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;T lista de tituios no final do volume
:::_~o P'ASSO-A-PASSO
SOCIAlS PASSO-A-PASSO
~ : C e ls o Castro
: : r n«;t'IRA PASSO-A-PASSO
~: Denis 1.Rosenfield
XV-U.l41ISE PASSO-A-PASSO
. = ;- ~ MaTCO Antonio C outinho Jorge
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- e¢o P'AS,SO-A-PASSO
·~I""."C: SOCIAlS PASSO-A-PASSO
~~: Celso Castro
P'ASSO-A-PASSO
~: Denis L. Rosenfield
-:OAJi"\iV'-~SEPASSO-A-PASSO:;;~fia' Marc o A nto nio C ou tin ho Jo rg e
,¢: - i . , , - t a de titulos no final do volume
Pedro Paulo Funari
Sandra de CassiaAraujo Pelegrini
Patrirnonio hist6rico
e cultural
~~
ZAHARRio de Janeiro
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Copyright © 2006, Pedro Paulo Funari e
Sandra de Cassia Araujo Pelegrini
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Composicao: Top'I'extos Edicoes Graficas Ltda.
Impressao: Sermograf
Cap a: Sergio Campante
ClP-Brasil. Catalogacao na fonte
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ
Funari , Pedro Paulo Abreu, 1959-
F977p Patrimonio historico e cultural I Pedro Paulo Funari,
2.,ed. Sandra de Cassia Araujo Pelegrini. - Led. - Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2009
(Ciencias sociais passo-a-passo)
Indui bibliografia
ISBN 978-85-7110-927-8
1. Patrimonio cultural . - Protecao. 2. Conservacao
historica, 1.Pelegrini, Sandra de Cassia Araujo, 1962-. II.
Titulo. III. Serie,
COD: 363.69
COU: 351.853
Sumario
Introducao 7
o patrimonio, do individuo a coletividade 8
A trajet6ria do patrimonio no contexte
mundial 10
A preservacao do patrimonio cultural na
AITH~ricaLatina 29
Politicas patrimoniais no Brasil:
impasses e realizacoes 43
A gestae do patrimonio cultural no
limiar do seculo XXI 56
Hefe renc ias e f on te s 61
1 itu ra s r ec om en da da s 67 -r :
Agradecimentos 70
S ab re o s a uto re s 71
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lntroducao
Quando se comemorou, se assim podemos dizer, 0quinto
entenario da chegada deCabral aoBrasil, em2000,0jurista
[oaquim Falcao constatou, com tristeza, que "patrimonio
historico virou sinonimo de igrejas barrocas, palacios e ca-
sas-grandes", Tal queixa implicava que os indigenas, alem
dos africanos e de tudo que se refere it vida cotidiana, nao
'ram associados, por nos, ao patrimonio. Como conse-
quencia, patrimonio historico parecia ser algo distante,
ulheio, velho.
Essas primeiras impressoes podem ser contrastadas
corn0empenho das comunidades empreservar e usar aqui-
,1 0 que consideram seupatrimonio, Emvarias partes do pais,entidades civis mobilizam-se para se apropriar dos seus
b '11S culturais. Em cidades como Santana do Parnaiba eSao
S·bastiao, entre outras, surgem projetos de preservacao pa-
t rirnonial que contam com a participacao de criancas das
comunidades locais. Como chegamos a essa situacao apa-
rentemente contraditoriai Quais as perspectivas do patri-
monic em nosso pais? Essas sao algumas das perguntas que
('sl' volume pretende discutir. Para isso, cornecaremos pe-
lo s conceitos basicos e pelas origens hist6ricas do patrimo-
7
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8 Pedro Paulo Funari e Sandra c .A . Pelegrini
nio, tanto no contexto mundial como no Brasil. Pretende-
mos que, ao final, 0 leitor nao apenas entenda melhor as
discussoes e praticas referentes ao patrimonio Como possa,
individual ou coletivamente, contribuir para uma acao pa-
trimonial em beneficia de todos.
o patrirnonio, do indivfduo a coletividade
Hoje, quando falamos em patrimonio, duas ideias diferen-
tes, mas relacionadas, vern a nossa mente. Em primeiro
lugar, pensamos nos bens que transmitimos aos nossos her-
deiros - eque podem ser materiais, como uma casa au uma
joia, com valor monetario determinado pelo mercado. Le-
gam as, tambern, bens materiais de pouco valor comercial,
mas de grande significado emocional, como uma foto, urn
livro autografado au uma imagem religiosa do nosso altar
domestico, Tudo isso pode ser mencionado em urn testa-
mento e constitui 0patrimonio de urn individuo.
A esse sentido legal do termo, devemos acrescentar
outro, nao menos importante: a patrimonio espiritual..
Quando pensamos no que recebemos de nossos antepassa-
dos, lembramo-nos nao apenas dos bens materiais, mas
tambern da infinidade de ensinamentos e licoes de vida que
eles nos deixaram. A maneira de fazer nhoques - que nao
se resume a receita, guardada com cuidado no caderno com
a letra da nossa querida mae au avo -, 0 modo como
sambamos (algo que nunea estara em urn caderninho!), os
ditados e proverbios que sabemos de cor e que nos guiam
II
Patrimonlo histor ico e cul tural 9
por toda a vida sao exemplos de urn patrimonio imaterial
inestimavel. Que Ieitor nao podera arrolar uma serie de
outros?
Ate agora, tratamos do patrimonio como alga indivi-
dual, de cada um de nos, mas, a partir de nossas percepcoes
e sentimentos, podemos entender 0 usa do mesmo termo
para se referir aquilo que e coletivo. Ha uma diferenca es-
sencial, contudo. 0 patrirnonio individual depende de n6s,
que decidimos 0 que nos interessa. l a 0 coletivo e semprealgo mais distante, pois e definido e determinado por outras
pessoas, mesmo quando essa coletividade nos e pr6xima. Se
dez pessoas diferentes forem listar 0 patrimonio de seu
iondomfnic ou de seu bairro, chegarao a listas muito dispa-
res. A associacao de moradores pode determinar que cons-
tituern 0patrimonio com urn, par exemplo, uma arvore e 0
hino do bairro (is so existe!). Se e assim em uma comuni-
dade pequena, tanto maior sera a distancia entre 0 indivi-
duo e as grandes coletividades, como 0municipio, 0estado,
IInacao ou a humanidade como urn todo. Para entender 0
putrimonio coletivo, e necessario, antes, refletirmos sobre apropria vida coletiva.
A co leuv idade eo pa tr im tm io . A coletividade nao e uma sim-
I I 's soma de individuos, assim como 0todo nao euma mera
lilly' 0das partes, como afirmou, ha 2.500 anos, a fil6sofo
KI"l'goPlatao, Podernos lembrar tambem 0 que diz outro
pensador antigo, Arist6teles, ao assinalar que as palavras
1110 sil.o apenas a juncao de letras, como urn animal nao e a
IIIia de orgaos, As coletividades sao constituidas por gru-
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10 Pedro Paulo Funari e Sandra CA. Pelegrini
pos diversos, em constante mutacao, com interesses distin-
tos e, nao raro, contlitantes. Urna mesma pessoa po de per-
tencer a diversos grupos e, no decorrer do tempo, mudar
para outros. Passamos, assim, par grupos de faixa etaria:
criancas, adolescentes, adultos, idosos. Passamos ainda de
estudantes a profissionais, e, em seguida, a aposentados.
Sao, portanto, inumeras as coletividades que convivem em
constante interacao e rnudanca,Inevitavelmente, essa diversidade leva a multiplicidade
de pontos de vista, de interesses e de acoes no mundo. Como
diziam os latinos, cada cabeca, uma sentenca, As opinioes,
por sua vez, resultam da diversidade de interesses, dos be-
neficios que se espera obter. Foram ainda os romanos a
cunhar uma expressao que explica bern essa diversidade de
interesses: cu i b ono , quem se beneficia? Os interesses sociais
de governantes e governados, de homens e mulheres, crian-
cas e adultos, cristaos e muculmanos nem sernpre sao con-
vergentes. 0 que para uns e patrimonio, para outros nao e.
Alem disso, os valores sociais mudam com 0 tempo. Portudo isso, convem analisar como 0patrimonio foi visto ao
longo dos tempos e dos grupos sociais,
A trajetoria do patrirnonio no contexto mundial
As o ri ge ns . Patrimonio e uma palavra de origem latina, pa-
trimonium, que se referia, entre os antigos romanos, a tudo
o que pertencia ao pai, pater ou paterfamilias, pai de familia.
Patr lrnonlo hlstorico e cultural 11
A semelhanca dos termos - p a te r, p a tr imoni um , f am i li a-
porem, esconde diferencas profundas nos significados, ja
que a sociedade romana era diversa da nossa. A familia
compreendia tudo que estava sob dominio do senhor, in-
clusive a mulher e os fi1hos, mas tambem os escravos, os
bens m6veis e im6veis, ate mesmo os animais. Isso tudo era
o patrimonium, tudo que podia ser legado por testamento,
sem excetuar, portanto, as pr6prias pessoas.o conceito de patrimonio, surgido no ambito privado
do direito de propriedade, estava intimamente ligado aos
pontes devista e interesses aristocraticos. Entre os romanos,
[1 maioria da populacao nao era proprietaria, nao possuia
'N raves; logo, nao era possuidora de patrimonium. 0 patri-
monic era urn valor aristocratico e privado, referente a
In1l1smissao de bens no seio da elite patriarcal romana. Nao
hnvia 0 conceito de patrimonio publico. Ao contrario, 0
IIJ~tadoera apropriado peIos pais de familia. N esse contexto,
podc-se compreender que os magistrados romanos colecio-
u lSSem esculturas gregas em suas casas. 0 patrimonio era
Iiitriarcal, individual e privativo da aristocracia.
Com a difusao do cristianismo e 0predominio da Igreja
II partir da Antiguidade tardia (seculos IV-V) e, em espe-
rlul, na Idade Media (seculos VI-XV), ao carater aristocra-
t it'u do patrimonio acrescentou-se outro, simb6lico e cole-
IIV'u;0 religioso. Ainda que 0 carater nristocratico tenha se
11 umtido, elevaram -se a categoria de valores sociais compar-
I lhados os sentimentos religiosos, em uma pletora de for-
I I I 1 I N materiais e espirituais. 0 culto aos santos e a valoriza-
~jh das reliquias deram as pessoas comuns urn sentido de
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12 Pedro Paulo Funari e Sandra CA. Pelegrini
patrimonio muito proprio e que, como veremos, de certa
forma permaneee entre n6s: a valorizacao tanto dos lugares
e objetos como dos rituais coletivos. Essas leituras e
interpretacoes populares nao deixavam de se ligar as
concepcoes aristocraticas, mas, de certo modo, fugiam do
seu controle. A reacao das elites nao tardaria, e veio com a
monumentalizacao das igrejas e a criacao das catedrais, que
passaram a dominar as paisagens do mundo fisieo e espiri-
tual. No topo de uma elevacao.passava a erguer-se a sededa
catedra do bispo, autoridade maxima: a catedral era urn
patrimonio coletivo, mas aristocratico,
o Renascimento viria a produzir uma mudanca de
perspectiva, ainda que0carater aristocratico fossemantido,
se nao mesmo reforcado, pelo humanismo nascente. Os
homens de entao lutaram pelos valores humanos, em subs-
tituicao ao dominio da religiao, e eombateram 0teocentris-
mo que prevalecera por longos seculos, Em sua batalha
intelectual, mas tambem pratica e politica, buscaram inspi-
racao na Antiguidade grega e romana e condenaram seus
imediatos antecessores, que teriam vivido urn periodo de
trevas, que chamaram de Idade Media, entre aAntiguidade
eo Renascimento da gloria dos antigos.ldade das Trevas era
urn termo que exemplificava bern 0tom da reacao ao domi-
nio das crencas e da nova valorizacao da cultura antiga.
Mas como chegar aos venerados antigos? Ravia duas
maneiras principais: lendo obras antigas e colecionando
objetos e vestigios da Antiguidade. Com a invencao da im-
prensa, multiplicaram-se as edicoes das obras classicas, na
-egua original e traduzidas. Em paralelo, os humanistas
Patrimonio hist6rico e cultural 13
znmecaram a se preocupar com a catalogacao e coleta de
~ e que viesse dos antigos: moedas, inscricoes em pedra,
~c.SOS de ceramica, estatuaria em marrnore e emmetal. Ves-
_:;'01> de edificios tambern eram medidos, desenhados e
,.,,-;:ndadoscom grande dedicacao. Esses humanistas, que
zmavam coisas antigas, fundaram 0 que viria a se chamar
_':..:'..tiquariado.sso ocorria nao apenas em cidades com
zrandes monumentos classicos, como Roma, mas por toda
~ .=.mopa, ate mesmo em cidadezinhas e aldeias onde os
zzriquarios faziam pesquisas com um nao disfarcado orgu-
- = - local.Algunsestudiosos enfatizam que 0patrimonio moder-
- - deriva, de uma maneira au de outra, do Antiquariado
_-Galias, nunca deixou de existir e continua ate hoje, na
~:::na de colecionadores de antiguidades. No entanto, a
~pac;:ao com 0 patrimonio rompe com as proprias
- : . _ - . e s aristocriticas e privadas do colecionismo, e resulta de
~. transforrnacao profunda nas sociedades modernas,
~ 0surgimento dos Estados nacionais.
- - = > t a d n nac iona l e a in ve ru iia do p atr imon io . Nem sempre
::::6,-tiIam nacoes, os atuais paises ou Estados nacionais. E
~d€ que, ji no Antigo Testamento, empregava-se 0con-
: : : : : = ' - ~ de nacao, comonolivro do Genesis (10, 31-32): "Estes
- _ - filhos de Sem, segundo as suas familias, e as suas
_ ~.!aS, e as suas regioes, e as suas nacoes. Estas sao as
:.r--11i'asde Noe, segundo os seus povos e as suas nacoes."
_;::" oje, goim, traduzido acima por "nacoes", e urn termo
(Ipelos judeus para se referir aos nao judeus. Essas
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14 Pedro Paulo Funari e Sandra c.A. Pelegr in i
nacoes nao sao, no entanto, os nossos paises rnodernos.
Tampouco 0 sao as chamadas "nacoes indfgenas", termo
usado para se referir a tribos. A palavra nacao, derivada do
latim, vern do verbo nascer e, originalmente, referia-se ape-
nas ao local de nascimento.
Ate 0seculo XVIII, na Europa, os Estados eram religio-
sos e monarquicos, baseados na identificacao da nacao com
a casa real. As monarquias eram de direito divino e as rei-
n6is nao eram cidadaos de um pais, mas suditos de urn
reino, 0 reino espanhol e um born exemplo dessa realidade.
Era composto por divers as regioes tradicionais, na pr6pria
Peninsula Iberica, cada uma com suas linguas e instituicoes,
chamadas de foros. Faziam parte do reino, ainda, areas fora
da Peninsula, como parte do continente americano, cujos
povos falavam outras tantas linguas e possuiam tradic;:oes
pr6prias, indigenas. Todos eram suditos do reino e deviam
fidelidade ao rei, soberano por direito divino, legitimado
pela Tgreja Cat6lica.
Esses suditos nao falavam a mesma lingua, nao pos-
suiam tradicoes comuns, nem eram iguais uns aos outros.
Uns eram nobres, outros plebeus; uns colonos, outros nati-
vas; uns clerigos, outros fidalgos. Cada caso tinha suas par-
ticularidades, mas essa situacao ocorria em toda a Europa,
como no Imperio Austro- Hungaro, na Franca ou na Ingla-
terra, cujos povos eram heterogeneos e cujas tradicoes, as
mais variadas. Havia ainda muitas unidades rnenores, como
as cidades italian as ou germanicas, que tambern eram com-
postas por pessoas com direitos diferenciados.
Patrlrncnio historico e cultural 15
E a patrimonio! Em tais sociedades, ele nao era algo
publico e compartilhado, mas privado e aristocratico, na
forma de colecoes de antiguidades, como no famoso caso do
irnenso acervo dos papas que, hoje, esta no museu do Vati-
ana. 0 surgimento dos Estados nacionais era 0que faltava
para desencadear uma transformacao radical no conceito de
patrimonio.
o melhor exemplo de criacao do Estado nacional mo-
demo talvez seja a Franca, a partir da revolucao de 1789.
Nilo par acaso, como veremos, foi la que se desenvolveu 0
moderno conceito de patrimonio. A Franca era urn rein a de
Iireito divino, conhecida como Filha Primogenita da Igreja,
por sua ligacao com a hierarquia catolica, Desde seu inicio,
{'reino dos francos baseava-se na sua legitimacao pela Igre-
l a , com 0 apice da canonizacao do rei, sao Luis. No reino,
fulavam-se divers as linguas e os suditos espalhavam-se nao
npenas pela Europa, mas tambern pda America, como ate
hoje a atesta a provincia de Quebec, no Canada. A realeza
['r~Lde origem gerrnanica; os francos eram de origem varia-
dll; gaulesa e romana. Havia uma pletora de estatutos juri-
dlcos que separavam os suditos,
A Revolucao Francesa viria a destruir os fundamentos
d!) antigo reino. Ao acabar com 0 rei, toda a estrutura do
IIMndoperdia sua razao de ser. A Republica criava a igual-
dltde, refletida na cidadania dos homens adultos. E precisa-
'\II! eriar os cidadaos, fornecer meios para que compartilhas-
N In valores e costumes, para que pudessem se comunicar
. ' 1 , 1 ( ' 1 " si, para que tivessem urn solo e uma origem suposta-
mente comuns. Por meio da escola, foi possivel, aos poucos,
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16 Pedro Paulo Funari e Sandra CA. Pelegrini
difundir a lingua nacional, 0frances, que antes era falado
apenas pelas elites. Com a lingua, 0povo aprendia tambern
que tinha uma origem comurn: os gauleses - ja nao fazia
sentido enfatizar os gerrnanicos francos, nem tampouco os
romanos; e que habitava urn territ6rio delimitado, 0 hexa-
gono, nome que passou a ser sinonirno do pais. ]a antes da
Revolucao Francesa, em 1763,0 territ6rio do que viria a ser
o Canada e cedido aos britanicos, e Napoleao consolida anova politica de urn Estado nacional no hexagono do conti-
nente europeu com a venda do restante das possessoes fran-
cesas na America do Norte em 1803, quando os Estados
Unidos compram a Luisiana por 15 milhoes de dolares.
o Estado nacional surgiu, portanto, a partir da inven-
cao de um conjunto de cidadaos que deveriam compartilhar
urna lingua e uma cultura, uma origem e urn territ6rio. Para
isso, foram necessarias politicas educacionais que difundis-
sern, ja entre as criancas, a ideia de pertencimento a uma
nacao, Os estudiosos modernos charnaram isso de introje-
cao ou doutrinacao interior, que visava a imbuir 0 jovern,
desde cedo, de sentimentos e conceitos que passavam a fazer
parte de sua compreensao de mundo, como se tudo fosse
dado pela pr6pria natureza das coisas. Urn soci6logo de
nossa epoca, 0 frances Pierre Bourdieu, usou a palavra ha-
bitus para se referir a essa naturalizacao inconsciente que, no
contexto dos Estados nacionais, depende de mecanismos de
reproducao social, como a escola. Varios outros pensadores
modernos, como Gilles Deleuze e Michel Foucault, ressal-
taram 0papel da escola na difusao e aceitacao dos conceitos
sociais.
17atrim6nio hist6rico e cultural
Os novos Estados nacionais tiveram como tarefa pri-
rneira inventar os cidadaos, Em relacao a isso, ha uma frase
f amo s a que vale a pena recordar. Logo ap6s a unificacao
italiana, em meados do seculo XIX, menos de 5% da popu-
IIIs:aoda Peninsula Italica falava ou entendia 0 italiano. 0
ltder da unificacao, Massimo D'Azeglio, constatou que "fei-
I I I aItalia, e preciso fazer os italianos". Talvez a Italia seja urn
I.ISOmais claro devido a sua unificacao tardia, mas 0 exem-plo marca bern a importancia da invencao de uma cultura
II icional que nao podia prescindir de suas bases materiais,
~,f'llpatrirnonio nacional. Assim comeca a surgir 0 conceito
II patrimonio que temos hoje, nao mais no ambito privado
uu religiose das tradicoes antigas e medievais, mas de to do
1 1 1 1 1 povo, com uma unica lingua, origem e territ6rio.
r Il li /'T imonio em duas tradidies do direito. Os modernos
J (it i d os nacionais surgiram a partir de dois gran des sistemas
1 1 1 1 dices, cujas caracteristicas sao importantes para enten-
1 ' 1 i rmos as diferencas que, ate hoje, subsistem entre as
i 1 1 1 1 ' 'p<;oesoriundas do direito romano ou civil e do direito
iunsuctudinario, anglo-saxao. Os Estados nacionais surgi-
IIUII lonto em regioes de tradicao latina - tributaria da
IIrHlh;:~odo direito romano - como em paises de tradicao
II I Inica, com base no chamado common law. 0 conceito
.1 propriedade difere bastante nessas duas tradicoes juridi-
I IHI," que tern repercussao direta nas definicoes do patrimo-
II II pdo Estado nacional.
A tradicao latina considera a propriedade privada su-
I 1 ,1 Ircstricoes, derivadas dos direitos dos outros ou da
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18 Pedro Paulo Funari e Sandra CA. Pelegrini
coletividade em geral. Talvez 0melhor exemplo dessa limi-
tacao seja 0 chamado dire ito de servidao, que provem do
direito romano, mas que esta presente nos direitos nacio-
nais de origem latina, como no caso do Brasil. Basta um
exemplo para entender do que se trata. Se dois edificios sao
contiguos e um deles so pode ter acesso a rua por uma
passagem atraves do outro, essa passagem e uma servidao
imposta ao edificio que est
adefronte
arua. Isso se aplica
tanto a passagem de uma casa de fundos como a sua tubu-lacao de agua, esgoto ou dutos de eletricidade. Ha, portanto,
uma limitacao a propriedade.
J a no direito consuetudinario anglo-saxao, a limitacao
ao direito de propriedade e, em geral, muito mais tenue, 0
que permitiu, por exemplo, 0 cercamento das propriedades
rurais na Inglaterra, no seculo XVIII . Os antigos acessos e
caminhos usados pelos camponeses foram fechados, contri-
buindo com a migracao para as cidades e a formacao da
mao-de-obra industrial.
Na mesma linha de raciodnio, os bens achados em
propriedades privadas, segundo 0direito consuetudinario,
sao de seu proprietario e podem ser vendidos. 1s50vale tanto
para 0petroleo como para vestigios historicos, J a na tradi-
s:ao do direito romano, tais bens sao considerados publicos
e nao podem ser usados pelos particulares a seu bel-prazer.
Essas duas tradicoes legais diversas levar~m a duas
concepcoes diferentes do patrimonio, uma mais voltada
para a protecao dos direitos privados e outra mais atenta ao
Estado naciona1. Essas diferencas entram em confronto
quando 0patrimonio deixa de restringir-se ao ambito na-
Patrimonio historico e cultural 19
donal, a partir da segunda metade do seculo xx. Anteselisso, convern retomarrnos a narrativa do patrimonio na-
i ional ,
() n ac io na iism o e 0patrimonio. Em plena Revolucao France-
:I, em meio as violencias e lutas civis, criava-se uma comis-
10 encarregada da preservacao dos monumentos nacionais.
I) objetivo era proteger as monumentos que representa-Viall a incipiente nacao francesa e sua cultura. A legislacao
IIIotetora do patrimonio nacional frances tardaria ainda
iuultas decadas, pois a primeira lei e de 1887, tendo sido
IIuuplementada por uma legislacao mais ampla em 1906, ja
I ill 11no seculo xx. Essas e outras disposicoes legais, na
Jlr l1 l1~aj voltavam-se para a Iimitacao dos direitos de pro-
III It,d Ide privada, em beneficio do patrimonio nacional, de
, u IIIdo com a tradicao do direito romano. Em outros paises
, I , · Ir'lldiyao latina, a trajetoria e semelhante, como no caso
, 1 ' 1 III' Isil, conforme veremos adiante em mais detalhe.
No s paises de direito consuetudinario, a protecao do1 ' 1 1 1 1 1 rnenio nacional deu -se no contexte limit ado das pro-
I" I dudes publicas. 0melhor exemplo, provavelmente, e 0
ill, l\ tados Unidos. A primeira lei patrimonial, 0 Anti-
'lull I" Act, de 1906-mesmo ana daleifrancesa-restrin-
'h, [' II proteger bens culturais de interesse da nacao que
I I lYI 'NI l~1l1 em terras de propriedade ou controle do gover-
I II I 1 4 ,011135 , 0 Historic Sites Act vida a complementar 0
1 1 1 1 1 n ur, no mesrno espirito, com enfase 11acompilacao de
IHI1II1f1I1~ de bens de interesse historico.
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20 Pedro Paulo Funari e Sandra CA. Pe legrini
Em ambas as tradicoes, contudo, ha diversos tracos
comuns que devem ser ressaltados. Em primeiro lugar, 0
patrimonio e entendido como urn bern material concreto,
urn monumento, urn ediftcio, assim como objetos de alto
valor material e simb6lico para a nacao. Parte-se do pressu-
posto de que hi valores comuns, compartiIhados pOI todos,
que se consubstanciam em coisas concretas. Ern segundo
lugar, aquilo que e determinado como patrirnonio eo ex-
cepcional, 0belo, 0exemplar, 0que representa a nacionali-
dade. Uma terceira caracteristica e a criacao de instituicoes
patrimoniais, alern de uma legislacao especifica. Criam-se
services de protecao do patrimonio, como museus, forman-
do uma administracao patrimonial. Essa burocracia foi
composta pOI profissionais de diversas forrnacoes e especia-
lidades, principalmente arquitetos, historiadores da arte,
historiadores, arqueologos, ge6grafos, antrop61ogos e so-
ciologos, entre outros.
A enfase no patrimonio nacional atinge seu apice no
periodo que vai de 1914 a 1945, quando duas guerras mun-diais eclodem sob 0 impulso dos nacionalismos. Alguns
exemplos extremos mostram como mesmo os vestigios
mais distantes, no tempo e no espaco, podiam ser lidos
como parte da construcao da nacionalidade. Assim, os ita-
lianos usavam os vestigios dos romanos para construirem
uma identidade calcada nesse patrimonio, restaurado, glo-
rificado, exaltado como exemplo do dorninio do mundo
pelos romanos e seus herdeiros, os italian os. Nao foi a toa
que 0 nacionalismo italiano usava simbolos materiais do
Patr imonio historico e cul tural 21
poder romano, como 0feixe, do qual deriva 0proprio nome
do movimento nacionalista, 0fascismo.
Na Alemanha nazista, da mesma maneira, usavam-se
v i st lg i os dos germanos, considerados antepassados dos ale-
I1H.CS, encontrados em territ6rio de outros paises, como a
l'olonia, para justificar reivindicacoes territoriais e invasoes
uillitares. Por outro lado, os vestigios materiais dos antigos
f~ 1 'gos tambern foram apropriados pelo nacionalismo ale-111,10, como se esses fossem seus verdadeiros antepassados,
• om sua arte e seu suposto culto a ordem e ao poderio
III lltar, Mesmo em paises dernocraticos as vestigios de po-
V I I N distantes no tempo e no espaco eram tornados como
I~III do patrimonio nacional. A Inglaterra, por exemplo,
II mslderava-se a verdadeira herdeira de antigas civilizacoes,
r utun a rnesopotamica, a egipcia e a romana.
j l/IIIUimonio m undial e a diversidade. 0 nacionalismo, as-
" lido ao imperialismo, seria superado com 0 fim da Se-
t u r u l u Guerra Mundial e a criacao da ONU, a Organizacao
1 1 1 1 _ Na~oes Unidas, e da Unesco, a Organizacao das Nacoes
1 1 1 1 d i N para a Educacao, a Ciencia e a Cultura, ambas em
1 1 1 . 1 ' " iI,l llbora desde 1937, sob a egide da antiga Sociedade
dll'~NII.yoes, a Conferencia de Atenas tenha defendido a
II\lIJ\l!arda do patrimonio cultural da humanidade, apenas
HII III IV!! .ontexto pas-guerra se desenvolveram abordagens
IW I Hhl'fU1gentese menos restritivas de cultura. 0 fim do
nul] Iii armado e a derrota dos nacionalismos fascistas na
,ICllhlllh:.l, Italia e Iapao colocaram emxeque as interpreta-
Ilil. IhHIonalistas e racistas do passado. 0 fato de que os
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22 Pedro Paulo Funari e Sandra CA. Pelegrini
campos de concentracao nazistas destinavam-se it destrui-
s:aode povos inteiros foi reconhecido como genocidio. A 1uz
do horror do Holocausto, os conceitos racistas, que antes
passavam por aceitaveis mesmo nos paises dernocraticos,
como a Inglaterra e os Estados Unidos, foram condenados
de forma clara e explicita. Da mesma forma, 0nacionalismo
imperialista saiu do conflito muito malvisto, 0que se refle-
tiu de imediato nas potencias imperialistas dernocraticas,como a Gra-Bretanha, que tinha imperios coloniais que
aplicava, em seus protetorados, uma politica racista.
o fun da guerra foi, portanto, urn marco essencial que
trouxe novos agentes sociais, com interesses diversos, para
o centro da acao social e politica. Os povos colonizados
intensificaram a Iuta contra as potencias coloniais e obtive-
ram resultados positivos, como no caso pioneiro da India,
independente em 1947. Estado multietnico e democratico,
a fndia representava a inclusao de novos agentes sociais no
cenario internacional e era urn sinal claro da faiencia dos
modelos nacionalistas que enfatizavam urn patrim6nio ho-
mogeneo, A consolidacao do poderio sovietico na Europa
Oriental, com 0 regime de partido unico, tambern contri-
buiu para reforcar, nos palses ocidentais, a irnportancia da
diversidade no interior das sociedades - contrastava-se a
variedade nos paises capitalistas com os aspectos monoliti-
cos do socialismo real. .
Nos paises capitalistas desenvolvidos, 0pas-guerra foi
caracterizado pelo crescente desenvolvimento de movi-
mentos sociais, em prol dos direitos civis, da ernancipacao
feminina, do reconhecimento da diversidade em varies ni-
Patri rnonio hist6r ico e cultural 23
veis e aspectos. Esses movimentos demonstravam, a urn 56
I nupo, a existencia de diversos grupos e interesses sociais e
como essa variedade podia gerar conflitos sociais no interior
des paises, A ideia de unidade nacional, uma so lingua,
eultura, origem e territorio, na base da concepcao do patri-
llHJnio nacional, era min ada no cotidiano das lutas sociais.
I )S rnovimentos em defesa do meio ambiente tambem fo-
111111mportantes para a ampliacao da nocao de patrimonio,plll'lI que incluisse nao apenas a cultura, mas tambem a
nntureza. A explosao da definicao ampliou os horizontes
~tli i u i s e legais. J a no fim da decada de 1950, a legislacao de
11 1I)' ( ) y a 0 do patrimonio ampliava-se para 0 meio ambiente
II ira os grupos sociais e locais, antes preteridos em benefi-
, I) c i a . nacionalidade.
Em termos internacionais, as diferentes nacoes intera-
" ,1111mais do que nunca, 0que tambem contribuiu para a
d II ulucao dos conceitos nacionalistas, apesar de os orgaos
lIirlllacionais, como a ONU e a Unesco, serem aglomera-
do tit· E tados nacionais e defenderem, em muitos casos, a
IHl~ !) iomo uma suposta unidade, sem contrastes internos.
lli'lot! Iforma, a convivencia levou a eleicao da diversidade,
IWIII.11I1l c ambiental, como valor universal a ser promovi-
IIlI 1 ' 0 1 " esse mesmo principio, nos diversos Estados nacio-
II1I 1IIll1'gi ram grada tivamen te possib ilidades de uma amp la
II I . H ! ' de amhitos patrimoniais, para alem do nacional.
I '11111,11(')I1:iose valor provincial ou municipal, mas tambem
,h '"I1Ii1oi.dades, como os indigenas ou as mulheres, de
I til H rcligiosos ou esportivos. Essa multiplicacao patri-
IIllildnl ucorreu em conjunto com a crescente participacao
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24Pedro Paulo Funari e Sandra CA. Pelegrini
das proprias pessoas na gestao dos bens patrimoniais, cul-
turais e ambientais, que deixaram de ser apenas preocupa-
yao da administrayaO publica nadonaL
Essas modificacoes no interior das sociedades produzi-
ram alteracoes nos modelos interpretativos e nas propostas
de acao pratica, Os padroes antes predominantes enfatiza-
Yam 0respeito as normas sociais par todos os membros da
sociedade. Tudo que se afastasse disso era interpretadocomo desvio que devia ser coibido. Esses padroes foram
sendo criticados, tanto em termos empiricos como teoricos,
As pesquisas de campo mostravam que as pessoas tinham os
mais variados interesses sociais e que os conflitos resultantes
- como a luta pe los direitos civis, contra 0racismo, pela
igualdade sexual- nao eram urn desvio, mas uma conse-
quencia das proprias situa<;:oes sociais. Para explicar essa
diversidade, surgiram varios questionamentos aos modelos
interpretativos normativos, que enfatizavam a homogenei-
dade social e a ace i t acao de regras ou normas gerais. As socie-
dades foram, cada vez mais, interpretadas como compostas
por divers os grupos sociais, eles proprios fluidos e em cons-
tante mutacao, com interesses possivelmente conflitantes.
Como consequencia, os proprios conceitos de a~bien-
te e cultura sofreram alteracoes, 0rneio ambiente e a cultu-
ra foram, muitas vezes, valorizados par seu carater unico e
excepcional. Com 0despertarpara a Importancia da diversida-
de, ja nao fazia sentido valorizar apenas, e de forma isolada,
o mais bela, 0mais precioso ou 0mais raro. Ao contrario, a
nocao de preservacan passava a incorporar urn conjunto de
bens que se repetem, que sao, em certo sentido, comuns,
Patrimonio historico e cultural 25
m as sem os quais na o pode existir 0 excepcional. E nesse
, nntexto que sedesenvolve a nocao de irnaterialidade do patri-
Inenio , Uma paisagem na o e apenas urn conjunto de a rvores ,
IItontanhas eriachos, mas sim uma apropriacao humana dessa
runterialidade. Assim, compoem a patrimonio cultural nao
1 1 1 1 I ' I H l S asfantasias de carnaval, como tambem asmelodias, os
I ltm o s e 0modo de sambar, que sao bens imateriais.
\ U nesco e 0P atrim 6nio cultura l da H um an ida d e. A primei-
,~ uinvencao referente ao patrimonio mundial, cultural e
ruuural foi adotada pela conferencia geral da Unesco em
11)( •A partir do reconhecirnento da importancia da diver-
q lInde, a grande novidade consistiu em considerar que os
_I t lu~de c l a r a do s como patrimonio da humanidade perten-
I 1 1 1 1 1 1 n to d o s os povos do mundo. Segundo essa convencao,
~llhorita por mais de 150 paises, 0patrimonio da humani-
I II I I" eompoe-se de:
M MOI'lUmentos: obras arquitetonicas, esculturas, pinturas,
V I Nt'l.giosarqueologicos, inscricoes, cavernas;
• I '1Illjuntos: grupos de construcoes;
• 1 1 1 1 1 0 s: obras humanas e naturais de valor historico, este-
II I {I, etnologico ou cientifico,
MUllLllnentos naturais: formacoes fisicas e biologicas;
1111'I'lmlij:oeseo logicas ou f isiograf icas: habitat de especies
uulmais e vegetais ameacadas de extincao;
f 1 1 1 1 1 m naturais: areas de valor cientifico ou de beleza natural.
A Unesco lancou diversas campanhas internacionais
Ihll II II Iltilvaguarda do patrirnonio cultural, a maioria na
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26 Pedro Paulo Funari e Sandra CA. Pelegrini
Asia enos paises arabes, mas tambem em outras areas,
inclusive uma no Brasil, Argentina e Paraguai, em 1988,
para proteger as miss6es jesurticas. Urna de suas preocupa-
y6es e a catalogacao de mais de duas dezenas de sitios patri-
moniais da humanidade ameacados; uma convencao de
1970 trata do trafico ilicito de bens culturais. 0 orgao tern
atuado tambern na formacao de pessoal e em programas de
ensino medio, e exortado os paises para que as populacoes
locais sejam estreitamente associadas a planificacao e as
acoes concretas de salvaguarda.
A chancela da Unesco d a aos sitios urn emblema de
patrimonio mundial que constitui urn atrativo cultural e
economico, tanto para as regioes epaises em que os sitios se
localizam como para 0importante fluxo de turismo cultural
e ecologico, 0 turismo cultural e urn dos principais subpro-
dutos da classificacao de urn sitio como patrim6nio da hu-
manidade.
A Unesco, contudo, nao deixa de ser afetada, como
organizacao, por duas caracteristicas. Em primeiro lugar,
cada Estado nacional membro represent a0seu pais, e mui-
tas vezes, por diversos motivos, nao reconhece a diversidade
cultural de outro. Nesses casos, a Unesco nao tern como
intervir. E verdade, contudo, que rnesmo nessas situacoes
minorias ou grupos podem valer-se do orgao e de cart as
assinadas pelos Estados membros como meio de pressao
para obter 0 reconhecimento de seu patrimonio,
Urna segunda caracteristica da organizacao consiste no
predominio do interesse das potencias economicas e na
valorizacao do patrimonio ligado as elites, em geral, e a
Patrim6nio hist6rico e cultural 27
!l,mopa, em particular. Isso significa que as grandes civiliza-
1 ,1 I .: S do passado recebem mais atencao do que as sociedades
'III .nao dominaram outros povos nem deixaram construcoes
IIH111umentais. Essa visao vern mudando, principalmente
1111~ duas ultimas decadas, com 0 crescente reconhecimento
I 1 1 I valor da diversidade humana em qualquer situacao, nao
Ilpl'nas no campo da potencia militar e material.
o predominio da Europa pode ser percebido pelo fato
!I I que mais da metade dos sitios listados pela Unesco esta
11I111U de continente. Sessenta por cento deles se localizam na
1 ' 1 1 1 upa e na America do Norte, numero que aumenta se
n 1 .1 ionarmos parte dos bens da America Latina referentes
IIlj vulores culturais introduzidos pelos europeus. A Africa
" 11 1 1 ~I'a be conta apenas com cerca de 4%. Outra distorcao
I ~ I, 14' M e ao predominio de sitios culturais, que chegam a
11 1 1 1 1 • I untra 20% de patrimonies naturais. Henry Cleere,
tlhllll"'ltl.) do Conselho Internacional de Sitios e Museus
IIIIIIIIO,~), afirmou, ha alguns anos, que a universalidade do
IlIllIi IIlm,io estava sendo reconhecida de forma crescente
l i t '" \ Iu 'sco, mas isso nao tern se confirmado na pratica,
Iud prcdominam nas propostas de inclusao, ano a ano,
II liN jill nuropa e da America do Norte (Estados Unidos e
I uliILIL).
I I ' / 1 ' 1 , , / 1 0 $ d o p a trim tm io n a e ra d ig ita l e a c on ven ~iio sa bre a
1 I 1 I 1 l i l r u l e c ultu ra l d a Un es co . A arnpliacao do conceito de
IHlllmtlllin .nao poderia deixar de abranger uma imensa
-IIIIII'I! ' IWIIS, que se tornou muito amplaem nossa epoca: 0
HO IW lu I l i g i t a L Nas ultimas decadas, os meios digitais e
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28 Pedro Paulo Funari e Sandra CA. Pelegr ini
eletronicos passaram a representar urn imenso manancial
de criacao humana. A correspondencia eletronica (e-mail),
a arte no meio digital, os processos administrativos e de
armazenamento de inforrnacoes concentram-se, cada vez
mais, em meios inforrnaticos, Nunca se produziu tanto
como agora, quando dispomos dos meios digitais, No en-
tanto, a preservacao desse patrirnonio constitui urn desafio
proporcionalmente grande. Os meios de preservacao digitalainda sao frageis, e os procedimentos tecnicos de migracao
de informacao de urn meio tecnologico para outro, mais
moderno, nao deixam de apresentar problemas. Em todo 0
mundo, surgem organizacoes voltadas para 0 estudo de
como preservar esse importante patrimonio para as gera-
coes futuras.
Nesse contexte, foi aprovada pela Unesco, em 2005,
uma nova convencao sobre a diversidade cultural. A princi-
pal caracteristica da medida consiste na questao com 0 ca-
rater nao comercial dos bens culturais e ambientais da hu-
manidade. Se essa ja era uma preocupacao em relacao ae
patrimonio tradicional, na forma de edificios, artefatos O~I
mananciais ambientais, ela tornou-se ainda maior com a
inclusao dos meios digitais, submetidos as leis de mercado.
A pilhagem de navios naufragados - com suas cargas de
valor comercial- ja alertava para a gravidade do problema
da apropriacao comercial do patrimonio, ja que se perde,
nesse caso, todo 0contexto que pode dar sentido aos objetos
retirados pela pirataria submarina.
A situacao tornou-se ainda mais dramatica com 0pa
trirnonio digital. Como ter acesso e, portanto, preservm
Patrim6nio hist6rico e cul tural 29
1mIrimonios digitais protegidos por copyright? Como garan-
Ih que 0 patrimonio, custodiado por uma empresa que 0
11 1 iunzena em forma digital, seja preservado se a firma falir
• ;!"saparecer (e, com ela, todo 0seu suporte digital)? Esses
u ilguns dos desafios que enfrentamos para preservar 0
p Il i I 11116nioem nossa epoca, e outros muitos semultiplicam
II I,d I dia, como veremos a seguir.
I PIINerva~aodo patrlmonio cultural
Iw~rka Latina
ilol!i' '"Wao do patrimonio cultural e a necessidade de
I' d l l l l h l os centros hist6ricos, na atualidade, constituem
I I I I I I ~f II: hasicas dos debates sobre 0 desenvolvimento sus-
I III iV I I uns idades latino-americanas, pois esses centros
IIII "' 111,11 a sintese da diversidade que caracteriza a pr6-
1111 dill h" Vista por esse angulo, a reabilitacao dos centros
~I IHIII II~Iulcm de potencializar a identidade coletiva dos
,,~ pllllllover a preservacao de seus bens culturais-
I I I1 LUllll eriais-e-pode contribuirpara 0desenvolvi-
1II1I I III mi 0 e social e,ainda, otimizar os custos finan-
II I 1 1 1 1 1 1 1 : rntais do desenvolvimento urbano, atraves do
.H UIII ,110 da infraestrutura de areas centrais e do in-
'HI ii, d u ndustria turistica,
r I .1 1 YI'Il1)8 ter em mente que as politicas de preser-
, •h I 1 1 1 1 1 1 1 iI()n10 cultural nos paises da America Latina
111111Iilllll'( xmtes. Em termos praticos, elassurgiram
I t . , 1.1IIIIIIIII'lIto em que a Unesco reconheceu alguns
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30 Pedro Paulo Funari e Sandra CA. Pelegrini
bens culturais latino-americanos como patrimonio da hu-
manidade. De fato, as politicas sistematicas de protecao e
recuperacao de centros historicos sao recentes ate mesmo
na Europa, e adquiriram maior impeto a partir das reflexoes
provocadas pelo desenvolvimento do urbanismo moderno
- estudo interdisciplinar da cidade e da questao urbana
que inclui 0conjunto de medidas tecnicas, administrativas'
econornicas e sociais necessarias ao desenvolvimento hu-
mana e ao erescimento ordenado da urbe.
As necessidades geradas pelo ereseimento industrial e
pelo aumento da densidade populacional nas grandes me-
tropoles, fenomenos observados no decorrer dos seculos
XIX e XX, legitimaram asreformas urbanas e 0 consequente
aumento das demolicoes nas areas hist6ricas - alvo de
a~~oradas criticas embasadas nas concepcoes estetico-so-
ciais de William Morris (1834-1896), John Ruskin (1819-
~90~) e Cam_ilo Sitte (1843-1903). 0artesao, poeta e teologo
mgles Morns e 0 escritor e reformista Ruskin, adversos a
forma como as cidades industriais vinham se desenvolven-
do, propuseram alternativas idealist as para 0 crescimento
citadino (emhora nao tivessern formacao especifica na area
de arquitetura e urbanismo). Essas proposicoes, anos ~ais
tarde, emhasaram as origens do chamado urbanismo eeol6-
gico e organieista e fundamentaram as teorias modernas de
restauro. Camilo Sitte, urbanista austriaco eritieo das
demolicoes efetuadas no continente europeu nas decadas
finais do seculo XIX, defendeu a preservacao do patrimonio
e,a ~onstr~c;:~o de cidades modernas sem abrir mao de prin-
ClplOSartistrcos, 0pensamento combativo e inovador dos
Patrim6nio hist6riw e cultural31
II I, d los personagens contribuiu para deflagrar
novas
II11111.11pac;:6es,ue motivaram a organizac;:ao de eventos in-
i. 111cionais com 0 intuito de buscar soluc;:6es adequadas
1111111s impasses da preservac;:ao do patrimonio diante da
I•I111s5.0rbana e industrial. .n impacto da destruic;:ao causada pelos bombardelOS
Jill onentes da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) cata-
I 1 1 1 1 1 1 8 atenc;:oes dos estudiosos, tornando perempt6ria aI I IIIIHtruc;:aodas cidades e a restaurac;:ao dos monumentos.
I,ll d'safio contribuiu para a conscientizacrao acerca dos
' \ 1 1 1 's identitarios dos hairros antigos, como lugares so-
,dill inte produzidos, privilegiados pelo acumulo de expe-
II III ius humanas ede vestigios da cultura material, resul-
ilHII' da permanente apropriac;:ao das coisas do passado.
M as se considerarmos que todas as dimensoes do espa-
,III It t line apresentam marcos da trajetoria de uma socie-
ii , d " , . por que privilegiar a preservacrao de areas historicas
I II \ '1I'icas?Diante da complexidade do assunto, per~ebeu-
I 1 11 1
' a valorizacrao dos centr~s historicos nao.podena e~tar
II h~ll 'iada da apreciac;:ao do contexto territonal e da paisa-III" urbana. 0 amadurecimento dessas e de outras ques-
IIII,lias liltimas decadas do seculo XX, ocorreu, como hem
iI h mhra Fernando Carrion, simultaneamente a descoberta
i ll IIl1VaS centralidades e a ampliac;:ao da nocrao de patrimo-
IIIIlilstorico para a de patrimonio cultural. A perspectiva
II 1111ionista inicial, que reconhecia 0patrimonio apenas no
Illlhlln histarico, circunscrito a recortes eronologicos arbi-
II lin/) e penneados por episadios militares e personagens
f 11111maticos, acabou sendo, aos poucos, suplantada por
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32 Pedro Paulo Funar i e Sandra c .A. Pelegrini
uma visao muito mais abrangente. A definicao de patrimo-
nio passou a ser pautada pelos referenciais culturais dos
povos, pela percepcao dos bens culturais nas dimensoes
testemunhais do cotidiano e das realizacoes intangiveis.
Sob esse enfoque, 0patrimonio e as acoes em sua defesa
passaram a ser vistos como construcces sociais historica-
mente edificadas, 0que corrobora a superacao das iniciati-
vas legais restritas apenas a protecao dos bens selecionados
segundo rigidos principios de antiguidade, nao raro limita-
das a preservacao de predios publicos e religiosos. Essa aber-
tura ternatica permitiu que construcoes menos prestigiadas
ou mais populares, como moinhos, mercados publicos ou
estacoes de trem, fossem reconhecidas como patrimonio,
incluindo-se nesse rol producoes contemporaneas e bens
culturais de natureza intangivel, como expressoes, conheci-
mentos, praticas, representacoes e tecnicas, Por outro lado,
alteracoes nas leituras do patrimonio como monumentos
isolados promoveram a valorizacao da nocao de conjunto e
a superacao de visoes da arquitetura como obra de arte
independente.
A s C artas P atrim oniais e su as p r o p o s i c o e s . Diante disso, ca-
beria indagar: essa mudanca de escala observada no enfoque
do patrimonio contribuiu para que as estrategias de preser-
vacao dos bens culturais avancassemi Por certo que sim,
pois possibilitou a contextualizacao estetica, social e cultu-
ral da obra, consolidou 0desenvolvimento da discussao
sobre as areas ao redor do patrimonio edificado e estabele-
ceu a necessidade de integracao dos centros historicos na
dinamica das cidades.
Patr imonio hist6r ico e cul tural33
Assim observamos que, entre as convenc;:oes interne-
I IlIlIlts realizadas ao longo da segunda metade do seculo
Icntuaram-se as preocupac;:oes com a tematica da reS-
111'1\ilO com a adocao de normas internacionais ~e pro-
I 11 ACarta deVeneza e a Declarac;:ao de Amsterda, resul-'\, c • 19641 1 1 1 1 1 1 dos congressos realizados, respectlvam~~te',em _
I I ' / . , imprimiram novos parametres de analise a qu~st~o
\1I11"ldmonio, na medida em que propuseram a a~phac;:ao
.1.Iiun ceito de monumento, recomendando tambem a pre-
I I \ '1 1 \ '1 ', 0 de obras consider adas modestas que tenh~m ad-
1"11 1 ,0 significa<;:ao cultural e a prote<;:ao ~e ~~nJuntos,
II IOS ou aldeias q~e apresentem interesse histonco e cul-
IllInL
A Declarayao de Amsterda introduziu orientacoes ~ara
" llzar a implantac;:ao de "politicas de eonservacao mt~-
1'1uIu'', inaugurando uma abordagem ~autada pel~ nocao
II . Hll.grac;:aodo patrimonio a vida social e confenndo ao
1 ' 1 1 1 h'l' publico municipal a responsabilidade de elab~rar
I IIIW~1l'nase conservac;:ao e aplicar os recursos financ~lfos
1 1 1 1 1 , r ludos para esses fins. 0 documento recomendava am_da
'I II volvimento da populac;:ao nos processos de preservacao-
." UIII(lo a garantir rnaior observancia dos valore~ ligados ah It II I dade microlocal e a evitar a evasao dos habltantes em
I l I w l · de especulayao. _Mas como a redefinicao das politicas de preservacao no
.1 1 1 1 1 I n internacional se propagou nas diferentes are~s do
, d " 1 i r 1 1 : 1 . 1 As recomendac;:oes contida~ nas cartas ,patnm~-
II I I 1 1 im sempre foram seguidas a nsca pelos parses parti-
,11"11 1
1:'8 das convencoes em defesa do patrimonio. No en-
5/10/2018 Patrimônio Histórico e Cultural LIVRO - slidepdf.com
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34Pedro Paulo Funari e Sandra c .A. Pelegrini
tanto, esses documentos sem dtivida estimularam a difusao
de experiencias distintas. Na America Latina, a diversidade
d.o.patrimonio cultural, 0vasto territorio, as urgencias so-
CIalSe a carencia de recursos propuseram desafios especifi-
cos as disposic;6es legais de protecao,
. Os centros historicos latino-americanos sao tao diver-
slf1cados que se torna dificil e inadequado trata-Ios como seconstituissem realidades iinicas e homogeneas. Uns datam I
d~ periodos pre-hispanicos, anteriores ao processo de colo-
nrzacao, como Cusco; outros do penodo colonial como
Q~ito e Olinda. Alguns se desenvolveram no period~ repu-
blicano, como Santiago, ou no periodo moderno como
~rasilia. E, como tal, cada urn deIes apresenta neces~idades
singulares de intervenc;ao. Por outro lado, e possivel detec-
~ar ta.mbem a <oexistencia de distintos centros historicos no
mten~r de ~ma mesma regiao, sem que suas temporalida-
~es e tlpologlas se restrinjam asalegorias esteticas referentes
as datas de fundayao das cidades. Desse modo, podemos
afirrnar que somente a investigayao minuciosa sobre as ori-
gens historicas do patrimonio e suas caracteristicas esteti-
cas, bem como a observacao atenta da densidade populacio-
nal e das tipologias urbanas da regiao estudada, podem
oferecer pistas precisas sobre os metodos adequados a Suarecuperacao.
O~ antigos nucleo» latino-americanos, apesar da hete-
rogeneldade dos contextos historicos, sociais, politicos e
urbanos que enfi-entam, atualmente deparam-se com pro-
blemas comuns, tais como privatizac;ao dos espacos publi-
COS,degradayao do patrimonio cultural, precaria qualidade
Patrim6nio histor ico e cultural 35
I vIIII) presenca predominante de populacao residente de
1 , , I k I I I enda, subemprego, ineficiencia nos servicos presta-
"II~HI)I~ idadaos e dificuldades de acesso ou total ausencia
It I quipamentos urbanos. As deficiencias no ambito da sus-
II 1llllh:1lidadedos processos sociais, economicos, ambien-
I, ill,Iulturais e institucionais, a crescente agressao ambiental,
I IIf ~11 ' I1 iyaO e descaracterizacao do patrimonio edificado eIlIlhlllf~ticotern result ado ern situacoes catastroficas para as
III ,d lH. les latino-american as.
1IIImtede tamanhos problemas, especialistas e tecnicos
I. 'III ulos a causa do patrimonio mobilizaram-se, desde 0
, 1 1 1 1 1 r ln decada de 1970, ern torno de rnedidas capazes de
' I _ I ',Ir a consciencia da comunidade latino-arnericana e de
1 1 1 1 11 I 1 VC. r 0 controle urbano por meio de decretos e codigos
I. III .acoes, entre outros instrumentos legais ~ seguindo
O J rnllrativos das bem-sucedidas experiencias realizadas na
I 1llllpn. Tentativas dessa natureza, apesar de apresentarem
. , 1 1 , 1 ! iscontinuidade, foram aplicadas nos investimentos
I IIf ~ ' " »s realizados em Cusco e na recuperacao parcial de
II II .,ntigos, como Buenos Aires e Lima, apenas para citar
1 1 1 1 1 1 1 1 ·xemplos.
N [ 0podemos negligenciar que tais empreendimentos,
Wlll"',\ restritos a recuperacao das fachadas de edificios e
I" II' ONas necessidades habitacionais da populacao residen-
,. , lur 1 1 . 1 1 influenciados pela Carta de Machu Picchu (1977).
I ' I I ' documento constituiu um marco nas reflexoes acerca
li n jll't'$ervayao dos bens culturais latino-americanos, ao
1 1 1 1 ' 1 mdar a incorporacao de valores socioculturais nos
II1II L'IlS0S de restauracao e retomar as questoes anterior-
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36Pedro Paulo Funar i e Sandra CA. Pelegrini
mente abordadas na Convencao de Estocolmo (1972). Esta
tratou da conserva~ao do patrimonio como meio eficaz
para :u~ter a vi.talidade urbana, considerando 0 impacto
economlCO e social da revitaliza~ao e os danos causados aomeio ambiente.
Essas posturas, tambem reforcadas na Declara~ao de
Tlaxcala (1982), indicaram a preserva~ao de pequenas
a~lomera~6es, onde repousavam modos de vida deposita-nos de relacoes comunitann, capazes de testemunhar sobre
cuhuras divers as e viabilizar a continuidade de tracos co-
muns de identidade entre seus habitantes. Proposi~6es Se-
melhantes forarn referendadas na Dec1ara~ao do Mexico
(1985), que ratificou 0 respeito as tradi~6es e formas de
expressao de cada povo, tomando 0conceito de identidade
cO.mo elemento de constitui~ao de valores nacionais e lo-cars,
Somente na decada de 1980 foi consolidada entre os
es~e~ialistas uma acep~ao ampliada do conceito de patri-
momo, compreendido nao s6 por produ~6es de artistas ou
intelectuais reconhecidos, mas estendido as cria~6es anoni-
mas, oriundas da alma popular. As urgencies sociais e a
carencia cronica de recursos dos diversos palses daAmerica
Latina nao dissimularam a importa.ncia da preserva~ao de
bens materiais e nao materiais que expressassem a criativi-
dade de seus povos, reconhecidos na singularidade'da lin-
gua, dos ritos, das crencas, dos lugares, dos monumentos
hist6ricos e das producoe, artisticas e cientfficas. Seguindo
essa linha, asseverou-se que a apre~o pelo patrimonio cul-
tural estimulava as povos a salvaguardar sua soberania e
Patr im6nio hist6rico e cul tural 37
IIIih'pcndencia e, por conseguinte, reafirmava sua identida-
,h I ultural.
A . coerencia dos compromissos firmados a partir das
!IIIV 'n~6es internacionais e 0 esforco dos agentes envolvi-
III nas questoes do patrimonio sao dignos de louvor. To-
t 1 1 ' - 1 n,para termos uma nocao das contendas enfrentadas na
Ill! flea Latina, examinaremos a seguir as experiencias de
1 1 1 1 1 ( > ·ra~ao de Lima e Quito.
1 1 1 1 1 1 1 nova p aisagem p ara a c entro hist6 rico de L im a. Ate
II I .ulns dos anos 90, as tentativas de recuperar a chamada
I Hi I cuadrada" limitaram-se a intervencoes pontuais em
' 1 1 ~ l t l ( ! . : ~ , reformados por instituicoes financeiras. 0 tema
1 0 1 ' 1 1 1 rlu destaque a partir da inclusao do centro hist6rico
,I I ! , 1 1 1 m na Lista do Patrimonio Cultural da Humanidade,
I I I 1 1) 9 1. Desde entao, 0 sitio tornou-se alvo de programas
l u d l l i 'os comprometidos com 0combate a degradacao ar-
' I I I 11'I(\nicae a poluicao visual. A tugurizacao - improvi-
' 1 . 1 1 , . dt: moradias com materiais precarios e em locais ina-
II 'I H I IL lo s - , gradualmente, passou a ser mencionada nos
jlllljll'llmas governamentais. Toda essa questao, entretanto,
I' u r h n u maior ressonancia no cenario nacional peruano
I j l l l 1 1 M eleicoes municipais de 1995, emergindo como tema
, q h II I do nas campanhas eleitorais limenhas.
A Iespeito do exito alcancado pela setorizacao admi-
1 1 1 1 1 1IIIIiva e da criacao de orgaos direcionados a intervencao
IIi! •I utro historico da cidade - como, por exemplo, 0
t, ,I lnrio General de Participaci6n Vecinal, dirigido pelo
, 1 1m cltuado sociologo Rodrigues Rabanal-, muitos pro-
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38Pedro Paulo Funari e Sandra CA. Pelegrini
blemas se mantiveram sem soluyao, como assinalou a pes-
quisadora Stephanie Ronda. Mas sera que a postura partici-
pativa da prefeitura de Lima contribuiu para a inclusao
social da populayao residente nessa area? As aparencias en-
ganam, ja diziam as gerayoes antigas! 0projeto de reabilita-
yao nao previa a intersecyao com as politicas habitacionais
e 0desenvolvimento sustentavel, As primeiras acoes em
prol da recuperayao do patrimonio se restringiram ao em-
belezamento dos monumentos, ao esquadrinhamento dos
espayOs publicos, a limpeza das pracas San Martin, Bolivar
e Italia e do Parque Universitario, entre outras areas cen-trais.
Sob a 6tica das autoridades municipais limenhas, a
degradayao do centro historico estava associada apenas ao
uso inadequado do solo urbano e a pobreza de seus habitan-
tes - locatarios que, na maioria das vezes, subdividiam os
casaroes, transformavam-nos em cortices deprimentes e
sobreviviam atraves do cornercio informal (como vendedo-
res ambulantes ou camelos),
E a especulacao imobiliaria, como foi enfrentada? Por
razoes obvias, os proprietarios transferiam as responsabili-
dades de manutenyao dos imoveis aos inquilinos pobres e
aguardavam pacientemente a deteriorayao total dos casa-
roes para proceder a dernolicao, Desse modo, atraiam inves-
tirnentos imobiliarios rnais rentaveis do que os alugueis e,
certamente, mais sedutores a populacao economicamente
privilegiada.
A volta dos segmentos dominantes ao centro historico
implicou a expulsao da populacao andina que ali residia e
Patrimonto hist6rico e cultural 39
III1(I ufruia das pracas como locais de cornercio, encontros
I II, iubilidades, A imposicao do uso contemplativo das
I'I ",liS" parques inibiu a preservacao do significado original
. 1111tlll~ao que tais lugares adquiriram para essa populacao,
11111Imdo padroes burgueses de uso da cidade.
N .0 obstante, a habilidade dos profissionais que atuam
I I,Il'~'sa do patrimonio nao conseguiu enfrentar os imp as-'. It .rentes as distintas realidades dos paises latinos, como
111111u no Mexico apos 0 terremoto de 1985. Nesse caso,
1,111I1cnte,as intervencoes bem-sucedidas alcancadas nos
1111,11'08ist6ricos e na reabilitacao de moradias, realizadas
II j , Ialas centrals dacidade do Mexico, contribuiram para
IIII »lhoria da qualidade de vida dos habitantes locais. Desde
III !,asautoridades mexicanas, como salientou Rene Cou-
11111111;ptaram pela integridade da gestae publica atraves de
ItI"IIU~c politicas de desenvolvimento econornico e social,
II I lila los ao planejamento habitacional, territorial e ur-
11'111'1,essa linha de abordagem, 0 exito dos empreendi-111111108ealizados na cidade de Sao Francisco de Quito
IIIHI 'omnao pode ser ignorado, como veremos a seguir.
I I / l Ic I J i T C I . m a d e re ab ilita ca o d o c en tr o h is t6 ric o d e Quito . A
'''I' III do Equador vem sendo apontada por especialistas
I 1 1 11 I t) uma das regioes latino-americanas que melhor pre-
, IV I I I I seu centro historico, apesar das mazelas causadas
jlll l! I 'rremoto de 1988. 0projeto de reabilitacao desenvol-
It II nildecada de 1990 pautou-se pelo resgate da tipologia
I j unstrucoes e pela sustentabilidade economica do local.
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40 Pedro Paulo Funari e Sandra CA. Pelegrini
Como assinalou Roberto Segre, a tentativa de integracao das
populacoes locais nesse projeto e a criteriosa investigacao
hist6rica tomada como referencial para as medidas coloca-
das em pratica concorreram para transformar esse conjunto
arquitetonico em urn "testemunho" urbanistico do seculo
XIX.
Reconhecida pela Unesco como patrimonio da huma-
nidade em 1978, Quito e uma cidade cuja paisagem natural
andina seharmoniza com os caminhos estreitos que condu-
zem aos campanarios presentes por toda parte. As constru-
coes religiosas abrigam obras de arte de variados estilos e
reliquias arquitetonicas que se mantem vitoriosas ante 0atroz
ataque do tempo e a devastadora acao humana. Erguido
sobre as ruin as de uma das capitais do Imperio Inca, por
volta de 1534,0 centro hist6rico acumula cerca de cinco mil
im6veis. No entanto, sua funcao residencial manteve-se
descaracterizada ate meados dos anos 80. As poucas habita-
coes que ainda conservavam sua tipologia original seencon-
travam, nessa epoca, em condicoes avancadas de deterioracao,permitindo apenas a utilizacao dos cornodos localizados no
andar terreo.
Diante dessa situacao, a recuperacao tomou por base 0
reforco da funcao habitacional e do equipamento coletivo
- aspecto que implicou a reabilitacao integrada de todo 0
sitio ea adocao de medidas abrangentes, capazes de orientar
a selecao dos im6veis que seriam utilizados como moradias
e daqueles que seriam destinados aos fins administrativos
ou comerciais, publicos ou privados. Com isso, as ativida-
des centraram-se na preservacao das caracteristicas do pa-
Patr imonio hist6r ico e cultural41
II 1I1C111io,a melhoria da qualidade do ambiente urbane e
I1 I1 I I 'lusao social da popula<;:ao.
A proposta de "moradia solidaria", implantada ~ois
III iM apos 0 inicio do proj eto, presumia a ado<;:aode politlCas
11111111s de desenvolvimento urbano que contemplassem
Illplos processos integrados de conservayao em perimetros
,j. IlLcrvenyao precisos, evitando~se operacoes di,spersas
' I I I< Illviabilizariam a otimizaerao da ~fr~est~utura m~tala-
II I icsse modo, a restaurayao das principats moradlas da
Ilhl Caldas, por exemplo, apoiou-se na concentrayao de
,Ivlcos, equipamento e infraestrutura - concep?ao q~e
h· " urn espaco residencial1tilitHfonnou 0 centro istonco em ;-
II1'l'l1ativoe beneficiou a reativa<;:ao econamica e turistica
,111oca l sem comprometer 0patrimonio hist6rico. .
A recuperayao do conjunto residencial conhecido
1111110 "Casa dos Sete Patios" configura, ainda hoie, urn caso
will matico da reabilita<;:ao realizada em Quito, pois a re-
I1111l'raeraoessa construcac restabeleceu 0convivio entre as
11I111)CrOSasamilias que a habitavam (preservando seus ha-
I f l f l t~ e costumes tradicionais) e refreou 0 avanyado estado
IIi I:teriorayao do im6vel. As caracteristicas o.riginais, ~a
III'l1Htruyaonduziram os arquitetos Jorge Carvajal, PatIlCl.a
lilmlello, Jose Roman Ruiz e Emilio Yanes, responSaVelS
III [ ) projeto, a preverem a necessidade de acompanhamen-
I'll nntinuo por, no minimo, 25 anos. .
o programade reabilitayao do centro hist6rico de ~Ut-
10 v i sou a revitalizar as atividades comerdais e os services
Illldl ionais. garantindo 0 acesso da populaerao ao patr~ma-
uln cdificado. Desenvolvido inicialmente com 0 apoio fi-
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42 Pedro Paulo Funari e Sandra c . A . Pelegrini
nanceiro do BID (entre 1991 e 1994), contemplou a reabili-
tacao dos edificios publicos, civis e religiosos, 0melhora-
menta das instalacoes urbanas e da sinalizacao das mas, a
construcao de cinco estacionamentos para veiculos, 0incre-
mento de ecovias e do transporte coletivo, e limitou a con-
taminacao arnbiental, a ocupacao indiscriminada e a profu-
sao da criminalidade,
o estabelecimento de um fundo de reabilitacao e a
criacao de uma empresa mista promoveram 0investimento
publico e privado em programas de turismo com 0intuito
de fomentar 0 desenvolvimento sustentavel: a revitalizacao
urbana e a conservacao integrada foram levadas a termo
atraves da adocao de politicas capazes de gerar novas usos
para 0 centro antigo e incorpora-lo ao drcuito turistico
internacional.
Talvez, como destacou Paulina Burbano de Lara, dire-
tara da Empresa do Centro Historico de Quito, urn dos
meritos mais importantes dessa forma de gestae do patri-
monic tenha decorrido do fato de que a mesma nao se
limitou apenas a reativar a infraestrutura urbana, estimular
a instalacao de hotels, restaurantes, museus e edificios de
estacionamento. Ao contrario, apostou tambem na efetiva
melhoria da qualidade de vida da populacao residente e dos
comerciantes informais que I S . se alojavam, fomentando a
inclusao social dos artesaos equatorianos e 0 turismo cul-
tural.
Entre 1994 e 1997, 0centro hist6rico foi incorporado adinamica da cidade de Quito, transformando-se em uma
area residencial, com ativa vida noturna e atividades urba-
Patrimonio historico e cultural43
, e 0 exito dessa expe-II I~(1t,crogeneas.No entanto, sera qu . A •
IIIII Ilogrou resultados positivos no trato do p~tnmomo,. L ti e em partlcular em'I ' IIILtrospaises da Amenca a ma, , '
III "I) pais?
1 1 " . 1 1 cas patrimoniais no Brasil:
I , IIissese rea\iza~5es
I I1 I I lr iS SO pais, as politicas publicas voltadas para ~ area
,0lilll'[ll, particularmente aquelas referentes a ~rot.ec;:aopa-
1l\lllllflial, tern oscilado entre concepc;:6es e dlretnze~ ~~m. Crt' a maior parte das 1111Cla-
111""transparentes. e 0e que
Ih'il nesse campo se inscreveu nas esferas do poder federal,
I' I " , nao raro, suscitaram interpreta~6es d:;res.
Urn registro no minimo curioso nos a ia a apreen-
It I IIllmbiguidade que 0trato do patrimonio cultural pode
Ilvnlver (se e que podemos tratar 0 epis6dio dessa forma).
1111 'orrespondencia enviada, em meados do seculo X:V~II,
III,Luis Pereira Freire de Andrade (governador ~a cap~ta-
-I P buco) D Andre de Me l o e Castro [vice- re i doIlhl( . ernam ,. A •
1 \1 V I il) manifestou 0 desejo de impedir a transferen~la de
1lllllla~6es militares para 0"Palacio das Duas Torres . Sob
I ItI'~ac;:aode que tal feito geraria a ruina dopalac~te ~0us~
1 1 1 1 loquado de suas lux.uosas instala~6es, 0 entao vlCe-rel
~ 1 1 1 'itou a permanencia dos soldados no antigo quartel,
I-IS da memoria das "ilustres e famosas ac;:6esque obraram
m~ . . ." daII !'ortugueses na restaurac;:ao dessa capltama , arranca
ill Jugo holandes em 1644. Ora, considerando-se que 0
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44
Pedro Paulo Funari e Sandra CAP I ", , e egnm
palacete fora erguido por M "" aunClO de Nnamos ll lterpretar a post do vi ,assau, como pode-
ura 0 VICe-reI?Q al 'se em proteger 0im6ve1 d" , ,u 0 seu mteres-
dos soldados"? Q 0 ,u,so vlOlento e pouco cuidadoso, ' ue memona pr t diIllvasores holande . e en ra preservar: ados
ses ou a dos colon' dSegundo alguns pesquisad ,I~a ores portugueses?df ' ores, essa IllIC' ti!ClOSda proterao d ra rva apresenta in-, ,e uma dada me "clOnal; para outros repr ' mona no territ6rio na-di ,esenta maIS ur n d 'lll1entos de nossos irrn - as lllCautos proce-
aos portuguesesA despeito da dubiedade ':'
dern suscitar cabe le b que essas Illterpretayoes po-, m rar, como ad '
o que sobrevive enquant vertlU]acques Le Goff:omem6ri l' '
sados na o e 0con)'un t d a co etrva de tempos pas-, , 0 os monumento d
eXIstnam, mas 0 efeit d s e ocumentos que, 0 e uma escolh a li
tonadores e pelas f a re Izada pelos his-, ors:as que atuaram d'rica. Por conseguinte t t em ca a epoca his t o-
, ra aremos a se ir dtad as para salvaguardar b guir as medidas ado-
os ens cultu is b "Esse terna foi b ,ralS rasdelros.
01 a ordado sIstemat'constitucionais desd " Icamente nas cartas
e os pnmenos an d de
A Constituis:ao da Rep 'bI' os a ecada de 1930u Ica Federat' d ' .por exemplo, dec1ar ' , Iva 0Brasll de 1934
ou 0ImpedIment' _ 'arte do territorio n ' al ' 0 a evasao de obras de, , aClon e llltroduzi bdnelto de propried d ' u 0a randamento do
a e nas cldades hi , .quando esta se revestisse d fu _ Istoncas mineiras,-, e urna ns:ao s ial T '
c a o , sanclOnada na Con t't ' _ OCl , al dISposi-s 1UIs:aode 1937
va para a proterao d . A • ' tornou-se dedsi-T 0patrlll10nlO brasile'
que submeteu 0instituto d . no, ria medida em
se coletivo (sob a inge A ,aPdropnedade privada ao interes-renCIa 0 Estad ) E
terminou viabiliza dO, sse entendimenton 0 os processos de tomba""' t
men 0 no
Patrim6nio hist6rico e cultural 45
I 'U ( , instituidos por meio do Decreto-lei n,2511937 - 0
I" u ipal instrumento juridico utilizado pelo entao Servico
110 Patrimonio Hist6rico eArtistico Nacional (Sphan), cria-
. 1 1 1 un 1936 sob os auspicios do ministro Gustavo Capane-
I 1 I H , r e sponsave l pela pasta de Educacao e Sande Publica,
Para analisar com maior clareza os procedimentos
lui!rtados pelo o rgao responsavel pela protecao do patrirno-
II c , ultural no Brasil, cabe recordar: enquanto a Convencao
"1Illre a Protecao do Patrimonio Cultural e Natural atua na
11~{,lIlizac;:aoprotecao dos bens culturais inclusos na Lista
t i l l Patrimonio Cultural da Humanidade, as acoes do Insti-
1 1 1 1 0 do Patrimonio Historico e Artistico Nacional (Iphan)
l' .ncarregam da identificacao, catalogacao, restauracao,
I01 s e rvac ao , preservacao, f iscal izacao e difusao dos bens
Iulturais em todo 0 territorio brasileiro.
A despeito das irnimeras reestruturacoes adrninistrati-
Y I, sofridas por esse orgao desde a sua criacao no governo
V trgas, seus meios de atuacao se rnantern leais as
i 4 omendacoes pertinentes para os compromissos firma-dl.l~ entre os paises signataries da Convencao do Patrimo-
nlo, liderada pela Unesco. Todavia, sera que esses indicati-
V I I S dao conta dos desafios enfrentados pelo Iphan? Que
lll'ientac;:oestern norteado suas atividades?
A priori, as propostas dos intelectuais vinculados ao
Ip h an foram orientadas por criterios seletivos pautados pela
d mtificacao da caracteristica estetica das obras, sua au t en-
II . i d ad e e seu carater excepcional. Tais preceitos remontam
I rnatriz frances a que serviu de modelo para a definicao da
IIsta do Patr imonio Cultural da Humanidade e para a ins-
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46 Pedro Paulo Funari e Sandra c.A. Pelegrini
titucionalizacao do ensino de arquitetura e engenharia em
diversos paises do rnundo, inclusive no Brasil, atraves da
Escola de Belas Artes e do Curso Politecnico. Portanto,
apesar do esforco do Iphan em preservar 0patrimonio bra-
sileiro, nao podemos ignorar 0fato de que a legislacao refe-
rente a esse tema se baseou na observancia da funcao social
da propriedade, restrita a conservacao de bens m6veis e
im6veis considerados memoraveis para a historia do pais.
Inseridas em urn projeto mais amplo, devotado a pra-
tica social integradora do governo Vargas, as primeiras acoes
em defesa do patrimonio nacional incluiram a selecao de
edificios do periodo colonial - em estilo barroco - e
palacios governamentais, em sua maioria predios neoclassi-
cos e ecleticos, Essas escolhas for am feitas devido a seus
vtnculos com a historia oficial da nacao, Enquanto a arqui-
tetura foi e1evada a condicao de marca nacional capaz de
promover a imagem de solidez do Estado brasileiro, os bens
culturais nao pertencentes as elites acabaram relegados ao
esquecimento. Tal premissa foi alterada mais de 60 anos
ap6s a criacao do Iphan, mediante a implementacao do
Decreto n.3.SS1/2000, que instituiu 0 registro de bens cul-
turais de natureza imaterial.
Voltando ao ponto de partida dessa reflexao: e possivel
afirmar que 0Iphan se dedica a salvaguarda dos bens cultu-
rais nacionais considerados representativos de diversos seg-
mentos da cultura brasileira? Como 0instituto desempenha
suas funcoesi Essas indagacoes nos parecem muito comple-
xas para serem circunscritas a uma resposta afirmativa ou
negativa. Contudo, podemos asseverar que as atividades do
Patrimonio hist6r1co e cultural47
mpormeioitono nacional transcorre
1 1 1 1 1 1 1 1 1 em todo 0 tern . . scrit6rios tecnieos, rnu-. deno s reglOna1S e e .
,I . ' I lE ermten enCla. rmativos que mter-. " mediados por no
• III . casas hlstonCas, h do instituto, como 0
. te no desempen 0 . -
Ii u-m dlretamen di A S sobre a aceltac;:ao e1 I !'eto-lei n.2.809/1940, que ISpO , - ou 0Decreto-
ivos particulares ao orgao,' 1 , 1 ":I<;:aode donati -0sistematica do
ue estabeleceu a execuc;:aIi 11.4.397/2002, q . 'Cultura _ Pronac.
\'tlJprama Nacional de ApOlOa promulgac;:ao da, , . afirmar que ara, se for legitimo upac;:ao com a pro-. . - d 1946 inaugurou a preoc .
IIlilstltUlc;:ao e . afirmou 0 que haVlat hist6ncos e re" I to de doeumen os . _ d 1937 podemos assinalar
I . C titUlc;:ao e ,.I n prescnto na ons submetida ao Esta-
dt 'monio manteve-se
t \11\'a gestao 0 pa n , t- 0 mensurar 0 alcance.' C podenamos en a
, I " i>rasile1ro. omo £ t de 0 instituto seater. d d lphan? Talvez, 0 a 0 d
1 1 ' 1 1 1ntivlda es 0 • . onialistas em defesa 0
. - d campanhas patnm . bi,\ t I'flaUlzac;:ao e de Juscehno Ku it-
'1' durante 0 governo , idIi li e lore brasl elf0 estao. Sem dUVl a,
£ pistas sobre essa qu .,~III'kpossa 0 erecer 'tedio patrirnomal tern
. 'bI' s devotadas a pro "r •
I ,oHtlcas pu ica it de identidade naClO-
dd com os concel os d
t "l11biado e aCor 0 d no poder. 0 perio 0· ue se suce em
1 1 1 1 dos governos q . u assim que fosse. 1964) proporclOno , ' , .
Ikl11oeratlcO (1946- _ d trimonio arqueolog1-, . 1 ide protec;:ao 0pa
Ilprovada a umca e h humanista encabec;:a-II( 92411961), ap6s urna campan aI· al aulista Paulo Duarte. .1 1 1 1 elo inteleetu ~ . 1de 1967 criou novas eategonas
A Carta Constltuclona d 0patrirnonio as· rvados, elegen 0com .
II •bens a serem prese . mente classificados· ' . ueo16gicos, antenor .
lll'l,ldase os sitios arq .' Contraditonamente,. 0locais de valor hlst6nco.Ilpcnascom
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48Pedro Paulo Funari e Sandra c . A . Pelegrini
esse documento afiancou, nos anos de intensa repressao
politica no Brasil, 0 direito a proposi<;:ao de acao popular
com vistas a anular atos lesivos ao patrimonio publico.
As profundas alterayoes nas relacoes entre 0Estado e os
produtores culturais iniciadas com a decreta<;:aodo Ato Ins-
titucional n.S (AI-5), em dezembro de 1968, pelos militares,
provocaram novos impasses a protecrao do patrimonio cul-
tural brasileiro. A partir de entao, inurneras obras passaram
a s~frer interven<;:oes e proibi<;:oes colocadas em pratica por
mew da acao cens6ria do governo. Nos anos posteriores, as
iniciativas em prol do patrimonio nacional se Iimitaram ao
controle sobre 0comercio de obras de arte antigas, a Iocacao
de reparticr6es publicas em im6veis de valor hist6rico e ar-
tistico, bern como a criacao conjunta de cursos de forma<;:ao
de mao-de-obra especializada e 0 incentivo a produs;ao ar-
tistica e literaria relacionada aos valores nacionais e regio-nais.
Nos anos 70, cogitou-se, por urn lado, a inclusao de
materias relacionadas ao patrimonio nacional nos curncu-
lo s do ensino fundamental, medio e superior, e, por outro,
foram analisadas as possibilidades de articulacrao entre a pre-
servacrao patrimonial e 0 fomento turistico. Assirn, 0Progra-
rna de Reconstru<;:ao das Cidades Hist6ricas, acionado pelo
governo federal em 1973, centrou-se na recuperayao dos
bens de "pedra e cal" e no incremento do turismo e do
comercio em areas consideradas de tradis;ao hist6rica e cul-
tural, sobretudo no Nordeste.
Durante a gestae de J arbas Passarinho no Ministerio da
Educas;ao, 0 governo Medici criou 0 Programa de Acao
Patrimonio h ist6r ico e cul tural 49
{;ultural (PAC), com vistas a promover a abertura de credi-
lo e financiamento para as acoes ligadas ao fomento cultu-
rul. Tres anos depois, 0Ministerio da Educacao e Cultura
(MEC), sob 0comando de Ney Braga, implantou 0primei-
1' 0 plano oficial na area cultural, denominado Politica Na-
.ional de Cultura (1975). Esta, por sua vez, viabilizou a
.riacao do Centro Nacional de Referencia Cultural
( ,NRC), que conjugou profissionais devarias areas interes-
sados na producao de urn sistema referendal basico, em-
pregado na descricao e analise da dinamica cultural brasi-
lcira,
Em 1979, sob os auspicios do MEC, foi criada a Funda-
9,0 Nacional Pro-Memoria, com 0 objetivo de driblar os
cntraves burocraticos e agil izar a captacao de recursos para
realizar programas e projetos na area da cultura. 0 reconhe-
imento de uma vasta gama de bens procedentes, sobretu-
d o , do saber popular alargou a concepcao de patrimonio,
agora assentada na diversidade cultural, etnica e religiosa do
pais. Sob a coordenacao de Aloisio Magalhaes, foram pro-movidas viagens e debates sobre a cultura e 0patrimonio em
distintas areas do pais - 0 que conferiu a ele 0 status de
renovador das politicas culturais no Brasil.
Em termos praticos, na decada de 1980 a protecao de
monumentos isolados, outrora priorizada, foi suplantada
pela preservacao dos espayOSde convivio, assim como pela
recuperacao dos modos de viver de distintas comunidades,
manifestas, par exemplo, na restauracao de mercados pu-
blicos e de outros espacos populares. Entre essas areas, des-
tacamos a do Terreiro da Casa Branca do Engenho Velho ou
5/10/2018 Patrimônio Histórico e Cultural LIVRO - slidepdf.com
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50Pedro Paulo Funari e Sandra C.A Pelegr ini
IlcAxeJya Nasso Oka, urn dos mais antigos templos de cuIto
religioso negro no Brasil. Trata-se de urn exemplar caracte-
ristico do modelo jeje-nago, reconhecido em 1982 como
patrimonio da cidade de Salvador, e, em seguida, tombado
como patrimonio nacional, registrado no Livro Arqueolo-
gico, Etnogr<ifico e Paisagfstico e no Livro Historico, em
agosto de 1986. A excepcionalidade desse tombamento se
deve ao fato de que representou urn marco nas ayoes doIphan, cuja tradis:ao anterior privilegiava apenas os monu-
mentos representativos do cuIto catolico. Ademais, alern do
patrimonio edificado, foram tombados tambem os princi-
pais objetos e arvores sagradas, bern como a vegetacao ritual
do entorno, numa area total de 6.800m2•
Essa amplias:ao da nocao dos bens a serem preservados
foi reforyada pel aspoliticas de incentivo fiscal voltadas para
a cultura. A Lei n.7.505/1986, conhecida como Lei Sarney,
constituiu, de urn lado, urn significativo impulso no ambito
da proteyao do patrimonio. Mas, de outro, propiciou 0
desenfreado desenvolvimento do marketing cultural, que seconsolidou nos anos 90.
Ayoes pelo patrimonio tornaram-se veiculos de propa-
ganda empresarial que, nao raro, espetacularizavam 0patri-
rnonio, tomando-o como "produto cultural" (uma mera
mercadorial). 0 Decreto n.8.313, conhecido como Lei
Rouaner, editado em dezembro de 1991, tambem reiterou
os principios norteadores da Le i Sarney e instituiu 0Progra-
rna Nacional de Apoio a Cultura (Pronac), cujo proposito
central era incentivar e desenvolver projetos culturais por
intermedio de recursos oriundos do Fundo Nacional de
Patrimonio historico e cultural 51
I lultura (FNC) e do Fundo de Investimento Cultural e Ar-
IINti.coFicart).
r) p atr im on io c ultu ra l s ob n ov o e nfo qu e. A abertura d~~o-
Il'ihica no pais, vivenciada na decada de 1980, perrnrtiu 0
urgimento de revis6es teoricas no campo da preservacao
dl)s bens culturais e a superacao de praticas limitadas a
«mservacao palaciana e fachadista - restritas a recupera-
\ 0 apenas da imagern plastic a, do colorido e das feicoes
I tilisticas dos conjuntos historicos,
A Carta Constitucional promulgada em 1988 retomou
ulguns pressupostos preservacionistas sugeridos por Mario
tit' Andrade eAloisioMagalhaes, reafirmando que a acao em
pial do patrim6nio devia se desenvolver independente-
III .nte da acao de tombamento e devia basear-se na referen-
t I i l idade dos bens. Alem disso, as disposicces contidas no
m'tigo215 reiteraram a protecao a s manifestacoes populares
ludlgenas e afro-brasileiras ou de quaisquer outros segme~-
1 4 I S etnicos nacionais, propondo, inclusive, a fixacao de efeme-
Id e s ou datas comemorativas concernentes aos seus respec-
t lvos interesses. A defesa do meio ambiente, da qualidade de
v da 110S centros urbanos e da pluralidade cultural repre-
IImtou avances na luta pela cidadania e por politicas preser-
vncionistas nos anos quese seguiram.
Apesar da predisposicao de tratar a cidade como do-
cumento, em toda a sua complexidade, as politicas de p~e-
N('I'Vayaoadotadas no Brasil a partir da decada de 19~O d i S :lunciaram-se dessa concepcao e, por vezes, sucurnbiram a
nocao de "cidade-espetaculo", para usar a terminologia su-
5/10/2018 Patrimônio Histórico e Cultural LIVRO - slidepdf.com
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52Pedro, Paulo Funari e Sandra c.A. Pelegrini
gerida por Nesto-r Canclini. A associas;ao dos bens culturais
ao seu valor de rrnercado corroborou para aumentar 0COn-
sumo cultural e p-"ara transformar a paisagem historicamen_
t~ construi~a em "ruinas" patrimoniais de marketing cita-
drno, ou sera, tra:il1sformar a cidade hist6rica em objeto de
consumo. Criou-ese urn simulacro de preservaS;ao, uma vez
que, nao raro, a iotervens;ao nos conjuntos hist6ricos limi-
tou -se a recuperar apenas a plasticidade expressa no tracado
e nas caracteristica.s esteticas das construyoes.
A exclusao d<3 populas;ao residente e a adaptayao dos
espas;os a novos usos, na maio ria das vezes, nao resultaram
em processos integ.rados de reabilitas:ao, como propunham
as cartas patrimoniais internacionais que defendiam a con-
servaS;ao integrada eo desenvolvimento sustentavel. Muito
peIo contrario, as alfoes desse tipo se identificaram com 0
fen6meno definido pelos ge6grafos como "gentrificas;ao",
enquanto a consoli.dacao do espas;o arquitet6nico, via de
regra, pautou-se pela superficialidade das restauraS;6es.
Desse modo, verificarnos que a suposta homogeneidade dos
centros hist6ricos foiconquistada a custa da restauras:ao de
fachadas de monum entos, da impressao de conjunto forja-
da pela demolis;ao de predios, pe1a criacao de amplos espa-
cos ~azios ou verdes, utilizas;ao de mobiliario urbano pa-
drolllzado (definido por padr6es de epoca) e pelo emprego
de jogos de cores e luzes contrastantes.
Todos esses efeitos visuais, somados a comercializayao
de produtos supostarnente oriundos da cultura local, tais
como a com ida, 0artesanato, os rituais, entre outros, e ao
investimento em eventos gigantescos Voltados para 0 turis-
Patr imonlo historlco e cul tural 53
IIU' t~m estabelecido a tonica dominante entre os projetos
Ii preservacao. Essa forma de intervencao, colocada em
I'liHtca nos Estados Unidos (Nova York e Boston), ~em
Illdo implantada tambem em algumas cidades europeias e
h ll no-americanas, Dentre esses projetos, destacamos aque-
h ~ -fetuados em areas pr6ximas a Barcelona (na orla mari-
Hl lm) e a Buenos Aires (onde estruturas portuarias deg~ad~-
, I , i . . foram recuperadas e utilizadas como base para a cnayao
. 1 . ' Puerto Madero). No Brasil, esse efeito pode ser observa-
,Ill na restauracao do Pelourinho, em Salvador, e do centro
It torico de Olinda e Recife. Tais projetos resultaram de
1111)1) pseudo autossustentabilidade pautada p~r pos~ulados
I I uucmicos evisaram a reducao dos custos de mvestimento
Jllllhlico,mas deixaram de lado a gestao associada de politi-
I 1 11 ambientais, urbanisticas e habitacionais. .
NAo podemos esquecer que as contribuicoes do Proje-
II! ores da Cidade, patrocinado pela Fundacao Roberto
M urinho e por fabricantes de tintas, tern viabilizado a res-
IIIuracao de espacos e edificios publicos mernoraveis em Sao
l'uulo e no Rio de Janeiro. Tampouco podemos ignorar que
w IN intervencoes realizadas no Pelourinho, por parte do go-
y '1'110 estadual da Bahia, sao reconhecidas nacional e inter-
III icionalmente. Por outro lado, devemos lembrar que a
prOJnissora reabilitacao do centro hist6rico de QUi,to ins.p~-
IOU a restauracao de significativos conjuntos patnmo~l~ls
urbanos, realizada pelo Programa Monumenta, adminis-
Ira 10pelo Ministerio da Cultura com recursos do BID.
Apesar do valor positivo desses projetos, pautados ~e~a
transformacao do patrimonio em areas de interesse tunsti-
5/10/2018 Patrimônio Histórico e Cultural LIVRO - slidepdf.com
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54Pedro Paulo FUnar i e Sandra c.A. Pelegrini
co, a implantayao de programas dessa natureza deve escapar
a tentayao de reduzir a patrimonio a "cenarios" da industria
cultural e it logica do entretenimento, dissodando toda a
fruryao dos bens culturais da memoria social e historica.
A amplia;;:ao do conceito de patrimonio observada no
artigo 216 da Constituiyao Federal Brasileira sern duvida
impulsionou a criayao de urn novo instrumento de preser-
vacao no pais: 0Registro de Bens Culturais de Natureza
Imaterial, implementado pelo Decreto n.3.551/2000. Essa
multiplicayao das frentes de tombamento do patrimonio
hist6rico nacional, apresentada no registro de "bens imate-
riais notaveis", como salientou Glauco Campe1o, eviden-
ciou a adocao de novas formas de acautelamento por parte
do Iphan e a necessidade da criayao do Livro de Registro dos
Saberes e do Livro de Registro das Formas de Expressao, nos
quais sao inscritos os "conhecimentos e modos de fazer
enraizados no cotidiano das comunidades" e compiladas
"as manifestayoes literarias, musicais, pIasticas, cenicas e
hidicar", Criou-se tambem0
Livro das Celebracoes e a Li-vro dos Lugares, que tratarn, respectivamente, dos "rituais e
festas que marc am a vivencia coletiva do trabalho, da reli-
giosidade, do entretenimento e de outras praticas da vida
social" e dos espacos on de se "concentram e reproduzem
praticas culturais coletivas", como mercados, feiras, santua-
rios e pracas, entre outros.
Claro que as recentes conquistas no ambito da preser-
vacao do patrimonio intangivel parecem irrevogaveis. 0
exito dessa medida pode ser comprovado mediante 0regis-
tro do Oficio das Paneleiras de Goiabeiras, primeiro bern
Patr lrnonlo historico e cul tural 55
!ultural catalogado no Livro de Registro dos Saberes, em 20
i i i . : dezernbro de 2002. Essa inscricao foi realizada por soli-
I It9;;:aoda Associacao das Paneleiras de Goiabeiras e pela
~;l'cretaria Municipal de Cultura de Vitoria, com 0objetivo
!II.!reservar 0 saber- fazer relacionado a fabricacao artesanal
rlepanelas de barro em Goiabeiras Velha, em Vit6ria, no
IINpfritoSanto. Esse conhecimento vern sendo repassado de
III e para filha por geracoes sucessivas, e continua garantin-
rlo a sobrevivencia de mais de 120 familias, muitas delas
I!p;;lrentadas entre si.
Alias, a inclusao do samba de roda (do Reconcavo
Haiano), da pintura corporal conhecida como Arte Kusiwa
(' da Arte Grafica Wajapi (do Amapa) no Livro de Registro
IIIlS Formas de Expressao representa uma conquista inco-
nicnsuravel no ambito da defesa do patrimonio mundial,
uma vez que estas duas ultimas foram proclamadas, em 2003,
ubras-prirnas do patrimonio imaterial da humanidade.
Ha muito par fazer, mas podemos afirmar que a expe-
I lencia patrimonial no Brasil tern sido assimilada no seu
N mtido mais completo, em sintonia com a coletividade e a
partir de conhecimentos antropol6gicos, socioI6gicos,. h~s-
It rices, artisticos e arqueol6gicos orientados par especialis-
IllS. A implantacao de cursos de educacao patrimonial, a
nrganizacao de oficinas-escola e servicos em mutirao cons-
lltuem aedes de importancia fundamental no processo de
envolvimento da populacao, Esse esforco, articulado com 0
!l~t:hnulo a responsabilidade coletiva, contribuira para con-
llo1idarpoliticas de inclusao social, reabilitacao e sustentabi-
l ldade do patrimonio em nosso pais.
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56
Pedro Paulo Funari e Sandra C A Pel "" egnnl
A organizas:ao de oficinas-eseo1a e _subsidios da Agencia E hIm Joao Pessoa (com
span 0adeCoo -nal) e de mutiroes su ' " peras:ao Internacio-
pervtslonados porras:ao de talhas no R .C ,. mestres em restau,
ecrre e em OItnda ( d i "entre 0governo do t d me lante assOclas:6es
es a 0 e as pref it ) .,resultados louvaveis A fici ei uras ja apresentam
" so cmas ao pobra para os trabalh s d ,repararem mao-de-
os e restaurarao 'bil"caz intercambio d " C _" POSSI itam urn efi-
e Inl0rmayao sobr 'movem a difusa d '" e 0patnmonio e pro-o e expenenclas p af
restauro de edificar - .1 r leas no campo doco es, a tares entalh d
dra e obras de arte t a os, portadas de pe-, en re outros bens M ' d '
atuarn como multipIiead d ". ,als 0 que ISS0:
d oras e conSelentI -a em que 0 exerclcl' d . z ac a o , na medi-
o os aprendizes ' .outros membros da id suscm 0 Interesse de
comum ade. Esse m .urn labor silencioso de r bil' OVImento se une a
ea ttacao que d '.do bem e das obras mai . prece e a eXlblyaO
ais vlstosas rratprocedimento ue - ,a-se, portanto, de urn
ao "espetaculo ~o pnaatOrI~mo~e.s~,restringirdar visibilidadeorno seia t 'd .
das obras de arte em m d ' "~ a raves e expOSIs:aouse us, e vrsita a
de turismo cultural. os monumentos ou
A g~st~odo patrim6nio culturalno limlar do secu/o XXI
A T dana is e os coneeitos referentes ao . ,x6es sobre as identid. d ' ,patnm6nlO e as retle-
d. a es e memonas to d 'lferentes processos d " ' ma as a Iuz de
e recuper -" dtalvez tenham suscitad I' as:a~ os bens culturais,
o ao ertor mars dUvidas doque cer-
Patr im6nio hlstorlco e cul tural 57
'I ezas , As prat icas preservacionistas acionadas na America
Latina mantem-se em sintonia com as politicas internacio-
nais de protecao, que enfrentam 0 desafio de associar a
preserv acao do patrimonio cultural e da mem6ria social ao
desenvolvimento urbano. Mas, no caso latino-americano,
osespecialistas se deparam com outros impasses, agravados
pela complexidade e extensao dos acervos de bens , a disper-
sao desse patrimonio no vasto continente americano, as
urgencies sociais e a escassez de recursos.
Por certo, essas dificuldades implicam acoes pontuais,
muitas vezes restritas a prornulgacao de leis e decretos espe-
cificos, que, por sua v ez , ocasionam desequilibrios regionais
e soc ia i s , Todavia, nan podemos ignorar que tais obstaculos,
justificados pelos entraves financeiros e pelas grandes dis-
tancias a serem vencidas, dissimulam esco lhas expressas em
projetos politicos historicamente constituidos, nos quais se
explicita os bens dignos de perenidade e aqueles condena-
dos a destruicao.
Assim, embora a implantacao de leis voltadas para a
defesa do patrimonio hist6rico tenha representado urn
avanyo no campo da preservacao da mem6ria social dos
paises latinos, os fundamentos que inforrnaram essas prati-
cas iniciais acabaram provocando a expropriacao cultural
da maior parcela da populacao, que nao se viu reconhecida
nos majestosos exemplares da arquitetura publica ou reli-
giosa, 0 deslocamento observado no percurso da politica
patrimonial resulta do desenvolvimento da arqueologiahis-
torica, dos enfoques da antropologia e, sem duvida, da aber-
tura da hist6ria a sujeitos sociais antes silenciados ou igno-
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58Pedro Paulo Funar i e Sandra c.A. Pelegrini Patr im6nio historico e cultural
rados. Essa possibilidade certamente implicou a escolha de
bens diversificados para celebrar a memoria social de distin
tos segmentos etnicos presentes em nosso continente.
No entanto, a observacao de algumas experiencias de
preservacao e a analise dos compromissos firmados pelas
instituiqoes voltadas para a defesa do patrim6nio tam bern
podern ter sugerido questionamentos no campo da gestae
patrimonial.
Se nos debruyarmos rnais detidamente sobre os pa-
droes de recuperacao patrimonial adotados nos nucleos
historicos de Lima e Quito, perceberemos que a diferenca
mais significativa entre os dois casos reside no fato de que as
autoridades equatorianas associaram a defesa do patrim6-
nio a polit ica habitacional e ao investimento turist ico, pri-
vilegiando a inclusao social. Talvez 0grande valor do proje-
to se resuma a estrategia de reabilitacao adotada _ urn
conceito de gestae urbana balizado pela requalificacnr, da
cidade, colocada em pratica por meio de intervencoes rmil-
tiplas destinadas a valorizar as potencialidades sociais, eco-
n6micas e funcionais do Iogradouro. Para tanto, 0programainvestiu na recuperaqao das identidades locais e no melho-
ramento das condiyoes fisicas do parque construido, sem
negligenciar as caracteristicas tipologicas e paisagisticas da
area, restaurando, com iS80, suas singularidades arquiteto-
nicas e artisticas.
Se a estrategia de reabili tacan parece contemplar satis-
fatoriarnente as necessidades de preservacao, que padroes
~e gestao do patrimonio seriam os rnais adequados para sua
lmplementaqao? Esse assunto tern provocado inquietaqoes
entre os membros das instituicoes responsaveis pela rea-
bilitacao dos sitios historicos. Todos parecem buscar proto-
t ipos de intervencao capazes de integrar 0 patrimonio a
dinamica da cidade. Nessa linha de abordagem, tern se va-
lorizado a opcao por medidas conjuntas, adequadas ao en-
volvirnento de atores publicos e privados para garantir a
sustentabilidade, 0 desenvolvimento e a valorizacao do pa-
rtimonio. Esses preceitos vern sendo debatidos desde longadata, como demonstram as recomendacoes contidas tanto
na Declaracao de Lima, quanta na Declaracao da Cidade do
Mexico - documentos resultantes respectivamente dos
congresses realizados em novembro de 1997 e em abril de
000.
Por certo, a implernentacao de politicas patrimoniais
I ve partir dos anseios da comunidade e ser norteada pela
delirnitacao democratica dos bens reconhecidos como me-
recedores de preservacao, Mas a selecao dos bens a serem
tombados precisa estar integrada aos marcos identitarios
reconhecidos pela propria comunidade na qual se inserem.
Nesse ponto, a experiencia participativa executada em
.uba, na Havana Velha, pode ser lembrada, pois as medidas
implementadas promoveram 0 dialogo entre 0 velho e 0
IlOVO e 0 debate sobre as necessidades socioculturais da
populacao. Desse modo, 0velho centro de Havana foi rea-
bilitado, segundo Roberto Segre, mediante atribuicao de
uovos usos aos ambientes antigos, transformados em espa-
¥os culturais, abrigos ou escolas.
As politicas preservacionistas adotadas na America La-
tina apostam, cada vez mais, no envolvimento das cornuni-
59
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60Pedro Paulo Funari e Sandra c.A. Pelegrini
dades e em in.iciativasintegradas entre 0publico e0privado.
Mas a globalizacao e as inovas;oestecno16gicasda contem-
por.aneidade,.somadas ao amilgama cultural incorporado it
sociedade latmo-americana, continuam suscitando muitas
contendas a serern superadas. Ficaremos contentes se a lei-
tura deste livro contribuir para uma compreensao rnais
~mpla.de patrirnonin e para a ados;ao de praticas socialsmcluslVas.
Referencias e fontes
Indicamos, a seguir, obras que substanciaram nossas
consideracoes, demodo que0leitor possa seaprofundar na
leitura de textos com referencias adicionais.
A citacao de Ioaquim Falcao foi retirada de seu artigo
"A reducao do Brasil", publicado na Folha de S. Paulo
(4/4/2000, Caderno A, p.3). A luta das comunidades pelo
patrimonio foi objeto de artigo no Estado de M inas
(31/5/1998, p.6-7). Os exemplos de Santana do Parnaiba e
Sao Sebastiao foram retirados de0E sta do d e S. Paulo, dos
artigos "Menores carentes restauram Santana de Parnaiba"
e "Projeto tira criancas das ruas e ensina a preservar 0patri-
monic" (27 /611999 e 2014/2002, respectivamente).
o carater aristocratico da sociedade romana que origi-nou 0conceito de patrimonium e discutido em A vida quo-
tid ia na n a R om a A ntig a (SaoPaulo, Annablume, 2003), de
Pedro Paulo Funari.
o conceito de nacao esta bern desenvolvido em Natio-
nalism (Oxford, Oxford University Press, 2005), de Steven
Grosby.A cidadania moderna encontra-se no livro Hist6ria
da c idadan ia (Sao Paulo, Contexto, 2003), organizado por
Jaime e Carla Pinsky. 0 caso das possessoes francesas na
America do Norte encontra-se em L a q ue stio n n atio na le a u
Quebec (Paris, PUF, 1998), de Francoise Epinette.
61
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62 Pedro Paulo Funar i e Sandra c.A. Pelegrini Patrlmonio histor ico e cultura l
As nocoes de habitus e reproducao por meio da eseola
foram esmiucadas par Christiane Chauvire e Olivier Fon-
taine, em Le v oc abula ire d e B ourd ieu (Paris, Ellipses, 2003).
D eleu ze e a ed uc ac ao (Belo Horizonte, Autentica, 2003), de
Silvio Gallo, e Par ed es q ue d om estic am : A rq ue olo gia da ar-
quitetura escolar cap ital is ta (Buenos Aires, CHAA/Uni-
camp/Fapesp, 2002), de Andres Zarankin, tratam dos ou-
tros autores citados no corpo do capitulo.
o caso da unificacao italiana eneontra-se bern desen-
volvido no classico do fil6sofo Benedetto Croce, Storia d'I tal ia,
dal1871 al1915 (Bari, Laterza, 1967). Os documentos na-
zistas estao em De r nationalsozialismus Dokumente 1933-
1945 (Hamburgo, Fischer, 1957), editados e comentados
par Walther Hofer. 0caso ingles, entre outros, e discutido
em A rc ha eo lo gy u nd er F ir e. N atio na li sm , P olit ic s a nd H er ita -
ge in the E astern M editerranean and the M iddle E ast (LoD-
dres, Routledge, 1998), organizado por Lynn Meskell.
A tradicao anglo-saxonica do direito patrimonial esta
bern representada por John Henry Merryman em "The na-
tion and the object", In tern atio na l Jo urn al o f C ultu ra l P ro -perty, 3,1994, p. 61-76. A tradicao continental, derivada do
direito romano, foi estudada por Dominique Audrerie em
L a n otio n et la p ro tectio n d u p atrim oin e (Paris, PUF, 1997).
A legislacao norte-americana e analisada em Ass es si ng S it e
S ig nific an ce , a Gu id e fo r A rc ha eo lo gist s a nd H is to ri an s (Wal-
nut Creek, Altamira, 2000), de Donald L.Hardesty e Barba-
ra J . Little. Asleis citadas no capitulo podem ser encontradas
na Internet.
A citacao de Henry Cleere esta em urn capitulo do livro
Destr uc tio n a nd Con se rv atio n o f C ul tu ra l P ro pe rty (Londres,
Routledge, 2001), organizado por Robert Layton, Peter G.
Stone e Julian Thomas. 0siteda Unesco forneee dados atuali-
z a d o s sobre a instituicao, as convencoe s e os sitios considera-
dos patrimonio da humanidade. http://www.unesco.org.
As declaracoes, cartas patrimoniais, leis e decretos re-
ferentes ao patrimonio cultural brasileiro foram disponibi-
l izados no site http://www.iphan.gov.br e no site da Unesco,
citado acima, podendo ser encontrados em publicacoes
especi f icas como L eg isla ra o b ra sileira d e p ro tec ao a os h en s
culturais, organizado pelo Iphan e pelo MEC, ou na Consti-
tuirao da Rep ublica F ederativ a do B rasil (Brasilia, Senado
Federal, 1988).
A analise dos casos darecuperacao dos centros hist6ri-
os de Lima e Quito foi fundamentada nos seguintes traba-
lhos: La p oliti qu e d e r esta ur atio n d es c en tr es h ist oriq ue s c om -
m e re so urc e p oli tiq ue . L a re co uv reme nt d u C en tr e H is to riq ue
fie L im a. A cteu rs, Id ees, E njeu x, de autoria de Stephanie
Rond a (A ix - e n-P ro v e nc e , monografia, 1997); a obra edita-
d a por Fernando Carrion, La c iudad const ru ida. Utbanismo
e n America (Quito, Facultad Latinoamericana de Ciencias
HocialeslJunta de Andalucial Rispergraf, 2001); as discus-
/i - espropostas por UrpiMontoya Uriarte em "Intervencoes
recentes em centros hist6ricos: as politicas de recuperacao
lias centros hist6ricos de Salvador, Lima e Quito" (Cader-
no s do CEAS, n.208, nov / de z 2003).
Os comentarios sabre a gestae do patrimonio em Cus-
ru e Lima, Puerto Madero (Buenos Aires) e Cidade do
63
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64Pedro Paulo Funari e Sandra c.A. Pelegrini Patr imonio his tor ico e cultural 65
Mexico apoiaram-se nas proposicoe, de Rene Coulomb em
os "ModeIos de gesti6n en los centros hist6ricos de America
Latina y elCaribe. En busca de la integridad, la gobernabili-
~ad democnitica y la sostenibilidad", artigo integrante do
Iivro supracitado de Fernando Carrion.
Os comentarios de Roberto Segre sobre a preservacao
na America Latina podem ser encontrados no livro Arquite-
tura e u rhan ismo da r ev ol ucao cubana(Sao Paulo, Nobel,
1987) e no capitulo "Havana: 0resgate social da mem6ria"
publicado em 0direito a memori a. Pa tr imonio h is to ri co e
cidadania (Sao Paulo, Departamento do Patrirnonio Hist6-
rico/Secretaria Municipal de CuItura/Prefeitura de Sao
Paulo, 1992), organizado por Maria Clementina Pereira da
Cunha.
A analise da recuperacao das residencias tradidonais
de Quito fundamentou-se nas proposi<;:oes de Rolando Tas-
quer e E. Peralta, expressas no texto "Rescate de edificado-
nes hist6ricas para la fund6n habitacional", publicado no
volume Casa s del Ecuador II (Quito, Ediciones Trama, s/d.),
e no artigo de Sandra de Cassia Araujo PeIegrini intitulado
"Cultura e patrimonio hist6rico. Estrategias de preservacao
e reabilita<;:ao da paisagem urbana", divulgado na revista
Latinoamerica, Revista de Es tud ios Latinoamer icanos , n.38.
(Mexico, Universidad Nacional do Mexico, 2004).
As impressoes de Paulina Burbano de Lara e demais
informa<;:oes sobre a recupera<;:ao desse sitio integraram os
textos que compuseram as coletaneas "Serie QUito", intitu-
ladas Cen tr o H is t6 ric o d e Quito . P ro blema tic a e p er sp ec tiv as
e Cen tr o H is to ric o d e Quito . S oc ie da d e e sp ac io u rb an e (Qui-
to, Direccion de Planificacion/Municipio de Quito/Conse-
jereria de Obras Publicas y Transporte/I unta de Andalucial
Ministerio de Asuntos Exteriores de Espana, 1990 e 1993).
A citacao da correspondencia do vice-rei do Brasil, D.
Andre de Melo e Castro, consta do livro Prot ecao e r ev it al i-
zm;:dodo pattimonio c ultu ra l n o B ra sil: uma tr aj eto ria . (Bra-
silia, MECISphan/Funda<;:ao Nacional Pro-Memoria, 1980,
p.61).As acoes do Iphan foram esrniucadas pelo arquiteto
Lauro Cavalcanti no artigo "0 cidadao moderno", incluido
no volume 24 da Rev is ta d o P a tr imon io H is to ric o e A rtis tic o
Nacional- Cidadania (Brasilia, Iphan/MEC, 1996).
A mencao de Jacques Le Goff diz respeito as assertivas
do historiador frances expressas na obra A Historia Nova
(Sao Paulo, Martins Fontes, 1995), enquanto as matizes
francesas dos criterios seletivos que pautaram a identifica-
<;:aodo patrimonio sao apontadas por Leonardo Benevolo
em H is t6 ria d a a rq uite tu ra mod er na (Sao Paulo, Perspectiva,
2001) e investigadas por Yves Bruand no volume Arquitetu-
ra c on tem po ra nea no B rasil (Sao Paulo, Perspectiva, 1997).
As contribuicoes de Camillo Sitte podem ser observadas em
A construcao d as c id ad es seg un do seu s p rin cip io s a rtistic os
(Sao Paulo, Atica, 1992).
Sobre 0tombamento do Terreiro da Casa Branca, vale
consultar 0 artigo do antrop61ogo Gilberto Velho, "Antro-
pologia e patrimonio cultural", publicado na Revista do
P atr imon io H is to ric o eA r tis tic o Nac io na l, n.20 (1984).
o conceito de "cidade-espetaculo" foi citado por Nes-
tor Canclini em Consum idores e c idad ii os . Con fl it os mu lt icul -
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turais dagTobalizafiio (Rio de Janeiro, UFRJ, 2001). As pa-
~~ra.s ~e. Glauco Campelo constam de "As;6es pelo patri-
OUlO , incluso em Urn o lh ar s ob re a c ult ur a b ra si le ir a co-l . ,. 'etanea com .prefaclO do presidente Fernando Henrique
Cardoso e dlsponivel no site http://www.minc.gov.br!
text os!olhar! acoespatrimonio.htm.
Leituras recomendadas
6 6Pedro Paulo Funari e Sandra c.A. Pelegrini
Os titulos a seguir sao indicados para os leitores que desejarn
aprofundar 0estudo dos temas tratados. Hi diversas obras
gerais sobre patrimonio que constituem bons guias, tais
c om o E l p atr im tm io h is t6 ri co y arqueo log ico: va lor y uso, de
losep BalIart (Madri, Ariel, 1997), e 0 qu e e patrimonio
hist6rico?, de Carlos Lemos (Sao Paulo, Brasiliense, 2000),
publicada originalmente em 1981 e ainda relevante.
Alguns conceitos sobre identidades sociais sao discuti-
dos em ldentidades, d is cu rs o e podet: e st udos da a rqueo logia
l'rI~ltemporanea, organizado por Pedro Paulo Funari , Char-
1l'Il E. Orser e Solange Schiavetto (Sao Paulo, Annablume,
lO(5), com capitulos sobre 0 patrimonio e seus usos. 0
IH I trimonio subaquatico e discutido em A rque olo gi a a te de -
lIlli' ,()dagua, de Gilson Rambelli (Sao Paulo, Maranta, 2002).
Os principais temas patrimoniais e uma extensa biblio-
tIl n f i a sobre 0 Brasil podem ser encontrados no artigo de
I'l ,dro Paulo Funari publicado em Portugal, "Os desafios da
41I"II, 'uiyao e conservacao do patrimonio cultural no Brasil",
IIf'Wante do peri6dico T raba lhos de ant ropolog ia (j etnolo-
,rl 11.41 (Porto, 2001, p.23-32).
Para alguns exemplos de Portugal, ver 0 t l J 1 t i H o ~Td'n-
I h h h i e s culturais urbanas em epoca de globi l l l : t : I I ! , 0" de
fnlh'II.110 Firmino da Costa, publicado na RCldMr11 IIw,/hra
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68 Pedro Paulo Funari e Sandra CA. PelegriniPatrimonio hist6rico e cultural
de C ienc ia s Soc ia is , v.17, nA 8 (Sao Paulo, fey 2002), dispo
nivel em http://www.seielo.br.
o turismo cultural e estudado em T urism o e patrims-
n io cu lt ural (Sao Paulo, Contexto, 2003), organizado pOI
Pedro Paulo Funari e Jaime Pinsky, e em Pat rimon io h is t' {5
rico e cultural (Sao Paulo, Aleph, 2002), de Haroldo Leitao
Camargo.Os desafios da preservacao digital podem ser avaliados
no site www.unicamp.brlsiarqldoc_eletronico. com textos
e links sobre a tema.
Alern do ja citado site da Unesco, sao muito uteis 01 1
portais do leomos, www.icomos.org, da Uniao Mundial d a
Natureza, www.iucn.org, do Conselho Internacional dos
Museus, www.icom.org, da Organizacao das Cidades Patri-
monic da Humanidade, www.ovpm.org, e da International
Law Association, www.ila-hq.org (Cultural Heritage Law);
no Brasil, ha informacoes em links de www.historiaehisto-
ria.com.br.
As estreitas relacoes entre arte e patrimonio podem seraprofundadas no artigo de Sandra de Cassia Araujo Pelegri-
ni, "Historia, cultura e patrimonio. Os solares urbanos do
seculo XIX", publicado na revista Varia Hist6ria, n.29 (Belo
Horizonte, UFMG, 2003, p.64-76). Outra boa fonte de con-
sulta sobre 0 tema e a Revista do P atrim6 nio Historico e
Art is ti co Naciona l, publicada pelo Iphan/MEC. Dela, em
particular, destacamos 0artigo de Claudia Girao, divulgado
em 2001, no numero 29.
As abordagens realizadas por Francoise Choay em A
a lego ri a do p atr im tm io (Sao Paulo, Edunesp, 2001) e por
II I' ia Scholz de Andrade Kersten em Os rituais do tom -
I l ll / I' l. r.mto a escr ita da hist6ria (Curitiha, UFPR, 2000) cons-
t t ucm obras referenciais sabre as temas debatidos neste
I vI' ).Uma discussao ampla e atual dos problemas do patri-
IIltilli,o no continente americana pode ser encontrada em
V I rlos escritos do sociologo Fernando Carrion, em especial
I,; lI tr os h is t6 ri co s d e Amer ic a Lat in a y Caribe (Quito, Unes-
Io/Flacso, 2001).
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AgradecimentosSobre os autores
Agrad~c.emos 0 apoio institucional do Nucleo de E t d
Estrateglcos da Unicam C s u ostadual d M . p, NPq, Fapesp, Universidade Es-e annga e aos I d .
Cultural P . co ega s 0I nte rn atz onal J ou rnal o froperty, assim como a Iosep Ballart I-I Id '
~c ,~o~o amargo, Fernando Carrion, Ce1soCastro Hen Cle
Lre,Raquel dos Santos Funari, Barbara Little, ~IaYM:th e-
ynn Meskell P J O'K f ers,
Z'I' L d ' . . . ee e, Lynde1 Prott, Jose RemesaIe ra Opes aSilv 5'1 . HI'. a, 1Via e ena Zanirato e And / Zkin Are bil'd res aran-
. sponsa 1 ade pe l as ideias natur Ige-se aos autor ' a mente, restrin-es.
PEDRO PAULOFUNARInasceu em Sao Paulo. Graduou-seem hist6ria, obteve 0mestrado em antropologia social e 0
doutorado em arqueologia, sempre na Universidade de Sao
Paulo. Obteve a livre-docencia em hist6ria pela Unicamp,
onde e hoje professor titular. E pesquisador associado da
Illinois State University e da Universitat de Barcelona, pro-
fessor do programa de pos-graduacao em arqueologia da
USP e coordenador associado do Nucleo de Estudos Estra-
tegicos da Unicamp. Atua, ainda, como pesquisador do
Nucleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam/Uni-
camp) e do doutorado em ambiente e sociedade, alem de
liderar 0grupo de pesquisa do CNPq sediado no Nucleo de
Estudos Estrategicos da Unicamp. Publicou mais de duzen-tos artigos cientificos em revistas academic as brasileiras e
estrangeiras e tambem dezenas de livros, muitos deles no
exterior. E urn estudioso do patrimonio e membro do con-
selho editorial da revista International Journal of Cultural
Property, assim como atuante na preservacao digital.
Seu e-mail [email protected].
SANDRACASSIAARAOJO PELEGRINIe natural de Sao Paulo.
Graduou-se em hist6ria na Universidade Estadual Paulista,
obteve 0mestrado em hist6ria e sociedade na mesma uni-
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Colec ;ao PASSO-A-PASSO
72 Pedro Paulo Funari e Sandra c.A. Pelegrini
versidade e 0doutorado em historia social na Universidade
de Sao Paulo. Desenvolveu os estudos depos-doutorado na
Unicamp sob a tutela do professor Pedro Paulo Funari.
Como docente do Departamento de Historia da Universi-
dade Estadual deMaringa (UEM), atuanos cursos de arqui-
tetura e urbanismo e no ensino de graduacao emestrado em
historia, Trabalha em comissoes municipais de cultura em-
penhadas na defesa do patrimonio cultural na regiao do
norte do Parana. Como uma das coordenadoras do Progra-
rna de Estudos e Pesquisas do Espaco Urbano da UEM e
como pesquisadora do Nucleo de Estudos Estrategicos da
Unicamp, tern aprofundado as reflexoes em torno da me-
moria e do patrimonio cultural. Publicou varies artigos
ciennficos em revistas especializadasbrasileiras e estrangei-
ras. Dentre as producoes e coedicoes mais recentes, vale
destacar: A UNE nos an o s 6 0. U to pia s epraticas p o li ti co s no
Brasil (Londrina, Eduel, 1998); Hist6ria, espaco e m eio am -
biente (Maringa, Anpuh Parana, 2000);D im en so es d a tma-
gem . I nt er fa ce s t eo ri ca s e me todo logi ca s; e N atra tiv as d a p 6s-
mo de rn id ad e n a p es qu is a h is t6 ric a (ambos publicados pela
editora da UEM ern 2005).
Seu e-mail [email protected].
Vo lumes recent es :
Ci tNC lAS SOCIAlS PASSO-A-PASSO
Literatura e sociedade [48]'
Adriana Facina
Sociedade de consumo (49).
LiviaBarbosa
Antropologia da crian~a [57),
Clarice Cohn
Patrimonio hist6rico e cultural [66},
Pedro Paulo Funari e Sa.n~ra
de Cassia Araujo Pelegrilll
Antropologia e imagem [681,
Andrea Barbosa e Edgar T.da Cunha
Antropologia da politica [79],
Karina Kuschnir
sociabilidade urbana [80],
Heitor Frugoli Jr.
Filosofia da biologia [81],
Karla Chediak
Pesquisando em arquivos [82].
Celso CastroCinema, televisio e historia [86].
Monica Almeida Kornis
FILOSOFIA PASSO-A-PASSO
Leibniz & a linguagem [61.1,
Vivianne de Castiilio MOreira
Filosoiia da educa~io [62},
Leonardo Sartori Porto
Estet.ica [63], Kathrin Rosenfield
Filosofia da natureza [67],
Marcia Gonr,:alves
Hume [69], Leonardo S.Porto
. . .
Maimonides [70], Ruben Luis
Najmanovich
Hannah Arendt (73), Adriano
Correia
Schelling [741.Leonardo AlvesVieira
Niilismo [77], Rossano Pecoraro
Kierkegaard [78]. Jorge Miranda deAlmeida e AlvaroL.M. valls
Ontologia [83}, Susana de Castro
John Stuart Mill & a Liberdade [84},
Mauro Cardoso Simoes
PSICANAuSE PASSO-A-PASSO
Ateoria do amor [38).
Nadia P.Ferreira
o conceito de 5ujeito [501.
Luciano Elia
Asublima~o [51}, Orlando Crux~n
Lacan, 0grande freudiano [561,
Marco Antonio Coutinho Jorge e
Nadia P.Ferreira
Linguagem e psicanalise [64].
LeilaLongo
sonhos [65], Ana Costa
polltica e psicanalise [71],
Ricardo Goldenberg
Atransferincia [72],
Denise Maurano
psicamilise com crianjjas [75].
Teresinha Costa
FemininofmascuUno [76],
Maria Cristina Poli
Cinema, imagem e psicamilise [85),
Tania Rivera
5/10/2018 Patrimônio Histórico e Cultural LIVRO - slidepdf.com
http://slidepdf.com/reader/full/patrimonio-historico-e-cultural-livro 39/39