LETRAMENTO PARA ALUNOS SURDOS ATRAVS DE TEXTOS SOCIAIS1

BALDO, Cirlei Ftima2

IACONO, Jane Peruzo3

RESUMO: Vive-se um momento de transio na educao de surdos. Aps muitos anos de tentativas para oralizar estes estudantes - sem grandes resultados constatou-se que existe outra possibilidade, j utilizada por alguns educadores h sculos atrs: os sinais. Sendo a oralidade, para o surdo, mais complexa, deve-se, ento, tornar a comunicao mais natural e tirar proveito dos recursos visuais atravs da lngua de sinais - no Brasil, Libras - j reconhecida como Lngua oficial da comunidade surda. Somente aps o domnio do aluno em Libras, parte-se para o ensino de uma segunda lngua: a lngua portuguesa. Porm, para que tal prtica se concretize, faz-se necessrio, que o professor aprofunde os conhecimentos sobre a educao de surdos e compreenda como pode ser efetivado o processo de Letramento atravs de prticas sociais de leitura e escrita. Objetivando tornar o Letramento mais prximo do professor e do aluno, propem-se um processo ou encaminhamento metodolgico utilizando textos do cotidiano dos alunos, os chamados textos sociais. Tal processo revelou-se eficaz e possvel de ser utilizado na prtica escolar, pois um estudo seguido da elaborao de material didtico para ser aplicado aos alunos surdos. As atividades contribuem para conduzi-los apropriao da Lngua Portuguesa escrita, como sua segunda lngua. PALAVRAS CHAVES: Educao. Alunos surdos. Letramento. Textos de circulao social.

1 Artigo Final elaborado como parte dos requisitos necessrios concluso do PDE - Programa de Desenvolvimento da Educao. 2 Graduada em Geografia, com especializao em Psicopedagogia e Educao Especial, professora da rede estadual de ensino. Aluna do Programa de Desenvolvimento da Educao PDE, turma 2008. 3 Mestre em Educao. Docente do Curso de Pedagogia da UNIOESTE Universidade Estadual do Oeste do Paran e Orientadora da primeira autora deste trabalho no Programa PDE, ano 2008/2009.

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LITERACY FOR DEAF STUDENTS THROUGH SOCIAL TEXTS

ABSTRACT: It has been living a transition moment in the deaf education. After many years attempting to make these students to speak with no meaningful results we have confirmed that there is another possibility, already used for some educators centuries ago: the signals. Being the orality, for the deaf, more complex, it is supposed to become the communication more natural and take advantage of visual resources through the language of signals in Brazil, Libra It is already known as official Language of deaf community. Only after the dominium of the student in Libra, it is begun the learning process of a second language: the Portuguese. However, to make possible such practice, it is necessary that the teacher up date the knowledge on the education of deaf and understand how it can be accomplished the literacy process through social practices of writing and reading. Aiming the literacy nearer the teacher and the student, it is proposed a process or methodological guiding using students daily texts , what is called social texts. Such process has been revealed efficient and possible of being used in school practice, because it is a study followed of didactical material to be applied to the deaf students. The activities lead them to the writing Portuguese Language appropriation, as their second language. Key Words: Education. Deaf students. Literacy. Social circulation texts.

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INTRODUO

Ao escolhermos o tema Letramento para alunos surdos, buscamos o

aprofundamento da histria da educao do surdo, e o que atualmente

considerado mais eficaz para sua educao por meio de uma reviso de literatura de

BUENO (1993), FERNANDES (2004), HOFFMEISTER (1999), LEONTIEV (2004),

QUADROS (1997), SACKS (1990), SOARES (2001), VIGOTSKI E BAKHTIN (In

FREITAS, 1995). Procuramos o aprofundamento dessa temtica para poder atuar

de maneira mais correta para atingir os objetivos aos quais nos propusemos ao

iniciar este estudo, que so: compreender o processo de Letramento de alunos

surdos na perspectiva metodolgica do bilinguismo; descrever uma forma possvel

de Letramento; apontar as etapas de Letramento, segundo Fernandes (2004.p.18 a

22); desenvolver prticas de Letramento com alunos surdos includos nesse

processo e desenvolver grupo de estudos sobre o tema, junto aos professores

participantes do Grupo de Trabalho (GTR), via on line.

Sabemos que o trabalho com surdos, em sala de aula, exige do professor a

compreenso do processo de letramento de alunos surdos na perspectiva

metodolgica do bilinguismo. Na sala de aula, faz-se pertinente que este aluno surdo

tenha contato com os mais variados gneros que circulam na sociedade. Ento, faz-

se necessrio que sejam encontradas novas formas metodolgicas para que ele

tambm se sinta includo, sendo agente de interlocuo com o outro.

A finalidade principal desse estudo foi elaborar uma forma prtica de

letramento que possibilitasse ao aluno surdo um entendimento maior dos textos que

circulam socialmente, de forma que ele possa se apropriar da escrita do Portugus e

faa uso dessa escrita em seu dia a dia. Isso s ser possvel com muita leitura e

troca de experincias entre colegas que vivenciam a mesma realidade.

Da mesma forma que a educao apresenta problemas, a educao de surdos tambm enfrentou - e ainda enfrenta - muitos desafios para proporcionar ao

aluno surdo conhecimentos cientficos, e atravs desses conhecimentos, torn-lo

capaz de interagir e se tornar independente. Mas o que realmente possibilita ao

surdo conhecimento, independncia e interao social? Seria o domnio da

oralidade? Da lngua de sinais? A discusso antiga. Vamos recordar um pouco o

incio dessa educao no mundo.

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Os mtodos utilizados para alfabetizar os surdos foram vrios, durante a

histria. Segundo Quirs e Gueller (apud BUENO, 1993, p.58) a educao de surdos

teve incio no sculo XVI, em 1541, pelo monge beneditino Pedro Ponce, na

Espanha. Este monge foi responsvel, por ter [...] educado uma dezena de surdos-

mudos, filhos todos eles de grandes personagens da corte espanhola, morrendo em

1549". Foram inmeras as tentativas de alfabetizar crianas surdas. Muitas bem

sucedidas, outras, no entanto, sem tanto sucesso. A poca envolvida era outra, bem

como o que era esperado dessa educao era, sem dvida, muito diferente de

nosso contexto atual, bem como o objetivo da educao naquele perodo. Com a

prtica de desmutizao buscava-se ensinar ao surdo.

Para Bueno:

preciso, tambm, distinguir o que significava educar crianas surdas nessa poca. Enquanto que, para as crianas ouvintes, a educao se constitua no ensino da leitura, da gramtica, da matemtica e das artes liberais, a educao de seus irmos surdos se confinava basicamente a tcnicas de desmutizao ou de substituio da fala por gestos, que parece corresponder muito mais recuperao da doena. De qualquer forma, no se pode negar que foi nesse perodo que se passou a ter uma preocupao e uma atuao sistemticas com o processo de comunicao de crianas surdas (BUENO, 1993, p. 59).

Assim, os objetivos da educao da criana surda e da ouvinte eram

diferentes. Para concretizar essa educao, vrias tentativas espalharam-se pela

Europa. As diferentes metodologias utilizadas na trajetria escolar histrica dos

surdos, no tm conseguido prepar-los para ingressar na sociedade letrada.

Historicamente, as metodologias utilizadas, foram e continuam sendo alvo de

discusso entre os profissionais envolvidos na Educao de surdos, sem atentar

para o fato principal: como o surdo aprende?

Bueno cita a querela entre Pereira, L Epe e Dechamps: No mbito da educao da criana surda, a querela entre Pereira, LEpe e Dechamps uma excelente ilustrao dessa negligncia, na medida em que foi quase que exclusivamente tratada como uma disputa entre defensores de mtodos de ensino especial (oralismo versus gestualismo), sem que se explicitasse os determinantes que subjaziam a essa disputa (BUENO, 1993, p. 64).

Segundo o autor, os trs se dedicaram educao de crianas surdas, com

mtodos prprios e cada um teve sucesso a seu modo. Segundo Quirs e Gueller

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(apud BUENO, 1993, p.64-65) Jacob Rodrigues Pereira, nasceu em 1715 na

Espanha; educou 10 crianas surdas trabalhando com a desmutizao atravs da

vista e do tato e introduziu a gramtica. O abade LEpe, francs, nasceu em 1712,

estudou gestos de comunicao de surdos entre duas irms gmeas. Alm de

estudar os gestos, criou outros que denominou Signos Metdicos. Transformou sua

casa em escola para 60 surdos pobres e ricos e teve seu trabalho reconhecido.

Quirs e Gueller (apud BUENO, 1993, p.65) ressaltam que a Assemblia

Constituinte em 1791 reconheceu: [...] o nome do Abade de LEpe entre os cidados que melhor tm merecido o reconhecimento da humanidade e da ptria, elevando a escola por ele criada ao nvel de Instituto Nacional, a primeira escola pblica de surdos do mundo.

O Abade de Dechamps, nascido em Orleans em 1745, tambm abriu sua

casa escola para crianas surdas, defendendo a desmutizao da criana surda.

Quirs e Gueller (apud BUENO, 1993 p.65). Os trs atuaram ao mesmo tempo e em

debates pblicos defenderam seus mtodos. A vitria foi de LEpe e dos signos

metdicos frente ao oralismo de Dechamps, que apresentou baixos resultados.

Bueno (1993, p.66).

Mas, segundo Quirs e Gueller (apud BUENO, 1993, p. 66), o prprio LEpe,

em sua obra Instituio de surdos mudos atravs dos signos metdicos afirma:

[...] talvez os mtodos de Pereira (que lamentavelmente no nos dado conhecer)

sejam melhores que os nossos e se isto assim, a gerao presente e futura lhe

devero agradecimentos.

Isso demonstra que desde o incio da educao dos surdos existe a

discusso de qual o melhor mtodo para alfabetizar os surdos: ensinar a falar? Ou

utilizar os gestos? Pesquisas so claras quanto no eficincia de mtodos

tradicionais na alfabetizao de surdos, visto que, o referencial auditivo usado para a

alfabetizao tradicional no pertence ao surdo.

No Brasil, por iniciativa do Governo Imperial, os marcos fundamentais da

Educao Especial se deram atravs da criao do Instituto dos Meninos Cegos

(hoje, Instituto Benjamin Constant) e do Instituto dos Surdos-Mudos (hoje, Instituto

Nacional de Educao de Surdos INES) situados no Rio de Janeiro (BUENO, 1993,

p.85). Segundo Lemos (apud BUENO, 1993, p.86) ambos sofreram modificaes por

[...] graves conflitos de ordem econmica, disciplinar e moral. Ainda segundo Bueno

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(1993, p. 90), por muitos anos, o carter assistencialista norteou a educao

especial no Brasil, muitas vezes ligada a ordens religiosas.

Quanto aos mtodos de educao de surdos, eles tambm foram se

modificando, seguindo o contexto histrico-social de cada poca. A alfabetizao de

alunos surdos geralmente baseou-se em mtodos que objetivavam sua oralizao,

seguindo os mesmos passos de uma criana ouvinte, sem atentar para o fato de que

o surdo desprovido de audio. Para isso usou-se, por muito tempo, a impostao

de fonemas, a silabao, as estruturas (repetio de slabas, de palavras) com o

objetivo de que a criana aprendesse por meio da memorizao ou de decorar as

palavras. Durante anos o surdo foi proibido, em determinadas pocas, de utilizar

gestos, sinais, porque o normal para que fosse aceito na sociedade, seria falar.

Diante de tais situaes, ressaltamos a necessidade e a importncia de se adotar

o Letramento como objeto de estudo e de ensino da Lngua Portuguesa aos alunos

surdos, visto que a escola tem como objetivo ensinar ao aluno a interagir em diferentes

situaes sociais, utilizando seu repertrio lingustico nas mais variadas situaes.

QUEM O SURDO?

Segundo o decreto N 5.626 de 22 de dezembro de 2005, no Captulo I - Das

Disposies Preliminares - Artigo 2:

[...] considera-se pessoa surda aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de experincias visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Lngua Brasileira de Sinais Libras. Pargrafo nico: Considera-se deficincia auditiva a perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas frequncias de 500Hz, 1.000Hz, 2.000Hz e 3.000Hz.

O surdo a pessoa que no ouve o som produzido pela natureza e pelo ser

humano. um ser humano privado de audio, mas no pode ser privado de viver,

de participar, de reclamar, de ser cidado. passvel de erros, acertos, lutas,

conquistas como qualquer outra pessoa.

Robert J. Hoffmeister (diretor de Programas em Estudos Surdos na

Universidade de Boston, Estados Unidos da Amrica) filho de pais surdos, diz que

aprendeu com surdos, seus pais e outros a "no se concentrar na ideia de surdez

que o mundo dos ouvintes emprega, mas sim na viso que o mundo dos surdos

define como o centro de suas vidas" (1999, p.117).

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A viso o meio que o surdo utiliza para compreender o que se passa sua

volta e deve ser utilizada no trabalho de qualquer profissional envolvido com o surdo.

Para Lane, Hoffmeister & Bahan (apud HOFFMEISTER, 1999, p.119): "essa lngua

baseada na viso, a lngua de sinais, a essncia do 'mundos dos surdos'". Sendo

visual, torna-se acessvel a qualquer criana, desde que tenha contato com outros

usurios. O surdo que conhece e usa a lngua de sinais recebe e decodifica a

informao, ou seja, ao visualizar o sinal, capaz de entender seu significado. ,

portanto, atravs da viso que o surdo faz a leitura do mundo. Com o auxlio da

lngua de sinais ele expressa suas idias, dirime suas dvidas, compreende seus

prprios anseios e desejos. de suma importncia que a famlia tambm se

aproprie da linguagem em LIBRAS para interagir com seu familiar surdo.

A LIBRAS GARANTE O DIREITO DE ACESSO AO CONHECIMENTO PARA O ALUNO SURDO?

Atualmente, no Brasil, a orientao sobre a forma de escolarizao do aluno

surdo o Bilingismo, ou seja, o uso de duas lnguas: LIBRAS e o Portugus. No

Paran, onde atuamos, procuramos utilizar Libras e Lngua Portuguesa na

modalidade escrita, sendo necessrio que o professor seja fluente em Libras para

que o processo ensino aprendizagem seja eficiente. Assim, crianas surdas devem

aprender Libras como lngua materna e, atravs dela, ter acesso lngua falada em

seu pas, s que na forma escrita.

Segundo Hoffmeister (1999 p.122), saber como usar a 1 e a 2 lngua para

estruturar o ambiente para o aprendizado a questo metodolgica mais importante

para as crianas surdas em casa e na escola. Muitas tentativas para alfabetizar

alunos surdos fracassaram, talvez porque se utilizava o mesmo mtodo utilizado

para alfabetizar os ouvintes, priorizando o som do grafema, ou seja, utilizando o

canal de aprendizagem auditivo, que o surdo no possui, ou no qual tem um dficit.

Segundo Quadros (1997, p.21) a educao dos surdos no Brasil passou por

trs fases: duas que podem ser delineadas e a terceira a fase atual, de transio.

Segundo Couto (apud Quadros, 1997, p. 21) a primeira fase constitui-se pela

educao oralista. a fase em que se busca ensinar o surdo a falar, como se fosse

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possvel essa aprendizagem da mesma forma que a das pessoas ouvintes

(Quadros, 1997, p. 21).

Sacks (1990, p.45) diz que o oralismo e a supresso do sinal resultaram

numa deteriorizao dramtica nas conquistas educacionais das crianas surdas e

no grau de instruo do surdo em geral. O mesmo autor (1990, p. 45) esclarece que

o surdo est menos exposto ao aprendizado incidental que ocorre fora da escola

(destaque do autor) como nas conversas do dia-a-dia, pela televiso e outras

experincias a que a criana ouvinte est submetida. Tambm enfatiza que o tempo

gasto com informaes, habilidades complexas ou qualquer outra coisa, menor do

que o utilizado para ensinar crianas surdas a falar.

Muitos dos surdos hoje, so iletrados funcionais. Um estudo realizado pelo

Colgio Gallaudet4, atualmente Universidade Gallaudet em 1972, revelou que o nvel

mdio de leitura dos graduados surdos de dezoito anos em escolas secundrias nos

Estados Unidos, era o equivalente apenas 4 srie. Outro estudo, efetuado pelo

psiclogo britnico R. Conrad (SACKS, 1990 p. 45) indica uma situao similar na

Inglaterra com estudantes surdos por ocasio da graduao, lendo no nvel de

crianas de 9 anos. No Brasil, a realidade no diferente; muitos surdos que frequentaram a

escola por vrios anos, no produzem escrita compatvel com a srie, alm de

defasagem escolar.

O tempo gasto para que a criana surda aprenda a oralizar enorme, ela s

capta 20% da mensagem por leitura labial, e s compreendida por pessoas de seu

convvio. Muitos casamentos de surdos com ouvintes logo se transformam em

divrcios pela falta de comunicao. Os surdos se casam com outros surdos para

poderem utilizar a lngua de sinais na vida pessoal, segundo Duffy (apud

QUADROS, 1997, p. 23).

Diante dessa realidade O Bimodalismo passa a ser defendido como a melhor

alternativa de ensino para o surdo (QUADROS, 1997 p. 24). Nessa fase de

bilinguismo utiliza-se a fala e os sinais O portugus sinalizado tambm no deu

conta de melhorar a aprendizagem e a realidade escolar, porque so duas coisas

diferentes; ao desconsiderar a lngua de sinais com sua estrutura riqussima, 4 Universidade Gallaudet: nica universidade do mundo cujos programas so desenvolvidos para pessoas surdas. Est localizada em Washington, a capital dos EUA. uma instituio privada e conta com o apoio direto do Congresso desse pas. A primeira lngua oficial de Gallaudet a American Sign Language (ASL), a lngua de sinais dos Estados Unidos (o ingls a segunda).

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tambm se desestrutura o portugus porque o professor sinaliza diferente e ao

combinar sinal-fala, o processo fica mecnico. Assim as crianas surdas

continuaram com as defasagens na leitura e nos contedos escolares.

No Brasil encontramos escolas oralistas, ou bimodais, mas a comunidade

surda busca o respeito e a valorizao de sua lngua natural, a lngua de sinais que

lhe permite se expressar por meio de sinais. Atualmente, os estudos apontam para

outra proposta: o Bilinguismo. ento, uma terceira fase, a atual, que configura um

processo de transio (QUADROS, 1997 p. 21).

Bilinguismo uma proposta de ensino que recomenda o uso de duas lnguas

no contexto escolar. Considera a lngua de sinais como lngua natural dos surdos e

parte-se dela para ensinar a 2 lngua; no nosso caso brasileiro, o portugus escrito.

A criana surda tem o direito de adquirir a lngua de sinais naturalmente em contato

com outras pessoas, tambm usurias dos mesmos sinais. Ela tambm deve ser

ensinada na lngua de sinais para, posteriormente, adquirir a 2 lngua escrita.

Como muitos surdos nascem em famlias de ouvintes, desconhecedores da

LIBRAS, cabe escola ter pessoas surdas para receber a criana e inici-la no

mundo dos sinais. O uso da LIBRAS no garantia de acesso 2 lngua, o

portugus escrito, mas pr-requisito para tal, pois os contedos devem ser

trabalhados em LIBRAS. Para Quadros (1997, p. 32 e 33): A lngua portuguesa dever ser ensinada em momentos especficos das aulas e os alunos devero saber que esto trabalhando com o objetivo de desenvolver tal lngua. Em sala de aula o ideal que sejam trabalhadas a leitura e a escrita da lngua portuguesa. A oralizao deve ser feita por pessoas especialistas, caso a escola a inclua no ensino da lngua portuguesa. Tendo em vista o tempo depreendido para a oralizao, esta dever ser feita fora do horrio escolar para no prejudicar e limitar o acesso aos contedos curriculares pelos alunos surdos.

Para Quadros (1997, p. 46) "... as lnguas de sinais apresentam-se numa

modalidade diferente das lnguas orais: so lnguas espao-visuais, ou seja, a

realizao dessas lnguas no estabelecida atravs dos canais oral-auditivos, mas

atravs da utilizao do espao". Elas surgiram da mesma forma que as lnguas

orais: da necessidade de as pessoas expressarem suas aes, seus sentimentos e

idias, ou seja, no surgiram de lnguas orais.

Vygotsky (apud FREITAS, 1995 p. 93) desenvolveu estudos sobre

Pensamento e Linguagem entre os anos de 1929 e 1934. Esses estudos

apresentam a relao entre o pensamento e a linguagem. Conforme o autor, "pode-

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se estabelecer no desenvolvimento da fala da criana uma linguagem pr-intelectual

e no desenvolvimento, um pensamento pr-lingustico". Para ele, a partir dos dois

anos, a linguagem pr-intelectual e o pensamento pr-lingustico se juntam e surge

nova organizao lingustico-cognitiva. Quando a criana percebe que cada coisa

tem um nome, a fala serve ao pensamento, ela sente necessidade de palavras, tenta

aprender os signos. Para o surdo, os sinais tm essa funo, eles correspondem

expresso do pensamento.

Quanto importncia da apropriao da linguagem para o desenvolvimento

da criana, Leontiev (2004, p. 348) diz que: A apropriao da linguagem constitui a condio mais importante do seu desenvolvimento mental, pois o contedo da experincia histrica dos homens, da sua prtica scio-histrica no se fixa apenas, evidente sob a forma de coisas materiais: est presente como conceito e reflexo na palavra, na linguagem. sob esta forma que surge criana a riqueza do saber acumulado pela humanidade: os conceitos sobre o mundo que a rodeia.

A lngua de sinais uma lngua complexa e expressiva tanto quanto a lngua

portuguesa. Desde 2002 a LIBRAS j reconhecida como Lngua Brasileira de

Sinais, pela Lei Federal nmero 10.436/02 e com ela fica reconhecido o direito aos

surdos de se expressarem. O Decreto N 5.626 de 22 de dezembro de 2005, Artigo

IV, trata Do Uso e da Difuso da LIBRAS e da Lngua Portuguesa. O acesso das pessoas surdas Educao se d atravs da LIBRAS, que faz parte de seu

cotidiano e por ela que a criana recebe as informaes do mundo. A Lngua

portuguesa deve ser a segunda lngua dos surdos.

A Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia, de setembro de

2007, contempla, no artigo 24, referente Educao, o direito ao aprendizado da

lngua de sinais aos surdos e a importncia de professores com o conhecimento de

LIBRAS.

Cada pas tem sua prpria lngua de sinais. Mesmo dentro do prprio pas,

pode haver mais de uma lngua. possvel, na lngua de sinais serem produzidas

poesias, expresses idiomticas que emocionam e comunicam sentimentos aos

ouvintes e deixar o surdo maravilhado porque ele, muitas vezes, muito melhor que

os que ouvem, percebe e interpreta a expresso facial e corporal.

Rodrigues (apud QUADROS, 1997, p. 80) apresenta concluses sobre a

aquisio da lngua de sinais por crianas surdas. As pesquisas apontam que a

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lngua de sinais organizada no crebro da mesma forma que as lnguas orais,

ento ela natural. Sendo natural, seu aprendizado tem o perodo ideal para ser

efetivado, podendo se tornar deficiente ou impossvel, se isso for desrespeitado. Se

h um perodo ideal, ento as crianas surdas esto iniciando seu aprendizado

muito tarde.

J sabemos que a no exposio da criana surda lngua de sinais, no

tempo certo, pode causar danos irreparveis com relao organizao

psicossocial do indivduo. Para Skliar-Cabral (apud QUADROS, 1997, p. 85). [...] no caso da comunidade surda, a L1 essencial as crianas surdas precisam ter acesso a uma lngua de sinais para garantir o desenvolvimento da linguagem e, consequentemente, do pensamento e a L2 necessria as crianas precisam dominar a L2 para fazer valer seus direitos diante da sociedade de ouvinte.

A segunda lngua no um processo natural para o surdo, seja falada ou

escrita. Para aprender, a organizao deve ser centrada no contedo. Willians (apud

QUADROS, 1997, p. 90) ressalta que o contedo deve considerar sete critrios: o

interesse dos alunos, a idade deles, a iniciativa, o uso da linguagem para crianas, o

imput lingustico, o domnio conceptual (so as habilidades conceituais das crianas)

e a promoo do processo de aprendizagem.

Para Taglieber (apud QUADROS, 1997, p. 94 e 95), A compreenso da leitura favorece o aprendizado de uma lngua, mas ela depende de conhecimento prvio do leitor, de sua bagagem lingustica e de mundo. O professor deve motivar a leitura, explicando antecipadamente o vocabulrio e estruturas mais difceis e qual a finalidade do texto.

A funo do texto deve transcender a questo da avaliao, a escrita a

oportunidade que os alunos tm de expressar situaes significativas. A produo

criativa s ocorre quando o aluno identifica possibilidades de uma nova lngua, a

segunda lngua, enquanto objeto social, interacional. Os surdos adquirem a lngua

de forma silenciosa, graficamente, pela instruo sistemtica.

Se dominarem a lngua de sinais, aprendem que palavras, frases, sentenas,

significam algo e as palavras esto situadas num contexto. Assim como os ouvintes,

a criana surda deve ter contato com textos diferentes desde pequena e devem

fazer parte da vida do aluno, pois pode utilizar o celular para mandar mensagens,

acessar a internet, se comunicar atravs da leitura e escrita. O professor, portanto,

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deve utilizar-se disso para despertar o prazer pela leitura e escrita e seu verdadeiro

significado para o aluno.

O que vivenciamos com Libras que as crianas, ao aprenderem os sinais

questionam, participam, enfim, interagem, tiram dvidas, no s com o professor,

mas com os pais e com outros surdos que eles conhecem. Isso fundamental para

seu desenvolvimento e conhecimento de mundo.

Os fatores emocionais tambm podem influenciar no desenvolvimento do

aluno na segunda lngua. Quando crianas, eles podem sofrer presses familiares e

quando adultos, podem apresentar resistncias resultantes de experincias

fracassadas, fruto de um ensino inadequado. Para QUADROS (1997, p.119), A voz dos surdos so as mos e o corpo que pensam, sonham e expressam. As lnguas de sinais envolvem movimentos que podem parecer sem sentido para muitos, mas que significam a possibilidade de organizar as idias, estruturar o pensamento e manifestar o significado da vida para os surdos. Pensar sobre a surdez requer penetrar no 'mundo dos surdos' e 'ouvir' as mos que, com alguns movimentos, nos dizem o que fazer para tornar possvel o contato entre os mundos envolvidos, requer conhecer a 'lngua de sinais'. Permita-se 'ouvir' essas mos, pois somente assim ser possvel mostrar aos surdos como eles podem 'ouvir' o silencio da palavra escrita.

Ler e escrever so atividades importantes para a criana em nossa sociedade

e, certamente, ao chegar escola ela j traz consigo muitos conhecimentos

adquiridos no ambiente familiar e social, como histrias, sua linguagem. Para

Vygotsky (apud FREITAS, 1995, p.101) a aprendizagem das crianas se inicia muito

antes de sua entrada na escola. Antes de ela ingressar na escola j teve uma srie

de experincias cotidianas, nas relaes com pessoas de seu meio. Mas somente

mais tarde, na escola, que ela adquire a capacidade de defini-las por meio de

palavras.

A criana surda tambm aprende e se desenvolve antes de iniciar na escola,

porm, pelo fato de estar menos exposta s experincias visuais, pelo no acesso

lngua de sinais - salvo se for filha de pais ouvintes - pode apresentar

desenvolvimento menor. Se a criana for surda e, principalmente, filha de pais

ouvintes, torna-se necessria a aquisio da lngua de sinais, pois ela precisa ter

contacto com usurios desta lngua para se apropriar e evoluir nessa apropriao.

Est provado que para o surdo a melhor forma de se trabalhar atravs da

linguagem de sinais. Mas, diante desse fato surge outro problema. Para o surdo

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aprender Libras algo natural e para o professor ouvinte, tambm ? Ainda h

poucos surdos formados docentes. Poucos professores so bilngues, pois este

aprendizado no fcil; preciso muita dedicao e estudo constante, j que vrios

sinais surgem a cada dia. medida que a comunidade surda se apropria de novos

conceitos transforma-o em sinais, que precisam ser aprendidos pelos profissionais.

Faz-se pertinente, ento, que se invista mais na formao de profissionais

bilngues, visto que so eles que faro a mediao utilizando a lngua de sinais para

ensinar a segunda lngua ao surdo. Muitas vezes, a criana somente aprende libras

com o professor ao chegar escola, como acontece com os surdos, filhos de pais

ouvintes. Ao adquirir a lngua de sinais, ela pode iniciar o aprendizado de uma

segunda lngua, no nosso caso, o portugus escrito. Muitas vezes nos

questionamos: qual a melhor metodologia para que isso acontea de maneira eficaz

e que atenda ao objetivo de capacitar o surdo para leitura de textos e sua efetiva

compreenso? Muitas tentativas diferenciadas, mtodos orais, comunicao total,

bimodalismo, at proibio de sinais, foram utilizados, porm, sem resultado

concreto de melhoria. As pesquisas revelam a triste realidade dos surdos: ao

conclurem a universidade ou o Ensino Mdio, so incapazes de ler e escrever de

maneira eficiente, segundo critrios de ouvintes. Seria deles a incapacidade? As

pesquisas vm demonstrando que a problemtica bem mais complexa e,

certamente, envolve as abordagens, os mtodos utilizados para alfabetiz-los.

Talvez porque todos os mtodos utilizados partem de nossa realidade de ouvintes e

no da realidade deles: so surdos. No ouvem, mas vem.

Para muitas crianas, a insero no mundo das letras, ou da sociedade

letrada complexa, sofrida e frustrada. Esto na mdia dados que revelam isso entre

as crianas ouvintes. Para o surdo, as dificuldades so maiores, pois os mtodos, as

propostas metodolgicas, as abordagens usadas para ensin-lo, baseiam-se

predominantemente na oralidade.

Com Libras os surdos tm outra viso do mundo, tornam-se questionadores,

embora ainda no estejam dominando a escrita e a leitura. Porm, o conhecimento e

o domnio da linguagem escrita proporcionam o acesso a mundos antes

desconhecidos, da o professor saber utilizar os recursos miditicos e tecnolgicos

como ferramenta no Letramento destes alunos.

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ALFABETIZAR OU LETRAR?

Todos concordam que a educao muito importante, atravs dela que

possvel ao indivduo sair de sua situao atual e melhorar de vida pelo

conhecimento adquirido na escola. Mas no essa a situao que vemos todos os

dias. Mesmo com diplomas de concluso de ensino mdio ou superior nas mos, as

pessoas no tm garantias de melhor trabalho e, no raras vezes, saem das escolas

semi-analfabetas, ou seja, sabem ler e escrever, mas no so capazes de

interpretar o que leem ao preencher ficha de trabalho ou at mesmo orientaes

simples no dia-a-dia.

A realidade clara, mesmo ouvindo, falando diariamente e recebendo todas

as informaes na lngua materna, muitas pessoas no se alfabetizam, se for levado

em conta o verdadeiro significado da palavra alfabetizado. O que falta? Estamos

tratando de temas diferentes? Em se aprendendo a ler e a escrever, tudo o que se

precisa saber est escrito. Ento, por que to difcil ler escrever? Provavelmente

porque alfabetizar no basta.

Se a realidade de aluno ouvinte esta - no estar realmente alfabetizado - a

realidade do aluno surdo no diferente. Ele no recebe as informaes dirias pela

via auditiva apresentando muitas defasagens na leitura e escrita. Como possvel

alfabetiz-lo, ento? No falamos em alfabetizao de surdo simplesmente, mas de

outra forma, por meio da qual ele possa conhecer e se apropriar da escrita da

Lngua Portuguesa como sua segunda lngua, para utiliz-la nas suas relaes

sociais. Acreditamos que essa forma seria o Letramento.

Soares (1988) definiu Letramento como sendo "[...] o resultado da ao de

ensinar ou de aprender a ler e escrever: o estado ou a condio que adquire um

grupo social ou um indivduo como consequncia de ter se apropriado da escrita"

(SOARES, 2001, p.18). A verdadeira funo da escola desenvolver no aluno o

domnio da lngua falada, mas se ela no tem utilidade na vida, no dia-a-dia, nas

relaes sociais, fica novamente sem funo, sem sentido. A lngua s ser eficaz,

quando o aluno fizer uso da leitura e da escrita em sua atividade diria, em sua vida.

Em se tratando do aluno surdo, a escrita e a leitura da lngua oficial do pas

possibilitaro a ele a participao e a integrao na sociedade, porque ela

formada, em sua maior parte, por ouvintes desconhecedores de Libras. Mesmo

assegurando o direito a intrprete de Libras na sala de aula, aprender a segunda

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lngua na modalidade escrita importantssimo para que ele possa evoluir no

conhecimento e participar socialmente.

Soares (2001, p.36) diz que o termo "letrado ser usado para caracterizar a

pessoa que alm de saber ler e escrever faz uso frequente e competente da leitura e

escrita".

O letramento, prtica social da linguagem escrita, extrapola o contexto

escolar, vai alm do espao restrito da escola, chega famlia, sociedade, enfim,

vida da criana. Mas, no receita pronta e acabada, uma construo infinita,

como tambm o nosso conhecimento.

A proposta de Letramento deve se basear em textos que circulem

socialmente, isto , fazem parte do cotidiano dos alunos. Textos que possibilitem

que ele compreenda o mundo e as relaes ao seu redor, mas que possa usar esse

conhecimento em sua vida diria, visto que aprendemos e incorporamos o que

relacionamos com nossa realidade. Tal proposta apresentada destinada a alunos

surdos e ser desenvolvida com o uso da Lngua de Sinais Brasileira (Libras) -

lngua materna dos surdos - para chegar ao aprendizado da 2 lngua: a Lngua

Portuguesa. O letramento, ento, pressupe fornecer e subsidiar o conhecimento

prvio que o aluno precisa para ler e interpretar.

Para Taglieber (apud QUADROS, 1997, p. 94 e 95), o professor deve motivar

a leitura, explicando antecipadamente o vocabulrio e estruturas mais difceis e qual

a finalidade do texto". Na proposta de Letramento esse procedimento muito

importante, pois atravs de questionamento relacionando-o com seu cotidiano,

antecipamos aos alunos palavras ou frases que gerariam dificuldades para a

compreenso do texto, por no fazerem parte de seu vocabulrio. Segundo o

mesmo autor, (apud Quadros, 1997, p.97), aps essas inferncias do professor, a

leitura silenciosa a forma mais indicada para uma leitura mais produtiva. Para ele,

depois de explorar o lxico no contexto, em atividades orais ou escritas o aluno far

a leitura individual e, assim, poder compreender melhor o que foi trabalhado.

No momento da leitura individual, o aluno j saber o significado desses

termos, que geralmente permanecem anotados no quadro para que ele recorra e

utilize no momento de dvidas, podendo proceder a leitura e a interpretao do texto

social que estiver sendo trabalhado.

Segundo Quadros (1997, p. 97) "as pessoas aprendem a maior parte das

palavras que conhecem atravs do contexto em que esto inseridas e no por

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procurarem o significado das mesmas no dicionrio". Compactuamos com Quadros

(1997, p.97), pois somente quando aprendemos as palavras no contexto de nossas

vidas, elas passam a ter sentido, significado.

A PROPOSTA METODOLGICA DE LETRAMENTO NA ATIVIDADE DE

IMPLEMENTAO DO PDE

Para efetivar a proposta de letramento optamos pelo trabalho com os alunos

surdos do Colgio Estadual Dr. Eduardo Virmond Suplicy, Francisco Beltro-Pr.

Propusemos e realizamos atividades com os alunos surdos de 11 a 17 anos, sendo

quatro estudantes de 5 srie e cinco de 8 srie. Eles frequentam uma turma de

apoio em perodo contrrio ao do ensino regular. Para a aplicao da unidade

didtica e tambm para poder trocar informaes, aprender Libras e conviver com

outros surdos, optamos por juntar as duas turmas no mesmo horrio. Todas as

atividades desenvolvidas a partir do histrico da agenda, do folheto de

supermercado e da receita foram voltadas para o letramento.

Utilizamos as sugestes de etapas de letramento propostas por Fernandes

(2004, p.18), no texto Educao Bilngue Para Surdos: Trilhando Caminhos para a

Prtica Pedaggica, disponibilizado pela SEED Paran, atravs do DEEIN

(Departamento de Educao Especial e Incluso Educacional). Segundo

FERNANDES, as sugestes foram inspiradas pela proposta de Kleiman, Moraes

(1999) no captulo referente Leitura do Texto Jornalstico Informativo. Para a

referida autora (2004, p.14 a 18).

Toda leitura /produo escrita deve seguir os seguintes aspectos: 1. Contextualizao visual do texto;

2. Leitura do texto em libras (conhecimento prvio de elementos intertextuais);

3. Percepo de elementos lingusticos significativos, com funes importantes no texto, relacionados sua tipologia e estilo/registro (elementos textuais);

4. Leitura individual/avaliao das hipteses de leitura;

5. (Re)elaborao escrita com vistas sistematizao

O nvel de apropriao dos conhecimentos dos alunos surdos envolvidos no

projeto era bastante diversificado, comum tambm nas classes regulares, porm,

entre os alunos surdos h bastantes diferenas no aprendizado.

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Quando se inicia algo novo, comum sentir-se inseguro. O fato de no se

dispor de livros didticos para as atividades , muitas vezes, angustiante para ns,

professores. Nosso questionamento, nestes casos: Ser que estamos realmente

fazendo o melhor? isso que nosso aluno surdo precisa aprender?

Por este motivo, partimos para o estudo com determinados gneros textuais,

os tambm chamados textos sociais, j conhecidos dos alunos. Dentre os muitos

gneros que circulam na sociedade, optamos por trs deles, cuja esfera social de

circulao fosse a cotidiana (PARANA, 2008, p. 100).: a Agenda escolar, o Folheto

de supermercado e a Receita de bolo. A receptividade pelas atividades foi positiva e

demonstrada pelo interesse por parte dos alunos.

AGENDA ESCOLAR DO ALUNO COM HISTRICO DO COLGIO ESTADUAL DR. EDUARDO VIRMOND SUPLICY: ATIVIDADE 1

Como primeira atividade, optamos pelo trabalho com a Agenda Escolar dos

alunos, recebida por todos no incio do ano letivo. Nela h os registros necessrios

aos alunos e tambm se trabalha a histria do colgio. Os alunos j tinham

observado que nela continha o histrico, mas no sabiam o que era, porque no

conheciam a funo social daquele texto. A partir das explicaes (em LIBRAS), a

curiosidade foi despertada e ficaram muito felizes quando descobriram que o nome

do patrono do colgio: Eduardo Virmond Suplicy referia-se a um homem que viveu

em Francisco Beltro e depois se mudou para Curitiba onde, posteriormente,

faleceu. Os alunos da 8 srie relembraram que no ano de 2006, quando o Colgio

comemorou 50 anos, eles participaram do projeto FERA (Festival de Arte da Rede

Estadual), realizado em nossa cidade. Durante o FERA um coral de ouvintes cantou

uma msica escrita pela professora Stela Granzotto e na apresentao os surdos

tiveram uma participao especial. Os alunos ouvintes cantavam e juntos, os alunos

surdos faziam os sinais referentes msica que tinha sido ensaiada anteriormente.

Para que tal ao se concretizasse no empregamos, naquele momento, o

portugus sinalizado, explicamos o significado da letra e eles escolheram qual sinal

seria mais interessante para expressar o sentido. Em seguida explicaram para os

alunos da 5 srie como tudo havia acontecido.

Relembraram tambm a primeira diretora do colgio, Diva Martins, bem como

as que a sucederam. Ao trmino das atividades, demonstraram ter entendido a

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funo social do histrico contido na Agenda e elaboraram em Libras um histrico

pessoal, socializado depois para os colegas dispostos em crculo. Posteriormente,

cada um escreveu seu prprio texto. Todos os alunos tiveram liberdade para

perguntar sobre palavras ou termos que julgavam necessrios para produzir o texto.

Aps sua concluso, novamente em crculo, leram o texto dos colegas O

interessante foi que eles puderam perceber que cada um escreve diferente e que

quem tinha maior domnio da lngua escrita fez mais observaes ao colega. Diziam:

faltam palavras, as idias esto misturadas (quando no havia sequncia lgica na

escrita do texto), aqui letra maiscula, etc. Aps a leitura de cada texto, foi

realizado um trabalho individual com cada um dos alunos, para rever seu texto,

mostrar o que faltava e como poderia ser melhorado.

Na semana seguinte, antes de iniciar um novo texto, atravs de

questionamentos, relembramos o que tinham aprendido na semana anterior, qual a

finalidade do texto histrico, se o haviam entendido e se o consideravam

interessante. Suas respostas demonstraram sua compreenso do texto e o quanto

haviam apreciado e se motivado ao realizar aquela atividade. Dessa forma,

consideramos que o objetivo proposto para esse texto foi alcanado.

FOLHETO DE SUPERMERCADO: ATIVIDADE 2

Esta atividade tambm consistiu em utilizar um texto cuja esfera social de

circulao era a cotidiana (PARANA, 2008, p. 100). Neste caso, trabalhamos um

folheto de supermercado com ofertas da Pscoa. Realizamos atividades adaptadas

com procedimento contido na Unidade Didtica; as mudanas foram quanto ao

lxico e atividades escritas. A proposta de reelaborao escrita foi a mesma descrita

no material. O trabalho com o folheto foi sensacional e na semana em que

realizamos este trabalho tivemos reunio com os pais. Vrios deles afirmaram que

seus filhos tinham realmente compreendido as questes, pois j sabiam indicar qual

ovo de pscoa era o mais barato levando-se em considerao a relao peso do ovo

(chocolate) e seu preo; fizeram muitas comparaes, demonstrando ter entendido o

que foi trabalhado, prtica que, anteriormente, no lhes chamava a ateno, pois

no tinham noo de quanto custava tal produto.

Na atividade de produo escrita, elaboraram uma lista de produtos

necessrios para o consumo de uma semana e seu custo em reais, com base nos

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produtos do folheto. Como no havia oferta de po, trocaram por biscoito, por

exemplo. Discutimos sobre quanto planejavam gastar e as respostas individuais

variavam entre R$ 60,00 a R$ 600,00. Tais respostas demonstraram que lhes faltava

noo de valor. Assim, refizeram as operaes matemticas, compararam e

constataram que os valores eram muito altos, levando-se em conta o salrio mnimo

vigente, cujo valor ainda deveria cobrir o custo de muitas outras despesas, alm de

supermercado.

Divididos em dois grupos criaram um folheto de supermercado com

recortes de produtos, mas preos pensados por eles. Na sequncia, fizeram

comparaes sobre quais deles era mais vantajoso comprar, no esquecendo de

colocar o nome do supermercado, endereo, horrio de atendimento e forma de

pagamento. Os nomes escolhidos foram GOOD SUPERMERCADOS e VIVO

SUPERMERCADOS. O trabalho com o folheto foi gratificante, pois os alunos surdos

se envolveram muito, especialmente na escrita da lista de compras em que era

possvel observ-los pensando alto em Libras sobre o que era necessrio comprar

para consumir em uma semana. Eles realmente colocaram-se no lugar de quem

est sozinho em uma casa, sem nenhum estoque de alimentos e produtos de

limpeza e precisa abastec-la.

RECEITA DE BOLO DE CHOCOLATE: ATIVIDADE 3

A explorao visual foi fcil e rpida, eles j tinham visto receitas neste

caso, receita oriunda de meio eletrnico, a Internet - mas o interessante foi explorar

o lxico, como por exemplo, colher(es) de sopa de chocolate, colher(es) de ch de

essncia de baunilha, xcara(s) de ch de acar. No compreendiam o significado

de colher de ch de chocolate. Perguntavam: - Precisa ch e chocolate? - Precisa

sopa e chocolate? Ao repetir a pergunta, ficavam desconfiados e diante do riso de

quem tinha entendido, compreendiam, pois trabalhamos com objetos concretos

como colher de ch e de sopa, xcara de caf, mostrando cada ingrediente.

Pretendamos fazer o bolo na cozinha, mas ela est desativada e no foi possvel.

Para verificar o entendimento, foi convidada uma pessoa surda, funcionria da

escola e eles explicaram (como se fosse um programa de culinria na TV, filmado

com uma filmadora imaginria) como se fazia o bolo, utilizando-se os objetos

concretos para explicar a receita, por meio da Libras como recurso lingustico.

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Fomos tambm ao laboratrio de Informtica, onde pesquisaram sobre

diferentes tipos de bolo, copiando duas receitas. Ficaram admirados com a

diversidade de receitas e encantados com as fotos de bolos. Um aluno que

aficcionado pelo tema exrcito pesquisou sobre bolos com essa temtica. Outro

que no tinha nenhum contato com o computador, ajudado, logo fez a pesquisa. No

laboratrio, aproveitamos para relembrar sobre direitos autorais, importncia de citar

a fonte em trabalhos, como fazer pesquisa na Internet. Na volta para a sala

conversamos e cada um explicou sobre a receita que havia copiado.

A Implementao da Unidade Didtica proposta mostrou-se eficaz, mas,

certamente, pode ser melhorada em muitos aspectos. Como o trabalho est apenas

comeando, faz-se necessrio aperfeio-lo, enriquec-lo, acrescentar outras

possibilidades de uso de textos sociais gneros. Pretendemos trabalhar com

folhetos da Sanepar (Companhia de Saneamento do Paran) sobre a importncia da

gua e nossa responsabilidade com o meio ambiente e sobre sexualidade. Justifica-

se a escolha deste assunto pelo fato de serem adolescentes, pela necessidade

deste conhecimento, muitas vezes no adquirido em casa, por vergonha dos pais ou

por desconhecimento da Libras para se comunicar com eles.

Alm dos textos citados, queremos disponibilizar para os alunos, no decorrer

das aulas, ao longo do Ensino Fundamental e dentro desta proposta de Letramento,

vrios outros tipos de textos sociais como: narrativas de histrias publicadas ou de

histrias de vida, poemas, histrias em quadrinhos, bilhetes, cartas, convites, textos

didticos, notcia, reportagens, relatrios, documentos de sua vida (certides,

formulrios), bulas de remdios, manual de instrues, entre outros que fazem parte

do nosso dia a dia. Assim, o Letramento vai sendo construdo com textos que se

revelem importante e de uso corrente na vida social.

GTR: SOCIALIZAO DO PROJETO, TROCA DE EXPERINCIAS E INFORMAES RIQUSSIMAS

O GTR consiste num GRUPO DE TRABALHO EM REDE, sendo uma

alternativa para o professor da rede do Estado do PR, podendo dispor do seu tempo

livre para responder suas atividades em casa ou na escola. Atravs dessa

modalidade possvel conhecer propostas novas, interagir com colegas de outras

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cidades e, o mais importante, enriquecer o trabalho dos colegas e o nosso com suas

contribuies, alm de obter certificao para avanos na carreira.

O primeiro passo do GTR foi disponibilizar um resumo na plataforma de

trabalho para que os professores interessados tivessem acesso a ele e pudessem

escolher de qual curso queriam participar dentro de sua rea de atuao ou

interesse. Ao socializar a proposta, tivemos 40 inscries, sendo que todas as vagas

foram preenchidas por professores de vrias cidades do Paran. Alguns com muita

experincia, outros com pouca ou nenhuma experincia com alunos surdos, mas

com muita vontade de partilhar e aprender.

O curso, composto por seis unidades ou mdulos teve a seguinte

programao: na primeira unidade cada participante se apresentou com suas

expectativas sobre o curso para o tutor e para os colegas. Ficou claro que todos

tinham vontade de aprender mais sobre o tema letramento de surdos. No decorrer

do curso quatro cursistas inscritos nunca acessaram o curso. Um acessou, mas, no

concluiu as atividades, sendo, posteriormente, considerado desistente.

Na segunda unidade foram disponibilizados textos sobre o assunto para que

lessem e respondessem atividades. Nessa Unidade dois cursistas fizeram apenas a

metade das atividades propostas e desistiram.

Na terceira unidade nosso projeto foi apresentado para apreciao e

conhecimento dos cursistas, sendo solicitada a relevncia do projeto para a

educao de surdos nos dias de hoje. Nessa Unidade, dois cursistas desistiram,

uma por motivo de sade e outro por motivo ignorado, no conseguimos mais

contatar o cursista. Seguimos com 31 cursistas que concluram todas as unidades.

No geral todas as participaes foram no sentido de que a proposta, alm de

interessante, necessria. Eles concordam que no possvel trabalhar com os

alunos surdos como se trabalha com os ouvintes, mas no tarefa fcil porque no

h material pronto para ser utilizado, sendo necessrio, ento, utilizar textos sociais -

que tambm no tm atividades.

Na quarta Unidade disponibilizamos atividades que seriam trabalhadas com

os alunos surdos includos no ensino regular e os cursistas tambm tiveram

liberdade de opinar e sugerir. Na quinta unidade os resultados da aplicao foram

socializados, como sugesto, muitos aplicaram as atividades em sua realidade e os

resultados segundo eles, foram satisfatrios. A Unidade Didtica serviu de exemplo

para outras atividades com textos sociais de gneros variados. Durante todo esse

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processo as trocas de informaes entre os cursistas foram muito importantes, bem

como a interao com a tutora. Esse o objetivo do curso.

Na sexta unidade, com a avaliao, tivemos a certeza que o objetivo do GTR

e tambm o do PDE foram alcanados. Muitos dos cursistas que aplicaram nossas

atividades tiveram bons resultados e se comprometeram a repassar a proposta

porque viram resultados satisfatrios com seus alunos ou com o relato de colegas.

Para ns, a primeira experincia nessa modalidade a distncia e como tutora, foi

muito gratificante porque mesmo sem conhecer pessoalmente a maioria dos

cursistas, ao responder e interagir parecia-nos que ramos conhecidas e colegas de

escola. Devemos isso ao fato de todos sermos responsveis e querermos o melhor

para os alunos. O GTR foi a semente lanada num grande solo, mas que certamente

dar bons frutos para os profissionais da educao de surdos e, especialmente para

os surdos.

CONCLUSO

Ao concluir este estudo sentimo-nos realizada, pois os objetivos propostos foram

alcanados. As leituras de autores anteriormente citados aclararam nossas dvidas e

ficamos conhecendo aspectos importantes da educao dos surdos. Na sequncia,

tornou-se claro para ns que o profissional da educao especialmente aquele que

trabalha com surdos - precisa sempre estar estudando. Assim como o mundo

dinmico, a educao de hoje no pode ser igual de ontem. Tal afirmao no

significa que devamos jogar o velho fora, mas, sim, us-lo para inovar e no ficarmos

parado no tempo. Portanto, ao professor deve ser propiciado o reconhecimento das

etapas do Letramento e o contato com os diversos textos para, posteriormente,

desenvolverem atividades que aprimorem no aluno surdo a capacidade de leitura e

anlise e, assim, entendam o valor social da escrita. Pelo Letramento percebemos que

possvel trabalhar sem o livro didtico e tais atividades foram, sem dvida,

enriquecedoras para os alunos envolvidos e para ns, como docente, devido ao fato de

percebermos que os alunos fazem relaes com o contedo aprendido em casa em

outras situaes fora da escola.

Aos alunos surdos ficou clara a compreenso de que os textos possuem funo

social, visto que alguns j conseguem relacionar o texto trabalhado s suas realidades.

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Porm, faz-se pertinente que tenhamos em mente que nosso trabalho deve ir alm da

identificao, dado a variedade de textos que circulam na sociedade.

Com o GTR, uma modalidade de educao distncia, socializando todas as

etapas do estudo, interagindo com professores da Rede Estadual do Paran e

percebendo o interesse de muitos em aplicar a Unidade Didtica por ns elaborada,

tivemos a certeza de que muitas de nossas indagaes foram respondidas ao longo

da aplicao do projeto: o ensino da Lngua Portuguesa aos alunos surdos mostrou-

se eficaz atravs do Letramento.

REFERNCIAS

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