O conservadorismo condicional nas demonstrações financeiras das
incorporadoras de capital aberto no Brasil
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1. INTRODUÇÃO
O trabalho está dividido em 5 seções: i) a primeira apresenta a introdução com
contextualização da pesquisa, situação problema, hipótese de pesquisa, objetivos e
justificativa; ii) a segunda contém a plataforma teórica com as subseções que abordarão
os conceitos de governança corporativa, gerenciamento de resultados, conservadorismo
condicional e apropriação contábil; iii) a terceira especifica os modelos de
conservadorismo condicional e os dados utilizados; iv) a quarta seção empenha em
analisar e observar os resultando sob a ótica dos modelos; e v) a última faz as
considerações finais.
1.1. Contextualização
Em 1973 foi emitido pelo International Accounting Standards Board (IASB) o
pronunciamento IAS 11 – Construction Contracts, que estabelece o tratamento contábil
das receitas e despesas dos contratos de construção. Estes são definidos como “um
contrato especificamente negociado para a construção de um ativo ou de uma combinação
de ativos que estejam diretamente interrelacionados ou interdependentes em função da
sua concepção, tecnologia e função ou do seu propósito ou uso final” (CPC 17, item 3).
Devidamente fundamentada no regime da competência, tal norma se baseia no método
POC (percentage of completion) como forma de reconhecimento de receita, o qual utiliza
o percentual de conclusão da obra (razão entre custo incorrido e custo orçado) para
reconhecer a receita ao longo da construção.
Todavia o IAS 11 não tinha uma clara distinção entre i) um contrato de construção, ii) um
contrato de prestação de serviços, iii) ou uma venda de bens. Para melhor interpretação,
o IASB emitiu em 2008 a instrução IFRIC 15 – Agreements for the Construction of Real
Estate, a qual proporcionou melhor entendimento da norma. A instrução definiu um
critério para identificar o enquadramento das atividades do setor de construção civil:
indaga-se se “o comprador é capaz de especificar os principais elementos estruturais do
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projeto do imóvel antes de começar a construção e/ou especificar mudanças estruturais
significativas após o início da construção (quer, ou não, o comprador exerça essa
possibilidade) ” (ICPC 02, item 11). Caso este critério for atendido, a atividade se
enquadra como um contrato de construção. Caso negativo, será uma prestação de serviços
ou venda de bens, passando então a serem normatizados pelo pronunciamento IAS 18 –
Revenue.
O IAS 18 já era aplicável em outros setores, contudo, quando a norma é utilizada pela
construção civil, o método POC também pode ser aplicado. No caso das prestações de
serviços, se atendido os critérios de reconhecimento de receita do IAS 18,
necessariamente aplica-se o POC nos termos do IAS 11. Já nos casos de venda de bens,
o método só é aplicável quando a “entidade pode transferir ao comprador o controle, os
riscos e os benefícios da propriedade do imóvel em construção em seu estágio atual de
acordo com a evolução da obra” (ICPC 02, item 17), desde que “os critérios de
reconhecimento de receita do IAS 18 forem continuamente atendidos à medida que a
construção avança” (Ibidem).
Paralelamente foi aprovada no Brasil a Lei 11.638/07, um marco do processo de
internacionalização das normas contábeis brasileiras. Desta forma as publicações IAS 11,
IAS 18 e IFRIC 15 são aplicadas pelo país por meio do CPC 17, CPC 30 e ICPC 02,
respectivamente.
Antes destas normas vigorarem, no Brasil, a Resolução CFC 963/03 regimentava todo
setor nacional. Esta resolução tinha diversas semelhanças com o IAS 11, inclusive os
critérios e os métodos para o reconhecimento da receita. Entretanto, com a publicação da
IFRIC 15 pelo IASB, a comparabilidade internacional foi comprometida, uma vez que
alguns segmentos tiveram nova interpretação. Todavia, a ascensão da Lei 11.638/07, e
consequentemente, com vinda dos CPCs, esperava-se retomar da comparabilidade com
as normas internacionais.
Um dos segmentos afetados pela ICPC 02 (IFRIC 15) foi a incorporação imobiliária. É
um segmento da construção civil, que tem como objetivo construir e comercializar
unidades imobiliárias para usos residencial e/ou comercial. Conforme a ICPC 02 sua
operação é caracterizada como venda de bens. Contudo, como os compradores não têm a
posse do imóvel ao longo da construção, interpretava-se que não há transferência do
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controle, dos riscos e dos benefícios ao longo da obra. Portanto a receita desta atividade
deveria ser reconhecida integralmente quando entregada a posse do imóvel ao comprador
(na conclusão da obra), e não mais pelo método POC conforme previsto pela CFC 963/03.
1.2. Situação problema
Contudo, Santos Domingues e Galdi (2010, p.214) observam que os impactos da ICPC
02 (IFRIC 15) às incorporadoras são decorrentes principalmente do modelo de negócios
utilizado no Brasil, o qual não é adotado em outros países. Pois “usualmente [no Brasil],
os novos projetos residenciais são vendidos ‘na planta’ e os recursos iniciais obtidos junto
aos compradores são utilizados para financiar parte da construção dos imóveis”.
Somando-se a esta característica nacional, o setor de construção civil possui uma
particularidade que se destaca dos demais setores da economia: além de sua
complexidade, o ciclo operacional geralmente extrapola um ano, ou seja, seu ciclo é maior
que o período contábil. Estas particularidades tornam-se um desafio quando se pretende
reconhecer, mensurar e evidenciar os resultados de um determinado período (BONIZIO,
2001).
A esse respeito Iudícibus, et al. (2010, p. 395) argumentam:
A justificativa do procedimento de reconhecer os resultados ao longo do período do
contrato, alternativamente à hipótese de nada se alocar durante o desenvolvimento do
contrato, para só se apropriar o resultado integral ao final, deve-se à preferência de se terem
resultados intermediários, em cada exercício, de forma aproximadamente certa, em vez de
resultados totalmente errados em todos os períodos. Quando se apropria tudo no final, cada
resultado anterior terá ficado errado integralmente, e o último não é correto também, pois
engloba todo o auferido e ganho nos anteriores; mas só agora é contabilmente reconhecido.
Portanto, o reconhecimento da receita integralmente no final da obra, como previsto pela
ICPC 02 (IFRIC 15), traria impacto estrutural e relevante às incorporadoras. O tema levou
grande preocupação para os gestores das companhias (SUETUGUI, 2011).
Em resposta a estas particularidades, o Comitê de Pronunciamentos Contábeis publicou
em 2010 a orientação OCPC 04 – Aplicação da Interpretação Técnica ICPC 02 às
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Entidades de Incorporação Imobiliária Brasileiras, que orientou principalmente os
critérios para o reconhecimento das receitas das incorporadoras no contexto nacional.
Tal orientação evidencia que os atos normativos contábeis devem ser lidos e interpretados
considerando a essência econômica das transações que pretendam normatizar,
independentemente da forma jurídica de que estejam revestidos, que demonstra uma visão
justa e verdadeira (true and fair view) da situação patrimonial da empresa. Na orientação
são observados diversos indícios que no contexto nacional permite-se transferir o
controle, os riscos e benefícios aos compradores ao longo da obra. Por meio dela,
justificou-se a aplicação do método POC pelas incorporadoras brasileiras.
Observou-se que em 2010 todas as empresas brasileiras de incorporação imobiliária
declararam em suas notas explicativas aplicar o método POC .
As justificativas levantadas pelos autores, para que as incorporadoras resistam na
utilização do POC, tange diretamente a qualidade da informação contábil. Entretanto o
método apresenta suas fragilidades, as revisões dos orçamentos podem alterar
significativamente a velocidade do reconhecimento da receita. Ou seja, o aumento do
custo orçado gera ajuste negativo de receitas reconhecidas indevidamente em períodos
passados, já a diminuição do custo orçado resulta em ajustes positivos.
Bonizio (2001) afirma que qualquer método utilizado para o reconhecimento da receita
não é objetivo e seus resultados podem ser considerados subjetivos. Com isso, gera ajustes
decorrentes de erros de previsão dos custos orçados.
Portanto, Santos, Oliveira e Filho (2010, p.15) destacam alguns pontos relevantes do CPC
17 ao tratar do método POC:
Controle Orçamentário: [...], é necessário que as entidades apresentem registros financeiros
e contábeis confiáveis e um sistema orçamentário eficaz.
Revisão de estimativas: [...] a entidade deve rever as estimativas de custo do projeto em
bases periódicas (mensalmente ou trimestralmente), a fim de determinar de forma
apropriada o resultado estimado para conclusão do projeto e o percentual de grau de avanço
dos contratos durante sua execução
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1.3. Hipótese
Visto que o processo de internacionalização geraria impactos significativos no
reconhecimento das receitas das incorporadoras do país, a OCPC 04 harmonizou as
normas internacionais com as características locais. A aplicação método POC justifica-se
pelos argumentos levantados por Iudícibus, et al. (2010), o qual preza a maior qualidade
informacional.
Todavia Bonizio (2001) observa que devido aos erros de previsão do orçamento, dada as
particularidades do setor, a aplicação do método geraria resultados considerados
subjetivos. Neste sentido, pode-se reconhecer uma relação de tradeoff 1 entre maior
qualidade informacional e menor subjetividade do método. Pois a subjetividade abre
precedentes para que o gestor utilize seu poder discricionário em vista de maximizar sua
função utilidade.
No contexto da incorporação imobiliária, a subjetividade atrelada à dimensão e
persistência das apropriações contábeis geram maiores incertezas para o reconhecimento
da receita. Considerando que os contadores habitualmente já deparam com elevado nível
de incerteza para efetivar as apropriações dos ganhos e perdas econômicas (COELHO,
2007).
Deste modo, o conservadorismo é um dos princípios utilizados para tentar tornar as
informações mais confiáveis (BASU, 1997). O qual reduz os custos de agência (WATTS,
2003). Que, portanto, pode ser visto como um mecanismo de governança corporativa para
reduzir o comportamento oportunista dos gestores. (COLLINS; et al., 2014).
Considerando a subjetividade do POC, a dimensão e persistência das apropriações
contábeis, e os mecanismos de governança corporativa, define-se a hipótese:
H: O nível de conservadorismo condicional nas demonstrações financeiras das
incorporadoras é superior em relação a outras empresas de capital aberto no Brasil.
1 “A expressão tradeoff define uma situação de escolha conflitante, isto é, quando uma escolha
que visa a redução de determinado problema acarreta, indevidamente, outros” (MANKIW, 2009).
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1.4. Objetivo
O trabalho tem como objetivo observar e analisar o conservadorismo condicional das
incorporadoras de capital aberto no Brasil.
1.5. Justificativa e contribuição
Ao estudar a opinião dos diversos usuários sobre os métodos de reconhecimento de receita
das incorporadoras brasileiras, Suetugui (2011, p. 13) concluiu:
Os órgãos reguladores, o fisco, e o meio acadêmico têm um viés de padronização e
comparabilidade da contabilidade brasileira com a internacional [...]. Já os analistas
financeiros, investidores e bancos buscam a manutenção das regras atuais [utilização do
método POC] dado que desta forma o histórico do setor seria mantido e a comparabilidade
entre histórico e projeção seriam viáveis.
Mesmo alguns anos após a pesquisa de Suetugui (2011), o tema é ainda continua em pauta
de discussão. Apesar de todas as incorporadoras brasileiras continuarem utilizando o
método POC, não existe um consenso sobre a melhor forma de reconhecimento de receita.
Além da comparabilidade, a confiabilidade é outra característica da qualidade da
informação contábil questionada quando utilizado ou não o método POC, visto que a
relação de tradeoff entre maior qualidade informacional e menor subjetividade do método
não tem solução óbvia. Tal conflito impacta diretamente na utilidade da informação para
fins de decisão dos usuários externos.
Todavia é possível observar que a existência do conservadorismo condicional nas
demonstrações financeiras pode refletir uma melhor qualidade informacional (SILVA,
2013). Portanto, observar e analisar o conservadorismo condicional, variável da qualidade
da informação, poderá gerar subsídios a enriquecer as discussões sobre o tema. Pois com
a identificação de conservadorismo é possível reconhecer a receita com a devida
responsabilidade para não gerar um lucro artificial, ou seja, baseado em excesso de
otimismo, o qual mitiga o efeito do tradeoff.
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Além disso, os resultados deste trabalho também darão informações aos próprios usuários
externos sobre o conservadorismo condicional das demonstrações financeiras das
incorporadoras brasileiras e seus impactos na utilidade da informação contábil.
As pesquisas sobre o reconhecimento de receita das incorporadoras brasileiras dedicaram-
se principalmente em analisar a conformidade das demonstrações financeiras com as
normas vigentes. Já as pesquisas sobre ao conservadorismo condicional não abordaram
especificamente as incorporadoras. Desta forma o presente trabalho traz a essência dos
diversos estudos do conservadorismo e aplica-os ao contexto das incorporadoras
brasileiras.
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2. PLATAFORMA TEÓRICA
O presente trabalho evidencia o conservadorismo condicional das empresas de
incorporação imobiliária. A plataforma teórica empenhará em fundamentar os conceitos
necessários para a observância e análise do tema.
2.1. Gerenciamento de resultados e governança corporativa
A teoria de agência busca analisar a relação de diversos indivíduos de um dado sistema,
onde a propriedade e o capital são designados a pessoas diferentes. Tal relação é dada por
uma ou mais pessoas (principal) que emprega outra pessoa (agente) para exercer um
trabalho em seu favor, dando-o alguma autonomia de decisão. (JENSEN; MECKLING,
1976)
Jensen e Meckling (1976) observam ainda que o indivíduo pode apenas desejar
maximizar sua utilidade, sendo que as decisões estão fundamentadas apenas em suas
preferências e objetivos. Portanto existe uma boa razão para acreditar que o agente não
irá atuar conforme os interesses do principal. A partir do exposto, chega-se ao chamado
“conflito de agência”.
De acordo com Segatto-Mendes (2001), a teoria de agência analisa os conflitos e custos
resultantes da separação entre propriedade e controle de capital. Essa possibilidade de não
participação do acionista no gerenciamento da empresa é bem representada pela
sociedade por ações, que limita a responsabilidade do acionista para com a organização à
parcela de capital que ele investiu.
Os custos de agência podem ser entendidos os custos de oportunidade (aplicação de
recursos em fins que não maximiza a utilidade do principal), e os custos de
monitoramento do comportamento dos gerentes (SEGATTO-MENDES, 2001).
No mercado de capitais, o conflito de agência é exacerbado pela assimetria informacional,
pois os administradores (agentes) possuem informações mais completas sobre o
desempenho da companhia do que os investidores (principal). Portanto esta assimetria
pode levar os investidores a prejuízos, uma vez que demoram mais para saber a situação
real da empresa. (LOPES, 2004)
10
Dentro do contexto da teoria de agência, a governança corporativa trata das formas pelos
quais os acionistas encontram para assegurar o retorno do seu investimento. Assim os
mecanismos de governança corporativa, asseguram maior transparência e confiabilidade
aos investidores. (SHLEIFER; VISHNY, 1997).
Neste contexto, a contabilidade exerce um papel importante:
A informação contábil é o produto da contabilidade corporativa e de sistemas de
informação para usuários externos, que mensuram e evidenciam publicamente informações
quantitativas auditadas relacionadas à posição financeira e performance de companhias
abertas2 (BUSHMAN; SMITH, 2001, p. 238).
Para tanto, estas informações precisam ser as mais úteis para que reflitam com maior
qualidade a posição econômico-financeira da entidade. “Se a informação contábil-
financeira é para ser útil, ela precisa ser relevante e representar com fidedignidade o que
se propõe a representar. A utilidade da informação contábil-financeira é melhorada se ela
for comparável, verificável, tempestiva e compreensível.” (Pronunciamento Conceitual
Básico, QC4).
Todavia, a própria elaboração das demonstrações financeiras sofre os efeitos do conflito
de agência. Watts e Zimmerman publicaram diversas obras relacionando os conceitos de
teoria de agência no âmbito contábil. Evidencia-se a possibilidade do gestor utilizar seu
poder discricionário em vista de maximizar sua função utilidade (FILHO; MACHADO,
2004). Este conceito aplicado à contabilidade constitui a gênese do gerenciamento de
resultados.
2.2. Conservadorismo condicional
Basu (1997) define o conservadorismo como o reconhecimento mais tempestivo das más
notícias (bad news) em relação às boas notícias (good news). Este reconhecimento
antecipado das más notícias gera assimetrias sistemáticas persistentes no resultado.
2 Tradução livre de: Financial accounting information is the product of corporate accounting and
external reporting systems that measure and publicly disclose audited, quantitative data
concerning the financial position and performance of publicly held firms.
11
Todavia o conservadorismo passou por diversos entendimentos ao longo do tempo, e seu
conceito tem sido questionado pelo IASB em função da possibilidade de influenciar a
neutralidade da informação. Em 2011 o presidente da instituição, Hans Hoogervorst,
declarou uma carta dizendo que não há problema no conceito do conservadorismo, mas
o seu uso em excesso pode gerar distorções. Mesmo havendo a exclusão do conceito do
conservadorismo na estrutura conceitual do IFRS, ele está enraizado no fundamento de
várias normas, por exemplo, o teste de impairment (SILVA, 2013).
Complementarmente Ball e Shivakumar (2005) abordam o tema em conceitos
segregados: i) o conservadorismo condicional decorrente da antecipação de possíveis
perdas econômicas, ii) e o conservadorismo incondicional que divulga valores baixos
independente do desempenho econômico.
A assimetria mencionada por Basu (1997) gera reservas ocultas pelo fato de reconhecer
perdas ainda não realizadas. Ou seja, são reconhecidas perdas futuras que ainda não
impactaram no fluxo de caixa presente. Todavia Ball e Shivakumar (2005) observam que
para o conservadorismo condicional, as reservas ocultas se desaparecem ao longo do
tempo, por estarem efetivamente relacionadas a perdas econômicas. Isto é, nestes casos
existe um reconhecimento de perdas econômicas futuras de provável realização. Para o
conservadorismo incondicional, as perdas não têm fundamento econômico, desta forma
elas geram reservas ocultas que não tem possibilidade de se realizarem.
Portanto conceito de conservadorismo incondicional pode ser associado com a declaração
de Hans Hoogervorst, uma vez que as distorções são geradas por reconhecimentos de
perdas sem fundamentos econômicos. Logo a existência do conservadorismo condicional
pode refletir uma melhor qualidade informacional (SILVA, 2013).
Sinteticamente Moreira, Calauto e Amaral (2010, p. 81) explicam que o conservadorismo
“consiste na inclusão de certa dose de cautela na formulação dos julgamentos necessários
na elaboração de estimativas nessas condições de incertezas, por isso é um atributo de
qualidade informacional das demonstrações contábeis. ”
Dentro do contexto organizacional, é importante observar quais são as motivações dos
gestores a praticar o conservadorismo. Após revisão da literatura, Coelho (2007) concluiu
que na maioria dos estudos, sobre praticar ou não o conservadorismo, variam acerca da
influência do conservadorismo na avaliação de empresas, até geração de informações
12
adequadas e eficientes para a contratação da empresa com seus públicos de interesse.
Todavia o autor também observou outras influências, tais como: i) instrumentalização de
mecanismos de governança, ii) qualidade e independência da auditoria, iii) características
particulares dos gestores (por exemplo, grau de aversão ao risco e oportunismo), e iv)
planos de remuneração e mecanismos internos de gestão de conflitos de agência.
Um dos incentivos para relatórios conservadores é a redução dos custos de agência
(WATTS, 2003). Portanto, o conservadorismo pode ser visto como um mecanismo de
governança corporativa para reduzir o comportamento oportunista dos gestores.
(COLLINS; et al., 2014). Por meio do estudo empírico de Almeida, Scalzer e Costa
(2008), observa-se maiores níveis de conservadorismo condicional nas empresas
negociadas na Bovespa que possuíam algum grau de governança corporativa, conforme
classificações da própria Bolsa.
2.3. Apropriação contábil
Coelho (2007, p. 63) observa a relação entre o conservadorismo e o regime da
competência:
A gênese formal do conservadorismo tem origem na estrutura do método contábil com os
Princípios da Realização da Receita e do Reconhecimento da Despesa, os que permitem
que se produzam construtos patrimoniais independentes da utilização de caixa nas
transações registradas.
A diferença entre o regime da competência e o regime de caixa gera apropriações
contábeis a serem realizadas devido a ajustes temporais entre o fluxo de caixa e o lucro
contábil das transações econômicas em andamento. Observando cada período
isoladamente, temos a seguinte identidade:
Equação 1 - Identidade do regime da competência (COELHO, 2007, p.65)
ACC ≡ LC – FCO, onde:
ACC = Apropriações Contábeis (advindas do regime de competência);
LC = Resultado Contábil;
FCO = Fluxo de Caixa Operacional.
13
As apropriações contábeis tendem a se anular (DECHOW; DICHEV, 2002), pois são
apenas ajustamentos temporários a fim de gerar informação aos usuários da
contabilidade.
Estas apropriações podem ser observadas nas vendas e compras de bens a prazo, e nos
recebimentos e pagamentos adiantados. Nestes exemplos estão incutidos o conceito de
Capital de Giro, que apresentam ajustes temporais em curto prazo nas disponibilidades
da entidade. Há também casos em que os ajustes temporais perpetuam por mais tempo,
em longo prazo. Por exemplo, as depreciações.
Os ajustes das apropriações contábeis vão além de um ajuste temporal, eles apresentam
informações não relacionadas à operação, mas que afetam “o valor líquido da empresa
como aproximação do valor de mercado dos componentes patrimoniais da firma”
(COELHO, 2007, p.66). São exemplos: i) teste de impairment; ii) registro de goodwill;
iii) reconhecimento de depreciação acelerada; iv) baixa do valor do estoque; v)
reavaliação de ativos, e outros.
Contudo, os contadores podem lidar com elevado nível de incerteza para efetivar as
apropriações dos ganhos e perdas econômicas, pois os valores dependem de estimativas
de julgamentos subjetivos da gerência, e a realização do caixa possuí alto grau de
incerteza por períodos indefinidos em longo prazo (COELHO, 2007).
Estas incertezas podem ser mitigadas pela pratica do conservadorismo condicional. Os
ajustes das apropriações contábeis podem ser reconhecidos com princípios
conservadores, desta forma as más notícias são reconhecidas mais rapidamente que as
boas notícias. Assim haverá a representação no presente a expectativa do fluxo de caixa
futuro. Visto que a existência do conservadorismo condicional pode refletir uma melhor
qualidade informacional (SILVA, 2013).
14
3. MÉTODO DE PESQUISA
A seção discorrerá sobre a metodologia utilizada para analisar o comportamento do
conservadorismo condicional das incorporadoras imobiliárias conforme a hipótese da
pesquisa. O modelo apoia-se nos métodos de regressão múltipla a partir de dados
amostrais coletados do software Economatica®.
3.1. Especificação do Modelo Original de conservadorismo condicional
O primeiro modelo apresentado é baseado em Basu (1997) para a observância do
conservadorismo condicional. Apresentando neste trabalho como Modelo Original, nele
foram adicionadas dummies para controlar o efeito setor3.
Equação 2 - Modelo Original
Onde,
Xit é o lucro por ação da empresa i no ano t;
Pit-1 é o preço da ação da empresa i de 9 meses antes do final do ano-fiscal t.
Rit é o retorno da empresa i de 9 meses antes do final do ano-fiscal t até 3 meses
após o final do ano-fiscal t.
DRit é uma variável dummy que assume valor 1 quando Rit é menor que 0, e 0
quando Rit assume outros valores;
∑ 𝜑𝑆𝑒𝑡𝑗−1𝑗 corresponde as dummies adicionadas pra controlar o efeito setor.
3 As dummies são adicionas como forma de controlar as características isoladas de cada setor,
proporcionando mais neutralidade aos outros coeficientes (LI, 2010).
Xit / Pit-1 = α + β1DRit + β2Rit + β3DRit*Rit +
∑ 𝜑𝑆𝑒𝑡𝑗−1𝑗 + μit
15
O modelo pressupõe um mercado de ações eficiente (ou semiforte), pois espera-se que o
preço da ação contenha todas as informações econômicas relevantes (COELHO, 2007).
Esta premissa contribui para a compreensão do modelo de Basu (1997). O preço da ação
há 9 meses antes do fechamento do ano t precificou a companhia referente ao ano t-1,
desta forma o lado esquerdo da igualdade (Xit / Pit-1) reflete o retorno da companhia em
bases econômicas e contábeis, ou seja, é o lucro contábil do ano t sobre o valor da empresa
(preço da ação) no ano t-1.
Já as variáveis do lado direito da igualdade estão representadas em bases econômicas. O
retorno é calculado pela variação da precificação da companhia pelo mercado de ações.
Desta forma, pela significância das variáveis, é possível analisar se o resultado econômico
incorpora o resultado contábil, além de demonstrar características de tempestividade.
Deste modo o conservadorismo pode ser analisado, pois é possível observar, pela reação
do mercado, informações conservadoras contidas nas demonstrações financeiras. Ou seja,
se o mercado reage tempestivamente a números conservadores após publicações
desfavoráveis (SILVA, 2013).
Dentre as variáveis da regressão, a dummy DR interage com o coeficiente β3, o qual
mensura a sensibilidade do lucro para retornos positivos e negativos (BASU, 1997). Para
os retornos positivos esta dummy assume valor 0, desta forma a regressão apresenta
característica de regressão linear simples, ou seja, a função pode ser representada por uma
reta nos eixos cartesianos XY. Entretanto a dummy DR assume valor 1 para os retornos
negativos, neste caso a função terá 3 variáveis e sua representação gráfica compreende 3
eixos.
A Figura 1 representa graficamente o modelo de Basu (1997) em duas dimensões, com
corte no eixo X. Percebe-se que para os valores negativos os retornos são sempre
inferiores à reta de valores positivos. Portanto, a significância do β3, o coeficiente de
Basu, leva a percepção de conservadorismo. Este coeficiente gera o reconhecimento de
perdas incrementais. Portanto Lopes e Walker (2008) consideram que um resultado com
características de conservadorismo apresenta a soma de β2 e β3 com valor superior a β2.
16
Figura 1- Efeito incremental do β3 do modelo de Basu (1997) da associação entre o lucros e
retornos.
3.2. Especificação do Modelo Adaptado de conservadorismo condicional
Este segundo modelo é uma adaptação ao Modelo Original de Basu (1997), que tem os
mesmos princípios das adaptações de Lopes, et al. (2008), Santos, et al. (2011) e Silva
(2013).
Apresentado neste trabalho como Modelo Adaptado, tem os mesmos fundamentos de
análise do Modelo Original, todavia será acrescida uma variável dummy que interage com
outras variáveis. A Equação 3 representa o Modelo Adaptado deste trabalho:
Equação 3 - Modelo Adaptado
Onde,
Xit é o lucro por ação da empresa i no ano t;
Xit / Pit-1 = α + β’0DRit + β’1Rit + β’2Rit*DRit + β’3DRit*Rit*Inc +
β’4Inc + β’5Rit*Inc + ∑ 𝜑𝑆𝑒𝑡𝑗−1𝑗 + μit
17
Pit-1 é o preço da ação da empresa i de 9 meses antes do final do ano-fiscal t.
Rit é o retorno da empresa i de 9 meses antes do final do ano-fiscal t até 3 meses
após o final do ano-fiscal t.
DRit é uma variável dummy que assume valor 1 quando Rit é menor que 0, e 0
quando Rit assume outros valores;
Inc é uma variável dummy que assume valor 1 quando a empresa é do setor de
incorporação imobiliária, e 0 quando é de outro setor;
∑ 𝜑𝑆𝑒𝑡𝑗−1𝑗 corresponde as dummies adicionadas pra controlar o efeito setor.
A dummy Inc distingue as incorporadoras brasileiras de empresas de outros setores da
economia. Como as incorporadoras assumem o valor 1 nesta variável, o coeficiente β’3
apresentará o conservadorismo apenas das incorporadoras. Uma vez que outras empresas
ao assumirem valor zero, o efeito do coeficiente é anulado. Com a mesma lógica do
Modelo Original, o β’3 gera o reconhecimento de perdas incrementais, mas neste caso,
apenas das incorporadoras.
Os resultados da aplicação dos dois modelos poderão validar a hipótese de pesquisa, a
qual espera um nível superior de conservadorismo das incorporadoras em relação ao
mercado.
Pois a aplicação do Modelo Original apresentará o conservadorismo geral do mercado
(incluindo as incorporadoras), e por sua vez o Modelo Adaptado apresentará o
conservadorismo apenas das incorporadoras. Deste modo é possível identificar, por meio
destes coeficientes, a diferença entre os níveis de conservadorismo. Visto que quanto
maior o coeficiente, maior o conservadorismo identificado.
3.3. Seleção de dados
Conforme premissa do modelo de Basu (1997), pressupõe-se que o mercado de ações seja
eficiente (ou semiforte), pois espera-se que o preço da ação contenha todas as informações
econômicas relevantes. Como a liquidez aumenta a eficiência de mercado (FORTI;
18
PEIXOTO; SANTIAGO, 2009), a amostra que atende a necessidade do trabalho é
composta pela combinação de duas carteiras teóricas de liquidez comprovada. São elas:
Índice Brasil 100 – (IBrX 100). Composta por ações negociadas na
BM&FBOVESPA que estão entre as 100 melhores classificadas quanto ao seu
índice de negociabilidade, apurados nos doze meses anteriores à reavaliação, e
terem sido negociadas em pelo menos 70% dos pregões ocorridos nos doze meses
anteriores à formação da carteira.
Índice BM&FBOVESPA Imobiliário – (IMOB). Composta por ações de
companhias da atividade imobiliária que, com base nos doze meses anteriores,
cujos índices de negociabilidade somados representem 99% do valor acumulado
de todos os índices individuais, e tenha participação em termos de presença em
pregão igual ou superior a 95% no período.
Estipulado o critério para a escolha das companhias, a Tabela 1 demonstra o
procedimento para a seleção final.
Tabela 1 - Procedimentos para seleção da amostra final
Empresas IBrX 100 em 21/10/2015 98
(+) Empresas de incorporação imobiliária do índice IMOB em 21/10/2015 9
(=) Subtotal 1 107
(-) Empresas repetidas (Listadas no índice IMOB e no IBrX-100) (6)
(=) Subtotal 2 101
(-) Ações com baixa liquidez para o caso de 2 ações da mesma empresa (5)
(-) Empresas com informações incompletas do sistema (14)
(=) Total de empresas que compõe a amostra 82
Uma vez selecionada as empresas, observa-se na Tabela 2 a composição da amostra por
setores de atuação, conforme classificação do Economatica®.
19
Tabela 2 - Número de empresas por setor
Setor Frequência %
Alimentos e Bebidas 8 10%
Comércio 6 7%
Energia Elétrica 12 15%
Finanças e Seguros 9 11%
Incorporação Imobiliária 9 11%
Máquinas Indust. 1 1%
Mineração 1 1%
Outros 15 18%
Papel e Celulose 2 2%
Petróleo e Gás 1 1%
Química 1 1%
Siderur. & Metalur. 4 5%
Software e Dados 2 2%
Telecomunicações 3 4%
Têxtil 1 1%
Transporte Serviços 3 4%
Veículos e peças 4 5%
82 100%
Na Tabela 3 são apresentadas as nove incorporadoras que compreendem a amostra.
Adicionalmente estão relacionados os pronunciamentos utilizados para embasar os
métodos de reconhecimento de receita, além de especificar o método utilizado, conforme
as notas explicativas das demonstrações financeiras de 2014.
20
Tabela 3 - Listagem das empresas de incorporação imobiliária, pronunciamentos e
métodos de reconhecimento de receita conforme demonstrações financeiras de 2014.
Companhia
Pronunciamentos
embasados para
reconhecimento de
receita
Método de
reconhecimento
de receita
Cyrela Brazil Realty S.A. CPC 17, 30; ICPC 02;
OCPC 04 POC
Direcional Engenharia S.A. CPC 30; OCPC 04 POC
Even Construtora e Incorporadora S.A. CPC 30; OCPC 04 POC
EZ TEC Empreendimentos e Participações S.A. OCPC 04 POC
Gafisa S.A. OCPC 04 POC
Helbor Empreendimentos S.A. CPC 30; OCPC 04 POC
MRV Engenharia e Participações S.A. OCPC 04 POC
Rossi Residencial S.A. CPC 17; OCPC 04 POC
Tecnisa S.A. CPC 30; OCPC 04 POC
Conforme características da amostragem Basu (1997), estre trabalho analogamente
desenvolveu:
Dados deflacionados;
Dados em cross-section compreendendo os anos de 2010 a 2014;
Aplicação do modelo de dados em painel POLS (pooled ordinary least squares).
3.4. Coleta de dados
Os dados foram coletados do software Economatica®, o qual foi parametrizado a gerar
dados deflacionados. Desta forma todos os valores foram corrigidos pelo Índice Nacional
21
de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) assumindo a data base de 01/04/2015. Os dados
compreendem os valores de fechamento das ações no dia 1º de abril dos anos de 2010 a
2015, e o lucro anual por ação de 2010 a 2014.
Os cálculos foram elaborados no software Microsoft Excel®, sobretudo os modelos de
regressão múltipla por meio da função “Regressão” do suplemento “Análise de dados”.
22
4. OBSERVAÇÃO E ANÁLISE DE RESULTADOS
4.1. Observação dos resultados da aplicação dos modelos
Na Tabela 4 são apresentados as médias e os desvios-padrão de algumas variáveis dos
anos de 2010 a 2014. Pode-se observar variações ao longo dos anos que refletem
mudanças na conjuntura macroeconômica do país. A aplicação do método de dados em
painel POLS, juntamente com a aplicação das variáveis de controle do efeito setor, podem
mitigam os efeitos temporais e setoriais. Desta forma, os resultados obtidos podem ser
mais relevantes por contemplarem cenários econômicos distintos.
Tabela 4 - Dados estatísticos das variáveis X/P, R, DR*R, DR*R*Inc
Xit / Pit-1 Rit DRit*Rit DRit*Rit*Inc
t μ σ μ σ μ σ μ σ
2010 0,119 0,103 0,160 0,325 -0,059 0,115 -0,006 0,038
2011 0,079 0,084 0,032 0,302 -0,110 0,160 -0,019 0,082
2012 0,045 0,105 0,025 0,320 -0,115 0,169 -0,017 0,089
2013 0,051 0,128 -0,097 0,210 -0,140 0,130 -0,022 0,077
2014 0,035 0,140 -0,068 0,322 -0,164 0,207 -0,040 0,136
NOTA: Xit / Pit-1 é o retorno dado pela razão entre o lucro por ação da empresa i no ano t e o preço da ação
da empresa i de 9 meses antes do final do ano-fiscal t; Rit é o retorno da empresa i de 9 meses antes do final
do ano-fiscal t até 3 meses após o final do ano-fiscal t; DRit é uma variável dummy que assume valor 1
quando Rit é menor que 0, e 0 quando Rit assume outros valores; e Inc é uma variável dummy que assume
valor 1 quando a empresa é do setor de incorporação imobiliária, e 0 quando é de outro setor.
Anderson, et al. (2009, p. 252) observam que a média amostral pode “ser aproximada por
meio de uma distribuição normal sempre que a amostra tiver o tamanho de 30 ou mais”.
Portanto, é importante observar a frequência das variáveis DR*R e DR*R*Inc quando as
dummies assumem valor 1. Na Tabela 5 estão apresentadas as frequências destas
variáveis. Observa-se que elas apresentam a frequência necessária para aproxima-se de
uma distribuição normal, visto que o método POLS utiliza o valor total.
23
Tabela 5 - Número de observações por período das variáveis DR*R e DR*R*Inc
t DR*R DR*R*Inc
2010 23 2
2011 39 7
2012 40 4
2013 65 8
2014 45 9
TOTAL 212 30
Na Tabela 6 são apresentadas as estimativas para o modelo de reconhecimento oportuno
de perdas segundo Basu (1997) e o Modelo Adaptado.
Tabela 6 - Estimativas geradas para o modelo de reconhecimento oportuno de perdas
segundo Modelo Original e Modelo Adaptado.
Variáveis
Original
(Equação 2)
Adaptado
(Equação 3)
Coeficiente / ( t ) Coeficiente / ( t )
C 0,073 / (4,19) 0,066 / (3,82)*
DR -0,003 / (-0,21) -0,012 / (-0,70)
R 0,015 / (0,43) 0,015 / (0,41)
DR*R 0,218 / (3,64) 0,134 / (2,06)**
Inc*R 0,013 / (0,13)
R*DR*Inc 0,322 / (1,88)***
N. Obs. 410 410
R² ajust. 0,152 0,181
Estatística F 7,709 9,424
Nota: Coeficientes *, **, *** são significantes estatisticamente a níveis de 1%, 5% e 10%
respectivamente.
24
Ao observar os resultados obtidos com a aplicação do Modelo Original, percebe-se que o
valor de β3 (0,218) é positivo. Este coeficiente apresenta um valor-p extremamente baixo,
representando assim uma variável de significância estatística. Portanto pode-se concluir
que o mercado reconhece as perdas econômicas mais oportunamente.
Ao adicionar a variável Inc conforme a proposta do Modelo Adaptado, a estimativa para
“R*DR*Inc” apresenta-se estatisticamente relevante, pois o valor-p de 0,06 é também
significativo. Sendo um coeficiente positivo (0,322) permite-se concluir que as
incorporadoras também apresentam características de conservadorismo, isto é, as
incorporadoras reconhecem mais tempestivamente as más notícias (bad news) em relação
às boas notícias (good news).
Pode-se observar também que o coeficiente de 0,322 da variável R*DR*Inc é superior ao
β3 (0,218) do Modelo Original, o que revela um maior nível de conservadorismo
condicional nas empresas de incorporação imobiliária em relação a outras empesas de
capital aberto no Brasil. Portanto, a hipótese de pesquisa pode ser aceita.
4.2. Análise de resultados
As apropriações contábeis no segmento de incorporação se apresentam de forma muito
característica. As vendas no período denominado “pré-chaves” (entre o lançamento e a
entrega do imóvel) são uma realidade presente no Brasil, que geram impactos
significativos no reconhecimento da receita. Para as vendas efetuadas neste período, de
aproximadamente três anos, as incorporadoras cobram em média 25% do valor do imóvel
a serem pagos durante a obra. (SASAKI, 2010).
Para exemplificar, o Gráfico 1 representa a diferença entre o valor efetivamente pago pelo
cliente e a receita reconhecida pelo método POC ao longo do tempo.
25
Gráfico 1 - Exemplificação da diferença entre o regime de caixa e o regime da competência
Neste exemplo, como forma de simplificação, a venda ocorreu no lançamento do
empreendimento concomitantemente ao início do período contábil. No término do
primeiro período, a companhia recebeu (caixa) 55% da receita reconhecida; no término
do segundo período, 20%; e ao encerrar a construção, 25%. Quando o empreendimento é
finalizado o cliente quita o saldo devedor por meio de recursos próprios ou de terceiros,
neste momento o valor recebido se iguala a receita já reconhecida. Há incorporadoras que
parcelam o imóvel além do período “pré-chaves”, nestes casos as apropriações contábeis
se estendem por diversos anos.
Portanto, a dimensão e persistência das apropriações contábeis da incorporação
imobiliária aumentam as incertezas para o reconhecimento da receita, visto que os
contadores habitualmente já deparam níveis de incerteza para efetivar as apropriações dos
ganhos e perdas econômicas (COELHO, 2007). Portanto, a elevada dimensão das
apropriações pode afetar ainda mais a qualidade da informação, visto que a subjetividade
abre precedentes para que o gestor utilize seu poder discricionário em vista de maximizar
sua função utilidade.
Então, a hipótese de pesquisa evidenciou o conservadorismo condicional como princípio
para mitigar o efeito do tradeoff entre a maior qualidade da informação com a menor
subjetividade do método de reconhecimento de receita, ou seja, incentiva a redução dos
custos de agência (WATTS, 2003). Que, portanto, pode ser visto como um mecanismo
0
100
200
300
400
500
600
Mil
ha
res
Caixa Competência
Início das
obras
Término das
obras
1º Per. Contábil 2º Per. Contábil 3º Per. Contábil
26
de governança corporativa para reduzir o comportamento oportunista dos gestores
(COLLINS; et al., 2014).
Dentro do contexto brasileiro, o estudo empírico de Almeida, Scalzer e Costa (2008)
identificou maior nível de conservadorismo condicional das companhias listadas na
Bovespa que tinham algum nível de classificação de governança corporativa. Esta
observação pode evidenciar o resultado deste trabalho, uma vez que todas as
incorporadoras listadas na amostra fazem parte do Novo Mercado 4, o mais elevado nível
de governança corporativa da BM&FBOVESPA.
Deste modo, a aceitação da hipótese pode estar relacionada ao contexto de maiores
incertezas das incorporadoras, respondido por maior conservadorismo condicional que
pode elevar a qualidade às receitas reconhecidas pelo POC. Isto significa que possíveis
ajustes positivos na receita, decorrente da revisão do orçamento, não seria feito.
Entretanto, para os ajustes negativos das receitas já reconhecidas anteriormente, se faz
imediatamente.
No contexto do método POC, Santos, Oliveira e Filho (2010) observaram a necessidade
de um sistema orçamentário eficaz com revisões periódicas dos custos orçados. Desta
forma, no Anexo A estão apresentados diversos trechos de notas explicativas das
incorporadoras sobre da revisão do custo orçado, que relatam a frequência e atenção que
as companhias empenham na revisão dos custos orçados.
Conclui-se então que i) as características operacionais das incorporadoras, ii) dado o
método de reconhecimento de receita, iii) com elevada dimensão e persistência das
apropriações contábeis, iv) dentro de um contexto do Novo Mercado, iv) evidenciado pela
regular revisão de custos orçados, podem justificar um maior conservadorismo
condicional das incorporadoras em relação às outras empresas do mercado.
4 Novo Mercado firmou-se como uma seção destinada à negociação de ações de empresas que adotam,
voluntariamente, práticas de governança corporativa adicionais às que são exigidas pela legislação
brasileira. Para maiores informações sobre os critérios para compor a seção em <
http://www.bmfbovespa.com.br/pt-br/servicos/solucoes-para-empresas/segmentos-de-listagem/novo-
mercado.aspx?idioma=pt-br> Acesso em 09 de nov. de 2015.
27
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Prezando pela qualidade da informação contábil, a OCPC 04 deu nova interpretação à
ICPC 02 (IFRIC 15), a qual harmonizou as normas internacionais com as características
locais das incorporadoras brasileiras. Todavia, foi identificado um tradeoff entre a maior
qualidade da informação com a menor subjetividade do método de reconhecimento da
receita. O trabalho levantou as hipóteses que o nível de conservadorismo condicional nas
demonstrações financeiras das incorporadoras é superior em relação a outras empresas de
capital aberto no Brasil.
Foram analisadas 82 empresas de diversos setores, sendo que dentre elas 9 são
incorporadoras. Ao aplicar o Modelo Original, observou-se com significância estatística
que as 82 companhias, em média, possuem algum nível de conservadorismo.
Quando aplicado o Modelo Adaptado, o qual apresenta o conservadorismo apenas das
incorporadoras, o coeficiente β’3 também acusou conservadorismo, todavia seu valor foi
superior ao observado no Modelo Original. Desta forma, pôde-se aceitar a hipótese de
pesquisa. A este resultado também é possível afirmar que estas empresas possuem um
nível maior de tempestividade, uma vez que o modelo de Basu (1997) analisa o
conservadorismo pela ótica tempestiva.
Justificou-se o maior nível de conservadorismo pelo seguinte conjunto:
Características operacionais das incorporadoras. Tais como o longo ciclo
operacional e venda relevante “na planta”;
Método de reconhecimento de receita. Apresenta-se subjetivo;
Elevada dimensão e persistência das apropriações contábeis;
Contexto do Novo Mercado. A governança corporativa favorável ao
conservadorismo;
Revisão frequente dos custos orçados. Evidenciação nas notas explicativas.
Ou seja, dada as características operacionais, a aplicação do método POC eleva a
qualidade informacional, mas é afetada pela subjetividade passível de gerenciamento de
28
resultados. Todavia, a governança corporativa, por princípios conservadores, diminui o
custo de agência elevando a confiabilidade das demonstrações. No entanto, dada a
dimensão das apropriações contábeis, o nível de conservadorismo se justificou.
A incorporação imobiliária se diferencia dos demais setores por diversos motivos:
demanda, risco, investimento, sazonalidade, retorno e outros. O trabalho se limitou em
analisar a qualidade da informação contábil pela ótica do conservadorismo, mais
especificamente dos efeitos do método POC. O conservadorismo e tempestividade
presentes nas demonstrações contábeis certamente impactam positivamente na qualidade
da informação, mas não é possível afirmar que as incorporadoras possuem maior
qualidade informacional, visto que diversas outras variáveis devem ser analisadas.
Como sugestão para pesquisas futuras, pode-se analisar outras variáveis das
incorporadoras que impactam na qualidade informacional, além do aperfeiçoamento do
Modelo Adaptado.
Em maio de 2014 o IASB aprovou a norma IFRS 15 – “Revenue from Contracts with
Customers”, a qual substituirá a IAS 11 e a IAS 18 a partir de 2018. Tais mudanças podem
ser pesquisas sobre conservadorismo neste novo contexto normativo.
29
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COMITÊ DE PRONUNCIAMENTOS CONTÁBEIS. Pronunciamento Técnico CPC
17 (R1): Contratos de Construção. Brasília, DF, 2012.
5 De acordo com a Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 6023.
30
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32
WATTS, R.L. Conservatism in accounting part I: explanations and implications.
Accounting Horizons. v. 17, p. 207–221, 2003.
33
ANEXO A – Trechos de notas explicativas de algumas incorporadoras sobre os
custos orçados
CYRELA (DF 2014)
“O custo orçado é revisado periodicamente e pode ocasionar alterações nas estimativas
iniciais. O efeito de tais revisões afeta o resultado prospectivamente, de acordo com o
pronunciamento técnico CPC 23 – Políticas Contábeis, Mudança de Estimativas e
Retificações de Erros. [...]
As principais incertezas, premissas e estimativas estão relacionadas, principalmente, aos
seguintes aspectos: custo orçado das obras, vida útil do ativo imobilizado, determinação
de taxas de desconto para apurar[...]”
DIRECIONAL (DF 2014)
“Os custos orçados totais, compostos pelos custos incorridos e custos previstos a incorrer
para o encerramento das obras, são revisados periodicamente no decorrer das obras, e o
efeito destas revisões nas estimativas afeta o resultado da companhia, de acordo com o
pronunciamento técnico CPC 23 – Políticas Contábeis, Mudanças de Estimativas e
Retificação de Erros.”
EVEN (DF 2014)
“O uso desse método requer que se estime os custos a serem incorridos até o término da
construção e a entrega das chaves das unidades imobiliárias pertencentes a cada
empreendimento de incorporação imobiliária para estabelecer uma proporção em relação
aos custos já incorridos. [...]
Atualmente 100% das obras de todos os nossos projetos são executadas pela própria Even.
Este alto grau de verticalização, junto com os nossos sistemas de controle, nos garante
uma maior agilidade no controle de custos de nossas obras. Enfatizamos que o cálculo do
POC (apropriação de receita em nossas demonstrações financeiras) contempla o custo
orçado de nossas obras, sempre revisado mensalmente, refletindo assim a real
performance da empresa.”
EZ TEC (DF 2014)
“Custos orçados: são regularmente revisados, conforme a evolução das obras, e os ajustes
com base nesta revisão são refletidos nos resultados da Companhia de acordo com o
método contábil utilizado;
34
GAFISA (DF 2014)
“Os custos orçados, compostos, principalmente, pelos custos incorridos e custos previstos
a incorrer para o encerramento das obras, são regularmente revisados, conforme evolução
das obras, e eventuais ajustes identificados com base nesta revisão são refletidos nos
resultados da Companhia. O efeito de tais revisões nas estimativas afeta o resultado.”
HELBOR (DF 2014)
“Os custos orçados totais, compostos pelos custos incorridos e custos previstos a incorrer
para o encerramento das obras, são regularmente revisados, conforme a evolução das
obras, e os ajustes com base nesta revisão são refletidos nos resultados da Companhia de
acordo com o método contábil utilizado.”
TECNISA (DF 2014)
“Os custos orçados totais, compostos pelos custos incorridos e custos previstos a incorrer
para o encerramento das obras dos empreendimentos imobiliários, são periodicamente
revisados, conforme a evolução das obras, e os ajustes com base nessa revisão são
refletidos nos resultados da Companhia.”