Leilão de jardim
Quem me compra um jardim com flores?
Borboletas de muitas cores,
lavadeiras e passarinhos,
ovos verdes e azuis nos ninhos?
Quem me compra este caracol?
Quem me compra um raio de sol?
Um lagarto entre o muro e a hera,
uma estátua da Primavera?
Quem me compra este formigueiro?E este sapo, que é jardineiro?E a cigarra e a sua canção?E o grilinho dentro do chão?
(Este é o meu leilão.)
Cecília Meireles
A JoaninhaA Joaninha
com suas pretas pintinhase seu corpo de brasa acesaé uma graça, uma beleza.
É a coisa mais fofinhade toda a natureza.
Sabendo de sua beleza,a Joaninha se olha no espelho
cheia de vaidadee ajeita bem as pintinhascomo se fosse à cidade.
A Joaninhatá gordinha,
mas dá gosto de ver,dia e noite,noite e dia,
não pára de comer.A Joaninha
só tem grande medoquando vê um passarinho.Pra se salvar, a Joaninha
também tem o seu segredo:solta logo um cheirinho
que tonteia o passarinho.Elias José
As borboletas
Brancas Azuis
AmarelasE pretasBrincamNa luz
As belasBorboletas
Borboletas brancasSão alegres e francas.
Borboletas azuisGostam muito de luz.
As amarelinhasSão tão bonitinhas!
E as pretas, então . . .Oh, que escuridão!
Vinicius de Moraes
As abelhas
A AAAAAAAbelha mestraE aaaaaaas abelhinhas
Estão tooooooodas prontinhasPra iiiiiiir para a festa.
Num zune que zuneLá vão pro jardim
Brincar com a cravinaValsar com o jasmim.
Da rosa pro cravoDo cravo pra rosaDa rosa pro favoVolta pro cravo.
Venham ver como dão melAs abelhinhas do céu!
Vinicius de Moraes
MEMÉIA, A CENTOPÉIA
Maria Hilda
Lá vem Meméia, a centopéia,Na cabeça tem uma idéiaDeixando-a triste e nervosa:Quem levou seus sapatos cor-de-rosa?
Todos têm um laço de fitaFeito pela minhoca Rita,As solas são de ouro do solFeitas pelo senhor caracol.
Neles bordou o gafanhoto,De mão esquerda porque é canhoto,As verdes folhinhas de murtaCom linha de grama curta.
As fivelas, feitas com amor,Todas de botão de flor,Pela cigarra AzulinaNum cantinho da campina.
E foi colado cada sapato,Isso é verdade, é um fato,Com resina vinda da colméiaPara enfeitar os pés de Meméia.
Sumiram, ninguém sabe nem viu,Os sapatos no mês de abrilDeixando descalça MeméiaProcurando entre as azaléias.
- Sorri Meméia lindinha!Sou eu, o grilo, nesta banquinhaMunido de viola e de pandeiroSendo o cantor o meu velho companheiro,
O canário-da-terra soltando a voz.Tem tambor de casca de nozPara o esquilo fazer batucadaEntrando pela madrugada,
Em frenético reboladoPara não ficar bicho paradoE assim restaurar a tua alegria.Meméia, tristeza só dá agonia!
Convite
Poesia é brincar com palavras como se brinca com bola, papagaio, pião.
Só que bola, papagaio,pião de tanto brincar se gastam.
As palavras não: quanto mais se brinca com elas mais novas ficam.
Como a água do rio que é água sempre nova.
Como cada dia que é sempre um novo dia.
Vamos brincar de poesia?
José Paulo Paes
Minhoca
Há furos pequenosPor todo terreno
São casas, são tocasDas finas minhocas.
Com tantos furinhosA terra é tão boa.
Minhocas não furam A terra à toa!
Maria da Graça Almeida
A minhoca
A minhoca- Quem diria!
Faz a terra respirar.
Jardim que nãoTem minhoca
Pode ter falta de ar.
(Marciano Vasques)
ENTREVISTA com Chico dos Bonecos
• Francisco Marques Vírgula Chico dos Bonecos
O Chico nasceu Francisco Marques em Belo Horizonte (MG), em 1959. É poeta, contista e "desenrolador de brincadeiras", como ele gosta de dizer. Trabalha há vários anos com formação de professores da rede pública e privada. Publicou os livros Palavramiga, Garranchos (Paulinas), A Biblioteca dos Bichos (Formato) e Galeio: antologia poética para crianças e adultos (Peirópolis), que foi premiado pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) como o melhor livro de poesia de 2005.
• O que é brincar?
Para a criança, brincar é uma questão de sobrevivência. É o recurso que ela possui para compreender a vida e interferir no mundo. A criança não construiu ainda o Pensamento Lógico, Analítico, Científico - esta maquininha de tecer idéias que caracteriza o mundo adulto. A criança pensa com a sua maquininha do Pensamento Poético – integrador, corporal, musical. Para a criança, Brincar e Pensar fazem parte do mesmo movimento. Nós, adultos, não precisamos ficar tristes... O Brincar, assim como a Infância, não são privilégios da criança. Estas duas raízes definem a própria humanidade: ludicidade e infância. E nós, adultos, pais, tios, avós e professores, precisamos aprender com a nossa infância. Quantas vezes, nós, pais, nos surpreendemos fazendo com os nossos filhos o que nós detestávamos que os nossos pais faziam conosco? Aprender com a nossa própria infância, e com a infância das crianças que nos rodeiam, ajuda a enfrentar a vida com mais jogo de cintura, mais paciência. E como nós, adultos, perdemos a paciência tão facilmente! Perder a paciência é perder o humor – e perder o humor é perder a inteligência. Quando a pessoa está brava, a gente não costuma dizer que ela está "emburrada"? Pois é! Ficou burra, perdeu a inteligência. O que é uma falta de respeito com o burro – um animal de opinião, inteligentíssimo, muito brincalhão.
"A criança é um casulo, apenas.E não há entomologista no Universo
que possa dizer pelo aspecto exteriordeste casulo, as cores do inseto que
palpita lá dentro.“
Humberto de Campos
Que lugar a brincadeira deve ter na escola?
O lugar da brincadeira na educação é, simplesmente, um lugar central. O que é a tão falada "construção do conhecimento"? Ela é, sempre, o resultado de uma atividade de investigação, experimentação, exploração.
E o que é o coração da brincadeira? Ele é, sempre, tecido por estes três verbos: investigar, experimentar, explorar. Esta maneira de compreender a educação está se espalhando e se enraizando – e de maneira muito especial nas redes públicas. Estatisticamente, podemos ser minoria ainda – mas esta filosofia é crescente. André Michelet, em "O mestre e o jogo", anuncia: "É toda uma revolução que faz cambalear o ensino: seu centro não é mais a pedagogia e sim a criança. O que é o jogo na escola? Nada mais do que um dos aspectos dessa revolução, um elemento que não pode separar-se dela, já que está intrinsecamente unido ao respeito da pessoa da criança e de suas necessidades." (Revista Brasileira de Psicopedagogia, número 17, SP.)