A casa do Chapéu ViradoA moradia do Chapéu Virado em Cascais não sendo de autor consagrado faz parte de um período extremamente rico da arquitetura portuguesa em que se confrontaram duas realidades arquitetónicas, a modernidade por um lado e por outro, a tradição corporizada na figura incontornável do arquiteto Raul Lino.
Texto e fotografia: Nuno Ladeiro
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A moradia agora reabilitada exibia na sua fachada o nome “Chapéu Virado”, uma
homenagem à antiga proprietária nascida no Brasil e a residir em Portugal há já
vários anos.
O novo proprietário que agora adquiriu a casa vivia em Cascais e apercebeu-se que
se tratava de uma construção com valor, uma vez que apresentava uma fachada
austera mas ao mesmo tempo moderna. O elevado estado de abandono não o
desencorajou, bem pelo contrário, entusiasmou-o e levou-o a procurar alguém
que o pudesse ajudar a recuperar a casa e o jardim, adaptando-os às novas
necessidades.
O projeto de reabilitação procurou tirar partido das características arquitetónicas
entendendo-as como um elogio justo a uma geração de arquitetos, da qual
fizeram parte, entre outros, Januário Godinho, o seu mestre Rogério de Azevedo
e o próprio Keil do Amaral. Este período foi um momento decisivo de viragem na
arquitetura portuguesa. Os arquitetos desta geração realizaram obras fantásticas
e colocaram em confronto duas realidades distintas mas, conciliáveis; a tradição
e a modernidade. Este difícil equilíbrio duma modernidade em continuidade, com
uma tradição Estado Novo corporizada na polémica da Casa Portuguesa e dos
valores atribuídos (não muito corretamente) ao ideário de Raul Lino nem sempre
foi consensual. Foi o descolar de uma mentalidade romântica, decorativa e feérica,
em direção a uma lógica organicista, universal, que valorizava o caráter expressivo
dos materiais e a singularidade das técnicas, que identificava o espaço como
premissa e o lugar como substância.
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A compreensão e valorização da obra fizeram com que se reconstruíssem as
pedras tradicionalmente bujardadas, se introduzissem os pavimentos em azulino
Cascais sobejamente polidos, se preservasse a tradição adaptando-a à nova
realidade.
A multiplicidade de atitudes e princípios assumidos numa lógica muito própria
foram fundamentais nos detalhes. Desenharam-se novas modelações nos
pavimentos mas sempre na lógica de continuidade e nunca de rutura. Reabilitou-se
a fachada, redesenharam-se as balaustradas, retiraram-se os excessos que o
tempo introduziu e retomou-se a imagem da obra original.
Para um olhar desatento, poderá escapar a vanguarda de rutura que marca esta
arquitetura claramente dos anos 60 mas, em que o equilíbrio entre tradição e
modernidade é, porventura, o rasgo que melhor permite explicar o acerto e a
intemporalidade deste projeto de arquitetura anónima. São obras em que o tempo
era outro. Tudo era pensado, amadurecido, desenhado, acompanhado… É ver
como cada parte ou elemento se insere no conjunto, sem abdicar da sua própria
personalidade.
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EXISTENTE
O abandono da moradia e jardim levou a um estado de ruína que
aparentemente parecia irrecuperável.
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FICHA TÉCNICA
Cliente: Dr. Rodrigo Guimarães
Arquitetura: Nuno Ladeiro
Colaboração: Arq.ª Claudia Campos
Colaboração Paisagismo: Arq. Luís Valente de Carvalho (Horto do Campo Grande)
Modelos Tridimensionais: Arq.ª Elisa Serralha
A reabilitação da casa do Chapéu Virado foi um projeto aturado. Desenharam-se
paramentos novos, padrões para novas composições da pedra, modelou-se o
jardim, escolheram-se cuidadosamente as novas vegetações e por fim, podaram-se
as árvores existentes, transformando-as em autênticas obras de arte.