009).
3.3.2.2 – Depois do REsp 1.141.990/PR
Entretanto, em 10/11/2010, quando a Primeira Seção do Superior Tribunal de
Justiça foi instada a se manifestar no paradigmático Recurso Especial de n.º
1.141.990/PR, os ministros Castro Meira, Arnaldo Esteves Lima, Humberto Martins,
Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves e Hamilton Carvalhido – que outrora,
na qualidade de relatores dos recursos relativos a esta questão jurídica, guiavam o os
seus julgamentos em conformidade com o entendimento jurisprudencial até então
pacificamente vigente - votaram com o relator Luiz Fux para afastar, pelo critério da
especialidade, a incidência da súmula até então aplicável, estabelecendo presunção
absoluta (iure et iure) de fraude à execução pela só existência do eventum damni.
Assentou-se nas razões de decidir recursais que, pelo fato de haver uma pessoa
jurídica de direito público buscando a satisfação de um crédito tributário, enquanto
receita pública derivada destinada ao atendimento das necessidades e satisfações do
interesse público, dever-se-ia analisar o instituto processual em questão de modo
diferenciado com relação aos processos nos quais participam apenas particulares.
Portanto, ao considerar o interesse público subjacente à execução fiscal
tributária, firmou-se o entendimento de que, para a configuração da fraude processual
seria prescindível o prévio registro da penhora do bem alienado ou comprovação de má-
fé do terceiro, afastando a incidência da súmula de n.º 375.
56
E mais, indo além da fixação da nova regra geral, segundo a qual a fraude à
execução fiscal desta natureza se operar in re ipsa, dispensando a identificação do
concilium fraudis, estabeleceu-se que esta interpretação projetaria seus efeitos inclusive
para os negócios jurídicos celebrados antes da vigência da Lei Complementar n.º
118/2005, devendo-se observar apenas os critérios temporais da “citação válida” ou da
“inscrição do débito em dívida ativa”, em atenção ao postulado do tempus regit actum.
A saber, caso a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu início, tenha
ocorrido antes de 09 de junho de 2005, a configuração do negócio jurídico como
fraudulento será declarada objetivamente quando houver sido efetivada após a citação
válida em execução fiscal. Por outro lado, caso a celebração do negócio jurídico tenha
ocorrido a partir de 09 de junho de 2005, o marco temporal será a inscrição do débito
tributário em dívida ativa, conforme o acórdão paradigma abaixo transcrito:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. DIREITO TRIBUTÁRIO.
EMBARGOS DE TERCEIRO. FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL.
ALIENAÇÃO DE BEM POSTERIOR À CITAÇÃO DO DEVEDOR.
INEXISTÊNCIA DE REGISTRO NO DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO -
DETRAN. INEFICÁCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO. INSCRIÇÃO EM
DÍVIDA ATIVA. ARTIGO 185 DO CTN, COM A REDAÇÃO DADA
PELA LC N.º 118⁄2005. SÚMULA 375⁄STJ. INAPLICABILIDADE.
1. A lei especial prevalece sobre a lei geral (lex specialis derrogat lex
generalis), por isso que a Súmula n.º 375 do Egrégio STJ não se aplica às
execuções fiscais.
2. O artigo 185, do Código Tributário Nacional - CTN, assentando a
presunção de fraude à execução, na sua redação primitiva, dispunha que:
"Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou
rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda
Pública por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa em
fase de execução.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem
sido reservados pelo devedor bens ou rendas suficientes ao total pagamento
da dívida em fase de execução."
3. A Lei Complementar n.º 118, de 9 de fevereiro de 2005, alterou o artigo
185, do CTN, que passou a ostentar o seguinte teor:
"Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou
rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda
Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem
sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento
da dívida inscrita."
4. Consectariamente, a alienação efetivada antes da entrada em vigor da LC
n.º 118⁄2005 (09.06.2005) presumia-se em fraude à execução se o negócio
jurídico sucedesse a citação válida do devedor; posteriormente à 09.06.2005,
consideram-se fraudulentas as alienações efetuadas pelo devedor fiscal após a
inscrição do crédito tributário na dívida ativa.
5. A diferença de tratamento entre a fraude civil e a fraude fiscal justifica-se
pelo fato de que, na primeira hipótese, afronta-se interesse privado, ao passo
que, na segunda, interesse público, porquanto o recolhimento dos tributos
serve à satisfação das necessidades coletivas.
57
6. É que, consoante a doutrina do tema, a fraude de execução, diversamente
da fraude contra credores, opera-se in re ipsa, vale dizer, tem caráter
absoluto, objetivo, dispensando o concilium fraudis. (FUX, Luiz. O novo
processo de execução: o cumprimento da sentença e a execução extrajudicial.
1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 95-96 ⁄ DINAMARCO, Cândido
Rangel. Execução civil. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 278-282 ⁄
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 22. ed. São Paulo:
Malheiros, 2003, p. 210-211 ⁄ AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro.
11. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 472-473 ⁄ BALEEIRO, Aliomar. Direito
Tributário Brasileiro. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 604).
7. A jurisprudência hodierna da Corte preconiza referido entendimento
consoante se colhe abaixo:
“O acórdão embargado, considerando que não é possível aplicar a nova
redação do art. 185 do CTN (LC 118⁄05) à hipótese em apreço (tempus regit
actum), respaldou-se na interpretação da redação original desse dispositivo
legal adotada pela jurisprudência do STJ”.
(EDcl no AgRg no Ag 1.019.882⁄PR, Rel. Ministro Benedito Gonçalves,
Primeira Turma, julgado em 06⁄10⁄2009, DJe 14⁄10⁄2009)
"Ressalva do ponto de vista do relator que tem a seguinte compreensão sobre
o tema: [...] b) Na redação atual do art. 185 do CTN, exige-se apenas a
inscrição em dívida ativa prévia à alienação para caracterizar a presunção
relativa de fraude à execução em que incorrem o alienante e o adquirente
(regra aplicável às alienações ocorridas após 9.6.2005);”.
(REsp 726.323⁄SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma,
julgado em 04⁄08⁄2009, DJe 17⁄08⁄2009)
"Ocorrida a alienação do bem antes da citação do devedor, incabível falar
em fraude à execução no regime anterior à nova redação do art. 185 do CTN
pela LC 118⁄2005".
(AgRg no Ag 1.048.510⁄SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma,
julgado em 19⁄08⁄2008, DJe 06⁄10⁄2008)
“A jurisprudência do STJ, interpretando o art. 185 do CTN, até o advento da
LC 118⁄2005, pacificou-se, por entendimento da Primeira Seção (EREsp
40.224⁄SP), no sentido de só ser possível presumir-se em fraude à execução a
alienação de bem de devedor já citado em execução fiscal”.
(REsp 810.489⁄RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em
23⁄06⁄2009, DJe 06⁄08⁄2009)
8. A inaplicação do art. 185 do CTN implica violação da Cláusula de Reserva
de Plenário e enseja reclamação por infringência da Súmula Vinculante n.º
10, verbis: "Viola a cláusula de reserva de plenário (cf, artigo 97) a decisão
de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua
incidência, no todo ou em parte."
9. Conclusivamente: (a) a natureza jurídica tributária do crédito conduz a que
a simples alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, pelo
sujeito passivo por quantia inscrita em dívida ativa, sem a reserva de meios
para quitação do débito, gera presunção absoluta (jure et de jure) de fraude à
execução (lei especial que se sobrepõe ao regime do direito processual civil);
(b) a alienação engendrada até 08.06.2005 exige que tenha havido prévia
citação no processo judicial para caracterizar a fraude de execução; se o ato
translativo foi praticado a partir de 09.06.2005, data de início da vigência da
Lei Complementar n.º 118⁄2005, basta a efetivação da inscrição em dívida
ativa para a configuração da figura da fraude; (c) a fraude de execução
prevista no artigo 185 do CTN encerra presunção jure et de jure, conquanto
componente do elenco das "garantias do crédito tributário"; (d) a inaplicação
do artigo 185 do CTN, dispositivo que não condiciona a ocorrência de fraude
a qualquer registro público, importa violação da Cláusula Reserva de
Plenário e afronta à Súmula Vinculante n.º 10, do STF.
10. In casu, o negócio jurídico em tela aperfeiçoou-se em 27.10.2005 , data
posterior à entrada em vigor da LC 118⁄2005, sendo certo que a inscrição em
dívida ativa deu-se anteriormente à revenda do veículo ao recorrido,
58
porquanto, consoante dessume-se dos autos, a citação foi efetuada em data
anterior à alienação, restando inequívoca a prova dos autos quanto à
ocorrência de fraude à execução fiscal.
11. Recurso especial conhecido e provido. Acórdão submetido ao regime do
artigo 543-C do CPC e da Resolução STJ n.º 08⁄2008.
(STJ. Resp nº 1.141.990/PR. Primeira Seção. Relator: Ministro LUIZ FUX.
DJe de 19/11/2010)
Conclui-se, pois, que em decorrência da nova conformação jurisprudencial
dada ao texto normativo do artigo 185, do Código Tributário Nacional, surgiram duas
novas consequências. A saber, a primeira, como bem pontua Luís Eduardo Schoueri
(2011), reside na necessidade de o comprador investigar se há débito inscrito na dívida
ativa em face do vendedor e, em caso afirmativo, certificar-se documentalmente que, ao
momento da celebração do negócio jurídico, este possuía, em seu patrimônio, bens ou
rendas suficientes para a satisfação do débito fiscal.
A segunda consequência, por seu turno, passou a ser observada no âmbito
jurisdicional, e reside no fato de o novel entendimento jurisprudencial vir sendo
aplicado no julgamento das ações de embargos de terceiro propostas pelos adquirentes
ou cessionários de boa-fé, assim como para o deferimento de pedidos incidentes de
fraude à execução, ainda que a celebração dos respectivos negócios jurídicos tenham-se
dado na vigência da antiga redação do artigo 185, do Código Tributário Nacional e
quando o próprio Poder Judiciário serenamente entendia ser aplicável a súmula de n.º
375, da jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça.
Diante dessa nova conformação, cabe indagar se a alteração jurisprudencial
ocorrida, que afastou a incidência de um entendimento jurisprudencial até então
pacificamente consolidado, poderia retroagir para tolher a eficácia de negócios jurídicos
celebrados antes de sua existência. Afinal, ao se declarar a ineficácia dos negócios
jurídicos sem se perquirir acerca da boa-fé do adquirente e das nuances do caso
concreto, não se estaria descurando dos efeitos jurídicos deletérios à eficácia dos
negócios jurídicos celebrados em conformidade com o entendimento jurisprudencial até
então vigente?
Não se olvidando que o Superior Tribunal de Justiça até 09/11/2010 sempre
decidia diferentemente, assentando ser indispensável o prévio registro da penhora ou
prova da má-fé, e que, inclusive, dentre os precedentes que ensejaram a edição da
súmula n.º 375, alguns tinham por objeto justamente a fraude à execução fiscal
59
tributária, aplicar o novo entendimento do referido Recurso Especial aos negócios
jurídicos anteriores à sua vigência não macularia a segurança jurídica?
Diante dessas problematizações atinentes aos limites e conformações da nova
interpretação jurídica dada pelo paradigma estudado à luz do princípio constitucional da
segurança jurídica é que o presente trabalho acadêmico se desenvolverá.
Será a partir da evolução legislativa procedida na esfera do processo civil
brasileiro, que o aproximou da lógica processual do common law ao conferir crescente
importância para os precedentes judiciais, que se analisará o cabimento da modulação
dos efeitos à nova interpretação jurisprudencial do artigo 185, do Código Tributário
Nacional, de modo a harmonizá-la com o mandamento constitucional da segurança
jurídica.
Neste momento, então, passar-se-á ao estudo da relevância e efeitos dos
precedentes judiciais para, ao cabo, assentar a solução adequada.
60
4 A SEGURANÇA JURÍDICA NA APLICAÇÃO DO RESP
1.141.990/PR
4.1 O efeito vinculante dos precedentes judiciais
Questão que vem ganhando relevo na doutrina a partir das evoluções
legislativas na esfera do processo civil é a natureza jurídica dos precedentes judiciais no
sistema jurídico brasileiro, sua aplicação e graus de vinculação.
Em definição propedêutica, com base nas lições de Karl Larenz (2005), pode-
se considerar o termo “precedente” como uma decisão judicial proferida a partir de uma
situação jurídica concreta e cujas razões fundamentais de decidir têm a aptidão de servir
como parâmetro para a posterior apreciação judicial de casos análogos. Em síntese, os
precedentes judiciais são decisões jurídicas proferidas por órgãos jurisdicionais e cujo
núcleo essencial direciona a resolução de demandas semelhantes.
Por se tratar de decisão judicial, todo precedente é composto pela descrição
fática da situação jurídica apreciada, pela tese jurídica assentada na motivação e pelo
dispositivo decisório, sob o qual recai, no direito objetivo pátrio, o atributo
constitucional da coisa julgada (artigo 5º, XXXVI85
, da CF c/c os artigos 46786
e 46987
,
ambos do CPC). Entretanto, para a lógica precedentalista, é apenas a ratio decidendi,
enquanto norma geral e tese jurídica fundamental, que tem a aptidão de projetar seus
efeitos para casos similares.
Por outro lado, não se pode confundir a ratio decidendi com a integralidade da
argumentação jurídica dispendida pelo magistrado, posto que aquela fica adstrita ao
raciocínio lógico-jurídico essencial e indispensável à norma individual proferida no
dispositivo decisório. Assim, a toda argumentação periférica, secundária e dispensável à
fundamentação da norma individual criada, ainda que se encontre topograficamente na
fundamentação, dar-se-á o nome de obter dictum (DIDIER JR., 2012).
Feitas essas considerações, cabe indagar se, no atual contexto jurídico, os
precedentes têm efeito meramente persuasivo, eficácia expansiva ou caráter obrigatório.
85
“A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. 86
“Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais
sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”. 87
“Art. 469. Não Fazem coisa julgada: I – os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance
da parte dispositiva da sentença; II – a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença; III
– a apreciação da questão prejudicial, decidida incidentalmente no processo.”.
61
Para Tércio Sampaio Ferraz Jr. (2010), a jurisprudência no Brasil não pode ser
considerada como fonte normativa do direito, senão elemento persuasivo na
interpretação normativa, porquanto não tem força vinculante e obrigatória. Por outro
lado, Luiz Guilherme Marinoni (2011) defende a autoridade dos precedentes dos
tribunais superiores, sobretudo para conferir coerência à ordem jurídica e resguardar a
previsibilidade e confiança nos atos do Poder Judiciário.
De todo modo, independente da posição doutrinária adotada, é inegável que o
Poder Judiciário tem rompido com a tradição conservadora, de origem ideológica liberal
do século XIX, assumindo um papel de protagonista que vem sendo refletido no próprio
ensino e pesquisa jurídicos e alçando o fundamento das decisões a uma importância
superior à própria lei (FERRAZ JR., 2014).
Ao decidir, o magistrado cria duas normas jurídicas distintas, a saber: a) uma
norma de caráter geral, oriunda da interpretação do texto normativo a partir dos fatos
narrados; e b) uma segunda norma, de caráter individual, criada e aplicada para o mérito
específico da demanda em apreço (FERRAZ JR., 2010).
Explica Fredie Diddier Jr. (2012, p. 383) que a primeira norma é
geral porque, tal como ocorre com os princípios gerais a que se chega por
raciocínio indutivo, a tese jurídica (ratio decidendi) se desprende do caso
específico e pode ser aplicada em outras situações concretas que se
assemelhem àquela em que foi originalmente construída.
Portanto, conclui-se que a vocação de universalidade da ratio decidendi é uma
realidade em qualquer sistema jurídico, quer assentado na lógica do civil law, quer
ligado à família do common law, diferenciando-se apenas no grau de autoridade que
logra em seus ordenamentos jurídicos (MARINONI, 2012).
Nos países de origem anglo-saxônica perfilhados ao sistema do common law,
sedimentou-se, com mais rigor, a teoria do stare decisis et non quieta movere88
,
segundo a qual os precedentes judicias, sobretudo dos tribunais superiores, revestir-se-
iam de eficácia vinculante não apenas perante a própria corte que os prolatou, mas
sobretudo perante os órgãos jurisdicionais hierarquicamente inferiores. A essa tese da
eficácia vertical dos precedentes deu-se o nome de doctrine of binding precedent, cuja
origem remonta à Inglaterra do século XIX e reconhecimento judicial se deu na Câmara
88
Brocardo latino segundo o qual o que já foi decidido deve ser aplicado sem variação.
62
dos Lordes inglesa por ocasião do julgamento do leading case London Tramways
Company x London County Concil (DIDIER JR., 2012).
Contudo, na experiência jurídica brasileira, é fato que o legislador vem, há
algum tempo, conferindo crescente autoridade aos precedentes judiciais, sobretudo dos
tribunais superiores, com vistas a garantir maior coerência, uniformidade e isonomia na
aplicação do direito, para resguardar a segurança jurídica na aplicação do direito posto e
propiciar maior celeridade no julgamento de questões idênticas.
Por ocasião do julgamento da paradigmática Reclamação Constitucional nº
4.335/AC, na qual se discutiu a tese da abstrativização do controle difuso de
constitucionalidade89
e a eventual ocorrência de mutação constitucional do artigo 52, X,
da Constituição Federal90
, defendida pelo ministro relator Gilmar Mendes, o ministro
Teori Albino Zavascki, ao proferir seu voto-vista, teceu minuciosa retrospectiva da
evolução legislativa que conferiu aos precedentes judiciais das cortes superiores o que
denominou de “força expansiva”, fato que vem aproximando, paulatinamente, o sistema
jurídico brasileiro da cultura do stare decisis, inerente ao sistema do common law.
Nos termos do referido voto-vista,
Não se pode deixar de ter presente, como cenário de fundo indispensável à
discussão aqui travada, a evolução do direito brasileiro em direção a um
sistema de valorização dos precedentes judiciais emanados dos tribunais
superiores, aos quais se atribui, cada vez com mais intensidade, força
persuasiva e expansiva em relação aos demais processos análogos. Nesse
ponto, o Brasil está acompanhando um movimento semelhante ao que
também ocorre em diversos outros países que adotam o sistema da civil law,
que vêm se aproximando, paulatinamente, do que se poderia denominar de
cultura do stare decisis, própria do sistema da common law. A doutrina tem
registrado esse fenômeno, que ocorre não apenas em relação ao controle de
constitucionalidade, mas também nas demais áreas de intervenção dos
tribunais superiores, a significar que a aproximação entre os dois grandes
sistemas de direito (civil law e common law) é fenômeno em vias de franca
generalização (...)
É interessante ilustrar a paulatina, mas persistente, caminhada do direito
brasileiro no rumo da valorização dos precedentes judiciais, no âmbito da
jurisdição geral (e não, exclusivamente, da constitucional, de que se tratará
mais adiante) mencionando alguns de seus mais expressivos movimentos. Em
1963, o Regimento Interno do STF (art. 102) instituiu a Súmula da
Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal, instrumento
prático ainda hoje importantíssimo para viabilizar a força persuasiva dos
89
Tese segundo a qual o precedente firmado em sede de recurso extraordinário também seria aplicável a
casos análogos, ante a relevância, objetividade e repercussão social da matéria suscitada. Assim, a ratio
decidendi firmada pelo Supremo Tribunal Federal adquiriria eficácia erga omnes e deveria abarcar casos
concretos que se enquadrassem na moldura fática similar que serviu como premissa para a aplicação da
interpretação constitucional de determinado dispositivo objeto de controle difuso. 90
“art. 52. Compete Privativamente ao Senado Federal: (...) X – suspender a execução, no todo ou em
parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;”.
63
precedentes da Corte. No regime original do Código de Processo Civil de
1973, previu-se mecanismo de uniformização de jurisprudência e de edição
de súmulas (art. 479 do CPC), a evidenciar a preocupação de dar tratamento
isonômico aos demais casos semelhantes. Logo depois, a LC 35/1979 (Lei
Orgânica da Magistratura - LOMAN), autorizou que, nos processos de
competência do Tribunal Federal de Recursos (TFR), o relator negasse
seguimento a recurso contrário a “súmula do Tribunal ou do STF” (art. 90, §
2.º, da LC 35/1979), o que representou manifestação inequívoca da força
expansiva desses enunciados. Seguiu-se, no mesmo sentido, a Lei
8.038/1990, que, em seu art. 38, autorizou o relator, no STF e no STJ, a negar
seguimento a recurso contrário a “súmula do respectivo tribunal”.
O movimento em direção à força subordinante dos precedentes (não apenas
dos sumulados, mas também dos demais) foi acelerado com as reformas do
Código de Processo Civil ocorridas a partir de 1994. A nova redação do art.
557 e de seus parágrafos autorizou o relator, nos tribunais, a,
individualmente, negar seguimento a recursos, quando a decisão recorrida
estiver adequada às súmulas ou à jurisprudência dominante do respectivo
tribunal ou dos tribunais superiores; e a dar-lhes provimento, quando a
decisão recorrida estiver em confronto com súmula ou jurisprudência
dominante dos tribunais superiores. Pelo art. 544, §§ 3.º e 4.º, do CPC, foi
atribuída competência ao relator de agravo de instrumento em recurso
especial e em recurso extraordinário para, desde logo, invocando
jurisprudência ou súmula do STJ ou STF, conhecer do agravo e prover o
próprio recurso especial ou o próprio recurso extraordinário. O parágrafo
único do art. 481 instituiu o sistema de vinculação dos órgãos fracionários
dos Tribunais aos seus próprios precedentes e, quando houver, aos do STF,
nos incidentes de inconstitucionalidade. Em 1998, o parágrafo único do art.
120 do CPC trouxe autorização para o relator decidir de plano conflito de
competência quando há “jurisprudência dominante do tribunal sobre a
questão suscitada”. Em 2001, o art. 475, § 3.º, do CPC, dispensou o reexame
necessário das sentenças que adotam jurisprudência do plenário do STF ou
súmula do tribunal superior competente. Na mesma época, o art. 741,
parágrafo único, passou a atribuir a decisões do STF sobre a
inconstitucionalidade de normas, mesmo em controle difuso, a eficácia de
inibir a execução de sentenças a ele contrárias (verdadeira eficácia
rescisória), o que foi reafirmado em 2005, pelo art. 475-L, § 1.º, do CPC. Em
2006, o art. 518, § 1.º, do CPC passou a considerar descabida a apelação
contra sentenças proferidas com base em súmulas do STF ou do STJ (típica
consagração da súmula impeditiva de recurso). No mesmo ano, os arts. 543-
A e 543-B do CPC, ao disciplinarem a “repercussão geral” para efeito de
conhecimento de recursos extraordinários (art. 102, §3.º, da CRFB/1988),
reafirmaram notavelmente e deram sentido prático à força dos precedentes do
STF. Em 2008, foi editada a Lei 11.672/2008, que acrescentou o art. 543-C
ao CPC, instituindo, para recursos especiais repetitivos, um sistema de
julgamento semelhante ao da repercussão geral. O sistema não apenas
confere especial força expansiva aos precedentes do STF e do STJ, mas
também institui fórmulas procedimentais para tornar concreta e objetiva a sua
aplicação aos casos pendentes de julgamento.
No âmbito dos juizados especiais federais, o regime de vinculação aos
precedentes dos Tribunais Superiores vem desde a sua origem, com a Lei
10.259/2001. O seu art. 14 dessa Lei criou um mecanismo de “uniformização
de interpretação de lei federal”, de competência de um órgão de caráter
nacional (a “Turma de Uniformização” – § 2.º), cujo referencial último é a
observância da “sumula ou jurisprudência dominante no STJ” (§ 4.º). Em
caso de demandas repetitivas, instalado o incidente, ficam retidos os demais
recursos (§§ 5.º a 8.º), os quais, após a definição da interpretação pelo órgão
superior, serão julgados nas Turmas Recursais, que poderão “exercer o juízo
de retratação ou declará-los prejudicados” (§ 9.º). Havendo recurso
extraordinário, nos Juizados, ele será processado e julgado pelo mesmo
sistema dos §§ 4.º a 9.º do art. 14 (art. 15), de modo que o precedente assim
64
formado terá a força de impor julgamento idêntico aos demais recursos sobre
a matéria decidida. Regime semelhante foi instituído pela Lei 12.153/2009 ao
“Sistema dos Juizados Especiais dos Estados e do Distrito Federal” (que
inclui todos os órgãos dos Juizados, e não apenas os Juizados da Fazenda
Pública – art.1.º, parágrafo único): o “pedido de uniformização de
interpretação de lei quando houver divergência entre decisões proferidas por
Turmas Recursais sobre questões de direito material” (art. 18), será julgado,
em reunião conjunta das Turmas em conflito, sob a presidência de um
desembargador (art. 18, § 1.º); e será julgado pelo STJ “quando as Turmas de
diferentes Estados derem a lei federal interpretações divergentes, ou quando a
decisão proferida estiver em contrariedade com súmula do Superior Tribunal
de Justiça” (art. 18, § 3.º). Foi criado, também, o pedido de “manifestação”
do STJ, para dirimir divergência “quando a orientação acolhida pelas Turmas
de Uniformização (...) contrariar súmula do Superior Tribunal de Justiça”
(art. 19). Nos casos do § 3.º do art. 18 e do art. 19, em que é provocado o
pronunciamento do STJ, os pedidos semelhantes ficarão retidos (art. 19,
parágrafo único); publicado o acórdão do STJ, esses pedidos “serão
apreciados pelas Turmas Recursais, que poderão exercer juízo de retratação
ou os declararão prejudicados, se veicularem tese não acolhida pelo Superior
Tribunal de Justiça” (art. 19, § 6.º). Quanto ao recurso extraordinário, o
processo e o julgamento obedecerão a esse mesmo método (art. 15), a
significar, aqui também, que o precedente repercutirá no julgamento de todos
os demais recursos em tema semelhante.
Portanto, nota-se que esse fenômeno de aproximação das decisões
jurisdicionais pátrias da filosofia do stare decisis não se limitou ao controle de
constitucionalidade. Ao revés, é um fenômeno que se encontra em evolução,
abrangendo os demais ramos jurisdicionais dos tribunais superiores e do sistema dos
juizados especiais. Afinal, como leciona Carlos Alberto Álvaro de Oliveira (2009, p.
81),
Em tais hipóteses, embora possa estar em jogo o direito da parte, subjaz no
fundo o interesse público, seja pela coordenação do conteúdo dos
julgamentos, seja pela declaração de ilegitimidade ou legitimidade das leis
atos normativos infraconstitucionais, tudo para diminuir as possibilidades de
erros e contradições, incrementando, assim, mediante o aperfeiçoamento da
distribuição de justiça, a confiança do cidadão na autoridade do Estado.
A observância às razões expendidas pelo Poder Judiciário, nesse contexto,
também passa a influenciar a própria atuação da Administração Pública, como compeliu
a União a compensar os prejuízos decorrentes dos expurgos inflacionários aos saldos do
FGTS, após o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, dos Recursos
Extraordinários de n.º 248.188/SC e 226.855/RS – sequer submetidos ao regime da
repercussão geral–, fato que motivou, inclusive, o legislativo a instituir a contribuição
65
especial do artigo 1º, caput91
, da Lei Complementar 110/2001, e estabelecer, nos termos
dos artigos 3º, §1º, e 4º, caput, do mesmo diploma normativo, que
Art. 3º [...]
§1º As contribuições sociais serão recolhidas na rede arrecadadora e
transferidas à Caixa Econômica Federal, na forma do art. 11 da Lei nº 8.036,
de 11 de maio de 1990, e as respectivas receitas serão incorporadas ao FGTS.
[...]
Art. 4º Fica a Caixa Econômica Federal autorizada a creditar nas contas
vinculadas do FGTS, a expensas do próprio Fundo, o complemento de
atualização monetária resultante da aplicação, cumulativa, dos percentuais de
dezesseis inteiros e sessenta e quatro centésimos por cento e de quarenta e
quatro inteiros e oito décimos por cento, sobre os saldos das contas mantidas,
respectivamente, no período de 1º de dezembro de 1988 a 28 de fevereiro de
1989 e durante o mês de abril de 1990...
De igual modo, em atenção à transcendência das razões de decidir assentadas
na jurisprudência dos Tribunais Superiores (Supremo Tribunal Federal, Superior
Tribunal de Justiça, Tribunal Superior do Trabalho e Tribunal Superior Eleitoral) é que
se podem compreender as inovações legislativas introduzidas pela Lei nº 12.884, de
2013 ao artigo 19, da Lei 10.522/2002, que estatui, in verbis:
Art. 19. Fica a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional autorizada a não
contestar, a não interpor recurso ou a desistir do que tenha sido interposto,
desde que inexista outro fundamento relevante, na hipótese de a decisão
versar sobre:
[...]
II – matérias que, em virtude de jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal
Federal, do Superior Tribunal de Justiça, do Tribunal Superior do Trabalho e
do Tribunal Superior Eleitoral, sejam objeto de ato declaratório do
Procurador-Geral da Fazenda Nacional, aprovado pelo Ministro de Estado da
Fazenda; (Redação dada pela Lei nº 12.844, de 2013);
[...]
IV – matérias decididas de modo desfavorável à Fazenda Nacional pelo
Supremo Tribunal Federal, em sede de julgamento realizado nos termos do
art. 543-B da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo
Civil; (Incluído pela Lei nº 12.844, de 2013).
V – matérias decididas de modo desfavorável à Fazenda Nacional pelo
Superior Tribunal de Justiça, em sede de julgamento realizado nos termos dos
art. 543-C da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo
Civil, com exceção daquelas que ainda possam ser objeto de apreciação pelo
Supremo Tribunal Federal. (incluído pela Lei nº 12.844, de 2013).
[...]
Na esfera normativa estadual, é digna de menção a Lei Complementar n.º
303/2005, do Estado do Rio Grande do Norte, que, ao estabelecer normas gerais para os
91
“Fica instituída contribuição social devida pelos empregadores em caso de despedida de empregado
sem justa causa, à alíquota de dez por cento sobre o montante de todos os depósitos devidos, referentes ao
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, durante a vigência do contrato de trabalho, acrescido
das remunerações aplicáveis às contas vinculadas”.
66
processos administrativos no âmbito estadual, impôs o dever de motivação aos atos que
“deixem de aplicar a jurisprudência firmada sobre a questão” (artigo 13, VI).
Aos que vivenciam a praxe forense é fácil constatar que, na prolação de
decisões e sentenças, tornou-se regra a transcrição ou, ao menos, menção de precedentes
judiciais, sobretudo dos Tribunais aos quais os magistrados estão diretamente
subordinados e das Cortes Superiores, às quais, por mandamento constitucional,
incumbiram-se de uniformizar a interpretação em matérias infraconstitucionais e
constitucionais.
Com maior frequência, encontram-se transcrições de precedentes oriundos de
Tribunais Superiores nos acórdãos dos Tribunais de Segundo Grau (Tribunais de
Justiça, Tribunais Regionais Federais, Tribunais Regionais Eleitorais e Tribunais
Regionais do Trabalho), bastando uma simples consulta em seus sítios virtuais ou no
site da “jurisprudência unificada” administrado pelo Conselho da Justiça Federal para
que se comprove tal assertiva.
Esse fato, porém, não decorre simplesmente do caráter persuasivo dos
precedentes judiciais, mas, sobretudo, da necessidade de o Poder Judiciário proferir
decisões isonômicas e coerentes de modo mais célere e efetivo possíveis, buscando
fazer frente à proliferação de demandas judiciais similares e evitando, sempre que
possível, a multiplicação de incidentes e recursos processuais jurisprudencialmente
infundados. Afinal, os precedentes judiciais, “sobretudo os dos tribunais superiores,
pelo menos quando não deparam com uma contradição demasiado grande, são
considerados, decorrido algum tempo, Direito vigente” (LARENZ 2005, p. 611).
Nesse sentido, o simples acompanhamento das sessões das Câmaras e Turmas
dos Tribunais de Segundo Grau demonstrará que, não raras às vezes, seus integrantes
votam em determinado sentido “ressalvando seus entendimentos pessoais”,
principalemente quando a questão já se encontra pacificada pelos respectivos Órgãos
Fracionários, pela Corte Especial, pelo Tribunal Pleno e pelos Tribunais Superiores
competentes. A título de ilustração, observe-se a ementa do REsp 726.323/SP,
colacionada no tópico 3.3.2.1.
Sucede que, como bem elucida Dimitri Dimoulis (2003, p. 194-195),
Os tribunais inferiores sabem que eventual decisão contra uma jurisprudência
‘assentada’ não será admitida nas instâncias superiores, por considerarem que
as mudanças de entendimentos comprometem tanto a segurança jurídica
como a autoridade do próprio Poder Judiciário. Por essas razões a
67
jurisprudência assentada influencia de forma decisiva as futuras decisões dos
tribunais.
Portanto, em termos práticos, a jurisprudência se tornou verdadeiro “guia
obrigatório” das decisões, por ser dotada, ao menos, de força vinculante material.
Exemplo desse fato é o requisito jurisprudencial da dupla conformidade para a aplicação
da sentença de improcedência prima facie, nos termos do artigo 285-A, caput, do
Código de Processo Civil, que estabelece, in verbis:
Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no
juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros
casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença,
reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada.
Explicando melhor, assentou-se na jurisprudência pátria que, para que a
aplicação do artigo 285-A, do Código de Processo Civil, atenda a sua finalidade,
enquanto instrumento de racionalidade e aceleração processual92
, é necessário que as
razões de decidir do juízo de 1º grau se encontrem em harmonia com o entendimento do
Tribunal e dos Tribunais Superiores93
.
É certo que, nesses casos, a vinculação aos precedentes não se dá,
formalmente, em paridade com a eficácia das Súmulas Vinculantes, criadas pelo Poder
Constituinte Derivado, ao positivar o artigo 103-A94
, da Constituição Federal, através da
Emenda Constitucional nº 45/2004, e regulamentadas pela Lei nº 11.417/2006.
Afinal, além de ser dotada de objeto específico (Artigo 103-A, caput e §1º95
, da
CF c/c o artigo 2º, caput e §1º, da Lei nº 11.417/2006), lograr de hipóteses de iniciativa
92
Na Exposição de Motivos n.º 00186-MJ,de 19 de novembro de 2004, o então Ministro da Justiça
Márcio Thomas Bastos assentou que “Sob a perspectiva das diretrizes estabelecidas para a reforma da
Justiça, faz-se necessária a alteração do sistema processual brasileiro com o escopo de conferir
racionalidade e celeridade ao serviço de prestação jurisdicional, sem contudo, ferir o direito ao
contraditório e à ampla defesa”. 93
“O art. 285-A do CPC constitui importante técnica de aceleração do processo. É necessário, para que o
objetivo visado pelo legislador seja alcançado, que o entendimento do juiz de 1º grau esteja em
consonância com o entendimento do Tribunal local e dos Tribunais Superiores (dupla conforme)”. (STJ.
REsp 1.225.227/MS. Relatora: Min. Nancy Andrighi. Terceira Turma. DJe de 12/06/2013). 94
“Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de
dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que,
a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do
Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem
como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.” 95
“§1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca
das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que
acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.
(incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).”.
68
constitucionalmente estabelecidas (Artigo 103-A, §2º96
, da CF) e ter procedimento
próprio (Resoluções nº 381/2008 e 388/2008, ambas do STF) para sua edição, revisão e
cancelamento (artigo 5º, da Lei 11.417/2006)97
, o Constituinte Derivado lhe atribuiu
eficácia vinculante perante os demais órgãos do Poder Judiciário e da Administração
Pública, a partir da publicação do enunciado em seção especial do Diário de Justiça do
Diário Oficial da União e estabeleceu o cabimento de instrumento processual próprio,
qual seja, a Reclamação perante o Supremo Tribunal Federal (artigo 103-A, §3º98
, da
CF c/c o artigo 7º99
, da Lei nº 11.417/2006), para reprimir sua inobservância e preserva-
lhe a eficácia.
A procedência da Reclamação, inclusive, implicará na anulação do ato
administrativo divergente ou cassação da decisão judicial reclamada, ocasiões nas quais
se determinará a renovação dos atos, com observância da Súmula Vinculante pertinente.
Outro aspecto digno de menção a respeito da edição de Súmula Vinculante é a
possibilidade de manifestação dos interessados na questão jurídica envolvida na edição
da Súmula Vinculante, fato que, lastreado pela concepção pluralista pensada por Peter
Haberle (1997), buscou aproximar a interpretação do Poder Judiciário à realidade social,
a partir da participação ativa dos destinatários finais do processo hermenêutico de
concretização dos textos normativos.
Não por outra razão, Edilson Pereira Nobre Jr. (2008, p. 23), ao analisar o
mencionado artigo 103-A, da Constituição Federal,
constata que, sem sombra de dúvidas, pode-se considerá-la como norma
jurídica. Representa guia de conduta, pois informa como deverão atuar os
juízes e a Administração Pública na tomada de decisões, influenciando o agir
dos particulares.
96
“§2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de
súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade.”
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004). 97
“Art. 5º Revogada ou modificada a lei em que se fundou a edição de enunciado de súmula vinculante, o
Supremo Tribunal Federal, de ofício ou por provocação, procederá à sua revisão ou cancelamento,
conforme o caso”. 98
“§3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente
a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato
administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem
a aplicação da súmula, conforme o caso.” (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004). 99
“Art. 7º Da decisão judicial ou do ato administrativo que contrariar enunciado de súmula vinculante,
negar-lhe vigência ou aplica-lo indevidamente caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal, sem
prejuízo dos recursos ou outros meios admissíveis de impugnação. [...]”.
69
Por oportuno, não se pode olvidar que a Lei 11.417/2006 também adicionou
artigos à Lei Federal 9.784/1999, para estabelecer que, nos casos em que o impetrante
de recurso administrativo alegar violação a enunciado de súmula vinculante, o órgão
administrativo competente para a sua apreciação deverá arcar com o ônus
argumentativo de explicitar as razões da aplicabilidade ou inaplicabilidade do respectivo
enunciado sumular (artigo 64-A100
).
De igual modo, nos casos em que o Supremo Tribunal Federal acolher a
reclamação fundada em sua violação, dar-se-á ciência à autoridade prolatora e ao órgão
competente para o julgamento recursal, para que estes adequem suas futuras decisões
administrativas a casos análogos, “(...) sob pena de responsabilização pessoal nas
esferas cível, administrativa e penal.” (artigo 64-B).
Contudo, a dinâmica evolutiva das decisões judiciais já relatada aliada à
realidade prática e limitações inerentes ao Poder Judiciário é suficiente para alçar a
jurisprudência em patamar superior ao de simples elemento persuasivo ou azimute
interpretativo, lastro de uma resolução adequada e racional dotada de eficácia material,
independente da manifestação expressa do órgão jurisdicional que a produziu (DIDIER
JR., 2012) e ainda que esse fato propicie a resolução de casos sobre premissas
equivocadas.
Nesse sentido, encontram-se as lições de Edilson Pereira Nobre Jr. (2008, p.
55), ao asseverar que
provocadas pela necessidade de rápida solução do enorme número de feitos
que assoberbam os tribunais pátrios, em conjugação com a multíplice e
apressada (por vezes, até mesmo descuidada) coleta de ementas atualmente
propiciada pela navegação do internauta, revelam-se, nos últimos tempos,
com certa frequência, distorções na verdadeira compreensão dos precedentes.
O fenômeno, denominado de ementismo (...) vem favorecendo a solução de
casos concretos sob premissas equivocadas.
De todo modo, nosso sistema jurídico está caminhando para que a eficácia
vinculante dos precedentes judiciais seja terminantemente incorporada e reconhecida
em nosso direito objetivo. Veja-se, a título de ilustração, que o projeto do novo Código
de Processo Civil (PL 8.046/2010) prevê a criação do Incidente de Resolução de
Demandas Repetitivas, estabelecendo que, em casos de proliferação de demandas sobre
100
“Art. 64-A. Se o recorrente alegar violação de enunciado da súmula vinculante, o órgão competente
para decidir o recurso explicitará as razões da aplicabilidade ou inaplicabilidade da súmula, conforme o
caso.”
70
uma mesma questão jurídica, a tese jurídica (ratio decidendi/norma geral) adotada pelo
respectivo tribunal vinculará o julgamento de processos individuais ou coletivos que
tramitarem em sua área de jurisdição até posterior revisão pelo próprio tribunal.
A saber, os artigos 988, caput, e 995, caput, e §1º, do mencionado diploma
normativo vindouro prevêem, respectivamente, que:
Art. 988. É admissível o incidente de resolução de demandas repetitivas
quando, estando presente o risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica,
houver efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a
mesma questão unicamente de direito.
(...)
Art. 995. Julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada a todos os
processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de
direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive
àqueles que tramitem nos juizados especiais do respectivo estado ou região.
§ 1º A tese jurídica será aplicada, também, aos casos futuros que versem
idêntica questão de direito e que venham a tramitar no território de
competência do respectivo tribunal, até que esse mesmo tribunal a revise.
Entretanto, à vista de todo o exposto, ainda que se persista em admitir o caráter
meramente persuasivo dos precedentes judiciais e se negue o fato de que todo o
conjunto normativo constitucional e infraconstitucional está se direcionando para a
valorização dos precedentes judiciais, o presente trabalho monográfico está a analisar
uma modalidade diferente e especial destes, qual seja, o Recurso Repetitivo, que se
encontra positivado no artigo 543-C, do atual Código de Processo Civil101
, com redação
dada pela Lei dos Recursos Repetitivos (Lei 11.672/2008).
4.2 Os recursos repetitivos
Em uma classificação gradativa criada pela doutrina, nas quais se elencam as
espécies de precedentes a) persuasivos102
, b) obstativos da revisão de decisões103
e c)
vinculantes/obrigatórios, há posição doutrinária que enquadra os recursos repetitivos ao
101
“Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de
direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo.” 102
Os precedentes meramente persuasivos são aqueles que não têm eficácia vinculante. Noutros termos,
designa-se precedente persuasivo àquele ao qual o magistrado não está obrigado a seguir, senão como
elemento argumentativo. 103
Os precedentes obstativos de revisão de decisões judiciais são aqueles que autorizam a negativa de
seguimento a certos recursos ou dispensam o reexame necessário, quando as respectivas decisões estão
em consonância com os precedentes judiciais, sobretudo dos Tribunais Superiores. Exemplos dessa
espécie são encontrados nos artigos 475, §3º, 518, §1º, 544, §§3º e 4º, 557, todos do CPC. Em casos tais,
autoriza-se o órgão jurisdicional competente a apreciar a admissibilidade dos recursos a partir dos
precedentes firmados, possibilitando a negativa de seus seguimentos ou a dispensa do reexame
necessário, conforme leciona Fredie Didier Jr. (2012, p. 390).
71
lado das súmulas vinculantes, dos entendimentos consolidados na súmula de cada um
dos tribunais, perante estes, e da decisão que fixa a tese para os recursos extraordinários,
nesta terceira categoria (DIDIER JR., 2012, p. 388-389).
Em artigo publicado no site do ConJur em 27 de novembro de 2008104
, meses
após o início da vigência do mencionado instrumento processual, o ministro Luis Felipe
Salomão, do Superior Tribunal de Justiça, afirmou que
(...) a inclusão do art. 543-C no Código de Processo Civil, preceito cujo
processamento foi regulado pela Resolução 8/2008 do Superior Tribunal de
Justiça, permitirá a objetivação no julgamento dos recursos especiais, com a
análise, em abstrato, de questões reiteradamente conduzidas à
apreciação desta Corte, assentando seu entendimento e orientando a
atuação das instâncias ordinárias. (grifos não constantes do original).
Tal assertiva, contudo, não é pretensiosa ou inovadora, sintetizando, apenas e
tão somente, a intensão do legislador ao editar a referida Lei dos Recursos Repetitivos,
conforme se abstrai da Exposição de Motivos nº 40-MJ, de 05 de abril de 2007105
.
A saber, o então Ministro de Estado da Justiça, Tarso Genro, relatou na referida
Exposição de Motivos que o projeto de lei que criou os Recursos Repetitivos, incluindo
o artigo 543-C, no Código de Processo Civil, baseou-se em sugestão do ex-ministro do
Superior Tribunal de Justiça Athos Gusmão Carneiro, com os objetivos de conferir
racionalidade e celeridade à prestação jurisdicional, assim como também de amenizar os
problemas decorrentes do excesso de demandas judiciais naquela Corte de Justiça.
Não por outra razão, em atenção à tendência de objetivação no julgamento dos
recursos especiais é que se conferiu a oportunidade de os tribunais a quo adequarem
suas decisões prolatadas em casos semelhantes e que se encontram com recursos
especiais sobrestados à ratio decidendi sedimentada pelo Superior Tribunal de Justiça,
por ocasião do julgamento do paradigma, conforme o artigo 543-C, §7º, II106
, do CPC.
Em verdade, o próprio sobrestamento recursal tem a função prática de vincular a
resolução do mérito de suas lides à norma geral estabelecida pela Corte Cidadã.
104
Documento on-line, não datado e não paginado. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2008-nov-
27/stj_julgamento_recursos_repetitivos>. Acesso em: 07 set. 2014. 105
Documento on-line, não datado e não paginado. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Projetos/EXPMOTIV/MJ/2007/40.htm>. Acesso em: 07 set. 2014. 106
“§7º Publicado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, os recursos especiais sobrestados na origem:
(incluído pela Lei nº 11.672, de 2008) I – terão seguimento denegado na hipótese de o acórdão recorrido
coincidir com a orientação do Superior Tribunal de Justiça; ou (incluído pela Lei nº 11.672, de 2008) II –
serão novamente examinados pelo tribunal de origem na hipótese de o acórdão recorrido divergir da
orientação do Superior Tribunal de Justiça. (incluído pela Lei nº 11.672, de 2008).”.
72
É o que de ordinário se percebe, a exemplo de recursos relativos ao instituto da
fraude à execução fiscal tributária após o advento do paradigmático recurso repetitivo,
como ocorreu no recente julgamento da Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da
Quinta Região abaixo transcrito:
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PROCESSO QUE RETORNOU
DA VICE-PRESIDÊNCIA. NOVO JULGAMENTO DO AGRAVO DE
INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. AQUISIÇÃO DE IMÓVEL.
INSCRIÇÃO DA DÍVIDA ATIVA ANTERIOR À ALIENAÇÃO DO
IMÓVEL. PROVA. APLICAÇÃO DO ART. 185 DO CTN (LC 118/2005).
ADAPTAÇÃO AO RESP 1.141.990-PR. JUÍZO DE RETRATAÇÃO.
AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO.
1 - Trata-se de agravo de instrumento interposto pela Fazenda Nacional ante
decisão que não reconheceu fraude à execução
2 - Afirma que o ato de alienação também foi posterior a anotação do nome
do co-executado pelo setor de distribuição da JF/PE, que ocorreu em
18.01.2012.
3 - O voto condutor, à época, aplicou o entendimento do C. STJ, o qual
considerava que inexistindo registro da penhora, a alienação do imóvel
mesmo posterior à citação não caracterizava fraude à execução, tendo
em vista a boa-fé do adquirente.
4 - Nada obstante, seguindo a nova orientação, em regime de Recurso
Repetitivo, do REsp 1114990/PR, verifico que, muito embora a alienação
do bem executado a terceiro tenha se aperfeiçoado anteriormente ao
registro da penhora do imóvel, o negócio foi posterior à inscrição em
dívida ativa , de acordo com os termos do art. 185 do CTN, em sua nova
redação (LC 118/2005). Como a inscrição em dívida ativa ocorreu em
01.10.2010 e 12.08.2011, após, a inclusão no pólo passivo do co-executado
em 16.01.2012 e, por seu turno, a alienação do imóvel ocorrida em
31.08.2012 ( fl.20/20v) , restou configurada a fraude à execução.
5 - Vale esclarecer que a Súmula 375 do C. STJ não se aplica à hipótese. O
antigo entendimento de apenas caracterizar-se fraude à execução quando
houvesse registro da penhora e fosse configurada a má-fe do terceiro
adquirente, não encontram apoio em sede de execução fiscal.
6 - O certo é que no regime atual, a teor do art. 543-C do CPC, a fraude à
execução independe da alegação de boa-fé do adquirente. Exige-se apenas à
observância do lapso temporal, se antes do advento da LC 118/2005,
pacificou-se, por entendimento da Primeira Seção (EREsp 40.224/SP), no
sentido de só ser possível presumir-se em fraude à execução a alienação de
bem de devedor já citado em execução fiscal". (REsp 810.489/RS, Rel.
Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 23/06/2009, DJe
06/08/2009). Se o ato translativo foi praticado a partir de 09.06.2005, data de
início da vigência da Lei Complementar n.º 118/2005, basta a efetivação da
inscrição em dívida ativa para a configuração da figura da fraude; Ora, como
a dívida ativa da União já tinha sido inscrito no momento da alienação do
imóvel, é de se reconhecer que houve fraude à execução.
7- No exercício do Juízo de Retratação, determinar o prosseguimento da
execução fiscal.
8 - Agravo de instrumento provido.
(TRF5. AG 136.472. Quarta Turma. Relator: Desembargador Federal Lazaro
Guimarães. Votação unânime. Julgado em 09/09/2014. DJe de 18/09/2014).
(grifos não constantes do original).
73
Pela grande relevância dessa nova sistemática processual, inclusive, foi que o
Conselho Nacional de Justiça – CNJ, no exercício de sua competência
constitucionalmente atribuída para o controle da atividade administrativa do Poder
Judiciário (artigo 103-B, §4º, da CF), editou, em 19 de outubro de 2012, sua resolução
de n.º 160, para determinar que os Tribunais Superiores, Tribunais de Justiça dos
Estados e do Distrito Federal e os Tribunais Regionais Federais, no prazo máximo de 90
(noventa) dias, organizassem seus respectivos Núcleos de Repercussão Geral e
Recursos Repetitivos – NURER (artigo. 1º).
4.3 A segurança jurídica e a mudança jurisprudencial
Diante dessa evolução jurídica do ordenamento jurídico pátrio, procedida com
o escopo – frise-se – de garantir a estabilidade na observância do direito, aclarar e
integrar o direito objetivo, buscando dar-lhe uma aplicação uniforme, racional e
socialmente adequada, de modo célere e efetivo, para conferir eficiência na tramitação
processual e debelar a mora na atividade jurisdicional, emerge a necessidade de os
operadores do direito e, sobretudo, dos membros do Poder Judiciário se aperfeiçoarem
em institutos próprios do sistema precedentalista do common law.
A saber, faz-se necessário o apuramento das habilidades interpretativas para
uma constatação precisa da ratio decidendi107
e dos obter dicta108
e, sobretudo, o
conhecimento, estudo e manejo de técnicas precedentalistas, tais como o
distinguishing109
, o overruling110
, o overriding111
, signaling112
e o reversal113
. Afinal,
107
Vide definição de página 58. 108
Plural de obter dictum. Vide definição de página 58. 109
Há duas acepções para o termo. Em um primeiro sentido o distinguishing pode ser definido como um
método de confronto e comparação entre o caso concreto a ser solucionado e a situação fática sob a qual
se desenvolveu o paradigma, leading case ou precedente. Em um segundo momento, pode-se denominar
distinguishing o resultado prático dessa comparação, resultando no afastamento da norma geral assentada
pela jurisprudência para o caso concreto ou na sua incidência. A saber, pela diferença ou particularidade
entre os fatos fundamentais discutidos e aqueles sobre as quais a ratio decidendi se assentou, afasta-se a
incidência de determinado precedente. 110
O overruling é uma técnica através da qual se retira a força vinculante de um precedente através da
edição de um novo procedente, que supera a sua ratio decidendi, de modo expresso (express overruling)
ou tácito (implied overruling). Quando a esta substituição se atribui eficácia ex tunc, dá-se o nome de
retrospective overruling, aplicando-se a fatos anteriores à superação jurisprudencial e pendentes de
julgamento. Quando a substituição se dá com eficácia ex nunc, dá-se o nome de Prospective overruling,
ocasião em que a ratio decidendi do precedente superado permanece válida e vinculante para os fatos
ocorridos e processos iniciados antes da superação. Há, contudo, situações nas quais, por excepcional
interesse social e com vistas a resguardar a segurança jurídica, os efeitos prospectivos do overruling não
incidiriam nem à situação jurídica apreciada que lhe deu ensejo, fato denominado de pure prospective
74
somente a partir desse conhecimento é que se poderá compreender a extensão dos
efeitos dos precedentes judiciais114
e proceder à sua aplicação de maneira mais precisa,
correta e adequada possíveis115
.
A partir dessa perspectiva, aos órgãos jurisdicionais, pelo princípio da
segurança jurídica, é atribuído o dever de atentarem à fundamentação e aos reflexos
sociais de suas decisões. Afinal, não basta que uma decisão seja fundamentada (artigo
93, IX, da CF), antes, ela deve ser justa e adequada à realidade social, sob pena de não
atender à sua finalidade de pacificação social.
Leciona Luiz Guilherme Marinoni (2011) que, em países cujos sistemas
jurídicos se perfilham ao common law, vinculando-se, portanto, ao princípio do stare
decisis, a revogação de um precedente (overruling) tem, de regra, efeitos retroativos.
Todavia, informa que a prática judicial americana se deparou com hipóteses nas quais as
Cortes não permitiram a retroatividade do novo entendimento firmado (retrospective
overruling) que revogou o precedente anteriormente vigente, para resguardar a
segurança jurídica diante de justificadas e legítimas confianças depositadas nos
precedentes posteriormente superados.
Ao se referir à realidade jurídica francesa, Marco Bruno Miranda Clementino
(2010) narra que o Conselho de Estado Francês, embora exerça jurisdição
administrativa e, por isso, não exerça tipicamente o controle de constitucionalidade de
normas, ao julgar o caso “nº 291545 – Societé Tropic Travaux Signalisation”, passou a
decidir pela modulação dos efeitos de decisões modificativas de jurisprudência, “por
imperativo de segurança jurídica”, já que se estava procedendo a uma profunda
modificação da tradição jurisprudencial.
overruling. Por fim, há o antecipatory overruling, enquanto modalidade de revogação preventiva de
precedentes firmados por Cortes Superiores, por órgãos jurisdicionais inferiores, nas situações em que
aquelas procedem ao implied overruling. 111
Limitação da área de incidência de um precedente, em função do advento de uma regra ou princípio
legal. É, pois, a superação parcial do precedente, em virtude de uma produção legislativa. 112
Vide tópico 4.4. 113
É uma técnica de controle da vinculação ao precedente, segundo a qual uma Corte Superior reforma
uma decisão proferida por um Órgão Jurisdicional hierarquicamente inferior. 114
Edilson Pereira Nobre Jr. (2008, p. 99) adverte que “(...) tanto no âmbito administrativo quanto no
judicial, a aplicação do enunciado sumular não se restringe a uma operação exclusivamente mecânica.
Cabe ao seu aplicador proceder ao exame da situação concreta, a fim de verificar se nesta estão presentes
os fatos fundamentais (material facts), capazes de ensejar a adoção da ratio decidendi que respalda a
súmula”. 115
Inicialmente, os aplicadores e intérpretes do direito devem atentar se o caso concreto guarda algum
grau de identificação com o precedente. Se, após a análise dos elementos objetivos da demanda,
constatar-se que os casos são análogos, deve-se analisar a ratio decidendi firmada no paradigma
pertinente.
75
Na Alemanha, por seu turno, como relata Karl Larenz (2005), o Supremo
Tribunal Federal já se pronunciou pela possibilidade de aplicação, por analogia, a uma
mudança jurisprudencial, dos princípios aplicáveis em casos de leis retroativas, diga-se,
também por imperativo da segurança jurídica.
Assentado nesse mesmo princípio fundamental, que é a segurança jurídica,
verifica-se que a própria Constituição Portuguesa, mais precisamente em seu artigo 282,
(4)116
, autoriza expressamente o Tribunal Constitucional a limitar os efeitos nocivos ou
radicais de eventual declaração de inconstitucionalidade em sede de controle abstrato,
fixando-os com alcance mais restrito, por razões de interesse público de excepcional
relevo, de equidade ou segurança jurídica.
Ao comentar o referido dispositivo constitucional, Jorge Miranda (2005, p.
286) conclui que
Embora correspondam a conceitos relativamente indeterminados, não
levantam dúvidas as referências a segurança jurídica e equidade. Tem-se em
vista preocupações de estabilidade dos actos jurídicos e de confiança dos
cidadãos e ponderações de justiça em face de circunstâncias mutáveis de
vida social. (grifos não constantes do original).
Adentrando na esfera jurídica brasileira, vislumbra-se similar possibilidade de
modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade em sede de controle
abstrato realizado pelo Supremo Tribunal Federal, nos termos dos artigos 27, da Lei
9.868/1999117
e 11, da Lei nº 9.882/1999118
, assim como por ocasião da edição de
súmulas vinculantes, conforme o artigo 4º, da Lei 11.417/2006119
.
116
Nos termos do artigo 282, (4), da Constituição Portuguesa, “Quando a segurança jurídica, razões de
equidade ou interesse público de excepcional relevo, que deverá ser fundamentado, o exigirem, poderá o
Tribunal Constitucional fixar os efeitos da inconstitucionalidade ou da ilegalidade com alcance mais
restrito do que o previsto nos n.os 1 e 2”. 117
“Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de
segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de
dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia
a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.” 118
“Art. 11. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, no processo de argüição de
descumprimento de preceito fundamental, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de
excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus
membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu
trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.” 119
“Art. 4º A súmula com efeito vinculante tem eficácia imediata, mas o Supremo Tribunal Federal, por
decisão de 2/3 (dois terços) dos seus membros, poderá restringir os efeitos vinculantes ou decidir que só
tenha eficácia a partir de outro momento, tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional
interesse público.”
76
Perceba-se, portanto, que o princípio da nulidade120
, inerente à declaração de
inconstitucionalidade, é precedido pelo princípio da segurança jurídica, conforme as
características e reflexos sociais da lei inconstitucional.
Em outros termos, a ideia de que os atos normativos contrários à Lei Maior
pátria, por serem nulos, não produzem efeitos (quod nullun est, nullum producit
effectum), cede espaço para situações jurídicas consolidadas na vigência do texto
normativo inconstitucional, com vistas a preservar a harmonia e estabilidade das
relações jurídicas nela arrimadas e atribuir ao provimento jurisdicional eficácia coerente
com as suas repercussões jurídicas, sociais e políticas.
A despeito de doutrinadores como Ivo Dantas (2001) e Manoel Gonçalves
Ferreira Filho (2000 apud DANTAS, 2008, p. 636) entenderem que, independente de
consagração por outros modelos constitucionais, o artigo 27, da Lei 9.868/1999, põe fim
à supralegalidade constitucional e contradiz a lógica jurídica ao admitir a produção de
efeitos de um ato nulo, o instituto da modulação dos efeitos tem sido pacífica e
amplamente aplicado.
Exemplo concreto da aplicação do instituto da modulação dos efeitos se
encontra no julgamento da ADI 2.240/BA, da relatoria do então ministro Eros Grau, na
qual, a despeito de se ter constatado a inconstitucionalidade formal da Lei Estadual nº
7.619/2000, do Estado da Bahia, por violação a pressuposto constitucional estabelecido
no artigo 18, §4º, da Lei Maior, para a criação do município de Luiz Eduardo
Magalhães, o Supremo Tribunal Federal ponderou as graves consequências de sua
declaração de inconstitucionalidade em face de todas as situações jurídicas exsurgidas e
consolidadas a partir da criação dessa municipalidade, ocasião em que se posicionou,
por maioria, no sentido de conferi-la efeitos puramente prospectivos, ao prorrogar a
vigência do mencionado diploma legal impugnado pelo prazo de 24 (vinte e quatro)
meses. Afinal, em determinados contextos sócio jurídicos, a relevância das matérias
120
Como leciona Jorge Miranda (2005, p. 272-273), o princípio da nulidade subsiste por dois motivos
essenciais: “por a Constituição (ou a lei) como fundamento de validade, como base da força intrínseca da
norma em causa, dever prevalecer incondicionalmente desde o momento em que esta é emitida ou em que
ocorre a contradição ou desconformidade, e não apenas desde o instante em que a contradição é
reconhecida; por a mera eficácia futura da declaração poder acarretar diferenças de tratamento das
pessoas, e dos casos sob o império do mesmo princípio ou preceito constitucional, uns sujeitos ao seu
comando e outros (os considerados antes da declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade)
subordinados ao sentido da norma inconstitucional ou ilegal, ao sentido de uma norma juridicamente
inválida”.
77
apreciadas pelo Poder Judiciário não admite, com justeza, a prolação de provimentos
jurisdicionais dotados de eficácia retroativa (ex tunc).
Contudo, esta modulação dos efeitos deve nortear apenas o Supremo Tribunal
Federal, por ocasião da verificação da compatibilidade vertical das normas
infraconstitucionais em sede de controle abstrato ou por ocasião da edição de uma
súmula vinculante? Em outros termos, uma Corte Superior pode modular os efeitos de
uma decisão que prolatou ao analisar casos concretos, cuja eficácia, a priori, seria inter
partes?
À míngua de previsão legal expressa nesse sentido, o Supremo Tribunal
Federal passou a admitir, por analogia e atendidos os mesmos requisitos, a modulação
dos efeitos de suas decisões por ocasião do controle concreto de constitucionalidade.
Portanto, ainda que não se trate de processo objetivo (exs: ADI, ADC, ADPF, etc.), em
atenção ao caráter expansivo e à aptidão de universalidade das quais se revestem suas
decisões, a Corte Constitucional pátria, em sua jurisprudência, passou a admitir a
modulação dos efeitos no bojo de casos individuais (exs: inquéritos, conflitos de
competência e recursos extraordinários), atribuindo-lhes novas conformações à suas
eficácias temporais.
Inicialmente, podem-se destacar precedentes sobre direito processual, a
exemplo do julgamento do Pleno do Supremo Tribunal Federal no Inquérito 687/SP121
.
Naquela ocasião, a Corte Suprema decidiu cancelar a súmula nº 394122
, que tratava da
manutenção da competência penal por prerrogativa de função após a cessação do
exercício funcional que lhe deu ensejo. Contudo, mesmo não sendo súmula vinculante
e, ressalte-se, anos antes da edição da Lei 11.417/2006 - que, como já relatado, em seu
artigo 4º previu a modulação dos efeitos na edição de Súmulas Vinculantes -, entendeu
pela adequação temporal do julgado, a fim de convalidar “todos os atos praticados e
decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, com base na súmula 394, enquanto
vigorou”.
Outrossim, por ocasião do julgamento do Conflito de Competência nº
7.204/MG123
, da relatoria do ministro Ayres Britto, a Corte Constitucional pátria
121
STF, Pleno, INQ. 687/SP, Rel. Ministro Sydney Sanches, maioria, julgado em 25/08/1999, DJe de
09/11/2001. 122
“cometido o crime durante o exercício funcional, prevalece a competência especial por prerrogativa de
função, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados após a cessação daquele exercício”. 123
STF, Pleno, CC 7.204/MG, Rel. Ministro Ayres Britto, maioria, julgado em 29/06/2005, DJe de
09/12/2005.
78
superou a jurisprudência pacificada para fixar que a competência para julgamento de
ações relativas a danos materiais e morais, propostas por empregado em face de
empregador, seria da Justiça Trabalhista. Todavia, dado o grande volume de processos
julgados ou pendentes de julgamento perante a Justiça Comum, mais uma vez o
Supremo Tribunal Federal atribuiu efeitos prospectivos à decisão, estatuindo que a nova
ratio decidendi sedimentada só se aplicaria para as demandas posteriores à Emenda
Constitucional 45/2004 e que ainda não se encontrassem com o mérito resolvido.
Prosseguindo, percebe-se, de igual modo, a aplicação da técnica de modulação
de efeitos em precedentes versados sobre direito material. No âmbito do direito
tributário, ao julgar o Recurso Extraordinário 560.626/RS124
, da relatoria do ministro
Gilmar Mendes, o Pleno do Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucionais os
artigos 45 e 46, da Lei 8.212/1991, por disporem sobre prescrição e decadência, a
despeito de serem matérias reservadas a Lei Complementar. Contudo, convalidou os
recolhimentos efetuados nos prazos por eles previstos, quando não impugnados antes da
data da conclusão de seu julgamento.
Por ocasião do julgamento do MS 26.604/DF125
, da relatoria da ministra
Carmen Lúcia, em que se tratou da fidelidade partidária, o pleno do Supremo Tribunal
Federal, por maioria, reconheceu ser direito partidário manter o número de cadeiras
parlamentares obtidas em eleição proporcional, motivo pelo qual eventual desligamento
de parlamentar no curso do seu mandato, por ruptura imotivada do vínculo partidário
anteriormente assumido, no sistema de representação política proporcional, acarretaria a
perda automática do cargo.
Entretanto, no referenciado julgado, assentou-se que por:
razões de segurança jurídica, e que se impõem também na evolução
jurisprudencial, determinam seja o cuidado novo sobre tema antigo pela
jurisdição concebido como forma de certeza e não como causa de
sobressaltos para os cidadãos. Não tendo havido mudança na legislação
sobre o tema, tem-se reconhecido o direito de o impetrante titularizar os
mandatos por ele obtidos nas eleições de 2006, mas com modulação de
efeitos dessa decisão para que se produzam a partir da data da resposta do
Tribunal Superior Eleitoral à Consulta nº 1.398/2007. (grifos não constantes
do original).
124
STF, Pleno, RE 569.626/RS, Rel. Ministro Gilmar Mendes, maioria, julgado em 12/06/2008, DJe de
05/12/2008. 125
STF, Pleno, MS 26.604/DF, Rel. Ministra Carmen Lúcia, Pleno, maioria, julgado em 04/10/2007, DJe
de 03/10/2008.
79
De igual modo, encontram-se diversos outros exemplos práticos da aplicação
da modulação de efeitos sobre entendimentos firmados em específicos casos concretos,
a exemplo do RE 600.885/RS126
, no qual o Supremo Tribunal Federal reconheceu que o
ingresso nas forças armadas deveria obedecer ao princípio da legalidade estrita,
impondo-se lei formal para dispor sobre a questão, mas, ao considerar que, por mais de
20 (vinte) anos, dezenas de concursos foram realizados sem a sua observância,
consolidando incontáveis situações jurídicas, entendeu por conferir efeitos prospectivos
à interpretação sedimentada em seu decisum.
A aplicabilidade da técnica da modulação dos efeitos, entretanto, não se
adstringiu ao âmbito do Supremo Tribunal Federal. Ao revés, a aplicação analógica do
artigo 27, da Lei 9.868/1999 já foi objeto de debate no Superior Tribunal de Justiça,
embora nela não tenha encontrado guarida.
A saber, por ocasião da apreciação dos Embargos de Divergência no Recurso
Especial 738.689127
, que tinha como questão de fundo a interpretação do crédito-prêmio
do IPI, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça - a quem incumbe pacificar a
divergência das Turmas de Direito Público (1ª e 2ª Turmas) e, portanto, manifestar-se,
em último grau, sobre a interpretação judicial de textos normativos infraconstitucionais
– debateu o cabimento da modulação dos efeitos da decisão.
Naquele julgado, através de seu voto vista, o ministro Herman Benjamin
propôs a aplicação da mencionada técnica, pelo fato de se estar alterando um
entendimento que era pacífico no Corte Cidadã até agosto de 2004, no sentido de que o
crédito subsistia. Portanto, diante da considerável mudança da orientação judicial sobre
a questão jurídica, dever-se-ia considerar a “sombra de juridicidade” que até então
pairava sobre os operadores do direito e se estendia na orientação das condutas dos
cidadãos.
O referido ministro asseverou que
(...) também no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, as decisões que
alterem jurisprudência reiterada, abalando forte e inesperadamente
126
STF, Pleno, RE 600.885/RS, Rel. Ministra Carmen Lúcia, Pleno, maioria, julgado em 09/02/2011, DJe
de 01/07/2011. 127
TRIBUTÁRIO. IPI. CRÉDITO-PRÊMIO. DECRETO-LEI 491/69. (ART. 1º). VIGÊNCIA. PRAZO.
EXTINÇÃO. “MODULAÇÃO TEMPORAL” DA DECISÃO. IMPOSSIBILIDADE. (...) 2. Salvo nas
hipóteses excepcionais previstas no art. 27 da Lei 9.868/99, é incabível ao Judiciário, sob pena de
usurpação da atividade legislativa, promover a “modulação temporal” das suas decisões, para o efeito de
dar eficácia prospectivas a preceitos normativos reconhecidamente revogados. (STJ. EREsp 738.689/PR.
Relator: Min. Teori Albino Zavascki. Primeira Seção. DJe de 22/10/2007).
80
expectativas dos jurisdicionados, devem ter sopesados os limites de seus
efeitos no tempo, buscando a integridade do sistema e a valorização da
segurança jurídica.” (grifos não constantes do original).
Na mesma toada, o ministro João Otávio Noronha se perfilhou, acrescentando
que a modulação da interpretação jurisdicional, com a aplicação de efeitos prospectivos,
teria exatamente o condão de possibilitar uma “(...) Corte Superior transcender o
interesse individual e fazer prevalecer a própria credibilidade do Poder Judiciário”.
Entretanto, tal entendimento não restou sufragado pela maioria, que minimizou o
princípio da segurança jurídica, ao asseverar que o artigo 27, da Lei 9.868/1999 seria
aplicável apenas ao controle de constitucionalidade realizado pelo Supremo Tribunal
Federal.
Manifestando-se, o doutrinador e processualista Luiz Guilherme Marinoni
(2011, p. 244) asseverou que “O Superior Tribunal de Justiça, neste julgamento, perdeu
grande oportunidade para adotar técnica imprescindível a um Tribunal incumbido de
dar unidade ao direito federal”. Afinal, não se trataria de aplicação analógica do artigo
27, da Lei da ADI, mas de aplicação direta e reconhecimento da eficácia imediata do
valor que lhe é subjacente, qual seja, o princípio constitucional da segurança jurídica,
imprescindível para não ocasionar surpresas desagradáveis e deletérias aos interesses
daqueles que depositaram legítima confiança nos precedentes judiciais (MARINONI,
2011).
Entretanto, até os dias atuais, as duas Turmas de Direito Público do Superior
Tribunal de Justiça perseveram nesse entendimento, conforme arrestos abaixo
colacionados:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO JUDICIAL QUE VISA AFASTAR O ICMS
SOBRE A DEMANDA CONTRATADA E NÃO UTILIZADA DE
ENERGIA ELÉTRICA. LEGITIMIDADE ATIVA DO CONSUMIDOR.
MUDANÇA DE ENTENDIMENTO DO STJ. NOVA ORIENTAÇÃO
JURISPRUDENCIAL, CONSOLIDADA EM SEDE DE RECURSO
ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. PEDIDO DE
MODULAÇÃO DOS EFEITOS. ART. 27 DA LEI 9.868/99.
IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO STF. AGRAVO
REGIMENTAL IMPROVIDO.
I. A Primeira Seção do STJ, ao julgar o REsp 1.299.303/SC (Rel. Ministro
CESAR ASFOR ROCHA, DJe de 14/08/2012), sob o rito do art. 543-C do
CPC, pacificou o entendimento no sentido de que o usuário do serviço de
energia elétrica (consumidor em operação interna), na condição de
contribuinte de fato, é parte legítima para discutir a incidência do ICMS
sobre a demanda contratada e não utilizada de energia elétrica, bem como
81
para pleitear a repetição do indébito referente ao mencionado tributo, não
sendo aplicável, na hipótese, a orientação firmada pela Primeira Seção desta
Corte, no julgamento do REsp 903.394/AL (Rel. Ministro LUIZ FUX, DJe
de 26/04/2010), também submetido à sistemática prevista no art. 543-C do
CPC.
II. Hipótese em que o Estado do Ceará não se insurge contra o conteúdo do
julgamento do aludido Recurso Especial 1.299.303/SC, julgado sob o rito do
art. 543-C do CPC, mas defende ser necessário o provimento do Recurso
Especial, para conformar o resultado do presente processo ao entendimento
jurisprudencial da época em que fora prolatado o acórdão do Tribunal de
origem, declarando-se que aquele Estado não pode cobrar o ICMS sobre a
demanda contratada e não utilizada de energia elétrica, afastados, porém, os
direitos à restituição ou à compensação tributárias.
III. A Primeira Seção do STJ, ao julgar os ERESP 738.689/PR e os
EREsp 767.527/PR (Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJU
de 22/10/2007), proclamou que, "salvo nas hipóteses excepcionais
previstas no art. 27 da Lei 9.868/99, é incabível ao Judiciário, sob pena
de usurpação da atividade legislativa, promover a 'modulação temporal'
de suas decisões", donde se conclui que tal competência limita-se ao STF. IV. Agravo Regimental improvido.
(STJ. AGREsp 1.332.559. Segunda Turma. Relator: Ministra Assusete
Magalhães. Votação unânime. Julgado em 23/09/2014. DJe de 02/10/2014).
(grifos não constantes do original).
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL
NO RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO DO DISTRITO
FEDERAL. CONCURSO PÚBLICO. APROVAÇÃO. NOMEAÇÃO EM
CARGO DIVERSO. DECRETO DISTRITAL 21.688/00.
INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA NAS INSTÂNCIAS
ORDINÁRIAS. MODULAÇÃO DE EFEITOS. IMPOSSIBILIDADE.
PRECEDENTE DO STJ. ART. 27 DA LEI 9.868/99. VIOLAÇÃO.
PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. EXISTÊNCIA. MATÉRIA
CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA DO STF. MATÉRIA FÁTICA.
EXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO
PROVIDO.
1. "O prequestionamento pode ser implícito, e é reconhecido sempre que as
questões decididas na causa remetam o Tribunal às normas legais que o
recurso especial diz contrariadas" (AgRg no REsp 1.226.130/AL, Rel. Min.
ARI PARGENDLER, Primeira Turma, DJe 7/3/13).
2. "Nos termos do art. 27 da Lei 9.868/1999, somente o Supremo Tribunal
Federal, por maioria de dois terços de seus membros, pode atribuir eficácia
ex nunc à declaração de inconstitucionalidade de lei" (EDcl no AgRg no
REsp 636.261/RJ, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, DJe
24/9/09). 3. A tese arguida pelo Distrito Federal, no sentido de que a
manutenção da sentença de Primeira Instância, que julgou procedente o
pedido formulado na inicial, importaria em afronta ao princípio da isonomia,
é matéria cujo exame compete exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal,
nos termos do art. 102, III, da Constituição da República.
4. A matéria devolvida ao Superior Tribunal de Justiça pelo recurso especial
restringe-se ao art. 27 da Lei 9.868/99 (possibilidade ou não de modulação
dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade do Decreto Distrital
21.688/00), não autorizando o reexame da matéria de fundo concernente ao
próprio mérito da controvérsia, que não foi objeto de recurso autônomo, sob
pena de eventual reformatio in pejus. Ademais, a pretensão do Distrito
Federal de reexame do próprio mérito da causa esbarra na necessidade de
exame de matéria fática (existência ou não de cargos vagos, bem como de
má-fé do autor, ora agravado), o que atrai o óbice da Súmula 7/STJ.
5. Agravo regimental não provido.
82
(STJ. AGREsp 1.351.914. Primeira Turma. Relator: Ministro Arnaldo
Esteves Lima. Votação unânime. Julgado em 16/04/2013. DJe de
22/04/2013).
A par desta interpretação jurídica e, para prosseguir no desenvolvimento deste
estudo, pertinente se faz a seguinte indagação: faz-se necessária previsão legal expressa
para a modulação dos efeitos de decisões judiciais?
Como já relatado, o Supremo Tribunal Federal dispensa tal exigência ao
estender a aplicação desta técnica de controle temporal dos efeitos de suas razões de
decidir também em sede de controle incidental de constitucionalidade, à míngua de
previsão legal expressa. Mas, como isto pode ser considerado plausível juridicamente?
Das lições de Humberto Ávila, em sua obra Teoria dos Princípios (2011b),
depreende-se que não há correspondência biunívoca entre texto normativo e norma,
motivo pelo qual há casos em que há norma sem dispositivo legal específico que a
assente, há dispositivo sem norma e há normas que defluem da interpretação conjunta
de mais de um dispositivo, como é o caso da segurança jurídica. A norma da segurança
jurídica vigora sem existir dispositivo legal expresso e específico que a assente.
Este fato, entretanto, não implica em menor grau de positividade à segurança
jurídica, como leciona José Souto Maior Borges (1997), até porque toda norma, em
certa medida, encontra-se implícita, posto que é resultante da interpretação incidente
sobre dado texto normativo, conforme afirma José Artur Gonçalves (2002) e adiante
melhor se elucidará.
No mesmo sentido, encontra-se o posicionamento doutrinário de Paulo de
Barros Carvalho (2008, p. 263-264), que, ao tratar do sobreprincípio da segurança
jurídica no direito tributário assevera:
Entre as grandes diretrizes que formam o estrato axiológico das normas
tributárias no Brasil, algumas se apresentam como conteúdos de
enunciados expressos, enquanto outras se encontram na implicitude dos
textos do direito posto. Todas, porém, com a mesma força vinculante. A
circunstância de figurarem no texto, ou no contexto, não modifica o teor
de prescritividade da estimativa, que funciona como vetor valorativo que
penetra as demais regras do sistema, impregnando-lhes, fortemente, a
dimensão semântica. Por isso mesmo são colocadas no altiplano da
Constituição. De lá, precisamente onde começam todos os processos de
positivação das normas jurídicas, descem aqueles primados para os vários
escalões da ordem legislada, até atingir as regras terminais do sistema,
timbrando os preceitos que ferem diretamente as condutas em interferência
intersubjetiva, com a força axiológica dos mandamentos constitucionalmente
consagrados. (grifos não constantes do original).
83
Nas palavras de Frederico Seabra de Moura (2009, p. 333), “se chega à
conclusão de que o direito brasileiro consagrou a segurança jurídica a partir da
positivação de outras normas”. Pode-se perceber, portanto, a norma da segurança
jurídica pairando sobre os dispositivos que garantem a legalidade, a irretroatividade e a
anterioridade, mas não se encerra neles, porquanto, André Ramos Tavares (2006, p.
662) bem frisa que
Um direito à segurança jurídica, em sentido amplo, poderá abranger: i) a
garantia do direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada; ii) a
garantia contra restrições legislativas dos direitos fundamentais
(proporcionalidade) e, em particular, contra a retroatividade de leis punitivas;
iii) o devido processo legal e o juiz natural; iv) a garantia contra a incidência
do poder reformador da Constituição em cláusulas essenciais; v) o direito
contra a violação de direitos; vi) o direito à efetividade dos direitos previstos
e declarados solenemente; vii) o direito contra medidas de cunho retrocessivo
(redução ou supressão de posições jurídicas já implementadas); viii) a
proibição de retrocesso em matéria de implementação de direitos
fundamentais; ix) o direito à proteção da segurança pessoal, social e coletiva;
x) o direito à estabilidade máxima da ordem jurídica e da ordem
constitucional.
Portanto, mesmo não constando expressamente do extenso rol de direitos
fundamentais do artigo 5º, da Constituição Federal, é inequívoca a existência de
fundamentalidade material do princípio da segurança jurídica. Afinal, a cláusula de
abertura ou inexauribilidade insculpida no §2º128
, do mencionado dispositivo
constitucional, autoriza a equiparação do mencionado sobreprincípio aos direitos
fundamentais de primeira geração.
Esta constatação é de suma importância, porquanto os direitos fundamentais de
primeira geração, dimensão ou, na classificação de Georg Jellinek, status negativus, são
direitos de resistência ou defesa que impõem ao Estado uma competência negativa, um
dever de abstenção, uma obrigação de não fazer, limitando a sua atuação e restringindo
a sua intervenção nas suas esferas de proteção.
Desse modo, ressalvadas as situações nas quais as áreas de proteção desses
direitos são restringidas de forma permitida, como nos casos de concretização mediante
lei, reserva legal (qualificada ou não), direito constitucional de colisão ou eventuais
128
“§2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e
dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil
seja parte”.
84
limitações constitucionais em casos excepcionais, impõe-se ao Estado o dever de abster
de praticar intervenções desproporcionais, injustificadas, como bem lecionam Dimitri
Dimoulis e Leonardo Martins (2009).
Logo, a observância do princípio da segurança jurídica deve se dar de forma
imediata (artigo 5º, §1º129
, da CF), prescindindo de norma infraconstitucional
regulamentadora específica, fato que impõe ao Estado a abstenção da prática de atos
jurídicos que maculem a legítima confiança nele depositada pelos cidadãos.
É certo que, originaria e tradicionalmente, a segurança jurídica se direcionava
como limite ao exercício das funções legislativa e administrativa. Contudo, diante da
evolução processual já relatada alhures, que conferiu às decisões judiciais crescente
vinculação material, impõe-se o reconhecimento de sua aptidão de inovar na ordem
jurídica, motivo pelo qual se deve incluir como destinatário da vedação à retroatividade
maléfica da produção jurídica também o Poder Judiciário.
A validade e a eficácia dos negócios jurídicos celebrados pelos cidadãos e em
conformidade com a jurisprudência vigente ao tempo de sua perfectibilização, portanto,
devem ser resguardadas e consideradas imunes a posteriores alterações jurisprudenciais
procedidas pelo Poder Judiciário, por imperativo do autoaplicável princípio
fundamental da segurança jurídica.
A partir dessa noção, então, é que se deve compreender que o entendimento
restritivo do Superior Tribunal de Justiça quanto à aplicabilidade da modulação dos
efeitos em sua atuação jurisdicional não teve o condão de encerrar a questão, tampouco
coibir a sua utilização por outros órgãos jurisdicionais.
Para ilustrar essa questão, deve-se fazer menção a interessante julgamento
proferido no recurso nº 0500029-33.2010.4.05.9840 pela Turma Recursal da Seção
Judiciária do Rio Grande do Norte. A saber, naquela ocasião, como narra Clementino
(2010, p. 31), a despeito de o órgão jurisdicional colegiado ter entendido que o recurso
interposto em face de decisão concessiva de tutela de urgência não o poderia ter sido
feito por instrumento, por ir de encontro à principiologia própria dos Juizados Especiais,
decidiu-se que tal entendimento deveria ser modulado, pelo fato de muitos recursos
terem sido interpostos de boa-fé pelos jurisdicionados, com arrimo em anterior
posicionamento de sua própria jurisprudência. Então, aos efeitos da nova interpretação
dada à matéria processual conferiu-se eficácia puramente prospectiva e promoveu-lhe
129
“§1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.”.
85
ampla divulgação nos meios disponíveis, para fins de ciência de advogados e
procuradores.
Ademais, deve-se observar que a jurisprudência e o legislador
infraconstitucional têm se pautado, em diversos contextos, no princípio da segurança
jurídica.
Exemplo de observância do princípio da segurança jurídica pelo legislador
ordinário se encontra no artigo 2º, parágrafo único, XIII, da Lei Federal nº
9.784/1999130
, que, ao reger os processos administrativos na esfera federal, estatui a
vedação de efeitos retroativos a nova interpretação. Tal texto normativo legal protege a
confiança legítima depositada pelos cidadãos no Poder Público, ao considerar que a
interpretação legal procedida por um órgão ou autoridade competente para tanto tem o
condão de orientar a conduta dos administrados.
Nesta mesma toada, e atentando à necessidade de se preservar a estabilidade
nas relações sociais, é que o Superior Tribunal de Justiça acolhe a teoria do fato
consumado para se abster de desconstituir certas situações jurídicas consolidadas pelo
decurso do tempo com amparo em decisão judicial131
, assim como também reconhece a
irrepetibilidade de verbas alimentares percebidas de boa-fé.
Há que se ressaltar, inclusive, no que atine à modulação dos efeitos na
alteração de jurisprudência dominante, que o projeto do Novo Código de Processo Civil
(PL 8.046/2010), após estabelecer expressamente que os tribunais têm o dever de
uniformizar a sua jurisprudência, mantendo-a estável, íntegra e coerente (artigo 520),
em seu artigo 521, caput, e §§ 10 e 11, foi de encontro ao entendimento restritivo
sedimentado pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do
EREsp 738.689/PR para estabelecer que
130 “Art. 2
o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade,
motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica,
interesse público e eficiência. parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre
outros, os critérios de: (...) XIII - interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o
atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação.” 131
“Impõe-se, no caso, a aplicação da Teoria do Fato Consumado, segundo a qual as situações jurídicas
consolidadas pelo decurso do tempo, amparadas por decisão judicial, não devem ser desconstituídas, em
razão do princípio da segurança jurídica e da estabilidade das relações sociais” (STJ. REsp 709.934/RJ.
Segunda Turma. Relator: Ministro Humberto Martins. Votação unânime. Julgado em 21/06/2007. DJe de
29/06/2007). “A teoria do fato consumado apoia-se na evidência empírica de que o tempo não retrocede –
pelo contrário, foge irreparavelmente – de sorte que é naturalmente impossível regressar-se a situações
ultrapassadas, para desconstituir relações que se consolidaram como fatos.” (STJ. AgRg no REsp
1.291.328/RS. Primeira Turma. Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Julgado em 24/04/2012.
Votação unânime. DJe de 09/05/2012).
86
Art. 521. Para dar efetividade ao disposto no art. 520 e aos princípios da
legalidade, da segurança jurídica, da duração razoável do processo, da
proteção da confiança e da isonomia, as disposições seguintes devem ser
observadas:
(...)
§10. Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante, sumulada ou
não, ou de precedente, o tribunal poderá modular os efeitos da decisão
que supera o entendimento anterior, limitando sua retroatividade ou lhe
atribuindo efeitos prospectivos.
§11. A modificação de entendimento sedimentado, sumulado ou não,
observará a necessidade de fundamentação adequada e específica,
considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e
da isonomia. (grifos não constantes do original).
Resta evidente que a evolução de nosso sistema processual em direção à lógica
precedentalista típica dos países de common law não pode se dissociar da racionalização
das manifestações jurisdicionais, tampouco trazer instabilidade às relações jurídicas
arrimadas na legítima confiança depositada nos precedentes, tudo em atenção à
segurança jurídica.
A existência de “lacuna ontológica” quanto à aplicabilidade do instituto
processual em comento no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, todavia, conforme
abalizada doutrina de Estevam Mallet (2005), Luiz Guilherme Marinoni (2011), Nelson
Nery Junior (2009), Roque Antônio Carrazza (2009) e Tércio Sampaio Ferraz Jr.
(2009), não obsta a sua aplicação direta.
Ao revés, ao modular os efeitos de determinados pronunciamentos
jurisdicionais, o Poder Judiciário estaria apenas e tão somente cumprindo os seus
deveres constitucionais de abstenção da prestação uma tutela jurisdicional que não seja
adequada e consentânea com a finalidade de pacificação social, dispondo sobre a
repercussão social daquela decisão judicial a casos análogos e resguardando os atos
praticados pelos cidadãos sob a expectativa de que a interpretação jurídica elaborada
pelos órgãos constitucionalmente competentes para tanto seria a correta.
Para eles, com acerto, a despeito de nosso ordenamento jurídico não proibir ou
exigir efeitos retroativos a decisões judiciais, a questão dos efeitos retrospectivos deve
ser objeto de política judiciária não apenas no âmbito restrito do Supremo Tribunal
Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, estendendo-se também aos demais
Tribunais Superiores aos quais a Constituição Federal atribuiu o munus de pacificar e
sedimentar o entendimento final do Poder Judiciário sobre determinadas matérias e, por
87
conseguinte, nortear as condutas do povo, gerando, assim, reflexos na órbita
fenomenológica da sociedade.
Esta questão deve ser compreendida a partir das lições de Hans Kelsen (2009),
para as quais a atividade jurisdicional é criativa e não se restringe a mera aplicação do
direito. A decisão judicial que exsurge da apreciação de um caso concreto pode ser
compreendida como a continuação do processo de produção do Direito. Afinal, não se
pode confundir, como bem preceituam Eros Grau (2006) e Humberto Ávila (2011b), o
texto normativo, enquanto criação legislativa, da norma jurídica, criada pelo intérprete a
partir de sua interpretação, à luz do fato social e dos valores que o circundam.
Assevera Konrad Hesse (1998, p. 61 e 63) que
O intérprete não pode compreender o conteúdo da norma de um ponto
situado fora da existência histórica, por se assim dizer, arquimédico, senão
somente na situação histórica concreta, na qual ele se encontra[...] A
vinculação da interpretação à norma a ser concretizada, à (pré)-compreensão
do intérprete e ao problema concreto a ser resolvido, cada vez, significa,
negativamente, que não pode haver método de interpretação autônomo,
separado desses fatores, positivamente, que o procedimento de concretização
deve ser determinado pelo objeto da interpretação, pela Constituição e pelo
problema respectivo.
Como ilustração prática da atividade criativa da jurisdição, pode-se indicar a
mudança de entendimento do Supremo Tribunal Federal para se perfilhar a posição
concretista do Mandado de Injunção132
, dada a inefetividade prática da Ação Direta de
Inconstitucionalidade por Omissão133
. Este fato, inclusive, possibilitou a edição da
recente Súmula Vinculante nº 33134
, do Supremo Tribunal Federal, que efetivou o
direito dos servidores públicos a uma aposentadoria especial, que carecia de
concretização por ausência de regulamentação legal, em virtude da reserva legal
132
Narra Gilmar Mendes que o Supremo Tribunal Federal, “(...) afastando-se da orientação inicialmente
perfilhada no sentido de estar limitada à declaração da existência da mora legislativa para a edição de
norma regulamentadora específica, passou, sem assumir compromisso com o exercício de uma típica
função legislativa, a aceitar a possibilidade de uma regulação provisória pelo próprio Judiciário”.
(MENDES; COELHO; BRANCO, 2010, p. 1394). Exemplos dessa nova posição se encontram nos
Mandados de Injunção de n.º 670, 708 e 712. 133
Por ocasião do julgamento da ADI 3.682/MT, a despeito de reconhecer a omissão na regulamentação
do artigo 18, §4º, da CF, o Supremo Tribunal Federal não impôs um prazo para a atuação legislativa do
Congresso Nacional, mas apenas fixou “um parâmetro temporal razoável”. (STF. ADI 3682/MT. Tribunal
Pleno. Relator: Min. Gilmar Mendes. DJe de 06/09/2007). 134
“Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre
aposentadoria especial de que trata o artigo 40, §4º, inciso III, da Constituição Federal, até a edição de lei
complementar específica”.
88
estabelecida na norma de eficácia limitada do artigo 40, §4º, III, da Constituição
Federal.
Assim, os provimentos jurisdicionais têm o condão de inovar na ordem jurídica
e influenciar diretamente na criação e manutenção (preservação, modificação ou
extinção) de relações jurídicas. Portanto, em atenção à cláusula de inexauribilidade do
artigo 5º, §2º, da Constituição Federal135
, o princípio fundamental da segurança jurídica
deve se limitar à irretroatividade da lei em face do ato jurídico perfeito, do direito
adquirido ou da coisa julgada136
, antes, deve ser direta e imediatamente aplicado às
mudanças de orientações jurisprudenciais até então pacíficas no seio dos Tribunais que
procederem ao que, nos sistemas precedentalistas, denomina-se overruling (MALLET,
2005).
A irretroatividade da lei, em verdade, deve ser interpretada como a
irretroatividade do Direito, já que é a partir da interpretação que a lei, enquanto objeto
do direito, ganha relevância e influencia na realidade social. É a partir das
manifestações dos órgãos jurisdicionais, sobretudo dos Tribunais Superiores, que o
direito é revelado e aplicado às situações jurídicas substanciais postas.
A segurança jurídica, então, como leciona Humberto Ávila (2011a, p. 142),
“(...) pode da mesma forma ter como objeto não a norma propriamente dita, mas a sua
aplicação uniforme e não arbitrária. Daí se falar em ‘segurança de aplicação das
normas’, no lugar de segurança das normas”. Afinal, nas precisas palavras de J. J.
Gomes Canotilho (2003, p. 257), “o homem necessita de segurança para conduzir,
planificar e conformar autónoma e responsavelmente a sua vida. Por isso, desde cedo se
consideraram os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança como
elementos constitutivos do Estado de direito”.
Prosseguindo, o referenciado doutrinador português assevera que
O indivíduo tem do direito poder confiar em que os seus actos ou às decisões
públicas incidentes sobre os seus direitos, posições ou relações jurídicas
alicerçados em normas jurídicas vigentes e válidas por esses actos jurídicos
deixado pelas autoridades com base nessas normas se ligam os efeitos
jurídicos previstos e prescritos no ordenamento jurídico (CANOTILHO,
2003, p. 257).
135
“Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos
princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja
parte”. 136
Conforme prevê o artigo 5º, XXXVI, da Constituição Federal, “a lei não prejudicará o direito
adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.
89
Desse modo, pode-se compreender que a Constituição não veda pura e
simplesmente a irretroatividade das leis, tanto que as normas puramente processuais têm
aplicação imediata aos processos em curso e os efeitos de um negócio jurídico se
subordinam, de regra, à nova legislação. O que o Constituinte estabeleceu foi a
proibição de aplicação de efeitos retroativos à lei posterior que prejudique dentre outras
situações, o ato jurídico perfeito. A prejudicialidade é, pois, o elemento a ser observado
na (ir)retroatividade normativa (TAVARES, 2006, p. 663).
Não se impede, portanto, a superação de uma tese jurídica dominante, afinal,
determinados precedentes podem se revelar posteriormente obsoletos, imprecisos,
incorretos ou inexequíveis. A evolução jurisprudencial, quando racional, é necessária e
salutar à adequação do Direito em face da progressiva evolução histórica, política e
econômica da sociedade e dos seus valores, sobretudo quando se lida com a textura
aberta e polimorfa das quais usufruem as normas-princípio (NOBRE JR., 2008), tão em
voga no contexto neoconstitucional - tanto que, no âmbito da jurisdição constitucional,
verificam-se os fenômenos da inconstitucionalidade superveniente, como evidencia
Teori Albino Zavascki137
, e da mutação constitucional, nos moldes em que salienta
Konrad Hesse138
e explica Inocêncio Mártires Coelho139
-.Contudo, o Poder Judiciário
não pode se desincumbir da responsabilidade de adequar os efeitos de seus
pronunciamentos na órbita fenomenológica.
Quando se fala em modulação dos efeitos de decisões proferidas em sede de
controle de constitucionalidade, mitiga-se o princípio da nulidade da lei ou ato
normativo inconstitucional em face de situações jurídicas consolidadas pelo decurso do
tempo. Mas, em se tratando da superação de entendimentos jurisprudenciais pacíficos,
devem-se adequar os efeitos da nova norma jurídica introduzida no âmbito jurídico a
137
“não é de se estranhar, assim, a ocorrência do fenômeno da inconstitucionalidade superveniente, acima
referido: uma norma nascida em harmonia com a Constituição pode tornar-se com ela incompatível em
face de substanciais mudanças da realidade social em que atua”. (ZAVASCKI, 2001, p. 114). 138
Assenta Konrad Hesse (1991, p. 22-23) que “se o direito e, sobretudo, a Constituição, têm sua eficácia
condicionada pelos fatos concretos da vida, não se afigura possível que a interpretação faça deles tábula
rasa. Ela há de contemplar essas condicionantes, correlacionando-as com as proposições normativas da
Constituição. A interpretação adequada é aquela que consegue contretizar, de forma excelente, o sentido
(sinn) da proposição normativa dentro das condições reais dominantes numa determinada situação. Em
outras palavras, uma mudança das relações fáticas pode – ou deve – provocar mudanças na interpretação
da Constituição.” 139
“visto sob essa perspectiva, portanto, as mutações constitucionais são decorrentes – nisto residiria a
sua especificidade – da conjugação da peculiaridade da linguagem constitucional, polissêmica e
indeterminada, com os fatores externos, de ordem econômica, social e cultural, que a Constituição –
pluralista por antonomásia – intenta regular e que, dialeticamente, interagem com ele, produzindo leituras
sempre renovadas das mensagens enviadas pelo constituinte”. (COELHO, 2011. p. 180-181).
90
partir de inovadora ratio decidendi a determinadas relações jurídicas calcadas na
“sombra de juridicidade” do uníssono entendimento jurisprudencial até então vigente.
Exatamente com base nessa noção foi que o Supremo Tribunal Federal, por
maioria, no dia 22 de outubro de 2014, ao julgar o Recurso Extraordinário n.º
590.809/RS, sob o regime de repercussão geral, entendeu ser incabível ação rescisória
em face de decisão que se baseou na orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal
Federal, ainda que posteriormente tenha sido por ele superada, conforme noticiado em
seu sítio virtual140
.
O processualista Luiz Guilherme Marinoni (2011, p. 248) é enfático a estatuir
que
a proteção da confiança justificada nos precedentes judiciais constitui dever
dos Tribunais Superiores, pelo que a limitação dos efeitos das decisões que
revogam precedentes ou jurisprudência consolidada não está sequer à
discrição do Superior Tribunal de Justiça. Esse Tribunal, para dar
cumprimento a sua missão constitucional de dar unidade ao direito federal,
tem o dever de utilizar a técnica da limitação dos efeitos retroativos, como
todo tribunal que, ao decidir, fixa normas que orientam a conduta dos
jurisdicionados, dando-lhes previsibilidade para trabalhar e viver.
Afinal, como afirma Estevam Mallet (2005, p. 141),
não é possível desprezar impunemente a expectativa legitimamente criada na
sociedade, desconsiderar a confiança produzida, ignorar os comportamentos
adotados segundo o que na altura se dizia e apregoava ser correto. Fazê-lo
compromete a própria autoridade dos tribunais e a credibilidade das
respectivas decisões, que deixam de servir ou de ser vistas como guia seguro
para o comportamento das pessoas.
Desse modo, à mingua de previsão legal expressa, mas se valendo da
aplicabilidade imediata do princípio fundamental da segurança jurídica, conforme
autorização expressa do artigo 5º, §1º, da Constituição Federal141
, devem-se observar
quatro critérios lógicos para uma correta política judiciária de gestão dos efeitos de seus
precedentes, quais sejam: a existência de entendimento jurisprudencial dominante e
potencialmente confiável, a existência de confiança depositada na jurisprudência
140
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Não cabe ação rescisória com base em mudança posterior de
jurisprudência, decide STF. Notícias STF, Brasília, Quarta-Feira, 22 de outubro de 2014. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=278092>. Acesso em: 23 out. 2014. 141
“As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”.
91
dominante, a delimitação temporal da pacífica vigência do entendimento precedentalista
superado e a relevância da repercussão do novo entendimento sedimentado.
Quanto ao primeiro requisito, deve-se aferir a existência de norma geral
assentada em pronunciamentos jurisdicionais sobre determinada situação fática apta a
protrair seus efeitos a outros fatos sociais similares e seu grau de confiabilidade,
elemento inerente a seu grau de vinculação e pretensão de permanência. Afinal, “quanto
maiores forem a vinculatividade e a pretensão de permanência da decisão, tanto maior
deve ser a protetividade da confiança nela depositada” (ÁVILA, 2011a, p. 483).
Esta vinculação pode ser tanto formal, quando atribuída expressamente por
normas do ordenamento jurídico, tais como as decisões proferidas no controle
concentrado de constitucionalidade, ou material, situação na qual, a despeito de inexistir
vinculação formal, a decisão se reveste de uma pretensão de permanência que torna
mínima a probabilidade de súbita modificação.
São exemplos deste último caso, nas palavras de Humberto Ávila (2011a, p.
483),
Decisões do Supremo Tribunal Federal, proferidas pelo seu Órgão Plenário,
do Superior Tribunal de Justiça, prolatadas pelo seu Órgão Especial ou pela
Seção competente sobre a matéria, ou objeto de súmula (que) manifestam
elevado grau de pretensão terminativa, na medida em que permitem a ilação
de que dificilmente serão modificadas, bem como uma presunção formal de
correção, em virtude da composição do órgão prolator...
A existência de confiança neste entendimento jurisprudencial sedimentado, por
seu turno, dispensa maiores explicações, por residir na espontânea e consciente projeção
de determinadas condutas dos cidadãos arrimada na certeza de que elas estariam
legitimamente arrimadas e resguardadas pelo direito vigente, sobretudo na visão dos
Tribunais Superiores.
Já a delimitação temporal da pacífica vigência do entendimento precedentalista
é imprescindível para aferir até que momento havia a legítima confiança digna de tutela
e que deveria ser resguardada pela modulação dos efeitos, considerando-se, para tanto,
em outros termos, o período no qual clara e inequivocamente pairava a “sombra de
juridicidade” nas condutas do cidadão.
Por fim, como já defendido, a aproximação do sistema processual brasileiro da
lógica própria do sistema do common law impôs e impõe aos órgãos jurisdicionais o
92
dever de sopesar, com responsabilidade, os efeitos de suas decisões nos interesses
jurídico-patrimoniais dos jurisdicionados e dos próprios cidadãos que se encontram em
similares contextos fáticos, sendo certo que, quanto mais graves forem os novos rumos
interpretativos trilhados pelo exercício típico da função jurisdicional, maiores as
cautelas na necessária modulação dos efeitos.
4.4 A aplicação (ir)retroativa do REsp 1.141.990/PR
Como já relatado no tópico 3.3.2.2, a Primeira Seção do Superior Tribunal de
Justiça, ao julgar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.141.990/PR,
afastou a incidência da súmula nº 375, de sua jurisprudência dominante, para execuções
fiscais de créditos de natureza tributária. Todavia, ao invés de ter adstrito o seu
pronunciamento judicial à análise do instituto da fraude à execução sob a perspectiva do
artigo 185, do Código Tributário Nacional, em sua novel redação dada pela Lei
Complementar nº 118/2005, também antecipou, em sede de obter dictum, o seu
entendimento para a interpretação dos casos de fraude à execução ocorridos antes de 09
de junho de 2005.
A saber, ao julgar o mencionado recurso paradigma, o Superior Tribunal de
Justiça estendeu a presunção absoluta (iure et iure) de fraude a execução à interpretação
legal do artigo 185, do Código Tributário Nacional em sua redação pretérita, mesmo
não sendo esta a questão de fundo propriamente envolvida e à míngua de qualquer
provocação. Tratou-se, na prática, da aplicação da técnica do signaling/caveat,
desenvolvida pelo tribunais americanos.
Entretanto, a aplicação dessa técnica denominada signaling/caveat se deu de
forma equivocada. Em sua origem e essência, esta técnica foi concebida como um
refinamento da técnica do prospective overruling (DIDIER JR., 2012), com vistas a,
mutatis mutandis, modular a incidência de uma nova interpretação jurisprudencial,
afastando a “sombra de juridicidade”/previsibilidade jurídica que até então pairava
sobre uma respectiva questão jurídica, em respeito e à serviço da segurança jurídica, e
não o contrário.
A situação fática levada à apreciação naquela ocasião consistia na aquisição de
uma motocicleta em 27 de outubro de 2005, sobre a qual, quando da celebração do
negócio jurídico, não recaia qualquer restrição junto ao cadastro do DETRAN/PR,
93
motivo pelo qual os embargos de terceiro foram julgados procedentes em primeiro grau
e permaneceram com provimento favorável ao embargante no Tribunal Regional
Federal ad quem, por ocasião da apreciação do recurso de apelação. Sucede, entretanto,
que a União (Fazenda Nacional), irresignada, interpôs o recurso especial em análise.
Instado a se manifestar, o Ministério Público Federal opinou, em seu parecer,
pelo desprovimento da insurgência recursal, por entender que seria típico e
inquestionável caso de aplicação da súmula de n.º 375, do Superior Tribunal de Justiça.
Entretanto, ao julgar este recurso por amostragem, supreendentemente a Primeira Seção
chegou à conclusão diametralmente oposta a toda construção jurisprudencial firmada,
afastado a incidência do enunciado sumular até então aplicável.
A partir de então, por refletir o entendimento do Superior Tribunal de Justiça
nessa matéria de direito público, o mencionado obter dictum passou materialmente a
vincular a interpretação do instituto da fraude à execução no direito tributário,
reproduzindo-se na jurisprudência pátria e, em termos práticos, os negócios jurídicos
celebrados até 09 de junho de 2005 também passaram a ser absolutamente considerados
como fraudulentos à execução, havidos por relativamente ineficazes, desde que
celebrados objetivamente após a citação do devedor no processo de execução fiscal.
Ao afastar a incidência da súmula de nº 375 inclusive para a interpretação dos
negócios jurídicos celebrados até então, o Superior Tribunal de Justiça não considerou
os fatos de que, dentre os precedentes que ensejaram a sua criação, encontravam-se
julgados nos quais se enfrentou a interpretação do instituto da fraude à execução fiscal à
luz do artigo 185, do Código Tributário Nacional, e que havia consolidado sua
jurisprudência até então no sentido de que a ocorrência da fraude à execução não
poderia ser decretada pela simples citação do executado, pelo que seria razoável
resguardar a boa-fé do adquirente.
Atento a esse fato e aos efeitos que a alteração jurisprudencial produz à
segurança jurídica, o magistrado federal Marco Bruno Miranda Clementino, titular da 6ª
Vara Federal da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte, estabeleceu, nas razões de
decidir da sentença dos Embargos de Terceiro nº 0002425-58.2011.4.05.8400, que
10. Embora a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por
ocasião do julgamento do recurso especial representativo de controvérsia nº
1.141.990/PR, pelo rito do artigo 543-C do Código de Processo Civil, tenha
estabelecido que, em execuções de créditos de natureza tributária, a súmula
94
nº 375 do STJ não seria aplicável, entendo que esse precedente não vincula o
presente caso concreto.
11. É que, nesse específico recurso, apreciava-se concretamente a
incidência do artigo 185 do Código Tributário Nacional (CTN) sob a redação
atual, introduzida pela Lei Complementar nº 118/2005, sendo essa a
respectiva ratio decidendi. E, embora, no voto do relator, se tenha feito
menção à redação anterior do artigo 185, tal se deu como mero obiter dictum,
já que a questão de fundo não era propriamente essa.
12. Estabeleço essa premissa até por uma preocupação com segurança
jurídica, já que o STJ, sob a vigência da redação anterior, sempre decidiu
diferentemente, entendendo não ser razoável vincular a ocorrência de fraude
à execução à mera citação do executado, assentando ser indispensável o
registro da penhora para que se presumisse a fraude.
13. Dentre os precedentes que ensejaram a edição da súmula n.º 375,
alguns tinham por objeto justamente o enfrentamento, pelo STJ, da discussão
sobre os limites e à configuração da fraude à execução na execução fiscal, à
luz da própria interpretação e aplicação do artigo 185 do CTN, quando da
vigência de sua anterior redação.
(...)
15. Desse modo, caso a alienação ou oneração de bens ou rendas tenha
ocorrido no período da vigência da redação pretérita, a saber, até 08 de junho
de 2005, entendo que, para que se configure fraude à execução fiscal, faz-se
imperioso o prévio registro da penhora do bem alienado ou que reste
comprovada a má-fé do terceiro adquirente.
(...)
Conforme demonstrado no tópico 3.3.2.1, aprofundando-se mais na pesquisa
jurisprudencial da Corte Cidadã, verificou-se que ao menos até o dia do julgamento em
análise, permaneceu irretocável e inabalável a interpretação superior de que seria
imprescindível o prévio registro de penhora judicial ou a prova da má-fé do adquirente
para que se pudesse incidir os efeitos da fraude à execução fiscal.
Portanto, conclui-se que, ao sinalizar para o novo entendimento interpretativo
de um dispositivo legal já modificado, atribuindo-lhe, ainda que em sede de obter
dictum, eficácia retroativa, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça
desconsiderou toda a jurisprudência pacificada em sentido contrário e subverteu a
própria essência da técnica do signaling, influindo negativamente nos efeitos de
negócios jurídicos celebrados com arrimo na, até então, pacífica aplicação da súmula nº
375, e frustrando a legítima confiança depositada na jurisprudência do órgão
jurisdicional a quem compete uniformizar, em última instância, a interpretação dos
textos normativos infraconstitucionais.
Verificada a presença de uma legítima confiança no entendimento
jurisprudencial superado, sua pacífica aplicação e vigência até 10 de novembro de 2010,
e o fato de que a situação concreta apreciada no paradigma envolvia a alienação de uma
motocicleta em 27 de dezembro de 2005, pela observância do autoaplicável princípio
95
fundamental da segurança jurídica impor-se-ia, ao menos a aplicação da técnica do pure
prospective overruling, para que a presunção absoluta de fraude à execução fiscal só se
operasse para negócios jurídicos celebrados após 19 de novembro de 2010, data da
publicação e publicização do julgamento do Recurso Especial em análise.
Nos moldes da técnica da ponderação assentada por Robert Alexy (2011), ao se
considerar que: a atribuição de presunção absoluta de fraude à execução fiscal
tributária atribui maior efetividade às execuções fiscais; Mas, não se olvidando que:
existia entendimento jurisprudencial dominante e potencialmente confiável no sentido
diametralmente oposto, porquanto consubstanciado na súmula n.º 375, do Superior
Tribunal de Justiça; havia confiança depositada na jurisprudência dominante; pairava
até a ocasião desse inovador julgamento, datado de 10 de novembro de 2010, a
interpretação de que a boa-fé do terceiro adquirente deveria ser resguardada; e que a
nova regra geral assentada no Recurso Repetitivo julgado pela Primeira Seção logra de
vinculação material; Conclui-se que o princípio da efetividade da execução, subjacente
ao próprio instituto da fraude à execução e hipertrofiado pela novel interpretação dada,
deve ser precedido pelo princípio da segurança jurídica.
Em outros termos, ainda que se reconstrua essa análise pelo critério da
proporcionalidade, levando-se em conta e constitucionalidade dos propósitos e do meio,
assim como a adequação e necessidade da interpretação da fraude à execução para
resguardar a efetividade tão distanciada dos executivos fiscais, os efeitos retrospectivos
da nova interpretação construída no paradigmático recurso por amostragem não
subsistiriam à proporcionalidade em sentido estrito, nos termos do parágrafo
antecedente.
96
5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
A título de conclusão, para que se reforce o que foi defendido nesse trabalho,
algumas questões merecem ser retomadas.
Enquanto produto social, o Direito e, especialmente, o processo de execução,
sofreram relevantes modificações ao longo da história.
Gradativamente, o Estado foi se aparelhando dos meios executivos necessários
à satisfação dos débitos executados, ao passo que a pessoalidade cedeu espaço para a
responsabilidade patrimonial do devedor.
Nesse contexto, e com vistas à promoção da pacificação social, assentou-se
uma série de princípios a serem observados no processo de execução, dentre os quais se
destacam os princípios da boa-fé, da nulla executio sine titulo, da nulla titulo sine legis,
da responsabilidade patrimonial do devedor e da efetividade da execução, essenciais ao
adequado desenvolvimento executivo.
Ao se aparelhar dos meios coercitivos necessários à satisfação dos créditos
executados, sobretudo decorrentes de obrigações de pagar quantia, o Estado-Juiz passou
a praticar atos de execução por sub-rogação, dentre os quais se destaca o binômio
penhora/expropriação, quer nos processos autônomos de execução ou na execução por
fase procedimental.
Conquanto também se tenham estabelecidos medidas de execução indireta, por
vezes são as medidas sub-rogatórias que garantem a devida efetividade das execuções
judiciais, a partir da(s) constrição(ões) que recaem no patrimônio do executado.
Em sua atividade própria de execução, ao Estado é imposto o dever de
dispender seus esforços para conferir efetividade e celeridade na satisfação das
pretensões creditícias sobre as quais recaem sua tutela.
Contudo, entre a origem da obrigação e o seu adimplemento, o devedor, ao se
distanciar da boa-fé que deve nortear sua conduta, pode praticar determinados atos de
disposição patrimonial com vistas a frustrar a legítima pretensão de satisfação do
crédito, que são as fraudes do devedor, notadamente a fraude contra credores e a fraude
à execução fiscal.
Em ambos os casos, o credor aliena ou onera os bens que, por força de sua
responsabilidade patrimonial, satisfariam as obrigações por ele inadimplidas. Todavia,
sua principal diferença reside nos interesses prejudicados.
97
Ao passo que a fraude contra credores atenta apenas contra o interesse privado
do credor, na fraude à execução, além de se ofender a pretensão patrimonial do
exequente, macula-se principalmente a dignidade da jurisdição executiva, que tem os
deveres constitucionais de zelar e agir pela efetividade de seus provimentos
jurisdicionais.
A segunda diferença entre os referenciados institutos reside no fato de que, na
fraude contra credores, é a partir da ação pauliana ou revocatória que se anula o negócio
jurídico celebrado, enquanto que na fraude à execução, mediante simples incidente
processual é que se declara a ineficácia relativa do negócio jurídico fraudulento.
Em se tratando de fraude à execução, na ausência de regulamentação legal
específica, aplicam-se as disposições gerais do Código de Processo Civil, ao passo que,
para execuções fiscais tributárias incidirão as disposições do artigo 185, do Código
Tributário Nacional.
Em ambos os casos, contudo, a despeito de as molduras normativas terem
estabelecido apenas o eventus damni como requisito para a caracterização desse
instituto processual, o Superior Tribunal de Justiça, com vistas a resguardar a boa-fé do
adquirente, consolidou o entendimento jurisprudencial de que seria imprescindível a
comprovação do conluio entre os pactuantes ou o prévio registro da penhora para que se
declara-se a ineficácia dos negócios jurídicos havidos, interpretação que culminou na
edição do enunciado de n.º 375, da súmula de sua jurisprudência dominante.
Apenas em 10 de novembro de 2010, a Primeira Seção do Superior Tribunal de
Justiça, ao julgar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia n.º 1.141.990/PR,
pelo rito do artigo 543-C, do Código de Processo Civil, afastou a incidência do
referenciado enunciado sumular para conferir presunção absoluta (iure et iure) à fraude
à execução fiscal tributária prevista no artigo 185, do Código Tributário Nacional.
Desse modo, passou a vigorar a regra geral segundo a qual para que se
configure a fraude à execução fiscal tributária basta que o ato de celebração do negócio
jurídico tenha ocorrido após o ato de inscrição em Dívida Ativa.
Entretanto, o mencionado órgão fracionário da Corte Cidadã, em sede de obter
dictum, também estendeu essa novo entendimento para o período anterior à sua
prolatação, na qual a toda a sua jurisprudência havia se projetado no sentido de
resguardar a boa-fé do adquirente.
98
Assim, inclusive para os negócios jurídicos celebrados à época em que
vigorava a redação pretérita do artigo 185, do Código Tributário Nacional – antes de 9
de junho de 2005 -, a fraude à execução fiscal tributária se operaria objetivamente,
residindo a única diferença no critério temporal para aferição, que, como já elucidado
no trabalho, é o ato processual de citação.
Após verificar a tendência que o legislador tem conferido ao sistema
processual pátrio, aproximando-o da família do common law e emprestando-lhe maior
respeito e vinculação (ao menos material) aos precedentes oriundos dos Tribunais
Superiores, evidenciou-se a necessidade de reconhecer a incidência direta, imediata e
plena do princípio constitucional da segurança jurídica, para que, à míngua de previsão
legal expressa, mas com arrimo nas experiências do direito alienígena e pátrio, a ratio
decidendi de determinados paradigmas jurisprudências tivesse a sua incidência temporal
modulada, dado o papel jurisdicional constitucionalmente atribuído aos Tribunais
Superiores aliado à natureza criativa da interpretação jurisprudencial do Direito
Pelo fato de o Superior Tribunal de Justiça ter conferido efeitos ex tunc à nova
interpretação que modificou completamente a jurisprudência até então pacífica em seu
âmbito jurisdicional, este e os demais órgãos jurisdicionais inferiores passaram, em
virtude da vinculação material inerente ao regime dos recursos repetitivos, a aplicar a
presunção absoluta (jure et jure) de fraude à execução fiscal, reconhecendo a ineficácia
relativa dos negócios jurídicos até então celebrados e autorizando a expropriação de
seus objetos mediatos (imóveis, móveis, ações, etc.), fato que notadamente rompeu com
a segurança jurídica que até então pairava sobre os efeitos materiais desses atos
jurídicos perfeitos.
Conclui-se, portanto, ao cabo do presente estudo, que à interpretação inovadora
dada ao instituto processual da fraude à execução fiscal tributária, regido pelo artigo
185, do Código Tributário Nacional, dever-se-ia ter atribuído efeitos puramente
prospectivos, para que, assim como ocorre com as leis retroativas, resguardassem-se os
efeitos materiais dos atos jurídicos perfeitos até então celebrados com arrimo na pacífica
jurisprudência recente e abruptamente superada.
99
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