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OBTENÇÃO DE NANOCOMPÓSITOS DE POLIÉSTER-MONTMORILONITA (MMT) APLICADOS EM TINTA EM PÓ

PARTE 1: CARACTERIZAÇÃO DOS NANOCOMPÓSITOS

aDiego Piazza*1, Débora S. Silveira2, Natália P. Lorandi2, Eliena J. Birriel2, bAdemir J. Zattera1, Lisete C. Scienza2

Universidade de Caxias do Sul – UCS –

1Laboratório de Polímeros /

2Laboratório de Corrosão

Rua Francisco Getúlio Vargas, 1130 – 95070-560 – Caxias do Sul, RS – Salas V-205G e G-205 a* [email protected] /

[email protected]

O desenvolvimento e obtenção de nanocompósitos poliméricos na área da nanotecnologia e da nanociência destacam-se pela diversidade de aplicações e significativas melhorias nas propriedades quando comparados com compósitos convencionais. Neste trabalho, formulações de tinta em pó comercial base poliéster contendo 0, 2 e 4% de montmorilonita (MMT) foram obtidas através da incorporação no estado fundido e caracterizadas por MET, MEV, DSC, TGA e Difração de Raios-X. A nanotinta foi aplicada por pintura eletrostática em aço carbono 1020. As análises por microscopia eletrônica mostraram a presença de MMT no filme da tinta, predominantemente na forma esfoliada, corroborando com os Raios-X obtidos, alguns tactóides e um filme superficial com poros e falhas. Redução gradativa da temperatura de reticulação, e diminuição da estabilidade térmica foram observadas nas análises térmicas. Os resultados mostraram que a formulação com 2% de MMT apresentou uma melhor dispersão da argila no revetimento e a obtenção de um filme de melhor qualidade. Palavras-chave: Dispersão, montmorilonita, nanocompósito, resina poliéster, tinta em pó.

Obtention of polyester-montmorillonite (MMT) nanocomposites applied to powder coating

Part 1: Nacocomposites characterization.

The development and obtention of polymeric nanocomposites in the nanotechnology and nanoscience field have attracted great attention due to diversity of potential applications and significant property improvement when compared to conventional composites. In this work, commercial formulations of polyester-based powder coating with 0, 2 and 4% (w/w) of montmorillonite (MMT) were obtained by incorporation in the melting state and characterized by TEM, SEM, DSC, TGA and XRD. The nanocoatings were applied on the mild carbon steel panels by electrostatic paint. The microscopy analysis showed MMT in the coating film, predominantly in the exfoliated form, corroborated by XRD results. Some tactoid structures and a surface film with some defects and porous were also revealed. Progressive reduction of crosslinking temperature and thermal stability was observed in thermal analysis. The best clay dispersion in the coating and a higher quality film were achieved at 2% MMT concentration. Keywords: Dispersion, montmorillonite, nanocomposite, polyester resin, powder coating Introdução Nanocompósitos poliméricos são definidos como uma classe de materiais poliméricos reforçados

com cargas inorgânicas nos quais pelo menos uma das dimensões da carga está em uma dimensão

nanométrica [1-4], dependendo de sua estrutura pode-se classificá-los em três tipos: i)

nanocompósitos contendo partículas esféricas [5-7]; ii) nanocompósitos contendo nanotubos ou

nanofibras [8, 9]; iii) nanocompósitos contendo partículas na forma de folhas [1-4]. Para estes

últimos, dependendo da natureza dos componentes utilizados (silicato, cátion orgânico e matriz

polimérica) e do método de preparação, três principais tipos de compósitos podem ser obtidos

quando uma argila é misturada com um polímero [1]: compósitos convencionais, nanocompósitos

intercalados, e nanocompósitos esfoliados ou delaminados. Quanto a preparação de nanocompósitos

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poliméricos com argila, alguns métodos vem sendo utilizados, tais como esfoliação-adsorção [10-

12], intercalação por polimerização in-situ [13-17] ou intercalação no estado fundido [18-19]. A

técnica de intercalação no estado fundido tem sido preferida, devido a algumas vantagens como

ausência de solventes, e a capacidade de produção elevada, entre outros. No entanto, a formação de

nanocompósitos poliméricos com estruturas intercaladas e/ou esfoliadas através deste método

requer um controle apurado da química dos componentes e das condições de processamento [18-

19]. Nestes nanocompósitos, aumentos substanciais das propriedades mecânicas, de barreira e

térmicas dos polímeros são conseguidos com a incorporação de apenas 5% em massa de argila.

Baseado neste cenário, a incorporação de argilas a tintas poliméricas por intercalação no estado

fundido possui um grande potencial, porém, muito pouco explorado. Especificamente, o segmento

de tintas em pó representa um campo de atuação propício para melhoria significativa de

propriedades, devido às características inerentes às tintas e aos processos de fabricação. Existe uma

infinidade de tintas em pó, sendo que a maior parte consiste de misturas de resinas termorrígidas

(epóxi, poliéster ou híbrida epóxi-poliéster) com cargas inorgânicas, como: pigmentos, cargas de

preenchimento, entre outras. O método mais comum e viável para a fabricação de tintas em pó a

base de resinas termocuráveis, consiste na preparação das misturas da resina termorrígida com as

cargas no estado fundido, com alto cisalhamento do material, tempo de residência curto, e baixas

temperaturas, geralmente 90°C.

Após o processo de mistura, a tinta em pó é cominuida até atingir a granulometria desejada para

possibilitar a aplicação, e esta se dá normalmente com auxílio de pistolas, onde a tinta é depositada

sobre a superfície que se deseja recobrir, posteriormente esta superfície é aquecida para que o

processo de cura do filme aplicado se inicie, formando ligações cruzadas entre as cadeias do

polímero base. A razão carga/resina está relacionada com as propriedades reológicas da tinta

durante o processo de aplicação da mesma.

A incorporação de argila, especialmente a montmorilonita, a resinas termorrígidas, possui grande

potencial na fabricação de nanocompósitos aplicados a tintas em pó. Estudos relatam a grande

eficiência da incorporação de montmorilonita particularmente a resinas epóxi [10-11, 15-17] e

poliéster insaturado [22], na fabricação de nanocompósitos esfoliados com incremento das

propriedades mecânicas, de barreira e de resistência à degradação [12, 20-21]. É importante

destacar que as propriedades reológicas [23] e de cura [24] destes materiais também seriam afetadas

pela incorporação das nanocargas.

O desenvolvimento de filmes nanoestruturados com MMT utilizando resinas de interesse comercial,

epóxi e poliéster, são poucos [25]. No meio acadêmico destacam-se estudos de incorporação da

montmorilonita (MMT) em matrizes base epóxi (EP) [25] para a fabricação de tintas líquidas. Na

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área de tintas em pó, porém, não há registro de trabalhos de nanocompósitos com matriz epóxi ou

poliéster. Portanto, o desenvolvimento destes novos materiais é ainda incipiente, tanto em caráter

científico como tecnológico. O presente artigo investigou a morfologia das misturas e a dispersão

da montmorilonita organicamente modificada, pela incorporação desta em estado fundido numa

mistura padrão de tinta em pó base poliéster.

Experimental

Materiais

A resina poliéster (Crylcoat 2425-0) foi fornecida pela empresa Surface Speciaties S.A. A argila

montmorilonita (MMT) modificada organicamente do tipo Cloisite 30B foi fornecida pela Southern

Clay Products. O substrado metálico aço carbono 1020 foi utilizado em forma de chapas com

dimensões de 95 x 145 x 1 mm.

Preparação dos nanocompósitos poliéster/MMT e aplicação

Os nanocompósitos resina poliéster/MMT foram preparados no estado fundido, utilizando uma

extrusora monorrosca da marca BUSS PVS 30, com velocidade de 200 rpm, e temperatura de 90°C.

Três formulações de tinta em pó foram obtidas, contendo 0, 2 e 4% de MMT, conforme apresentado

na Tabela 1.

Tabela 1 – Composição das Tintas.

Produto Amostra A Amostra B Amostra C Resina Poliéster 1832,2 g 1798,4 g 1758,8 g

PT 100 138 g 135,2 g 132,4 g Alastrante 10 g 10 g 10 g Benzoína 5 g 5 g 5 g

MMT 0 g 39,4 g 78,8 g % ponderal de MMT 0 % 2 % 4 %

Após extrusado, o material foi submetido a um cisalhamento manual para a obtenção de chips, os

quais foram cominuídos em um moinho de lâminas. O pó obtido da moagem foi peneirado

manualmente com uma peneira de granulometria 17µm, sendo as partículas de menor dimensão

utilizadas para a aplicação da tinta nos painéis de aço carbono. Estes painéis foram desengraxados

manualmente com o uso de gaze embebida em solvente orgânico (metil-etil-cetona). Após a

aplicação da tinta por pintura eletrostática, procedeu-se à cura em estufa a 200 ºC durante 10

minutos.

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Caracterização

Os nanocompósitos Resina Poliéster/MMT foram caracterizados por Calorimetria Exploratória

Diferencial (DSC) no equipamento SHIMADZU DSC-50 e por Análise Termogravimétrica (TGA)

no equipamento SHIMADZU TGA-50, ambos à uma taxa de 10°C/min., à uma vazão de

50mL/min. de N2. Na análise por Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) foi utilizado um

microscópio SHIMADZU SEM Superscan SS-550 a uma voltagem de 15kV, com aumento de

3000x. Para Microscopia Eletrônica de Transmissão (MET) foi utilizado microscópio PHILIPS EM

208S. Difração de Raio X foi realizada num Difratômetro SHIMADZU – XRD 6000, utilizando

radiação de Cu, com ângulo de 2θ.

Resultados e Discussão

As análises de DSC mostram que há dois eventos significativos. O primeiro refere-se à temperatura

de fusão, e o segundo à temperatura de reticulação, conforme demonstrado na Figura 1. Com o

aumento da concentração de MMT, observou-se uma diminuição gradativa da temperatura de

reticulação.

Figura 1. Análise de DSC da argila (MMT) e das tintas formuladas sem MMT e com 2% e 4% de MMT.

A Figura 2 apresenta o resultado do ensaio de TGA. Observa-se que ocorre um aumento da perda da

massa em temperaturas inferiores, diminuindo a estabilidade térmica do nanocompósito com o

aumento da concentração de MMT, onde é possível verificar esta redução no detalhe da Figura 2.

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Figura 2. Análise Termogravimétrica das diferentes concentrações de MMT e da argila. Detalhe mostrando a perda da massa nas diferentes

concentrações de MMT.

A Figura 3 apresenta as fotomicrografias obtidas por MET das amostras das concentrações de tinta

em pó dos nanocompósitos poliéster/MMT. É possível, na análise morfológica com aumento de

25000x, observar a formação de um nanocompósito com partículas de argila distribuídas na forma

intercalada e esfoliada na matriz polimérica, bem como a presentça de algumas estruturas tactoides.

Figura 3 – Fotomicrografias das amostras de tinta em pó: (a) sem MMT, (b) com 2% de MMT, e (c) com 4% de MMT.

As fotomicrografias obtidas por MEV (Figura 4) mostram a presença de poros e aglomerados na

superfície do filme aplicado sobre o substrato metálico.

Figura 4– Fotos da análise de MEV das amostras de tinta em pó: (a) sem MMT, (b) com 2% de MMT, e (c) com 4% de MMT.

(a) (b) (c)

(a) (b) (c)

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As amostras de tintas em pó poliéster/MMT, com concentrações de 0, 2 e 4% de MMT, foram

caracterizadas por difração de Raios-X. Os resultados desta caracterização estão apresentados na

Figura 5, onde se observou o deslocamento dos picos para a esquerda, ou seja, para ângulos

menores, o que indica a expansão do espaçamento “d001” causado pela intercalação das cadeias de

polímero nas galerias da argila sugerindo uma estrutura mais esfoliada, corroborando com os

resultados de MET.

0 2 4 6 8 10 12

0

2000

4000

6000

8000

10000

12000

Inte

nsid

ade

2 θ

Tinta em Pó (Resina Poliéster + 0% MMT)

Tinta em Pó (Resina Poliéster + 2% MMT)

Tinta em Pó (Resina Poliéster + 4% MMT)

MMT

Figura 5 – Sobreposição dos difratogramas de raios-X da MMT e das composições da nanotinta poliéster/MMT.

Conclusões

Com base nos resultados obtidos, pode-se concluir que os nanocompósios (poliéster/MMT) das

amostras de tintas em pó com concentrações de 2% de MMT apresentam os melhores resultados

quanto à formação de filmes para revestimento do que maiores concentrações de MMT. Este

resultado pode ser justificado pelas análises de MET, MEV e Difração de Raios-X, onde se observa

que houve esfoliação da argila MMT na matriz de resina poliéster quando aplicada sobre substratos

de aço carbono.

O aumento da concentração para 4% de MMT pode gerar defeitos no filme, na forma de poros e

aglomerados, não ocorrendo a dispersão da argila, indicando a presença de tactóides no filme

aplicado sobre o substrato metálico. O presente resultado é corroborado pelas análises de TGA e

DSC, observando que o aumento do teor de MMT no nanocompósito gera uma diminuição na

estabilidade térmica e redução gradativa na temperatura de reticulação, podendo causar defeitos na

etapa de cura da nanotinta.

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Agradecimentos

A Universidade de Caxias do Sul, ao Laboratório de Polímeros da Universidade de Caxias do Sul,

ao Laboratório de Corrosão da Universidade de Caxias do Sul, a Tecnóloga de Polímeros Débora

Albino, e a empresa Finantintas S.A. pelo apoio a este estudo.

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