Patrocínio
Da
Imobiliária Solar
1
APRESENTAÇÃO
No intuito de divulgar os valores literários da nossa Escola e de comemorar a "Semana PEDRINHO", foi que surgiu a ideia de reunir, em coletânea, uma série de escritores, não só de alunos e professores como também de ex-alunos.
É uma iniciativa pioneira, que se pretende tenha continuidade. uma vez que visa a incentivar, em nosso meio estudantil, o cultivo da expressão.
Como é bem conhecida a dificuldade que existe para o custeio de publicações desta ordem, agradecemos, com reconhecimento, aos que a possibilitaram: a Gráfica Unisinos a gentileza da Imobiliária Solar que assumiu, na íntegra, os gastos necessários para a concretização do presente opúsculo.
Prof. Siegfried Braun
Diretor
2
3
Criação do Colégio.
O Colégio Estadual Professor Pedro Schneider, situado à rua São Caetano, 616, São Leopoldo, foi criado pelo Decreto n9 4857, de 8 de fevereiro de 1954, com o nome de Ginásio Noturno de São Leopoldo. Foi transformado em Colégio Estadual pelo Decreto n9 7995, de 22 de julho de 1957. Por força do Decreto n9 9791, de 9 de dezembro de 1958, foi denominado Professor Pedro Schneider.
Até o ano de 1969 funcionou nos prédios do Grupo Escolar Visconde de São Leopoldo. Em 1970 transferiu-se para os atuais prédios.
Biografia do Professor Pedro Schneider.
Em Dois Irmãos, no dia 27 de dezembro de 1866, o casal de alemães Schneider via nascer um filho a quem deu o nome de Pedro. Sim, Pedro Schneider, patrono do nosso colégio.
Criança ainda, quando falou em ser padre, ouviu: - Tu não dás para os estudos!
Aos 9 anos, ele entrou para o Colégio Nossa Senhora da Conceição (onde hoje funciona a UNISINOS) que era dirigido por
jesuítas.
Era de profunda piedade, irrepreensível em seu comporta- mento e de aplicação a toda prova. Sabia granjear o respeito dos colegas e a estima dos mestres.
Em princípios de 1881, terminou os exames finais preparatórios, com distinção.
A seguir viajou pela primeira vez à Europa onde, em 11 de
abril de 1881, ingressou para o Noviciado da Companhia de Jesus, com apenas 14 anos. Fez seu noviciado na Holanda. Foram 4 anos de juniorado e mais 3 de Filosofia e Retórica.
Tornou-se ótimo latinista, em virtude de sua grande facilidade e pronunciada queda para o estudo de línguas.
Regressou para o Brasil em 1889, ano da proclamação da República e veio trabalhar em São Leopoldo como professor de Portuçuês no mesmo colégio em que fora aluno.
Publicou três livros didáticos no ano de 1893, a saber: "Livro de exercícios para aprender os elementos da gramática portuguesa"; "Gramática elementar prática da língua alemã"; "Livro de leitura alemã com vocabulário".
4
Em 30 de novembro de 1897, foi ordenado sacerdote e em 2 de fevereiro de 1900 uniu-se definitivamente à Companhia de Jesus. quando professou os votos solenes.
Durante 11 anos esteve no Colégio Conceição, lecionando português, literatura, grego, alemão, filosofia e apologética.
Em 1905 fez a sua segunda viagem à Europa. Em Portugal especializou-se em Camões e Filologia Portuguesa, - acontecimento raro para a época. Na Alemanha dedicou-se ao estudo de diversas línguas: árabe, sânscrito, tupi-guarani e antigos idiomas germânicos.
Em 1907, imprirne-se outro livro: "Sintaxe e Gramática Histórica da Língua Portuguesa", resultado de seus estudos feitos na Euorpa.
Em 1912, transferido para Pelotas, tornou-se Vice-Reitor do Ginásio Gonzaga. Com o sistema nervoso abalado, abandonou um pouco o magistério, ficando com algumas aulas de Estilística, História· Pátria e Língua Portuguesa, e dedicou-se mais ao trabalho de sacerdote, ocupando o cargo de capelão da Santa Casa.
Dirigiu, também, associações religiosas e, sendo excelente pregador, fez conferências em várias cidades do Estado e de Santa Catarina.
Em 1922, comemorou o jubileu de prata do seu sacerdócio. Nesta ocasião, notou-se que ele era benquisto, porque muitas pessoas lhe fizeram manifestações de simpatia.
Era de gênio sociável e expansivo. Foi um dos oradores mais brilhantes do Rio Grande do Sul, em sua época. Foi insuperável na catequese.
Em 1931, Pedro Schneider celebrou o seu jubileu de ouro na Companhia de Jesus, quando as associações religiosas que ele dirigia, deram-lhe de presente um bonito e valioso cálice.
No dia 17 de julho de 1931, a cidade de Pelotas chorou a morte dé Pedro Schneider e o Rio Grande do Sul perdeu um dos seus maiores filósofos e professores da língua portuguesa.
(Bibliografia: "Seleta P.S." de Prof. ·Pe. A Rabuske. S.J.).
5
Nome: Sônia Bemfica Bohrer.
Natural de São Leopoldo.
Cursou Geografia e História na Faculdade de Filosofia da PUC de Porto Alegre. Atualmente é Professora do "Pedrinho".
Seu amor às letras foi incentivado, na infância, pelo seu pai e mana Haydée, mais tarde por seu marido e filhos. Aplausos de colegas e amigos contribuíram para que continuasse a escrever.
RENASCER
O homem desperta Para o esplendor da vida, Quando vê o sol, Quando sente o Céu brilhante. Quando se sensibiliza com as cores No emaranhado dos tons. Quando mergulha no abismo dos sentimentos, Quando arranca de dentro de si mesmo
Uma chama, e arde e queima... E então nasce o poeta, o pintor, o artista Que, envolvido nos acordes cristalinos Ressonantes de beleza e vida, Leva mensagens vibrantes De sons, cores, entusiasmo E sonho ...
UM CANTO DE DOR
Um dia para sempre eu vou partir, Mas voltarei. As pedras que eu amei Rolarão para me encontrar E eu não verei. Os caminhos com as flores Que eu perdi Desabrocharão. Em todas as curvas Dos meus mundos Chorarei. Instantes inolvidáveis Fixarei.
E uma fresta de angústia Sentirei. E, então, dissolverei, E nunca mais ... O deserto espelhará a minha dor. Ao explodir o anseio do encontro, Quando as rosas reflorirem, Eu só, espacial e sonho, Acordarei para encontrar O canto de paz e amor Que já não é, Porque mudo tudo encontrarei...
6
UMA PAUSA NO ESPAÇO
Eu olho e vejo: (só o que eu quero ver) O mundo, O sol, A esperança, O amor, As estrelas ... O verde do mar e da floresta. A felicidade, O azul do céu, O colorido embriagante,.. A amizade que conforta, A música que transcende, A alegria quetransborda... Muita gente Querendo ser feliz. Outras Esperando a vida Passar ... A vida passando
E os sonhos voltando Na ilusão De·um novo dia. O sol aquecendo Os momentos de euforia. Inebriada Sinto a paisagem Que carrega tons Nunca sonhados. A imagem da vida Em contornos de esperanças... Muitas flores! Barcos, muitos barcos ... Mar imenso ... Um horizonte multicor, Um sonho... O alarido, efervescência, O entusiasmo e a alegria Da mocidade vivendo, Das crianças brincando Avida!
PARA MEDITAR
O tu, que vais passando, Pára! Olha! Quantas pessoas ao teu redor! Elas esperam um sorriso, um aperto de mão, Uma lembrança ... Dá o que puderes agora, Quando ainda estás vivo E elas também. Tem o prazer de dar, A alegría de fazer alguém Feliz.· Agora, neste instante. O presente é que vale
O passado não é nada. O futuro, quem sabe? Agora, neste minuto A vida é bela! Olha o céu: O céu é azul, O azul infinito ... As árvores, as folhas são verdes, Verdes de esperança! A terra é marron e lembra o Trabalho. Trabalho que dignifica. Participa da jornada Que, às vezes, é longa, Outras vezes tão curta
7
AS PEDRAS
Eu queria escrever nas pedras de todos os caminhos Para que todas as pessoas pudessem ver E quando o desespero as consumisse Minhas palavras trariam O sol com o calor-de um consolo A luminosidade de um bem querer O aconchego de um colóquio a dois A paz para nunca mais sofrer
A ilusão para olvidar o adeus As estrelas para fazer sonhar A compreensão para apagar a aridez do presente A alegria e o amor para afastar a solidão A felicidade para esquecer a dor O entusiasmo para divagar Uma grande força para continuar a viver ...
8
Mardilê Friedrich Fabre
Natural de Cachoeira do Sul. Licenciada em Letras Neolatinas, PUC. Professora no PEDAINHO desde 1966.
NO PARQUE
Trinados . Gorjeios . Pássaros no parque. Gritos . Risos . Crianças no parque. Sussurros . Suspiros .
Namorados no parque. Sabedoria ... Lembranças ... Velhos no parque. Solidão . Silêncio . Noite no parque.
DEUS EXISTE ?
Tristeza . Cansaço Peço e não sou atendida. Pergunto e não obtenho resposta. Confusão na minha mente. Deus existe? E há resposta para esta pergunta? Se não existisse Deus, Haveria flores? Crianças? Chuva? Sol? Se não existisse Deus,
Haveria amizade? Gratidão? Bondade? Amor? Se não existisse Deus, Haveria risos? Lágrimas? Se não existisse Deus. Haveria VIDA? MORTE? Descoberta ... Alegria ... DEUS EXISTE.
9
Elvira Coelho Hoffmann
Nascida em Santo Angelo (RS).
formada em Letras Português-Francês pela antiga Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São Leopoldo (1967).
Professora de Português no Pedrinho desde 1968.
METAMORFOSE
De uma flor
sensível ao gelo dos silêncios
ao calor do ódio sem limites
Maceraram as viçosas pétalas
Para viver o perfume
E haurir a doçura ingênua e colorida.
Então quebrou-se a haste
Para sentir o ruído da Morte.
Mas a flor,
Ferida até o fundo, resistiu.
E hoje protesta
Transmudada em cacto.
CRONICA
Muita gente me tem dito que sente tristeza quando chega a noite de Natal. Eu não conseguia compreender a razão de tal sentimento. Hoje, sim. E já explico.
Quando criança, era com verdadeira ansiedade que via entrar o mês de dezembro. Na verdade, o Natal de consumo bem pouco me atingia. Quando a noite se aproximava, no dia 24, ficava olhando o céu tropical que lentamente esmaecia. Então, não era mais no quintal de casa que me sentava. A visão daquele céu, de um azul matizado de verde e rosa, sempre me levou ao Oriente. Ao Oriente mágico das mesquitas, dos muezins e da música melancólica e doce que só meus ouvidos captavam.
Sem esforço chegava à beira do deserto e contemplava as brancas cidadezinhas, os ásperos caminhos e uma tranqüila manjedoura iluminada pelo brilho da Estrela. Em espírito e com os olhos da imaginação, sempre me sentia privilegiada porque O via nascer - no meio agora de um silêncio tão grande, que a própria abóbada celeste parecia se curvar para escutar-Lhe os primeiros vagidos.
E quando despertava de sonhar acordada, trazia os olhos cheios
de estrelas...
10
Isto quando era criança e o Papai Noel. um velhinho místico que não me assombrava. Guiava uma charrete cheia de brinquedos pelas - ruas sonolentas, seguido pelos gritos da criançada a qual, entre atemorizada e curiosa, recebia os presentes.
Até que, um dia, alguém me disse que ele não existia ... e como pudera uma guria ser tão tola. a ponto de crer nas mentiras de meus pais? Chorei em desespero, uma vez que eu QUERIA acreditar. Contudo, a adolescência já se insinuava em meu corpo com suas inquietudes inexplicáveis - e a lógica implacável da razão me obrigou a aceitar o que o coração rejeitava. E o Velhinho, em lenta agonia, também morreu...
Tanta gente me dizia que o Natal é triste - eu não conseguia
compreender o motivo. Hoje eu sei.
É que a nostalgia evoca a infância feliz e despreocupada, quando éramos unidos e, mais ainda na noite de Natal. Trazia dentro do peito a segurança de nos termos juntos, uns aos outros, presos pelo carinho e pela afeição, olhando-nos bem nos olhos. abraçando-nos com efusão.
Suave era a minha infância, sólidos os entes a quem amava. Eu lhes quero ainda mais, agora que já não são sólidos e a maturidade chegou de vez.
Dos momentos mágicos daqueles tempos, só me restam os olhos cheios de estrelas. tão grandes, tão brilhantes que se desfazem em lágrimas de saudade ...
11
Fábio José Martins Fleck
Natural de São Leopoldo.
Estuda desde a 1 ª série no PEDRINHO, cursando a 3ª série do II Grau.
É um dos componentes do Conjunto Flor de Cactus
PÁSSARO VOA
Pássaro voa, lento
pelo céu azul.
E voa, e voa
em busca de paz ...
Eu queria ser como ele,
leve e solto no ar.
Andar pelas nuvens
e cantar, e cantar.
Mas, não é fácil,
Mas não é fácil sonhar ...
Pássaro voa, lento ...
E ele segue voando,
sempre à frente, cada vez mais.
Suas asas batem e batem
numa luta em pleno ar.
Pois, nãoé fácil,
pois, não é fácil aceitar ...
Pássaro voa, lento ...
O vento traz as palavras
de uma vida um pouco melhor.
Seus olhos fitam o espaço
infinito ao seu redor.
Mas, não é fácil,
mas não é fácil encontrar ...
Pássaro voa, lento...
Lá de cima, este mundo
lhe parece sucumbir
12
e entre fogo e h.rnaça
e a cinza que há de vir.
E não é fácil,
e não é fácil fugir ...
Pássaro voa, lento ...
Pássaro, Pássaro, voa pelos ares.
Pássaro, Pássaro, o que será de nós?
O teu olhar. a tua voz se confundem num só grito
e os teus ouvidos, e os teus sentidos
não querem mais ouvir ...
13
Rosane Martins Fleck
Natural de São Leopoldo.
Atualmente está cursando a 2ª série do li Grau.
Além de crônicas e poesias. escreve contos.
SEMENTE
Semente alheia que na terra cresce,
Semente pura que veio do mar,
Semente negra que à terra desce,
Semente amada quero te olhar.
Semente preta que me faz dormir,
Semente ingrata que me faz amar,
Semente triste que faz surgir,
Semente minha na beira do mar.
O QUE t VOAR?
"Dizem que Voar é com os Pássaros".
Voar é sentir o ar nos segurando,
Voar é planar no espaço, planando ...
Voar é olhar para baixo das nuvens
E ver o povo lá embaixo, caminhando ...
Voar é sentir as alturas nos perfumando,
Voar é bater asas, planar amando...
ESTRELAS MORENAS
Carreguei no meu colo milhões de estrelas. Todas lustrosas, colossais. Andei de verão a inverno vazio, com meu colo cheio de estrelas. Olhei para o vácuo e percebi ilusão, cercada de ilusão.
Acendi minha mente com a luz das estrelas, peguei no meu sono anormal. Acendi minha alma, com luz sern igual, e assim distingui tanta coisa. Aprendi a dizer tudo o que se deve dizer, e na hora certa de se dizer.
Estrelas morenas, mamães dos meus ais, soberanas astrais, cuidem de mim. Sou tão pequenina, mulher e menina, não sei o que se
14
passa em mim. Não deixem o arrependimento chegar perto de mim. Eu
tenho receio, tenho medo. Brilhem suas luzes, estrelas morenas.
famintas de boas ações. Dediquem as suas vidas ao documento vital
alheio. Partilhem o bem comigo.
FAUSTO DESEJO SONHADO
Hoje eu me senti como borboleta. Voava a certas alturas maravilhosas. Era tão colorida, tão jovem. Era despreocupada e feliz.
Somente- conhecia a mim e o céu, sem falar nas flores em que pouse1.
Saía e voltava, voava e voava, na hora em que mais desejasse. Olhei a imensidão tão soberbamente. Batia minhas asas docemente.
Lá embaixo, o pessoal. Era tudo tão igual. Somente eu me
sobressaía feliz. Músicas e risadas ouvia ao longe. Um novo mundo criei. Tomei um rumo distante. E cheguei a cumprimentar o desconhecido.
Pousava em tantas flores. Falava com outras borboletas. E com elas para bem longe voei. O vento já havia virado música. A6 escutar muitas músicas dancei. Dançava tão docemente. Tantos tipos de música escutei.
Possuíam minhas asas um amarelo, o mais bonito tom de todo o Universo. Elas eram borboletas de marrem. Sem falar nas pintinhas de mil cores, que manchavam o fundo amarelo.
Era tão livre, era tão level Era despreocupada e feliz.
Somente conhecia a mim e ao céu. Sem falar nas flores em que pousei.
Saía e voltava, voava e voava. Batia minhas asas docemente.
Tudo se tornou diferente. A tristeza havia saído de férias.
Comigo só voaram bons sentimentos e a feliz sensação de liberdade.
CHEGADA DA NOITE
Desce o céu escuro, lá do céu das vidas, sem fazer barulho, sem
marcar saída.
Canta a nuvem calma.
Talvez vá chover. E os pingos da água, hão de na terra bater
15
Penso nas estrelas que não apareceram. Ou estavam cansadas, ou
se esqueceram.
Bate o vento jovem, não está cansado.
Faz com que me lembre o que havia sonhado. Até mesmo a lua não
apareceu. Ficou com muito medo e se escondeu.
Uma música começa lentamente a ser tocada.
Ela veio enfeitar a fria madrugada.
O TORPEDO DA LUA
A noite caiu e meus olhos elevaram-se até a lua ... Ela estava numa figuração estonteante. O vento a açoitava com força e com raiva. Parecia querer mandá-la embora.
A raiva do vento parou e novas formas fizeram-se em frente da lua. Eram pretas e macias. Carregavam umidade, jogavam zombarias.
A lua estava somente com um pedaço da cara redonda de fora. Senti-a tão romântica e tão sozinha... Embora sua alegre face tornasse a aparecer, eu ainda a senti teimosa e só.
Subitamente fechei um olho e a vi sendo ultrapassada por um lacrimejante senso de tristeza. Vi-a parada e tranqüila, arrebatada por um torpedo de histórias. Em sua mente, desenrolam-se filmes de cenas macias e risos estonteantes. Há apenas um clarão a cobrir-lhe a suave limpidez.
Seu torpedo gruda-se a uma era imaginária que faz parte do meu sonho. Torna-se quadrada. Estúpida. "Não tomes decisões sem antes consultares teu torpedo."
Acendeu-se em um minuto o clarão de seu torpedo. E o seu doce desejo de descer até o chão, clareou o meu sonho ...
Nada pediu a ninguém e, por isso, a ninguém deve nada.
Abri meu outro olho. Novo ângulo apareceu.
Vi a lua e seu torpedo, conversando num mundo que não era o meu.
16
AMANHÃ, TALVEZ ...
Hoje eu pensei que as rosas não mais existiam. que os pássaros não mais cantavam. Na tarde quente eu não vi as borboletas amarelas.
Hoje eu não notei a criança que por mim passava.
Estava muda como uma pedra, estava fria como um poço fundo.
Não fiz como a fonte que canta. Não fiz como as plantas que riem quando o vento lhes toca as faces.
Hoje pareci um ninho de pássaros, esquecido, abandonado pelos que partiram em revoada.
Fiz como os espinhos, que ferem, mas sem uma intenção a mais do que o sentimento de defesa.
Hoje eu não senti o sol. não senti a lua descer suas escadas e bailar no espaço.
Hoje eu não vi o riso nos lábios de quem passava.
Hoje eu não vi o amor, tocante e profundo passar pelos olhos de um vagabundo que ama a vida e que traz a felicidade escondida em sua roupa suja.
Hoje eu só vi lutos. gente enojada, assim como eu, como tu.
Hoje não cantei como o vento e nem sorri como as plantas.
Hoje eu chorei como as cascatas vestidas de noiva e sem um companheiro.
Hoje eu não li: "Liberdade Acima de Tudo".
Hoje eu estava sem passado, sem tempo de pensar no futuro.
Hoje eu fui botão-de-rosa, sem cor, sem brilho. sem gota-d'água.
Hoje eu não vi o que deve ter sido belo.
Amanhã, talvez...
17
Sandra Fogaça
Natural de São Leopoldo, está cursando a 1 ª série do II Grau.
MEU ESCONDERIJO FAVORITO
Meu esconderijo sou eu. Quando alguma coisa sai errada, me escondo dentro de mim.
Se minha mãe reclama da cama desarrumada, se a Toti grita, quando estou estudando, se a Pati perde uma bijuteria minha ou se meu namorado não é pontual, me zango e me escondo dentro de mim.
Lá dentro do meu esconderijo, é escuro e abandonado. Ninguém entra e ninguém sai além de mim. Lá eu choro e ninguém escuta meus soluços, lá eu rio e ninguém ouve meu riso. Lá não há janelas e muito menos portas. Ë pequeno e isolado. Perdido e sufocado.
Quase sempre estou no esconderijo. É preciso que algo de muito importante aconteça, para que eu saia de lá e venha para cá.
Talvez eu goste do meu esconderijo, porque ele não fala, não ouve, não vê, não sente. Assim ele não vê como estou ou se estou: alegre ou triste, doente ou sadia.
O que sei é que gosto dele. Ele é imparcial, indiferente.
Se me escondo, ninguém nota. Estou aqui, não estou? Não estou não. Estou no esconderijo.
Lá não sinto cheiro, nem gosto. Se me escondo, não grito, não emudeço. Fico.
Se chove não me molho, se faz sol, não me queimo, porque estou no esconderijo. Ele não é colorido e muito menos incolor. Ele não é um quadrado, mas não me pergunte se é redondo. Eu não sei responder.
Ele é a única coisa que tenho que é só minha.
Ninguém vê, ninguém toca nele. Só eu.
Se ele é velho e sujo ou novo e limpo não importa. Ele é meu.
Ele não fala, mas, muitas vezes, me chama. Não tem membros, mas, muitas vezes, me puxa.
Entristeço-me, quando o deixo, e alegro-me, quando volto.
Além de tudo, ele é meu. Não comprei e não roubei e ele é meu.
Nunca vou perdê-lo e nunca o ganhei.
Não o descobri, ele é que me achou
18
Neiron Rodrigues Marques
Natural de Cachoeira do Sul. Cursa a 1 ~ série do li Grau.
LUTA
Queria apenas conhecer a mim mesmo.
Por que me era isso tão difícil?
Bem, hoje me conheci e ...
Assim termina a história:
Quem eu sou?
Na verdade, este não é o fim.
Não há fim para os sonhos.
Não há fim para a luta, tampouco
Na medida em que os sonhos
Ultrapassam a liberdade para a realidade.
O verdadeiro fim se esconde num futuro distante.
Mas de algumas coisas estou certo:
Continuarei crescendo e mudando,
Porque parar de crescer e mudar
É começar a morrer.
Compreendo o perigo de elevar-me
Às grandes alturas.
Posso escorregar e cair e tenho, de qualquer forma,
Que tentar manter a minha vida.
Para muitos inútil... e para mim tão cara!
Essa perspectiva não é o que mais me atemoriza.
Até certo ponto não há dúvida de que
Terei de enfrentar outra época de adversidades.
Quando ela vier, lutarei contra elas,
Assim como lutei contra o meu corpo prejudicado ...
E vencerei ... saberei vencer.
Aprendi numa escoìa difícil
Umareqra essencial da existência humana:
Para se ter ... somos obrigados a dar.
Espero lutar pelo resto da minha vida,
Pors só assim darei algo.
Tudo que peço é o direito de lutar.
19
VAZIO ... SAUDADE ...
Passos lentos, compassados. procurando
terra firme, parelha, fazendo o mínimo
de ruído possível, para não
quebrar o encanto do pensamento.
Sento-me.
Cabeça semibaixa, olhar fixo no papel,
o cérebro martela, pensa em tudo. pensa em nada.
Apenas o vazio ... vazio que imobiliza,
vazio de carinho, de amor, de palavras.
De palavras da pessoa amada, que parece
longe, muito distante, intocável.
A mão agora escreve.
A cabeça nem precisa pensar.
as palavras saem com naturalidade.
O que poderá ser isto? ... Saudade?
Sim, saudade de um certo longo olhar,
saudade de um gesto, de um sorriso.
Saudade é o que sinto agora.
O coração bate oprimido.
Sua pulsação parece acompanhar
o movimento lento das mãos,
uma, que escreve, outra, que segura o cigarro.
O cigarro chega ao fim,
a saudade continua.
O vazio é constante.
20
Nome: Lindemberg de Rezende Miranda.
Natural de Lagoa da Prata(MG).
Estuda no "Pedrinho", 2' série do li grau.
Algumas de suas caracteristicas: Tem fé em Deus, no destino, no
merecer sem exigências, mesmo que a recompensa venha depois de
morte e crê que a exceção é a substância de todas as coisas.
Faz poesia, música e canto.
MINUTOS SÃO FLORES DAS HORAS
Nas tardes de inverno, eu relembro
Sensações frias e gostosas;
O fogão de lenha me aquecendo
Oh! horas afetuosas ...
Eu nem sentia o tempo passando por cima de mim.
Os minutos eram flores num jardim
Que era horas sem fim
Pintadas de lilás e carmim, todas as cores, enfim!
Tinha perpétua, jasmim, todas as flores enfim!
Tudo era um todo de marfim
Eu ficava feliz de saber que vim
A este mundo ruim.
E pode ser que ainda os minutos sejam flores das horas,
E as horas jardins dos dias - só poderia!
Mas ...
Os minutos ainda são flores das horas atuais
- Flores artificiais!
São flores artificiais!
Nada mais,
Já é demais!
INCAPAZ
O tempo faz î empesta des, mas Não é capaz De trazer. Não traz O que ficou atrás Duma foto, cartaz
Que na parede jaz Num ar frio, falaz; Lutador pela paz, Que morreu sem gás Na tempestade que faz O tempo incapaz.
21
PENSAR
Pensa se vale a pena pensar...
Talvez um pensamento realizável
Não é pensar sonhando - é pensar algo acreditável!
Pensar se os animais pensami
Penso que um pensamento eles não dispensam.
Talvez seja eu que não pense, mas penso que penso.
Mas pensar não é o que penso,
Pensamento é algo mais intenso, mais denso:
Penso que o meu pensamento é o instinto contraído,
Ë a minha indistinta libido.
Quem pensa é só uma ilusão pensada?
E os animais se iludem com um pensamento de nada,
Ou nada pensam de uma ilusão necessária?
Pensam·que pensar é coisa voluntária,
Ë ser indócil como um animal fóssil.
Mas se a personalidade é o ego,
Dor que, personalizando, me torno cego?
Deve ser porque sou um pequeno pensador
Que nem pensando se esquece da dor.
Aquela dor de impor a si mesmo pensamentos
Que consistem em nada mais que eventos.
Mas com que os animais pensam sonhar
Ou em que sonham pensar?
E será que eles pensam que eu penso
Que eles pensam?
22
EXCETO AS EXCEÇÕES
Basta de tomar a sociedade como fixo ponto de comparação! Tudo que deve e precisa ser compreendido não compete ao que é aceito pela sociedade julgar. Agora não é tempo, nunca foi tempo de tudo obedecer a regras, leis que nem sempre distinguem a justiça - escassa, rara! É certo que deve haver regras, não nas mãos desta ou daquela pessoa - mas nas mãos de todas!
A razão não tem proprietário, ela é de quem simplesmente existe e apelar para julgamentos· não é o ideal. Ora, ninguém sabe julgar, nenhum humano sabe, por isso Deus é sobre-humano, extra-humano ...
Foi justamente a partir dessa referência a Deus. que o tempo mudou, esvaziando todo o vácuo impregnado de idéias vazias da mente das pessoas ali presentes, em plena praça pública, ouvindo tudo que um desconhecido dizia, até que este percebeu que a semente havia germinado. E breve um voluntário floresceu em flores frias, porém perfeitas e belas ...
Eu tenho que dizer que, agora, nada tenho como prova de que sou· inocente, como se não valesse a pena ser inocente... E eu não posso determinar o dia em que a justiça prova que não falha. Ela e Deus devem saber até quando tardar.
Homem, as nossas raízes é que são imperfeitas, defeituosas ... É nelas que está o mal, o erro... Chega! Não tenho que referir ao homem em geral, quando falo sobre o mal. Não tenho que falar, não tenho que proferir ... Não sou profeta! Para que botar a "boca no mundo", se ele não pode me ouvir? ....
Logo que este se fez mudo, um outro desabrochou em tamanha espontaneidade!
Aqui estou, mesmo que esteja lá ao mesmo tempo... Espíritos estão compartilhando corpos ou não, como o meu. As pessoas tentam compreender algo fácil, não o essencial. Aqui é assim, desta forma. Todos têm que recebê-la toda, suas condições. Talvez seja uma atitude direita, mas não a perfeita, a melhor.
Aqui, não há um único ser ou todo único ser é uma sociedade. A exceção não pode ser utilizada agora. Ninguém admite ou não pode admitir. Algo raro deve ser desconhecido, pois causa dúvidas. Dúvidas são medo - perigo! E, na maioria das vezes, as pessoas preferem pensar no raro como algo. errado. Nada de problemas! Que problemas? Há muitos ... Então. homem, mate-os, afaste-os; problemas, dúvidas, diferenças, excepcionalidades, exceções e tudo da espécie. fncompreenda-os!
Des preze-os I Esqueça-os!
23
Algumas pessoas pensam que é esta a solução. Não! Elas não pensam isto. Elas não sabem o que pensar, elas não pensam. Elas não sabem como saber o que deve ser sabido. Então, podem ser transforma- das. ajudadas! Elas são boas, sentem algo, são pessoas e pessoas sentem e pessoas estão aqui! Eu estou ausente, mas tento estar com elas, ' juntamente com Deus.
- Deus, elas nos precisam! Nós podemos ajudá-las a nos amari. Elas nos amam e, de qualquer forma, fiquemos aqui, nunca ausentes! Tentemos pelo menos ...
Cada botão de flor que desabrocha diz:
- "Mundo, Deus existe!" Contudo. as pessoas não ouvem ...
Exceto as exceções I
QUANDO O INF.ERNO EXISTE
A mente transborda,
O ódio ferve frio.
A coerência discorda
, Da exceção, seu desvio.
A memória incompatível
Com o objeto orgulho
Faz tão imprescindível
O grito do barulho!
E os prédios da arrogância
Entram em incêndio ufano
O incêndio avança
No combustível desumano.
Estraçalham carnes mórbidas
Na eufórica erosão;
Suas naturezas sórdidas
Em corrosiva corrupção.
Baixa o pano do cenário!
Ë o fim da peça despedaçada,
Agora sabem: o mundo é originário
Duma história inventada!
24
-José Fernando Lacerda d'Ávila - Nando d'Ávila - nasceu em São Leopoldo, tendo cursado o científico no Colégio Estadual Professor Pedro Schneider, nos anos de 1971, 1972 e 1973. Em 1974 ingressou na Unisinos, onde atualmente está se especializando em "jornalismo". Neste ramo, trabalha no jornal "Vale do Sinos" há dois anos e meio na editoria de política. Os poemas contidos neste livro, é bom salientar, são todos letras de músicas compostas por Nando. Como compositor,
Nando tem feito diversas apresentações no Rio Grandb do Sul, e duas músicas suas - "Água Benta" e "Como Relâmpago no Céu", com as letras neste livreto estão contidas no LP "Paralelo 30", lançado pela gravadora ISAEC em junho passado.
CRUZEIRO DO SUL
(O poema busca, mais uma vez com utilização de imagens gaúchas,
expressar a busca do autor de um lugar de paz simbolicamente
localizado nos Aparados da Serra gaúcha)
Rubro céu da minha tristeza
Eu quero as noites mais azuis, azuis,
Desbotando em branco nas coxilhas.
Ser minuano, só saber seguir
Na minha eterna nave Cruzeiro do Sul,
Cruzeiro do sol, Cruzeiro do Sul.
Solitária e árida e sólida manhã
Ferida face, roída espera,
Pó de ouro é teu suor,
Dó sem dono pelo ar...
Eu quero as noites mais azuis, azuis,
Desbotando em branco nas coxilhas.
Provar o dano, mas daqui partir
Para os Aparados da Serra do céu
Da serra do sul, da Serra do Mar.
ÁGUA BENTA
(Traçando um paralelo entre o passado - a infância - e o presente. o
autor procura mostrar sua compreensão atua! de vida)
Nunca me sentei no canto lado a lado ao fogão
Deixando a chama do tempo clarear a solidão.
25
Nunca fui senão o filho que um dia ia saber
Que mais quente é a chama que definha pela mão.
Nunca dei a outra face sem em frente ter meu pão
Se fazendo ele ausente, me servisse a explicação
Nunca fui senão menino que um dia ia crescer
E calar-me sobre a mesa lamentando o meu quinhão.
Nunca soube por que o pranto em minha mãe não deu vazão
Se esta é a roupa que envolve qualquer resignação
Nunca fui senão o fruto que um dia ia saber
Que mais benta é a água que alaga o coração.
COMO RELÂMPAGO NO CEU
(O poema busca recriar, dentro de uma linguagem que tenta aproximar-
se da de Simões Lopes Netto, sentimentos de amor e solidão)
Co'aquela manga de chuva
Me perdi do meu amor.
Hora e meia faz que o dia
Lá no pátio clareou,
Mas 'inda assim de estrelas
O meu peito madrugado
Ai, saudade ... ai, sumidouro ...
Choro seco e calado ...
Eu arei pro meu destino
Sete quadras de alegria
Plantei sonho em sol a pino
Deu só pé de ventania
E no fruto que era o vento
Espreitei maduro dia
Bicho-triste deu por dentro
Enquanto meu bem dormia.
Como relâmpago no céu é chuva na terra
Cá dentro deste peito "cabe" eu e ela (cabemos)
Como relâmpago no céu.
26
BÊ-A-BA
(Crítica à moral burguesa dos tempos atuais, no tocante à família)
Este menino já está bem crescido,
Parecido corn o pai no tempo de vida ganhar,
Já está tirano corno água no cano
Lá e cá no cotidiano, em qualquer lugar.
Já percebeu que na porta de cima
Sempre se bate corn o devido respeito
E que na porta de baixo se bate, se late
Se entra de qualquer jeito.
Sempre a fulana, sempre a beltrana,
Nunca a mana, que essa, oh!, é artigo de luxo!
Mas se o amigo puxa o pano, desvendando o embrulho,
Ela é do barulho, também corre no cano.
Este menino, manjo, está bem crescido
Garantido qual urn anjo, tem ex-voto preventivo.
Tá prestativo qual anel de diamante
Anda todo cintilante, cheio de motivos.
O amor da irmã mais nova grita calado,
A mãe é o bê-á-bá da boa postura.
Pregada na parede tal qual urna ilha
A família segue unida pela moldura.
Que doçura! (Que loucura!)
CANTO CISPLA TINO
(Espécie de ode às terras que se situam acima do Rio da Prata. É urn
"canto da terra", utilizando imagens dos pampas principalmente)
Cisplatina e verde terra, terra,
Tuas sangas sujas sangram, secam
E os homens de preto laçam, levam
As manadas mortas trotam, berram.
Cisplatino e verde pampa,
Teus trigais navegam ouro,
Parreirais na serra vazam
Vinhos sobre as mesas ...
27
Sentinela atenta. quero-quero
Que o minuano conte lendas, casos.
Mas de açoite a noite venta. nega. vinga, cega...
Cisplatino e verde canto
Solto nesta ronda alta
Vultos pela madrugada
Charruas que a geada acordou ...
SETE POVOS DAS MISSÕES
(Poema épico sobre a plenitude, a destruição e o presente fantasmagóri-
co dos Sete Povos das Missões edificadas pelos Jesuítas e guaranis em
nosso Estado. A expressão "pay", no final de algumas frases quer dizer,
em guarani: o principal, o melhor, etc...)
Siete tentá de las missiones pay...
Neste oriental latino chão
Um favo igual de guaranis cristalizou cristã nação.
Sete certezas de pedra perdidas no tempo,
Flechas lançadas do arco da plena igualdade.
Siete tentá de las missiones pay.
Y era in nombre de Dios y el Rey
La futura cicatriz
E era em fogo cego a lei pelas penas dos fuzis
E foi povo bronze ao chão
Branco brado pelo ar.
E foi luso solo ser pela posse e o poder
Siete tentá de las missiones guarani.
Cativo irmão, nas Reduções
M inuanos são teus ancestrais
Que guardam na palma da mão
Nativa alma de algodão.
Sete angústias de pedra mais fortes que o tempo
Setas no rumo da aurora da fraternidade
Siete tentá de las missiones pay
Siete tentá, tentar, tentar, tentar
28
Nome: Milton Bender
Natural de Marcelino Ramos (RS). Estudou no "Pedrinho" de 1971 a 1974, onde cursou o colegial (li Grau).
Cursa Direito e Comunicação Social na Unisinos. Trabalha no Jornal Vale do Sinos há três anos onde já atuou como
repórter e posteriormente publicitário. Atualmente exerce as funções de gerente-adjunto e responsável pelo noticiário econômico.
POEMA URBANO
Quis fazer um poema.
Procurou as pessoas:
Tinham seu tempo recrutado.
Procurou arniqos:
Não sabiam que existiam.
Procurou uma mulher:
Ela não sabia que tinha amor.
Procurou uma árvore:
Estava podada pelos edifícios.
Caminhou.
Correu dos cartazes:
Queriam artificializá-lo.
Parou nos faróis tristes dos automóveis:
Fugiu dos seus rugidos.
Extraviado,
saiu beiradeando a calçada
e a vida,
redescobrindo
que era uma avulsa fantasia
de uma coleção de ilusões.
Era nada.
Somente do nada
póde fazer seu poema.
Ficou um poema
sem rimas,
sem romantismo,
sem poesia,
sem nada.
E. assim, ficou tão triste
quanto sempre fora.
29
CASO COMUM DE AMOR
Depois de passar o dia amortizado atrás de uma calculadora, buscando a precisão total, numa técnica absoluta, sair nesta noite para rever um amor arquivado nas paredes do tempo, mas registrado no seu olhar - pensa o homem - é o mesmo que "prirnaverizar meu peito, orvalhar minhas asas." Mas ficar submerso nesta poltrona, afundado na televisão, é compassar com o estado do mundo.
Parado na fumaça do cigarro, que se rarefaz como a sua imagem de exemplar cúmplice de uma organização tecnocrata, o homem veste-se de uma esperança já aposentada e sai.
Ao fechar o carro, olha o edifício e pensa voltar. Neste amor vou-me alastrar numa teia de sonhos. Mas sobe, como a borboleta que retorna ao fogo para novamente queimar as asas.
Quando ela abre a porta, como um aprendiz, ele sente o estômago congestionado. Mas a emoção o cimenta no corredor e a ânsia de vida o joga nos seus braços e o faz aportar nos seus lábios.
Nos andaimes da noite um pote de ilusões represadas nos muros do dia, começam a vazar do seu coração da mesma forma que o uísque alaga sua garganta.
O sorriso branco, o olhar desenevoado, os braços seguros da mulher deixam-no ingovernável. Nem parece o mesmo homem, plissado pelo pragmatismo da organização que decota seus pensamentos, assim como ele se afoga_ em . incontáveis cafezinhos e se sufoca em outros tantos cigarros. Até atreve-se a falar da esterilidade do mundo, da opressão dos números que obturam seu rosto, dos poderes que amassam sua cabeça, da ausência teimosa das pessoas que existem e não sabem.
Sorrateiros, seus olhos brilham. Descobre que existe.
No hálito da madrugada atravessa a vida. Navega no ventre daquele amor. Perde-se nos seus seios. E ancora nos seus lábios. Como navegador corsário, acaba de filar da vida um resto de felicidade.
Um severo acorde da aurora aliado ao último gole de uísque começa a abalroar os pensamentos noturnos, descarrilados.
Vai-se, deixando pendurado na porta uma lágrima vertendo saudade. Saudade daquele amor. Saudade de ter se sentido vivo.
30
Na rua, desenternece-se. Alfandega-se em seu corpo. E, com sua armadura, blinda-se do homem que estava dentro de si.
Refugia-se outra vez atrás da calculadora, garimpando uma razão para sonegar que existe. Uma razão para confirmar que apenas está aí. Só e sem desculpas.
31
Adroaldo Diesel Filho
Natural de Porto Alegre
Aluno do Pedrinho de 1965a 1971
Estudante de Comunicação Social na Unisinos
Secretário de Redação da Revista Rua Grande
TARDE DE CHUVA
Foi servida a sobremesa e as nuvens, que suspiravam com ansiedade pelo seu momento de ação, receberam o aviso final: mais uma tarde de chuva. E esta não tardou. Ainda suspirando em trovões veio atrapalhar os operários apressados, atucanar mães na busca alucinada de abrigo para que seus filhos fossem ao colégio. Mas eu, de ruim só, só pensava.
Pensar, com as asas amarrotadas por gotas inescrupulosas que jamais se perguntaram por onde deveriam andar. Não é como em um dia de sol, quando o pensamento alcança a atmosfera na sua última camada: a ficção. Em tarde de chuva, apenas é permitido atingi~. a camada poluída da realidade do mundo. Nem o jogo de cartas, nem a leitura amena, nem mesmo o filme "água com açúcar," nem nada pode ocultar o nosso mais recôndito pecado.
Na agonia da alma descoberta foi passando a tarde e com ela os derradeiros instantes do dia. E, se cada dia é viver de novo, o que vivi hoje? Nada mais fiz do que rebentar cicatrizes, nas quais não deveria ter ousado tocar. Mas a culpa foi da chuva, cúmplice dos meus atos. Estivesse ausente e teria fugido com pensamentos despreocupados.
Contudo, cessem por um momento os trovões. deixem-me um pouco, pois percebo que há algo de salvador. Claro, se eu não fosse assim errado, essa chuva poderia ser fértil a agradáveis recordações, parece que seria melhor se cuidasse mais de mim antes da acusação.
Porém, agora a tarde e a chuva já me abandonaram. Restou somente o consolo de que outras tardes de chuva virão, e quiçá melhor poderei consumi-las.
32
Nome: Carlos Alberto Nunes
Natural de São Sebastião do Cai-BS.
Estudou no "Pedrin ho" de 1970 a 1976.
Atividades atuais: Estuda Jornalismo na Unisinos.
Leciona no supletivo.
É revisor da Rotermund S/ A.
O PREÇO pr NÃO SER
Havia um silêncio em meu quarto.
no corredor, ali, um aplto:
seria o trem, o trem. o trem,
ou do foguista um grito?
E os trilhos iam sumindo
até que a porta se abrisse,
não era trem, mas um grilo
e a minha meninice.
Não havia sequer um foguista,
nem maquinista, nem vagões sem fim.
Para imaginar coisas sem vida,
foi prá isso (foi?) que eu vim?
Deixei que o grilo entrasse, indiferente.
com seu jeito mórbido;
por não ser nem trem. nem foguista,
piquei-o todo, de ódio...
VOSSOS SACRIFÍCIOS
Lamento
e vos digo que lamento
não poderdes ser vossos sonhos,
vossos risos,
vossos prantos,
não poderdes ter vossos encantos,
não poderdes cantar vossos cantos,
não poderdes gritar com a voz sem poeira.
33
Lamento
e vos digo com certeza,
não poderdes escrever vossas linhas,
vossas idéias,
vossas súplicas.
Lamento por vossas turvações
cerebrais.
Sinto não poderdes lavrar vossa terra,
vosso pao,
vossa serra,
sem que interfira a mão injusta.
Lamento serdes tão promíscuos,
tão submissos e orgulhos ao mesmo tempo.
Lamento porque dais o exemplo
para os filhos do meu lamento.
LÁ VEM A VIDA
Lá vem a vida,
vem a vida
com seu todo sádico,
seu jeito trágico,
seu cantar menor.
Lá vem a vida
com seu corpo sujo,
e eu espero a vida
com meu corpo imóvel,
com meu jeito instável
e com meu tempo escasso.
Lá vem a vida,
e eu espero quieto,
eu espero a vida
com 'tenção de ter,
porque vem a vida
cujo real é sonho,
cujo jeito é mágico,
e eu nao posso ser.
34
Lá vem a vida
e eu aguardo triste.
porque sei da morte
que não vou querer.
ASSIM TÃO Só...
A janela estava assim aberta,
assim tão livre.
assim tão única.
que não mais pude evitar a noite
assim tão calma,
assim tão pura,
que pouco. então, tive alerta,
assim tão cheia,
assim tão nua
a minha maior vontade de amar ...
assim tão verdadeiramente.
A janela estava, estava aberta
assim tão grande.
assim tão viva,
que entrou a rua, entrou o céu, a lua
assim tão crua.
assim tão bela,
que mais chorei, chorei tão triste,
assim tão má,
assim tão ela,
pois mais corri a fechá-la, com dó
assim tão forte.
assim tão dó,
que mais fiquei dentro de mim mesmo
assim tão só...
RUA PEQUENINA
A rua é pequenina,
onde mora uma pequena
menina,
onde vive um tempo morto,
onde chora a velha sina.
35
A rua rói a rotina,
murcha o vento
na colina
que se vê daquela rua,
de tão velha. pequenina.
E a estrelinha lá brilhante,
linda. leve,
pregada lá em cima,
não conhece aqui na terra
a minha rua pequenina.
E SE DEUS ESTIVER NO TEU CORPO?
O caminho é triste, o fim incerto, distante a vida, perto a morte. o certo de saber se chorar ou não chorar diante de Deus. Pois que está Deus na vidraça, na nuvem, na praça, sabe-se lá se não está na gaveta. na corta, na rua viva de gente morta ... Pois se está Deus na vingança, no amor, na futilidade, e não sabemos. Ou somos os mais desgraçados do caminho triste?
Pois se estará Deus na tristeza que caminha conosco, na própria sombra, que respira o mesmo ar, que come nosso alimento. Pois se estará Deus no tempo indefinido, incompleto, calado como o reflexo, que passa sem deixar rastros, simplesmente pelo hábito de passar... Pois se estará Deus no teu seio, quando o descobres, ou no meio do teu choro feito de desajustes sintéticos ... Ou estará Deus comigo, vestido com teu corpo ... ?
VERBOS INVERSOS
O pretérito que é mais que perfeito traz futuro pouco indicativo;
- haverá, haverá um motivo prá ser o que não aceito?
36
Calma a covardia acreditada nos mais tristes, nos mais leves. pobre gente de tempo breve, que de vida é quase nada. Submissos antes que subjuntivos. conjugados por todo o canto
ora mediocres terminações, parasitas e pouco vivos. Desta mágoa tola, infinitiva no meu pretérito imperfeito, quero ter tão só vida ativa, que é o presente meu direito.
COTIDIANO
Corre, corre, corre, homem, corre, vai querendo Anda, Passa cansa, homem. cansa, vai amando Corre, corre, corre, homem, corre, briga e morre.
Anda. passa, cansa. homem. cansa, oança. Avança Corre, passa. Chora homem. corre. cansa e morre. - Que Deus tenha mais uma besta no céu!
REFEIÇÃO
O pranto é único que adere aos pratos nos quatro cantos de uma mesma mesa, que são quatro cochos, e mais quatro mochos embaixo da fome que tem quatro nomes da mesma raiz.
E a digestão é fraca, pois perdeu a força pro calor demasiado que calou as bocas. E ao redor as moscas pretas, sérias, zumbem, e os talheres novos
37
com gosto de gaveta, que não justificam a seita que se divide em sonhos, que se apodera em gritos, que se dimensiona em gestos para se erguer do chão. O pranto é único que sobrou nos pratos
dos instintos gastos de cada um dos quatro que engoliram o pão. E ficou o rastro que se aviva em bagaços, que se mostra em ossos, para provar que houve refeição
GIRAR
Gira a roda a roda a roda rode que roaando e seu girar. Muda a rota a rota a rota
roda muda a rota prá dançar. Gira a vida a vida vira vira viva e como é bom a gente amar.
ENCONTRO
Vinhas de lá prá cá e eu ia daqui prá lá... Ficarmos nisto e mais nada seria como se a música terminasse em Fá. Não haveria Sol. nem Lá, nem Si, nem nada prá mim ou prá ti, a não ser o dom de passar. Vinhas de tá prá cá e eu ia daqui prá lá... Ah! que bom sairmos daqui, juntarmos Sol e Si, unirmos meu cá e teu lá
numa casinha que vi; tu sorrindo prá mim, eu sorrindo prá ti. Vinhas de lá prá cá e eu ia daqui prá lá ... Meu peito ardendo de dó, teu corpo, riqueza prá mi'. Queria um pedaço de um sim prá beijar os lábios de ti, prá cantar as dores de mim nos instrumentos de lá.
38
Vinhas de lá prá cá e eu ia daqui prá lá... Tão boa seria esta vida, se saísses do lado de lá, serias um pedaço de amor
caindo no lado de cá. Tudo então ficaria em par. a união renasceria aqui. Até a lua que nos dividia, ganharia um Sol prá Si. ..
MESMO QUE...
Mesmo que sejas falsa, mesmo que me tenhas traído mesmo que sofrido, mesmo que passado, mesmo que findado este tempo de sonho; mesmo que não sejas santa. mesmo que não sejas pura,
mesmo que não me cures, mesmo que não me ames, mesmo que reclames, mesmo que eu sofra muito, mesmo que eu chore tanto, nunca negarei que é tua e apenas tua a culpa do meu pranto.
POEMA PARA CECÍLIA MEIRELES
Obrigado por teus poemas, tuas rimas extremas, teus sonhos em versos. Agradeço por tuas palavras e por teus pensamentos que se fizeram canção. Desde "Nunca mais... e poemas dos poemas". até, talvez, "O espírito vitorioso", ou "Vozes da cidade" ... Vejo no teu retrato a imagem da saudade, do pesar que hoje me invade, ao saber-te distante, num mundo que não conheço. Vejo nos teus olhos tristes a imensidão de amor
que existe nas tuas obras, nos dias em que viveste. Choro muito e lamento isto, quando penso que teu corpo já é pó, assim como o meu também será. Sem saber o que virá, levo na alma a certeza de que te perpetuaste no tempo. E sinto ainda, trazido pelo vento, o perfume das flores que rodeavam tua morada. Tu que nos deixaste tanta poesia, partiste sem avisar.
39
Foste simplesmente, embora eu não saiba p'rá onde Apenas sinto que um dia, gostaria de te encontrar Obriqado pela pureza, Mais, então. a franqueza das tuas verdades poéticas.
Agradeço, ainda sofrido, num contentamento simultâneo, por teres existido Em cada estrofe um pensamento. rogo por ti CECILIA, agradecendo em nome do mundo, a tua lembrança que tanto brilha ...
40
fNDICE pág Apresentação 1 Criação do Colégio 3 Biografia do Professor Pedro Schneider 3 Professores: Sônia Bemfica Bohrer 5 Mardilê Frìedricb Fao ..e 8 Elvira Coelho Hoffrnann 9 Alunos: 11 Fábio José Martins Flees 13 Rosane Martins Fleck 17 Sandra Fogaça 18 Neiron Rodrigues Marques 20 Lindenberg de Rezende Miranda Ex-alunos: José Fernando Lacerda d'Ávila 24 Milton Bender 28 Adroaldo Diesel Filho 31 Carlos Alberto Nunes 32
Distribuição gratuita
Composto e Impresso naGráfica Unisinos
Capa: Prof' Nilda F. Fabre
Recommended