Transcript
Page 1: INTERRUP~AO VENOSA COMO TRATAMENTO DE EXCECAO NA TROMBOSE ...jvascbras.com.br/revistas-antigas/1987/3/03-INTERRUPCAO-VENOSA... · os doentes eram portadores de trombose venosa pro-

Artigo Original

INTERRUP~AO VENOSA COMO TRATAMENTODE EXCECAO NA TROMBOSE VENOSAPROFUNDA E NA EMBOLIA PULMONAR

Winston Bonetti Yoshida •Hamilton Almeida Rollo ••Sidnei Last6ria •••Francisco H. de Abreu Maffei ••••

Embora a terapeutica anticoagulante (AC) continue sendo 0principal tratamento para os casos de trombose venosa profundae ou embolia pulmonar,existem pacientes em que os AC naopodem ser iniciados, e/ou continuados ou casos de EP na vigen,cia de tratamento AC adequado. Para esses doentes existea opr;ao 'da interrupr;ao venosa como tratamento de execu9ao.Com 0 objetivo de contribuir para melhor conhecimento dessetratamento, foi fe/to um estudo retrospectivo de 31. doentessubmetidosaessas operar;6es no Hospital das Clfnicas da Facul-dade de Medicina de Botucatu no per(odo de 1971 a 1986.As indicar;6es dos procedimentos foram: contra-indicar;ao douso de AC (67,7%); complicar;6es hemomigicas graves do usode AC (19,3%); trombose venosa extensa atingindo veia cavainferior (6,4%) e suspeiti3 ou confirmar;ao de embolia pulmonarna vigencia de AC (6,4%). Os procedimentos realizados "toram:ligadura da veia cava inferior em 10 doentes (32,2%); colocar;aode clipe de Miles em 7 (22,6%); implante de filtro de Greenfieldem 7(22,6%); ligadura de veia femoral em 5 (16.1%); plicaturade veia cava em.1 (3,2%) e ligadura de veia femoral seguidade colocar;ao de clipe de Miles em 1 (3,2%» A mortalidadehospitalar foi de 38,7%, a maioria sendo pacientes de alto riscoou portadores de molestias graves ou disseminadas. Dentreesses houve 2 suspeitas e 1 confirmar;ao de embolia pulmonarp6s-interrupr;ao, sendo 1 de ligadura de veia cava, 1 de filtrode Greenfielde 1de I~gadurade veiafemoral seguida de coloca-r;ao de filtro de Miles em veia cava inferior. A evolur;ao dosdemais doentes foi boa, com edema discreto ou moderadoque diminuiu ou desapareceu ap6s a alta. Os dados verificados,semelhantes aos da literatura, permitiram considera. este trata-mento de excer;ao, uma alternativa importante no tromboem-bolismo pulmonar.

Unitermos: Veia cava inferior, embolia pulmonar,tromboembolismo

Trabalho realizado pela Disciplina de Cirurgia Vascularda Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP

Professor Assistente Doutor•• Professor Assistente••• ·Professor Assistente Doutor•••• Professor Adjunto

A embolia puhnonar (EP) persiste como causa impor-tante de morbidade e mortalidade, apesar de todos osesfor~os desenvolvidos nos ultimos anos para aperfei~oara profilaxia, 0 diagn6stico precoce e 0 tratamento datrombose venosa profunda (TVP), sua causa maiscci·mum.

Estima-se que 140.000 a 200.000 mortes por ana nosEUA tenham a emboli a pulmonar como causa unicaou principal coadjuvante (3). A incideneia da emboli apufmonar em necr6psias tern variado de 0,6 a 69,3%dependendo da tecnica empregada napesquisa de embo-los. Em nosso Hospital encontrou-se 19,3% de EP, em998 aut6psias consecutivas realizadas. entre 1969 e 1976(16). .

Os anticoagulantes (AC), bem controlados, saD 0 tra-tamento J,asico do tromboembolismo venoso (17). Aefic,kia desta terapeutica tern sido comprovada, comredu~ao, em media, de 28% para 5% na mortalidadepor EP (25). Entretanto, existem casos em que os ACnao devem ser iniciados, e/ou continuados ou casos deEP na vigencia de tratamento AC adequado. Nestescasos estao indicados os procedimentos de interrup0lovenosa, visando impedir a passagem de embolos paraopulmao. .

.Essas operac;6es comec;aram com a ligadura de veiafemoral, evoluiram depois para ligadura, plicatura e co-locac;ao extema de clipes de Teflon® na veia cava infe-rior, ate chegarem recentemente aos filti-os internos deveia cava. A evolu~ao desses metodos visou,principal-mente, a eficacia na prevenc;ao do tromboembolismopulmonar, a diminui~ao de incidencia decomplica~6eshemodimlmicas ou cirurgicas e a facilidade de execl!c;ao,especialmente em doentes em mau estadn geral.

Embora todos esses metodos possam apresentar com-plica~6es e riscos (4), e opiniao corrente serem de indica-~ao inevitavel em casos ja referidos e justificaveis frentea morbidade e mortalidade inerentes a EP.

Com 0 objetivo de contribuir para melhor compreen-saD dessa terapeutica, foi feito urn estudo retrospectivode 31 pacientes operados da Disciplina de Cirurgia Vas-cular da Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESF

.em periodo de 15 anos.

Entre 1971e 1986, foram realizados 31 procedimentosde interrupc;ao venosa no Hospital das Clfnicas da Facul-dade de Medicina de Botucatu - UNESP. Doze doenteseram do sexo feminino e 19 do sexo masculino. A distri-bui~ao quanto a idade encontra-se na Tabela 1. Todos

Page 2: INTERRUP~AO VENOSA COMO TRATAMENTO DE EXCECAO NA TROMBOSE ...jvascbras.com.br/revistas-antigas/1987/3/03-INTERRUPCAO-VENOSA... · os doentes eram portadores de trombose venosa pro-

IDA DE

20 - 2930 - 3940 - 4950 - 5960 - 6970 -79

+ 80

16,19,76,4

22,6.19,322,63,2

Tab. 1: Distribuic;iio quanto a idade de 31 pacientes submetidos a opera-C;iiode interrupc;iio venosa no HC da FMB - UNESP.

os doentes eram portadores de trombose venosa pro-funda extensa (atingindo os setores ileo-femoral, femo-ro-poplfteo ou veia cava), documentada por flebografia.As principais molestias associ ad as diagnosticadas saomostradas na Tabela 2.

MOLESTIASASSOCIADAS

N~ MORTALIDADEPACIENTES

Neoplasias malfgnasNeoplasias cerebraisAcidente vascular cerebralHemorragias intra-cranianasP6s-parto ou cezareaArteriosderose obliterantePerifericaTrombose venosa profunda[soladaSepticemiaMioma uterinoTrauma de ba<;oTrauma tOf<icicoCirrose hepaticaEsteatonecrose de pancreas

Tab. 2: PriIicipais mohlstias associadas de 31 pacientes submetidos aoperac;iio de interrupc;iio venosa no HC da FMB - UNESP.

Os procedimentos efetuados foram: ligadura de veiacava inferior (VCI) em 10 casos, coloca<;ao de dipe deMiles em sete, filtro de Greenfield em sete, Iigadurade veia femoral em cinco, plicatura de VCI em urn eligadura de veia femoral + coloca<;ao de clipe de Milesem urn. As indica<;6es desses procedimentos encontram-se na Tabela 3 .

INDICA<:;OES N~PACIENTES %

Contra-indica<;ao do usode anticoagulantes 21 67,7Complica<;6es hemorragicasgraves de heparinotetapia 6 19,3Trornbose venosa extensaatingindo a veia cava 1l1ferior 2 6,4Quadro dfnjco '!luges'tWode EPna vigencia de tratamentoanticoagulante 2 6,4

Tab. 3: Indicac;oes dos procedimentos de interrupc;iio venosa em 31pacientes operados no HC da FMB - UNESP.

A abordagern cirurgica da VCI foi feita preferencial-mente pela via extra-peritoneal, tendo sido utilizada emcinco casos de ligadura e seis casos de coloca<;ao de dipede Miles. Nos restantes desses casos, a abordagem de ssevasa foi feita par laparotomia, aproveitando-se 0 ato ci-rurgico decorrente da molestia associada. No unico casode plicatura, a abordagem da VCI foi feita por laparo-tomia. Essas interrup<;6es de veia cava foram feitas cercade 2 cm abaixo da desernbocadura das veias renais. Osfiltros de Greenfield foram implantados mi VCI de acor-do com as recomenda<;6es do autor (10), introduzindo-seo aplicador sob radioscopia pela veia jugular intern a di-reita, exposta por dissec<;ao cirurgica no pesco<;o comanestesia local. Os filtros foram liberados internamentena VCI ao nlvel de L2-L3, pouco abaixo das veias renais.Em todos esses casos foi feita cavografia antes e ap6sa implanta<;ao dos filtros (Figura 1).

Page 3: INTERRUP~AO VENOSA COMO TRATAMENTO DE EXCECAO NA TROMBOSE ...jvascbras.com.br/revistas-antigas/1987/3/03-INTERRUPCAO-VENOSA... · os doentes eram portadores de trombose venosa pro-

A abordagem da veia femoral superficial foi feita aonIvel da prega inguinal, e as respectivas ligaduras foramnesta realizadas pr6ximas a desembocadura da veia fe-moral profunda. Obviamente, em todos esses casos aflebografiademonstrou trombos somente abaixo dessenIvel (perifericos).

Em nenhum dos casos acima foi feita ligadura conco-initantede veias ovarian as ou· testiculares. No perlodop6s-operat6rio, utilizou-se, sempre que possIvel, comomedidas gerais, a contensao elastica das extremidadese a camana posi~ao de Trendelemburg.

o 6bito dentro de 30 dias ap6s os procedimentos deinterrup~ao venosa ocorreu em 12 doentes (38,7%). Acondi~ao m6rbida de cada urn deles, 0 tipo de operac;ao,e 0 intervalo de tempo entre a interven~ao e 0 6bitoestao na Tabela 5. A maioria desses pacientes apresen-tava molestias graves e disseminadas como condi~ao as-sociada. E piovavel que os atos cinlrgicos nos casosn~ 3, 14, 16 e 25 possam ter precipitado 0 6bito, sejapelo "~tress" do procedimento aliado a molestia de basenas tres primeiras, seja pelb desenvolvimento de trom-boembolismo pulmonar no ultinio (Tabela 5).

A mortalidade e.a frequencia de EP suspeitada clinica-mente ou confirmada,considerando-se 0 tipo de procedi-mento de interrup~ao venosa estao na Tabela 4.

EMBOLIAPULMONAR

SUSPEITACLiNICA

PROCEDIMENTO N MORTALIDADE CONFIRMADA

Ligadura de VeiaCava 10 06 0 01Clipes de Miles 07 1 0 0Filtro deGreenfield 07 02 01 0Ligadura deVeiaFemoral 05 02 01 0Ligadura de VeiaFemoral + Miles 01 01 01 0Plicatura de VeiaCava 01 12 02 01

". TOTAL 31 12 03 01

Tab. 4: Tipos de operll~iio efetuadas, mortalidade associada e inciden-cia de embolia pulmonar ap6s 0 procedimento de interrup~iiovenosa em 31 pacientes do HC da FMB - UNESP.

Em nenhum dos casos verificou-se altera«ao hemodi-namica grave, com hipotensao e choque decorrente deato de interrup«ao venosa, nem mesmo nos casos deligadura de VCI. A maioria dos pacientes sobreviventesmanteve edema moderadoou discreto de membros infe-

Cirurgia na embolia pulmonar

riores, que diminuiu ou desapareceu ate a alta. Os casosn~ 1 (ligadura VCI), 11 (Miles), 12 (ligadura VCI e 27(Greenfield), apresentaram aumento doedema nos diasque se seguiram a interrup«ao venosa.

Os filtros de Greenfield, em particular, foram todosimplantados mais recentemente (1985/1986). Nao houveem nenhum caso dificuldade de coloca«ao pelo acessoja mencionado, nem complica~6es cinlrgicas locais. En-tretanto, em u'm desses casos, 0 filtro fixou-se abaixodo ponto planejado para sua inser~ao e a cavografiamostrou que parte de seus ganchos ficou presa em trom-bo que atingia 0 infcio da veia cava. 0 paciente evoluiupara 6bito por septicemia e 0 achado cavografico acimafoi confirm ado na aut6psia; neste paciente, mesmoas-sim, nao houve emboli a pulmonar. Urn outro pacientecom filtro de Greenfield colocado adequadamente apre-sentou quadro clfnico·:bastante sugestivo de embolia pul-monar, com insuficiencia respirat6ria aguda, e 6bito su-bito, mas os familiares nao permitiram a realiza«ao daaut6psia. Nos demais pacientes, os filtros tambem fica-ram bem posicionados e a evolu«ao clfnica dos mesmotranscorreu sem problemas.

A heparinoterapia, seguida pelos antagonistas da vita-mina K, continua sendo 0 tratamento padrao da trom-bose venosa profunda (TVP) e EP. A terapeutica anti-coagulante nesses casos e constante em todas as circuns-tancias, seja isoladamente, seja como coadjuvante detratamento cirurgico ou com fibrinolfticos (17). Entre-tanto, existem casos em que os anticoagulantes nao de-vem ser usados. Nesses pacientes quando a trombosevenosa atingeos setores ileo-femoral, femoro-poplfteoou veia cava, estao indicados os procedimentos de inter-rup~ao venosa para se evitar a EP. As situa~6es maiscomuns sao:1. Pacientes com doen~a trombo-emb6lico que apresen-

tam contra-indica«ao ao uso de AC (Ex.: doen«ashemorragicas, acidentes vasculares cerebrais recen-tes, insuficiencia renal, opera«6es de grande portecom deslocamentos extensos etc ... ).

2. Pacientes em que ha dificuldades no controle do ACou que apresentam complica<;6eshemorragicas decor-rentes de seu uso.

3. Quan<lo a anticoagula<;ao bem controlada falha emprevenir a recorrencia de emboli a pulmonar.

4. Paciente submetido a embolectomia pulmonar porembolia maci<;a.

5. Nos casos de trombose venosa profunda extensa, atin-gindo a veia cava inferior.Indica~6es mais raras incluem os embolos septicos e

as emboli as paradoxais. Os casos operados neste Hos-pital emquadraram-se todos dentro das situa<;6es maiscomuns. Deve-se ressaltar, no entanto, que a necessi-dade de interrup<;ao venosa, por qualquer dos motivosacima, e uma eventualidade rara, sendo necessaria em

Page 4: INTERRUP~AO VENOSA COMO TRATAMENTO DE EXCECAO NA TROMBOSE ...jvascbras.com.br/revistas-antigas/1987/3/03-INTERRUPCAO-VENOSA... · os doentes eram portadores de trombose venosa pro-

menos de 10% dospacientes c()m ttombose venosa, namaioria dos gran des centros (6). Em nosso Hospital,os 31 pacientes submetidos· a interrup<;ao venosa saoestimados em cerca de 5% dos pacientes com TVP trata-das no rnesmo periodo.

Introduzida por Homans (12), a ligadura de veia femo-ral foi, historicamente, 0 primeiro tipo de opera<;ao deinterrup~ao venosa realizada com a finalidade de preve-nir a EP. Esse tipo de opera<;ao tinha a vantageIr! depoder ser feitacom anestesia local, com pequeno riscocinirgico, particularmente, para doentes graves. Entre-tanto, foi gradativamente cedendo lugar as interrup~oesde' veia cava inferior, tendo em vista os indices altos,de ate 22% de recorrencia de EP verificados com a liga-dura femoral (22). Alguns auto res (7), apesar disso, conetinuaram justificando esse procedimento paracasos sele-cionados, especialmente pacientes graves, de alto riscocinirgico, com base na reduzida mortalidade e com baseemoutras casuisticas apontando indices de EPentre0,6 e 10%. Nestes casos haveria necessidade de flebo-grafia com demonstra<;ao clara de trombose venosa pro-funda em urn so membro e restrita a regiao perifericaa ligadura.

Neste Hospital, seis pacientes foram submetidos a esseprocedimento cirurgico. A EP fatal (Tabela 5) ocorreupossivelmente em dois desses pacientes, incluindo 0 pa-ciente que foi posteriormente submetido a coloca~aode clips de Miles: Urn dos pacientes operados apresentoua longo prazo insuficiencia venosa cronica de diffcil c0!l-trole clinico e flebografia com obstru~ao de veia femoral.Embora seja urn metodo com trauma cirurgico menore de custo relativamente baixo, 0 pequeno beneficionao pareceti compensar 0 seu emprego como primeiraop<;ao,principalmente apos 0 advento dos filtros de veiacava.

A possibilidade mio remota de ocorrencia de emboli apulmonar com ligadura femoral a partir de veias tributa-rias do sistema da veia femoral superficial (23) assimcomo adesvantagem de poder causar ou piorar a sindro-me de insuficiencia venosa cronica (4), levou os cirur-gioesa <:Ieslocarempara a veia cava inferior 0 local dainterrup~ao venosa.

A ligadura da VCI, foi introduzida como tratamentoprofilatico do tromboembolismo pulmonar tanibem porHomans, em 1944 (13). Desdeessa epoca, extensa expe-riencia com esse procedimento foi acumulada nos varioscentros medicos, nos quais se verificou, em media, mor-talidade em torno de 12% (entre 8% e 21%), incidenciade EP recorrente de aproximadamente 4% e 22% de

. sequelas pos-flebfticas .(18). Essa mort<iliclade elevadareiegou a ligadura de veia cava inferior a urn valor mera-mente historico, sendo ainda indicada somente nos casosde preven<;ao de embolos septicos ou nos casos em quenao houve possibilidade de se executar outros metodos(4, 18).

A mortalidade operatoria verificada nos doentes comligadura de veia cava inferior neste Hospital foi bast anteelevada (Tabela 5). Casuisticamente, as indica~6es deligadura de veia cava recafram sobre grande contingente

Cirurgia na embolia pulmonar

de pacientes com molestias neurol6gicas graves e/ou por-tadores de neoplasias avan<;adas ou disseminadas, 0 quepode explicar 0 indice de obitos elevado. Nos demaisdoentes, os quais nao apresentavam estetipo de-rri6TestT<i-associada, nao houve mortalidade. Embora, aparente-mente, nao tenha ocorrido altera<;aohemodinamica agu-da em nenhum doente e nem piora ou apareeimentode. sinais de insuficiencia venosa nos pacientes sobrevi-ventes, a ligadura de veia cava inferior neste Hospitaltern sido indicada somente dentro dos criterios mencio-nados acima, tendo em vista os dados da literatura ea experiencia local.

A longo prazo, apos a ligadura de VCI, forma-se namaioria dos l"acientes, uma extensa rede de veias colate-rais t6raco-abdominais que se encarrega de fazer 0 retor-no venoSo. Mesmo assim, em 22% dos casos, aparecemsinais intensos de insuficiencia venosa cronica nas extre-midades possivelmente por extensao da trombose venosaprevia ou por insuficiencia das veias colaterais. 0 reco-nhecimento desse problema levou os cirurgioes a intro-duzirem as interrup<;6es parciais de veia' cava inferior,com 0 objetivo de impedir a passagem de embolos e aomesmo tempo permitir 0 fluxo sangufneo. Nesse sentido,foram inicialmente propostos os procedimentos eirurgi-cos de plicatura da veia cava, que consistiam em variostipos de suturas aplicadas transversalmente na mesma,de modo a criar especie de filtro com varias pequenasluzes dentro da luz da veia cava.

Neste Hospit~l apenas urn paciente foi submetido aesse tipode interven<;a-o(plicatura a Spencer) e a impres-sa-odeixada foi de ser esse metodo de interrup~ao venosatrabalhoso e de execUl;ao demorada. Os clipes externossurgiram possivelmente para suprir essa dificuldade, con-figurando-se em procedimentos simples, rapidos, efeti-vos e amplamente empregados (18).

Em termos de eficacia na preven<;ao da EP, verifi-cou-se em varias series que a coloca~aode clipes eratao efetiva quanto a ligadura deveia cava inferior. Embo~ra a mortalidade nessas series nao tenha melhorado mui~to (media de 10,2%), houve melhora discreta na inciden-cia de insuficiencia venosa cronica, que de aproxima-damente 22% nos casos de ligadura passou a ser emtomo de 16,0% nos casos dos clipes (18). Verificou-setambern, nessas series, que as complica<;oes hemodina- .micas agudas (hipotensao hipovolemica) eram tambemmenos frequentes com os clipes do que com a ligadurade VCl. Entretanto, nenhum dentre os varios modelosde clipes (Moretz, Adams-De Weese e Miles) mostroualguma superioridade em rela<;aoa esses parametros aci-mas mencionados (4). Alem disso, em todos os tipos,foi verificada a possibilidade de oclusao espontanea deveia cava no sitio de aplica~ao (18). Nos sete pacientesdeste Hospital, nos quais se aplicou clipes de Miles aevolu~ao foi similar a descrita na literatura (Tabela 4).Nesses pacientes, embora a agressao cirurgica promo-vida para a aplica<;ao dos mesmos tenha sido similaraos casos de ligadura da veia cava, a mortalidade dospacientes com os clipes foi urn pouco menor talvez porapresentarem molestias associadas menos graves.

Page 5: INTERRUP~AO VENOSA COMO TRATAMENTO DE EXCECAO NA TROMBOSE ...jvascbras.com.br/revistas-antigas/1987/3/03-INTERRUPCAO-VENOSA... · os doentes eram portadores de trombose venosa pro-

*

Cirurgia'na embolia pulmonar :-

l~

~-

Fig. 2 - Representa~o' esquematica dos principais tipos de filtros de veia cava: 1 ; Fittro de Mobin-Uddin; 2 - Filto de Kinray- Greenfield;3 - Filtr.o de Amplatz; 4 - Fittro de Roehm e 5 - Filtro de Gunther.

A grande soluc;ao para 0 problema da mortalidadeoperat6ria, surgiu com a criac;aodos filtros intraluminaisde veia cava (Figura 2) que alem de seguros, provou-sesercm eficientes na prevenc;ao do embolismo pulmonare na manutenc;ao da perviedade venosa local. Revisoesde varias series clinicas com os filtros de Mobin-Ud-dine Kinray-Greenfield (18) tern apontado mortalidade de0,3%, embolia recorrente de 1,8% e 20,0% de insufi-ciericia venosa cronica it longo prazo.

o "guarda-chuva" de Mobin-Uddin foi 0 primeirotipo de filtro aplicado em veia cava (21). Foi amplamenteutilizado e a experiencia acumulada revelou ser urn filtroassociado a alto indice (mais de 70%) de oclusao deveia cava. 0 balao de Hunter (14), criado posterior-mente,nao diferia de uma ligadura convencional de veiacava (4), a nao ser pela menor agressao na sua aplicac;ao.

o filtro de Greenfield, em contraste com 0 filtro deMobin-Uddin,parece manter mais frequentemente aveia cava pervia. Indices de 95% de veias cavasperviasforam registrados por varios autores em seguimento alongo prazo, de 23 meses em media (2, 9, 26). Talvezdevido a essa caracteristica, 0 filtro de Greenfield alcan-c;ougrande aceitac;ao emvarios centros medicos, passan-do a ser preferido em relac;ao aos dispositivos prece-dentes (19). Entretanto foram relatados tambem algunsproblemas com a sua aplicac;ao, tais como: alguns casosde formac;ao e propagac;ao de trombo no filtro, comembolia pulmonar (19);liberac;ao do filtroem veia renalou na veia cavaacima da veia renal (20); inclinac;aodo filtro em relac;ao ao eixo longitudinal da veia cava(20) com risco de perfurac;ao da mesma quando 0 angulofosse maior que 30° (8); que bra de urn dos ganchos aposimplantac;ao (1); migrac;ao do filtro (20) sendo mais fre-quente a migrac;ao caudal (30%) do que a cranial (6%);aumento ou diminuic;ao do diametro do filtro a longoprazo, relacioriados, respectivamente, it trombose comretrac;aoe entrada de alguns ganchos em veia renal ouperfurac;ao da pare de de veia cava (20).

Dentre os sete pacientes deste Hospital em que foicolocado a filtro de Greenfield, urn apresentou suspeitaclinica deembolia pulmonar com 6bito sl.ibito, sem possi-

bilidade de confirmac;ao por autopsia. Em urn outro obi-to, a aut6psia mostrou que 0 filtro foi posicionado muitodistalmente na veia cava, sendo que parte dos ganchosdo filtro ficou colocada em trornbo mural que se estendiaem direc;ao it veia cava. Esse posicionamento nao teverelac;ao com 0 6bito do pacientee ocorreu porque aliberac;ao do filtro na veia cava foi feita bruscamente,dando possibilidadedeste "saltar" adiante do ponto pla-nejado para sua inserc;ao. A liberac;ao lenta do filtrotalvez tenha evitado esse.problema nos casos subsequen-tes. Problema semelhante foi apontado por outros auto-res (8). Os demais pacientes evoluiram bern, sem proble-mas.

Mais recentemente, outros tipos de filtros (Figura 02)tern sido apresentados naliteratura, visando maior facili-dade de colocac;ao e eficacia. Dentre os mais novos,o filtro "ninho ,de 'passaro" criado porRoehm ecol. c.

(24), teria a vantagem de poder ser colocado por catete-rismo venoso comum com cateter n~8F, sem necessidadede dissecc;ao e venotomia cirl.irgica. 0 proprio filtro deGreenfield jafoi aplicado recentemente por via percuta-nea, porern, apos dilatac;ao progressiva e colocac;ao debainha n~ 24F na veia femoral (5); embora os autoresnao relatem nenhum problema ao nivel do local de introcduc;ao, a necessidade da dilatac;ao venosa e 0 calibreda·bainha nao permitiram aceitac;ao ampla, pelo menosentre a maioria dos radiologist as (15). Afora esses filtros,foram lanc;ados tambem dois outros filtros que, alemde poderem ser aplicados por via percutanea, teriama vantagem adicional de poderem ser "pescados" e reti-rados do organismo nos casos de mal posicionamentoou quando nao houvesse mais necessidade do mesmo,quando indicados profilaticamente em operac;oes de altorisco, desde que dentro de 2semanas ap6s sua aplicac;ao(11, 15). Esses novos filtros, tipo aranha de Amplatz(15) e tipo de cesta de Gunther (11) mostraram-seexperimentalmente e "in vitro", mais eficazes que 0 filtrode Greenfield na retenc;ao de pequenos coagulos e teriama vantagem de poderem ser aplicados e retirados daveia cava porcateterismo percutaneo com cateter calibre·8F e 10F, respectivamente. Alem disso, a forma dos

Page 6: INTERRUP~AO VENOSA COMO TRATAMENTO DE EXCECAO NA TROMBOSE ...jvascbras.com.br/revistas-antigas/1987/3/03-INTERRUPCAO-VENOSA... · os doentes eram portadores de trombose venosa pro-

mesmos impediria a inclina<;aodo filtro dentro da veia,incoveniente mais ou menos frequente com filtro deGreenfield.

A pesquisa continua de novos filtros demonstra quena verdade, ainda se esta procurando 0 filtro de cavaque apresente todas as caracteristicas de urn filtro ideal,quais sejam: boa biocompatibilidade, estabilidade, res is-tencia a corrosao, retenc;ao efetiva de embolos, aderen-cia segura a parede da veia cava sem migra<;ao, manu-ten<;ao da perviedade da veia cava apesar da retenc;aode embolo; introdu<;ao e retirada percutanea por cateterde pequeno calibre, facilidade de liberac;ao sem inclina-<;ao,ausencia de obstaculos ao fluxo sanguineo e ausen-cia de trombogenicidade (11). as recentes avanc;os tec-nol6gicos alcan<;adostern demonstrado que os filtros pa-

Cirurgia na embolia pulmonar

recem ser atualmente 0 mais segura e eficiente procedi-mento de interrup<;ao de veia cava prra 0 tratamentodo tromboembolismo pulmonar e que 0 filtro ideal em-bora ainda nao tenha surgi~o, possivelmente nao demo-rani muito tempo para ser criado.

Em nosso meio, entretanto, a grande limita<;ao aoamplo emprego dos filtros reside fundamentalmente nofator economico. as filtros e aplicadores sao todos im-portados e sao aqui comercializados a prec;os ainda bas-tante proibitivos. Ademais, exigem recursos humanosespeci.alizados e equipamentos radiol6gicos mais sofisti-cados, 0 que torn a 0 procedimento ainda mais onerososendo, consequentemente, de diffcil utilizac;ao rotineiraem nosso meio.

TIPO DE N~CASO CONDU;OES ASSOCIADAS INTERVALO DE TEMPOPROCEDIMENTO ~NTRE A OPERA<;AO E

OBITO (dias)

A) Ligadura de veia cava 3 Meningioma operado com hernia do uncus 27 Carcinoma do fundo da vesicula biliar com 11

carcinomatose peritoneal12 Carcinoma de ovario com carcinomatose peritoneal 1814 Cezarea de gestac;ao de 6 meses + hemorragia 2

meningea23 Cancer de bexiga operado com eviscerac;ao JO

p6s-cirurgica25 Glioblastoma operado +tumor vesical 6-,

B) Ligadura de veia femoral 8 Arteriosclerose obliterante periferica + ampulac;ao 10de membro inferior

18 Hematoma sub-dural e contusao cerebral 22

C) Clipes de Miles 11 Adenocarcinoma de pancreas com metastases 19viscerais

D) Ligadura Veia Femoral 16 Acidente Vascular Cerebral 2+ Miles

E) Filtro de Greenfield 26 Insuficiencia Renal Aguda 1628 Septicemia 10

Tab. 5: Tipo de procedimento, principal condi"iio m6rbida associada e intervalo de tempo em dias entre a opera~iio de interru~iio venosa e 0 6bitoem 12 pacientes que evoluiram para 0 obito ap6s a opera~iio de interrup"ii'o venosa no He da FMB - UNESP.

SUMMARYAnticoagulants (AC)ar.ethe main treatment for venous throm-

boembolism. but there 'are patients in whom they cannot beused or even during its adequate use there are recurrence ofpulmonary embolism. In these cases venous interruption proce-dures (VIP)may be appropriate to prevent pulmonary embolism.In order to contribute to a better knowledge of VIP. a retros-

pective study of 31 patients who underwent to partial or totalVIP at Hospital das Clfnicas da Faculdade de Mediclna de Botu-catu between 1971 and 1986. was oerformed. The indicationsfor VIP were.: contra- indication for AC (67,7%). severe hemor-rhagic complication dunng AC therapy (19.3%); thrombus inthe inferior vena cava (6,4%) and AC treatment failure in preven-ting pulmonary embolism (6.4%). Ligation of inferiorvena cavawas performed in 10 cases (32.2%). suture plication was usedin 1 case (3.2%) and a serrated Miles prosthetic clip was appliedin 7 cases (22.6%). Ligation of femoral vein was carried out

in 6 patients (16.1 %) and 7 (22.6%) trans venous Greenfield'sintracfitval devices were inserted in this period. Hospital deathocurred in 12 patients (38.7%), almost all presenting underlyngdebilitating or disseminated diseases. Pulmonary embolism wassuspected in 2 cases and confirmed in one after the VIP being2 cases of inferior vena cava ligation. 1 case of Greenfield filterand 1 case of femora! vein ligation + inferior vena cava Mile'sclip application. In the remaining patients. it was recorded mildor moderate swelling of the extremities that decreased or disap-peared at dsicharge. Results were similar to other in the literatureand based In these cases. the indications. perioperative careand operative methods are briefly discussed.

Uniterms: Vena cava inferior. pulmonary embolism.thromboembolism.

Page 7: INTERRUP~AO VENOSA COMO TRATAMENTO DE EXCECAO NA TROMBOSE ...jvascbras.com.br/revistas-antigas/1987/3/03-INTERRUPCAO-VENOSA... · os doentes eram portadores de trombose venosa pro-

1 - BECQUE 0 - Partial rupture of a Kinray -Greenfield filter Presse Med, 13: 1334, 1984.

2-CIMOCHOWSKI GE; EVANS RH; ZARINSCR; LU C; DE MEESTER TR -Greenfield filterversus Mobin-Uddin umbrella. J. Thorac Car,dio-vasc Surg, 79: 358, 1980.

3 - COON WW - Epidemiology of venous throm-boembolism. Ann Surg, 186: 149, 1977.

4 - DALEWA - Control of the inferior vena cavato prevent pulmonary embolism. In Dalewa:Management of vascular surgical problems. NewYork, McGraw-Hill, 1985, p. 524.

5 - DENNY DF; CRONAN 11;DORFMAN GS; ES-PLIN C - Percutaneous Kinray-Greenfield filterplacement by femoral vein pincture. Am J Roent,145: 827, 1985.

6 - DE WEESE JA - Control of the inferior venacava to prevent pulmonary embolism -Invitedcommentary. In: Dalewa- Management ofvascular surgical problems. New York, McGraw-Hill, 1985, p. 538.

7_. DONALDSON NC; WIRTHLIN LS; DONALD-SON GA - Thirty-year experience with surgicalinterruption of the inferior vena cava for preven-tion of pulmonary embolism. Ann Surg, 191: 367,1980.

8 -GOMEZ GA; CUTTLER BS; WHEELER HB- Transvenous interruption of the inferior venacava. Surgery, 193,612, 1983.

9-GREENFIELD LJ; PEYTON RP; CRUTE S;BARNES R ~ Greenfield vena cava filter expe-rience: late results in 156 patients. Arch Surg, 116:1451,1981.

10 -GREENFIELD LJ; STEWART JR; CRUTE S-Improved technique for insertion of Greenfield ve-na caval filter. Surg Gynecol Obstet, 156: 217,1983.

11-GUNTHER KW; SCHILO H; FRIES A;STOR-KEL S ~ Vena caval filter to prevent pulmonaryembolism: experimental study. Radiology, 156:315, 1985.

12 - HOMANS J - Thrombosis of the deep vein ofthe lower lwgcausing pulmonary embolism. N EnglJ Med, 211: 993, 1934. .

13 - HOMANS ] - Deep quiet venous thrombosis inthe lower limb. Surg Gynecol Obstet, 79: 70, 1944.

14 --'-HUNTER JA; SESSION R; BUENGER R -Experimental baloon obstruction of vena cava.Arch Surg, 171: 315, 1970.

15 - LUND G; KYSA VY JA; SALAMONOVITZ E- A new vena caval filter for percutaneous place-ment and retrieval: experimental study. Radiology,152: 369, 1984.

16~MAFFEI FHA; FALEIROS ATS; VENEZIANCA; FRANCO MF - Contribui<;ao ao estudo daincidencia e anatomia patol6gica do tromboembo-lismo pulmonar em aut6psias. Rev Ass Med Brasil,26: 7, 1980.

17 -MAFFEI FHA;;LAST6RIA S; YOSHIDA WB;ROLLO HA ~ Tratamento clfnico da trombosevenosa profunda. Rev Ass Med Brasil, 30: 73,1984.

18-MANSOUR M; CHANG AE; SINDELAR WF- Interruption of inferior vena cava for preventionof recurrent pulmonary embolism. Am Surg, 51:375, 1985.

19 -McAULEY CE; WEBSTER NW; JARRET F;HIRSCH SA; STEED DL - The Greenfield intra-caval filter as a source of recurrent pulmonary th-romboembolism. Surgery, 96: 574, 1984.

20-,-MESSMER JM & GREENFIELD LJ - Green-field caval filters: long-term radiographic follow-upstudy. Radiology, 156: 613, 1985. .

21-MOBDIN-UDDIN K; McLEAN R; BOLOOKIH; JUDE JR - Caval interruption for preventionof pulmonary embolism. Arch Surg, 99: 711,1969.

22 - MOZES M; ADAR R; BOGOKOWSKY H -Vein ligation in the treatment of pulmonary embo-lism. Surgery, 55: 621, 1964.

23 -PARRISH EH; ADANS JT; PORIES WJ; BUR-GETDE; DE WEESE A - Pulmonary embolismfollowing vena caval ligation. Arch Surg, 97: 899,1969.

24 - ROEHM JOF; GIANTURCO C; BARTH MH;WRIGHT RC - Percutaneous transcatheter filterfor the inferior vena cava. Radiology, 150: 255,1984.

25 - THOMAS DP - Therapeutic role of heparin inacute pulmonary embolism. Curr Therap Res, 18:21, 1975.

26 - WINGERDM; BERNHARD VM; MADDISONF; TOWNE JB - Comparison of caval filters inthe management of venous thromboembolism.Arch Surg, 113: 1264, 1978.


Recommended