BÁRBARA DE OLIVEIRA LOPES
O PAPEL DO JORNALISTA NO JORNALISMO COLABORATIVO:
ESTUDO DO CASO DO BLOG DO NASSIF
UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO (UNINOVE)COMUNICAÇÃO SOCIAL – JORNALISMO
SÃO PAULO – 2008
BÁRBARA DE OLIVEIRA LOPES
O PAPEL DO JORNALISTA NO JORNALISMO COLABORATIVO:
ESTUDO DO CASO DO BLOG DO NASSIF
Trabalho de conclusão de curso apresentado como exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Universidade Nove de Julho – Uninove.
Orientadora: Profa. Patrícia Quevedo Kay
UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO (UNINOVE)COMUNICAÇÃO SOCIAL – JORNALISMO
SÃO PAULO – 2008
RESUMO
O papel do jornalista no jornalismo colaborativo: Estudo do caso do Blog do
Nassif. O objetivo deste trabalho é fazer um estudo da interação entre jornalista e leitores no
blog mantido por Luis Nassif. Por meio da análise, descobriuse que os leitores são
convidados a participar das coberturas e sua participação é incentivada com a publicação de
textos de leitores na área principal do blog e do elogio público a essa participação. Nassif
também compartilha com os leitores a observância pelas regras da comunidade. A análise teve
como base o estudo do jornalismo colaborativo e suas implicações em conceitos teóricos
como gatekeeping e agenda setting. Com isso, observase que esses conceitos não funcionam
da mesma maneira na internet, por esta ser um ambiente em que não há escassez de espaço,
como em meios impressos ou de tempo, como em meios eletrônicos (rádio e televisão).
Palavraschave: jornalismo colaborativo, internet, conteúdo gerado por usuários.
Para o Gustavo, minha força e minha inspiração
SUMÁRIO
Introdução............................................................................................................................ 51. A internet e a contracultura............................................................................................ 7
1.1. Aspectos técnicos..................................................................................................... 81.1.1. O computador........................................................................................................ 81.1.2. A internet............................................................................................................ 101.2. Implicações culturais............................................................................................. 121.3. Trabalho colaborativo............................................................................................ 15
2. Do jornalismo pessoal ao jornalismo colaborativo..................................................... 172.1. Origens................................................................................................................... 172.2. Jornalismo alternativo na internet......................................................................... 182.3. Tipos e funções da participação............................................................................ 232.4. Implicações para o jornalismo tradicional…........................................................ 26
3. O Blog do Nassif.......................................................................................................... 293.1. Biografia................................................................................................................ 293.2. O Blog e a participação dos leitores...................................................................... 293.3. O Blog, a mídia e a internet................................................................................... 313.4. Cobertura do acidente da TAM............................................................................. 323.5. Conclusão.............................................................................................................. 35
Bibliografia........................................................................................................................ 37
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INTRODUÇÃO
A discussão sobre quem é e o que faz um jornalista não é nova. Isso porque a matéria
prima do jornalismo, a notícia, é, em última análise, de difícil definição, objeto de estudo de
incontáveis pensadores. A notícia separase da informação em geral apenas por um limite
muito tênue, e mesmo este por vezes desaparece. A multiplicidade de papéis do jornalista no
mercado de trabalho e a defesa aguerrida que a categoria faz da restrição dessas atividades a
profissionais credenciados tornam essa uma questão complexa – ainda mais levandose em
conta que o jornalismo sempre conviveu com produções feitas por amadores, militantes de
determinada causa ou aficionados por determinado assunto.
A complexidade aumenta com o advento da internet e a entrada em cena novos
modelos de produção e difusão de informações. O trabalho colaborativo no desenvolvimento
de programas de computador e na criação de fóruns sobre variados assuntos, que acompanha
a internet desde sua criação, no começo deste século chegou ao jornalismo. O jornalismo
colaborativo ou participativo ganhou densidade e atenção pública com o material produzido
por usuários após os atentados de 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos.
O crescimento do jornalismo colaborativo coincidiu, também, com crescentes
questionamentos sobre a indepedência dos meios tradicionais. Redações cada vez mais
enxutas e a concentração das empresas jornalísticas em poucos grandes conglomerados
acenderam discussões sobre a qualidade do serviço prestado e sobre a democratização da
imprensa.
Este novo contexto representa um desafio e uma oportunidade para o jornalista. Ele
passa a ter a disposição ferramentas inéditas até então, porém precisa desenvolver novas
habilidades para se sobressair. A participação dos leitores, que passam a ser colaboradores,
coautores, é mais uma chance de enriquecer o trabalho do jornalista que uma ameaça a sua
profissão.
Neste trabalho, decidimos analisar o blog do renomado jornalista Luis Nassif para
descobrir quais habilidades novas estavam sendo colocadas em prática. Nassif, que construiu
sua carreira na grande imprensa, também sempre manteve um olhar crítico em relação à
cobertura da mídia em casos polêmicos. Sua adesão ao formato blog, em 2006, já veio
acompanhada do convite à participação dos leitores. Restava saber se isso se deu, e de que
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forma.
Para descobrir, após uma leitura dos arquivos do Blog do Nassif, coletamos textos que
têm como assunto a participação dos leitores, comentários sobre a mídia tradicional e os
novos meios que surgem. Esta compilação, que pode ser consultada no Anexo I, permitiu
traçar um retrato da relação que o jornalista estabeleceu com seu público. Além disso,
decidimos analisar a cobertura de um caso específico: o acidente com o vôo 3054, da TAM,
em julho de 2007. Tratavase de um caso difícil, pela necessidade de conhecimentos técnicos
de aviação e pela politização por que a investigação passou em alguns momentos. Reunimos
os posts sobre o acidente publicados em julho e agosto de 2007 no Anexo II.
Para dar embasamento teórico à nossa análise, que forma o terceiro capítulo deste
trabalho, resolvemos estudar o surgimento da internet e sua relação com os ideais libertários
da contracultura, no primeiro capítulo. O segundo capítulo traz um breve panorama do
jornalismo não como empresa, mas como exercício da liberdade de expressão, antes e depois
da internet. Também no segundo capítulo, trazemos a contribuição de alguns autores no
tocante a conceitos teóricos da área de comunicação dentro do novo contexto.
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1. A INTERNET E A CONTRACULTURA
“Estamos criando agora um espaço no qual o povo do planeta pode ter um
novo tipo de relacionamento: quero poder interagir totalmente com a consciência que
está tentando se comunicar comigo”.
John Perry Barlow, músico e fundador da Electronic Frontier Foundation
(apud CASTELLS, 1999, p. 443)
A internet como é hoje existe pelo encontro de dois grupos aparentemente
antagônicos: hippies e militares. Mas a verdade é que nos anos 1960 e 1970, as principais
universidades americanas eram o ponto de convergência de ambos, especialmente na busca
pela inovação. A contracultura teve um papelchave para o modelo de comunicação mediada
por computadores, que por sua vez possibilitou a existência de novos modelos de jornalismo,
como o jornalismo colaborativo.
Desde o advento da internet, muitos estudiosos vêm se entusiasmando com as
mudanças e o potencial de mudanças trazidos pelas novas tecnologias. Para muitos, é a
realização de fato do conceito de aldeia global de McLuhan, inicialmente desenvolvido para
explicar a transformação no universo da comunicação causada pela televisão. McLuhan foi o
principal teórico a enfatizar que as mudanças tecnológicas – como a invenção da escrita ou da
imprensa – trazem mudanças cognitivas para a sociedade. A teoria da mídia, que tinha pouco
crédito nos meios acadêmicos nos anos 1980, principalmente por sua falta de ênfase nos
aspectos sociopolíticos, ganhou novo fôlego ao ser adaptada para o estudo da era digital.
É dentro dessa perspectiva que diversos autores vêm apontando a importância da era
digital, como algo que tem impacto mesmo sobre quem não está diretamente envolvido. "Esse
[a revolução da tecnologia da informação] é (...), no mínimo, um evento histórico da mesma
importância da Revolução Industrial no século XVIII, induzindo um padrão de
descontinuidade nas bases materiais da economia, sociedade e cultura” (CASTELLS, 1999, p.
68).
Diferentemente da televisão, que se constitui basicamente como uma via de mão única,
a internet trouxe como seu principal ganho a comunicação multidirecional, estabelecendo, de
fato, uma teia.
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O que torna a internet tão interessante? Dizer que ela é 'anarquista' é um modo
grosseiro e falso de apresentar as coisas. Tratase de um objeto comum, dinâmico,
construído, ou pelo menos alimentado por todos que o utilizam. Ele certamente
adquiriu esse caráter de nãoseparação por ter sido fabricado, ampliado, melhorado
pelos informatas que a princípio eram seus principais usuários. Ele faz uma ligação
por ser ao mesmo tempo o objeto comum de seus produtores e de seus exploradores.
(LÉVY, 1996, p. 1289)
Embora aspectos técnicos e culturais ocorram simultaneamente, optamos por tratálos
em tópicos separados, para preservar a cronologia e aprofundar o estudo de ambos.
1.1. ASPECTOS TÉCNICOS
1.1.1. O computador
A inovação se tornou um fator chave para o Departamento de Defesa do governo
americano a partir da Segunda Guerra. Um dos pontos estratégicos era a decodificação de
mensagens inimigas e a elaboração de modelos de criptografia, além do desenvolvimento de
armas que chegou à bomba atômica. Castells se refere a Segunda Guerra como "a mãe de
todas as tecnologias" (1999, p. 78). A divisão do mundo após o fim do conflito continuou
impulsionando as pesquisas militares e, mais que isso, ampliando os campos de interesse das
forças armadas. Com a Guerra Fria, a competição com os soviéticos deixou de ser apenas de
poder bélico, mas também uma disputa pelos corações e mentes de todo o mundo.
Em fevereiro de 1946, seis meses após o fim da Segunda Guerra, com patrocínio das
forças armadas, uma equipe da Universidade da Pensilvânia desenvolveu o primeiro
computador para uso geral, o ENIAC (Computador e Integrador Numérico Eletrônico, na
sigla em inglês). O desenvolvimento da máquina havia começado em 1943. O Exército
investiu 500 mil dólares nas pesquisas, com o objetivo de ter uma ferramenta para cálculos
balísticos. O ENIAC pesava 30 toneladas e ocupava uma área de 180 metros quadrados.
Quando foi acionado, seu consumo de energia foi tão alto que as luzes da Filadélfia piscaram.
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Em 1947, físicos da empresa Bell Laboratories, em Nova Jersey, inventaram o
transistor o ENIAC utilizava válvulas a vácuo. A fabricação do transistor passou a ser feita
com silício em 1954, com o feito creditado à Texas Instruments. A empresa patenteou, três
anos mais tarde, o Circuito Integrado, que permitia a integração de diversos transistores
miniaturizados em um chip. Um dos inventores era Robert Noyce, fundador da Fairchild
Semiconductors e, mais tarde, da Intel, ambas no Vale do Silício, na Califórnia.
A Fairchild passou, em 1959, a utilizar o processo plano para a fabricação de circuitos
integrados. "Em apenas três anos, entre 1959 e 1962, o preço dos semicondutores caiu 85% e a
produção aumentou vinte vezes, sendo que 50% dela foi destinada a usos militares"
(CASTELLS, 1999, p.77). Essa tendência de barateamento do processamento em
computadores foi descrita por outro cofundador da Intel, Gordon E. Moore, em um artigo de
1965. Ele afirma que o número de transistores que podem ser colocados em um circuito pelo
mesmo custo cresce exponencialmente e dobra a cada dois anos. A afirmação ficou conhecida
como Lei de Moore. O preço médio de um circuito integrado caiu de 50 dólares em 1962 para
1 dólar em 1971. A mudança do coração das inovações em microeletrônica para o Vale do
Silício acabaria se consolidando ao longo dos anos seguintes.
Foi na década de 1970 que "as novas tecnologias da informação difundiramse
amplamente, acelerando seu desenvolvimento sinérgico e convergindo em um novo
paradigma" (CASTELLS, 1999, p. 76). Em 1971, o engenheiro da Intel Ted Hoff inventou o
microprocessador. Em 1975, o engenheiro Ed Roberts, da fabricante MITS, no Novo México,
criou uma "caixa de computação", batizada de Altair. A máquina era vendida em kits pelo
correio, por meio de anúncios em revistas voltadas para aficionados por eletrônica. A
expectativa da MITS era de vender apenas algumas centenas de exemplares, mas apenas no
primeiro mês, milhares de unidades foram vendidas. O Altair foi a fagulha que acendeu o
estopim da revolução do computador pessoal nos anos seguintes. Seu design serviu de
inspiração para o Apple I e, posteriormente, para o Apple II.
A história da Apple acabou se tornando uma das lendas do Vale do Silício. Fundada
em 1976, com capital de 91 mil dólares, a empresa atingiu, em 1982, a marca de mais de 500
milhões de dólares em vendas. Em 1981, a IBM (que nos anos 1950 também havia recebido
patrocínio militar) lançou uma máquina com o nome de Computador Pessoal (PC, na sigla em
inglês), que se tornaria o nome genérico do microcomputador. Como o PC foi desenvolvido
com base em tecnologias desenvolvidas para a IBM por terceiros, ficou sujeito à clonagem,
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que logo foi praticada em escala maciça, especialmente na Ásia. Embora tenha sido um golpe
para a IBM, isso permitiu a popularização do PC em lugar dos computadores da Apple. Em
1984, a Apple lança o Macintosh, o primeiro computador a usar mouse e interface gráfica,
baseado, pelo menos parcialmente, em pesquisas que a Xerox fazia na época.
O Altair também acendeu o entusiasmo de dois estudantes da Harvard, Bill Gates e
Paul Allen. Eles apresentaram para a MITS uma implementação da linguagem BASIC para o
Altair. Quando a companhia aceitou a proposta, Gates abandonou a faculdade e mudouse
para o Novo México e lá fundou a Microsoft.
Nas últimas décadas, os computadores aumentaram incrivelmente a capacidade de
processamento, armazenamento e memória, em uma escala que pode ser descrita de acordo
com a Lei de Moore. Por trás disso, está uma das características mais importantes da
revolução da informação: sua capacidade de se realimentar. Segundo Castells, o custo médio
do processamento da informação caiu de aproximadamente US$ 75 por cada milhão de
operações, em 1960, para menos de um centésimo de centavo de dólar em 1990. A tecnologia
e o design para fabricação de computadores passaram a ser aperfeiçoados pelo uso de
computadores.
O que caracteriza a atual revolução tecnológica não é a centralidade de
conhecimentos e informação, mas a aplicação desse conhecimento e dessa
informação para a geração de conhecimentos e de dispositivos de processamento/
comunicação da informação, em um ciclo de realimentação cumulativo entre a
inovação e seu uso. (CASTELLS, 1999, p. 69)
É também o que Lévy caracteriza como "máquina darwiniana".
Os sistemas darwinianos apresentam uma capacidade de aprendizagem nãodirigida
ou (o que dá no mesmo do ponto de vista de uma teoria do espírito) de uma
capacidade de autocriação contínua. (...) As máquinas darwinianas arrastam consigo
seus ambientes no caminho de uma história irreversível. (LÉVY, 1996, p. 102)
1.1.2. A internet
Além do desenvolvimento de hardware e software, a internet também é resultado de
avanços em telecomunicações e em optoeletrônica (o uso de cabos de fibra ótica para
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transmissão de dados).
Em 1969, a Agência de Projetos de Pesquisas Avançadas (ARPA, na sigla em inglês),
do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, lançou o projeto de uma rede de
comunicação que fosse invulnerável a ataques nucleares. Vale lembrar que a experiência da
Segunda Guerra havia mostrado a importância de um meio de comunicação segura como
estratégia bélica. O modelo escolhido utilizava a troca de pacotes de dados e um sistema em
que não houvesse um comando central. Cada ponto da rede poderia se comunicar diretamente
com outro e com mais de um ponto ao mesmo tempo. Em uma rede com um servidor ou
comando central, um ataque inimigo que atingisse esse centro derrubaria toda a rede. O
sistema de comutação de pacotes de dados era um novo conceito na época o comum então
era a comutação de circuitos, como na comunicação telefônica.
Batizada de ARPANET, estabeleceu seus primeiros quatro nós na Universidade da
Califórnia em Los Angeles, no Stanford Research Institute, na Universidade da Califórnia em
Santa Bárbara e na Universidade de Utah. "Estava aberta aos centros de pesquisa que
colaboravam com o Departamento de Defesa dos EUA, mas os cientistas começaram a usála
para suas próprias comunicações, chegando a criar uma rede de mensagens entre entusiastas
de ficção científica”. (CASTELLS, 1999, p. 83)
Em 1971, Ray Tomlinsom, um programador da BBN, empresa contratada pelo
Departamento de Defesa, desenvolveu e mandou a primeira mensagem eletrônica. Esse tipo de
comunicação rapidamente se difundiu: em 1973, 75% do tráfego da ARPANET eram emails.
Em 1973, um novo serviço foi incorporado, a transferência de arquivos, via FTP (Protocolo de
Transferência de Arquivos, na sigla em inglês).
O crescimento da rede foi rápido. Em setembro de 1971, a rede contava com 15 nós e
23 hosts conectados à ARPANET, em universidades e centros de pesquisa do governo. Nesse
ano, com a rede bem estabelecida, a ARPA transferiu a operação da ARPANET para a
Agência de Comunicações do Departamento de Defesa. Em 1983, com 213 nós, a parte militar
da rede foi desmembrada, formando a MILNET.
Um dos usos mais populares da internet começou a ser feito no ano seguinte: os
grupos de discussão. Também passam a ser registrados os primeiros domínios (endereços na
internet). Os primeiros chats, do IRC, datam de 1988.
Porém vem de 1991 um dos marcos mais importantes. Uma equipe do Centro Europeu
de Pesquisa Nuclear (CERN, na sigla em francês), liderada por Tim Berners Lee, criou a
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WWW – world wide web, rede de alcance mundial – um aplicativo que organizava os sites de
acordo com sua informação.
Não montaram a pesquisa na tradição da ARPANET, mas com a contribuição da
cultura dos hackers da década de 1970. Basearamse parcialmente no trabalho de
Ted Nelson que, em seu panfleto de 1974, 'Computer Lib', convocava o povo a usar o
poder dos computadores em benefício próprio. Nelson imaginou um novo sistema de
organizar informações que batizou de 'hipertexto', fundamentado em remissões
horizontais. (CASTELLS, 1999, p.88)
O CERN distribuiu gratuitamente o software WWW. Ele foi fundamental para fazer
com que a internet saísse dos ambientes acadêmicos e técnicos e atingisse o grande público.
Ao longo dos anos 1990, estimase que a internet tenha dobrado de tamanho a cada
ano, com exceção de 1996 e 1997, que tiveram um crescimento ainda mais explosivo. A
segunda metade da década também marca a descoberta da rede por empresas de todos os
tamanhos, que passaram a investir no potencial da internet. Ações de empresas de internet
tiveram enorme valorização em bolsas de valores. Essa “corrida pelo ouro” acabou não se
mostrando sustentável com o estouro da chamada “bolha pontocom”, em 2001, quando
diversas empresas foram à falência.
Em meados dos anos 2000, passam a ocupar lugar de destaque sites que oferecem
ferramentas para que os usuários possam personalizar e publicar conteúdos. Essa categoria de
sites foi agrupada sob o rótulo de Web 2.0.
1.2. IMPLICAÇÕES CULTURAIS
O desenvolvimento da internet correu simultaneamente à revolução nos costumes e
com a convergência geográfica para a Califórnia.
Enquanto empresas grandes e bem estabelecidas do leste eram rígidas (e arrogantes)
demais para reequiparse constantemente com base em novas fronteiras tecnológicas,
o Vale do Silício continuou produzindo muitas novas empresas e e praticando troca
de experiências e difusão de conhecimentos por intermédio da rotatividade de
profissionais e de cisões parciais. Conversas noturnas em bares e restaurantes, como
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o Walker's Wagon Wheel Bar e o Grill in the Mountain View, fizeram mais pela
difusão da inovação tecnológica que a maioria dos seminários de Stanford. (...)
Outro fator importante da formação do Vale do Silício foi a existência de uma rede
de empresas de capital de risco desde o início. (CASTELLS, 1999, p. 101 102).
Com isso, técnicos e engenheiros ganhariam a vizinhança de escritores, artistas em
geral e de hippies de todo o país, que convergiram para a Califórnia. Já no século XIX, por
sua localização e com a corrida pelo ouro e o estabelecimento de diversas indústrias, o
condado de São Francisco abrigava um grande número de imigrantes, especialmente latinos e
asiáticos (o bairro de Chinatown se formou por volta de 1850), criando ali uma cultura
poliglota. Desde os anos 1940, a Universidade da California em Berkeley abrigava poetas de
vanguarda, como Kenneth Rexroth, Madeline Gleason e Robert Duncan. Foi também entre
meados da década de 1940 e a década de 1960 que começou a aparecer a Geração Beat, como
ficou conhecido o grupo de escritores, incluindo Jack Kerouac, Allen Ginsberg e William S.
Burroughs, que desafiava os valores americanos tradicionais, se interessava por
experimentações com drogas e pela espiritualidade oriental. A realização de leituras e festivais
fez com que o período ficasse conhecido como Renascença de São Francisco e começasse a
consolidar a imagem da região como centro da contracultura.
Em 1967, dois anos antes da criação da ARPANET, São Francisco havia sido palco do
chamado "Verão do Amor", que reuniu cerca de cem mil jovens de todos os Estados Unidos.
Essa concentração foi crucial para a visibilidade do movimento hippie. A cidade já era o
epicentro da contracultura, onde fervilhavam música, drogas psicodélicas, liberdade sexual e
revolta política. O ano de 1968 ficou marcado pelos protestos jovens ao redor do mundo.
Nos EUA, as contradições da Guerra do Vietnã davam lugar a um forte movimento
de resistência pacifista. A deserção e a desobediência civil assumiam dimensões de
radical atitude política. Surgia uma Nova Esquerda valorizando o domínio da
problemática pessoal ou de lutas tidas como secundárias a liberação sexual, a luta
dos negros, das mulheres, as reivindicações minoritárias. Bob Dylan, Allen
Ginsberg, Black Panthers... novos símbolos e formas culturais tomavam corpo,
expressando aquilo que Herbert Marcuse, filósofo de cabeceira da nova
intelligentsia, chamou de a Grande Recusa. (HOLLANDA, GONÇALVES, 1982, p.
69)
Pierre Lévy cita um exemplo de como contracultura e tecnologia se conectaram na
14
época:
O movimento social californiano Computers for the People quis colocar a potência
do cálculo dos computadores nas mãos dos indivíduos , liberandoos ao mesmo
tempo da tutela dos informatas. Como resultado prático desse movimento "utópico",
a partir do fim dos anos 70 o preço dos computadores estava ao alcance das pessoas
físicas, e neófitos podiam aprender a usálos sem especialização técnica. O
significado social da informática foi completamente transformado. (LÉVY, 1999, p.
125)
Stewart Brand é um escritor que ficou conhecido pelos catálogos Whole Earth,
publicados duas vezes por ano entre 1968 e 1972, com outras edições eventuais até 1998. O
objetivo era catalisar a emergência de um domínio de poder pessoal, por meio da
disponibilização de tecnologias simples para indivíduos interessados em criar comunidades
sustentáveis as comunidades hippies que pipocaram nos Estados Unidos nesse período.
“Os revolucionários do computador pessoal eram a contracultura”, [Stewart] Brand
me lembrou (...). O cofundador da Apple Steve Jobs viajou para a Índia em busca
de iluminação; o fundador e desenvolvedor do Lotus 123, Mitch Kapor, havia sido
um professor de meditação transcendental. Eles eram cinco ou dez anos mais novos
que os hippies, mas eles vieram do mesmo zeitgeist dos anos 1960, e adotaram
muitas das idéias de libertação pessoal e iconoclastia. (RHEINGOLD, 1994,cap.2)
Steve Jobs, fundador de uma das mais importantes empresas de tecnologia até hoje, a
Apple, compara os catálogos Whole Earth a uma espécie de Google em papel, em um
discurso em uma cerimônia de formatura na Universidade de Stanford:
Quando eu era jovem, havia uma publicação incrível chamada The Whole Earth
Catalog, que foi uma das bíblias da minha geração. Foi criada por um sujeito
chamado Stewart Brand perto daqui em Menlo Park, e ele a trouxe à vida com seu
toque poético. Isso foi no fim dos anos 1960, antes de computadores pessoais e
publicação informatizada, então era feita com máquinas de escrever, tesouras e
câmeras polaróide. Era uma espécie de Google em papel, 35 anos de o Google
existir: era idealista, e repleta de dicas elegantes e grandes idéias. (JOBS, 2005)
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1.3. TRABALHO COLABORATIVO
Um dos usos da internet é facilitar o trabalho colaborativo entre equipes que não
necessariamente mantêm contato pessoal, ou que estão distantes geograficamente. Os dois
maiores exemplos deste tipo de trabalho são o movimento software livre e o desenvolvimento
da enciclopédia virtual Wikipedia.
Softwares livres são aqueles que podem ser usados, estudados, modificados e
redistribuídos sem restrições (ou com poucas restrições) de direitos autorais. Além do
programa em si, o usuário pode acessar seu códigofonte, algo como a receita do programa.
Os direitos autorais passaram a se aplicar também a programas de computador em
1980. A caixapreta fechada dos softwares começou a incomodar programadores, entre eles
Richard Stallman, que então trabalhava no Laboratório de Inteligência Artificial do MIT
(Massachusetts Institute of Technology). Em 1983, Stallman anunciou o Projeto GNU, para o
desenvolvimento de um sistema operacional livre através da contribuição em massa. Ele criou
o termo “software livre” e, em 1986, a ONG Fundação Software Livre. Além da programação,
as atividades da fundação estão voltadas para o ativismo.
Em 1988, foi publicada a Licença Pública Geral GNU, uma alternativa aos direitos de
propriedade intelectual. Foi sob essa licença que Linus Torvalds publicou, em 1991, um dos
programas essenciais para o sistema operacional sonhado por Stallman. Surgia assim o Linux
(ou GNU/Linux).
O fator significativo no êxito do Linux foi seu interminável aprimoramento em
conseqüência da contribuição de milhares de usuários, que descobriam novos usos e
aperfeiçoavam o software, depois divulgando esses aperfeiçoamentos na Rede,
gratuitamente, retribuindo assim o presente técnico que haviam recebido. Esse
esforço constante e multifacetado para melhorar a comunicabilidade da rede
constitui um notável exemplo de como a produtividade de cooperação tecnológica
através da rede acabou por aperfeiçoála. (CASTELLS, 1999, p.441)
O Linux possui uma fatia de mercado atualmente em cerca de 1%, o bastante para
incomodar a Microsoft, que tem hegemonia nesta área com o Windows. Além disso, o sucesso
do Linux inspirou o desenvolvimento de outros programas livres, como o navegador Mozilla
Firefox, que detém mais de 20% de seu mercado.
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Seguindo a mesma filosofia, foi criada, em 2001, a Wikipedia. Fundada por Jimmy
Wales e Larry Sanger, também sob uma licença que previa livre uso, modificação e
redistribuição. A enciclopédia criada por eles utiliza o software wiki, que possibilita que
qualquer pessoa edite o material ou publique novas páginas. Porém, as mudanças, as
diferentes versões de cada verbete ficam armazenadas para consulta, com indicação de quem
fez a alteração.
No final de 2001, a Wikipedia já tinha 20 mil artigos, em 18 idiomas. Atualmente, há
edições em 161 idiomas. A edição em inglês da enciclopédia superou a marca de 2,6 milhões
de verbetes. A versão em português possui cerca de 445 mil artigos. O medidor de audiência
na internet Alexa colocou a Wikipedia entre os quinze sites mais populares. Outra medida de
seu sucesso é o volume de doações arrecadadas, que sustentam um orçamento estimado em
quase 6 milhões de dólares no biênio 2008/2009.
Para lidar com as preocupações sobre a confiabilidade dos artigos, a Wikipedia
desenvolveu um modelo de comunidade, que pode indicar se um artigo sofre de parcialidade
ou carência de citações, ou até mesmo fechar a edição de verbetes relacionados a temas
polêmicos do noticiário. Em comparação com a tradicional Enciclopédia Britânica, a revista
cientfíca Nature encontrou um nível similar de acuracidade.
Também tornouse um modelo para outros empreendimentos colaborativos. A “família
Wikimedia” conta com um dicionário (Wiktionary), um canal de notícias (Wikinews), uma
biblioteca de livros virtuais (Wikibooks), entre outros projetos.
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2. DO JORNALISMO PESSOAL AO JORNALISMO COLABORATIVO
“Não retrate a comunidade. Seja a comunidade”.
Tim Porter, escritor1
2.1. ORIGENS
Ao lançarmos um olhar sobre a história da imprensa, percebese que a
profissionalização e a institucionalização nunca foram absolutas. A onipresença dos grandes
jornais, do rádio e da televisão podem ofuscar um pouco esta realidade, mas publicações
alternativas têm estado presentes em todos os momentos, especialmente durante crises,
situações de instabilidade política, tragédias, etc.
Em seu Nós, os Media, Dan Gilmor narra como panfletos contribuíram para a
independência e formação dos Estados Unidos. “Nos finais do século XVIII, um dos nossos
primeiro panfletários, Thomas Paine, inspirou muita gente com seus escritos acerca da
revolta, da liberdade e da governação” (2004, p. 22). Um dos adeptos dos panfletos era
Thomas Jefferson. Os autores anônimos dos Federalist Papers, que se dedicaram a analisar a
Constituição proposta e discutir o funcionamento da nova república,tiveram papel
importantíssimo para a aprovação da Constituição nos estados americanos. A Carta, aliás, tem
como primeira emenda a garantia da liberdade de expressão.
No Brasil, um dos momentos que fez disparar o gatilho da imprensa alternativa foi a
ditadura militar. Kucinski, em sua pesquisa sobre o assunto, afirma que no Brasil, entre 1964 e
1980, “nasceram e morreram cerca de 150 periódicos que tinham como traço comum a
oposição intransigente ao regime militar” (2003, p. 13). O número inclui jornais de âmbito
regional ou com temáticas específicas, como os feministas. Entre os de maior destaque,
estavam Pasquim, Movimento, Opinião e Versus. O autor aponta ainda que no apogeu desse
tipo de publicação, nos anos entre 1975 e 1977, os oito maiores somavam até 160 mil
exemplares por semana.
Ele também destaca a ocorrência desse fenômeno em outros momentos de agitação
política.
1 http://www.timporter.com/firstdraft/archives/000347.html. Último acesso em 12/12/2008
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Apesar de complexo, o fenômeno alternativo teve contornos nítidos no tempo, como
outros surtos na história do nosso jornalismo, entre os quais o dos pasquins
irreverentes e panfletários do período da Regência, que atingiu seu apogeu em 1830
com cerca de cinqüenta títulos, e o dos jornais anarquistas de operários, meio século
depois, com quase quatrocentos títulos. Nos três momentos, pequenos jornais sem
fins mercantis, produzidos precariamente, às vezes por um só homem, como eram
muitos pasquins, dirigiamse à sociedade civil e às classes subalternas criticando o
Estado e propondo mudanças. (KUCINSKI, 2003, p. 21)
Nos anos 1980 e 1990, proliferam em diversos países fanzines. Dessas publicações
amadoras, feitas por fãs de alguns fenômenos da cultura pop, há registro desde os anos 1930.
Porém a explosão do movimento punk e de seu do it yourself (faça você mesmo) trouxe nova
vitalidade para o gênero, em uma época marcada pela estagnação econômica e pelo
desemprego em diversas partes do mundo. Normalmente em edições fotocopiadas ou
mimeografadas e enviadas pelo correio, sem qualquer regularidade, os zines nasceram e
morreram aos milhares. Nos Estados Unidos e na GrãBretanha, alguns dos mais respeitados
críticos culturais começaram suas carreiras nesse tipo de revista. Entre eles, Greil Marcus e
Lester Bangs. (STONEMAN, 2001)
2.2. JORNALISMO ALTERNATIVO NA INTERNET
O advento da internet, além de facilitar a criação de publicações, aumentou de forma
avassaladora seu alcance. Uma das primeiras ferramentas desenhadas para o novo meio, o
wiki, em 1994, tinha como objetivo justamente possibilitar a criação colaborativa de conteúdo.
O uso mais conhecido do wiki é a enciclopédia online Wikipedia, mas há sites jornalísticos
que usam a ferramenta, como o WikiNews. (GILLMOR, 2005)
Em 1997, surge o Slashdot, site dedicado a notícias de tecnologia, em que os usuários
podem enviar links para matérias publicadas em outros sites. A novidade trazida pelo
Slashdot, entretanto, é o diálogo que se desenvolve nos comentários de cada notícia. No
começo, enquanto havia um grupo pequeno de usuários, apenas o fundador do site, Rob
Malda, organizava as mensagens e separava o “joio do trigo”. Porém, um ano depois, cerca de
50 mil pessoas participavam do espaço. Acompanhando o crescimento de seu site, Malda foi
19
aprimorando uma ferramenta de programação que permite que qualquer usuário com alguma
assiduidade venha a se tornar um moderador temporariamente e dar notas aos comentários. O
número de notas é limitado. Quem navega pode optar por ver apenas as entradas com notas
mais altas, na escala que vai de 1 a 5. O histórico de notas recebidas pelo usuário compõe seu
“carma” e usuários com carmas mais elevados ganham privilégios, como terem mais chances
de serem escolhidos moderadores.
Steve Johnson incluiu o Slashdot como um dos casos em seu livro Emergência, sobre
sistemas do tipo bottomup (de baixo para cima). Tratase de sistemas que se organizam sem
uma liderança central, mas que, a partir de regras próprias e com a ação de indivíduos, cria
um todo “inteligente” (não necessariamente no sentido da inteligência humana) e evolutivo.
Em linguagem mais técnica, são complexos sistemas adaptativos que mostram um
comportamento emergente. Neles, os agente que residem em uma escala acima
deles: formigas criam colônias; cidadãos criam comunidades; um software simples
de reconhecimento de padrões aprende a recomendar novos livros. O movimento das
regras de nível baixo para a sofisticação de nível mais alto é o que chamamos de
emergência. (JOHNSON, 2003, p. 14)
O feedback – tanto positivo como negativo – é um dos mecanismos para o
funcionamento de comunidades. No caso do Slashdot o feedback positivo é dado pelo valor
atribuído à participação; o negativo, pela escassez, já que os poderes de moderação se
esgotam.
O problema para Malda era como construir um sistema homeostático que levasse o
site naturalmente àquele estado, sem que nenhum indivíduo estivesse no controle. A
solução a que ele chegou seria imediatamente reconhecido hoje: uma mistura de
feedbacks positivo e negativo, uma dose de acaso estruturado, interações entre
vizinhos e controle descentralizado. De um certo ângulo, o Slashdot hoje se parece
com uma colônia de formigas. De outro, parece uma democracia virtual. O próprio
Malda comparao às tarefas de um júri. (JOHNSON, 2003, p. 115)
O Slashdot foi pioneiro em um modelo que atualmente é utilizado em diversos sites,
como a gigante de vendas online Amazon e o respeitado Epinions, de resenhas de produtos.
Ambos computam tanto notas dadas pelos usuários aos artigos como os próprios usuários são
avaliados, pela freqüência e qualidade de participação. Também é o exemplo para sites de
20
jornalismo colaborativo que atuam sem a presença de uma equipe de edição centralizada,
como veremos adiante.
Em 1999, dois acontecimentos tiveram grande impacto na maneira como as pessoas
passaram a usar a internet: os protestos antiglobalização e o surgimento dos blogs.
Desde meados dos anos 1990, movimentos populares e anticapitalistas como os
zapatistas no México, o Movimento dos Sem Terra brasileiro, o inglês Reclaim the Streets, a
Rede de Mulheres Indígenas da América do Norte, e outros começaram a se articular em uma
rede, que em 1998 ganhou o nome de Ação Global dos Povos. Um dos princípios dos grupos
envolvidos era a ausência de hierarquia; a organização deveria ser horizontal. A primeira ação
internacional foi o “Carnaval contra o Capitalismo”, que ocorreu em 18 de junho de 1999,
enquanto o G8 se reunia na Alemanha. Com o lema “Nossa resistência é tão transnacional
quanto o capital”, foram realizados protestos simultâneos em distritos financeiros de mais de
40 países, incluindo Alemanha, Inglaterra, Estados Unidos, Canadá, França, Israel e Nigéria.
A internet – emails e a lista de discussão – foi um fatorchave para a abrangência do
movimento e contato entre os grupos. Mas ainda havia o entrave do pouco espaço na mídia
tradicional para os protestos. Na reunião de criação da Ação Global dos Povos, um dos
participantes havia dito: “O inimigo global é relativamente bem conhecido, mas a resistência
global que ele enfrente raramente passa através do filtro da mídia” (LUDD, 2002, pp. 1516).
Assim, para as próximas manifestações, os movimentos criaram seu próprio veículo
na internet, o Indymedia – Independent Media Center (Centro de Mídia Independente). O site
foi ao ar em 24 de novembro de 1999, dias antes dos protestos contra a reunião da
Organização Mundial do Comércio (OMC) em Seattle, nos Estados Unidos. A primeira
entrada dá o tom do que viria: “A web alterou dramaticamente o equilíbrio entre mídia
multinacional e ativista. Com apenas um pouco de programação e algum equipamento barato,
podemos estruturar um website automatizado que rivaliza com as corporações”
(INDYMEDIA, 1999).
A OMC começou a sua reunião no dia 30, mas as negociações do que seria a Rodada
do Milênio, sobre a diminuição das barreiras comerciais, sequer iniciaram2, devido a diversos
fatores, entre os quais os massivos protestos que ocorreram na data. O Indymedia foi o espaço
em que ativistas, curiosos e jornalistas buscaram notícias, fotos, áudio e vídeos sobre as
2 Um novo encontro aconteceu em novembro de 2001, em Doha, no Qatar, e a agenda estabelecida então ficou conhecida como Rodada de Doha. As negociações, ainda em andamento, até a última reunião em 2008 em Genebra, não levaram a um acordo, principalmente pela discordância entre países desenvolvidos e em desenvolvimento.
21
manifestações e a repressão policial – o próprio Centro de Mídia Independente, aliás, recebeu
“uma violenta visita do FBI”, como lembra Gillmor (2004, p. 148). Atualmente, há 150
versões locais e autônomas do Indymedia. A brasileira permite que qualquer pessoa publique
conteúdo, mas remove da página inicial spams, textos repetidos e em desacordo com a política
editorial do site. Esse material é reunido em uma seção chamada “Artigos escondidos”, para,
de acordo com o coletivo editorial, dar transparência ao processo.
Se o Indymedia era a possibilidade de publicar com apenas um pouco de
programação, na mesma época surgia uma ferramenta que permitia criar seu espaço na
internet mesmo a quem não tinha nenhum conhecimento de linguagem HTML. Os blogs –
abreviação para web log (registro de web) – são páginas de internet que publicam entradas em
ordem cronológica inversa, ou seja, as mais recentes acima das mais antigas. A primeira
comunidade de blogs foi a Open Diary, que foi ao ar em outubro de 1998. Além de oferecer a
criação de diários, a Open Diary logo implementou uma funcionalidade para que usuários
pudessem colocar comentários em entradas de outros diários, que depois se tornaria uma das
características mais comuns desse tipo de publicação. Em meados de 1999, mais de 10 mil
diários faziam parte da comunidade. Também em 1999, surgiram outros dois serviços online
para criação e hospedagem de blogs: o LiveJournal e o blogger.com, que rapidamente
alcançaram extrema popularidade. O blogger.com foi comprado pelo Google em 2003, por
valores não revelados.
Com o acesso cada vez maior e mais barato à conexão à internet por banda larga, os
blogs experimentaram uma explosão. O mecanismo de ranqueamento de blogs Technorati cita
a pesquisa da Universal McCann para referendar sua visão de que os blogs vieram para ficar:
em todo o mundo, 184 milhões de pessoas já criaram um blog e 346 milhões de pessoas –
77% dos usuários ativos de internet – lêem blogs. O próprio Technorati tem indexados 133
milhões de blogs desde 2002, dos quais 1,5 milhão haviam publicado algum conteúdo nos sete
dias anteriores à elaboração do relatório, em junho de 2008. (TECHNORATI, 2008)
O espectro formado por todos essas páginas vai de projetos individuais a publicações
coletivas, dos mais amadores aos corporativos; seu conteúdo vai de textos literários e fotos,
passa por cartuns e culinária, até abordagens sofisticadas.
Segundo Dan Gillmor,
Nos últimos 150 anos, dispusemos essencialmente de dois meios de comunicação:
22
de um para muitos (livros, jornais, rádio e televisão) e de um para um (cartas,
telégrafo e telefone). Pela primeira vez, a Internet permitenos dispor de
comunicação de muitos para muitos e de alguns para alguns ... De muitos para
muitos, de alguns para alguns. Nestes dois casos e em todos os outros, o blogue é o
meio de comunicação. (GILLMOR, 2004, pp. 42 e 45)
As novas ferramentas para publicação já haviam conquistado algum espaço, mas um
período de tragédia as colocou à prova como instrumento de informação alternativa à mídia
tradicional. A cobertura do atentado terrorista de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos
mobilizou milhares de pessoas que levaram à internet seus relatos, imagens, informações e
comentários.
De acordo com o Pew Internet Project, em pesquisa citada por Bowman e Willis
(2003, p. 7), os ataques geraram o maior volume de tráfego para os sites de notícias
tradicionais na história da Web até então. Muitos sites não deram conta da enorme demanda e
o público se voltou para emails, blogs e fóruns.
Gillmor (2004), falando sobre um dos blogs que ascenderam na época, o InstanPundit,
de Glenn Reynolds, descreve da seguinte forma:
Actualmente, InstanPundit.com goza de enorme aceitação. Reynolds está sempre a
publicar comentários cortantes, de tendência libertária e conservadora3, sobre uma
grande diversidade de questões. Tornouse uma estrela num firmamento que, ainda
há muito pouco tempo, não poderia ter existido, um firmamento que conseguiu o
maior impulso no dia mais cruel da história americana recente. O dia que ficou
congelado no tempo, mas as explosões dos aviões contra aquelas torres trouxeram
uma redobrada onde de calor ao glaciar dos meios de comunicação e o gelo continua
a derreterse. (GILLMOR, 2004, p. 39)
Foi a partir deste momento que ganhou em popularidade os termos jornalismo
cidadão, jornalismo participativo ou jornalismo colaborativo – além dos termos mais comuns
na área de tecnologia mídia gerada pelo usuário e conteúdo gerado pelo usuário. (Em inglês,
citizen journalism tem um caráter muito mais voltado à produção feita pelos cidadãos; em
português, a expressão pode indicar a cobertura de assuntos relacionados à cidadania. Por
3 Libertário, no contexto político americano, é aquele que defende mínima intervenção do Estado na economia (redução de impostos, privatização da Previdência Social, pouca regulação do mercado) e em outros aspectos da vida social, como direito ao aborto, ao porte de armas, liberação da prostituição, jogos de azar e de drogas. (Nota da autora)
23
isso, neste trabalho optamos por “jornalismo colaborativo”).
Os desdobramentos do 11 de Setembro também levaram a uma cobertura intensa na
internet e ao reconhecimento, por alguns veículos importantes, das possibilidades que
surgiam. Para cobrir as manifestações em diversos lugares que precederam a invasão
americana no Iraque, a BBC News fez um apelo para que seus leitores enviassem fotos tiradas
com câmeras digitais ou celulares com câmeras embutidas e publicou as melhores em seu site
(BOWMAN e WILLIS, 2003, p.8). Os autores também citam pesquisa mostrando que, nos
primeiros dias da guerra do Iraque, 17% dos americanos com acesso à internet usaram o meio
como principal fonte de informação sobre a guerra; logo após o 11 de Setembro, eram apenas
3%. (BOWMAN e WILLIS, 2003:8).
2.3. TIPOS E FUNÇÕES DA PARTICIPAÇÃO
O estudo do Media Center define jornalismo participativo como "o ato de um cidadão,
ou grupo de cidadãos, participa ativamente no processo de coletar, reportar, analisar e
disseminar notícias e informação. O intuito dessa participação é produzir a informação
independente, confiável, precisa, abrangente e relevante de que necessita a democracia"
(BOWMAN e WILLIS, 2003, p. 9).
Essa participação pode se dar de diversas maneiras, muitas das quais estão em um
terreno pantanoso quanto a serem de fato jornalismo ou não. Lasica (2003) propõe que em
geral o jornalismo participativo se enquadra em uma das seguintes categorias:
1. Participação do público em veículos mainstream – que inclui blogs de
membros da equipe do veículo com espaços para comentários, fóruns, artigos escritos por
leitores e fotos e vídeos enviados pelo público. No Brasil, a maioria dos jornais e portais de
notícias (Folha de S. Paulo/UOL, Estado de S.Paulo, O Globo, Terra, entre outros) conta com
espaços do gênero;
2. Sites de notícia independentes que podem ser desde blogs individuais até sites
voltados a nichos ou comunidades locais. Os blogs dos jornalistas Luis Nassif e Pedro Dória
(que não são subordinados às empresas onde eles trabalham) estão nessa categoria, assim
como o blog coletivo de tecnologia Gizmodo. Outra iniciativa de interesse no Brasil é o Rio
Body Count, em que, a exemplo do Iraq Body Count, seus criadores computam as mortes por
24
violência no Rio de Janeiro.
3. Sites participativos – em que o material produzidos pelo público é o principal
recurso. O coreano OhmyNews é o exemplo mais famoso, com milhões de visitantes
diariamente e dezenas de milhares de colaboradores. O OhmyNews conta com uma equipe de
profissionais que faz a edição do material e os colaboradores recebem um pagamento
simbólico em dinheiro.
4. Sites colaborativos – em que, além de enviar material, o público em geral pode
participar do processo de edição. É o que acontece no Slashdot, no Kuro5hin e no brasileiro
Overmundo.
5. Mídia magra – listas de discussão por email e newsletters. No Brasil, o Ex
Blog do César Maia pode ser considerado um exemplo.
6. Sites de transmissão pessoais – entre os quais estão os podcasts e videocasts.
Bowman e Willis (2003) fazem uma classificação partindo da função que a
colaboração do público pode exercer:
1. Comentário – o mais comum e talvez o mais importante nível de participação.
Isso se aplica tanto ao espaço para comentários em sites de notícias como textos de opinião e
análise. “... alguns defendem que o blog é a próxima geração das páginas de editoriais e
opinião dos jornais” (BOWMAN e WILLIS, 2003, p.33).
2. Filtragem e edição – que incluem filtragem, classificação, ranqueamento e
apontamento de links. São os casos em que ocorre seleção e julgamento editorial. O escândalo
da demissão de procuradores da República no governo Bush levou o então ministro da Justiça
americano, Alberto Gonzáles, a renunciar. O caso foi trazido à tona por Joshua Micah
Marshall, do blog Talking Points Memo, que recebeu o prêmio George Polke pela cobertura.
“Informado por leitores em vários cantos do país, percebeu que havia uma série de
procuradores públicos sendo demitidos. Invariavelmente, eram procuradores que haviam
aberto processos contra políticos republicanos locais. Não havia ninguém no jornalismo
tradicional atento a estas histórias que eram, essencialmente, pequenas e regionais”. (DÓRIA,
2008)
3. Checagem – um dos exemplos trazidos por Gillmor (2004, pp.185186) é o de
Kayceen Nicole, que criou um blog para falar sobre sua luta contra a leucemia. Entre 2001 e
2002, o espaço teve milhares de visitas de internautas que enviavam mensagens de apoio e
ofertas de auxílio, até que sucumbiu à doença. Porém, em 18 de maio de 2001, um usuário
25
questionou no MetaFilter se ela existia de verdade. Um grupo de usuários tomou para si a
tarefa de descobrir: investigaram registros, trocaram informações, e revelaram a farsa. Se este
é um caso mais profundo, não devemos perder de vista o trabalho cotidiano de checagem
feitos pelo público de blogs e jornais.
4. Reportagem de base “Assumindo a forma de testemunhas ou relatos de
primeiramão, usuários de internet participam do processo de reportagem e reunião de fatos,
muitas vezes produzindo notícias de impacto (BOWMAN e WILLIS, 2003, p. 33). Também
se enquadram nessa categoria a participação de especialista ou diletantes, que publicam em
seu blog ou em outros espaços, especialmente quando se trata de assuntos que não têm uma
boa cobertura da mídia tradicional.
5. Reportagem extensiva – envolve a publicação de material complementar a uma
matéria. Muitos jornalistas usam seus blogs para públicar íntegras de entrevistas, versões
menos editadas de textos, etc.
6. Reportagem “código aberto” e revisão pelos pares – alguns sites começam a
permitir que leitores avaliem determinado material antes mesmo de sua publicação oficial, de
maneira similar à revisão por pares feitas em publicações científicas. Recentemente, a revista
Wired criou um blog4 para acompanhar a elaboração de um perfil do roteirista Charlie
Kaufman para a edição de novembro. Foram publicados emails internos (mas não de fontes),
áudio, vídeos, rascunhos de texto e de diagramação, numa espécie de making off em tempo
real da reportagem.
7. Transmissão de áudio e vídeo
8. Compra, venda e anúncios “O ethos igualitário que move o jornalismo
participativo não se resume meramente à disseminação de notícias e informação, mas também
abrange comércio e anúncios” (BOWMAN e WILLIS, 2003, p. 36). Há casos bem sucedidos
de jornalistas independentes que conseguiram levantar fundos com a doação de leitores, como
Chris Allbritton, que em 2003 pediu contribuição financeira a seus leitores para ir ao Iraque
fazer reportagens sobre o conflito. No total, 342 pessoas enviram cerca de 14,5 mil dólares
(GILLMOR, 2004, p.158). Outro exemplo é o site Kuro5hin, que permite que leitores
comentem os anúncios.
9. Gerenciamento de conteúdo – em que as pessoas usam blogs para coletar,
armazenar e compartilhar conhecimentos sobre determinado assunto.
4 http://blog.wired.com/storyboard/ . Último acesso em 12/12/2008.
26
2.4. IMPLICAÇÕES PARA O JORNALISMO TRADICIONAL
A participação do público traz à tona novamente questionamentos sobre o que é
jornalismo, o que é notícia, quem são os jornalistas. As discussões, por exemplo, se blogs são
jornalismo, tema da matéria de capa da revista Imprensa de setembro de 2008 (para a revista,
a discussão acabou: não são, como afirma na capa), acontecerem em 2003 em um programa
da rede de televisão pública americana, PBS (LASICA, 2003).
Como descreve o relatório do Media Center:
Claramente, o jornalismo está em processo de redefinição, se ajustando às forças
desordenantes que o cercam. Assim, não é surpreendente que discussões sobre
formas de jornalismo participativo, como os blogs, sejam freqüentemente
consumidas por debates defensivos sobre o que é jornalismo e quem pode,
legitimamente, se autodenominar jornalista. (BOWMAN e WILLIS, 2003, p. 11)
Na transposição para outro ambiente, a internet, alguns dos paradigmas do jornalismo
sofrem alterações5, borrando ainda mais os limites entre informação e notícia. Neste trabalho
vamos nos deter nas implicações da internet em duas teorias do jornalismo: agenda setting e
gatekeeping.
A hipótese do agenda setting propõe que “a mídia, pela seleção, disposição e
incidência de suas notícias, vem determinar os temas sobre os quais o público falará e
discutirá” (BARROS FILHO, 1995, p. 169). Simultaneamente, os assuntos excluídos pela
mídia não entram na agenda de debates das pessoas.
Porém, uma das características da internet é a personalização do noticiário que o
público recebe. Amplificada, essa personalização pode ser definida como o The Daily Me, a
previsão feita por Nicholas Negroponte em 1995 que os leitores poderiam escolher apenas os
tópicos e fontes que lhes interessassem (apud BOWMAN e WILLIS, 2003, p. 7).
Atualmente, a maioria dos portais e sites de notícias estrangeiros incluem opções para
personalização da página inicial. No iGoogle, do Google, o usuário pode escolher destaques
de diversos sites e sua disposição na página; no MyTimes, do The New York Times, é possível
escolher entre editorias do jornal, sugestões de jornalistas da equipe e material externo; o
Yahoo oferece, com o MyYahoo, um serviço similar.
5 Algumas dessas mudanças já começavam a acontecer com a transmissão televisiva via cabos de fibra ótica, que possibilitou o surgimento de canais como a CNN.
27
Mas não é necessário sequer ir até os sites. O RSS (Really Simple Sindication ou
Distribuição Realmente Fácil) é um elemento que é cada vez mais presente nos sites que têm
atualizações freqüentes. Com um programa conhecido como agregador, o usuário pode se
inscrever ou assinar os sites que deseja acompanhar. Nesse agregador, o usuário passa a
receber as atualizações de seus sites preferidos. “De um momento para o outro, o sistema RSS
põe a Internet a funcionar como deve ser. Em vez de procurar tudo, a Internet traz até nós o
que pretendemos, nas condições por nós estabelecidas” (GILLMOR, 2004, p. 54). Boa parte
dos agregadores também apresentam ferramentas de redes sociais, ao permitir que o usuário
também receba atualizações indicadas por seu grupo de amigos. Outro uso interessante é feito
pelo Google, ao oferecer assinaturas para resultados de buscas por determinadas palavras
chave. Assim, o usuário pode ficar sabendo sempre que houver um novo resultado para aquela
busca.
Com o largo espectro temático e ideológico dos blogs e sites e a cultura do link e dos
comentários, o poder do agenda setting se divide em número cada vez maior de mãos. Por
outro lado, o Daily Me não é tão individual como previsto. Como afirmam Bowman e Willis
(2003), a idéia do Daily Me está sendo substituída pelo Daily We.
O conceito de gatekeeping estabelece que o fluxo de notícias dentro dos meios de
comunicação passa por zonas filtro que definem qual material será aceito e qual será rejeitado.
O jornalista atua, portanto, como um porteiro. Bruns (2003) lembra que o conceito já vinha
sendo questionado, antes mesmo da internet, devido à contaminação pela influência crescente
das assessorias de imprensa e especialistas em manipulação (spin doctors), que debilita o
processo de gatekeeping.
O gatekeeping se baseia na noção de que há uma realidade identificável de eventos,
que ultrapassa os canais de publicação, limitados seja pelo espaço, no caso dos veículos
impressos, seja pelo tempo, no caso da televisão e do rádio. Na internet, porém, não há
escassez de espaço; pelo contrário, há uma tendência a capacidades cada vez maiores de
armazenamento, como um dos corolários da Lei de Moore.
Com a internet, afirma Bruns (2003, p.4), "não apenas há uma multidão de portões
pelos quais informação e eventos potencialmente noticiáveis emergem à arena pública, como
também existe um igual número de critérios para avaliar a 'noticiabilidade' para públicos
específicos". O uso de hiperlinks permite ao autor apontar diretamente para fontes e para
outros pontos de vista.
28
Ao gatekeeping, o autor contrapropõe o conceito de gatewatching. Os gatewatchers
atuam como bibliotecários especializados, selecionando quais informações são confiáveis na
área que cobrem. Os publicadores, que podem ser pessoas comuns ou partidários de uma
causa, não levam a informação para o usuário, mas sim permite que ele venha até a
informação. Ao manter os benefícios do gatekeeping, o gatewatching permite confrontar
diversos problemas na abordagem do gatekeeper:
• as matérias têm potencial para ser mais profundamente informativas, já que
os leitores podem explorar material das fontes diretamente, e de maneira completa;
• a velocidade do noticiário aumenta, já que notícias podem ser publicadas
assim que uma fonte de informação é encontrada na internet, sem a necessidade de
esperar jornalistas escreverem suas matérias ou gatekeepers completarem sua
avaliação;
• o processo de edição se torna mais transparente e não se evita que leitores
chequem as fontes de uma notícia; ao contrário, isso é encorajado;
• o viés pessoal do editor pode ainda afetar sua matéria, mas como leitores
estão mais inclinados a consultar fontes originais, esse viés tem efeito reduzido;
• gatewatchers não precisam de grandes habilidades jornalísticas, e sim de
habilidades para pesquisa geral online. (BRUNS, 2003, pp. 89)
Em relação ao terceiro e ao quarto tópico, um ponto interessante a ser considerado é o
uso que as próprias fontes fazem da internet. O Departamento de Defesa do governo
americano, por exemplo, publica em seu site6 a íntegra das entrevistas importantes do
secretário e de seu adjunto. Assim, o público tem como conhecer o contexto em que foram
dadas as declarações e julgar se foram editadas de maneira inadequada.
Qual a indústria que, por tradição, se encontra entre as menos transparentes? O
jornalismo. Temos sido uma caixa negra e, nos anos recentes, apenas conseguimos
tornarmonos ligeiramente menos opacos. O público, porém, está a exigir maior
transparência no nosso domínio e a fazer seu próprio jornalismo quando nós não
conseguimos responder de maneira satisfatória … Não estamos habituados, por mais
saudáveis que nos sintamos, a ser analisados da mesma maneira que analisamos as
outras pessoas. (GILLMOR, 2004, p. 74)
6 http://www.defenselink.mil/transcripts/
29
3. O BLOG DO NASSIF
3.1. BIOGRAFIA
Luis Nassif nasceu em 1950, em Poços de Caldas, Minas Gerais. Formouse em
jornalismo pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Trabalhou na
revista Veja, de 1970 a 1979. A seguir, foi para o Jornal da Tarde, onde criou a seção “Seu
Dinheiro”, de finanças pessoais, e o “Jornal do Carro”. Em 1983, foi para a Folha de S.Paulo,
onde foi colunista e membro do conselho editorial. Escrevia principalmente sobre economia,
embora um de seus espaços no jornal fosse uma coluna de crônicas. Ele ficou na Folha de
1983 a 2006, com um intervalo entre 1987 e 1991. Em 1987, criou a Agência Dinheiro Vivo,
de notícias de economia em tempo real.
É vencedor do Prêmio Esso de Reportagem, em 1986, por sua cobertura do Plano
Cruzado; do Prêmio Ayrton Senna, na categoria Jornalista Econômico, em 2003; recebeu
menção honrosa do prêmio Jabuti de 2003, categoria crônica; vencedor do prêmio de Melhor
Jornalista de Economia da Imprensa Escrita do site Comuniquese em 2003, 2005 e 2008. Ele
atuou como comentarista econômico na TV Cultura e na TV Bandeirantes. É membro do
Conselho do Instituto de Estudos Avançados da USP e do Conselho de Economia da Fiesp.
Já lançou os livros O Menino de São Benedito e Outras Crônicas (2001), O
Jornalismo dos Anos 90 (2003) e Os CabeçadePlanilha (2007). Além do trabalho como
jornalista, Nassif também é cantor e compositor, pesquisador de samba e choro.
Criou o Blog do Nassif em 30 de maio de 2006, pouco antes de deixar a Folha. O blog
continuou hospedado pelo UOL, portal pertencente ao grupo Folha da Manhã, que edita a
Folha de S. Paulo, até setembro de 2006. Desde então, está hospedado no portal iG
(www.projetobr.com.br/web/blog/5).
Em 2007, Nassif lançou o Dossiê Veja, série de textos denunciando manipulações e
distorções intencionais no noticiário da revista semanal.
3.2. O BLOG E A PARTICIPAÇÃO DOS LEITORES
Desde o início, Nassif abriu espaço no blog para as manifestações de leitores. No
30
primeiro post, de apresentação (“O Blog”, 30/5/2006), ele já destaca essa participação:
Sempre que levanto um tema polêmico, costumo receber emails consistentes, de
pessoas com diferentes opiniões. Pretendo abrir espaço para esse tipo de comentário,
mais do que para os comentários curtos e impressionistas dos blogs convencionais.
Por isso mesmo, quem tiver comentários maiores a fazer, poderá escrever para
[email protected] Os melhores serão publicados, dentro dos limites de
espaço do blog”. (Anexo I)
Cerca de uma semana depois, é publicado o primeiro comentário de leitor como post
na área principal do blog (“Do leitor”, 6/6/2006, Anexo I). Em 17/7/2006, é publicado o
primeiro post com o objetivo exclusivo de fazer elogio público à participação dos leitores (“O
Blog e os leitores”, Anexo I). Esse procedimento é uma constante no blog (por exemplo, nos
posts “O acidente da Gol”, 17/11/2006; “Livro em rede”, 27/11/2006; e “A discussão sobre o
Youtube”, 9/1/2007, Anexo I) e uma dos mecanismos utilizadas para atrair a participação
qualificada. Com o tempo, o grupo de leitores, especialmente o de contribuidores mais
freqüentes, passa a ser referido como comunidade.
Também são criadas seções específicas para a participação dos leitores. A primeira é a
“Trivial variado”, com estréia em 20/3/2007 (“Trivial variado”, Anexo I), com o objetivo de
ser um post no qual os freqüentadores poderiam publicar quaisquer comentários que não
estivessem relacionados com os assuntos dos outros posts do dia. Com o tempo, o “Trivial”
acabou por se tornar um espaço para publicação de textos literários, poemas, discussões sobre
arte e cultura e outros temas mais leves. Em agosto de 2008, criou outra seção com objetivo
similar, a “Fora de pauta” (“Fora de pauta”, 26/8/2008, Anexo I), publicada diariamente por
volta do meiodia.
Com o crescimento da popularidade do blog e aumento no número dos comentários,
alguns posts são dedicados também a esclarecer as “regras de convívio” no espaço (cabe
destacar que os comentários passam por moderação e só vão ao ar – integral ou parcialmente
– depois de aprovados). É o caso dos posts “O Estatuto da Gafieira” (3/11/2006), “Estatuto da
gafieira” (5/2/2007), “Convivência democrática” (17/6/2007), “Filtros nos comentários”
(6/7/2007), entre outros (Anexo I). A moderação veta a publicação de comentários de teor
ofensivo ou grosseiros, como define um dos posts: “Críticas pesadas contra terceiros
continuarão a não ser aceitas. Contra o blogueiro (desde que não contenham elementos de
31
injúria, calúnia ou difamação) serão aceitas, mas desde que o comentarista se identifique. Só
faltava abrir um espaço democrático para receber porradas de anônimos” (“Estatuto da
gafieira”, 5/2/2007, Anexo I). Outro comportamento comum é fechar os comentários ou pedir
aos freqüentadores que não o façam quando se trata de posts com a resposta de alguém
criticado no blog, como em “A Abril se manifesta” (2/2/2008).
O Projeto Brasil surge de forma paralela, como “um empreendimento jornalístico
independente que oferece os conteúdos e ferramentas necessárias para a discussão estruturada
de temas estratégicos para o desenvolvimento nacional (...) tem como objetivo principal
mudar o foco das discussões na imprensa brasileira”7. Além do conteúdo produzido por
equipe própria, o Projeto Brasil se alimenta de fóruns de discussão. Os fóruns estão divididos
em “comunidades”, termo usado aqui com sentido levemente diferente do anteriormente
mencionado, já que neste caso os participantes são cadastrados em uma rede social, criam
perfis, podem criar grupos e interagir de formas diferenciadas em relação ao blog. São elas:
“Comunidade do Blog Luis Nassif Online”, “Comunidade Verso & Prosa” e “Comunidade
Projeto Brasil Gestão”.
A relação entre o Projeto Brasil, os fóruns e o blog é evidenciada nos posts sobre o
desenvolvimento do Projeto, com o objetivo de “1. Dar dar mais visibilidade aos artigos dos
comentaristas do Blog, publicando no PB aqueles comentários mais elaborados. 2. Permitir
mais tempo de vida às discussões permanentes, que serão transferidas para o Fórum Online”
(“Blog e Projeto Brasil”, 12/11/2007, Anexo I).
3.3. O BLOG, A MÍDIA E A INTERNET
Neste período, destacamse as discussões sobre o comportamento da imprensa
tradicional (“O papel da mídia”, 22/6/2006; “O papel da mídia – 2”, 22/6/2006, Anexo I), por
sinal, assunto analisado por Nassif no livro O Jornalismo dos Anos 90, e também sobre as
novas tecnologias e o novo modelo de comunicação surgido delas (“Conhecimento em rede”,
29/9/2006; “A nova era da comunicação”, 24/10/2006, Anexo I). Um texto em especial mostra
sua visão em relação à internet e aos blogs:
A homogeneização do pensamento acabou deixando ao relento fatias importantes do
7 Fonte: http://www.projetobr.com.br/c/portal/layout?p_l_id=PUB.1013.29. Último acesso em 12/12/1008.
32
público, do leitor intelectualmente mais exigente àquele cujas preferências políticas
deixaram de ser contempladas pelo conjunto da mídia.
Todo esse quadro se formou no momento em que a proliferação de blogs, na
Internet, criou novos espaços de opinião. Antes, tinhase o jornal dando a
visibilidade a seus colunistas, emprestando parte de seu prestígio e recebendo, de
volta, a agregação de mais leitores e prestígio. Com os blogs, o aval não é mais do
jornal, mas é individual, do blogueiro.
Os blogs são apenas a parte mais visível de um processo de criação de novos centros
de opinião, como grupos de discussão, fóruns, ONGs. E novos atores de peso
entrando no jogo, como as empresas de telefonia e os portais.
Nos próximos anos, a mídia brasileira passará pelas maiores transformações da sua
história. Os jornais que entenderem o processo continuarão no jogo” (“O jogo da
convergência digital”, 29/8/2006, Anexo I).
A observação crítica da cobertura da imprensa sobre os assuntos em pauta – e falta de
cobertura sobre determinados assuntos – é um dos aspectos mais relevantes do Blog do
Nassif, que trespassa os comentários sobre. E, como espécie de epílogo virtual a O
Jornalismo dos Anos 90, em de janeiro de 2008, lançou a série “O caso Veja” (“O fenômeno
Veja”, 30/1/2008), denunciando o uso da revista semanal de maior circulação do País para
promover empresas ou atacar adversários, a partir de interesses comerciais ou intrigas
pessoais.
Até novembro de 2008 foram escritos 24 capítulos, vários deles mostrando a atuação
de jornalistas e colunistas a serviço do banqueiro Daniel Dantas, acusado de diversos crimes
financeiros. “O caso Veja” também contou com a colaboração de leitores, tanto no
levantamento de material a pedido de Nassif (tendo como exemplo o post “Preparativos”,
16/2/2008, Anexo I), como na investigação e análise. Sobre isso, diz Nassif: “Foi um trabalho
minucioso de pesquisa feito por vocês … Quando pedi a ajuda de vocês, houve quem risse do
pedido. Esse povo não sabe o que é o trabalho cooperativo em rede” (“A rede e os g00db0ys”,
21/2/2008, Anexo I).
3.4. COBERTURA DO ACIDENTE DA TAM
A cobertura do acidente com o vôo 3054 da TAM é um caso exemplar da participação
do público no Blog do Nassif. Este material foi escolhido para análise por se tratar de um
33
tema em que aspectos técnicos têm grande relevância, mas que ainda assim apresentou um
forte caráter político. Assim, com informações difíceis de serem contestadas por não
especialistas e acontecendo em meio a um momento de grande polarização política, a
cobertura jornalística fica sujeita a manipulações e sensacionalismo. O material produzido
pelo blog (jornalista e leitores) é uma narrativa tanto das investigações das causas do acidente
como de como a imprensa se comportou em relação ao caso. Porém, como destacado no
capítulo anterior, momentos de tragédia acabam disparando uma grande participação amadora
no noticiário.
O acidente aconteceu em 17 de julho de 2007, quando uma aeronave Airbus A320 da
TAM Linhas Aéreas, vinda de Porto Alegre, teve problemas na aterrissagem no aeroporto de
Congonhas, em São Paulo, e chocouse contra um prédio da TAM Express. No total,
morreram 199 pessoas, sendo 187 que estavam a bordo (181 passageiros, dos quais 19
funcionários da TAM, e 6 tripulantes). É o pior acidente da aviação no Brasil.
Foram levantados 37 posts no Blog do Nassif a partir da madrugada de 18 de julho de
2007 até o fim do mês de agosto do mesmo ano (Anexo II). Outros posts no período faziam
referência indireta ou referência a assuntos relacionados (como a gestão da Agência Nacional
de Aviação Civil ou o desempenho comercial da TAM). Neste trabalho, porém, reduzimos
nossa seleção aos textos relacionados diretamente ao acidente.
O primeiro post sobre o acidente publicado por Nassif é uma contribuição feita por
leitor (“Sobre a pista de Congonhas”, 18/7/2007, Anexo II). O conteúdo é uma sugestão à
convocação dos leitoresespecialistas do blog. Outros 12 dos posts selecionados contêm
comentários ou emails enviados por leitores, seja com texto próprio, seja reproduzindo
material de outra fonte. Deste último caso, temos os posts “A hidroplanagem na aviação”
(18/7/2007), em que a leitora Silvana reproduz texto do site Air Safety Group, e “FAA aprova
sistema aéreo brasileiro” (19/7/2007), com texto da BBC enviado pela leitora Luzete (Anexo
II).
Dos textos de autoria dos comentadores, destacase o post “O peso do Airbus da TAM”
(2/8/2007), em que o leitor Gustavo faz um trabalho de cruzamento de informações oficiais da
Airbus, publicadas em seu site, do número de passageiros e quantidade de combustível no
avião, de acordo com o publicado na imprensa, e outras, para fazer um cálculo independente
do peso do avião. Na ocasião, havia a hipótese de que o excesso de peso pudesse ser um dos
fatores responsáveis pelo acidente. O cálculo, feito com base em informações públicas, era
34
inédito na cobertura até aquele momento.
Também é digno de menção o post “Dos leitores” (29/7/2007), com um apanhado de
comentários curtos (em geral com quatro ou cinco frases), que tratam, em maioria, de como a
imprensa vinha tratando o acidente. A crítica à abordagem da grande imprensa também
aparece nos comentários publicados como texto principal dos leitores André Borges Lopes
(“A dura mudança de rota”, 29/7/2007) e weden (“A segunda morte dos pilotos”, 2/8/2007).
Luis Nassif chama os leitores à colaboração com a cobertura em cinco posts:
• “Sobre a pista de Congonhas” (18/7/2007), que embora reproduza comentário
de leitor, é endossado ao ser publicado como texto principal;
• “A propósito do furo do JN” (19/7/2007), em que se dirige aos leitores
especialistas em dois momentos: “os leitores especialistas me corrijam, se
estiver errado” e “Solicito que os leitores especialistas expliquem melhor essa
questão, para que se possa avaliar as seguintes questões...”. Menos de duas
horas depois da publicação deste post, é publicado “O uso do reverso”
(20/7/2007), com resposta do leitor Antonio Carlos de So aos questionamentos
do jornalista;
• “A questão IPT x ANAC” (23/7/2007), em que o convite aparece na seguinte
forma: “Quem tiver elementos, fique à vontade para enriquecer a discussão”. O
post foi editado posteriormente de modo a incluir comentários dos leitores José
e Paulo Travaglini;
• “O manual do Airbus” (25/7/2007), em que é publicado o link do manual “para
nossos especialistas”;
• “A defesa pósmorte” (1/8/2007), em que embora não nomeie leitores como
interlocutores, é constituído apenas de duas perguntas que, pelo contexto, não
podem ser consideradas apenas como recurso retórico.
Por fim, merece citação o post “O acidente aéreo e o Blog” (15/8/2007), com elogios à
participação dos leitores:
Encontrei minha colega Maria Lídia, da TV Gazeta. Me disse que a cobertura do
acidente, pelo seu jornal, se orientou fundamentalmente pelas análises e informações
que vocês ajudaram a colocar no Blog.
Especialmente o cálculo do peso do avião, preparado pelo Gustavo, que, segundo
ela, deixou todos seus entrevistados da área surpresos, por perceber que ali estava
um dos pontos centrais, que a cobertura da grande mídia não aprofundou.
35
3.5. CONCLUSÃO
John Seely Brown, cientistachefe da Xerox Corp., descreve assim o jornalismo
participativo no livro Elementos do Jornalismo: “Em uma era em qualquer um pode
ser um repórter ou comentarista na Web, caminhamos em direção a um jornalismo
de mão dupla. O jornalista se torna um líder de fóruns ou um mediador, mais do que
simplesmente um professor ou palestrante. O público deixa de ser consumidor para
ser prosumidor, um híbrido de consumidor e produtor”. (KOVAC e ROSENSTIEL,
apud BOWMAN e WILLIS, 2003, p. 9)
Esse jornalismo de mão dupla é o que caracteriza o Blog do Nassif. Embora não
disponha de ferramentas tecnológicas sofisticadas, o relacionamento entre jornalista e leitores
marca essa nova era. Ao convidar textualmente os leitores a participar e pedir ajuda; publicar
comentários na área principal do blog; e fazer elogios aos leitores, Nassif passa de jornalista
professor para jornalistamediador.
Na cobertura do acidente da TAM, são utilizados todos esses mecanismos, tendo como
resultado um material que em alguns aspectos superou em qualidade o produzido pela grande
imprensa. Ele também media a comunidade ao indicar parâmetros gerais de comportamento
nos comentários e ao compartilhar esse trabalho com os leitores – pedindo que reportem
algum comentário fora das regras da casa, por exemplo.
Mesmo sendo um blog individual no Blog do Nassif se verificam pelo menos três das
funções de participação descritas no capítulo anterior: comentário, filtragem e edição e
checagem. A primeira é a mais evidente. Mas se encontra filtragem e edição no envio de links
para textos de outros sites e checagem no trabalho do leitor em relação ao peso do avião.
Além disso, podese afirmar que, devido ao espaço privilegiado destinado à
participação dos leitores, o Blog do Nassif situase a meio caminho entre um site de notícias
independente e um site participativo, de acordo com a classificação de J.D. Lasica,
mencionada no capítulo anterior.
As características do gatewatching também aparecem na cobertura analisada. Um
exemplo bem claro é o convite à consulta a uma fonte, no caso, o manual do Airbus, aeronave
que sofreu o acidente. Isso, como visto anteriormente, torna o processo de edição mais
transparente.
36
É importante ter em consideração que o princípio que move a participação em sites de
notícias é diferente da produção jornalística tradicional.
Tudo se resume a algo de muito simples: os leitores (ou telespectadores ou ouvintes)
sabem mais do que os profissionais dos media. Uma verdade por definição: eles são
muitos e nós, nas mais das vezes, somos um só. Necessitamos de reconhecer o que é
óbvio e, no melhor sentido da palavra, valernos dos conhecimentos deles.
(GILLMOR, 2004, p. 119)
37
BIBLIOGRAFIA
BARROS FILHO, Clóvis. Ética na Comunicação – da informação ao receptor. São Paulo:
Editora Moderna, 1995.
BOWMAN, Shayne e WILLIS, Chris. We Media: How audiences are shaping the future of
news and information. The American Press Institute, 2003. Disponível em
http://www.hypergene.net/wemedia/. Último acesso em 12/12/2008.
BRUNS, Axel. Gatewatching, not gatekeeping: Collaborative online news. Australia:
Media International:, 2003. Disponível em http://eprints.qut.edu.au/archive/00000189/.
Último acesso em 12/12/2008.
BUARQUE DE HOLANDA, Heloísa e GONÇALVES, Marcos Augusto. Cultura e
participação nos anos 60. São Paulo : Brasiliense, 1982.
CASTELLS, Manuel. A era da informação: economia, sociedade e cultura – Volume 1: A
sociedade em rede. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1999.
DÓRIA, Pedro. O blog, o ministro, sua renúncia e uma sociedade melhor. 25/02/2008.
Disponível em http://pedrodoria.com.br/2008/02/25/oblogoministrosuarenunciaeuma
sociedademelhor/. Último acesso em 12/12/2008.
GILLMOR, Dan. Nós, os media. Lisboa: Editorial Presença, 2005.
INDYMEDIA. Welcome to Indymedia. 24/11/1999. Disponível em
http://seattle.indymedia.org/en/1999/11/2.shtml. Último acesso em 12/12/2008.
JOHNSON, Steven. Emergência: a dinâmica de rede em formigas, cérebros, cidades e
softwares. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2003.
38
KUCINSKI, Bernardo. Jornalistas e revolucionários: nos tempos da imprensa alternativa.
São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2003.
LÉVY, Pierre. O que é o virtual. São Paulo: Editora 34, 1996.
____________ Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999.
LUDD, Ned (org.). A Urgência das Ruas: Black Block, Reclaim the Streets e os Dias de
Ação Global. São Paulo: Editora Conrad, 2002.
RHEINGOLD, Howard. The Virtual Community: Homesteading on the Electronic
Frontier. Disponível em www.rheingold.com/vc/book. Último acesso em 12/12/2008.
STONEMAN, Phil. Fanzines: Their Production, Culture and Future. Escócia: University
of Stirling, 2001. Dissertação (mestrado). Disponível em http://www.lundwood.u
net.com/fandissy/fdtitle.html. Último acesso em 12/12/2008.
TECHNORATI. State of the Blogosphere 2008. Disponível em
http://www.technorati.com/blogging/stateoftheblogosphere/. Último acesso em 12/12/2008.
ANEXO I – Excertos do Blog do Nassif sobre mídia e participação dos leitores, publicados entre maio de 2006 e agosto de 2008
30/05/06 09:04
O Blog Depois de algum tempo de resistência, resolvi aderir aos blogs. Em parte, por acreditar que o futuro do jornalismo está na Internet. Em parte, devido à enorme e revitalizante interação com o público leitor. Durante alguns anos, em lugar de temas econômicos, publiquei crônicas na minha coluna de domingo na "Folha". Era uma maneira de trazer à tona uma veia literária de juventude, que o jornalismo tinha contido por alguns anos. Mas também uma forma de passar a mensagem de que um país não se fazia apenas com a vã economia. Havia valores relevantes, que absorvi ao longo da infância e da adolescência, do início da maturidade, que pareciam desaparecidos nessa geléia geral da internacionalização dos anos 90. E havia uma enorme demanda dos leitores por temas dessa natureza. As crônicas me renderam enorme satisfação e um prêmio de finalista do Jabuti, categoria contos e crônicas, com o livro "O Menino de São Benedito". Quando a "Folha", por razões editoriais internas, decidiu suspender a publicação, passei a prospectar a Internet, através de sistemas de mailing, de ferramentas de extração de endereços. E aí e emoção redobrou. Você assistia os e-mails sendo disparados, ía recebendo os retornos, acompanhando os lidos, os não lidos, e o mailing foi sendo enriquecido com pedidos de inclusão que muito me honraram, como os de Ivan Lessa, Jader de Oliveira, Artur da Távola, os incentivos de Moacir Scliar, dentre outros. Apenas uma coisa me incomodava. Com o fim das crônicas na "Folha", perdi os meus "velhinhos", um público mais velho, pouco afeito à Internet, mais chegado ao papel, mas que aquecia meu coração com suas cartas e bilhetes. O formato do Blog será o seguinte: 1. Durante a semana prevalecerão os comentários políticos e econômicos. 2. Nos finais de semana, as crônicas e comentários sobre músicas, além de trechos de livros meus já publicados. Orgulho-me muito do nível de meus leitores. Sempre que levanto um tema polêmico, costumo receber e-mails consistentes, de pessoas com diferentes opiniões. Pretendo abrir espaço para esse tipo de comentário, mais do que para os comentários curtos e impressionistas dos blogs convencionais. Por isso mesmo, quem tiver comentários maiores a fazer, poderá escrever para [email protected] Os melhores serão publicados, dentros dos limites de espaço do blog. O Blog será dividido em quatro categorias principais, o Blog propriamente dito, Crônicas, Minhas Músicas e Livros. Todo o material blogado sairá obrigatorimente na página do Blog. Mas ficará armazenado, inclusive para efeito de pesquisa, nas janelas correspondentes a cada categoria. Em Crônicas pretendo trazer reminiscências, um pouco de historiografia e temas ligados à história da música. Em Minhas Músicas, vou expor pesquisas com músicas marcantes ou com lançamentos de novos autores. Eventualmente, incluirei composições minhas. Em Livros, trechos de livros já publicados, e ensaios de novos livros em que estou trabalhando. Para temas mais complexos, pretendo exercitar um tipo de cobertura já ensaiada em discussões como a da TV Digital e a da transposição das águas do São Francisco. Haverá uma interação com o site do Projeto Brasil (www.projetobr.com.br) e uma explicação didática dos diversos ângulos envolvidos na discussão, assim como a participação de cada ator trazendo seus argumentos, rebatendo os argumentos da parte contrária, tudo no tempo real que a Internet permite praticar. Espero poder cumprir um papel dentro desse espaço precioso que o UOL me abriu.
06/06/06 10:35
Do leitor A venda de dados públicos
Não sou de escrever muito, ainda menos para colunistas ou jornalistas (gente que não conheço em geral).
A indignação me leva no entanto a fazê-lo, pois li a noticia na Folha Online sobre a possibilidade de o governo paulista vender os dados dos cidadãos às empresas privadas.
Uma das diversas conseqüências prejudiciais ao cidadão é, para citar a própria matéria, "uma loja poderá negar um serviço a alguém que já cumpriu pena por algum crime". Ora, isso já configura uma dupla pena. Alguém deve ser julgado por um crime e pagar a pena. Mas divulgar o cadastro e torná-lo acessível a todos (mediante pagamento) seria acrescentar uma outra pena, passível de durar eternamente, à primeira.
Poderia citar outros abusos potenciais, tantos são: uma empresa poderia negar um emprego a um postulante se souber que ele ja entrou com uma ação trabalhista no passado...
Esperando que a reação de todos faça o governo paulista recuar nesse atentado ao direito do cidadão.
Atenciosamente,
Felipe Ribeiro Cunha
22/06/06 22:50
O papel da mídia
Como muitos leitores estão discutindo o papel da mídia, coloco no Blog minha coluna do último domingo na "Folha", sob o título "A Mídia e o Fator Lula".
NO INÍCIO dos anos 90, a inacreditável entrevista de Pedro Collor para a revista "Veja" inaugurou a era de maior poder da mídia, desde o início dos anos 50. Descobriu-se a notícia-espetáculo, os fatos inverossímeis baseados em fontes suspeitas, mas que atendiam à sede de show.Denúncias graves não foram apuradas, denúncias vazias viraram manchete, forçou-se a barra, mas o presidente caiu. Ainda que à custa de um pequeno Fiat Elba.
Seguiu-se um longo período de denúncias inverossímeis, ou interessadas. Criou-se até essa obra-prima do jornalismo ficcional, o "roteiro Frankestein", que consiste em juntar pedaços de notícias verdadeiras, porém irrelevantes, e compor um roteiro com denúncias graves, porém falsas.
Ao longo dos anos 90, esse tipo de jornalismo gerou peças de ficção famosas, como a capa de "Veja" sobre Chico Lopes -segundo a qual o lobista amigo de Lopes, ele e o banco que pagava as informações se comunicavam por meio de três celulares, e o banqueiro Salvatore Cacciolla obtinha as informações por meio do "grampo" dos aparelhos, no dia da mudança de câmbio, o "grampo" falhou, por isso Cacciolla quebrou.
Agora, está-se em plena era da globalização e da internet, com dois fenômenos concomitantes, com implicações relevantes para o futuro das democracias. O primeiro, os
amplos fluxos migratórios para os países centrais, gerando um novo tipo de cidadão-eleitor, as minorias étnicas, cada vez mais atuantes.
O segundo, a internet trazendo, em um primeiro momento, enorme balbúrdia de informações e, principalmente, de opiniões, catarses, espetáculo. Agora, quando esse tipo de recurso freqüenta intermitentemente a internet, as caixas de e-mails, os blogs, os comentários nos blogs, quando o exercício vazio da indignação pode se expressar de várias maneiras, o papel fundamental da grande mídia é o de estabelecer parâmetros.
É esse o diferencial: o aval à informação. Muito mais do que em qualquer outra época, há a necessidade do rigor da apuração, justamente porque existe uma overdose de notícias, boatos e opiniões exigindo o avalista.
Pergunto: estamos preparados para isso? A cobertura dos escândalos do mensalão e pós-mensalão deixa uma enorme dúvida no ar. Havia uma betoneira de denúncias a serem apuradas. Em vez disso, quando esgotou a fase inicial das denúncias, recorreu-se a uma overdose de denúncias sem comprovação, somada a uma incapacidade ampla de ir atrás de pistas consistentes, de entender a complexidade dos grandes golpes, de separar o escândalo de episódios triviais. Em alguns órgãos, juntou-se uma dose de agressividade, desrespeito e preconceito sem paralelo até na campanha do impeachment.
Chega-se ao final de um ciclo, que começou com a campanha do impeachment, que derrubou um presidente, e termina com a do mensalão, que não foi capaz de abalar a popularidade de outro presidente.
O exercício do jornalismo precisa ser urgentemente repensado. E não se trata de um problema de forma. É de fundo, de conteúdo.
22/06/06 19:59
O papel da mídia - 2 Quando topei montar o Blog, sabia de antemão da excelência dos leitores. Agradeço bastante as observações postadas na matéria anterior.
Mas vamos a alguns pontos que não são ainda muito claros. Como muitos leitores observaram, a grande mídia obedece a uma lógica econômico-financeira também. Nos anos 30, Ortega y Gasset já tinha estudos muito interessante sobre esse papel da mídia de massa.
Vamos analisar a notícia, então, como produto. Cada produto, em qualquer campo, pode ter características diversas, inclusive como posicionamento de mercado. Mas possui características intrínsecas, que não podem ser desrespeitadas, sob pena de se perder público.
Há um tipo de jornalismo sensacionalista, há o jornalismo de entretenimento, há o show de TV. No caso do jornalismo de opinião, uma das qualidades intrínsecas é a credibilidade. Não há como fugir disso. Pode-se mudar a natureza, tornar-se um veículo sensacionalista, e disputar o mercado nessa faixa, não na faixa da opinião.
Uma das características da credibilidade é a sobriedade. E aí se entra no nó: como casar credibilidade/sobriedade com a necessidade de vender o produto notícia? Como evitar que não se transforme em algo chato e insosso.
Eu diria que a fórmula é fácil de definir, e difícil de implementar: com talento, com pauta criativa, com rigor na apuração. "Cria" notícias quem não tem fôlego suficiente para
pensar pautas criativas, com texto atraente e enfoques originais.
Por isso mesmo, em plena era da Internet, as armas do jornalismo convencional estão na recuperação do exercício objetivo dos valores jornalísticos.
17/07/06 08:26
O Blog e os leitores
Quem tem bons leitores, não morre pagão. Gostaria de parabenizar os leitores do Blog em geral pelo elevado nível das argumentações, pela aceitação do contraditório, por se praticar a democracia com argumentos, fugindo-se do simplismo, embora o clima de campanha eleitoral às vezes esquente o sangue de um ou de outro. Vocês estão ajudando o Blog a cumprir o papel a que se dispôs: ir contra as unanimidades e o maniqueísmo.
29/08/06 08:50
O jogo da convergência digital
Coluna 30/08/2006
Um dos temas mais instigantes dos próximos anos, especialmente no Brasil, será o papel das novas mídias de opinião, concorrendo com a mídia tradicional. Nos anos 90, em que pesem inúmeros exageros cometidos com a espetacularização da notícia, a mídia brasileira tentava cultivar alguma forma de pluralismo. O desafio era atingir o mais largo espectro de leitores. Havia o esquerdista e o direitista de plantão, e uma cobertura supra-ideológica, cujo maior objetivo era conseguir repetir o feito da derrubada de um segundo presidente. Fernando Henrique Cardoso foi alvo dessas tentativas. Mas, a não ser na cobertura financeira e seu falso viés técnico, não havia um componente ideológico, apenas compromisso com o show. Calhava da esquerda petista e seus procuradores fornecerem o roteiro para o show.
Esse modelo prosseguiu com o atual governo, a partir do episódio Waldomiro Diniz. Mas a campanha contra Lula foi um divisor de águas por várias razões. A maior de todas é não ter conseguido nem derrubar nem afetar a popularidade do presidente fora do campo da opinião média midiática. É o fim de um ciclo de prestígio da mídia tradicional, que começou com a campanha das diretas e atingiu seu auge com a queda de Collor.
Havia denúncias graves a serem apuradas, é fato, mas a mídia cedeu a uma radicalização cada vez maior. O movimento do pêndulo saiu da diversidade anterior para uma gradativa homogeneização da análise, se deslocando para a direita. Mais que isso, assumindo um profundo corte ideológico que, não raras vezes, enveredou pelo preconceito social -em que pese, repito, a gravidade evidente de muitas das denúncias—com um viés de intolerância em alguns veículos impossível de se sustentar ao longo do tempo: cansa o leitor, esgota.
À medida que a campanha contra Lula avançava --e ele resistia--, criou-se um jogo de braço com perdas para todos os lados. Perdeu o governo Lula, pela resistência radical que passou a provocar na opinião média midiática, perdeu mais ainda a mídia em geral, por ter comprometido a diversidade de pensamento e a objetividade das apurações e
análises. A homogeneização do pensamento acabou deixando ao relento fatias importantes do público, do leitor intelectualmente mais exigente àquele cujas preferências políticas deixaram de ser contempladas pelo conjunto da mídia.
Todo esse quadro se formou no momento em que a proliferação de blogs, na Internet, criou novos espaços de opinião. Antes, tinha-se o jornal dando a visibilidade a seus colunistas, emprestando parte de seu prestígio e recebendo, de volta, a agregação de mais leitores e prestígio. Com os blogs, o aval não é mais do jornal, mas é individual, do blogueiro.
Os blogs são apenas a parte mais visível de um processo de criação de novos centros de opinião, como grupos de discussão, fóruns, ONGs. E novos atores de peso entrando no jogo, como as empresas de telefonia e os portais.
Nos próximos anos, a mídia brasileira passará pelas maiores transformações da sua história. Os jornais que entenderem o processo continuarão no jogo.
25/09/06 13:13
Despedida
Pessoal,
Encerro, agora, minha parceria com a UOL.
A partir de amanha estarei de casa nova. Gostaria de agradecer a equipe da Marion, sempre prestativa, profissional, com um senso de camaradagem e de equipe raros nos dias de hoje.
Quem quiser continuar acessando o Blog, clique em www.luisnassif.com.br. A partir de amanhã estará com um novo direcionamento, mas com o mesmo layout e divisão temática. Muda apenas a hospedagem.
PS -- Alguns leitores indagam se a saída tem algo a ver com artigos que escrevi. De forma alguma. Os Blogs são individuais, disponíveis a todos os assinantes da UOL. Nunca houve nenhuma pressão aqui, na UOL. A mudança tem a ver com projetos profissionais e a decisão foi comunicada à UOL há duas semanas.
29/09/06 15:05
Conhecimento em rede
Pessoal,
se quiserem conhecer de perto o poder fantástico do trabalho em rede, especialmente nas redes de conhecimento, dêem uma clicada na aba ECONOMIA e leiam os comentários colocados no post sobre a fruticultura de Petrolina.
Como jornalista, não tinha a menor idéia sobre os problemas apontados pelos leitores. Clique aqui
24/10/06 07:00
A nova era da comunicação Na aba ECONOMIA a Coluna Econômica analisando a nova era dos blogs, e o divisor de águas na mídia: o episódio das fotos do dinheiro do dossiê.
28/10/06 09:08
Toc toc Aqueles dois enxames de abelhas africanas que invadiram o blog depois do debate já se foram? Posso entrar sem risco?
Então proponho aprofundarmos o debate sobre essa questão da Amazônia, que me pareceu um tema muito interessante. E, sem eleição açulando as abelhas, ficará mais fácil retomar o espírito original do Blog.
Adendo
Por absoluta exaustão com as abelhas africanas -- os dois grupos de skinheads da política que invadiram o Blog ontem -- vou tomar a liberdade de vetar os comentários partidários. Precisamos despoluir a Amazônia e o blog.
03/11/06 15:44
O Estatuto da Gafieira Minha colega Eliane Cantanhede se ofendeu com e-mails abusivos que recebeu, com ofensas de toda ordem.
É um abuso, de fato. Mas não é conveniente partidarizar os ofensores, nem julgar que as ofensas façam parte de um processo de "vilanização" da mídia.
Conforme se poderá conferir nos comentários colocados nos posts sobre o debate, havia um clima exacerbado e generalizado de torcida organizada. As ofensas saíam de partidários do PT e do PSDB, em doses iguais. E olha que bloqueei muitos comentários, inclusive com ofensas contra colegas jornalistas.
Esse pessoal não pode ser colocado na categoria de petistas ou tucanos. Eles têm o mesmo nível das torcidas organizadas futebolistas. Alguns estão em processo de aprendizado político e democrático -- um dia aprendem. Outros, estão contaminados pelo clima de radicalização. Todos estão se esbaldando com essa segunda explosão da Internet.
Ë questão de tempo para que amadureçam ou sejam enquadrados. Como em toda comunidade que se forma, no início é o caos. Depois, entram as regras tácitas ou explícitas. Quem desobedece acaba sendo expelido pelo próprio grupo.
07/11/06 23:16
Projeto Brasil Esta noite houve o jantar de lançamento do Projeto Brasil 2007. O jantar reuniu um grupo de empresas e instituições parceiras.
Foram definidos os principais temas que serão desenvolvidos, assim como as ferramentas que, em breve, serão implantadas aqui, para facilitar a participação dos leitores.
No jantar comuniquei aos convidados que a qualidade dos leitores do Blog era garantia mais que suficiente de discussões de alto nível.
Entre as instituições parceiras, estão a Cepal, a Escola de Economia da FGV-SP, a GV-Law, a Unicamp como um todo, o Instituto de Economia da UFRJ, a Fundação Nacional da Qualidade e a Apex.
11/11/06 10:07
A mídia e os direitos fundamentais No meu livro "O Jornalismo dos anos 90" abordo dezenas de episódios em que a mídia atropelou os direitos mais comezinhos de vítimas de arbitrariedades policiais e do Ministério Público, que se associou a chantagistas para divulgar dossiês incriminatórios contra adversários, que desrespeitou sigilo fiscal, telefônico e pessoal de pessoas, expondo-as a manchetes e capas, sem comprovação do crime.
Contei o caso da filha de Chico Lopes, cujo computador pessoal foi apreendido pela Polícia Federal, o grampo no BNDES, a loucura do dossiê Cayman, em que se deu aval a uma falsificação evidente e grosseira, ao vazamento de contas telefônicas sigilosas na CPI dos Precatórios.
Quando a "Folha" comemorou 80 anos, participei de uma mesa redonda com colegas do jornal. Nela, se enaltecia o papel da mídia pelo fato de, no dia anterior, um senador da República, Jader Barbalho, ter sido algemado pela PF. Questionei o ato. Disse que quando se avalizava uma arbitrariedade dessa ordem contra um senador da República, mesmo com o passado e a má reputação de Jader, estava se investindo contra direitos individuais básicos, e dando autorização para o delegado de periferia usar o pau-de-arara.
Perguntei, na ocasião, se o compromisso da mídia era dar tudo o que o leitor queria, ou ser a guardiã de valores da civilização, mesmo em um país onde direitos individuais são tão pouco considerados.
Digo que sempre fui minoria nessas discussões. Cada vez que se desrespeitavam os direitos de qualquer pessoa, classe média para cima, vinha a cantilena de que se o pobre tinha o direito desrespeitado, porque essa preocupação com os direitos dos ricos. Ou seja, buscava-se a igualdade na uniformização do desrespeito.
A questão do desrespeito aos direitos básicos foi sempre uma constante nas publicações desde a campanha do impeachment. Grampos foram utilizados despudoradamente, assim como dossiês. E digo despudoradamente porque, muitas vezes, se destacavam frases sem nenhum significado, e a publicação adicionava as interpretações que queria sobre outras partes do grampo que, não sendo divulgadas, impediam o leitor de conferir
sua veracidade.
Por tudo isso, não há o menor sentido nesse carnaval em torno do fato de dois telefones da "Folha" terem ido parar no inquérito da compra do dossiê. Está claríssimo, para qualquer leitor inteligente, que entraram exclusivamente devido ao fato de constarem no telefone de um dos suspeitos.
A seguir, dois dos capítulos do livro. Sugiro que leiam à luz do que foi a mídia nos últimos anos. O livro era crítico em relação aos anos 90, mas terminava com uma visão otimista, de que a única saída da mídia seria aprimorar-se, porque os leitores seriam cada vez mais exigentes e não aceitariam carne de terceira.
O uso dos grampos e dossiês
Um dos piores recursos utilizados para esquentamento de notícias foi o uso indiscriminado dos dossiês. Dessa facilidade se aproveitaram alguns dos piores chantagistas da República, tanto para jogadas políticas quanto comerciais.
Partia-se de um ato criminoso, o grampo, e -pior— conferia-se ao dossiê do chantagista mais valor do que a um processo jurídico. Passava-se ao leitor a impressão de que, por ter sido obtido de modo clandestino, tudo o que o grampo revelava era verdadeiro.
Os principais estratagemas para "esquentar" grampos eram os seguintes:
Frases fora do contexto - A conversa telefônica informal é basicamente coloquial. Experimente analisar uma conversa sua, ao telefone, e, depois, levantar a quantidade de declarações que, tiradas do contexto, podem dar margem a interpretações dúbias. O que se fazia era mencionar trechos da conversa e, depois, o chantagista, através do repórter, tirar suas próprias conclusões e tentar induzir o leitor.
O ápice dessa manipulação foi o "grampo" em cima de um dos irmãos Bragança - tido como homem do ex-presidente do Banco Central Chico Lopes - em que ele dizia que "a reunião foi desmarcada". E o repórter concluía - sem uma prova sequer - que a "reunião" só poderia ser a do Banco Central, onde se deliberaria sobre eventuais mudanças no câmbio.
Outro caso clássico foi o das centenas de horas de gravação da Polícia Federal em cima de suspeitos de escândalos da Sudene. A reportagem era rica em adjetivos que descreviam as transcrições - "chocante", "inacreditável". Mas a transcrição das principais passagens mostrava declarações pífias. Os esquemas existiam, eram pesados. Mas nada justificava os atentados que se cometeram contra a objetividade jornalística.
Estratagema semelhante - de manipulação de frases em conversas "grampeadas" -- foi tentado na disputa Ambev x Kaiser, em cima de um grampo sobre o advogado Airton Soares. O episódio foi desmascarado a tempo.
A fonte secundária -- Outra jogada usual era o "grampo" em cima de uma pessoa, em geral suspeita, onde ela mencionava relações com pessoas do governo. Não se ia conferir se a pessoa tinha acesso à fonte mencionada, ou se simplesmente se se valorizava perante o interlocutor. Um bandido conversava com outro bandido sobre um terceiro personagem ao qual ele sequer tinha acesso. Era suficiente para se considerar a conversa como definitiva
O caso da compra de votos para a reeleição foi típico. Houve o grampo em cima de um político secundário, que dizia ter sido convencido pelo governador Amazonino Mendes a votar pela reeleição. Ele supunha que a razão do interesse do governador fosse o "dinheiro do Sérgio Motta".
Era evidente que a forma de cooptação política não era a mala preta levada na calada da noite para Manaus, mas verbas liberadas legalmente através do orçamento nas mãos dos
aliados políticos - uma prática fisiológica condenável, mas que nada tinha a ver com a maneira com que se embrulhou a denúncia.
A denúncia foi importante para combater as práticas fisiológicas, mas sua premiação foi um dos principais estímulos ao uso indiscriminado pela mídia de práticas criminosas, como grampos e dossiês.
A verdade parcial - Recurso bastante utilizado no dossiê Cayman, ou na cobertura do caso Chico Lopes, era juntar um conjunto de fatos, alguns não apenas inverídicos como inverossímeis, e outros reais, porém secundários. A partir destes, concluir que o conjunto era real.
Nesse episódio tinha-se um caso real - a conta aberta no banco de Cayman. Não se sabia de quem era, quem movimentava os recursos e quanto recurso era movimentado. Podia simplesmente ser uma conta aberta pelo chantagista para armar a jogada, podia ser uma conta real. Pouco importava. Em torno de um fato verdadeiro e não conclusivo - a existência da conta - se armou toda a ficção.
O caso Chico Lopes foi um clássico de ficção também. Tinham-se duas informações: o número da conta do banco Pactual em Nova York e três números de celulares que pertenceriam a Bragança, o amigo de Lopes. Em cima dessas informações criou-se a história de que a conta do Pactual era utilizada para pagar Chico Lopes, e os três celulares eram utilizados por Bragança para poder trocar informações com Chico sem ser grampeado.
Na verdade, o número da conta era apenas o número de registro do banco em Nova York. E os números dos três celulares constavam da declaração de renda de Bragança. Essa informação jamais foi divulgada, depois que a denúncia saiu na "Veja", apesar de cartas enviadas para lá por acusados.
Manual de Sobrevivência
Preparei um Manual de Sobrevivência na Selva, com algumas indicações simples e óbvias sobre como se precaver contra as falsas matérias.
Dossiê Cayman, reportagens sobre Chico Lopes, armação em torno do depoimento da conselheira do Cade (Conselho Administrativo de Direito Econômico) Hebe Tolosa na Polícia Federal, o sujeito que se dizia lobista do diretor-geral da Agência Nacional de Petróleo (que, depois, descobriu-se que era meio desequilibrado), todos esses fatos comprovam que não há mais o menor controle de qualidade na produção jornalística como um todo.
Conhecimento
Parte dos leitores tende a considerar que tudo sai em letra impressa é, por princípio, verdadeiro. Um pouco de ceticismo não faria mal. Tipo, toda denúncia é por princípio falsa, a menos que apresentem provas de que é verdadeira. Trata-se de princípio básico de direito, que reza que o acusador tem o ônus da prova.
Verossimilhança
É o critério inicial básico para se avaliar uma matéria: conferir se tem lógica. Se a denúncia diz que o sujeito que quebrou recebia do presidente do BC informações privilegiadas sobre o câmbio, a denúncia não tem lógica: se recebesse, teria enriquecido e não quebrado. Da mesma maneira, supor que quatro políticos, sem afinidades pessoais entre si, pudessem abrir uma conta conjunta, e batizá-la com suas iniciais é algo tão extravagante que deveria desqualificar a denúncia no seu nascedouro.
Evidências
Há denúncias que vêm acompanhadas de provas, outras que apresentam meras conclusões. O repórter que chegou à determinada conclusão, mesmo que não revele a fonte ou não disponha de provas, tem por obrigação revelar todos os elementos que lhe permitiram concluir. Quem tem elementos, apresenta. Quem não apresenta, é porque não tem. Se não pode apresentar testemunhas, o repórter tem, no mínimo, que apresentar fatos, circunstâncias, detalhes que lhe foram contados, para que o leitor possa avaliar se a suposição tem base ou se é chute. Se não apresentar, é chute.
Fitas
Não acredite no jornalista que, ao mencionar determinadas gravações, use adjetivos tonitruantes para qualificá-las ("explosivas", "impactantes"), mas não mostre nem a cobra nem o pau. Só acredite nos trechos entre aspas, e só acredite naquilo que você está lendo. Se o trecho mencionado não significar nada para você, é porque não tem significado algum mesmo. Qualquer conclusão que a matéria apresente, que não for aquela que você pode tirar objetivamente da frase entre aspas, é cascata. Se os trechos do "grampo" que foram publicados não tiverem importância, é porque o que não foi publicado tem menos importância ainda.
17/11/06 15:10
O acidente da Gol Estou juntando várias informações deixadas por leitores há um mês, quando abrimos aqui as discussões sobre o acidente da Gol. Algumas, só apareceram hoje na cobertura dos jornais.
Daqui a pouco apresento os dados dessa fantástico trabalho em rede possibilitado pela Internet.
27/11/06 08:47
Livro em rede Pessoal,
no primeiro balanço de contribuições ao livro, posso dizer que estão confirmadas todas as minhas expectativas de que o conhecimento difuso de que o país dispõe hoje em dia é amplo, rico, e não captado pelos canais convencionais da mídia. As contribuições ao blog foram excelentes.
Muito obrigado, e o livro continua.
07/12/06 17:47
A (i)lógica do Copom
Na aba de ECONOMIA, uma contribuição preciosa de um leitor não-economista para a mandracaria das atas do COPOM.
16/12/06 12:18
A rede venceu Há uns dez anos, o Reinaldo, um japonesinho gênio, meu guru para a área de informática, veio me contar a grande nova: uma tecnologia desenvolvida pela Citryx, empresa americana, que permitia que, a partir de um servidor - local ou remoto - baixar programas até em máquinas XT, e rodar usando a memória do servidor. Me dizia ele: "Essa tecnologia mudará a história da Internet".
Demorou, mas esse dia chegou com a maturidade da Web 2. E pergunto, como ficará a Microsoft nisso?
Primeiro, a Microsoft tinha a vantagem de dominar o sistema operacional, primeiro o DOS, depois o Windows. Utilizou essa vantagem cometendo toda sorte de abusos, não abrindo os códigos para os concorrentes. Com essa manobra, conseguiu alijar todos os grandes desenvolvedores de aplicativos da era DOS, a Boreland e seu Quatro Pro, o Wordperfect, a Lótus e seu 123, o Wordstar, o Visicalc, o Supercalc, e tantos outros programas que fizeram história.
Quando os concorrentes começaram a aprender a atuar, ela se prevaleceu do controle sobre os formatos hegemônicos. Eu podia gostar do Amipro ou do Smartsuite, mas não usava porque não conseguia falar com o Word e o Excel.
Quando a padronização avançou e os concorrentes desenvolveram interfaces para ler os programas do Office, a Microsoft passou a se valer da integração com seus sistemas de rede. E aí se revelou o gênio de Bill Gates.
Lá atrás, quando começou a era da micro-informática, além do sistema operacional a Microsoft avançou na tecnologia de redes (matando a Novell), nos bancos de dados (conquistando nichos de pequenas e médias empresas), no navegador (matando o Netscape), e outros sistemas de infra-estrutura. E essa integração entre Exchange, SQL, depois o Sharepoint garantia uma sobrevida à família Office e ao Windows - ainda os carros chefe da companhia.
Esse momento acabou, e Bill Gates se aposentou. A rede avançou, amadureceu, definiu critérios de padronização e confirmou a predição do jovem desenvolvedor do Netscape, que sonhava que, a partir dos navegadores, acabaria o predomínio do Windows como sistema operacional e do Office como aplicativo.
A partir do navegador, em setores de larga abrangência - como pesquisa, email e aplicativos - os concorrentes chegaram com uma tecnologia superior, recuperando os valores da simplicidade (que a Microsoft perdeu, criando programas cada vez mais complexos e funcionalidades cada vez menos essenciais) e um modelo de negócios muito mais eficiente, conquistaram os novos mercados. Qual o melhor buscador do meu desktop com sistema operacional Windows? O Google. Qual o melhor buscador dos meus e-mails que ficam no Outlook? O Google.
Ao mesmo tempo, o trabalho em rede, que já se consagrara no desenvolvimento do sistema operacional Linux, ganhou a maturidade com o extraordinário Firefox e o Thunderbird. Os aplicativos da web encontraram sua linguagem universal no Java, da Sun. Os aplicativos explodiram depois que a Sun colocou o Staroffice à disposição da comunidade. Agora, o próprio Google começa a oferecer os aplicativos virtuais, que
podem ser baixados gratuitamente através da Internet. O Linux avança em desktops. E se tem a oportunidade, pela primeira vez, da massificação do mais perfeito sistema operacional da era dos PCs, o da Apple.
A Microsoft tenta avançar em todas essas frentes. Lançou o bom Live Messanger, tem o Hotmail. Mas não há mais os ganhos de sinergia. Agora, cada produto desses tem um CEO à frente. Só que, em cada frente, há um projeto de Bill Gates dirigindo cada concorrente.
A rede venceu.
A discussão está ótima e as informações são preciosas. Mas alguns leitores observam que o Blog não é de especialistas. Por isso solicito aos nossos especialistas que procurem empregar uma linguagem mais didática e menos técnica, para que todos (inclusive eu) possamos aproveitar melhor esse conhecimento.
27/12/06 10:10
MBAs, headhunters e TAM O caso TAM propiciou uma boa discussão, nos comentários, sobre as distorções desses cursos de MBA e do papel dos "headhunters" (empresas de colocação de executivos).
Quem quiser poderá conferir nos comentários dos posts sobre a TAM. Amanhã vamos ampliar esse debate, que é atualíssimo.
09/01/07 10:34
A discussão sobre o YouTube Pessoal,
parabéns pela discussão sobre o caso YouTube. Apesar de ser um assunto que está pegando fogo, em sua maioria absoluta (os 120 primeiros comentários que li), são análises de nível civilizado, com ótimos argumentos de lado a lado. Até as "abelhas" que ocasionamente invadem o Blog se renderam ao bom nível da discussão em que vocês se empenharam.
Creio que temos, ali, ótima matéria prima para discutir um dos grandes temas emergentes: a privacidade, o Estado nacional e os provedores de conteúdo da rede.
02/02/08 15:44
A Abril se manifesta
A Editora Abril enviou carta ao iG, respondendo à série que estou publicando. Reproduzo aqui a carta (que o iG posta no Último Segundo):
“ A EDITORA ABRIL, responsável pela publicação da revista VEJA, repudia veementemente
as informações divulgadas no blog do jornalista Luis Nassif nos dias 18.12.2007, 10.01 e 11.01.2008.
Ao contrário do que quer fazer crer Luis Nassif, o jornalismo praticado pela revista Veja jamais esteve mancomunado com os interesses alheios à postura adequada de órgão informativo ético. A revista Veja sempre postou-se pelo exercício de um jornalismo honesto, sério e imparcial, portanto, bastante contrário às acusações descabidas de Nassif.”
Resposta - Em vez de repudiar, faria melhor a Abril em analisar mais detidamente os fatos narrados.
Solicito aos comentaristas que se abstenham de comentários neste post especificamente, já que o direito de resposta é sagrado.
05/02/07 16:23
Estatuto da gafieira Pessoal,
Para aqueles que estão chegando agora, algumas regras de conduta do Blog, já que até as gafieiras têm estatutos:
1. Há alguns elementos desequilibrados que volta e meia azucrinam o Blog. Em particular, um professor de exatas da Unicamp que passou meses perturbando, entrando com codinomes variados. Quando descrevi o perfil do perfeito desequilibrado das salas de chat, ele se identificou com o retrato e passou a enviar e-mails com ameaças físicas. Decidi poupá-lo de um BO ou de revelar sua identidade pública (já que ele assume os vários personagens que cria) com a condição de que parasse de azucrinar. Agora ele está de volta.
2. A presença desses elementos impõe uma regra. Críticas pesadas contra terceiros continuarão a não ser aceitas. Contra o blogueiro (desde que não contenham elementos de injúria, calúnia ou difamação) serão aceitas, mas desde que o comentarista se identifique. Só faltava abrir um espaço democrático para receber porradas de anônimos.
3. O clima do blog está o melhor possível. Começa a haver diversidade maior de opiniões, e uma civilidade exemplar entre pessoas que pensam de forma diferente. Como existem vários blogs que até usam como matéria prima a guerra santa entre torcidas políticas, que tal os poucos briguentos irem brigar por lá, e depois de saciados, voltarem para discutir em alto nível por aqui? Não é uma boa proposta? Tem uns briguentos bons de argumentos que, quando passarem a recorrer só aos argumentos, vão ajudar bastante na discussão.
23/02/07 23:46
A comunidade do Blog
Hoje fui dar uma palestra para os 600 participantes do encontro anual do INDG, a consultoria de qualidade dos professores Falconi e Godoy. Inclusive com show após a palestra.
Fiquei feliz de encontrar vários integrantes do Blog. Essa interatividade, realmente, cria uma afinidade impossível na relação estática de colunista e leitor de jornal.
20/03/07 12:20
Trivial variado Pessoal,
como muitos utilizam alguns posts para mensagens off-topics, que nada tem a ver com o assunto, vou postar todo dia uma nota especial para tal tipo de mensagem. Podem deixar aqui seus off-topics.
21/03/07 20:52
O sistema Projeto Brasil Amigos,
Hoje fizemos os penúltimos testes do novo sistema do Projeto Brasil que entrará brevemente no ar. Está uma lindeza, trabalho de craque da Facilit, rapaziada do Porto Digital de Pernambuco.
A idéia será montar a primeira plataforma aberta de discussão de políticas públicas.
As ferramentas serão as seguintes:
1. O site permitindo a montagem de comunidades e trabalho colaborativo. Estarão disponíveis dezenas e dezenas de trabalhos, apresentações, PDFs sobre os mais diversos temas de políticas públicas.
2. Haverá um Fórum de Discussão estruturado, em que os leitores cadastrados poderão participar com comentários, artigos e trabalhos. Os leitores com mais colaborações terão uma área própria, onde poderão colocar seu perfil, fazer upload de seus trabalhos e artigos.
3. Cada fórum de discussão terá um documento wiki associado, com uma espécie de ata das conclusões a que se for chegando. Esse conjunto constituirá o WikiPB, com todas as informações consolidadas permanentes do Projeto.
4. Haverá uma ferramenta chamada Painel de Controle, que permitirá listar projetos públicos por atividade, com prazo e responsável. Com a ajuda de vocês montaremos um monitoramento porreta das promessas de governos.
5. O Fórum será linkado ao Blog, de tal maneira que os comentários maiores e mais consistentes serão transferidos para o Fórum, para permitir aprofundar a discussão.
Tem mais ferramentas, que oportunamente divulgarei aqui.
30/05/07 01:09
A blogosfera Agradeço o empenho de vocês na votação da revista Imprensa .
Mas do que o resultado em si, tem sido importante para mostrar a relevância do instrumento Blog dentro do universo da mídia em geral.
Até agora, 2.508 votos dados à categoria, a todos os candidatos, muito mais do que a votação de todas as demais categorias. Apesar de ser permitido repetir o voto a cada dia, a assiduidade dos votantes é sinal claro da afinidade que se cria na comunidade que se forma em torno de um Blog.
A beleza da história é que essa afinidade está permitindo montar uma comunidade que pensa de forma diversificada, com várias competências somando esforços e praticando diariamente a pluralidade e a tolerância.
30/05/07 10:31
A diversidade nos blogs Enviado por: Paulo de Freitas Dia
Nassif,
Eu mesmo sou a prova viva da importância dos blogs na diversificação e disseminação das diversas correntes de opinião.
Sou um eleitor histórico do PDSB, principalmente do Serra. Era um daqueles indignados com o governo Lula, após as crises que estouraram no primeiro governo. Embarquei naquela história de que era o governo mais corrupto, de que o bolsa família era não mais que um programa assistencialista, que o Lula era um populista de marca maior, manipulador dos pobres...etc. Enfim, toda aquela campanha irracional que irrompeu em meados de 2005.
Ano passado comecei acompanhar seu blog, pois era seu leitor na Folha. Logo em seguida os blogs do Mino Carta e Paulo Henrique Amorim. Foi então que comecei a ter a outra versão dos fatos. Principalmente baseado nas análises extremamente equilibradas que você faz neste espaço.
Para mim os mitos foram caindo. Por exemplo, o mito de gestor eficiente concedido ao Alckimin. Mito esse denunciado por você como falso. E os fatos (segurança, educação, febem, metrô) corroboraram o que você vinha antecipando.
Hoje tenho (ou pelo menos penso ter...rs) uma visão muito mais equilibrada e menos maniqueísta do cenário político brasileiro. E freqüento blogs dos mais variados matizes (desde Zé Dirceu até Reinaldo Azevedo e os podcasts do Mainardi).
Continuo um eleitor do PSDB, mas muito mais crítico e racional, tanto ao PSDB quanto ao governo Lula. Arrisco dizer que esse segundo governo Lula começou muito mais pró-ativo do que o segundo governo FHC, e mesmo com as barbeiragens na política econômica, deixará um legado mais positivo.
É engraçado quando comparo minha visão atual com familiares ou amigos que se
informam apenas pelas mídias tradicionais. Eles não fazem idéia da riqueza, da diversidade e profundidade dos temas tratados nos blogs. E como esse instrumento nos ajuda a vislumbrar as mais variadas questões pelos mais variados ângulos.
P.S: acompanho seu blog desde o primeiro dia, lá no UOL. E digo feliz que nunca fiz parte das "abelhas assassinas". O bom combate resulta sempre de boas argumentações, em detrimento de baixarias e ofensas pessoais.
05/06/07 00:52
Novo portal do Projeto Brasil Prezados amigos,
depois de um longo tempo, de passar por vários desenvolvedores que nos deixaram na mão, está finalmente pronto o novo sistema do Projeto Brasil (www.projetobr.com.br).
Parte do sistema está no ar. Esta semana passaremos fazendo os últimos ajustes. Será possível criar comunidades de discussão, participar dos fóruns de discussão, enviar artigos, trabalhos, baixar apresentações.
O sistema terá as seguintes ferramentas:
1. Blog (vai entrar no ar até o final de semana) integrado com o fórum de discussões, de maneira a automatizar o envio para o fórum dos comentários de maior fôlego.
2. Fórum de discussões, permitindo deixar arquivos para download e permitindo que os leitores façam upload de artigos e trabalhos.
3. Documento wiki, que será desenvolvido à medida que os fóruns vão levando a conclusões.
4. Painel de controle: ferramenta que permitirá identificar projetos de governo e listar tarefas, prazos e responsáveis.
Para participar do Projeto Brasil há dois caminhos:
1. Individualmente, basta entrar no endereço e se cadastrar, cadastro simples, com nome e email. Até o final da semana será disponibilizada uma área para cada cadastrado, onde estarão armazenadas todas suas contribuições.
2. Comunidade. Você poderá juntar um grupo de pessoas em torno de determinado tema, montar uma discussão restrita ao grupo, e depois postar para os demais usuários as conclusões.
Esta semana e a próxima serão de ajuste. Por isso convido vocês a se cadastrarem e ajudarem nas sugestões para o aprimoramento do sistema.
Endereços:
Para cadastro.
Fórum sobre biocombustíveis.
Mapa da Burocracia, incorporando os comentários que vocês postaram naquela nota estimulando o levantamento das obrigações burocráticas inúteis.
Gestão das Universidades Públicas, em cima dos comentários sobre indicadores de gestão nas universidades.
Experimente, e depois passe sua avaliação para darmos os retoques finais no portal.
17/06/07 13:47
Convivência democrática Pessoal,
o Blog está com uma diversidade ótima. Bons debatedores com pontos de vista divergentes, boas informações e análises.
Às vezes o clima esquenta e, sem perceber, enveredam pelas brigas e ataques pessoais. Já temos exemplos de sobra da pocilga em que se transformam Blogs assim, ou quando coordenados por blogueiros desequilibrados, ou quando o próprio grupo não dá uma parada para respirar e voltar ao normal.
Por isso, pé na tábua, ênfase nos argumentos, mas respeito pela diversidade e amistosidade.
28/06/07 00:19
O Blog e os temas complexos Boa discussão sobre os agressores da moça no Rio.
Reparem: a única coisa que escrevi foi que o pai de um criminoso tem o direito, como pai, de se condoer da situação do filho. Em dois trechos salientei que não estava defendendo os agressores. Porque salientei? Para ressaltar o óbvio mesmo sabendo, de antemão, que em momentos de catarse nem o óbvio reiterado é aceito.
Mas é importante uma reflexão sobre essa profícua discussão.
Na morte do menino João, por exemplo, analisando os antecedentes dos assassinos, coloquei aqui a hipótese de que foi muito mais uma tragédia, depois de uma tentativa de assalto, do que fruto de uma mente criminosa. Crime? Crime. Mas de uma natureza menos drástica do que se fosse manifestação clara de premeditação e crueldade.
O post foi invadido por um grupo de indignados, com as ilações mais loucas possíveis. Eu estaria defendendo os criminosos apenas porque eram pobres e eu seria lulista adversário da classe média. Há muito já desisti de entender essas relações e causalidade invocadas nessas discussões, em que se politiza até cartilha de orientação sexual.
Agora se tem um quadro oposto. Não defendi os rapazes e nem poderia. Espancar uma mulher humilde não é defensável. Como há uma unanimidade em torno do caso, se quisesse ganhar aplausos fáceis faria como alguns colegas meus e estimularia a catarse. Quem pode ser contra quem defende a punição exemplar de quatro filhinhos de papai que bateram em uma empregada doméstica?
De que adiantaria? Colheria aplausos, insuflaria ainda mais o espírito de vingança e o que nós todos ganharíamos em termos de informação, de opiniões divergentes? Nada. Daí a provocação de defender o direito do pai de... prantear a tragédia provocada pelo filho. O mínimo! Não defendi a libertação dos agressores, não minimizei o episódio, não julguei o pai, não pretendi dar aulas de como ser pai. Defendi o seu direito de prantear a atitude de um filho que cometeu um crime. O direito ao luto. Não pode porque é de classe média.
Releiam os comentários. Dá para entender o clima maluco em que nosso país se meteu, com acusações políticas a torto e a direito, desqualificação de quem pensa de forma diferente?
Meus amigos freqüentadores habituais do Blog criticaram minha posição mas encararam de forma democrática. Mas porque temos um histórico de relacionamento. Alguns que acabaram de chegar entraram chutando a porta. Porque não temos relacionamento ainda.
Um dos inicialmente agressivos, o Rogério K, depois de uma discussão com o Weden, entendeu o espírito da comunidade do Blog, e mudou o comportamento.
Reparem a responsabilidade que paira sobre os ombros do bloguista. Pode-se induzir o blog a entrar em baixaria ampla, ou podem-se definir regras que permitem a convivência civilizada.
Felizmente, temos aqui no Blog um pessoal de alto nível e um ambiente de troca civilizada de idéias.
Mesmo na divergência, em um tema complexo como o que coloquei, conseguimos ir até o final com um mínimo de baixaria.
03/07/07 23:19
Os modelos de Estado Os leitores do Blog usam o anonimato não para atacar, desqualificar, difamar, espalhar escatologia e ofensas. É para ensinar. Não é uma maravilha?
Aproveitem as ótimas lições anônimas.
Enviado por: Outro economista
Nassif, para dar solidez teórica e empírica ao seu ótimo comentário, sugiro a leitura do livro de Peter Hall & David Soskice, Varieties of Capitalism. Oxford, 2001.
Grosso modo, as análises conduzidas por esses autores enfocam as diversidades do ambiente institucional que condiciona, contorna e suporta os comportamentos dos agentes econômicos e suas interações estratégicas.
Assim, argumentam que as nações prosperam não por se tornarem similares, mas por construírem suas "vantagens institucionais comparativas". As análises classificam dois tipos ideais de economia de mercado: liberal e coordenada. Entre as nações do primeiro tipo encontram-se os países anglo-saxões, como os EUA, o Reino Unido, Austrália, entre as do tipo coordenado estão a Alemanha, a França e o Japão.
No modelo liberal o mercado media a relação entre os atores, num contexto de competição, no modelo coordenado, o apoio institucional é permanente suportando a interação estratégica, a colaboração e a complementaridade. Vale a pena conhecer para
dissolver o pensamento único, mostrando que existem outras alternativas para o desenvolvimento socioeconômico para o Brasil se inspirar (e não copiar).
Enviado por: Filosofo
Caro Nassif,
Mais ou menos na linha do teu post, há interessante obra de Maria Lucia Teixeira Werneck Vianna (êta nome grande) que identifica dois modelos teóricos sobre a forma de influência no processo de formação da vontade política quando da elaboração das políticas públicas previdenciárias. O primeiro, europeu, é o "neocorporativismo", reflexo do chamado corporativismo societal, que surge a partir das mudanças ocorridas nos sistemas de seguridade feitos na década de 1970.
Nele, há uma negociação generalizada entre Estado e representantes do Capital e do Trabalho, em instâncias governamentais nas quais participam sindicatos fortes, que também controlam a atuação Estatal. Neste processo, o Estado cede parte de sua autoridade decisória numa relação negociada com grupos representativos. O segundo modelo de influência é o "lobbying" norte-americano, no qual a estratégia legislativa decorre da competição entre interesses individuais e fragmentados das inúmeras facções da sociedade.
Há uma multiplicidade de canais de acesso às decisões governamentais através dos lobistas. Ela defende a tese de que o modelo brasileiro migrou do sistema neocorporativo, com sistemas de integração negociada, para o de "lobbying", com competição de grupos de interesses no "mercado político".
Dentre os fatores que levaram a essa modificação, cita-se o regime presidencialista forte, a baixa representatividade da estrutura partidária, a formação de canais privilegiados durante os regimes autoritários que desmontaram a estrutura hierarquizada de representação montada por Getúlio Vargas e outros. (VIANNA, Maria Lucia Teixeira Werneck. A americanização (perversa) da seguridade social no Brasil, p. 53 a 192).
06/07/07 11:27
Filtros nos comentários Devido ao acúmulo de comentários, muitos deles liberados através do celular, em pleno trânsito, é possível que passem alguns que fujam ao espírito do Blog.
Solicito que vocês me ajudem a identificar eventuais cochilos na liberação dos comentários. Especialmente os frequentadores habituais do Blog, solicito que mantenham-se críticos, mas evitem extrapolar. A melhor maneira de responder aos ataques baixos é ignorá-los ou tratá-los com crítica civilizada.
06/07/07 21:04
Depois das moscas assassinas
Passei o dia todo fora, pegando depoimentos para meu próximo livro. Mil perdões para os leitores fiéis que tiveram que conviver o dia todo com as moscas assassinas. Mas foi por uma boa causa.
Graças à colaboração de vocês, nessas duas semanas desmontamos uma ofensiva macartista contra uma cientista, desmascaramos uma ofensiva manipuladora contra um curso. Aos poucos vai sendo jogado luz sobre essas manipulações, inclusive essa história maluca de que pedi a cabeça de parajornalistas.
Os escritos de vocês têm ajudado muito a entender os jogos retóricos-escatológicos dos neocons tupininquins, a desmontar falsificações grosseiras. E, principalmente, ajudaram alguns dos agressores, depois que entenderam o espírito do Blog, a se transformarem em abelhas laboriosas, interessadas na troca civilizada de idéias e informações.
Bem vindos os novos leitores que chegaram atraídos por acusações e se integraram ao clima de discussões sem ofensas do Blog. Petistas, tucanos, conservadores, esquerdistas, somos todos cidadãos interessados na troca civilizada de idéias.
Agora, vamos dar um tempo porque ninguém aqui tem estômago de ferro para conviver com tanta escatologia.
02/08/07 09:44
Manera, frufru
Lembrando a música de Fagner para pedir aos leitores que evitem acusar pessoas de "canalhas" e adejtivos similares. Colabore com a campanha Blog Limpo.
/09/07 23:01
Noblat e o Blog
O jornalista Ricardo Noblat teve a gentileza de indicar este Blog no seu. Creio que somos amigos, dos tempos heróicos do jornalismo que combatia a ditadura. Em muitos temas, nossas posições são divergentes. Em grande parte, nossos públicos são distintos.
Mas temos em comum o fato de, em determinados momentos de nossas vidas profissionais, termos recusado a imposição da linha editorial das respectivas publicações em que trabalhávamos. E também o fato de termos partido para o vôo solo dos Blogs, ele pioneiramente, eu, depois.
Independentemente de posições doutrinárias, somos ambos jornalistas, em um momento em que o jornalismo tem sido atropelado por um neo-jornalismo oportunista e inescrupuloso, que analisa a relação custo/benefício da injúria/difamação vs as condenações a que estão sujeitos.
O Blog do Noblat fica em www.noblat.com.br
PS – Vamos retribuir a gentileza de Noblat pedindo aos que discordam dele não aproveitar esse espaço para colocar comentários ofensivos.
22/09/07 10:55
Regras de conduta De tempo em tempos precisamos dar uma freada de arrumação para não perder o foco do Blog. Peço a compreensão de todos para os seguintes princípios que devem nortear o Blog:
1. Aqui é um lugar público. Isto é, pode ser freqüentado por pessoas de todas as linhas de pensamento, desde que preservados princípios de civilidade.
2. O clima de descontração permitiu que alguns grupos se formassem. É um prazer acompanhar a maneira como se conhecem, se relacionam, se aproximam, mesmo tendo pensamento divergente.
3. Por outro lado, essa informalidade, e o relacionamento dos grupos, podem induzi-los ao processo de demarcação de espaço, a atuarem contra “invasores”, baseados no critério antiguidade. Processo que lembra um pouco os ambientes das velhas salas de chats de anos atrás.
Pessoal, por aí não dá. Todos os visitantes são sempre bem vindos. É normal, em um primeiro momento alguma resistência contra outras pessoas que passem a participar mais ativamente das discussões. Mas, depois, a poeira tem que assentar.
O aumento da diversidade é benéfica ao Blog e a todos que participam das discussões.
Espero que outras amizades e relacionamentos se formem a partir do Blog. O que mais me compraz é ver a aproximação entre pessoas de pensamento diverso, a troca civilizada de idéias, o contraditório bem exercido.
Desde a infância em Poços de Caldas, minha casa sempre foi portas abertas. Em toda minha vida fiz sempre questão de cultivar as diferenças, e entender a grandeza dos diversos personagens, independentemente de linha política. Já recebi Olavo de Carvalho e José Genoíno em casa; fui amigo de Roberto Campos e de meu mestre Antônio Cândido; tenho a maior admiração por Otávio Gouvêa de Bulhões e Celso Furtado.
Portanto, vamos colocar a hospitalidade e a diversidade como marca do Blog. Quem sair da linha será vetado, como sempre. Se algum comentário mais grosseiros passar, vocês me alertem. Mas, viva a diferença!
E vamos colocar o Brasil no foco da discussão, porque o futuro chega muito depressa para perdermos muito tempo com disputas ideológicas.
23/09/07 23:37
De blogueiros e colunistas
O professor Carlos Chaparro lançou em Portugal o livro “Sotaques d’aquém e d’além mar”, comparando jornalistas do Brasil e de Portugal. O livro é de 1997 e será relançado no país. No seminário em que participamos, na sexta, me presentou com um exemplar, indicando uma página com uma entrevista que fez comigo na época, sobre o fenômeno dos colunistas.
Olha como o mundo gira, mas as coisas não mudam:
“O colunista funciona como referência, âncora opinativa, para um público perdido entre tantas informações nem sempre bem tratadas. Mas porque nos tornamos uma espécie de eixo ideológico da discussão pública, somos ‘patrulhados’ por pessoas e segmentos sociais. Meu mérito, como colunista, tem sido o de superar o leitor ‘patrulheiro’, o leitor ativista que existe entre os chamados formadores de opinião, para os quais escrevemos. Penso, também, que o personalismo é um perigo, pela influência nefasta que pode
exercer”.
Para Nassif, o colunista tornou-se importante no jornalismo brasileiro, “porque rompeu o monopólio dos donos de jornais”. Mas está ameaçado pelo “excesso de julgamentos morais, tentação em que cai quando se tem argumentos”.
11/11/07 12:18
Direitos autorais
Solicito aos leitores que enviam colaboração que, quando o material for fruto de pesquisa, indiquem as fontes consultadas, para evitar problemas de plágio. E lembro que uma boa pesquisa sempre é valiosa.
12/11/07 14:41
Blog e Projeto Brasil
A nova versão do Projeto Brasil está sendo colocada no ar entre hoje e amanhã. Minha idéia, desde o começo, era a integração das duas plataformas. A idéia é a seguinte:
1. Dar dar mais visibilidade aos artigos dos comentaristas do Blog, publicando no PB aqueles comentários mais elaborados.
2. Permitir mais tempo de vida às discussões permanentes, que serão transferidas para o Fórum Online.
3. Vários de vocês já estão cadastrados no Projeto Brasil. Em breve colocarei instruções para quem quiser se associar às comunidades que forem sendo criadas. Penso em criar uma especificamente para os frequentadores do Blob.
30/01/08 20:01
O fenômeno Veja
Recentemente, estimulei uma competição com um blogueiro da revista – contratado especificamente para atacar os adversários de Veja . Havia duas razões relevantes para tanto.
Primeiro, para demonstrar que, com a Internet, cessou o predomínio das grandes publicações. É possível, mesmo sem ter um grande órgão da imprensa tradicional por trás, mobilizar pessoas para esse trabalho cooperativo, de disseminar informações. É o verdadeiro trabalho em rede, no qual – graças à Internet – cada pessoa dá sua colaboração, pegando as informações e levando para seus círculos de conhecidos.
Segundo, para que essa rede, formada nesse período, ajude a dar visibilidade a essas reportagens que passo a publicar.
Não será um desafio fácil. Estaremos enfrentando o esquema mais barra-pesada que
apareceu na imprensa brasileira nas últimas décadas. E montado em cima de um tanque de guerra: uma publicação com mais de um milhão de exemplares.
Tenho convicção de que a força do jornalismo e do trabalho em rede permitirão decifrar o enigma Veja. Para tanto, conto com a mobilização de todos vocês. Não se trata mais de um mero exercício esportivo de aquecer uma eleição de Blog. Trata-se, agora, de uma questão nacional que, tenho certeza, ajudará a reabilitar o exercício do jornalismo, mesmo na grande imprensa.
O macartismo e o jornalismo de negócios
O maior fenômeno de anti-jornalismo dos últimos anos foi o que ocorreu com a revista Veja. Gradativamente, o maior semanário brasileiro foi se transformando em um pasquim sem compromisso com o jornalismo, recorrendo a ataques desqualificadores contra quem atravessasse seu caminho, envolvendo-se em guerras comerciais e aceitando que suas páginas e sites abrigassem matérias e colunas do mais puro esgoto jornalístico.
Para entender o que se passou com a revista nesse período, é necessário juntar um conjunto de peças.
O primeiro, são as mudanças estruturais que a mídia vem atravessando em todo mundo.
O segundo, a maneira como esses processos se refletiram na crise política brasileira e nas grandes disputas empresariais, à partir do advento dos banqueiros de negócio que sobem à cena política e econômica na última década.
O terceiro, as características específicas da revista Veja, e as mudanças pelas quais passou nos últimos anos.A partir de agora, e nos próximos dias, publicarei, em capítulos, a história que tenta explicar esse fenômeno de anti-jornalismo.
No capítulo 1 – “Os Momentos de Catarse e a Mídia” – analisam-se as pré-condições que abriram espaço para o estilo que tomou conta da revista nos últimos anos.
No capítulo 2 – “A Mudança de Comando”, o que significou a ascensão de Eurípides Alcântara e Mário Sabino ao comando da revista de maior circulação do pais. Clique aqui.O endereço para acessar as matérias é http://luis.nassif.googlepages.com/home. Ou clicando aqui.
A partir dessa página se terá acesso aos capítulos que serão publicados.
10/02/08 13:39
Comunidade porreta
Sugiro moderação e humildade. Mas não tenho dúvidas de que a comunidade que se formou aqui, no Blog, tem o melhor e o mais diversificado quadro de comentaristas da mídia brasileira - em todos seus formatos.
Não basta ter Blog e Internet. É preciso comentaristas do nível de vocês. Alguns passam dias sem falar nada sobre temas apresentados. De repente, um baita tema complexo e, pimba!, lá vem uma aula impossível de se encontrar na mídia convencional.
Outros exercitam a capacidade de argumentação em diversos temas, trazendo enfoques novos ou ajudando a identificar ângulos não explorados.
Em temas políticos ainda há muita polarização. Mas nas discussões mais técnicas existe um show de diversidade e inteligência. Dá gosto ver economistas de diversas tendências discutindo na aba de Economia e, ao mesmo tempo, sendo questionados pela lógica de comentaristas que não tem formação econômica - mas possuem a lógica férrea das exatas ou o uso inteligente do bom senso.
Joga-se um post de armas e aparecem especialistas de todos os calibres. De reflorestamento, acontece o mesmo. Entram temas internacionais, e lá vêm diversidade e informação. Quando entra a questão racial, duvido que qualquer órgão de imprensa tenha conseguido apresentar quadro tão diversificado e de alto nível quanto as discussões que ocorreram no Blog. Tecnologia, nem se fala.
Não sei se vocês se deram conta, mas - acredito eu - estamos no estágio mais próximo do que será qualificado, em pouco tempo, de jornalismo do futuro, colaborativo, dentro da lógica da construção do conhecimento.
É fantástico apreciar a evolução do relacionamento dessa comunidade de inteligência. Existem comentaristas que ajudam a moderar as brigas, a acalmar os mais agressivos; outros colaboram na parte tecnológica; existem os provocadores adoráveis, os poetas, os tímidos que, vez por outra, dizem presente - e enche meu coração saber que, além dos que se manifestam, existe um público que não escreve mas se diz presente. E existe essa solidariedade - especialmente nos momentos das grandes batalhas - que só se encontra na família.
Estou animadíssimo com a entrada no ar, em breve, do sistema de Comunidades do Projeto Brasil. Aí, sim, toda essa riqueza de informações e análise poderá ser sistematizada e organizada. E poderemos provar que a Internet não é apenas a capacidade de trabalhar grandes massas de informação. Mas também o exercício de moldar o caráter de um veículo.
Cláudio Abramo dizia que o jornalismo é o exercício do caráter. Ele ficaria surpreso em acompanhar no dia a dia o desenvolvimento do caráter do Blog, através da interatividade, das contribuições de cada comentarista, do papel assumido por cada um, encontrando seu lugar e seu papel no Blog.
16/02/08 11:17
Preparativos
Vou abusar de vocês.
O que necessito:
1. Uma das maiores espertezas difamatória é o jogo das falsas relações. Tipo: fulano era amigo de beltrano, que conhecia sicrano, que aprontou tal coisa. Logo... Para o futuro livro, seria interessante se alguns de vocês pudessem montar um quadro com esse tipo de expediente, a partir dos arquivos da Veja.
2. Preciso ter uma idéia da quantidade de blogs e sites que colocarm links para a série (tanto com o endereço do Blog quanto do Google Pages). Esqueci qual o endereço que fazia esse tipo de levantamento.
16/02/08 21:41
Trivial do exército blogueiro
Segundo o site de buscas Technorati, neste momento existe a seguinte rede de blogs linkados conosco:
683 que colocaram o link www.projetobr.com.br
237 com www.luisnassif.com.br
211 com luis.nassif.googlepages.com
50 com www.projetobr.ig.com.br
21/02/08 09:18
A rede e os g00db0ys
Chamo a atenção de vocês para um resultado genuíno do trabalho em rede. O trecho abaixo fecha o capítulo "Lula é meu álibi", no dossiê Veja. Foi um trabalho minucioso de pesquisa feito por vocês (clique aqui para ler o capítulo).
Quando pedi a ajuda de vocês, houve quem risse do pedido. Esse povo não sabe o que é o trabalho cooperativo em rede.
O bad boy e os g00db0ys
No domingo, quando publiquei o Capítulo sobre esse suspeito dossiê italiano, cujo link estava na coluna de Mainardi, o leitor João Alcântara, juiz aposentado, analisou o documento e ajudou a reforçar as suspeitas de fraude:
1) O documento não tem começo nem final. O documento tem duas numerações. Uma, aparentemente a numeração oficial do inquérito. Outra, uma numeração específica do documento. Por exemplo, a primeira página tem o número 1 (que é do dossiê entregue a Mainardi) e o número 136 (que provavelmente é do inquérito da polícia italiana). Significa que foram escondidas as 135 primeiras páginas do inquérito original. O que continham?
2) A diferença da numeração no inicio do arquivo é de 135 paginas. Já no final é de 140, indicando que foram suprimidas 5 paginas, sem motivo algum. Entre a penúltima e a última página estão faltando a 317 e 318.
3) Depois, a numeração do documento vai até a página 75 (que corresponde à página 210 do documento original). A partir daí, acaba a numeração original. É um claro sinal de que alguma coisa, que não interessava, foi suprimida do documento original.
4) É só conferir a página 97 do documento. Começa a falar de Motta Veiga (o principal contato de Dantas com a mídia) e, de repente, acaba.
Há indícios fortes de que Mainardi divulgou intencionalmente uma fraude.
Mais tarde, um trabalho investigativo feito pelos próprios leitores do Blog permitiu reforçar as suspeitas sobre as fontes de Mainardi.
Acompanhe os nossos sherlocks:
1. O leitor Aton Fon abriu as propriedades do PDF com o relatório sobre a Telecom Italia, e descobriu a data em que o documento foi preparado: criado em 21 de janeiro e modificado pela última vez no dia 22 de janeiro.
2. O leitor Salles pegou a dica e foi até o blog de Janaína Leite - que já admitiu ter como fonte Rodrigo Andrade, do Opportunity. Lá, ele levantou um post que falava sobre os problemas da Telecom Itália. Endossava todas as hipóteses do Opportunity, mas não mencionava a fonte de suas informações.
O nome do post era estranho: gOOdbOys, assim mesmo, com zero em lugar do O. E foi publicado no dia 21 de janeiro, mesmo dia em que o PDF foi criado.
3. Aí, consultou o texto da jornalista para entender o que vinha a ser esse g00db0ys.
4. Curioso, foi até o relatório sobre a Telecom Itália, indicado por Mainardi na sua última coluna. E o que achou?
A expressão era a mesma do relatório sigiloso sobre a Telecom Itália, inclusive com os zeros em lugar do "0". Janaína, que tem como fonte o Opportunity, tinha se baseado no mesmo relatório de Mainardi, que diz ter como fonte italianos.
A rede ajudou a desmascarar a pantomima em torno do relatório que Mainardi garantia ter recebido da Itália.
07/04/08 10:39
Baixando a bola
O clima ficou pesado com essa guerra irracional em torno do relatório de despesas do Planalto - que alguns teimam em chamar de dossiê. Que tal baixarmos a bola, aqui, e retomarmos as discussões mais técnicas e menos passionais?
08/04/08 10:33
Trabalho colaborativo
Pessoal,
são muitos os comentários postados. Às vezes passa um ou outro com acusações, palavrões e torpezas menores e maiores.
Peço que me alertem rapidamente quando identificarem alguns desses comentários.
Pontos principais a serem evitados:
1. Acusações pessoais.
2. Grosserias contra adversários.
3. Palavrões: o nosso Legião, como sempre, tem colocado comentários saborosíssimos, que se perdem pelos palavrões.
4. Provocações ou excesso de proselitismo.
26/08/08 12:49
Fora de pauta
Vou colocar todo dia, ao meio dia, esse Fora de Pauta para os temas fora de pauta que entram em outras notas.
Aparentemente o Trivial não está cumprindo bem essa função depois que ficar mais para trás, na lista de notas publicadas.
ANEXO II – Excertos do Blog do Nassif sobre o acidente com o vôo TAM 3054, publicados em julho e agosto de 2007
18/07/07 00:50
Sobre a pista de Congonhas Enviado por: RobertoOla Nassif,após este acidente com a aeronave TAM, um ponto que apareceu nas reportagens e que parece ser importante é o fato da pista recem-inaugurada ainda não contar com os sulcos (grooving) para sua melhorar aderencia.
Pelo que andei lendo, este processo soh poderia ser realizado algum tempo apos a conclusão da pista, devido ao processo de cura da massa asfaltica. Fica a pergunta. Abrir a pista sem o grooving é um procedimento corriqueiro ou foi uma decisão de arriscada. Analisando os fatos agora, provavelmente vai haver uma disputa que impeça o raciocínio.
Não seria o caso de abrir aqui no blog uma consulta para que alguns especialistas indicassem qual é o padrão internacional para esse procedimento?
18/07/07 01:14
Prospectando as causas do acidente Participei agora do "Jornal da Cultura". Foi entrevistado um especialista em segurança de vôo, pelo telefone, um coronel da Aeronáutica. Pelo que conversei fora do ar, pelo que ouvi no ar, pelo que ouvi nas rádios e li no noticiário online, há uma jogo complexo pela frente. Não dá para se chegar a conclusões precipitadas sobre as causas do acidente com o Airbus da TAM.
Aventou-se a possibilidade do avião da TAM ter pousado a uma velocidade superior ao normal. Não está confirmado, mas será fácil conferir através dos equipamentos de controle de vôo.
Se isso ocorreu, há duas hipóteses a serem analisadas. Ou foi um problema do piloto ou um problema mecânico. Como o Airbus é um avião que praticamente pousa sozinho, segundo os especialistas, seria mais um problema mecânico. Repito: caso se comprove que desceu, mesmo, em velocidade superior ao normal.
Mas essa é apenas uma hipótese. A segunda hipótese é a questão da pista de Congonhas, que teria sido liberada sem estar plenamente segura. Também não será difícil comprovar essa possibilidade. Nesse caso tem-se um problema sério aí, independentemente do pouso do avião ter sido normal ou em velocidade excessiva.
Batendo na pista, teria ocorrido a hidroplanagem, o excesso de água fazendo as rodas do avião rodarem em falso. E aí, o piloto teria tentado inutilmente arremeter novamente, mas sem forças no motor. A questão fundamental é: mesmo que o avião tenha descido em velocidade superior ao normal, o estado da pista foi decisivo ou não para o acidente ter ocorrido?
***
Se a primeira hipótese se confirmar, minimiza um pouco a responsabilidade da Infraero com a pista de pouso. Se não se confirmar, tem-se uma encrenca administrativa e política das maiores.
A Infraero foi colocada na cota das alianças partidárias. No governo FHC, foi entregue ao grupo do governador mineiro Itamar Franco. No governo Lula, ao neopetista Carlos Wilson, deputado de Pernambuco. Nos últimos anos houve um festival fantástico de investimentos em modernização de aeroportos, e construção de novos aeroportos, ao mesmo tempo em que em várias cidades aeroportos regionais eram abandonados.
Não haverá como se fugir de uma investigação séria e profunda das causas desse acidente.
18/07/07 01:21
A apropriação da ANAC Seja qual forem os resultados das investigações do acidente da TAM, a superlotação do aeroporto de Congonhas é a prova cabal de como as agências reguladoras - Departamento de Aviação Civil (DAC), antes, ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), depois - foram apropriadas pelas companhias aéreas.
Até os anos 90 havia uma aviação extremamente regulada, com quase nenhuma autorização para novas linhas, preços administrados e nenhuma competição. Ocorreu uma desregulamentação em nível internacional, que foi implantada no Brasil à moda brasileira: sem a definição prévia das regras do jogo e dos órgãos reguladores.
Graças a esse modelo, a TAM conseguiu alçar vôo, VASP, Varig e Transbrasil rodaram, surgiu a Gol.
A aviação é um setor estratégico para o país. Caberia às autoridades definir a malha aérea, de maneira a distribuir melhor os vôos, ampliar os vôos regionais, redefinir os hubs (aeroportos onde cruzam vôos para várias regiões) nacionais.
Nada disso aconteceu. Não houve estudos técnicos, não houve reformulação. Provocou-se o esvaziamento da aviação regional e a definição de vôos e de aeroportos passou a depender dos interesses comerciais das companhias aéreas.
Nem assim se chegou ao livre mercado. A autorização para novos vôos continuou burocrática e os critérios de aprovação nunca foram suficientemente claros. Consolidou-se um oligopólio nefasto, concentrado nos principais aeroportos, deixando abandonados diversos aeroportos regionais.
18/07/07 11:06
O inventário do desastre O noticiário de hoje dos jornais permite manter as análises preliminares sobre o acidente da TAM que escrevi ontem.
Para sistematizar de forma mais clara as notícias até agora divulgadas:
Causas indiretas
1. A sobrecarga do aeroporto de Congonhas, em função da falta de um modelo de planejamento da malha aérea, depois da desregulamentação do setor e da apropriação das agências reguladoras pelas grandes companhias aéreas.
2. A crise aérea continuada, desde o acidente da Gol, que provavelmente influiu na pressa da Infraero de liberar as pistas sem as tais ranhuras necessárias para aumentar a segurança.
Possíveis causas diretas
1. Pouso mal feito. Nos diversos jornais há a informação de que o piloto desceu fora do ponto a uma velocidade excessiva. Depois, a frenagem falhou. Há três hipóteses para isso:
a. Falhou devido à chamada hidroplanagem, excesso de água na pista.
b. Falhou devido a problemas no reverso do avião.
c. Falhou devido a uma falha pessoal do piloto.
2. A pista de Congonhas. Há indícios suficientes, nos últimos dias, de que estava escorregadia e arriscada para pousos. O argumento de que todos os demais aviões, com exceção do acidentado, conseguiram pousar não é atenuante. O grau de segurança de uma pista não se mede apenas pela ausência de acidentes em pousos bem feitos, mas pela maneira com que consegue prevenir pousos mal feitos.
Parte importante a ser levantada é o relatório do Ministério Público, quando pediu a suspensão dos vôos de Congonhas por falta de segurança.
18/07/07 11:30
A hidroplanagem na aviação Enviado por: Silvana
Do site Air Safety Group
Todo piloto sabe o que é pousar numa pista molhada e o perigo que isso representa. É quando se torna grande o risco de uma derrapagem, ou melhor, uma aquaplanagem. O fenômeno é mais comum do que se supõe, e não é tão simples como parece. Um estudo realizado pela McDonnell Douglas em 1997 aponta as pistas contaminadas por água ou gelo como a quarta maior causa de acidentes em pousos e táxis nos Estados Unidos entre 1992 e 1996. A Flight Safety Foundation define que a aquaplanagem (também chamada de hidroplanagem) inicia-se no ponto a partir do qual a elevação hidrodinâmica sob os pneus equivale ao peso do veículo conduzido sobre as rodas. A partir desse ponto, qualquer aumento da velocidade acima desse valor crítico elevará completamente o pneu do pavimento - é aí que a aquaplanagem se inicia. São vários os tipos de aquaplanagem e vários fatores podem desencadear o evento.
Mas, felizmente, nem tudo está perdido: há também várias técnicas para recuperar o controle da aeronave. Esse perigoso "escorregão" pode ser dos seguintes tipos:
Hidroplanagem viscosa: Com a pista já definida como molhada, uma pequena camada de
água pode atuar como um lubrificante, permitindo que os pneus deslizem. Este tipo tem a agravante de poder ocorrer em velocidades menores que as dos outros tipos de hidroplanagem e numa camada de água extremamente delgada (cerca de um milionésimo de polegada). O pior é que a chuva não é a única vilã: a umidade de garoa e sereno também pode causar o fenômeno.
Hidroplanagem dinâmica: Ao contrário da viscosa, a hidroplanagem dinâmica ocorre normalmente em velocidades maiores, em água parada com a espessura de um décimo de polegada ou mais. Durante este tipo de hidroplanagem a água não consegue escapar pelos sulcos dos pneus e a roda gira sem a menor tração, literalmente sobre a camada de água.
Hidroplanagem de borracha retornada: Resulta do travamento dos freios em uma pista molhada ou úmida, o que cria uma super aquecida camada de vapor devido à fricção dos pneus contra a superfície da pista. Quando isso ocorre, a borracha do pneu funde-se enquanto roda sobre o vapor, deixando marcas de derrapagem acinzentadas ou brancas na pista. Vítimas desse tipo de aquaplanagem surpreendem-se com a sensação física muito semelhante a dos outros tipos de aquaplanagem, apesar das marcas deixadas na pista. Mas esse tipo normalmente não causa problemas em aeronaves equipadas com sistema de frenagem com modulating anti-skid, que impede o travamento das rodas.
Consultores e profissionais da indústria aeronáutica são unânimes em uma conclusão: o problema da aquaplanagem seria minimizado se todas as pistas fossem construídas de maneira igual, isto é, todas utilizando as técnicas de construção que minimizam os efeitos da aquaplanagem.
As técnicas são duas: a utilização de grooving (sulcos transversais) e a aplicação de cobertura PFC (Porous Friction Course).
Em 1968 a NASA já testava coberturas anti-aquaplanagem para pistas para determinar qual seria a melhor em condições de pavimento seco ou molhado. Tom Yager, engenheiro de pesquisas do NASA"s Aircraft Landing Dynamics Facility em Hampton, Virgínia, nos Estados Unidos, opina que a solução ideal é uma pista de concreto com 1,5 % de cobertura com fendas transversais (grooving) de ¼ de polegada (cerca de 6 mm) de profundidade e ¼ de polegada de largura com uma polegada (aproximadamente dois centímetro e meio) de separação entre elas.
Foi verificado que enquanto a média das pistas sem grooving fornecia uma razão de frenagem molhado para seco de dois para um, uma pista com fendas dentro das medidas acima fornecia uma razão de um para um.
No ponto de vista de custos, quanto maior o espaço entre as fendas, melhor. "Mas percebemos que a fricção (atrito) em uma pista com um espaçamento de duas polegadas entre as fendas ficava comprometida em 20%" informa Tom. Os padrões da FAA americana pedem fendas de ¼ por ¼ polegadas com uma distância entre elas de 1,5 polegadas (pouco mais de 3 cm), especificações que freqüentemente não são consideradas em aeroportos para aviação geral naquele país - é o que a FAA pretende corrigir em breve.
A causa dessa falta de uniformidade é o de sempre: a NASA alega que os testes de atrito realizados pela FAA são inadequados, do que a FAA, claro, discorda.
Entre o certo para uma e o certo para a outra, as pistas são construídas de diversas maneiras. O grooving na pista principal do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, ocupa uma extensão de 1.746 m. No caso da pista auxiliar, a extensão é de 1.437 m e, em ambos os casos, a largura da área sulcada é de 30 metros (15 metros de cada lado do eixo das pistas). A profundidade e a largura dos sulcos obedecem ao padrão de 6 mm por 6 mm, sendo que o espaçamento utilizado em Congonhas é de 3 cm entre cada sulco.
Já no caso de aeroportos que utilizam a cobertura PFC de ¾ de polegada (quase dois
centímetros) a água escoa rapidamente através da cobertura e sai para as laterais através do substrato não-poroso. Mas, tão importante quanto o material usado, é a manutenção adequada. Principalmente durante os meses quentes de verão, o grooving na área de toque pode ficar cheio de borracha de pneu, reduzindo o coeficiente de atrito.
A superfície PFC pode igualmente acumular borracha, reduzindo ou anulando o atrito nestas áreas, tornando-as lisas. A manutenção da camada de grooving em Congonhas é realizada com uma periodicidade semestral ou anual, dependendo da utilização. A borracha e outros resíduos são retirados com jatos de água sob alta pressão e um equipamento avalia as condições de atrito e aderência da camada de concreto asfaltico. Quando há necessidade, os sulcos são refeitos utilizando-se um equipamento que risca o piso com discos de diamante. Um cuidado todo especial refere-se às áreas pintadas com faixas e números.
O engenheiro da NASA recomenda a adição de areia, saibro ou elementos equivalentes à tinta utilizada para as faixas ou números para tornar a área áspera. "Pilotos que tocam sobre eles perceberão que, quando molhados e sem aditivos antiderrapantes, são tão lisos quanto gelo e lá não há aumento da velocidade de rotação da rodas. Inclusive, alguns pilotos afirmam que mesmo secas essas áreas são tão escorregadias quanto pouso em asfalto molhado. Óleo, então, em uma pista molhada... nem se fala! O risco de hidroplanagem é evidente e imediato. O sistema anti-skid pode se tornar inoperante, pois as rodas não atingem o ponto de rotação em que ele começa a funcionar".
Foi o que aconteceu com um Learjet 35 em fevereiro de 1998 em Greenville, Carolina do Sul, EUA. O piloto aplicou os freios, houve hidroplanagem, as rodas atingiram a grama e só então a rotação das rodas atingiu o ponto de ativação do anti-skid, iniciando a frenagem da aeronave.
Naturalmente, as condições da aeronave também são muito importantes na hora do pouso. Pneus inflados abaixo dos parâmetros requeridos estarão mais propensos a aquaplanar. E os pneus do trem de nariz, que normalmente são inflados abaixo da pressão dos pneus do trem principal, irão aquaplanar antes das rodas principais. As aeronaves com dois pneus no trem do nariz, como é o caso das de grande porte, devem ter ambos inflados com mesma pressão. Caso contrário, a aeronave tenderá a puxar para a direção do pneu menos inflado, aumentando a possibilidade de aquaplanagem em pistas molhadas. Essa tendência de puxão para a direita ou esquerda será ainda mais evidente se houver pneus com pressões diferentes nos trens direito ou esquerdo.
A velocidade na qual a hidroplanagem ocorrerá em uma pista sem grooving e sem cobertura porosa (PFC) dependerá sempre da pressão dos pneus, de acordo com a NASA. A fórmula que a agência aeroespacial norte-americana utiliza para determiná-la é 7,7 vezes a raiz quadrada da pressão do pneu. É aconselhável utilizar, nesta equação, a pressão menor, do trem de nariz, para a determinação da velocidade.
Por exemplo: em uma aeronave cujos pneus do trem de nariz tenham sido inflados com 70 psi (pounds per square inch), a hidroplanagem em uma pista com significante acúmulo de água ocorrerá inicialmente a partir desse conjunto de trem e a 64,4 nós. Um pneu usado estará mais propenso a aquaplanar do que um pneu mais novo devido à diminuição da profundidade das fendas. Uso desigual (pneus novos e usados, juntos) também pode causar um efeito similar ao de pneus com pressões desiguais. Pista e pneus em condições adequadas, o fator restante a considerar é á técnica do pouso em si.Embora o NTSB (National Transportation Safety Board) tenha concluído que em muitos acidentes onde a hidroplanagem foi a causa determinante, o piloto deveria ter iniciado uma arremetida a partir do ponto em que determinou falta de ação dos freios, John Lowery, piloto de aviação executiva e professor da Embry-Ridle Aeronautical University analisa que, após o toque e acionamento de freios aerodinâmicos e reversores, a partir da descoberta da falta de tração dos freios restará um tempo mínimo para uma arremetida bem-sucedida. Em uma pista molhada, por garantia, evite tocar sobre os números ou faixas pintadas.
Mesmo nos EUA, apesar das recomendações resultantes de testes da NASA, ainda são poucas as pistas que possuem areia ou outro material que garanta o atrito das áreas pintadas. - O importante, como afirma John Lowery, piloto de aviação executiva e professor da Embry-Ridle Aeronautical University, é tocar firmemente e concentrar o máximo possível de peso nas rodas o quanto antes (método muito usual nos EUA). Além disso, desça rapidamente o trem de nariz, mantendo o manche para a frente para garantir um contato firme e atrito máximo das rodas com a pista e acione de imediato todos os freios aerodinâmicos. Eles devem ser aberto o mais cedo possível, ainda na fase de maior velocidade da rolagem na pista durante o pouso.
- Uma vez iniciada a aquaplanagem, para recobrar o controle o ideal é soltar os freios por completo, para a rotação das rodas atingir o ponto de ativação do anti-skid, e simultaneamente, leve o comando do reverso para idle. Isso vale para o tipo modulating anti-skid. Se não for este o caso, a pressão nos freios deve ser mantida entre firme para pesada para evitar que eles travem. Se a aeronave começar a guinar aplique mais empuxo para ajudar a recuperar controle direcional. Na derrapagem do trem de nariz, a aplicação de empuxo poderá ser o único meio de recuperar a direção.
- Se a hidroplanagem ocorre em um pouso com vento cruzado, a aeronave quase com certeza tenderá a aproar a direção do vento, à medida que as forças do vento ajam sobre o estabilizador vertical. As forças do vento de través são proporcionais ao quadrado da velocidade do mesmo vento. Dez nós de vento de través, por exemplo, quadruplicará as forças laterais produzidas por um vento de través de cinco nós.
- Fique sempre alerta quanto à possibilidade de falha do sistema de frenagem já a partir do momento em que receber a informação de que a pista está molhada.
- Colaboração: Solange Galante (jornalista especializada em aviação)Fonte: ATR News
18/07/07 11:32
A falta do modelo aéreo Enviado por: Ricardo Lima
Nassif,
O grooving é de suma importância e ajuda sobremaneira a frenagem da aeronave.
Esta pista de Congonhas sempre foi crítica (não é a primeira reforma que recebe). Há diversos relatos pertinentes de pilotos sobre a questão. Infelizmente (nenhuma novidade nisto), a pressão econômica dita as regras da aviação, como você muito bem expôs, desde a abertura dos céus, a desregulamentação do setor, momento em que a seriedade no setor deu espaço aos aventureiros. A verdade é que hoje em dia a segurança de vôo tem peso secundário nas decisões administrativas, e só tem impacto nos speeches bonitos que fazemos para justificar algum atraso ou decisões mais contundentes. As autoridades contam sempre com o fator estatística para suas decisões, e você sabe que a probabilidade de um acidente na aviação é sempre remota. Bem, demorou muito tempo, mais de década, mas aconteceu!
Enfim, nosso sistema de aviação é uma vergonha! A infra-estrutura é feita para o comércio. Shoppings sofisticados nos aeroportos, mas nossas pistas, nossos auxílios à navegação e ao pouso são obsoletos, inoperantes ou inexistentes. Ou será que a comunicação na rota Brasília-Manaus não apresenta mais problemas?! E a operação com
chuva no Santos Dumont?! E o ILS da pista 29 de Brasília que nunca funciona?! E o ILS da pista 35L de Congonhas que tem a rampa de planeio tão deficiente?! Será que ele foi um fator contribuinte neste evento?!
Minha aposta é que chegarão a conclusão que os pilotos erraram e, mais uma vez, nada de significativo acontecerá. O Presidente da República não será instado a explicar por que contigencia (sic) dinheiro de tudo quanto é orçamento, o presidente da Infraero dirá que foi uma fatalidade, o governador do estado dirá que no próximo mês se concluem as obras do aeroporto etc. etc.
P.s. algo significativo seria impedir a operação de Congonhas em chuva, ou com aviões acima de 100 assentos etc. etc. O que acha?!
18/07/07 11:47
Congonhas e as normas de segurança Enviado por: Afonso
Congonhas está fora das normas internacionais de segurança por não possuir área de escape adequada. Sabe-se (e a imprensa deveria ir atrás) que a distância entre a pista e os fingers está fora das normas de segurança. A obra (dos fingers) só pode ser realizada, pois a Infraero possui um "parecer independente" alegando que, apesar de fora da norma, o risco é bem pequeno de acidente. A obra não tem nem 1 ano, e já temos uma tragédia.Sempre defendi o fechamento desse aeroporto maluco, a construção do trem bala ligando RJ/SP e um trem expresso para Cumbica. É mais seguro e econômico. Bem, optou-se pelo piso de mármore.
Enviado por: Ricardo Freire
Nassif,
Congonhas funcionava bem enquanto era um aeroporto regional voltado para executivos, com vôos mais caros. Com a exceção das ligações ao Rio, BH e Curitiba, qualquer vôo que partisse para alguma capital precisava, necessariamente, fazer escala numa cidade do interior. Os vôos para Salvador passavam em Ilhéus ou Porto Seguro, os para Porto Alegre, como o de ontem, faziam escala em Joinville ou Caxias do Sul, para ir a Brasília era preciso parar em Ribeirão Preto, Floripa, só parando em Navegantes antes (ou Curitiba).
(...) Foi quando se deu a uniformização da aviação brasileira: TAM/Varig reivindicaram, e conseguiram, os privilégios que a Gol tinha para voar para qualquer lugar a partir de Congonhas. As tarifas da Gol subiram quase ao nível de Varig/TAM, e o serviço de bordo de Varig e TAM desceram quase ao nível da Gol.
Num quarto momento, pós-Varig, Congonhas se torna não só o aeroporto preferencial do paulistano para viajar a qualquer lugar do Brasil, como se vê alçado à condição de "hub" de conexões. Passageiros de todo o Brasil vêm a Congonhas para trocar de avião!
Aí tem ganância das companhias aéreas, burrice do paulistano (já faz tempo que usar Congonhas é masoquismo) e má gestão da Infraero -- que está claramente mais interessada em obras de ampliação (do Santos Dumont? Para quê???), aeroshoppings, fingers, edifícios-garagem, viadutos de acesso (Porto Alegre, Recife), túneis de acesso (Congonhas), contratos de licitação de publicidade, e menos focada na operação técnica -- pistas e equipamentos.
Não importa se foi ou não foi a falta de ranhuras na pista que causou essa tragédia. Mesmo com todo o caminhão de dinheiro gasto inutilmente, é preciso repensar já o modelo de uso de Congonhas.
18/07/07 15:20
Relatório preliminar do acidente Aqui um relato da rádio CBN sobre um relatório preliminar da Aeronáutica sobre o acidente.
19/07/07 15:57
Das manchetes perigosas Não existe profissão mais ingrata no jornalismo que o "mancheteiro", especialmente o da primeira página. A manchete vai ajudar o jornal a brigar na banca, vai permitir diferenciá-lo dos concorrentes, é a parte mais visível do jornal.
Ainda nos anos 80, o velho e ainda insuperável "Jornal do Brasil" tinha uma receita mágica de manchete. Supunha que qualquer notícia de forte impacto seria explorada no mesmo dia pela televisão e pelas rádios. Por isso, sua manchete sempre focava o pós-evento. Se morresse alguém relevante, por exemplo, a manchete mencionaria o local do enterro, para ficar em um exemplo bem simples.
Hoje em dia, em plena era do excesso de notícias, com TV aberta e cabo, rádios e Internet, os jornais ainda não aprenderam a lição. Se for conferir, as manchetes de quase todos sobre o acidente da TAM baseavam-se na falsa percepção de que seria o primeiro contato do seu leitor com a notícia.
Um jornal que vem tentando avançar os limites da manchete é "O Globo", mas ainda sem conseguir chegar perto do ainda insuperável "Jornal da Tarde" do Murilinho e do Fernando Mitre.
Mas a veia artística do mancheteiro muitas vezes extrapola. É o caso de hoje: "Infraero, Anac, Decea, Cindacta, FAB... e não se sabe o que houve", é uma manchete forçada que não reflete as matérias internas.
O "mancheteiro" mesclou duas questões que nada têm a ver entre si. Uma, o da sobreposição de órgãos reguladores na aviação - tema relevante, mas de pouco apelo popular. Outro, a apuração das causas do acidente - tema de muito apelo popular, mas impossível de ser apurado em prazo tão curto. Deu um ornitorrico.
Aliás, a manchete poderia ampliar a lista de órgãos para Casa Civil, Estado Maior da Aeronáutica, Presidência da República, Santa Casa da Misericórdia, que o resultado seria o mesmo da submanchete da página 3: "Investigadores afirmam que é cedo para determinar as causas". Ao contrário do que supõe a manchete, dez órgãos investigando não tornarão a apuração dez vezes mais rápida.
19/07/07 18:20
Os desastres aéreos Recebo via email esse endereço do site Desastres Aéreos, com relação de problemas ocorridos com aviões da TAM e links para matérias publicadas.
Não sei a quantidade de problemas mecânicos ou fora de controle (tipo colisão com urubus). Nem sei se o quanto essa quantidade de problemas está acima da média mundial e nacional.
Não se trata de minimizar responsabilidade de ninguém. Se a incidência de acidentes for elevada, é problema da TAM e é das autoridades reguladoras e fiscalizadoras
19/07/07 20:49
FAA aprova sistema aéreo brasileiro Enviado por Luzete
Adriana Stock, da BBCDe Nova York
Apesar da crise aérea no Brasil e do acidente com o vôo 3054 no aeroporto de Congonhas, a autoridade americana para aviação civil acredita que o sistema de aviação brasileiro está de acordo com os padrões internacionais de segurança.
"O Brasil está OK com os padrões internacionais da Organização Internacional de Aviação Civil (Icao, na sigla em inglês)", diz Les Dorr, porta-voz da Agência Federal de Aviação dos Estados Unidos (FAA, na sigla em inglês).
Desde o início da década de 1990, a FAA tem um programa que avalia as autoridades de aviação em cada país, isto é, se o governo está seguindo as regras internacionais de segurança determinadas pela Icao.
Os países são classificados nas categorias um e dois. Na categoria um, o país segue as regras. Na dois, não segue. O Brasil está na categoria um. (...)
Segundo o Conselho Internacional de Aeroportos (AIC, em inglês), associação com sede em Bruxelas que agrupa aeroportos comerciais de 178 países, a maior preocupação internacional em relação à segurança aérea no Brasil diz respeito ao sistema de tráfego aéreo.
"A situação no Brasil vem sendo observada desde o acidente com a Gol, no ano passado. Mais que o estado dos aeroportos, o que mais nos preocupa é o sistema de tráfego adotado no Brasil", afirmou Eduardo Flores, secretário da entidade para a América Latina.
(...) Para o especialista, o Brasil, assim como a América Latina de forma geral, enfrenta dois tipos de problema no tráfego aéreo: um de infra-estrutura e outro humano.
"No caso do Brasil, exige muita atenção o fato de o controle ser realizado por militares. Os requerimentos e procedimentos da aviação civil são distintos dos da aviação militar, e é muito importante que sejam compatibilizados adequadamente", disse.
Quanto à infra-estrutura, segundo Flores, toda a América Latina deixa a desejar em manutenção permanente das estruturas aéreas e em modernização de equipamentos.
(...)
Segundo Flores, "o Brasil precisa implementar uma política conjunta do mais alto nível, envolvendo linhas aéreas, aeroportos, controladores e Estado. O que se vê é que falta coordenação e unidade entre os diversos organismos".
19/07/07 22:28
A propósito do furo do JN Deixa ver o se entendi o furo do "Jornal Nacional", a respeito dos problemas enfrentados pelo Airbus da TAM.
Segundo o JN apurou, na sexta-feira o Airbus apresentou um problema no reverso. Segundo a Wikipedia, "modificação temporária da turbina de uma aeronave que permite que seu empuxo produzido seja direcionado para a frente (as turbinas geralmente geram empuxo para trás)". Segundo o diretor da TAM entrevistado pelo JN, o manual do avião diz que o reverso pode ser travado (isto é, anulado mecanicamente), e que o avião poderia voar dez dias sem precisar consertar a peça, desde que o tempo esteja bom e que a pista não esteja "contaminada" - termo para designar pista encharcada.
O avião não parou de voar desde então, embora o tempo tenha piorado significativamente nos últimos dias. Ou seja, tinha-se dois fatores de risco: o reverso não funcionando, e o tempo chuvoso. Na sexta-feira o avião já teria apresentado problemas na aterrissagem, mas que não foram reportados pelo piloto.
Segundo o diretor da TAM, o problema ocorreu em apenas um reverso o que, para um leigo como eu, não significa nada. Um reverso apenas funcionando faria o avião rodar (os leitores especialistas me corrijam, se estiver errado). Segundo ele, a torre não confirmou que a pista estaria "contaminada".
Mas chovia, mas se sabia que o reverso não estava funcionando, se sabia não se estava se trabalhando com a segurança máxima.
Solicito que os leitores especialistas expliquem melhor essa questão, para que se possa avaliar as seguintes questões:
1. Qual o grau de gravidade desse reverso não funcionando em dia de chuva?
2. Além da própria TAM, os reportes dos pilotos deveriam ser analisados por algum órgão regulador, ou a responsabilidade é exclusiva da empresa?
3. A partir dessas informações, dá para se atribuir a essa pane do reverso o fato do piloto não ter conseguido parar o avião? Qual a responsabilidade adicional da falta de ranhuras na pista?
20/07/07 00:07
O uso do reverso Enviado por: Antonio Carlos de So
Caro Nassif, o reverso é primordial no pouso de uma aeronave a jato. Por ser um jato e pousar com velocidades maiores que um avião a hélice, o uso do reverso é essencial em pistas de pouca extensão como Congonhas. Os procedimentos para um pouso em pista molhada preconizam o uso do reverso no início da frenagem evitando o uso dos freios. Também deve-se evitar o uso de freios e reversos ao mesmo tempo para evitar a hidroplanagem. Além disso, é recomendado o uso dos freios com suavidade em uma pista molhada para evitar a hidroplanagem.
Na minha humilde opinião, errou a TAM em não parar a aeronave. Errou o piloto em confiar demais em sua larga experiência e pousar uma aeronave com havia apresentado problemas no reverso e sabendo que a pista de Congonhas não apresenta condições ideais de pouso em dias chuvosos. Deveria ter solicitado o pouso na pista interna. Mas, o piloto pode ter realizado o procedimento por medo de perder o emprego.
Além do problema do reverso, pergunto: está previsto passageiros viajando sem estar acomodado com cintos de segurança. A aeronave tinha excesso de passageiros, não está previsto a viagem fora dos assentos. Estas conclusões a que chego são apenas especulativas balizadas na minha pouca experiência de vôo.
20/07/07 00:16
A questão do reverso Estou procurando escrever com cuidado, para não haver precipitação nas conclusões. Mas é evidente que o reverso é fundamental para a freagem em Congonhas.
Nos últimos meses, pousei com vários aviões acionando o reverso ao máximo para conseguir chegar ao final da pista, ou aop ponto em que taxiam. Os passageiros tinham que se firmar no assento para não caírem. Objetos deixados em cima das poltronas eram arrastados para o chão. E tudo isso com céu aberto, sol. Como, agora, se vem com essa história de que o reverso é dispensável.
20/07/07 11:48
As responsabilidades da TAM A mídia está tratando com cautela a responsabilidade da TAM no acidente com o Airbus. No acidente com a Fokker, o "Jornal Nacional" chegou a colocar uma entrevista de vários minutos com um piloto anônimo, despedido da empresa, desancando a companhia.
Os cuidados atuais se devem a outras razões. Como sempre acontece nesses episódios, sai-se atirando no que se vê. Esse viés estava mais presente nas manchetes e nos colunistas. A cobertura, em si, foi mais objetiva. Depois, há enorme dificuldade para o ajuste de rota, quando os fatos colidem com a versão inicial.
Não se condene a mídia por essa cautela com a TAM. Essa deveria ser a regra. Mas é flagrante a diferença em relação ao tratamento anterior.
Ontem, por exemplo, "O Globo" deu em manchete uma relação de órgãos governamentais que atuam no setor aeronáutico, e não apresentavam nenhuma explicação para o acidente. Agora, que o "Jornal Nacional" traz a hipótese mais concreta para o acidente, o jornal foi obrigado a dar o furo em uma tímida manchetinha de uma
coluna.
Todos os jornais deram, com destaque, a explicação da TAM de que é possível aterrissar sem o reverso. Na "Folha", um especialista anônimo (porque o anonimato para uma avaliação técnica?) diz que "o problema no reverso direito do Airbus-A320 da TAM não seria suficiente, sozinho, para provocar o acidente de terça-feira, conforme especialistas ouvidos pela reportagem".
Claro que não. "Técnicos apontam ainda que a pista do aeroporto, além de escorregadia sob chuva, é curta e sem área de escape, algo que potencializa as dificuldades", diz ele. "A aeronave não depende dos reversores para frear nas situações normais. Isso porque, embora usado praticamente em todos os pousos do tipo, ele é só um instrumento extra para ajudar a frenagem do avião, que é projetado para parar com freios das rodas e aerodinâmico".
Tudo o que ele colocou é agravante para a TAM, mas o tom é de atenuante. Estava-se em situação normal? Claro que não. Chovia, o avião voava dentro do limite máximo de peso, do limite máximo de passageiros.
Não sei se me escapou, mas não me lembro de ter lido nos jornais os problemas com as cinco aeronaves da TAM que, em dezembro, foram tiradas de operação para manutenção extraordinária, agravando os problemas dos passageiros. Só se faz manutenção extraordinária em tamanha quantidade de aeronaves quando se deixa de fazer a manutenção ordinária.
É evidente que há tempos a TAM vinha perseguindo obsessivamente índices de rentabilidade da Gol, e se descuidando de aspectos básicos da operação. Aqui mesmo, no Blog, escrevi várias matérias sobre esse desmonte da empresa, a primeira, se não me engano, em meados do ano passado.
Esse desmonte foi mais amplo do que o que se observava no atendimento aos passageiros. A notícia da manutenção extraordinária dos cinco Airbus, em dezembro passado, indicava que havia mais coisas no ar do que aviões de carreira e a perda de qualidade no atendimento.
20/07/07 14:13
Das responsabilidade e do crime Há duas situações claras e distintas nesse acidente.
Uma, as condições do espaço aéreo nacional, com toda sua precariedade, incluindo as condições de pouso em Congonhas.
Outra, tendo como dado objetivo esse cenário, a decisão de manter em vôo uma aeronave com o reverso avariado, e de ter permitido uma decolagem com as condições de tempo registradas e o peso carregado pela aeronave.
O primeiro caso é uma discussão política relevante, com desdobramento nas áreas cível e, eventualmente, na área criminal.
O segundo caso é crime. Resta saber se a responsabilidade é apenas da TAM ou se compartilhada com a agência fiscalizadora.20/07/07 19:11
Radicalização irresponsável A radicalização política está assumindo proporções assustadoras. Está se tornando um fenômeno amplo e que, a qualquer momento, pode fugir ao controle do bom senso.
Os gestos do Marco Aurélio Garcia e do seu assessor, comemorando a "barriga" da cobertura do "Jornal Nacional" são condenáveis. Mas filmá-los dentro de sua sala, na intimidade, equivale a um grampo ilegal. É crime. Qual teria sido o comentário dos editores da Globo quando receberam o material que permitiu desviar o foco da discussão da cobertura para o gesto do assessor?
Lembro-me quando a "Veja", em um de seus momentos típicos, crucificou o jornalista Ricardo Boechat, em cima de frases tiradas de um grampo, em uma conversa informal. Um ex-diretor da revista, Mário Sérgio Conti, comentou com o então diretor da revista que se tivessem sido grampeadas as conversas deles com Pedro Collor, ninguém sairia ileso. E isso porque termos e frases (até gestos) em uma conversa privada em tudo diferem de uma manifestação pública. Muitas vezes o problema não é da frase ou do gesto: é do grampo e da publicidade dada ao ato criminoso de grampear sem autorização judicial.
Mesmo assim, tanto o gesto de Marco Aurélio como a repercussão da mídia mostram que conveniências políticas se colocaram acima da solidariedade com as vítimas ou da busca de saídas para o impasse aéreo.
Tem-se um jogo, hoje em dia, em que se condena Lula por seus erros e por erros de terceiros, na outra ponta, se ataca José Serra meramente por ter divulgado o número de mortos. Acenam-se com cadáveres do Metrô contra os cadáveres da TAM. E toda essa luta para quê? Não estão em jogo projetos de país, modelos alternativos de desenvolvimento, princípios políticos e ideológicos. É um pega-pra-capar que tem a mesma falta de lógica dos efeitos-manada.
A imprensa se machucou seriamente no período eleitoral. Não aprendeu a lição. Tem que cobrar Lula pela falta de regulação do setor aéreo, pela incompetência da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), pela politização anterior da Infraero. Tem que se cobrar um novo modelo para o setor aéreo.
Agora, quem ganha com esse tiroteio destrambelhado, com esse festival de acusações apressadas, com essa tentativa de criar um fato político em cima de grampos televisivos? Quem ganha com essa montagem de colocar uma frase solta do Ministro da Defesa reclamando de salário, como se fosse uma resposta à crise aérea?
É um preço muito alto que o país paga para se desviar o foco da discussão principal: a incompetência do governo para resolver a questão aérea, a incompetência da mídia para fazer uma cobertura técnica e isenta.
23/07/07 12:35
Apanhadão do acidente da TAM No quebra-cabeças sobre o acidente da TAM, os jornais acrescentam algumas peças a mais:
1. A "Folha" traz uma entrevista com um especialista alemão, que aponta a falta de clareza dos manuais do Airbus, na parte de frenagem.
2. O "Estadão" traz a informação de que a torre de controle registrou seis queixas de pilotos, de que a pista estava escorregadia.
3. O "Estadão" traz matéria explicando que o problema de Manaus foi erro técnico da manutenção. O que demonstra a falta que faz programas de qualidade total no sistema aéreo. Quando todo um sistema pode cair por falha de um eletricista, alguma coisa está profundamente errada com sua gestão operacional.
4. O "Valor" aponta o advogado Ives Gandra como um dos nomes cotados para Ministro da Defesa. A escolha seria incompreensível. Ives é um advogado bem relacionado, mas nada tem a ver com Defesa, nada entende de espaço aéreo e toda sua vida consistiu em trabalhar para clientes corporativos.
Na verdade um grande nome seria o coronel Oliva, que deixou o Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República e demonstrou ser dos poucos quadros do governo capaz de pensar o futuro de forma planejada, além de uma inegável vocação pública, até por conta de sua formação militar. O problema dele é ser coronel. E coronel não pode comandar general nem brigadeiro.
23/07/07 14:21
A questão IPT x ANAC Pelo que entendi do imbroglio IPT x ANAC, proponho um tema para discussão.
1. O IPT soltou um laudo avalizando o grau de adarência da pista de Congonhas.
2. A ANAC divulgou o laudo do IPT, como se fosse o documento necessário para a liberação da pista.
3. O IPT rebateu, dizendo que o laudo só falava de um aspecto da pista.
4. A discussão sobre o acidente é em torno de um aspecto da pista: o grau de adarência. E em relação a outros aspectos de segurança (o avião sem reverso e bastante carregado em dia de chuva).
Quem tiver elementos, fique à vontade para enriquecer a discussão.
Enviado por: José
Nassif,
Os pontos são os seguintes :
a) a pista tem aderência conforme projeto apresentado, ou seja, o IPT confirma que o projeto e a obra estão alinhados,
b) o IPT NÃO tem como responder se aquela aderência é suficiente para parar as aeronaves, pois esta questão passa pelo tipo de avião e seu peso, ou seja, alguns aviões pequenos pousam ali sem problemas, outros maiores pousam com pouco peso e outros maiores com muito peso requerem aquela aderência mas em um espaço maior,
c) aviação é engenharia de zero defeito, e por isto na revisão os equipamentos são trocados por horas de uso, mesmo que estejam funcionando
d) o problema em Congonhas é a incompatibilidade entre a lógica de zero defeito dos
aviões que estão sendo usados e a estrutura existente (tipo de asfalto e comprimento da pista), ou seja, a estrutura comporta a maioria dos pousos e decolagens, mas pode ocorrer problema na combinação de situações desfavoráveis (avião pesado em dia de chuva)
e) a simples POSSIBILIDADE (entendida como um % acima da tolerância baixa que se exige em conceitos aeronáuticos) de existir problema no pouso já indica que concentrar aviões daquele tipo em Congonhas foi um ato criminoso
f) o humor negro disto tudo para quem é engenheiro como eu : quem denunciou isto foram os advogados do Ministério Público, e advogado não faz conta nem usa raciocínio cartesiano para resolver problemas.
Resumo : a pista podia ser boa, mas o aeroporto reune condições de risco que não podem ser analisadas pelo IPT, que recebeu uma ordem específica de pesquisar a aderência.
Enviado por: Paulo Travaglini
O ponto central desta questão do laudo e liberação da pista é a responsabilidade profissional.
Uma obra desse porte tem uma ART (Anotação de Responsabilidade Técnica) registrada no CREA. Este documento indica quem é o Engenheiro responsável pela obra, bem como o escopo que será atendido.
O laudo do IPT é uma das informações que o Engenheiro responsável precisa para dar por concluída a obra e eventualmente liberá-la para os usuários.
Portanto a personagem central desta questão é o Engenheiro responsável da obra. (Em tempo: o Laudo do IPT tem também um Engenheiro responsável, porém responsável apenas pelo laudo e não pela obra).
O responsável pela fiscalização deste procedimento é o CREA-SP.
Suponho que as informações de ART no Crea sejam públicas, permitindo investigação por parte da imprensa.
Similarmente ao desmoronamento da obra do Metrô, o CREA-SP não se manifesta, não interfere, não vem a público justificar a própria existência.
25/07/07 11:46
Rescaldo da crise aérea O movimento dos pilotos da TAM, de denunciar as condições da pista de Congonhas, chama a atenção para essa loucura em que se transformou o setor aéreo por falta de regulação e fiscalização.
Não sei se é estratégia para defender a empresa, ou se é real. Dia desses um dos mais ativos dirigentes da antiga e combativa Associação dos Pilotos da Varig declarava que a pista era perfeitamente segura. Pista segura para quem pousa direito não é pista segura.
Agora, quando o Sr. Crise se manifesta:
1. Os pilotos resolvem boicotar Congonhas.
2. As companhias começam a evitar Congonhas.
3. O governo decide descongestionar Congonhas.
4. Os sindicatos começam a falar mais alto contra o desrespeito ao tempo de trabalho.
Todos esses agentes não se manifestaram esse tempo todo, ofuscados pelo "boom" do setor aéreo e sem que o governo Lula agisse com planos, normas e regulamentos adequados.
E aí me dá uma dúvida enorme. A aviação, assim como outros setores da atividade, trabalha com redução de risco. Ter cem por cento de segurança é impossível, o custo seria infinito. Um sistema responsável teria todos seus agentes trabalhando para minimizar ao máximo os riscos.
Até agora, o que se viu foram análises individuais de cada problema apontado. Ora, a análise individual vale quando todos os demais fatores de risco estão sob controle. Tomar chuva mata? Não, porque muita gente toma chuva e não morre. Pneumonia mata? Também não, porque muita gente tem pneumonia e não morre. E pneumonia com chuva? Aí aumenta o risco.
Mas aí se tem o seguinte quadro que se tira, após ler os especialistas:
1. Primeiro fator de risco: a pista de Congonhas. Saliente-se que a reforma somente foi feita depois de interferência do Ministério Público. Ainda não está claro qual o efeito final do asfalto sobre o acidente. Mas, pela leitura dos jornais, é evidente que o aeroporto não possuía diversos elementos extras de segurança, como o asfalto mole no final da pista, uma área de escape maior. Com pista, ou sem pista, quando se permitiu o vôo dos Airbus, diminuiu-se a segurança do aeroporto.
2. Segundo fator de risco: o fato do avião não ter um dos reversos funcionando (a propósito, ainda não entendi - e peço que algum leitor me informe - se um reverso funcione equivale a 50% da capacidade ou a zero, pelo risco do avião rodopiar se se jogar toda a força em um motor só). Não adianta dizer que o fabricante autoriza até dez dias, e que avião pode pousar sem reverso. Pode em condições ideais de pouso. Mas é evidente que, sem o reverso, é um fator a mais de aumento do risco, que pode ser a diferença em condições anormais de pouso. E uma companhia aérea séria e uma agência reguladora séria não vão se seguir ao pé da letra manual de avião, como se isso as absolvesse de eventuais futuros acidentes.
3. Terceiro fator de risco: o peso do avião, superlotado de passageiros e com tanques cheios. Também não adianta a TAM alegar que estava pouco abaixo do peso máximo autorizado para a pista. O peso máximo vale para condições normais de vôo.
Há uma incompetência e irresponsabilidade sistêmicas, cuja culpa maior é do órgão regulador, a ANAC, mas que atinge todos os atores.
Comandantes, que eram senhores absolutos da decisão de voar, aceitaram pousar em Congonhas até o dia do acidente. A Infraero só reformou a pista depois que o MP agiu. A ANAC nada fez no período. As companhias aéreas se limitaram a essa corrida maluca em torno dos índices de rentabilidade.
Hoje em dia, há dois públicos recebendo as críticas contra o governo Lula. Um que aceita qualquer bobagem contra o governo, e um que minimiza toda crítica por estar cercada de manipulação.
Está na hora de se recuperar o bom senso e se passar a cobrar intensamente competência, e medidas que alterem estruturalmente as graves deficiências do setor aéreo. E isso para se começar a pensar em uma mudança qualitativa na forma de governar.
Enquanto a bandeira da gestão e da qualidade não se tornar uma obsessão nacional, vai-se continuar nesse drama sem fim, que outro dia a Marina relatou aqui.
25/07/07 14:08
O olhar externo Fernando Duarte, em "O Globo" de hoje
Para Cristoph Gilgen, integrante do Conselho Técnico da IFATCA (Federação Internacional dos Controladores de Tráfego Aéreo), e controlador a serviço da Skyguide, estatal a cargo do tráfego aéreo da Suíça, o Brasil deveria aceitar uma auditoria externa independente no setor aéreo, como foi feito em seu país em 2002. Gilgen, que também participou de uma comissão da IFATCA que visitou o Brasil logo após o acidente com o Boeing da Gol, no ano passado, diz que o exemplo suíço mostra conseqüências positivas e pede um pouco mais de humildade por parte das autoridades brasileiras
No Brasil está se falando que a IFATCA está defendendo uma intervenção no setor aéreo. Foi assim na Suíça?
CRISTOPH GILGEN: Nada acontece se autoridades e governo não aceitarem ou mesmo apoiaram uma auditoria externa, ou a ida de estrangeiros ajudando na resolução de uma crise. Não adianta nem começar, se não for assim. E, a julgar pelas declarações do presidente da Infraero, fica a impressão de que o governo brasileiro não quer o apoio dos gringos, embora eu ache estranho quando ele fale de "nossos mortos". Intervenção é uma palavra muito forte, estamos falando de apoio
O exemplo da Suíça tem sido citado como caso de estudo. Você poderia falar um pouco mais sobre ele?
GILGEN: A Suíça sofreu eventos bem parecidos com os do Brasil entre 1998 e 2001. Houve desastres aéreos, incluindo o choque de dois aviões da Crossair perto do aeroporto de Zurique e a falência da Swissair. A reputação do setor aéreo na Suíça ficou bastante ruim, com sinceras dúvidas do público e da mídia sobre a eficiência e segurança. Foi quando o governo decidiu pedir ajuda e contratou os serviços de uma companhia holandesa, a NLR, que trabalhou na Suíça entre 2002 e 2003.
As coisas melhoraram muito.
Que tipo de trabalho foi feito?
GILGEN: A auditoria nos ajudou a ver exatamente onde a Suíça realmente estava em matéria de segurança aérea, mas um dos pontos principais foi trazer seriedade para as discussões bem emocionais entre políticos, mídia e opinião pública. E também paz para as pessoas diretamente envolvidas com o tráfego aéreo. Os holandeses fizeram muitas críticas, especialmente à falta de investimento no setor.
O caso brasileiro, porém, é um pouco mais complicado, como você mesmo deve ter visto durante as investigações da queda do Boeing da Gol, não?
GILGEN: O Brasil precisa de uma auditoria mais complexa, especialmente porque faltam estruturas civis mais firmes para regular o setor. Seria necessária uma agência reguladora, com a tarefa de supervisionar a aviação civil e o controle aéreo em particular. Uma espécie de olho do Estado, que asseguraria o cumprimento das normas nacionais e internacionais. Uma auditoria neutra pode determinar a real situação atual e detectar pontos-chave na modernização e mudança na malha aérea.
Isso não é tarefa para a IFATCA.
Mas a IFATCA tem recomendações?
GILGEN: Não estamos falando de um acidente específico, até porque o do vôo JJ 3054 não parece ter nada implicando o tráfego aéreo, por exemplo. Mas são situações como o apagão de sábado e os casos de "quase" que assustam. A IFATCA acha que é necessário reestruturar tudo a respeito do controle aéreo no Brasil, com melhores condições de trabalho para os controladores, a modernização do equipamento e um melhor treinamento para os trabalhadores do setor. Segurança não é dada, mas sim suada.
Enviado por: Carlão
Não esse Gilgen que deu, tempos atrás, uma entrevista sensacionalista ao Fantástico e, pouco depois, foi revelado que havia transmitido E-mail aos controladores de vôo brasileiros, exortando-os a manterem os peixes na rêde.
25/07/07 22:20
O manual do Airbus Direto do Emule, o manual do A312, para nossos especialistas.
28/07/07 21:43
Sobre a culpa do piloto Márcio Aith, da "Veja" - um dos autores da reportagem de capa desta semana sobre o acidente com o Airbus da TAM - é repórter sólido. Quando seus textos não sofrem as alterações amalucadas dos diretores de redação Eurípedes Alcântara e Mário Sabino - como no samba do crioulo doido sobre as supostas contas de homens do governo no exterior - produz matérias consistentes.
Mesmo assim, a capa está mais parecendo uma aposta em uma das versões do que fundada em dados comprovados.
O Tonico Ferreira, do "Jornal Nacional", fez uma boa matéria sobre as hipóteses prováveis. Uma das mais consistentes é justamente essa do piloto ter acionado de maneira errada os manetes. No meio da semana, aliás, foi a hipótese mais ventilada, inclusive depois da Airbus ter soltado um comunicado reforçando os procedimentos a serem adotados com o manete, quando um dos reversos está parado.
Mas ainda é uma hipótese. Antes de se condenar o piloto morto, há que se entender o que o levou ao erro. Pode ter sido um descuido, manejando o avião como se os dois reversos estivessem funcionando - o que mostra a gravidade de voar com um aparelho sem um reverso, já que altera completamente o modo com que os pilotos foram condicionados a pousar. Mas pode ter sido um sinal errado do sistema de computação.
Segundo o JN só a degravação da caixa preta poderá elucidar o caso.
Postado domingo 12:28
Se, com o reverso pinado, a mudança do modo de pilotar é tão drástica, a ponto de ter provocado dois acidentes nos últimos anos, e se o piloto era experiente, há os seguintes fatos a serem aputados:
1. É quase impossível que uma companhia como a Airbus não tivesse colocado alertas estridentes, na hipótese de algum piloto repetir a manobra errada. Não se trata de mudança conceitual no aparelho. Trata-se apenas de cruzar dados e, na hipótese do manete estar errrado, com o reverso pinado, emitir alarmes com estardalhaço. Se não houve o alerta, ou decorreu de um descuido criminoso da Airbus, ou porque o sistema não funcionou. E aí é problema de manutenção.
2. Se o reverso pinado já tinha provocado dois acidentes com o Airbus, é evidente que qualquer sistema responsável de prevenção, seja da companhia ou do controle aéreo, trataria de listar aparelhos com esse problema e, no momento do pouso, tratar de emitir um alerta adicional ao piloto.
3. Esse conjunto de fatores, mais as condições de trabalho da tripulação, é que poderão explicar as circunstâncias em que o erro teria sido cometido.
29/07/07 13:59
A dura mudança de rota Enviado por: André Borges Lopes
Contribuições de um ex-aluno do professor Chaparro para melhor compreensão do bom jornalismo praticado pela nossa semanal preferida:
Publicado no site da revista "Veja":
"A Aeronáutica se negou a comentar neste fim de semana as INFORMAÇÕES EXCLUSIVAS divulgadas na atual edição de VEJA, que mostra que o avião da TAM que caiu em São Paulo teve erro humano no pouso." (grifo meu)
Esse "furo" sobre o possível erro de operação do piloto em função do reverso "pinado" já estava aqui no Blog, creio que no dia seguinte ao da tragédia. É considerada a versão mais provável segundo o jornal espanhol El País há pelo menos cinco dias. Tem dois antecedentes documentados e motivou, depois do acidente em Congonhas, um comunicado formal da Airbus aos usuários do avião. Haja exclusividade.
Voltando ao que está publicado no site:
"As investigações revelam ainda que, apesar da chuva, não houve aquaplanagem nem falha no sistema de freios."
Compare-se essa declaração com o título do box da página 67 da edição 2018 (semana passada) da revista impressa:
"Para a maioria dos profissionais, o sistema de freio falhou e houve aquaplanagem".
Dentre os dez "profissionais ligados à aviação" (anônimos) ouvidos pela Veja, a hipótese de falha nos freios ganhava por 8 X 1 (com uma abstenção) e a de aquaplanagem por 7 X 3. Nenhuma surpresa para quem conhece o critério da redação de Veja para selecionar a opinião de especialistas.
Para coroar, qual o título da matéria no site?
"FAB silencia sobre o erro do piloto. E especialistas confirmam falhas em pista"
Quanto à FAB, ela apenas segue fazendo o que fez desde o início dessa (e de outras) investigações de acidente: não comenta hipóteses até a conclusão das investigações.
E quais são as considerações dos "especialistas" da vez? Voltemos ao texto do site:
"Em reportagens divulgadas neste domingo pelos jornais O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo, especialistas do setor aéreo confirmam outra informação de VEJA em sua última edição -- a de que as características da pista de Congonhas também contribuíram de forma decisiva para o desastre em SP. Curta e sem uma área de escape adequada, a pista agravou o acidente, por dificultar a reação dos piloto." (sic)
Ou seja: sorrateiramente, saem do texto (mas não do título) a aquaplanagem, a falta do "grooving", o "holiday on ice" do Mainardi , a "reforma inacabada", a entrega precipitada da pista pela Infraero e tudo mais o que foi incessantemente martelado por mais de 10 dias pela imprensa nativa. As "falhas" da pista decorrem do fato de ter apenas 1950 metros, não ter área de escape e estar no meio da cidade. "Falhas" que têm, pelo menos, uns 30 anos de existência, mas só agora foram reveladas por Veja em sua última edição.
Que beleza, não? Humilde sugestão minha para o próximo "furo" da Veja: "Epecialistas da Airbus, que preferem não se identificar, afirmam que avião poderia ter pousado em segurança apesar do reverso desativado, da chuva e do equívoco dos pilotos, caso a pista tivesse 10 km de extensão e Lula não estivesse na Presidência da República"
PS: curiosa essa colocação de que o suposto erro dos pilotos tenha sido a "causa inicial" do acidente. Confirmada a hipótese da manete mal posicionada, na minha opinião, a "causa inicial" é o reverso desativado, a causa secundária são os procedimentos confusos da Airbus para pouso nessas condições, a causa terciária é o erro dos pilotos em condições não usuais. Chuva, pista relativamente curta e condições do aeroporto, são agravantes.
Por outro lado, transformar um aeroporto limitado como Congonhas em principal "hub" da aviação nacional é uma evidente irresponsabilidade - que deve ser dividida entre o governo e as companhias aéreas.
ComentárioNo dia do acidente participei de uma entrevista com um especialista em segurança no Jornal da Cultura. No intervalo, ele dizia que a hipótese mais provável era do reverso não ter funcionado. No ar, fugia da hipótese. Nos dias seguintes, o efeito-manada desestimulou as análises nessa linha. Só quando começou a se esgotar a história do "grooving" e da pista é que os jornais passaram a explorar, no início timidamente, a hipótese do reverso.
29/07/07 14:08
Dos leitores enviado por: césar figueiredo
Nassif:
vejo como álibi da TAM e até uma atitude irresponsável, colocar a culpa nos pilotos.Com um reversor travado(inoperante) as manetes não têm absolutamente ação de frenagem.eficaz. Também botar culpa na pista não faz sentido,já que outras aeronaves pousaram ali imediatamente antes e depois do acidente!
Os pilotos podem ter acionado o reverso esquerdo,com empuxo total, em ato de desespero.
enviado por: Marcel Stefano
Nassif,
uma hipótese que estão ventilando mas não está muito bem explicada é de que os manetes de potência e reverso estavam em posições erradas (até aí tudo bem). Mas os jornais argumentam que essa foi a causa do avião sair à esquerda no final da pista. Esse final é que está mal explicado. Pq se o manete estava errado o avião já tenderia a sair à esquerda desde o começo do pouso e não só no final. Acredito que a curva à esquerda ao final da pista foi mais uma tentativa de cavalo de pau com o avião para tentar pará-lo "na marra" do que outra coisa.
enviado por: Marco Vitis
A imprensa deveria republicar as declarações do Coronel Franco e do Prof. Jorge Leal (da POLI - USP) que afirmaram categoricamente que o acidente fora causado pela pista. Afirmação dada no dia seguinte ao acidente. Por que um jornalista (que mereça a função) não vai perguntar a esses dois senhores por que eles mentiram para a sociedade brasileira? Daria uma boa matéria: muito instrutiva sobre o papel social da imprensa
Enviado por: Silvana
Se seguirmos a nossa mídia, chegaremos a conclusão que a caixa preta além de preta, é pobre e vota no Lula.
01/08/07 13:08
O reverso e o "spoiler" Da reportagem do Fernando Rodrigues, hoje e ""Folha", trazendo fatos novos:
"Ao tocar o chão na pista principal de Congonhas, uma voz na cabine diz: "Reverso um apenas". Ou seja, o piloto e o co-piloto sabiam que só um reversor estava operante".
"Em seguida, outra frase: "Spoiler nada...". Ou seja, os spoilers (freios aerodinâmicos na parte de cima das asas), que abrem automaticamente no pouso, não funcionaram".
"O tom fica dramático: "Desacelera, desacelera, desacelera!". Aumenta o pânico: "Não dá, não dá, não dá". Por fim, a frase já conhecida: "Vira, vira, vira"."
"Quem ouviu as gravações completas e repassou o conteúdo à Folha não quis revelar as palavras finais captadas dentro da cabine de comando, segundos antes de o avião explodir, matando 199 pessoas".
01/08/07 13:19
A defesa pós-morte Se o piloto lembrou, pela degravação da cabine, que havia só um reverso funcionando, ainda dá para falar em erro humano no acidente? Ou foi problema mecânico mesmo?
01/08/07 16:40
O fim da operação-abafa Finalmente, o jogo clareou. Assim como ficaram claros os motivos de reportagens recentes deixando de culpar o governo, poupando a TAM e lançando a culpa sobre o piloto morto.
Foi montada enorme operação-abafa entre autoridades aeronáuticas, companhia aérea e alguns órgãos da mídia, visando transferir a responsabilidade do acidente dos ombros das autoridades e da TAM para quem não podia mais se defender.
No início, a cegueira ideológica da grande mídia, jogou toda a responsabilidade no colo do governo, da pista de Congonhas, do "grooving". Deixaram-se manipular ou manipularam fontes porque há muito se perdeu o compromisso com o jornalismo: o que importava era apenas utilizar politicamente o acidente ou garantir o escândalo do dia.
Quando autoridades aeronáuticas e a TAM perceberam que não conseguiriam esconder indefinidamente as causas do acidente, montou-se a conspirata,
Constatou-se que o acidente ou foi causado por falha humana ou por problemas mecânicos. Se por problemas mecânicos, a responsabilidade batia direto na TAM e nos órgãos fiscalizadores. Para poupar a companhia, órgãos de imprensa, que até instantes atrás eram capazes de culpar o governo até pelas chuvas, procederam a uma mudança de rota. Aceitaram isentar as autoridades, encampando a versão de que o culpado era o piloto morto.
A verdade agora vem à tona, os pilotos mortos podem dormir em paz. Mas os brasileiros dormem cada vez mais intranqüilos, com a falta de manutenção nas aeronaves e no jornalismo.
CPIs
Continuo contra CPIs. Mas a exigência do parlamento, de ouvir a transcrição dos diálogos da cabine, gravados na caixa-preta do avião, foi fundamental para elucidar essa trama.
01/08/07 17:57
O depoimento do comandante Ontem a CPI ouviu o comandante José Eduardo Batalha Brosco, que pilotou o airbus da TAM na véspera do dia do acidente. Um relato saiu no Globo Online.
A ênfase do comandante - e da matéria - é nas condições de Congonhas. O título, aliás, é "Piloto da TAM critica pista de Congonhas na CPI". O comandante é apertado pelo relator da CPI, deputado Marcos Maia (PT-SR) sobre supostos problemas enfrentados pela aeronave.
O relato que saiu no Globo Online:
"(...) O relator pediu ainda que Brosco ajudasse a CPI a entender alguns códigos escritos por mecânicos de manutenção das aeronaves da empresa em relatórios dos movimentos, feitos no dia do acidente, na aeronave que explodiu. O piloto informou que o relatório parecia indicar que teria acontecido uma falha no sistema de flap e no trem de pouso e frenagem da aeronave e que, depois de efetuada a manutenção, isso teria sido corrigido. Depois, ressalvou, diante da pergunta do relator se isso seria a demonstração de que a aeronave já teria apresentado problemas de frenagem em Campo Grande:
- Não diz que aconteceu um problema, diz que foi feito um check. Pode ou não ter tido problema.
Para o relator, os relatórios de manutenção da aeronave que explodiu terão que ser melhor analisados e isso poderá significar a convocação dos mecânicos que fizeram essa checagem.(...)
01/08/07 22:53
Explicando a operação-abafa Alguns leitores pedem explicações mais detalhadas sobre o que considerei a operação-abafa.
É simples. Quando ocorreu a tragédia, como sempre tem ocorrido nesses momentos de catarse, a mídia saiu correndo atrás de um culpado. Com a politização a pleno vapor, o enfoque preferencial das matérias era procurar jogar a culpa no governo.
Muitas das falhas apontadas são reais, como a falta de regulação do setor, o fato das empresas aéreas terem se apropriado da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), a imprudência de permitir a super-lotação de Congonhas, a pista recém-recapeada. Mas nenhum desses fatos foi decisivo para a queda do avião.
No início, a TAM escondeu qualquer informação sobre a manutenção do avião. Aí se descobriu a que o reverso não estava funcionando. Seguiu-se um festival de informações técnicas desencontradas, alegando que o reverso não era relevante. Depois, se admitiu que o reverso pinado exigiria procedimentos diferentes do pouso normal, e por alguma razão esses procedimentos não haviam sido seguidos.
Quando ficou claro que o reverso poderia ter provocado o acidente, havia duas hipóteses: ou erro do piloto, ou problemas mecânicos. Problemas mecânicos podem ser de estrutura (softwares com bugs) ou de manutenção. Se de manutenção, a responsabilidade é da empresa, a co-responsabilidade das autoridades fiscalizadoras.
Em geral, nesses acidentes, o resultado final das investigações leva tempo para aparecer, o caso esfria, é esquecido, morre. E, por uma questão de auto-defesa, o setor sempre evita incriminar-se. Por isso mesmo, a tese do erro humano era a mais cômoda e poder-se-iam jogar as conclusões para daqui um ano, quando o assunto já estivesse esfriado.
Quando a caixa preta foi para os Estados Unidos, e os deputados decidiram acompanhar a degravação, percebeu-se que não daria para manter as conclusões em sigilo. A caixa-
preta inevitavelmente apontaria problemas mais sérios do que a pista ou um eventual erro do piloto.
O que as fontes fizeram? Se anteciparam à CPI, procuraram a "Veja" e a "Folha, que embarcaram na tese do erro do piloto. Só que, para embarcar nessa tese, tiveram que isentar as autoridades fiscalizadoras, e deixar de lado todas as acusações indevidas que haviam lançado contra o governo. A culpa ficaria sendo exclusivamente de um piloto que não poderia se defender. Esse foi o cerne da operação-abafa.
Quando os deputados da CPI se deram conta dessa jogada, decidiram liberar os diálogos dos pilotos na cabine. E aí a operação-abafa começou a ruir.
É possível que pilotos esquecessem que o reverso não estava funcionando e adotassem os procedimentos errados. Mas a degravação mostra que, na hora do pouso, ambos estavam alertas a esse problema. Como supor que cometeriam um erro minutos depois de terem constatado o problema?
Com isso, a tese do problema mecânico se fortalece. E aí, empresa e autoridades fiscalizadoras terão que prestar contas à opinião pública.
Comentário
Por questão de justiça, ressalve-se que Fernando Rodrigues, da "Folha", não embarcou totalmente na versão da culpa do piloto. Em sua reportagem, mencionou o problema com o spoiler do avião.
02/08/07 13:57
Famílias de pilotos evitam sair e ver notícias Fabiane Leite, no "Estadão" de hoje
Maria Helena, a mulher do co-piloto Henrique Stephanini Di Sacco, do vôo 3054 da TAM, não quer mais assistir TV, ouvir rádio ou ler jornais depois que ganhou destaque o noticiário sobre possível falha humana como causa do acidente.
"Conclusões sobre o caso têm sido apresentadas apressadamente, antes do fim das investigações. Só confiamos nas informações passadas por conhecidos da família", disse ela. "E acrescento que até que, no meu entender, receba informações oficiais, ainda não pensamos em nenhuma providência sobre a divulgação de falha humana, pois a família no momento só está à espera da identificação do pai e do marido que nos faz tanta falta", informou ao ser questionada se a família tomaria providências contra as acusações contra o piloto.
Maria Helena, que é conhecida como Milena, responde rápido quando lhe perguntam sobre as possíveis causas do acidente. "Só posso falar dos 30 anos que passamos juntos."
Já a mãe do outro piloto do vôo, Kleyber Lima, que, segundo a TAM, comandava a aeronave, não anda mais nas ruas e evita conversar sobre o caso. "A gente recebe com espanto (as notícias). Conhecia bem meu tio, ele tinha mais de 20 anos de experiência. É muito difícil alguém fazer aquilo, você esquecer um manete de aceleração para frente, acho que nem um piloto começando faria isso", afirmou o sobrinho de Kleyber, Sheldon Lima, de 19 anos, que tem permanecido na casa da avó. "A mãe dele está muito traumatizada, triste em vê-lo acusado por grandes veículos de comunicação. Ela já tem idade. Costumava caminhar, fazer tricô. Não caminha mais. Ainda não conseguiu se
recuperar. Ela sofre muito, até porque ele era a vida dela e ela, a dele", continuou Sheldon. As duas famílias informaram que têm recebido assistência da TAM desde a data do acidente.
02/08/07 15:35
A segunda morte dos pilotos Enviado por: weden
Imprensa agora tenta se eximir de acusação indevida
Cinismo ou covardia? A divulgação apressada de que o acidente aéreo foi causado por erros do piloto deve-se exclusivamente à imprensa.
Nenhum órgão do Estado, nenhuma fonte do Congresso, ou das empresas envolvidas vieram, oficialmente, a público para afirmar, por meios próprios, que os pilotos eram os culpados.
Pelo contrário: a Aeronáutica sempre alertou que as investigações jamais são encaminhadas para encontrar culpados.
Isso foi dito diversas vezes pelo comandante
Apesar de duvidar da seriedade das CPIs, também não vi congressistas irem às ruas alertar para o erro dos pilotos.
Quem divulgou esta notícia, sem uma apuração mais cuidadosa, e sem o zelo necessário para não gerar manchetes sensacionalistas e acusatórias foi a revista Veja e o jornal Folha de SP.
Foram estes órgãos que estamparam sem qualquer pudor que a culpa cabia aos pilotos.
Se era uma das causas possíveis, que se publicasse apenas como causa possível.
Mas a ênfase espetacular puxando tiragens não deixou margem para outra interpretação.
Não é permitido ao jornalista errar a mão na utilização das palavras. Isto é tão grave quanto um médico que opera de forma despreparada os instrumentos cirúrgicos.
Cabe aos editores e aos repórteres, exclusivamente, escolher os termos que comporão seus textos, seus títulos.
Cabe aos editores mensurar os efeitos negativos e perniciosos que manchetes como aquelas podem ter sobre as famílias dos acusados.
Não há nenhuma força "superior", em situação democrática, que obrigue jornais a publicar o que publicam.
Cabe também aos profissionais de mídia assumir todo e qualquer erro de informação que por acaso cometam.
No entanto, começou um movimento, misto de cinismo e de covardia, para tentar afirmar que o erro de informação veio de alhures.
Ninguém que saiba o funcionamento mínimo de uma redação vai cair nessa falácia.
A Folha de SP e a Veja, possivelmente, vão dizer que a acusação contra os pilotos partiu de outros interessados, tanto quanto um dia órgãos de imprensa disseram que um delegado era o grande responsável pelo escândalo da Escola Base.
Jornalistas e editores devem assumir seus erros e não repassá-los adiante.
Foram criticados imediatamente quando divulgaram esta falsa notícia de forma tão apressada.
De forma arrogante, não voltaram atrás, não pediram desculpas.
Agora fazem matérias sobre a dor dos familiares causada pela divulgação de uma notícia, como se estivessem reparando erros de outrem.
Não se sabe ainda de quem é a culpa, ou quais foram os fatores todos que desencadearam o acidente.
Mas uma coisa é certa: a culpa pelo segundo sofrimento da família dos pilotos é exclusivamente da imprensa.
02/08/07 23:02
O peso do Airbus da TAM Enviado por: Gustavo
Vou postar aqui um dado técnico, mais como frustação de não ver a imprensa querendo descobrir algo de fato:
Cálculos sobre o peso do Airbus A320 (Fonte: airbus.com)
Fazendo contas bastante conservadoras (que seguem abaixo com cálculos e dados oficiais), tudo indica que a aeronave da Tam estava acima do limite do peso. Três fatores serão importantes para se confirmar esses dados: 1) o cálculo DETALHADO do peso oficial da aeronave (a ser investigado por algum jornalista interessado), 2) as informações dos familiares quanto ao peso da bagagem dos passageiros, e 3) responder se há uma balança que calcule o peso das aeronaves nos aeroportos, se o computador de bordo faz isso, ou se o procedimento é o cálculo mesmo.
Para que o cálculo bruto da Tam (62,7 toneladas) esteja certo, a média de bagagem de check-in para cada passageiro teria que ser de 6,6 kg (excetuando correio e carga, daí o conservadorismo - e sabendo que o limite brasileiro é de 23 kg).
O excesso de peso poderia explicar a provável pane dos computadores (porque, para que as máquinas funcionem bem, é preciso respeitar os limites dentro dos quais elas são projetadas).
Seguem os dados:
Peso máximo de rampa: 77,4 toneladasPeso máximo de decolagem: 77 toneladasPeso máximo de aterrissagem: 66 toneladasPeso máximo com zero combustível: 62,5 toneladas *Capacidade máxima de combustível: 29.840 litros (23.872 Kg) **Peso básico operacional (PB): 42,4 toneladas ***
Capacidade de carga paga (peso dos passageiros + bagagens)16,6 toneladasCapacidade de passageiros recomendada: 150 passageirosMédia de peso por passageiro (incluindo bagagem de mão): 75 kg
* Avião totalmente carregado faltando apenas o combustível nas asas.** Densidade do querosene: 0,8 g/cm3.*** É o avião vazio, incluindo fluído hidráulico, óleo, combustível não drenável, poltronas na versão passageiro, e os equipamentos fixos. O PB é informado pela fábrica, mas a aeronave deverá ser eventualmente pesada pois as trocas de equipamentos, pintura, modificações estruturais, grandes revisões, sujidade e umidade acumuladas poderão alterar o PB.
Vôo 3054:
Dados da segurança para pouso em Congonhas sem reverso:Carga máxima: 64,5 toneladasPeso do avião declarado pela Tam: 62,7 toneladas
Cálculos da pesagem:Valor do peso do combustível declarado pela Tam: 9,2 toneladasPassageiros e tripulação: 186 pessoas (186 x 75kg: 13.950kg)Peso básico operacional: 42,4 toneladasCombustível de saída: 9,2 toneladas (contestado por um mecânico da Tam)*Combustível de chegada: 5,2 toneladasTotal parcial: 61,55 toneladas
Para que a conta da Tam feche, o peso da bagagem (dado que não tenho) deveria ser de 1.150 kg.
Limite brasileiro de peso de bagagem (por passageiro): 23kg Peso estimado da bagagem do vôo 3054 (sem excedente): 1.150 kgPeso estimado da bagagem por passageiro (174), para que a conta da Tam feche: 6,6 kg
* (...) um mecânico que teria inspecionado a aeronave teria afirmado que ela teria 12 t de querosene. A TAM teria informado que o Airbus decolara de Porto Alegre, ponto de origem do vôo, com 9,2 t. Cálculos de consumo indicariam que o trajeto não consumiria mais do que 4 t de combustível (folhaonline).
04/08/07 10:41
Dos fatos e das manchetes Na "Folha" de hoje:
Manchete principal: "Avião acidentado não tinha defeito, afirma Airbus".
Manchete interna: "Airbus isenta avião e indica falha operacional".
Submanchete: "Nota da empresa afirma que a aeronave A-320 não apresentou defeito e que o manete não foi desacelerado corretamente pelo piloto".
Textos:
"A comissão de investigação da Aeronáutica irá analisar o motivo da falha e não se pronunciou oficialmente sobre o comunicado"
"(...) A comissão de investigação da Aeronáutica -da qual participa representantes da Airbus- irá analisar o motivo da falha e não se pronuncio oficialmente sobre a questão, apesar de aprovar o texto da AIT. Já foi levantada a hipótese de que algum problema mecânico possa ter impedido que o manete fosse desacelerado até o ponto morto. E ainda que um defeito técnico possa ter impedido o piloto de trazer o mesmo manete para o reverso depois de tocar o solo ou ainda quando os pilotos tentavam frear após perceber o problema".
"Estadão" de hoje:
Manchete interna: "Airbus: caixa-preta não indica defeito"
Sub-manchete: "Documento comprova que manete não estava na posição correta e pilotos frearam em toda a extensão da pista"
Textos:
"Airbus chegou à conclusão de que não há registro na caixa-preta de que tenha ocorrido defeito na aeronave. A empresa não descartou a existência de falhas - informou apenas que nada foi constatado".
Outra matéria: "Aeronáutica diz que dados não são conclusivos"
Texto: "A Aeronáutica informou ontem que a nota técnica divulgada pela Airbus é apenas uma descrição das informações contidas nas caixas-pretas de dados e de voz, e não a conclusão sobre a tragédia do vôo 3054. Os militares salientaram que ainda não é possível determinar se a posição incorreta dos manetes indica erro operacional dos pilotos ou se houve pane nos computadores".
08/08/07 17:24
A notícia órfã Ontem o Ali Kamel publicou uma coluna na página de Opinião do "Globo", "A grande imprensa".
Sobre a cobertura do acidente da TAM, Kamel se defende: "A grande imprensa se portou como devia. Como não é pitonisa, como não é adivinha, desde o primeiro instante foi, honestamente, testando hipóteses, montando um quebra-cabeça que está longe do fim".
"Testando hipóteses" é outro nome para falta de discernimento. Em qualquer cobertura competente, enquanto o quadro não está claro montam-se cenários de investigação, análise de probabilidade, linhas de investigação. Evitam-se afirmações peremptórias, e apela-se para a criatividade para produzir manchetes de impacto sem recorrer conclusões taxativas.
De cara, se poderiam alinhavar várias possibilidades para o acidente da TAM, que seriam o ponto de partida. Toda a cobertura seguiria esse roteiro, procurando checar a probabilidade de ocorrência de cada possibilidade ou delas combinadas. A partir daí, o Sr Fato se incumbiria de descartar algumas hipóteses e reforçar outras.
O "testando hipóteses" do Kamel consistia em bancar aposta total na Hipótese A. Dias depois, esquecer a Hipótese A e bancar toda a aposta na Hipótese B. Depois, na Hipótese C, até acertar. Mas não houve acerto. A resposta final - a degravação dos diálogos na cabine - eliminou todas as hipóteses anteriores.
E aí se entra no modelo de gestão da notícia adotado pelas Organizações Globo. De alguns anos para cá resolveu-se homogeneizar o entendimentos dos jornalistas em relação aos temas de cobertura. Esse papel doutrinário coube a Kamel.
Não sei qual é a experiência de Kamel no front da reportagem. Mas foram dois os resultados. Primeiro, acabou-se com a diversidade de enfoques, marca de jornalismo plural. Segundo, perdeu-se o sentimento da rua, o sentido da reportagem. Os repórteres passaram a subordinar a cobertura aos desígnios do "aquário". Houve um divórcio dos pais - o "pai" "aquário" e a mãe reportagem - e o resultado deixou a notícia órfã.
Nem vale a pena comentar as acusações generalizantes e conspiratórias de Kamel, na seqüencia do artigo, contra os críticos da cobertura. Ele não está escrevendo para os leitores. Apenas se justificando para os donos da empresa.
15/08/07 21:44
O acidente aéreo e o Blog Encontrei minha colega Maria Lídia, da TV Gazeta. Me disse que a cobertura do acidente, pelo seu jornal, se orientou fundamentalmente pelas análises e informações que vocês ajudaram a colocar no Blog.
Especialmente o cálculo do peso do avião, preparado pelo Gustavo, que, segundo ela, deixou todos seus entrevistados da área surpresos, por perceber que ali estava um dos pontos centrais, que a cobertura da grande mídia não aprofundou.
21/08/07 11:36
Rescaldo do acidente da TAM Duas informações sobre o acidente da TAM que, certamente, terão desdobramentos na esfera judicial.
Um, a informação de que, para desobstruir a pista de Congonhas, a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) apresentou à juíza uma relação de medidas de segurança, incluindo a proibição do avião pousar sem o reverso funcionando. Fica claríssimo que, ao contrário do que foi exaustivamente afirmado nos primeiros dias do acidente, pousar sem o reverso era reduzir a segurança do pouso.
Manter a diretoria da ANAC, depois da divulgação desses dados, é rematada imprudência. Assim como manter conselheiros em agências que não disponham de currículo e competência técnica comprovada.
O segundo, a informação de que no, vôo anterior do Airbus, o piloto havia errado o procedimento de pousar com o reverso pinado. Significa que a TAM foi descuidada no treinamento dos pilotos e, mesmo depois do piloto ter errado na operação, não emitiu um alerta geral para os demais pilotos.
Mesmo que se comprove que não houve erro do piloto no acidente, a informação mostra a necessidade urgente de uma auditoria completa nos sistemas de manutenção e treinamento das companhias aéreas.