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Pró-Reitoria Acadêmica
Escola de Educação, Tecnologia e Comunicação
Curso de Pedagogia
Trabalho de Conclusão de Curso
A NEUROCIÊNCIA E O PROCESSO ENSINO E
APRENDIZAGEM NAS CLASSES DE
ALFABETIZAÇÃO DA REDE PARTICULAR DO DF
Autora: Tauana Ferreira Militão
Orientador: Msc. Olimpo Ordoñez Carmona
Brasília - DF
2017
TAUANA FERREIRA MILITÃO
A NEUROCIÊNCIA E O PROCESSO ENSINO E APRENDIZAGEM NAS
CLASSES DE ALFABETIZAÇÃO DA REDE PARTICULAR DO DF
Artigo apresentado ao curso de graduação
em Pedagogia da Universidade Católica
de Brasília, como requisito parcial para
obtenção do Título de Licenciado em
Pedagogia.
Orientador: Msc. Olimpo Ordoñez
Carmona
Brasília – DF
2017
Artigo de autoria de Tauana Ferreira Militão intitulado, A neurociência e o processo
ensino e aprendizagem nas classes de alfabetização da rede particular do DF,
apresentado como requisito parcial para obtenção do grau de Licenciado em Pedagogia
da Universidade Católica de Brasília, em 13 de junho de 2017, defendido e aprovado
pela banca examinadora abaixo assinada:
Prof. MSc. Olimpo Ordoñez Carmona (Orientador)
Pedagogia - UCB
Prof.a MSc. Tatiana Da Silva Portella (Examinadora)
Pedagogia - UCB
Brasília
2017
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A NEUROCIÊNCIA E O PROCESSO ENSINO E APRENDIZAGEM NAS
CLASSES DE ALFABETIZAÇÃO DA REDE PARTICULAR DO DF
TAUANA FERREIRA MILITÃO
RESUMO: Este artigo pretende investigar e compreender como se dão os princípios
neurológicos na apreensão da leitura e escrita da língua no processo de alfabetização
infantil. A questão norteadora é balizada em inquietações que indagam sobre as
contribuições da neurociência para o processo de ensino e aprendizagem, mais
especificamente no processo de alfabetização de crianças. E as contribuições que a
neurociência pode trazer para complementar a formação de educadores que atuam nas
classes de alfabetização, visto que, o processo de leitura e escrita é resultado de atividades
neurais intensas. A pesquisa procurava saber se os professores de uma escola particular
utilizavam os conhecimentos da neurociência no processo de alfabetização em crianças
com seis anos. Através das observações de campo foi possível verificar que efetivamente
as crianças da escola particular, apresentam um aprendizado significativo, que possibilita
o processo de alfabetização. No sentido que o professor está fazendo um constante
bombardeio sináptico, permitindo que os estudantes se apropriem, de forma natural, de
todos os instrumentos que permitem a interiorização e exteriorização do processo de
leitura e escrita. Ficou claro em todas as observações que as estratégias metodológicas
estão amparadas na neurociência, uma vez que o professor potencializa a plasticidade
cerebral, levando em conta a realização das atividades de forma interativa.
Palavras-Chave: Neurociência. Alfabetização. Ensino e aprendizagem.
1 INTRODUÇÃO
O processo de alfabetização é complexo e progressivo. Por ser uma competência
recente para a humanidade, se faz necessário uma instrução orientada para a
aprendizagem da língua escrita, o que requer estratégias pedagógicas para o
desenvolvimento da apreensão de tais habilidades.
A alfabetização consiste em um exercício cerebral que exige concentração,
atenção, memória e muitas outras atividades neurais, e, por isso, considera-se pertinente
a colaboração da neurociência junto à educação. Ressalta-se, também, a importância de o
professor conhecer as etapas de estruturação cerebral, para ter melhor aproveitamento
deste processo com as crianças, que se constitui pelo reconhecimento visual da palavra,
codificação dos estímulos gráficos e definição pela via lexical (DEHAENE, 2012). Essas
etapas formam um conjunto com a decodificação, pré-leitura, fixação e o reconhecimento
dos traços das letras e sua articulação (SCLIAR-CABRAL, 2009).
Todo esse procedimento é segmentado em componentes neurológicos essenciais
para a concretização da aquisição da língua. Sendo assim, torna-se primordial o
conhecimento da organização cerebral que é responsável por essa habilidade, pois dessa
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forma ampliam-se as possibilidades para que a alfabetização aconteça com a configuração
correta, decorrendo em resultados significativos na aprendizagem.
O conhecimento sobre como o cérebro processa a aprendizagem e quais as
melhores ferramentas para aquisição da escrita, tornou-se indispensável na sociedade
contemporânea. Conforme Cosenza e Guerra (2011, p.142), entende-se hoje que “o
cérebro é o órgão da aprendizagem”.
A alfabetização é um momento crucial na vida escolar do aluno, pois a partir
dela decorre todo o desenvolvimento educacional e cognitivo que são extremamente
importantes para o desenvolvimento das demais áreas do conhecimento. Paulo Freire
(1982, p. 9), define esta etapa como um “processo que envolve uma compreensão crítica
do ato de ler, que não se esgota na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem
escrita, mas que se antecipa e se alonga na inteligência do mundo”. Além da sua
relevância pedagógica, também possui um valor social expressivo para a participação do
aluno na sociedade.
Para isso, se requer organização didática, conhecimentos pedagógicos, de
metodologias, de desenvolvimento sociocultural, mas também o conhecimento do que os
estudos na área das ciências trazem para auxiliar no processo de ensino aprendizagem. A
neurociência muito já descobriu e pode auxiliar neste processo.
Acredita-se que o conhecimento sobre a neurociência poderá contribuir para o
avanço da ação pedagógica e para o processo de ensino e aprendizagem, uma vez que, as
mudanças contemporâneas, o avanço da ciência poderá nos mostrar novas estratégias de
ensino. Dessa forma, surge então a seguinte problemática: Como as descobertas da
neurociência podem contribuir no processo de alfabetização e na formação de
profissionais de educação?
Por ser justamente no cérebro que ocorre todo o desenvolvimento e etapas da
cognição, este estudo tem como objetivo geral analisar como os profissionais de
educação utilizam os conhecimentos da neurociência no processo de alfabetização.
Os objetivos específicos são: identificar os elementos científicos apontados
pela neurociência que contribuem para a alfabetização de crianças, conhecer e
descrever os componentes neurocientíficos que desenvolvem a habilidade de leitura
e escrita do ser humano.
O vínculo existente entre neurociência e educação pode proporcionar um leque de
possibilidades para descobertas nas ciências, tanto para a ciência da mente, como também
para a Pedagogia. Oliveira (2011, p. 21), ressalta que “A neurociência se constitui como
a ciência do cérebro, a educação como ciência do ensino e da aprendizagem e ambas têm
uma relação de proximidade porque o cérebro tem uma significância no processo de
aprendizagem da pessoa”. O entendimento de tais fatores que transcendem no cérebro,
como as células processam as informações, a sinapse e a eficiência da plasticidade
cerebral, motivam o aprendizado da linguagem oral e escrita, quando o profissional de
educação tem esses conhecimentos e auxilia no processo de alfabetização.
Esta pesquisa pretende envolver conhecimentos sobre alfabetização de crianças;
estudos da neurociência sobre o processo de apreensão da língua por meio de investigação
em escola de ensino fundamental anos iniciais, onde serão envolvidos profissionais de
educação e alunos em processo de alfabetização.
O corpus de análise da pesquisa, além de levantamento bibliográfico sobre
alfabetização e neurociência, foi realizada uma análise em uma escola particular do
Distrito Federal, em que foram observados os educadores e os alunos em processo de
alfabetização. O referencial teórico e metodológico deste estudo teve como base
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bibliográfica os pesquisadores Dehaene (2012); João Batista Araújo e Oliveira (2004);
Leonor Scliar-Cabral (2013); Michael S.Gazzaniga; Richard B.Ivery, George R.Mangun
(2006); e Paulo Freire (1982), entre outros que, no decorrer da pesquisa, serão
consultados.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 CONCEPÇÕES SOBRE A ALFABETIZAÇÃO
De acordo com a Lei 9.394 (BRASIL, 1996), Art. 21, a escolarização brasileira
se divide em “educação básica, formada pela educação infantil, ensino fundamental e
ensino médio e educação superior’. Um dos objetivos da Educação Básica é o preparo do
aluno para a prática de cidadania, visando a promoção futura no meio profissional e
acadêmico. O Art. 23 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), declara que a
forma de organização do ensino pode ser baseada em vários critérios, composto por
períodos semestrais, ciclos, idade ou, por competências, pretendendo sempre a melhor
condução do ensino e aprendizagem.
A Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (BRASIL, 1996) estabelecera que o
aluno só deveria ser inserido no 1o ano do Ensino Fundamental - anos iniciais - com 7
anos de idade. Isso também mudou com a instauração da Lei no 11.274, de 6 de fevereiro
de 2006, que inclui crianças a partir de 6 anos no primeiro ano do ensino fundamental.
Esta mesma Lei determinou a matrícula obrigatória a partir dos 6 anos de idade, ou seja,
o Ensino Fundamental passou a ter duração mínima de 9 anos. Modificou também os
procedimentos de alfabetização, já que o aluno inicia o exercício funcional da
alfabetização mais cedo e, portanto, uma das finalidades do acréscimo de mais um ano
foi para dar a oportunidade a alunos que não frequentaram a pré-escola.
As Diretrizes Pedagógicas do Bloco Inicial de Alfabetização de 2012, impede a
reprovação nos anos iniciais de alfabetização, em razão de que este processo não ser
finaliza no primeiro nível de ensino, sendo a continuação de um ciclo, onde o aluno passa
por fases de instrução da leitura, escrita e cálculo. Por conseguinte, se tem a avaliação,
de forma processual na alfabetização, com um olhar para uma progressão da
aprendizagem. Neste sentido, o aluno, apesar de ser avaliado, não será retido.
É inquestionável a importância da alfabetização no cenário atual e com isso
várias medidas e leis são pautadas para ascensão da compreensão do sistema de escrita.
Por exemplo, a instituição do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa compete
em:
Um compromisso formal assumido pelos governos federal, do Distrito Federal,
dos estados e municípios de assegurar que todas as crianças estejam
alfabetizadas até os oito anos de idade, ao final do 3º ano do ensino
fundamental (BRASIL, 2012, p.11).
Espera-se que o aluno no final do 3º ano do ensino fundamental, reconheça a
relação grafema e fonema, além também de entender e elaborar pequenos textos.
Conforme o Art. 5o, do Pacto Nacional, alguns dos objetivos consistem na garantia da
alfabetização em Língua Portuguesa e Matemática no final do 3o ano do ensino
fundamental; na diminuição da defasagem entre a idade e o ano; na melhora nos índices
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do IDEB; e no incentivo á formação continuada dos professores alfabetizadores e
desenvolver estratégias para aprendizagem do aluno nos três anos do Ensino
Fundamental.
Percebe-se a magnitude e a responsabilidade do professor alfabetizador para o
comprimento de tais objetivos educacionais e sociais. Seu papel não fica limitado apenas
à reprodução de conteúdos para assimilação de códigos linguísticos, é fundamental que
sua atuação seja metódica e explícita com sua definição de alfabetização, pois dessa
forma, pode-se contribuir para realização plena de cidadania do aluno.
Alfabetizar é se apropriar de um sistema de escrita por meio da codificação e
decodificação dos signos linguísticos, ou seja, é o aprendizado da língua não como meros
símbolos, mas como representação do mundo, e com o propósito primordial de se
comunicar e pensar (MORAIS, 1996). Além da apreensão da língua como uma
ferramenta de comunicação, esta apropriação é de cunho social e cultural, pois todos
somos sujeitos de linguagem e essa se dá também por meio da leitura e escrita. Para o
sujeito ser considerado incluso na sociedade é necessário este ser letrado.
Diante da complexidade que é atividade de leitura e escrita, este conhecimento
necessita de metodologias de ensino, que desenvolvam habilidades cognitivas e
mobilizem estruturas neurais importantes para o ensino e aprendizagem. Portanto, além
das metodologias e estudos na área de educação de pesquisadores renomados como Piajet,
Vygotsky e Wallon, recentes pesquisas na área de neurociência também podem contribuir
nesta tarefa tão complexa que é a aprendizagem e, mais precisamente, a alfabetização.
Muitas são as concepções de didática da alfabetização que já foram usadas e
ainda estão em vigência. Algumas décadas atrás a ação de ler e escrever acontecia
exclusivamente por meio do método fônico e silábico que, segundo Sebra e Dias (2011),
envolve o estudo dos elementos menores das palavras, fonemas e sílabas, muito
empregado nas cartilhas, prosseguindo para o estudo das unidades maiores, linguagem
escrita, sentenças e textos.
Outra metodologia utilizada na alfabetização é o método analítico, em que, “ao
contrário, as unidades apresentadas inicialmente são unidades de significado, sejam elas
palavras, frases ou textos” (SEBRA, DIAS, 2011, p. 307). Portanto, nessa metodologia
expõem-se primeiro o todo para depois ir para as partes.
Manifesta-se no ambiente escolar, uma nova linha pedagógica que torna o aluno
participante no processo de aprendizagem, denominada a teoria construtivista. Surge
assim alfabetização baseada no Construtivismo, mudando alguns conceitos sobre a forma
de alfabetizar que, de acordo com Ferreiro e Teberosky (1985), a aquisição da leitura e
escrita é diferente de um aluno para outro por que cada um tem um processo de
aprendizagem com evoluções e recuos.
Estas autoras dividiram o processo de alfabetização em quatro fases: a pré-
silábica – em que o aluno ainda não tem compreensão das letras e sons, apenas faz traços;
a silábica – é o nível de escrita em que eles representam as palavras por letras conhecidas,
normalmente, do seu próprio nome, entretanto, ainda não diferem totalmente letras e
números; a silábica alfabética - surge a tentativa de atribuir um som a cada letra, e a fase
alfabética – que abrange uma parcela bem significativa da relação grafema-fonema,
porém, ainda se tem algumas dificuldades ortográficas.
Neste sentido, retira-se o foco apenas dos aspectos fônicos e silábicos, e se
reconhece que o raciocínio e cognição são construídos pelo aluno, sendo ele agente
importante de sua aprendizagem. O professor, portanto, não é mais considerado como o
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único detentor do conhecimento, agora é atribuído a ele o título de mediador, onde no
Construtivismo, o conhecimento é construído com a exposição do sujeito ao meio.
Outro aspecto importante da teoria construtivista, que foi incorporado e
aperfeiçoado na psicogênese da língua escrita, é a questão do erro como agente de
formação. Ferreiro e Teberosky (1985) relatam que durante o aprendizado da escrita e
leitura, os alunos erram, de forma comum a todos, e estes constituem um processo
gradativo de aprendizagem, possui um caráter construtivo.
Diante de todas as abordagens apresentadas aqui, não é comum aprender a ler e
escrever sem que haja um estímulo e uma motivação. Nesse sentido, é preciso que o
educador mediador desenvolva estratégias para que o aluno se sinta instigado a despertar
o interesse pela escrita e pela leitura. Também é necessário um ambiente que propicie
desafios para provocar a geração de pensamentos críticos e produção de exercícios
cognitivos. A neurociência surge para somar meios de auxiliar os educadores na missão
de escolarizar com maior eficiência e qualidade.
2.2 A CONTRIBUIÇÃO DO CONHECIMENTO DA NEUROCIÊNCIA PARA A
EDUCAÇÃO
O cérebro é o órgão vital do sistema nervoso, responsável pelas ações do
pensamento, sentimento, atenção e muitas outras competências complexas, ele também
interpreta as percepções do meio ambiente. Para que o sistema nervoso decifre as
informações e oriente uma reação para uma determinada parte especializada do corpo, é
indispensável as atuações dos neurônios. Lent (2005, p. 13) descreve os neurônios como
células:
Cuja morfologia está adaptada para as funções de transmissão e processamento
de sinais: tem muitos prolongamentos próximos ao corpo celular (os
dendritos). Que funcionam como antenas para os sinais de outros neurônios, e
um prolongamento longo que leva as mensagens do neurônio para sítios
distantes (o axônio).
É essa cadeia de neurônios interligados que formam o circuito neural,
responsável pela execução das funções decisivas para o aprendizado. Outro fenômeno
essencial para que a aprendizagem ocorra é a sinapse. “Quando o potencial de ação
alcança um terminal axional, este induz a liberação de mediadores químicos em uma
região especializada, a sinapse, onde o neurônio faz contato com outro neurônio”
(GAZZINGA; IVRY; MANGUN, 2006, p.78).
Em outras palavras, a sinapse é onde acontece a transferência de informações
entre um neurotransmissor e outro. Assim acontece o mecanismo de mensagem, que
permite o ser humano aprender, e por isso é importante que as didáticas pedagógicas
provoquem o maior número de sinapses possíveis para a consolidação das ideias.
É vantajoso que o professor utilize de estratégias pedagógicas que favoreçam
alterações na estrutura cerebral, pois o ambiente influencia na organização funcional. Ele
intensifica a plasticidade cerebral e a capacidade de mudança neural frente a estímulos
(GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006). No momento que se aprende algo novo,
associado com as informações e conhecimentos já pré-existentes, o cérebro se torna cada
vez mais plástico e se ajusta ás modificações motivadas pela aprendizagem. Oliveira
(2014, p. 16) destaca que “As mudanças estruturais, chamadas de períodos críticos,
incluindo a sinaptogênese e a poda neuronal, são eventos relevantes na educação”. Nesses
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períodos, as estimulações para determinadas aprendizagens são importantes para o
desenvolvimento educacional da criança.
Segundo Vygotsky (1998), o aprendizado está vinculado com o
desenvolvimento, sendo que, a aprendizagem poder ser maior que o desenvolvimento
biológico. O autor explica essa competência com a zona de desenvolvimento proximal:
que é a distância entre o desenvolvimento real e o desenvolvimento potencial, e se
concretiza com a habilidade de resolver problemas sozinhos. O desenvolvimento
potencial seria a capacidade de resolução de novos problemas com a mediação de um
outro sujeito. Desse jeito, Vygotsky, já trabalhava com a plasticidade cerebral, ao afirmar
que o ser humano é capaz de aprender através dos estímulos ambientais e não
necessariamente só por meio biológico, ao contrário de Piaget, que se “concentra em
encontra o liminar inferior de uma capacidade de aprendizado, ou seja, a idade ideal na
qual um tipo particular de aprendizado se torna possível pela primeira vez” (VYGOTSKY
1998, p.104).
Oliveira (2011, p. 66) define a neurociência “como o conjunto de ciências
envolvidas no estudo do sistema nervoso, especialmente do cérebro humano, tem por base
a interdisciplinaridade”. Há, portanto, uma intercomunicação com a educação e tem
como parâmetro a interdisciplinaridade dos conhecimentos e constituição humana.
Compreende-se aqui a importância de explorar essa combinação e o quanto é relevante
que o professor conheça o funcionamento do cérebro para impulsionar os processos de
aprendizagem.
O discernimento de como o cérebro funciona e de quais maneiras esses
fundamentos podem ser empregados na educação, indicam mudanças de referências para
o desenvolvimento da aprendizagem. Com o surgimento de novos parâmetros, ampliam-
se os campos de estudos que investigam a neurociência e a educação. Para Hennemann
(2015) a neuroeducação se trata da conjunção dos saberes da psicologia, educação e
neurociência, surgindo assim, um novo entendimento dessa reunião, onde o aprender é a
causa de transformações nos comportamentos.
A educação nesse contexto não se constitui apenas na obtenção de novos
conhecimentos, mas na reorganização e alteração das metodologias de ensino e na forma
como o aluno aprende. Ainda segundo Hennemann (2015), essa mudança de
comportamento ou aprendizagem pode ser tanto cognitiva, quanto motora ou emocional.
Para conseguir tais objetivos de modificações na educação, é preciso oferecer
uma formação de professores voltada para inclusão da neurociência na formação básica
do docente. Silva e Morino (2012, p. 47) destacam essa nova concepção como “nesta
perspectiva futurista, não se pode deixar de mencionar o papel do neuroeducador, o
professor do futuro, a partir de um currículo de formação de professores adequado a essa
inevitável esfera”. Os autores ressaltam ainda que é essencial um currículo que abarque a
neuroeducação para inserção dos progressos cognitivos na metodologia e teoria. Noronha
(2012, p.1) aprofunda ainda mais as colaborações da neurociência para a prática
pedagógica:
A imaginação, os sentidos, o humor, a emoção, o medo, o sono, a memória são
alguns dos temas abordados e relacionados com o aprendizado e a motivação.
A aproximação entre as neurociências e a pedagogia é uma contribuição
valiosa para o professor alfabetizador. Por enquanto os conhecimentos das
Neurociências oferecem mais perguntas do que respostas, mas cremos que a
Pedagogia Neurocientífica está sendo gerada para responder e sugerir
caminhos para a educação do futuro.
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Aprendizagem consolidada com a neurociência, ou a neuroeducação, possibilita
potencializar as habilidades dos alunos, visto que, são desenvolvidas as aptidões
cognitivas para a expansão da inteligência e não meramente memorização temporária.
Segundo Izquierdo (2002), a memória é a consecução, elaboração, continuação e a
recordação de experiências. Portanto, só se aprende com efetividade quando concepções
novas são intermetidas com informações ascendentes.
Para Fonseca (2014, p. 5) “a interatividade e a inseparabilidade dinâmica da
cognição, da conação e da execução permitem a emergência e a sustentação do processo
da aprendizagem humana”. Essa movimentação só é possível devido à circulação de
informações entre as células (neurônios), que são propícias ao aprendizado. O cérebro
humano é formado por partes especializadas em realizar determinadas atividades, onde
todos os circuitos e sistemas participam para seu funcionamento.
Segundo Noronha (2012) o cérebro humano é dividido em dois hemisférios e o
jeito de cada pessoa sofre influência de forma direta a partir do lado que a mesma utiliza.
As pessoas que usam mais o hemisfério esquerdo, tender a ser racionais e lógicas,
enquanto que o lado direto é encarregado da imaginação e criatividade, geralmente as
pessoas que utilizam esse lado, possuem facilidade para oratória.
É importante que exista equilíbrio entre os hemisférios esquerdo e direito do
cérebro e a constante estimulação das capacidades. Também é notória a diferença de
aprendizagem entre os alunos, já que cada um tem seu tempo de aprender e apresenta
formas distintas para apreensão dos conhecimentos. O entendimento das funções
cerebrais resulta na necessidade de excitar e intensificar o potencial de aprendizagem de
forma integrada para a totalidade do aluno.
Para Maricato (2013) a educação cognitiva faz parte da edificação do
conhecimento, do pensamento crítico e reflexivo; uma temática que está sendo debatida
na tentativa de progredir na qualidade da educação. Por esse motivo, é preciso uma
reconfiguração pedagógica para avançar nos processos de desenvolvimento e
aprendizagem, pois, conhecendo as particularidades dos alunos, o professor pode se
tornar um agente atuante na aprendizagem, e desse modo, alternar sua atuação para áreas
diversificadas, com utilização de procedimentos e ferramentas múltiplas.
Diante dos fundamentos apresentados, são evidenciados os benefícios da
apreensão das descobertas da neurociência na educação, para revelar os princípios que
comprometem o cérebro na aprendizagem, bem como preparar o aluno para uma
educação que está em sucessiva transformação, pois as mudanças de comportamento são
produtos de um exercício cerebral ativo.
2.3 A ALFABETIZAÇÃO E AS CONTRIBUIÇÕES DA NEUROCIÊNCIA
A linguagem é usada pela humanidade para comunicação, diálogo, troca de
ideias e pensamentos, é um conjunto de símbolos que possibilita a interlocução entre os
sujeitos. A habilidade da fala é inata, pois todas as crianças aprendem e expressam essa
competência de maneira semelhante (GAZZINGA; IVRY; MANGUN, 2006). Dessa
forma, a linguagem caracteriza-se por ser uma manifestação cultural (VYGOTSKY 1998)
que, por meio, primeiramente da fala de uma língua, insere o sujeito numa determinada
cultura e essa inclusão é estendida quando esse sujeito apreende a versão simbólica desta
língua que se dá na alfabetização.
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Dessa forma, a habilidade de ler e escrever também é uma forma de divulgação
de informação e comunicação, além de ser um meio de a sociedade se desenvolver. Sem
dúvidas é a criação humana que mais mudou o pensamento e existência do ser humano,
modificando também suas estruturas sociais e neurais. Morais (1996, p. 43), enfatiza que
“a escrita é uma aquisição muito recente. O primeiro traço de escrita tem apenas seis mil
anos”. Devido à escrita ser uma inovação, ícones que foram e são construídos pela
sociedade (LIMA, 2013) precisam ser ensinados, ao contrário da linguagem oral, a escrita
não é uma habilidade inata, necessitando ser aprendida.
Em virtude da sua complexidade, a escrita e a leitura alteram as redes neurais.
A criança necessita compreender que a linguagem oral é formada por fonemas, orações e
pensamentos que configuram os elementos do diálogo. Morais (1996, p. 109) define a
leitura como “a capacidade de reconhecimento de palavras escritas, isto é, a capacidade
de identificar cada palavra como forma ortográfica que tem uma significação e atribuir-
lhe uma pronuncia”. Em consequência da estrutura complexa que é o ato de ler, este
assunto é bastante pesquisado, devido a sua importância para a evolução da civilização.
A leitura e a escrita proporcionam que os alunos tenham acesso a essa cultura do
conhecimento, que é desenvolvida pelas e para as pessoas.
É preciso reforçar a necessidade do conhecimento neurocientífico para o ensino
da leitura e escrita, pois a aptidão para essas habilidades manifesta-se diretamente no
cérebro. Lima (2013) diz que “quando a docência da escrita integra várias das
contribuições da neurociência, observamos que se tornam mais concretas e complexas as
aprendizagens da criança pela realização de memórias de longa duração” (p.9). São
defendidos os benefícios de uma abordagem pedagógica com enfoque na neurociência
para o ensino da leitura e escrita, podendo aprimorar esse processo e até torná-lo mais
rápido e eficaz.
Hoje em dia nas salas de alfabetização, principalmente nas escolas públicas, é
adotada a teoria do construtivismo, onde deve-se respeitar a evolução de cada criança,
indo ao oposto do que é evidenciado pela zona de desenvolvimento proximal e a própria
neurociência, já que revelam que o nível de maturação da criança está muito além de seu
desenvolvimento. É por meio da estimulação precoce que o cérebro realiza as sinapses,
sendo que a patir dos primeiros anos de vida até a adolescência é quando ocorre o maior
número de sinapses. Portanto, como Vygotsky (1998, p.154) já argumentava, “se as
crianças mais novas são capazes de descobrir a função simbólica da escrita, então o ensino
da escrita deve ser de responsabilidade da pré-escola” e não apenas uma capacidade
atribuídas as crianças de seis anos em diante.
De acordo com Morais e Kolinsky (2013), e Oliveira (2004), considerando os
processos de aprendizagem da leitura, para que o aluno aprenda a ler é necessário entender
algumas etapas: a primeira etapa consiste em identificar o princípio alfabético, que é
formado pela correlação fonemas e grafemas, ou seja, os fonemas são unidades de som
que são representadas por letras (grafemas); a segunda condição equivale à apropriação
sucessiva das regras comuns de decodificação grafofonológica e fonográfica, pois
dependendo da localização das letras e do contexto, a mesma pode expressar sons
diferentes, grafemas distintos para um mesmo fonema e as regras complexas de
morfossintáticas (classes gramaticais); a terceira situação é a construção dos conceitos
mentais da ortografia, quando o léxico mental ortográfico, já bem desenvolvido,
identifica automaticamente as palavras.
Identifica automaticamente as palavras, e, dessa forma, torna-se fluente e pode
concentrar sua atenção no texto e no contexto. O bom leitor usa o contexto para
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facilitar a compreensão, não para identificar a palavra. O mau leitor, ao
contrário, utiliza o contexto para identificar a palavra, comprometendo a
memória, atenção e concentração nessa tarefa, o que afeta a sua leitura e
compreensão. Para identificar automaticamente uma palavra é preciso
aprender, antes, a decodificá-la. O alfabeto é um código, é artificial, foi
inventado. (OLIVEIRA, 2004, p. 24)
A alfabetização necessita seguir um processo de valorização de etapas. As etapas
inicias, são importantes para o desenvolvimento de fases futuras. Quando a criança
aprende os princípios da leitura, as demais fases tornam-se descomplicadas, a
compreensão do texto vai sendo construída no cotidiano quando a leitura se torna
espontânea.
A legitimação dos preconceitos e conceitos que são cruciais para a habilidade de
ler é baseada em pesquisas que realizaram perguntas de natureza exploratória, como por
exemplo de como se aprende a ler. Dehaene (2013) e Oliveira (2004) questionam quais
organizações cerebrais são responsáveis por esse processo e como a leitura modifica
nosso cérebro (DEHAENE,2013; SCLIAR-Cabral (2010).
Cosenza e Guerra (2011) afirmam a existência de circuitos especializados no
processamento da linguagem, localizados no hemisfério esquerdo, denominados de áreas
de Broca (responsável pela fala); e a Wernicke (vinculada à compreensão da linguagem).
No entanto, para a decodificação da escrita, não se encontra uma área cerebral já
predeterminada para tal função, no momento da aprendizagem da leitura e da escrita
ocorre à plasticidade cerebral, os neurônios se reorganizam para decifrar os estímulos e
originar aprendizagem, decorrente da transformação de algumas redes neurais (SCLIAR-
CABRAL, 2010).
Os princípios neurobiológicos da leitura são comuns para todas as línguas e
sujeitos. Segundo Dehaene (2013) e Oliveira (2004), o processo de leitura se inicia nas
vias corticais, em que a retina captura o estímulo gráfico e o divide em pequenas unidades
que são enviadas para o cérebro, especificamente para a região occipitotemporal ventral
esquerda. Após o reconhecimento da palavra, os neurônios acessam o chamado dicionário
mental de formas das palavras, onde os grafemas são relacionados com seus respectivos
fonemas, construindo, desse modo, a consciência fonológica.
Em seguida, é feita a interpretação da palavra pela via lexical , atribuindo-lhe
um sentido. Coltheart (2013, p.21) reforça a importância das duas vias para o
reconhecimento da letras e significação da leitura.
Existem duas rotas da palavra impressa a fala: uma rota lexical e uma rota não
lexical. De forma ampla, a rota lexical envolve analisar a pronúncia de uma
palavra armazenada em um léxico ou dicionário mental. Em contrapartida, a
rota não lexical envolve traduzir os grafemas (letras ou grupos de letras) em
fonemas e gerar a pronúncia da palavra a partir dessa sequência de fonemas.
Apesar das mudanças que o cérebro é submetido para apreensão da escrita e
leitura, mesmo assim permanece delimitações fisiológicas para o processo. Dehaene
(2013) relata que só é possível identificar entre 10 e 12 letras, em cada fase, onde 3 a 4
são reconhecidas à esquerda do olho e 7 a 8 à direita. Essa região é denominada de campo
da percepção visual da letra. Além disso, todo esse mecanismo é executado em questões
de milésimos de segundos, fomentado em uma competência multifacetada que demanda
um envolvimento conjunto de todo o cérebro, que requer também capacidades superiores
de atenção, concentração, compreensão e memória.
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Embora se tenha poucas informações e descobertas, a ciência neurocognitiva
evolui de forma excepcional, resultando em diversos conhecimentos que contemplam a
vivência escolar em um dos períodos principais, que é a alfabetização, pois é a partir dela
que se vinculam todos os outros aprendizados e conhecimentos.
3 METODOLOGIA
O presente artigo é baseado em uma abordagem qualitativa que, para Malheiros
(2011, p. 31) “tentam compreender os fenômenos pela ótica do sujeito. Neste sentido, têm
como premissa que nem tudo e quantificável e que a relação que a pessoa estabelece com
o meio e única e, portanto, demanda uma análise profunda e individualizada. ”
Esse tipo de pesquisa tem um caráter qualificador e social, já que a investigação
é focalizada no sujeito e sua realidade. A finalidade da pesquisa foi de analisar as
estratégias de alfabetização, e as contribuições da neurociência para esse processo,
o que demandou, além de levantamento bibliográfico sobre o tema, a análise, por meio
de observações do cotidiano pedagógico de uma turma de alfabetização da rede particular
do Distrito Federal.
Esta pesquisa tem um caráter bibliográfico e exploratório, que para Cervo, Brian
e Silva (2007, p.61) se define como “ o procedimento básico para os estudos
monográficos, pelos quais se busca o domínio do estado da arte sobre determinado tema.”
Já a investigação exploratória é definida como uma pesquisa que não necessita a
verificação de hipóteses, delimita-se a buscar mais informações sobre um tema estipulado
(CERVO; BERVIAN; SILVA, 2007). Por ser um tema contemporâneo, necessitou de um
estudo intrínseco para familiarizar-se com a temática.
O objetivo de analisar se as estratégias de alfabetização têm fundamentação com
a neurociência, apresenta, assim, algumas características de estudo de caso simples.
Segundo Gil (2002) o estudo de caso é um método qualitativo, utilizado para investigar
situações da vida real e explicar as variadas causas de um fenômeno complexo.
A pesquisa foi realizada em uma única escola, onde a coleta de dados se deu em
um ambiente real. A pesquisa de campo e mais uma técnica que se relaciona muito mais
a forma de coleta de dados do que propriamente ao modelo metodológico de condução
da pesquisa. Como o próprio nome diz, nesta técnica a coleta de dados e realizada em
campo, sendo este uma delimitação no espaço e no tempo (MALHEIROS, 2011).
Os dados analisados são de natureza primária, que se refere a “dados coletados,
em primeira mão, como pesquisa de campo, testemunho oral, depoimentos, entrevistas,
questionários, laboratórios, conferências gravadas etc.” (MICHEL, 2009, p.65). As
informações foram reunidas por meio de 10 observações diretas, realizadas em uma classe
de alfabetização da rede particular do Distrito Federal.
4 ANÁLISE GERAL DAS OBSERVAÇÕES
A pesquisa foi realizada em uma escola particular do Distrito Federal, na turma
de 1o ano do Ensino Fundamental I, com crianças na idade de 6 anos, totalizando 11
alunos. A observação abrangeu o conjunto de 10 aulas com a somatória de 40 horas, entre
os dias da semana de terça-feira, quinta-feira e sexta-feira.
O critério escolhido para a realização das observações nessa determinada escola,
foi de verificar como os profissionais de educação utilizam os conhecimentos da
neurociência no processo de alfabetização.
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De forma geral, é surpreendente como as crianças da escola particular,
apresentam um aprendizado significativo, que possibilita o processo de alfabetização, no
sentido que o professor está fazendo um constante bombardeio sináptico, permitindo que
os estudantes se apropriem de forma natural, de todos os instrumentos que permitem a
interiorização e exteriorização do processo de leitura e escrita.
A proposta de alfabetização da professora inicia-se pela organização da sala.
Cada espaço é identificado com seu devido nome e há livros em todos os lados da sala:
em uma estante pequena, em um baú e armários. São variados tipos de livros e revistas
ao alcance das crianças, onde elas podem pegar e apreciar a leitura. Além disso, a escola
possui um projeto de leitura chamado Ciranda do Livro, no qual as crianças escolhem um
livro para ler e levar para sua casa, e a cada história lida, elas realizam uma atividade para
consolidar a aprendizagem e compreensão do texto. Oliveira (2004, p. 65) confirma a
importância dessa estruturação da sala de aula e materiais:
Numa classe bem organizada deve haver materiais para o professor, para
leitura compartilhada, para leitura individual e para atividades a serem
desenvolvidas pelo o aluno. Deve haver também materiais de leitura e trabalho
que o aluno leve para casa e fazer deveres.
O habito da leitura diária é essencial para o desenvolvimento das habilidades de
ler, escrever e para o aumento do vocabulário das crianças. Ademais, ouvir histórias
também é essencial nesse processo de formação de leitores. A professora da classe
observada, sempre começava a aula com a leitura de um livro e logo depois dialogava
com os alunos sobre a história. Souza (2009, p.45) evidência a relevância dessa prática:
“Hoje sabemos que, antes da criança começar a ler, é preciso que ela escute histórias, pois
a palavra falada é um agente estruturante das funções superiores da mente porque é o
início da aprendizagem para que a pessoa seja um leitor”.
Outro recurso utilizado na sala para a o aprimoramento da leitura são as fichas
de leiturinha que contêm diversos gêneros textuais. As crianças escolhem uma ficha e
realizam a leitura durante toda a semana ou até sua aprendizagem. Oliveira (2004)
defende a memorização de textos como sendo um importante modo de fortalecer a
memória, ajudando também na identificação de palavras e fluência verbal.
Na observação do nono dia, a professora leu várias parlendas e trava-línguas para
as crianças e ainda pediu que as próprias crianças narrassem as parlendas conhecidas por
elas. Ora, a leitura de textos como parlendas e trava-línguas por exemplo, enriquece a
competência de consciência fonológica nas crianças. Segundo Cassela, Amaro e Costa
(2011, p.39-40):
A unidade da escrita conhecida como grafema é o correspondente da unidade
sonora, denominada fonema, e esta consciência é fundamental na aquisição da
leitura. Esta capacidade é denominada consciência fonológica e está presente
de forma estável em crianças a partir de cinco anos de idade. Este tipo de
percepção representa um passo inicial para o desenvolvimento de circuitos
neurais em regiões específicas do cérebro, que desde a idade pré-escolar já se
mostram presentes, localizando-se principalmente em áreas do hemisfério
esquerdo do cérebro.
Durante todas as aulas, a professora sempre incentivava as crianças a pronunciar
primeiramente a palavra, identificando os sons de cada letra e em seguida elas teriam que
escrever, reforçando mais uma vez a relação fonema-grafema, de acordo com Dehaene
(2012, p. 221) “Em definitivo, o melhor modelo de aprendizagem fonológica é, sem
15
dúvida, o de uma interação recíproca entre o desenvolvimento dos grafemas e fonemas”.
Como consta, a todo instante elas trabalham essa importante relação de som e letra.
A compreensão textual é desenvolvida juntamente com a leitura e escrita. Além
da contação de história diária, no sexto dia tendo como exemplo, a professora pediu que
as crianças contassem a história da “Bela Adormecida”, e em seguida ela fez a relação
com a música “A Linda Rosa Juvenil”, as crianças entenderam que as duas se referem á
mesma história. No mesmo dia, ela explicou para as crianças a diferença entre parlenda e
cantiga. Na quarta observação, houve uma atividade com o livro “Camilão, o comilão”,
as crianças escolheram um animal e pesquisaram sobre ele, quer dizer, que as crianças
não só ouviram a história, como também falaram sobre o que apreenderam e ainda
escreveram sobre um animal de sua preferência, trazendo novos conhecimentos para
história.
Conforme Oliveira (2004), algumas competências importantes para a
compreensão do texto seriam: identificar o princípio, meio e fim de histórias lidas pelo
professor; identificar as principais características dos gêneros literários; resumir a história
e compreender o objetivo da leitura.
A escrita é otimizada com exercícios de copiar do quadro os deveres, agenda e
textos. Outras vezes a professora dita as palavras, espera as crianças escreverem e depois
escreve no quadro para que elas corrijam, e elas também revisam os textos dos outros
colegas. Oliveira (2004) refere-se aos ditados e cópias, quando usadas de maneira correta,
como instrumentos para o conhecimento da ortografia e evolução da leitura. Elas também
produzem pequenos textos com suas próprias palavras, como foi visto no decorrer do
sexto dia, quando as crianças deveriam escrever sobre o significado da páscoa para elas.
Segundo Hennemann (2012), o exercício de escrever à mão é tão fundamental para
aperfeiçoamento da ação motora, quanto para o cérebro e o desenvolvimento cognitivo,
isto é, desenvolve a expressão de ideias mais rapidamente.
Na apreciação do terceiro dia, a professora introduziu a letra cursiva. Ela
escrevia no quadro a palavra e pedia para as crianças traçarem com dedo o formato da
letra na folha e só depois escrever com o lápis. Dehaene (2012, p. 246) ressalta que
“Escrevê-las ou traça-las com o dedo contribui certamente, a transpor, com sucesso, esta
importante etapa”. Também foi solicitado às crianças que, ao ler uma palavra, elas
acompanhassem cada letra com seu dedo, um recurso muito importante no momento da
leitura, pois nossos olhos capturam as palavras por meio de sacadas, envia ao cérebro,
onde desintegra essa palavra em pequenos elementos. Então, ao acompanhar com o dedo,
a criança focaliza a palavra que deve ler, facilitando assim as sacadas dos olhos no
reconhecimento visual da palavra (DEHAENE, 2012).
Um outro recurso utilizado pela professora para o processo de ensino e
aprendizagem são os desafios semanais propostos aos alunos. Toda semana é lançado um
desafio ás crianças - problemas que elas tentam resolver apenas com ajuda de uma outra
pessoa - mas que devem conseguir solucionar sozinhos. Essa habilidade é importante para
a memória, aprendizagem, e muitas outras funções do cérebro, evidenciando a contínua
plasticidade cerebral de alguns circuitos neurais com o aprendizado (CASSELA;
AMARO; COSTA, 2011). Além da resolução de problemas, o incentivo incessante a
realizar atividades que superam seus limites, reforça a ideia de zona de desenvolvimento
proximal.
A zona de desenvolvimento proximal permite-nos delinear o futuro imediato
da criança e seu estado dinâmico de desenvolvimento, propiciando o acesso
16
não somente ao que já foi atingindo através do desenvolvimento, como
também aquilo que está em processo de maturação (VIGOTSKY, 1998,
p.113).
As perguntas também fazem parte das estratégias de aprendizagem na sala
observada. A cada ação realizada pelas crianças, a professora faz diversas perguntas sobre
aquela atividade, promovendo, desta forma, uma grande realização de sinapses,
estimulando de modo similar a plasticidade cerebral. De acordo com Silva e Morino
(2012, p.40):
As perguntas enfatizam importantes elos da informação semântica. Uma
maneira de abordá-la é fazer perguntas abertas que dão a todos os níveis de
estudantes a oportunidade de responder “corretamente”. Outra maneira é dar
as respostas e deixar que os estudantes deem as perguntas.
Em síntese, todos os procedimentos aplicados no processo de ensino e
aprendizagem são advindos das afirmações da neurociência, ou seja, estão de acordos
com os mecanismos do cérebro, proporcionando uma aprendizagem mais significativa e
eficaz.
Lembrando as palavras de Vygotsky (1998) o bom aprendizado é aquele que se
adianta ao desenvolvimento. Desta forma, a escola pesquisada propicia memórias de
longo prazo, aproveitando o processo de mielinização e preparando os cérebros das
crianças, para uma interconexão sináptica que permite a efetividade da plasticidade
neuronal.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir dos estudos das correntes de pensamentos que apoiam a neurociência
como colaboradora no processo de alfabetização, e com base nas observações realizadas
nesse trabalho, compreende-se que o processo de ensino e aprendizagem necessita ser
pautado de acordo com os conhecimentos científicos, ou seja, os professores devem ter
uma atenção especial para Pedagogia Científica aliada à neurociência, com a finalidade
de potencializar a aprendizagem dos alunos.
Por isso, as crianças que são alfabetizadas desenvolvendo as competências
propostas pela neurociência, conquistam uma aprendizagem de uma maneira mais ativa
e duradora. Diante do que foi apresentado, a alfabetização de crianças pode ocorrer em
idades precoces, visto que, Segundo Cassela, Amaro e Costa (2011), crianças em idade
pré-escolar já possuem as estruturas cerebrais adequadas para o aprendizado da leitura e
escrita. São durante os primeiros anos de vida que ocorrem o maior número de sinapses,
ou seja, o cérebro é mais plástico na infância, o momento propício para a alfabetização.
A obtenção de novos conhecimentos e o aperfeiçoamento da aprendizagem
depende, em grande parte, das estruturas cerebrais e da mediação do professor, desse
modo, esta pesquisa reafirma a importância de os educadores entenderem a relevância da
neurociência para as práticas pedagógicas na alfabetização, pois a instrução da leitura e
escrita demanda uma metodologia condizente com componentes neurológicos e
neurocientíficos que desenvolvem a habilidade de leitura e escrita do ser humano.
Dessa forma, verificou-se os elementos essenciais para a habilidade de leitura e
escrita , descritos por Morais e Kolinsky (2013), e Oliveira (2004): a apropriação da
relação grafema-fonema, construção da consciência fonológica, compreensão do contexto
e acesso a ortografia.
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Portanto, quando o ensino é realizado em conformidade com a neurociência, este
proporciona ás crianças uma aprendizagem que estimula a realização de sinapses,
impulsiona a plasticidade neural e, consolida a memória, promovendo, assim, uma
atenção e concentração fixa, isto é, são os elementos neurológicos primordiais não só no
processo de alfabetização, mas como em qualquer outro processo de aprendizagem.
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