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  • A INTELIGNCIA NATURALISTA: um novo caminho para a educao ambiental

    Valerie Nicollier Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente pela Universidade

    Estadual de Santa Cruz (UESC) E-mail: [email protected]

    Fermin Garcia C. Velasco

    Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) Departamento de Cincias Exatas e Tecnolgicas

    Doutor em Fsica Del Ncleo Atmico pelo CEADEN, Cuba E-mail: [email protected]

    RESUMO A presente pesquisa prope uma nova abordagem para a aprendizagem das questes ecolgicas na infncia, a partir de uma anlise da cognio humana. Fundamenta-se na Teoria das Inteligncias Mltiplas de Howard Gardner (1994), que preconiza a existncia de oito inteligncias no ser humano, inclusive uma Inteligncia Naturalista. Os princpios da Educao para a Sustentabilidade formaram o alicerce filosfico e pedaggico para definir o Saber Ambiental. O estudo partiu da pergunta de como a Inteligncia Naturalista se manifesta na interao com as demais inteligncias e qual a sua relao com o Saber Ambiental. A investigao quanti-qualitativa foi realizada ao longo de dois anos (2002/2004) numa escola de Ensino Fundamental de Ilhus, Bahia, Brasil, envolvendo 45 crianas de 1 a 4 sries. Os resultados sugerem que o desenvolvimento da Inteligncia Naturalista pressuposto para o desenvolvimento de um Saber Ambiental na segunda infncia. Palavras-chaves: cincias cognitivas, Teoria das Inteligncias Mltiplas, inteligncia naturalista, educao para a sustentabilidade ABSTRACT The present research proposes a new approach to understand the development of Environmental Knowledge in middle childhood. It interprets human cognition according to the Theory of Multiple Intelligences of Howard Gardner (1994) that defends the existence of eight types of human intelligence, including a Naturalist Intelligence. The principles of Education for Sustainability formed the foundations for a definition of Environmental Knowledge in its philosophical and pedagogical aspects. The research investigated the manifestation of Naturalist Intelligence joint to other intelligences and its relationship with Environmental Knowledge. This quantitative and qualitative study has been carried out along two years (2002/2004) in an Elementary School in Ilhus, Bahia, Brazil, including 45 children through 1st to 4th graders. Research results suggest that the development of the Naturalist Intelligence is a condition to expand the Environmental Knowledge in childhood. Key words: cognitive sciences, Theory of Multiple Intelligences, naturalist intelligence, education for sustainability

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    REDE Revista Eletrnica do Prodema, Fortaleza, v. 2, n.1, p. 19-44, jun. 2008. ISSN 1982-5528.

    1 INTRODUO

    Assistimos, atualmente, a uma das mais graves crises ecolgicas de toda histria do nosso Planeta. Os impactos causados pela presena humana na Terra levam os cientistas a comparar o surgimento da espcie humana s grandes catstrofes da escala do tempo geolgico, que transformaram radicalmente, em sua composio e em seu equilbrio, a flora e a fauna do mundo inteiro.

    Ao mesmo tempo em que o conhecimento da Natureza tornou-se cada vez mais importante para a sua preservao, a biologia popular vem sofrendo uma crescente involuo como demonstram as pesquisas de Wolff, Medin & Pankratz (1999). Os estudos revelam o brusco declnio quantitativo e qualitativo do conhecimento popular sobre as plantas e os animais que marcou o sculo XX, enquanto mostram que houve um forte crescimento dos termos referentes a outras categorias, como livros, roupas e mveis.

    Portanto, de suma importncia para a humanidade a construo de uma nova racionalidade, fundamentada em uma conscincia ecolgica que no s deve guiar as aes dos poderes pblico e privado, mas, especialmente, deve inspirar o modo de vida da populao em geral (LEFF, 2002). Nesse sentido, a Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988 dedica um captulo inteiro questo ambiental e define que cabe ao Poder Pblico promover a Educao Ambiental em todos os nveis de ensino e a conscientizao pblica para a preservao do Meio Ambiente (CF art. 225, VI). Os Parmetros Curriculares Nacionais (PCNs) formulados pelo Ministrio de Educao e do Desporto representam mais um esforo direcionado implantao definitiva da Educao Ambiental na educao formal no Brasil. Os PCNs consideram que a Educao Ambiental deve estar presente no currculo como tema transversal, desde as primeiras sries de Ensino Fundamental, devendo ser interessante e prazerosa para que a criana estabelea, em primeiro lugar, uma ligao afetiva com o tema Meio Ambiente (BRASIL, 1998).

    No entanto, ainda so poucas as propostas pedaggicas sistematizadas para a Educao Ambiental no Ensino Bsico. Diversas teorias e metodologias de fundamentao scio-construtivista foram absorvidas por educadores que propem abordagens educativas para as questes ambientais na escola (MEDINA; SANTOS, 2000; DIAS, 1992), no entanto, apesar de todas as iniciativas importantes, nota-se que os esforos ainda no lograram o desejado resultado. No se constata, na populao em geral, uma modificao significativa do estilo de vida e dos valores e atitudes que determinam a relao do homem com a Natureza (CRESPO, 2003).

    Podemos afirmar que a Educao Ambiental ainda no contempla as mais recentes descobertas sobre o ser humano na rea das cincias cognitivas. Ao estabelecerem um dilogo entre as cincias naturais e as cincias humanas, essas abriram caminhos para uma nova compreenso do funcionamento da mente. Um dos produtos dessa rica discusso entre representantes de diferentes reas do conhecimento a Teoria das Inteligncias Mltiplas de Howard Gardner (1983/1994) que reformulou o conceito tradicional de inteligncia. Seguindo os novos critrios cientficos estabelecidos para definir uma inteligncia, Gardner e sua equipe identificaram a existncia de sete inteligncias no ser humano: as inteligncias lingstica, lgico-matemtica, musical, visuo-espacial, cinestsico-corporal, inter- e intrapessoal. Cada inteligncia, enquanto potencial bio-psicolgico, corresponde a uma forma especfica de compreender o mundo, sendo que todo ser humano possui todas as inteligncias que, interagindo entre si, formam o perfil cognitivo individual de cada pessoa. Recentemente, Gardner (2000) props a existncia de uma oitava

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    inteligncia, a Inteligncia Naturalista, que corresponde capacidade humana de conhecer a Natureza.

    Conforme os novos princpios da educao, que preconizam a formao integral e o desenvolvimento pleno do ser humano, os educadores vm buscando, nas cincias cognitivas, modelos que ampliam a compreenso do ser humano na sua totalidade. Nesse contexto, a Teoria das Inteligncias Mltiplas vem se destacando pelas suas inmeras possibilidades de aplicao prtica na formao de pessoas (GARDNER; KORNHABER; WAKE, 1998; CAMPBELL; CAMPBELL; DICKINSON, 2000; ARMSTRONG, 2001).

    No intuito de aprimorar a qualidade do ensino, diversos estudiosos realizaram pesquisas que avaliam e propem metodologias para investigar as mltiplas inteligncias dos alunos (TEELE, 1992; SHEARER, 1997; MCMAHON; ROSE; PARKS, 2004), ao passo que discutem os resultados da aplicao da Teoria das Inteligncias Mltiplas na sala de aula, propondo formas de mensurar essa relao entre a teoria, a prtica e o desempenho manifesto dos alunos em diferentes reas de conhecimento (ARMSTRONG, 2001; MCMAHON; ROSE; PARKS, 2004; DECLAN & TANGNEY, 2006). As escolas que adotam a Teoria das Inteligncias Mltiplas, oferecendo um espao e um currculo que estimulam as diferentes inteligncias dos seus alunos, esto se multiplicando nos Estados Unidos como relata o Project Zero of Harvard Graduate School of Education (PROJECT ZERO, 2007) e em outros pases como, por exemplo, na China, cujo sistema educacional foi redesenhado em funo da Teoria das Inteligncias Mltiplas (JIE-QI CHEN, 2006). Quanto aplicao bem sucedida dessa teoria, temos relatos tambm na rea das artes (KUZNIEWSKI et al. 1998; GEIMER et. al. 2000), no aprimoramento das capacidades de leitura (GENS et al. 1998) e na ampliao da compreenso de conceitos em cincia (ZDEMIR; GNEYSU; TEKKAYA, 2006).

    Numa crtica s propostas educativas tradicionais e construtivistas, Gardner (1994a) esclarece que estas do uma nfase maior ao desenvolvimento das inteligncias lgico-matemtica e lingstica, ao fundamentar-se em uma viso unitria da inteligncia. A Teoria das Inteligncias Mltiplas mostra que possumos tambm outras inteligncias, inclusive uma Inteligncia Naturalista. O presente trabalho sugere que a aplicao da Teoria das Inteligncias Mltiplas na escola abre possibilidades inditas de ensino-aprendizagem para as questes ecolgicas na infncia.

    2 FUNDAMENTOS METODOLGICOS

    A presente pesquisa buscou, de um lado, a verificao da hiptese de que existe um elo entre as inteligncias e o Saber Ambiental. Neste sentido, configurou-se como uma pesquisa bsica, que visa extenso do conhecimento cientfico. De outro lado, a nossa pesquisa pretendeu oferecer uma resposta prtica a um problema concreto e imediato: a falta de um conjunto sistematizado de metodologias atraentes e eficientes em Educao Ambiental. Neste aspecto, a pesquisa apresentou-se como uma pesquisa aplicada. Considerando, pois, as vrias dimenses envolvidas nesse estudo, foi necessria uma combinao de diferentes tipos de metodologias para a integrao do nosso Research Design (WIERSMA, 2000).

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    Apresentamos, a seguir, o esquema geral da pesquisa, na Figura 1:

    PBLICO Participantes: 45 Crianas de 1 a 4 srie do Ensino Fundamental, educadores e pais. Caracterizao: Populao urbana de classe mdia com pouco contato com o ambiente natural.

    LOCAL Escola Particular de Ensino Fundamental mantida por uma associao sem fins lucrativos. Municpio de Ilhus, Bahia, Brasil

    ANO/DURAO 2002/2004 Durao 24 meses

    OBJETIVOS

    - Descrever os perfis de inteligncias e do Saber Ambiental das crianas, atravs do acompanhamento do desenvolvimento cognitivo das mesmas, a fim de evidenciar algumas relaes existentes entre a Inteligncia Naturalista (enquanto potencial biopsicolgico) e o Saber Ambiental (enquanto manifestao desse potencial). - Verificar se o estmulo s inteligncias das crianas pode contribuir significativamente para o desenvolvimento de um Saber Ambiental, mediante a elaborao e aplicao de metodologias fundamentadas na Teoria das Inteligncias Mltiplas voltadas para a Educao Ambiental.

    HIPTESE O estmulo ao desenvolvimento da Inteligncia Naturalista em interao com as demais inteligncias nas crianas ir contribuir para o desenvolvimento do Saber Ambiental das mesmas.

    INTERVENES PEDAGGICAS FORMATIVAS

    1. Ensino sobre a Teoria das Inteligncias Mltiplas para as crianas, os educadores e os pais. 2. Aplicao da Teoria nos projetos interdisciplinares de ensino, permitindo a vivncia de todas as inteligncias. 3. Introduo sistemtica do tema transversal Meio Ambiente e ensino dos conceitos essenciais da ecologia, atravs do uso das mltiplas inteligncias.

    METODOLOGIAS DE AVALIAO E ACOMPANHAMENTO

    1. PERFIS DE INTELIGNCIAS DAS CRIANAS - Avaliao sistemtica dos perfis de Inteligncias Mltiplas com formulrios (auto-avaliao, avaliao pelos pais, avaliao pela professora) - Intervenes pedaggicas (42 ciclos de aulas) com registro sistemtico das observaes - Portflio da criana - Dirio do educador - Observao assistemtica pela pesquisadora 2. SABER AMBIENTAL DAS CRIANAS - Entrevistas Ecossistema - Diagnstico e acompanhamento (5 atividades) - Intervenes pedaggicas (42 ciclos de aulas) com registro sistemtico das observaes - Portflio da criana - Dirio do educador - Observao assistemtica pela pesquisadora

    Figura 1 - Esquema geral da pesquisa

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    2.1 O universo da pesquisa Participaram dessa pesquisa 45 crianas de 1 a 4 srie do Ensino Fundamental, seus

    educadores e pais. A pesquisa foi realizada ao longo de dois anos (2002/2004) com crianas entre 6 e 11 anos de idade numa escola particular mantida por uma associao de pais sem fins lucrativos, com proposta de ensino construtivista. A escola em questo est inserida na zona urbana de um municpio que possui aproximadamente 222.000 habitantes (IBGE, 2001), localizado no Sul da Bahia, no Brasil. Os educadores possuem formao universitria e as famlias das crianas pertencem, na sua maioria, classe mdia.

    2.2 Procedimentos gerais na aplicao da pesquisa

    O nosso ponto de partida para a pesquisa foi a introduo da Teoria das Inteligncias

    Mltiplas (TIM), na escola em 2002, atravs de seminrios e palestras para pais e educadores e um curso para os educadores. Em 2003, iniciamos o ano letivo com um diagnstico do Saber Ambiental das crianas, atravs da aplicao de uma entrevista, que est relacionada na figura 2. No decorrer do ano letivo 2003, aplicamos intervenes pedaggicas (42 ciclos de aula), cujo objetivo era: ensinar a TIM para as crianas e os educadores (e indiretamente para os pais interessados); aplicar a TIM nos projetos interdisciplinares de ensino, permitindo a vivncia de todas as inteligncias; introduzir de forma sistemtica o tema transversal Meio Ambiente e ensinar os conceitos essenciais da ecologia, atravs do uso das mltiplas inteligncias. Uma descrio do perfil de inteligncias das crianas foi realizada com a participao das mesmas, dos seus pais e dos educadores, no final do ano 2003. Vrios aspectos observveis do Saber Ambiental e das inteligncias das crianas foram acompanhados durante todo processo de aplicao das intervenes pedaggicas, por meio de observaes sistemticas (registros dos pesquisadores, dirio da professora, portflio da criana, questionrios, avaliaes) e observaes assistemticas (registros dos pesquisadores) at maro de 2004.

    3 O SABER AMBIENTAL

    Um termo comum quando se fala em Educao Ambiental conscincia ambiental.

    Acreditamos que o termo conscincia, pela sua complexidade e variedade de compreenses possveis, um termo inadequado e que dificulta a aproximao em relao a uma conceituao mais exata em Educao Ambiental. Portanto, sugerimos o uso do termo Saber Ambiental, pois nos parece um termo adequado para explorar os diferentes aspectos relacionados ao funcionamento de uma mente enraizada (no corpo e no ambiente socioambiental), na qual se inscreve a relao do homem com a Natureza. Encontramos muitas abordagens em relao ao termo saber no campo da filosofia e da educao.

    O Saber Ambiental, alm de representar um novo tipo de racionalidade, como preconizado por Leff (2002), foi definido, neste trabalho, de acordo com Os quatro pilares da Educao de Delors (1999) reconhecidos universalmente como parmetros na definio dos objetivos na Educao. Estas recomendaes descrevem o aprender como fenmeno pluridimensional, como aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser. O Saber Ambiental refere-se a essas quatro dimenses do aprender.

    O termo ambiental, por sua vez, deve ser entendido como o conjunto de elementos e relaes em que o prprio homem foi constitudo ao longo de uma histria evolutiva. Ou

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    seja, defendemos uma viso de integralidade, que percebe o homem como parte da Natureza e cuja prpria natureza est diretamente relacionada com o ambiente em que se constitui.

    Supomos, pois, inicialmente, que o Saber Ambiental, enquanto saber-conhecimento, saber fazer, saber ser e saber viver juntos, dentro de uma tica da sustentabilidade, deve ser mais amplo do que a Inteligncia Naturalista em si. Levantamos a hiptese de que o Saber Ambiental poderia ser descrito a partir de uma anlise profunda da Inteligncia Naturalista, a descrio desta em interao com as demais inteligncias e a manifestao concreta destes diferentes potenciais biopsicolgicos num contexto especfico, scio-ambiental. Na Figura 2 listamos os principais temas abordados atravs de diferentes atividades (de pesquisa ou intervenes pedaggicas), que tiveram como objetivo a obteno de dados sobre o Saber Ambiental das crianas.

    METODOLOGIA POPULAO

    SRIES DATA TEMAS/ ELEMENTOS DO SABER AMBIENTAL

    1. Entrevista Ecossistema

    1 4

    dez. 2002 a abril 2003

    Elementos biticos/abiticos (funo). Relaes no ecossistema. Viso sistmica. Reproduo plantas. Ciclo da matria. Conceito de natureza. O lugar do homem na Natureza.

    2. Jogos vivo ou morto

    1, 2 e 4

    nov. 2002

    Conceito de ser vivo.

    3. Preferncia animais

    3 e 4

    Julho 2003

    Interesses (espontneos) da criana.

    4. Conhecimentos espcies plantas/animais

    2 4

    Ano 2003

    Conhecimento da flora e fauna. Distino flora e fauna brasileira e extica. Conhecimento da Mata Atlntica. Conscincia de viver em um Hotspot.

    5. Histria do universo

    1, 3 e 4

    Maro e maio 2003

    A vida como fenmeno especial encontrado s na Terra. Evoluo. Biodiversidade. Extino. Viso cientfica ou religiosa.

    6. Relao homens/ animais -tica

    3 e 4

    Julho 2003

    Relao do homem com os animais e com as plantas julgamento de valor. Lugar do homem na Natureza. Viso da Natureza (valor).

    Figura 2 - Diagnstico e acompanhamento do desenvolvimento do Saber Ambiental

    Inicialmente, fizemos um levantamento amplo das concepes infantis sobre alguns

    conceitos essenciais da ecologia e do conhecimento das crianas sobre o ambiente local, mediante a realizao de uma entrevista individual com 30 das 45 crianas que participaram da pesquisa (Figura 2, item 1). A fala de cada criana entrevistada foi cuidadosamente registrada e tabelada. Na entrevista realizada com as crianas foi utilizado um jogo de gravuras elaborado a partir de um material de pesquisa da Universidade de Harvard criado por Bell-Basca et. al. (2000). A entrevista referia-se compreenso da Teia da vida, como conceito amplo para a compreenso da Natureza. Abordava a importncia do sol, da gua e

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    das rvores e visava, basicamente, revelar a compreenso da criana a respeito da relao dos seres vivos com o ambiente e, indiretamente, a noo da mesma em relao aos conceitos vida e seres vivos.

    No decorrer das intervenes pedaggicas, foram aplicadas mais cinco atividades de diagnstico relacionadas ao Saber Ambiental das crianas (Figura2, itens 2 a 6). Vrios aspectos observveis do conhecimento das crianas sobre a Natureza foram acompanhados durante todo processo de aplicao das intervenes pedaggicas, por meio de observaes sistemticas (registros dos pesquisadores, dirio da professora, portflio da criana, questionrios, avaliaes) e observaes assistemticas (registros dos pesquisadores). Os contedos trabalhados foram selecionados de acordo com os temas e os princpios sugeridos pelos PCN`s (1998); por Coll & Teberosky (2000) e por Sussman (2000).

    3.1 A Inteligncia Naturalista

    A TIM preconiza que cada inteligncia corresponde a uma possibilidade especfica de

    conhecer o mundo; funciona de forma relativamente autnoma; e, uma combinao nica, das oito inteligncias, caracteriza a mente de uma pessoa normal (CAMPBELL, CAMPBELL & DICKINSON, 2000).

    A inteligncia conceituada por Gardner (2000),

    [...] como um potencial biopsicolgico para processar informaes que pode ser ativado num cenrio cultural para solucionar problemas ou criar produtos que sejam valorizados numa cultura. (...) as inteligncias no so objetos que podem ser vistos nem contados. Elas so potenciais neurais presumivelmente que podero ser ou no ativadas, dependendo dos valores de uma cultura especfica, das oportunidades disponveis nessa cultura e das decises pessoais tomadas por indivduos e/ou suas famlias, seus professores e outros (Gardner, 2000, p. 47).

    A Inteligncia Naturalista descrita por Gardner (1994a; 2000) como a capacidade

    em reconhecer padres na Natureza; identificar e classificar objetos e as numerosas espcies; compreender sistemas naturais e aqueles criados pelo homem. Inclui a sensibilidade a outros fenmenos naturais, como nuvens, montanhas e paisagens. A expresso de seu papel adulto representada pelo naturalista que exerce uma funo importante em todas as culturas. O naturalista, Gardner, demonstra grande experincia no reconhecimento e na classificao de numerosas espcies a flora e a fauna de seu meio ambiente, e as sociedades apreciam pessoas capazes de reconhecer membros especialmente valiosos ou notadamente perigosos de uma espcie e de categorizar organismos novos e desconhecidos.

    Gardner e sua equipe (1994a) elaboraram oito critrios de evidncia para definir a existncia de uma inteligncia, listados na Figura 3.

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    RAZES DISCIPLINARES CRITRIOS

    CINCIAS BIOLGICAS

    1. Isolamento potencial por dano cerebral; 2. Uma histria evolucionria plausibilidade

    evolucionria;

    ANLISE LGICA

    3. Uma operao ou conjunto de operaes nucleares identificvel;

    4. Suscetibilidade codificao num sistema de smbolos;

    PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO

    5. Uma histria do desenvolvimento distinta, juntamente com um conjunto definvel de desempenhos acabados;

    6. A existncia de sbios idiotas, prodgios e outras pessoas excepcionais;

    PSICOLOGIA TRADICIONAL

    7. Apoio de tarefas psicolgicas experimentais; 8. Apoio de descobertas psicomtricas;

    Figura 3 - A Inteligncia Naturalista luz dos 8 critrios definidores de uma inteligncia

    Fonte: Gardner, 2000, p. 49-55

    Alguns critrios foram especialmente relevantes para o nosso estudo da Inteligncia

    Naturalista, como relacionados em seguida: 3.2 A plausibilidade evolucionria

    Achados da biologia evolutiva indicam a existncia de uma histria evolutiva para a

    Inteligncia Naturalista (GARDNER, 2000). Acreditamos na tese de Mithen (2002), segundo a qual o estudo do Homo habilis, que viveu h dois milhes de anos, demonstra que as inteligncias naturalista, tcnica e social surgiram gradativamente a partir de uma inteligncia geral que marcava o pensamento do nosso ancestral comum ou elo perdido. Nos Homens arcaicos, que viveram no perodo que se estende de 1,8 milho de anos a 100 mil anos atrs, a existncia de inteligncias especializadas j se tornara ntida. Nesta poca, uma definio mais exata da Inteligncia Naturalista, como domnio especializado, tornou-se possvel e o autor assim a descreve:

    A inteligncia naturalista uma amlgama de pelo menos trs subdomnios do pensamento: o dos animais, o das plantas e o da geografia da paisagem, como a distribuio de fontes de gua e cavernas. No todo refere-se a compreender a geografia da paisagem, o ritmo das estaes e os hbitos das presas em potencial. Refere-se a observaes do mundo natural no presente para prever o futuro: o significado da formao de nuvens, de pegadas de animais, da chegada e partida de pssaros durante a primavera e o outono (MITHEN, 2002, p. 197).

    3.3 Um desenvolvimento distinto

    Gardner (1994; 2000) sugere que as inteligncias esto relacionadas a uma

    participao em alguma atividade culturalmente valorizada e que o desenvolvimento do indivduo nesta atividade segue uma determinada trajetria desenvolvimental, levando de manifestaes bsicas e universais a um estado final de percia. Assim, a Inteligncia Naturalista possui uma histria desenvolvimental distinta e um conjunto definvel de desempenhos especializados (estados finais ou adultos).

    Supe-se que existem alguns paralelos entre a histria da evoluo humana e o desenvolvimento do ser humano (MITHEN, 2002). Por exemplo, o processo de especializao

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    pelo qual passa a mente humana ao longo da sua histria evolucionria encontra um paralelo no processo de desenvolvimento do ser humano, que tambm acontece a partir de esquemas gerais (perodo sensrio-motor em Piaget) e caminha em direo a uma crescente especializao ou modularizao mental com inteligncias especficas (KARMILOFF-SMITH, 1999; MITHEN, 2002). Por sua vez, a culminncia do processo evolutivo e desenvolvimental da especializao a fluidez cognitiva, ou seja, a interao perfeita dos diferentes domnios, mdulos ou inteligncias, produzindo nveis mais elaborados de conhecimento (FODOR, 1983; GARDNER, 1994a; KARMILOFF-SMITH, 1999; MITHEN, 2002).

    As experincias sugerem que um ensino atravs do estmulo s mltiplas inteligncias particularmente eficaz, quando se trata da aprendizagem de conceitos complexos. Pois, a compreenso de processos complexos demanda o funcionamento integrado de diferentes inteligncias, pressupondo a fluidez cognitiva, e os indivduos mais criativos so aqueles que conseguem estabelecer conexes entre domnios ou mapeamentos, atravs do uso de metforas e analogias (GARDNER, 2000).

    4 PROCEDIMENTOS DE AVALIAO E ACOMPANHAMENTO DO DESENVOLVIMENTO DAS MLTIPLAS INTELIGNCIAS

    A TIM postula que todas as pessoas possuem as oito inteligncias, podendo

    desenvolv-las em um nvel bem elevado de competncias. Observou-se, contudo, que as crianas apresentam certas tendncias ou inclinaes desde pequenas. Espera-se que, na segunda infncia, as crianas j tenham estabelecido maneiras preferenciais de aprender, seguindo algumas inteligncias em detrimento de outras (GARDNER, 1994a; 1994b; 2000; ARMSTRONG, 2001). Ao buscar descrever os perfis individuais das crianas, tivemos o cuidado para no categorizar, nem rotular as mesmas. Ao contrrio, a avaliao dos perfis de inteligncias foi um instrumento para facilitar o acesso da criana aos contedos escolares (mediante abordagens pedaggicas que considerem os estilos individuais de aprendizagem), como para estimular o desenvolvimento integral da criana, atravs de um trabalho direcionado em funo das inteligncias mais ou menos marcantes.

    Na escola pesquisada, uma das peas dos portflios, para acompanhar o desenvolvimento individual das crianas, foi a avaliao do perfil de inteligncias da criana atravs de formulrios prprios. Os formulrios foram elaborados com base no modelo sugerido em Armstrong (2001), para a avaliao do perfil da criana, em que so utilizados vrios indicadores para a identificao de cada uma das oito inteligncias (Fig. 4). Fizemos uma adaptao desses indicadores realidade local das crianas em estudo.

    Os indicadores das inteligncias referem-se a comportamentos manifestos, a interesses e preferncias, mas tambm a sentimentos. A avaliao do perfil de inteligncias da criana, atravs da escolha dos indicadores que so julgados mais adequados por quem avalia, corresponde, na verdade, a uma descrio da personalidade da criana, mediante identificao de suas habilidades, interesses e sentimentos, no tendo qualquer peso valorativo. Cada indicador ilustra um dos mltiplos aspectos de uma inteligncia e, ao ser assinalado, expressa que a criana apresenta o comportamento, um interesse, uma preferncia ou um sentimento descrito, com certa freqncia, em detrimento dos demais indicadores no assinalados.

    No foi estabelecido um mnimo de indicadores a ser assinalado (podendo ser zero), e o limite mximo o prprio nmero de indicadores, havendo sempre a possibilidade de o avaliador acrescentar alguns indicadores que julgasse importantes. Portanto, no h valores

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    absolutos, nem referenciais fixos, para comparar os perfis, mas trabalhamos com valores relativos e ponderveis entre si que demonstram certas tendncias individuais e coletivas, sujeitas a interpretaes.

    Os formulrios foram aplicados como auto-avaliao (preenchidos pela criana); como avaliao pelos pais e como avaliao pelo professor. Nos formulrios, cada uma das inteligncias foi avaliada em funo de 10 a 15 indicadores, conforme exemplo abaixo (Figura 4).

    INDICADORES PARA AUTO-AVALIAO DA INTELIGNCIA NATURALISTA (AUTO-AVALIAO)

    1 ADORO ANIMAIS E CUIDO BEM DELES

    2 GOSTO DE ESTAR AO AR LIVRE, TENHO LUGARES PREFERIDOS NA NATUREZA

    3 PERCEBO COM FACILIDADE PEQUENOS DETALHES PRESENTES NA NATUREZA

    4 APRECIO PLANTAS E GOSTO DE CUIDAR DELAS

    5 FICO INDIGNADO(A) COM QUALQUER TIPO DE MAUS TRATOS AOS ANIMAIS 6 GOSTO DE COLECIONAR OBJETOS DA NATUREZA (PEDRAS, CONCHAS, FOLHAS ETC)

    7 NUM ESPAO NATURAL OU SELVAGEM, FICO VONTADE E SINTO-ME FAZENDO PARTE DAQUELE AMBIENTE

    8 GOSTO DE ESTUDAR CINCIAS NATURAIS (SERES VIVOS, QUMICA, FSICA, HISTRIA DA TERRA)

    9 PREFIRO PRAIA PISCINA, POIS NA PRAIA ESTOU EM CONTATO COM A NATUREZA

    10 OBSERVAR O COMPORTAMENTO DOS ANIMAIS ME FASCINA

    11 GOSTO DE ASSISTIR FILMES SOBRE A NATUREZA OU A VIDA ANIMAL

    12 EU ME ACHO PARECIDO(A) COM OS ANIMAIS EM MUITAS COISAS

    13 ADORO LER OU OUVIR HISTRIAS RELACIONADAS COM A VIDA NA NATUREZA

    14 NA CIDADE GRANDE NO ME SINTO TO BEM, POIS, PARA MIM, IMPORTANTE VIVER NUM LUGAR PERTO DA NATUREZA

    15 (A CRITRIO DO OBSERVADOR)

    Figura 4 - Exemplos extrados das listras de verificao das inteligncias por formulrios

    Antes de realizar as auto-avaliaes, os educadores liam todas as questes com os alunos nas 1, 2 e 3 sries. Na 4 srie, os alunos liam e respondiam sem a ajuda do educador, embora esse estivesse presente o tempo todo para tirar dvidas. A cada dia foi

    INDICADORES PARA AVALIAO DA INTELIGNCIA NATURALISTA (AVALIAO PELOS PAIS)

    MEU FILHO / MINHA FILHA

    1 ADORA ANIMAIS E CUIDA BEM DELES

    2 GOSTA DE ESTAR AO AR LIVRE, TEM LUGARES PREFERIDOS NA NATUREZA

    3 PERCEBE COM FACILIDADE PEQUENOS DETALHES PRESENTES NA NATUREZA 4 APRECIA PLANTAS E GOSTA DE CUIDAR DELAS

    5 FICA INDIGNADO(A) COM QUALQUER TIPO DE MAUS TRATOS AOS ANIMAIS

    6 GOSTA DE COLECIONAR OBJETOS DA NATUREZA (PEDRAS, CONCHAS, FOLHAS ETC)

    7 NUM ESPAO NATURAL OU SELVAGEM, FICA VONTADE E SENTE-SE FAZENDO PARTE DAQUELE AMBIENTE

    8 GOSTA DE ESTUDAR CINCIAS NATURAIS (SERES VIVOS, QUMICA, FSICA, HISTRIA DA TERRA)

    9 PREFERE PRAIA PISCINA, POIS NA PRAIA EST EM CONTATO COM A NATUREZA E SE SENTE MAIS LIVRE

    10 OBSERVAR O COMPORTAMENTO DOS ANIMAIS O FASCINA

    11 GOSTA DE ASSISTIR FILMES SOBRE A NATUREZA OU A VIDA ANIMAL

    12 ACHA-SE PARECIDO(A) COM OS ANIMAIS (FAZ COMPARAES, IMAGINA SER UM ANIMAL)

    13 ADORA LER OU OUVIR HISTRIAS RELACIONADAS COM A VIDA NA NATUREZA

    14 NA CIDADE GRANDE NO SE SENTE TO BEM, POIS, PREFERE VIVER NUM LUGAR PERTO DA NATUREZA

    15 (A CRITRIO DO OBSERVADOR)

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    feita a avaliao de apenas uma inteligncia, at completar as oito inteligncias, para evitar que a avaliao se tornasse demasiadamente cansativa para os alunos, pois, se eles perdessem o interesse em responder os formulrios, passariam a responder s perguntas sem ateno.

    Para compor o perfil individual de inteligncias de cada criana, foi contado o nmero de indicadores marcado em cada inteligncia; o nmero de indicadores foi convertido em um valor percentual relativo para cada inteligncia e esses valores foram representados num grfico de curvas, em que as linhas que unem os pontos no representam funes, mas apenas objetivam dar coerncia aos dados da mesma origem (Fig. 5).

    5 RESULTADOS

    Consideramos que a descrio dos perfis de inteligncias das crianas alcanou uma

    expresso marcante no momento em que aplicamos as avaliaes atravs dos formulrios. Partimos, portanto, dos resultados obtidos nessas avaliaes, para analisar os perfis de inteligncias das crianas. Alicerados por essa descrio quantitativa, fizemos uma interpretao dos dados qualitativos colhidos ao longo da convivncia com as crianas.

    Na Figura 5 so representados os perfis de inteligncias das sries, com base nas avaliaes por formulrio, contendo as listas de verificao das inteligncias. Os grficos de barras mostram as mdias quantitativas de cada inteligncia em cada srie, sendo que o eixo X corresponde s 8 inteligncias avaliadas e o eixo Y representa os valores mdios (em por centos) das respostas positivas assinaladas em cada inteligncia. Nas 2, 3 e 4 sries foram aplicadas, atravs do uso das listas de verificao (formulrios), a auto-avaliao, a avaliao pelo educador e a avaliao pelos pais. Mas, na 1 srie no foi aplicada a auto-avaliao com o formulrio, pois julgamos que as crianas ainda no dominavam a leitura suficientemente para a realizao desta atividade. Devemos, pois, atribuir um peso menor avaliao da 1 srie, para efeito de comparao dos perfis das turmas.

    Com base nos perfis individuais de inteligncias das crianas, procuramos traar os perfis de cada srie, a fim de mostrar tendncias e analisar a classificao das diferentes inteligncias nos perfis individuais e coletivos. Para tal, analisamos as mdias dos indicadores de cada inteligncia na avaliao de cada criana, estabelecendo, respectivamente, as trs mdias mais altas e as duas mdias mais baixas, classificando as inteligncias por ordem de preferncia individual. Em seguida, calculamos a mdia de cada inteligncia em cada srie e organizamos as inteligncias em ordem de preferncia para cada srie. Observamos quais as inteligncias apresentavam a maior ocorrncia entre as trs primeiras e entre as duas ltimas (na 1 srie, entre a ltima) colocadas nas sries. Com base nesta classificao, descrevemos o perfil de cada srie. Este perfil foi completado com outras informaes oriundas do portflio das crianas, do dirio do educador, de observaes em sala de aula (no decorrer das intervenes pedaggicas) e da anlise de produes infantis.

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    Figura 5 Perfis das sries analisadas

    Nas sries em que as trs avaliaes por formulrio foram realizadas (2 - 4 sries), chamou-nos a ateno que a Inteligncia Naturalista alcanou uma posio entre as primeiras trs colocadas, como tambm a inteligncia visuo-espacial; a inteligncia cinestsico-corporal aparece entre as primeiras quatro colocadas. Ao contrrio, tanto a inteligncia lingstica, como a inteligncia intrapessoal figuram entre as ltimas colocadas. A inteligncia musical oscila entre as primeiras colocadas (4 srie) e as ltimas colocadas (2 e 3 sries).

    Na 1 srie, as inteligncias naturalista e cinestsico-corporal tambm aparecem entre as primeiras colocadas, mas a inteligncia interpessoal foi percebida como a mais marcante pela educadora. Esta inteligncia, alis, tambm aparece entre as primeiras quatro colocadas nas 2 e 4 sries; sendo a 3 srie uma exceo neste sentido, pois, neste caso, a inteligncia interpessoal figura entre as ltimas. Como foi observado nos portflios e no dirio da educadora, as crianas da 3 srie apresentavam algumas dificuldades especficas nos relacionamentos interpessoais.

    A inteligncia lgico-matemtica figura entre as ltimas nas 1, 2 e 4 sries; apenas na 3 srie esta inteligncia est prxima ao meio, entre as primeiras quatro colocadas. 4.1 Perfis de inteligncia das crianas na segunda infncia

    Gardner (2005) prope o agrupamento das oito inteligncias em trs categorias. A

    primeira categoria engloba as inteligncias visuo-espacial, corporal-cinestsico e naturalista, que se referem mais diretamente ao mundo dos objetos materiais e s habilidades concretas

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    das pessoas. A segunda categoria engloba as inteligncias musical, lingstica e lgico-matemtica, que se baseiam em sistemas de smbolos e esto relacionadas com conceitos, teorias e histrias. O terceiro grupo contm as inteligncias pessoais que envolvem o conhecimento sobre os seres humanos.

    As avaliaes dos perfis de inteligncias das crianas revelaram, de modo geral, a predominncia ntida das inteligncias da primeira categoria, ou seja, as inteligncias naturalista, visuo-espacial e corporal-cinestsico, que esto relacionadas diretamente ao conhecimento do mundo concreto. Ao contrrio, as inteligncias lingstica e lgico-matemtica, relacionadas ao mundo dos smbolos, figuraram entre as ltimas colocadas nos perfis de inteligncias das crianas. A inteligncia interpessoal era bastante marcante, a musical oscilava entre a primeira e ltima colocada e a intrapessoal figurava sempre entre as ltimas colocadas, ao lado das inteligncias lingstica e lgico-matemtica.

    Do ponto de vista evolutivo, a Inteligncia Naturalista foi uma das primeiras a surgir na evoluo do homem, como descreve Mithen (2002). Segundo o autor, h mais de 2 milhes de anos surgiu a linhagem Homo, sendo que h indcios de que nesse perodo a inteligncia, at ento de carter generalista, comeou a se especializar e apresentar domnios especficos nesses ancestrais humanos. As primeiras inteligncias especializadas eram focalizadas no conhecimento e na explorao da Natureza, da qual dependia a sobrevivncia imediata do homem. Tanto a Inteligncia Naturalista desempenhou uma importncia fundamental na sobrevivncia da espcie, como tambm a inteligncia cinestsico-corporal. Esta ltima era especialmente solicitada e valorizada no contexto das comunidades de caadores-coletores, uma vez que se refere s capacidades que envolvem o uso do aparelho motor (movimentos amplos e finos) e o tato. Agilidade, destreza, equilbrio, fora, preciso nos movimentos do corpo, mas tambm a capacidade de identificar diferenas sutis pelo tato ou a agilidade e preciso com as mos (fabricao e uso de instrumentos de caa) eram essenciais sobrevivncia da espcie.

    De acordo com a definio de Gardner (1994a), a inteligncia visuo-espacial est relacionada percepo precisa do mundo em termos visuais (referindo-se aos elementos linha, cor, forma, configuraes) e espaciais (relao entre elementos) e capacidade de orientar-se no espao. Quando Mithen (2002) descreve o surgimento e a evoluo da Inteligncia Naturalista, considera um de seus aspectos, a capacidade de encontrar, no espao, os recursos naturais necessrios sobrevivncia, memorizar a localizao dos mesmos e construir mapas mentais que contm estas informaes (mapeamento do ambiente). De acordo com estudos antropolgicos recentes, os elementos da Natureza so percebidos pelos seres humanos, em funo das suas caractersticas visuais (COLEY; MEDIN; ATRAN, 1997; WOLFF; MEDIN; PANKRATZ, 1999).

    Se, de um lado, o estudo da evoluo do ser humano mostra que as inteligncias naturalista, cinestsico-corporal e visuo-espacial so, na sua origem, estritamente relacionadas entre si, de outro lado, no desenvolvimento cognitivo do ser humano, essas mesmas inteligncias tambm parecem manter uma estreita relao. Na descrio dos estgios de desenvolvimento cognitivo da criana, por exemplo, em Jean Piaget, o desenvolvimento sensrio-motor a base da construo de esquemas mentais mais elaborados (GARDNER, 1994a; DOLL, 1995). Segundo pesquisas neurolgicas mais recentes, a percepo dos elementos da Natureza envolve aspectos mentais, tanto visuais, como motores. Ou seja, as propriedades visuais so fundamentais na percepo do meio ambiente pelo ser humano, porm a apreenso das mesmas pela mente ocorre de forma

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    concomitante e integrada com os esquemas motores que os elementos percebidos admitem em relao ao organismo (GARBARINI; ADENZATO, 2004).

    No s nos perfis de inteligncias, elaborados com base nas avaliaes pelos formulrios, mas tambm nos dados retirados nas demais fontes citadas acima, a preferncia das crianas pelas inteligncias concretas foi ntida. A Inteligncia Naturalista foi, de modo geral, a mais querida pelas crianas. Observamos, em todos os grupos, uma crescente afinidade com esta inteligncia no decorrer da pesquisa. Ao trabalhar com a TIM, as crianas foram elaborando, gradativamente, um conhecimento metacognitivo, no qual a Inteligncia Naturalista surgiu como um potencial novo, antes desconhecido. Em comparao com as inteligncias tradicionalmente mais valorizadas na escola (as inteligncias lgico-matemtica e lingstica), a Inteligncia Naturalista foi um conceito absolutamente novo para as crianas e os dados da pesquisa sugerem que, para elas, a idia de possuir este potencial fascinava-as, levando ao estabelecimento de uma forte ligao afetiva com o mesmo. 4.1.1 Exemplos de perfis individuais com predominncia nas inteligncias concretas

    Para efeito de exemplificao, discutiremos dois perfis individuais em que

    predominaram as inteligncias concretas. A primeira criana escolhida (Fig. 6) apresentou nas suas avaliaes trs curvas bastante similares. Na auto-avaliao essa criana julgou-se mais capaz nas inteligncias naturalista e cinestsico-corporal e menos capaz nas inteligncias lingstica, lgico-matemtica e intrapessoal. A professora avaliou a criana de forma similar, atribuindo peso maior s inteligncias Naturalista, cinestsico-corporal e visuo-espacial, identificando mais dificuldades com as inteligncias lingstica, lgico-matemtica, inter e intrapessoais. Os pais viam as inteligncias lgico-matemtica, cinestsico-corporal, visuo-espacial e naturalista como mais expressivas no seu filho, ao passo que julgam a lingstica, a musical e as inter e intrapessoais como menos expressivas.

    Figura 6 - Perfil do Aluno-A da II srie

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    Este perfil de crianas representa um exemplo muito comum encontrado nas escolas: trata-se de uma criana que se sente pouco valorizada nas reas tipicamente escolares, como a lngua portuguesa e a matemtica; por sua vez, suas dificuldades relacionadas com uma auto-estima baixa (inteligncia intra-pessoal) manifestam-se igualmente pela apresentao de dificuldades nos relacionamentos interpessoais.

    Na escola, como um ambiente fechado, esta criana sente-se apertada, pois gosta muito de movimento e de sentir-se livre num espao maior e aberto. Porm, nas reas que, normalmente, so pouco valorizadas na escola, como as artes, o esporte e o conhecimento da natureza, esta criana consegue sobressair-se em relao turma. Portanto, apresenta uma forte ligao afetiva com essas reas, sendo facilmente motivada para todo tipo de trabalhos relacionados s mesmas. Este perfil revela-se propcio ao desenvolvimento de um Saber Ambiental, como tambm mostra que as inteligncias concretas, muitas vezes, podem representar um acesso para a aprendizagem em outras reas, no diretamente relacionadas s mesmas.

    A segunda criana escolhida (Fig. 7) apresentou, nas trs avaliaes, curvas praticamente idnticas, apontando a Inteligncia Naturalista como sendo a mais expressiva e a inteligncia lingstica a menos expressiva.

    Figura 7 - Perfil do Aluno-B da III srie

    No segundo exemplo, trata-se de uma criana que no se sobressai nas reas tradicionalmente mais valorizadas pela escola. Embora se relacione bem com os colegas, corre o risco de ter pouca ateno por parte dos educadores, por ser introspectiva e sensvel. uma criana que facilmente rotulada como sendo quietinha, sonhadora ou boazinha e porque no incomoda, deixada de lado. O trabalho intensificado com as inteligncias concretas criou oportunidades para que esta criana pudesse manifestar suas capacidades. Revelou-se um naturalista nato, ou seja, uma pessoa com um dom especfico para as reas biolgicas, sobretudo para a observao e o estudo dos insetos. Sua inteligncia interpessoal, bem desenvolvida, manifestava-se no s na relao com as pessoas, mas tambm na empatia e no trato cuidadoso com os animais.

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    4.1.2 As inteligncias concretas como porta de entrada para a construo do Saber Ambiental

    A criana na segunda infncia parece apresentar uma afinidade com as inteligncias ligadas ao mundo concreto, ao passo que escola, tradicionalmente, cabe o papel de inserir a criana no universo da linguagem escrita e da matemtica, os domnios que envolvem o uso de sistemas simblicos e, portanto, exigem maior grau de abstrao. A forma como projetamos a educao formal na sociedade ocidental mostra que a descoberta do mundo dos objetos, atravs do uso das inteligncias ligadas ao mundo concreto no ocorre na escola, mas deve ser anterior ou exterior mesma. Neste sentido, h uma tradio na escola em valorizar mais ou exclusivamente a aprendizagem da matemtica e da leitura e escrita a partir da 1 srie (quando as crianas tm apenas 6 ou 7 anos de idade), em detrimento das atividades ldicas, das artes e da psicomotricidade.

    Estabelecendo um paralelo com os estgios de desenvolvimento infantil, segundo Doll (1995) e Gardner (1994b) sobre o desenvolvimento cognitivo do ser humano, a nossa pesquisa confirmou que as crianas tiveram uma inclinao a aprender com facilidade qualquer contedo, atravs das inteligncias concretas, ou seja, as inteligncias corporal-cinestsica, visuo-espacial e naturalista, at completar a segunda infncia (em torno de 12 anos). No incio da adolescncia inicia-se o estgio das operaes formais, segundo Jean Piaget, e a criana seria ento madura, no que se refere construo dos esquemas mentais, para raciocinar de forma mais abstrata (DOLL, 1995).

    O estudo da evoluo e do desenvolvimento das inteligncias sugere que h um paralelo entre os processos no tocante relao entre as inteligncias naturalista e cinestsico-corporal, evidenciando que o conhecimento da Natureza, em algum momento, passa essencialmente pelo uso da inteligncia cinestsico-corporal. Essa posio sustenta-se igualmente, tendo em vista a hiptese da involuo do conhecimento biolgico popular (devolution of folkbiology). Esta defende que, apesar do crescimento do conhecimento cientfico e do acesso mais generalizado ao mesmo, houve uma perda generalizada do conhecimento biolgico popular nas sociedades modernas do sc. XX em funo da falta do contato direto com o ambiente natural (WOLFF; MEDIN; PANKRATZ, 1999). Os autores defendem que, embora a exposio indireta possa talvez substituir a exposio direta, na aquisio do conhecimento biolgico popular, uma quantidade mnima de exposio direta seja necessria para garantir que o conhecimento sobre o ambiente natural possa se estabelecer.

    A nossa pesquisa sugere que preciso repensar a forma como o conhecimento da Natureza introduzido na escola. A apresentao das primeiras noes em biologia e ecologia nos primeiros anos de escolaridade, certamente, no deveria acontecer pelo uso predominante das capacidades relacionadas s inteligncias lingsticas e lgico-matemticas e sim pela abordagem mediante as inteligncias tradicionalmente menos valorizadas na escola, ou seja, atravs de vivncias que requerem o uso das inteligncias concretas. 4.2 Anlise das inteligncias emocionais em interao com a Inteligncia Naturalista

    Na anlise do perfil de inteligncias, no que se refere s inteligncias emocionais, observamos que as crianas privilegiam, nitidamente, a inteligncia interpessoal, em

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    detrimento da inteligncia intrapessoal. A primeira associada ao prazer de estar relacionando-se com outras pessoas, de estar em companhia dos amigos, de ser includo e benquisto por todos. A segunda, ao contrrio, vista pelas crianas como um sinnimo para a solido ou excluso em relao ao grupo, estado muito temido pelas crianas, de um modo geral.

    Ao trabalhar com a TIM, ajudamos as crianas a se conhecerem melhor e desenvolverem sua inteligncia intrapessoal. Como pode ser observado nos perfis das sries (sendo que os registros dos educadores e da pesquisadora o confirmaram), as crianas mostraram, no seu desenvolvimento, uma tendncia ntida em voltar seus interesses para questes relacionadas inteligncia interpessoal, ao passo que demonstraram uma certa dificuldade para lidar com questes que envolvem auto-conhecimento.

    Mithen (2002) descreve como a inteligncia social (em Gardner considerada como as inteligncias pessoais ou emocionais) desenvolveu-se, referindo-se, primeiramente, s relaes interpessoais, ou seja, comunicao entre os membros de um grupo. Historicamente, o surgimento da prpria linguagem observado no nos sujeitos isolados, mas nas relaes interpessoais. Gardner (1994a) trata das duas inteligncias em conjunto num mesmo captulo, embora mostre que ambas se distinguem claramente. O autor observa que a expresso e o desenvolvimento dessas inteligncias dependem fortemente do contexto cultural. Na nossa cultura, especificamente, as pessoas mais extrovertidas e que se comunicam com facilidade se saem melhor. Pessoas introvertidas, tmidas e retradas, embora possam ter imensas qualidades intrapessoais, costumam ser menos valorizadas. Os resultados da nossa pesquisa podem ser um reflexo dessa tendncia.

    Outro aspecto das inteligncias pessoais refere-se ao antropomorfismo, fenmeno descrito em Mithen (2002). De acordo com o autor, a maior habilidade dos homens modernos (H. sapiens sapiens) para compreender as especificidades dos diversos animais resultou, provavelmente, da interao das inteligncias naturalista e social, cuja expresso o antropomorfismo. Pois, esse processo mental serviu para aumentar o sucesso na caa, pela capacidade de prever corretamente o comportamento animal e, conseqentemente, tornou o humano moderno mais apto sobrevivncia do que as demais populaes humanas arcaicas extintas.

    O antropomorfismo, que pode ser considerado uma forma primitiva de pensar, tambm fruto da fluidez cognitiva e tem, possivelmente, uma importncia para a construo de um Saber Ambiental, na medida em que auxilia na compreenso do comportamento animal e permite estabelecer uma ligao afetiva com os elementos da Natureza. Pois, ao acompanhar a evoluo da Inteligncia Naturalista, observamos que, originalmente, esta no se configurava como um sentimento de afinidade ou averso em relao Natureza, mas antes como um instinto para descobrir o que era til ou prejudicial sobrevivncia do organismo. Uma afinidade com elementos da Natureza deve ter sido, originalmente, um produto da interao da inteligncia social com a naturalista, considerando que as capacidades associadas s relaes interpessoais (como, por exemplo, a empatia ou a percepo dos elementos da Natureza como seres socialmente relacionados com os seres humanos) surgiram, de acordo com Mithen (2002), em funo da evoluo da inteligncia social.

    Tendo em vista a construo de um Saber Ambiental, pensamos na importncia das inteligncias pessoais na sua relao com a Inteligncia Naturalista, tambm na medida em que estas inteligncias so as principais responsveis para a compreenso do prprio ser humano. Numa viso sistmica, a Natureza no algo que est fora do mbito humano, o

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    mundo na sua integralidade contm de forma entrelaada o ambiente natural e cultural, sendo o homem um elemento importante de ambos. Neste sentido, torna-se impensvel a construo de um Saber Ambiental, margem da compreenso do prprio ser humano. Podemos, sem dvida, afirmar que o desenvolvimento das inteligncias intra- e interpessoais uma condio fundamental para melhorar o auto-conhecimento, as relaes interpessoais e, conseqentemente, a relao dos sujeitos e da coletividade com o ambiente natural. Os novos paradigmas da educao expressam bem esta idia de que a melhoria da qualidade de vida, em todos os sentidos, comea pela melhoria da qualidade das relaes entre as pessoas.

    Uma vez que cabe escola contribuir para o desenvolvimento harmonioso das crianas, procuramos, no decorrer das intervenes pedaggicas da nossa pesquisa, estimular o desenvolvimento da inteligncia intrapessoal, atravs de vivncias que envolviam o uso de outras inteligncias, com as quais as crianas tinham mais afinidade. O trabalho com a TIM ajudou muito as crianas na construo de um conhecimento metacognitivo sobre suas prprias potencialidades, sendo que o vocabulrio e os conceitos relacionados TIM foram, aos poucos, fazendo parte do cotidiano escolar, permitindo que elas se conhecessem melhor e elevassem sua auto-estima e sua capacidade de cooperar com os outros. 4.3 Anlise da Inteligncia Naturalista em interao com as inteligncias simblicas

    Nos perfis individuais e coletivos de inteligncias das crianas, as inteligncias lgico-matemtica, lingstica e musical no tiveram a mesma expressividade que as inteligncias concretas. Gardner (2005) considera as capacidades lingsticas, lgico-matemticas e musicais como as inteligncias relacionadas aos sistemas simblicos. No nosso universo estudado, as inteligncias simblicas revelaram-se menos acessveis para as crianas da segunda infncia, sendo que este resultado contradiz pesquisas realizadas com testes-padro comentados em MacMahon, Rose & Parks (2004) e zdemir, Gneysu & Tekkaya (2006). Precisamos ressaltar que na nossa pesquisa tanto as crianas como os educadores participaram, durante vrios meses, de atividades pedaggicas que envolviam a explorao de todas as inteligncias, tendo, inclusive, a oportunidade de analisar o seu desempenho em cada inteligncia. Portanto, ao realizarem as avaliaes com os formulrios (lista de verificao), crianas e educadores j tinham adquirido um olhar mais amplo sobre as potencialidades das mesmas. Em comparao, nos resultados dos testes-padro comentados pelos autores supracitados est expressa a viso da escola tradicional, em que apenas as inteligncias lgico-matemtica e lingstica so realmente valorizadas.

    As inteligncias lingstica e naturalista mantm, na verdade, uma estreita relao, pois o sistema simblico desta encontra sua expresso atravs da lngua. Fazendo uma comparao com a msica ou com a matemtica, a Inteligncia Naturalista no possui um sistema notacional independente da lngua, uma vez que as taxonomias so expressas atravs de palavras de uma lngua (na cincia, o latim). Ao mesmo tempo, devemos considerar que as unidades lingsticas utilizadas nas taxonomias no so organizadas como uma lngua (sujeito, verbo, objeto etc.). Ao contrrio, as palavras representam exclusivamente nomes de elementos naturais e grupos classificados em hierarquias de forma especfica; sendo esta organizao o que distingue o sistema simblico das taxonomias em relao lngua propriamente falando.

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    Subjacente representao dos elementos naturais por nomes e grupos relacionados, h uma organizao sistemtica dos elementos, que prpria da Inteligncia Naturalista e independe basicamente da linguagem; e este fato confirma-se, quando observamos que a compreenso do mundo natural nem sempre expressa por palavras, mas tambm por outros tipos de smbolos, tais como as simbologias da idade mdia (bestirios) citados por Thomas (1996) ou os complexos sistemas relacionados ao totemismo e representados em artefatos de povos caadores-coletores (MITHEN, 2002). Portanto, a lgica da organizao dos elementos da Natureza, ou seja, a compreenso das propriedades dos elementos que permite que sejam nomeados e relacionados de determinada forma, no est na linguagem, mas no conhecimento naturalstico dos elementos. Sem o conhecimento naturalstico, as taxonomias se reduzem a rtulos vazios que, embora possam ser transmitidos verbalmente, carecem absolutamente de sentido.

    Na nossa pesquisa, observamos que, para as crianas, as plantas no passam de uma paisagem amorfa, pois demonstraram no conhecer quase nenhuma espcie de planta. Alguns poucos nomes de rvores que sabiam nomear, referiam-se a rvores frutferas, cujos frutos conheciam, mas que dificilmente eram capazes de reconhecer enquanto rvore. O vocabulrio que as crianas possuam sobre as plantas era muito limitado e impreciso; por exemplo, o nome pau-brasil (Caesalpinia) planta que deu nome ao Brasil, no era associado rvore, pois as crianas no possuam nenhuma idia a respeito. Isso ficou evidente quando apresentamos s crianas partes dessa planta (folha, galho, fruto) e elas no sabiam de que planta se tratava.

    Ao longo das intervenes realizadas referentes s plantas, registramos que as crianas adquiriram muitos conhecimentos novos, ampliando sua compreenso sobre a importncia das plantas, sua funo no ecossistema da Terra e a relao das mesmas com os demais seres vivos. Porm, no que diz respeito s espcies vegetais, o conhecimento das crianas no aumentou significativamente no mesmo perodo.

    Foi constatado que, espontaneamente, a escola no fazia uso de uma linguagem sobre as plantas da regio, pois o corpo docente no possua este conhecimento naturalista. Nas nossas crianas, identificamos, como reflexo dessa prtica, exatamente o processo de perda do conhecimento relativo s rvores presente na nossa cultura, como foi descrito por Wolff, Medin & Pankratz (1999). Parece que as crianas mantiveram alguns rtulos sobre certas espcies de rvores, porm estes permaneciam vazios de significado, uma vez que elas no reconheciam concretamente as espcies e nada sabiam a seu respeito.

    Para a Educao, acreditamos ser importante a percepo de que o conhecimento biolgico, embora seja transmitido em grande parte pela lngua, em muito extrapola a mesma. Pois, os elementos da Natureza podem ser percebidos de diferentes formas e a apreenso visual demonstra estar associada, normalmente, a esquemas motores ou afetivos (GARBARINI; ADENZATO, 2004). A palavra dificilmente poder abranger todas estas dimenses. Uma simples definio verbal to pouco adequada para compreender os elementos naturais, pois as categorias naturais formam-se em torno de prottipos (COLEY; MEDIN; ATRAN, 1997; GARBARINI; ADENZATO, 2004). A definio corresponde a uma afirmao precisa e unvoca; o prottipo envolve mais do que isso e, dificilmente, pode ser expresso adequadamente pela lngua somente. Muito mais, parece basear-se em experincias ricas em impresses subjetivas, vivncias concretas ou em imagens mentais repletas de detalhes.

    Quanto relao da Inteligncia Naturalista com a inteligncia lgico-matemtica, devemos considerar que, ao incluir a Inteligncia Naturalista como oitava e ltima

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    inteligncia na sua Teoria, Gardner (2000) menciona o fato de que, at ento, certas capacidades relacionadas a esse potencial biopsicolgico, por exemplo, classificar elementos da Natureza, tinham sido consideradas aspectos da inteligncia lgico-matemtica. Atualmente, defende o autor, podemos seguramente mostrar que h diferenas fundamentais entre a abordagem lgico-matemtica e a compreenso naturalista do ambiente.

    Gardner (2002) considera que as operaes nucleares da inteligncia lgico-matemtica referem-se capacidade de partir de experincias com eventos ou objetos materiais e mover-se em direo a sistemas formais cada vez mais abstratos, cujas interconexes tornam-se questes de lgica que dispensam a observao emprica. A matemtica trabalha com entidades abstratas, no lingsticas. Esta inteligncia refere-se tambm capacidade de lidar com nmeros; de perceber padres subjacentes e seqncias lgicas em proposies que, uma vez abstrados, podem ser aplicados em outros contextos, levando aos mesmos resultados; de simplificar problemas complexos atravs da sua representao por modelos abstratos (Gardner, 1994).

    Buscando uma comparao entre as inteligncias naturalista e lgico-matemtica, observa-se que as operaes nucleares, como a classificao e organizao hierrquica de elementos e o reconhecimento de padres, embora estejam presentes na definio de ambas as inteligncias, adquirem feies diferentes em cada domnio. Quando relacionadas Inteligncia Naturalista, estas capacidades esto associadas percepo sensrio-motora e afetiva dos elementos e de suas relaes, no implicando, necessariamente, em representaes simblicas e abstraes. 4.4 Um perfil individual com marcante Inteligncia Naturalista e baixo desempenho nas inteligncias lgico-matemtica e lingstica

    Neste perfil a expresso predominante da Inteligncia Naturalista estava conjugada com baixos escores nas inteligncias lingsticas e lgico-matemticas (Figura 8). Esta criana apresentava um baixo rendimento escolar devido s dificuldades com a linguagem escrita e a matemtica. A sua Inteligncia Naturalista, ao contrrio, era marcante.

    Figura 8 - Perfil do Aluno-D da II srie

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    No Dirio do educador, encontramos estes trechos sobre a referida criana:

    Na atividade de classe de matemtica, no conseguiu resolver nenhuma questo sem a minha ajuda. Ela tem dificuldades na leitura e interpretao, na escrita, em assuntos gramaticais, na auto-correo de textos. No lgico-matemtico, as dificuldades so menores, porm, presentes. Esta criana tem pouca concentrao; na hora da roda, a conversa paralela est sempre presente; na maioria das vezes intervm, saindo do assunto em discusso. [...] Porm, uma criana comunicativa, que faz amizades com facilidade e aprecia a companhia dos colegas. Demonstra tristeza, quando no acompanha a sala nas atividades de leitura e interpretao (DIRIO, 2003).

    A dificuldade com a leitura e interpretao tambm a razo pela qual a criana no

    conseguiu se auto-avaliar melhor, sendo que na lista de verificao da auto-avaliao marcou praticamente todas as opes, sem grandes reflexes sobre suas reais capacidades, como demonstra a curva correspondente na Fig. 8.

    Nos nossos registros, observamos que, na hora da roda, quando o assunto era Natureza, esta criana desabrochava; a sua satisfao ficava visvel no rosto, ela participava ativamente. Ela ficou preocupada e chateada quando outras crianas quebraram uma planta na sala. Nas aulas aplicadas pela pesquisadora e no decorrer do projeto relacionado Natureza, esta foi a criana que mais se destacava na Inteligncia Naturalista, demonstrando interesse e motivao, mas, tambm, facilidade em compreender os contedos relacionados natureza. Por exemplo, decorou com facilidade o complexo ciclo reprodutivo do salmo (que o educador explicou na sala e sobre o qual as crianas assistiram a um filme) e contou em forma de roteiro o processo, detalhadamente, para a pesquisadora numa entrevista final sobre ecossistema. Na avaliao do projeto esta criana escreveu:

    Eu tive prazer em estudar o projeto porque foi muito legal. Eu tive dificuldades, mas no tantas, porque a minha inteligncia naturalista a mais desenvolvida. [...] Eu gostei de estudar tudo, principalmente, sobre as baleias, as grandes navegaes, os animais etc. Eu fiquei muito interessado, no gostaria de mudar nada e nem ter estudado outra coisa. Eu gostei muito da flora local, foi o meu melhor projeto (Criana D, 2003).

    Abaixo, apresentamos uma das atividades que foi aplicada com as crianas e

    poderemos observar a riqueza das respostas desta criana de 2 srie sobre as relaes existentes em um ecossistema. Num primeiro momento, ela foi orientada a preencher um desenho esquemtico sobre relaes num ecossistema, com setas, para indicar quais as relaes que j conhecia; num segundo momento, para verificao do conhecimento, a pesquisadora pediu criana para explicar oralmente o que sabia sobre o ecossistema representado. O ecossistema representado envolvia: um ser humano; um animal (mamfero); uma planta; um inseto. A criana deveria indicar qual a relao existente entre esses elementos, usando setas que indicavam indiferena (ou nenhuma relao); prejuzo (um elemento prejudica o outro); ajuda ou ajuda mtua (um elemento servindo ao outro).

    1 Momento: avaliao do tipo caneta-lpis sobre relaes num ecossistema. Ao

    usar as setas, a criana mostrou que entre: Insetos e ser humano; plantas e ser humano; e, insetos e animais - no h

    nenhuma relao (indiferente); Plantas e insetos; plantas e mamferos h ajuda mtua; e

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    Mamfero e ser humano o primeiro ajuda o segundo. 2 Momento a mesma avaliao foi feita oralmente atravs de uma conversa

    descontrada com a pesquisadora. A mesma criana revelou que: Insetos - ser humano: As pessoas e os insetos no se ajudam, porque os insetos picam e as pessoas os matam. A abelha pode prejudicar o homem, picando-o. A abelha pode, tambm, ajudar o homem, mas o mosquito no. Plantas ser humano: As pessoas ajudam as plantas, pois, quando respiram, do gs carbnico para as plantas. As pessoas preparam o adubo, ajudando as plantas e os insetos. Plantas insetos: As plantas (a natureza) ajudam os insetos, pois estes vivem delas. Os insetos ajudam as plantas, fazendo o processo (queria dizer polinizao). A abelha, quando ajuda as plantas, ajuda a vaca que come plantas. Mamfero ser humano: A vaca d leite e carne para o homem. As pessoas cuidam da vaca. Insetos mamfero: A vaca ajuda os insetos, fornecendo bosta que lhes serve de alimento. Os insetos ajudam a vaca, fazendo (transformando a bosta em) adubo. Mamfero plantas: A vaca come as plantas, por isso estas a ajudam. A vaca fornece adubo para as plantas, ajudando-as a crescer.

    Observa-se, nesta criana da 2 srie, uma acentuada compreenso das relaes num

    ecossistema. No primeiro momento, quando deveria se expressar por meio de setas (forma abstrata), teve dificuldades em expressar seu pensamento, mas, quando teve oportunidade para falar livremente sobre o tema, revelou todo seu conhecimento. Esta constatao sugere o seguinte: a dificuldade em expressar o pensamento, no primeiro momento, est relacionada inteligncia lgico-matemtica, uma vez que envolve o uso de smbolos (setas) para representar relaes de forma abstrata. Como vimos, esta criana apresentava uma relativamente baixa capacidade nesta inteligncia. No segundo momento, ela podia utilizar um recurso mais acessvel, ou seja, a oralidade, para expressar seus conhecimentos, demonstrando, ento, o que realmente sabia sobre as relaes num ecossistema.

    Alm disso, este exemplo mostra que os conhecimentos naturalistas no so necessariamente relacionados s reas tradicionalmente valorizados pela escola, ou seja, a leitura, a escrita e a matemtica. Em outras palavras, crianas que obtm baixos escores no rendimento escolar podem ter bons conhecimentos naturalistas. Pois, a construo do conhecimento biolgico possui caractersticas diferentes, em comparao com a construo do conhecimento lingstico e, tambm, lgico-matemtico. Outrossim, a elaborao dos conceitos biolgicos no corresponde, simplesmente, a uma aplicao de princpios gerais do desenvolvimento da inteligncia a esta rea de conhecimento, mas segue um caminho prprio.

    Podemos observar que as inteligncias lingstica e lgico-matemtica, embora mais focalizadas pelos programas de ensino, so as capacidades que mais se distinguem da Inteligncia Naturalista. De outro lado, tm muito a contribuir para a construo de um Saber Ambiental, na medida em que exercem funes imprescindveis na nossa sociedade. Por exemplo, a inteligncia lingstica permite que haja uma comunicao entre cientistas e que o conhecimento biolgico possa ser socializado de forma inequvoca. Um conhecimento meramente intuitivo sobre plantas ou animais, por mais minucioso que seja, s tem valor na nossa sociedade, quando pode ser partilhado atravs de uma linguagem precisa e universal

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    (por exemplo, por uma taxonomia cientfica). Quanto inteligncia lgico-matemtica, precisamos reconhecer que o avano da ecologia enquanto cincia fundamenta-se, em grande parte, em modelos abstratos e clculos matemticos sobre o funcionamento da Natureza, a partir dos quais conseguimos obter um entendimento mais preciso sobre limites e possibilidades do ser humano em relao com a Natureza. Portanto, a ecologia seria impensvel sem as abordagens lingstica e lgico-matemtica. 5 CONSIDERAES FINAIS

    A presente pesquisa sugere que a Teoria das Inteligncias Mltiplas (TIM) de Howard

    Gardner e sua equipe (1994) pode oferecer uma nova base terico-metodolgica para a Educao Ambiental. Uma anlise mais precisa da Inteligncia Naturalista, a partir de suas propriedades, mostra suas especificidades e a sua relao com as outras inteligncias. Evidencia-se que a Inteligncia Naturalista faz parte das inteligncias concretas, relacionadas mais diretamente ao mundo dos objetos, e mantm uma estreita afinidade com as demais inteligncias desse grupo, as inteligncias visuo-espacial e cinestsico-corporal. Os resultados sugerem que as crianas, ainda na segunda infncia, ou seja, no incio da escolaridade obrigatria, identificam-se fortemente com essas inteligncias concretas, ao ponto de demonstrarem uma tendncia inata em desenvolverem com facilidade as capacidades relacionadas s mesmas e nutrirem uma verdadeira adorao por tudo que est ligado a esses potenciais biopsicolgicos da nossa espcie.

    Um aspecto fundamental da nossa pesquisa foi o fato de as crianas terem tido oportunidade de vivenciarem suas diferentes inteligncias e, sobretudo, as inteligncias tradicionalmente menos valorizadas na escola. Fez parte das intervenes pedaggicas, o fato de os alunos aprenderem a identificar as diferentes inteligncias utilizadas em cada atividade realizada. Ao serem informadas sobre a TIM, as crianas estavam cientes de que as metodologias vivenciadas objetivavam o desenvolvimento das suas mltiplas inteligncias.

    Percebe-se, que a construo de um Saber Ambiental exige mais do que o simples desenvolvimento da Inteligncia Naturalista. Primeiramente, o prprio desenvolvimento desta inteligncia parece estar relacionado diretamente ao desenvolvimento das inteligncias visuo-espacial e cinestsico-corporal; segundo, uma compreenso da Natureza como preconizam os objetivos da Educao Ambiental, vai muito alm do simples conhecimento biolgico, requerendo a empatia do sujeito com os elementos da Natureza, a predisposio para amar e respeitar os seres vivos e proteger o ambiente natural. Isto nos sugere que a origem da capacidade humana de estabelecer uma ligao afetiva com o meio ambiente est na interao entre a Inteligncia Naturalista e as inteligncias emocionais.

    necessrio que seja revisto o tratamento dado na escola Educao Ambiental. luz da TIM, o objetivo da Educao Ambiental pode ser considerado em funo do desenvolvimento da Inteligncia Naturalista, tendo em vista a integrao harmoniosa das demais inteligncias. Os resultados da pesquisa sugerem que uma abordagem pedaggica que focaliza, num primeiro momento, o estmulo s inteligncias concretas e s inteligncias emocionais, seja mais adequada natureza cognitiva da criana na segunda infncia, no sentido de permitir um desenvolvimento integral e harmonioso da mesma dentro dos princpios da sustentabilidade scio-ambiental. Ao contrrio, a compreenso das caractersticas distintivas da Inteligncia Naturalista em relao s inteligncias tradicionalmente mais valorizadas pela escola, as inteligncias lingstica e lgico-

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    matemtica, sugere que uma abordagem que privilegia as mesmas menos eficaz para estimular o desenvolvimento de um Saber Ambiental na infncia.

    Acreditamos que as linguagens mais adequadas para se falar para a criana sobre a Natureza e favorecer o estabelecimento de um vnculo afetivo positivo com a mesma, passam pelo uso das inteligncias naturalista, visuo-espacial e cinestsico-corporal, assim como das inteligncias emocionais. Estas inteligncias so, em outras palavras, a porta de entrada para a construo do Saber Ambiental na infncia.

    A anlise realizada no presente trabalho permite concluir que o conhecimento do ambiente deve chegar criana, atravs da explorao livre do meio e um intenso contato fsico e visual com o mesmo. Essas experincias devem ser acompanhadas por intervenes pedaggicas que auxiliam no desenvolvimento do auto-conhecimento (inteligncia intrapessoal) e no aprimoramento das relaes interpessoais (inteligncia interpessoal). O presente estudo no nega a importncia das inteligncias tradicionalmente mais valorizadas na escola, ao contrrio, percebe-se que as abordagens lingstica e lgico-matemtica fazem-se necessrias, como forma complementar abordagem atravs das inteligncias concretas, no sentido de auxiliar no desenvolvimento do conhecimento cientfico, um importante aspecto da escola.

    Diante do modelo atual de escola, em que predomina a transmisso oral e escrita de conhecimentos, muitas vezes abstratos, precisamos considerar que a construo de um Saber Ambiental na infncia ocorre mediante o estmulo das inteligncias concretas e emocionais. O desenvolvimento destas inteligncias na infncia revela-se, ao mesmo tempo, o fim e o meio para a construo de um Saber Ambiental; um fim, no sentido de estas serem as inteligncias que constituem a essncia de um Saber Ambiental; um meio, porque atravs do uso destas inteligncias que a criana capaz de construir um conhecimento significativo e uma compreenso mais profunda do Meio Ambiente.

    Artigo recebido em: 13/02/2008

    Artigo aceito em: 19/04/2008

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