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José Leon Machado

O Menino e o Pássaro

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Um menino descobrira um passarinho que ainda não voava. Encontrou-o saltitando assustado num canteiro de flores na casa da avó que fora visitar com a sua irmã, uma menina de tranças muito com-pridas. O menino correu para a irmã e pediu-lhe que o ajudasse a apanhar o pardal. E os dois, com um saco plástico vermelho e azul, conseguiram apanhá-lo. Foram muito satisfeitos mostrá-lo à avó que lhes preparava um lanche apetitoso, como as avós fazem quando são visitadas pelos netos. O menino estava excitado e ela disse-lhe que o pássaro era muito engraçado e que não o deixasse fugir. O menino então projectou uma gaiola de madeira que o pai lhe have-ria de fazer e seria a casa do passarinho. E ele tê-lo-ia no quarto e ouvi-lo-ia cantar, dar-lhe-ia miolo de pão e seriam os dois muito amigos. Após o lanche com biscoitos caseiros e leite quente com chocolate, os netos deram quatro beijos à avó e partiram para sua casa de autocarro. A menina era mais velha e já tinha certa responsabilidade. – Adeus, meninos. Cumprimentos aos papás e tratai bem do passarinho.

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Instalaram-se nos bancos traseiros, aqueles parecidos com os do comboio em que os passageiros estão voltados uns para os outros. O menino sentou-se junto de um senhor de bigode, mal encarado e sempre a coçar o joelho. A irmã ficara ao lado de uma amiguinha a conversar. Em frente esta¬va uma senhora gorda que ocupava mais de metade do banco e entalava contra a janela um outro passageiro. – O que levas no saco com tanto cuidado? – perguntou a amiga da irmã ao menino. – É um passarinho. – Deixas-mo ver? – Deixo. Mas ele que não fuja! – É tão pequenino! – exclamou a amiga espreitando pela abertura da saca – Onde o apanhaste? – No jardim de minha avó. – Já lhe deste de comer? – Dei-lhe migalhas de pão. – O que vais fazer com ele? – Vou tê-lo preso até que aprenda a voar. Se andar por aí, os gatos podem comê-lo. Vou pedir ao meu pai que me ajude a fazer uma gaiola. – Não tens pena de o prender? – Ele é meu amigo!

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O senhor de bigode tossiu e disse: – Ó meu rapaz, de que cor é o passaroco? – É castanho. – Castanho? Humm!... – E fez uma careta. – Deve ser um pardal. – Não é, não! É um passarinho – protestou o miúdo. – Pois olha – acrescentou o senhor de bigode tossindo novamente e coçando o joelho –, os pardais não podem viver fechados. Se o meteres numa gaiola, ele amanhã aparece-te morto. São pássaros que gostam da liberdade. O melhor é tu deitá-lo à vida. Senão, morre. – Não morre, não! – protestou o miúdo – Eu não posso deixá-lo fugir. É muito pe-queno ainda, não sabe voar! E encostou ao peito o saco plástico vermelho e azul numa atitude protectora.

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A senhora gorda, ajeitando-se num gesto macilento, abriu a boca bochechuda e disse para o menino: – Mata-o! Faz uma arrozada com ele. Esses pássaros são maus, não prestam. Estrag-am as sementeiras e depenicam a fruta. Nem os espantalhos os assustam. Quando crescer, será um verdadeiro demónio. Tenho lá em casa umas laranjeiras com laranjas muito boas, de umbigo. Um dia destes, tive desejos de comer duas e pedi ao meu marido, que faz sem-pre a minha vontade, para mas colher. Pois estavam ocas. Os pardais comeram tudo por dentro e só deixaram a casca redonda e muito direitinha pendurada. Grandes lambões! São pássaros maus e feios. Mata-o! Põe-no no chão, um pé em cima e... trás!, menos um. Ou então dá-o à tua mãe para fazer arroz com ele. O menino ficou chocado. Aqueles senhores não gostavam do passarinho. O pardal era seu amigo. Porque é que a gente crescida era tão malvada? Só a avozinha disse bem dele.

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Quando o pai chegou à noite a casa, o menino pedira-lhe a gaiola. Mas o pai, fatiga-do do dia de trabalho, não se queria incomodar a construir uma gaiola para um pássaro e muito menos gastar dinheiro a comprá-la. Tinha mais que fazer, mais em que pensar, mais em que gastar o dinheiro, respondeu-lhe. Por isso o menino meteu o pardalito numa caixa de papelão dos sapatos que lhe ofereceram no Natal e tapou-a com pauzinhos para o pardal não se escapar.

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Todos os dias lhe dava miolo de pão, sementes, moscas que ele apanhava na cozinha com a palma da mão e água fresca numa lata vazia de sardinhas de conserva. E ficava feliz, pois, ao contrário do que o senhor de bigode profetizara, ele não morria. Antes pelo contrário: crescia todos os dias um bocadinho mais.

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Quinze dias depois, o menino retirou os pauzinhos da caixa e o par¬dal esvoaçou pelo quarto. Deu duas voltas à roda do menino e desapare¬ceu pela janela aberta na espessura das árvores próximas. O menino nem chorou nem ficou triste. Veio-lhe uma grande alegria, porque salvara um passarinho das mãos dos homens crescidos e das garras afiadas dos gatos. Agora, sempre que via um bando a saltitar, a chilrear nalguma árvore, apontava e dizia: – Um daqueles é meu amigo. Fui eu que o salvei.

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Fábio Felício Nº4392Artes Plásticas e Multimédia

I.P.Beja

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