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41047 Problemas Sociais Contemporâneos

Autor: SebentaUA, apontamentos pessoais E-mail: [email protected] Data: 2007/2008 Livro: Problemas Sociais Contemporâneos, edição UAB do ano de 2001, de Hermano do Carmo (coordenador) Caderno de Apoio: Nota: Apontamentos efectuados para o exame da disciplina no ano lectivo 2007/2008 O autor não pode de forma alguma ser responsabilizado por eventuais erros ou lacunas existentes. Este documento não pretende substituir o estudo dos manuais adoptados para a disciplina em questão.

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Problemas Sociais Contemporânea 1 – Estudar os problemas sociais 1.1- Dos problemas sociais aos problemas sociológicos O que são problemas sociais? Podemos apresentar desde já duas definições possíveis:

• Segundo Rubington e Weinberg (1995), um problema social é “uma alegada situação incompatível com os valores de um significativo número de pessoas, que concordam ser necessário agir para a alterar”.

• Para Spector e Kitsuse, um problema social é constituído pelo conjunto das acções que indivíduos ou grupos levam a cabo ao prosseguirem reivindicações relativamente a determinadas condições putativas.

Para que um problema social possa ser considerado problema sociológico deve possuir as condições de regularidade, uniformidade, impessoalidade e repetição. A problematização sociológica dos problemas sociais implica mesmo a des-construção destes, o desmantelar do significado social de maneira a criar um significado de acordo com o discurso científico. Os investigadores sociais debruçam-se sobre uma realidade autoconstruida e encontram representações sociais que moldam a realidade e condicionam os próprios investigadores. 1.1.1 – A questão do positivismo vs relativismo A sociologia positivista – defende a procura de leis sociais (à semelhança das leis do mundo natural) a partir de um método imdutivo-quantitativo, e advoga uma separação absoluta entre a Ciência e a Moral, isto é, entre os factos e os valores. Para a ciência positivista é possível conhecer objectivamente a realidade social, uma vez que existem critérios universais do conhecimento e da verdade. Ao abordar os problemas sociais, a sociologia positivista estuda situações objectivas, que são definidas como problemas em razão de características que lhe são próprias. Daí a necessidade de se conhecerem as suas causas e de se chegar à elaboração das leis que regem o fenómeno. A posição relativista segundo a qual não existe nenhum critério universal para o conhecimento e para a verdade. Todos os critérios utilizados serão sempre internos ao sistema cogniscente e, como tal, serão relativos e não universais. Consequentemente, a definição do que seja um problema social será sempre relativa, será antes de mais um rótulo colocado a determinadas situações, e não uma característica inerente à situação em si mesma. O que importa estudar é a definição subjectiva dos problemas sociais, conhecer os processos pelos quais uma dada situação se torna problema social. 1.1.2 – A aplicabilidade da ciência e o desenvolvimento teórico Um problema pressupõe uma solução. Os problemas sociais, que têm um significado social, requerem uma solução social. Desde o início, os sociólogos tentam equacionar o que Rubington e Weinberg denominam de mandato duplo:

• Por um lado, dar atenção aos problemas existentes na sociedade, numa perspectiva de correcção da realidade social, através dos conhecimentos empíricos adquiridos,

• Por outro lado, desenvolver teórica e metodologicamente a sociologia enquanto ciência.

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Hester e Eglin, seguindo Matza consideram que o primeiro tipo de perspectiva pode ser denominado de sociologia correctiva, que parte dos seguintes pressupostos:

• Equivalência de problema social a problema sociológico, • As questões sociológicas derivam das preocupações sociais, • O grande objectivo do estudo sociológico é a melhoria dos problemas sociais, • Preocupação central com as causas ou etiologia dos problemas, • Compromisso com os princípios positivistas da ciência.

Para estes autores, a sociologia correctiva falha nos seus propósitos precisamente porque não separa a aplicabilidade da ciência do seu corpus teórico-metodológico, e não reconhece os viezes que tal situação origina. Encara as pessoas como objectos e não como sujeitos constroem a realidade social. Sociologia de Intervenção – a sociologia de Intervenção não é uma especialidade ou ramo sociológico, mas sim um modo de ver o trabalho do cientista social que, em vez de isolar assepticamente o investigador do seu objecto de estudo, o desafia a ser “contaminado” por este, o leva a intervir activamente na realidade que estuda e a não separar os papeis de investigador e de cidadão. A investigação social deve ser utilizada para melhorar a sociedade, segundo princípios humanistas de solidariedade e de libertação. 1.2 – As perspectivas de estudo dos problemas sociais 1.2.1 – As perspectivas da Sociologia Positivista »»«« Patologia Social Os avanços e os sucessos de disciplinas já instaladas, como a biologia e a medicina, influenciaram profundamente os sociólogos a adoptarem a analogia do organismo ao seu objecto de estudo: a sociedade. Adoptaram igualmente um modelo médico de diagnóstico e de tratamento. Os problemas sociais são entendidos como doenças ou patologias sociais. O pensamento organicista, cujo autor mais consistente foi o britânico Herbert Spencer, defende que a sociedade e os seus elementos podem sofrer malformações, desajustamentos e doenças, à semelhança dos organismos vivos. Para a corrente da Patologia Social, um problema social é uma violação de expectativas morais (Rubington, Weinberg). A condição de saúde ou normalidade do organismo é definida por valorações do Bem e do mal. A patologia pode ser encontrada no indivíduo ou no mau funcionamento institucional. Os primeiros autores desta corrente, desde os meados do século XIX até cerca de I Guerra Mundial, enfatizaram sobretudo as mal formações dos indivíduos. Foi a perspectiva do Homem Delinquente da escola positiva italiana de criminologia, donde se destacaram Cesare Lombroso, Ferri e Garófalo. Para Cesare Lombroso, era claro que a explicação do comportamento criminal dos indivíduos estava em características fisiológicas particulares, como o tamanho dos maxilares, assimetria facial, orelhas grandes ou a existência de um número anormal de dedos. Esta corrente voltou a ganhar alguma importância na década de 1960, mas os novos patologistas sociais afastaram-se da procura de deficiência nos indivíduos e centraram-se antes nas deficiências na socialização. Segundo esta nova aproximação à patologia social, os problemas sociais seriam o resultado da incorporação de valores “errados” pelos indivíduos, fruto de uma “sociedade doente”. Neste sentido, a

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solução para os problemas sociais passaria necessariamente pela educação moral da sociedade e pela incorporação de valores moralmente correctos. Vytautas Kavolis propôs a conceptualização de patologia como sendo um comportamento destrutivo ou auto-destrutivo. Para Kavolis a definição de comportamento destrutivo seria possível em termos absolutos, isto é, igual em todas as sociedades humanas. »»«« Desorganização Social A perspectiva da patologia social dominou o estudo dos problemas sociais até sensivelmente ao fim da I Guerra Mundial. Com a década de 1920,a perspectiva da desorganização social ganha claramente terreno na sociologia norte-americana. Esta nova abordagem dos problemas sociais veio iniciar um período do pensamento sociológico mais voltado para o amadurecimento e para o desenvolvimento teórico e metodológico da sociologia enquanto ciência. Os autores da perspectiva da desorganização social utilizam um conceito claramente “sociológico” e que apresenta um maior potencial de operacionalização do que o conceito de patologia social. Os quatro teóricos mais importantes da desorganização social foram Charles Cooley, Thomas, Znaniecki e William Ogburn:

• Cooley teorizou a distinção entre grupos primários e secundários, sendo que nos grupos primários os indivíduos vivem relacionamentos face a face, mais intensos e duradouros, enquanto que nos grupos secundários as relações sociais são mais impessoais e menos frequentes. Cooley definiu a desorganização social como sendo a desintegração das tradições. As regras sociais deixam de funcionar.

• De forma semelhante, Thomas e Znaniecki, no seu estudo clássico sobre os imigrantes polacos, conceptualizaram a desorganização social como a quebra de influência das regras sociais sobre os indivíduos.

• O contributo de Ogburn centrou-se no conceito de desfasamento cultural (Cultural lag) que este autor propôs. Para a perspectiva da desorganização social, a sociedade não é um organismo mas sim um sistema composto por várias partes interdependentes.

Aos teóricos acima mencionados, gostaríamos de acrescentar os nomes de Robert Park, Ernest Burgess e Roderick McKenzie, os quais consideramos incontornáveis ao falarmos em desorganização social, no seguimento dos estudos que levaram a cabo sobre a organização espacial da cidade. Efectivamente, o fenómeno da urbanização é central para a perspectiva da desorganização social ao estar relacionado com o enfraquecimento das relações face a face e das tradições sociais. Park afirmou que a organização social se baseia nas tradições e nos costumes e que tudo o que perturba os hábitos sociais, isto é, a mudança social, tem potenciais efeitos desorganizadores. Passamos a apresentar as críticas apontadas por Marshal Clinard ao conceito de desorganização social:

• O seu poder explicativo para a sociedade em geral é reduzido, por ser um conceito demasiado vago e subjectivo.

• Confundiu-se desorganização social com mudança socialização • è um conceito fortemente sujeito aos julgamentos de valor do investigador, tal como o conceito de

patologia, • Aplicou-se o conceito de desorganização social a situações que não são de desorganização, mas

que, pelo contrário, traduzem outros tipos de organização, de que é um exemplo típico o que se passa nos bairros de lata.

• O sistema social pode acolher em si focos de desorganização ou a existência de comportamentos

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desviados sem que tal comprometa o seu funcionamento, • No seguimento da crítica anterior, ao constatarmos a existência de diferentes formas de

organização social, não podemos inferir que tal situação seja desastrosa para a sociedade, podendo pelo contrário ser indispensável para a manutenção da coesão social.

»»«« Conflito de valores Um outro modo de ver os problemas sociais é considerá-los como reflexo de um conflito de valores na sociedade relativamente a uma dada situação. Quer a corrente da patologia social, quer a da desorganização social, equacionaram os problemas sociais como condições objectivas, menosprezando a definição subjectiva que os indivíduos pudessem fazer da situação em causa. A perspectiva do conflito de valores, ao definir os problemas sociais em relação a valores ou interesses dos grupos sociais envolvidos, coloca em evidência a importância da definição subjectiva, sem a qual a condição objectiva de base não seria só por si um problema social. Os teóricos mais importantes desta corrente na sociologia norte-americana foram Richard Fuller e Richard Myers. Segundo estes autores, podem ser distinguidos três tipos de problemas que afectam as sociedades:

• Problemas físicos, • Problemas remediáveis (ameliorative) • Problemas morais.

Ainda segundo Fuller e Myers, os problemas sociais evoluem segundo três fases: • Inicialmente processa-se a tomada de consciência do problema, • Segue-se uma fase de determinação política, • Por fim a fase das reformas.

»»«« Comportamento desviado Em meados do século XX, a sociologia tinha já realizado um longo caminho no seu desenvolvimento teórico e metodológico, o número de sociólogos aumentava consideravelmente bem como o financiamento para pesquisas. Havia cada vez maior disposição para a integração entre teoria, pesquisa empírica e aplicação prática. Observou-se um clara tentativa de conciliar as duas grandes escolas que dominavam o pensamento académico da sociologia norte-americana:

• A Escola de Harvard, de ênfase teórica, • A Escola de Chicago, eminentemente empírica e descritiva.

Para Durkheim, o conceito de anomia significava uma ausência de normas, um quebrar das regras. O conceito de anomia em Merton é um tanto diferente: refere-se antes a um desfasamento entre metas culturais a atingir e os meios que a sociedade proporciona para o efeito. Daqui resulta que o comportamento desviado é entendido como normal em relação a situações anormais, concepção que já Durkheim tinha avançado. O comportamento desviado dependerá da assimilação das metas culturais e das normas institucionais, e da acessibilidade dos meios legitimados pela sociedade. Segundo Merton, o desfasamento entre meios e metas dá origem a quatro tipos de adaptação individual:

• A inovação, na qual as metas são mantidas mas são utilizados novos meios para as alcançar (ex.: roubar ou subornar),

• O ritualismo, pelo qual se renuncia às metas, mas se sobrevalorizam os meios, • A evasão, na qual tanto os meios como as metas são renunciados (ex.: alcoolismo) • A rebelião, quando se pretende instaurar novas estruturas de metas e de meios.

Também a Universidade de Chicago influenciou a perspectiva do Comportamento Desviado. É aí que Edwin Sutherland desenvolve a teoria da associação diferencial.

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Sutherland, mais tarde em parceria com Donald Cressey, apresenta em nove pontos este processo de génese do comportamento criminoso: Página 39. Em meados dos anos 50 Albert Cohen, na sua teoria da subcultura delinquente, sustentou que os jovens da classe trabalhadora enfrentavam uma situação de anomia no sistema escolar, pensado segundo os valores da classe média. Outra teoria de síntese foi proposta por Richard Cloward e Lloyd Ohlin nos anos 60, na sua teoria da oportunidade, estes autores sustentam que não basta considerarmos a estrutura de oportunidades legítimas na génese do comportamento delinquente: é igualmente essencial ter em conta a estrutura de oportunidades ilegítimas. A perspectiva do comportamento desviado entende que os problemas sociais reflectem, de forma mais ou menos directa, violações das expectativas normativas da sociedade, sendo que todo o comportamento que viola essas expectativas é um comportamento desviado. 1.2.2 – As perspectivas da Sociologia Relativista Neste ponto iremos abordar três perspectivas que seguem uma visão relativista da ciência, de base interaccionista (o labeling e o constructivismo social) e estruturalista (a perspectiva crítica). Nelas se defende, em oposição ao positivismo, que o conhecimento é socialmente construído. »»«« Labeling Teoria do Labeling ou teoria da rotulagem, consideramos importante referir sumariamente as suas bases filosóficas assentes no interaccionismo simbólico. Mead, concebeu a formação do Ego como o resultado das interacções sociais, os indivíduos aprendem a ver-se como objectos sociais e comportam-se de acordo com essa percepção. Herbert Blumer desenvolveu a ideia de que os significados não são dados, mas requerem uma interpretação activa por parte dos actores sociais envolvidos. Erving Goffman introduziu o conceito de identidade social, para se referir às qualidades pessoais que permanecem constantes em diferentes situações. Se as reacções forem negativas, as pessoas podem ser forçadas a aceitar uma “spoiled identily”, processo que Goffman define como estigmatização. Para a teoria de Labeling, os nomes pioneiros da perspectiva propriamente dita são indiscutivelmente os de Edwin Lemert e Howard Becker. Lemert defendeu, no inicio dos anos 50, a teoria de que o desvio primário e desvio secundário. Esta distinção de conceitos baseia-se numa outra distinção que Lemert estabeleceu entre comportamento desviado e papel social desviado. A reacção ao desvio primário está assim na origem do desvio secundário. Segundo Lemert, a sequência de interacção que leva ao desvio secundário pode ser esquematizado com a seguinte evolução:

• Ocorrência do desvio primário, • Sanções sociais, • Recorrência do desvio primário, • Sanções sociais mais pesadas e maior rejeição social, • Continuação do desvio, • O coeficiente de tolerância chega a um ponto critico, • Fortalecimento do comportamento desviado como reacção à estigmatização e às sanções, • Aceitação do estatuto de desviado por parte do individuo estigmatizado e consequentes

ajustamentos com base no novo papel social. Esta perspectiva é reforçada por Howard Becker ao introduzir o conceito de Labeling.

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Becker defendeu que o comportamento desviado é aquele que a sociedade define como desviado. Os problemas sociais, tal como os comportamentos desviados, são definidos pelas reacções sociais a uma alegada violação das normas ou expectativas sociais, e podem ser ampliados por essas mesmas reacções. Para que alguém seja rotulado de desviado é necessário percorrer uma série de fases sequenciais, num processo de interacção dinâmico, a que Becker apelidou de carreira desviante. O que a perspectiva do Labeling constatou é que nem todos os que violam as normas são rotulados de desviados, o que nos leva a considerar que, em última instância, todo este processo traduz uma certa equação do poder na sociedade: quem define as regras, quem aplica os rótulos, quem é rotulado. »»«« Perspectiva Crítica A perspectiva crítica, também denominada de perspectiva radical, veio a centrar-se na questão da influência do poder na definição dos comportamentos desviados e dos problemas sociais, e numa concepção alargada da contextualização social do desvio. A fundamentação desta corrente encontra-se no pensamento marxista. Assume, portanto, uma postura de conflito na génese dos problemas sociais. Segundo a tradição marxista, os modos de produção da infra-estrutura económica determinam relações sociais distintas. Para a perspectiva crítica, os problemas sociais advêm das relações sociais impostas pelo modo de produção, e traduzem a necessidade de controle da classe capitalista e a necessidade de resistência e acomodação das classes exploradas. O tipo e a gravidade dos problemas sociais ficam particularmente dependentes das condições económicas conjunturais e da consciência de classe que os trabalhadores possam ter. A solução para os problemas sociais reside, em última instância, na mudança (de preferência revolucionaria) do sistema social de classes para uma sociedade sem classes, isto é, sem exploração humana, sem injustiças e sem desigualdades. O surgimento da corrente crítica e a sua influência no pensamento sociológico datam dos anos 70. Os autores mais significativos desta abordagem foram os sociólogos britânicos Ian Taylor, Paul Walton e Jock Young. Segundo Taylor, Walton e Young, o desvio deve ser analisado de forma materialista e histórica:

• Materialista – porque deve ser analisado o contexto material no qual surge o desvio, • Histórica – porque se deve relacionar o desvio com a evolução histórica dos modos de produção.

»»«« Constructivismo Social Ao falarmos aqui em constructivismo social estamos a referir-nos a correntes teóricas cuja ideia central e geradora é a de que as pessoas criam activamente a sociedade.3 Os autores que introduziram formalmente esta perspectiva foram Peter Berger e Thomas Luckmann. Estes autores defendem que a sociedade é uma produção humana e o Homem é uma produção social. Para estes sociólogos, a sociedade é ao mesmo tempo uma realidade objectiva e subjectiva.

• É objectiva porque é exteriorizada, relativamente aos actores sociais que a produzem, e é objectivada, sendo constituída por objectos autónomos dos sujeitos sociais. A condição objectiva do problema social é, portanto, posta de lado pela perspectiva constructivista, pois esta não é essencial para a existência de um problema.

• É uma realidade subjectiva porque é interiorizada através da socialização. É a definição subjectiva do problema social que se revela essencial para a existência do mesmo e como tal só esta deve ser investigada pelos sociólogos. Problemas como a violência conjugal, o trabalho infantil, a discriminação das mulheres ou a poluição ambiental são exemplos de situações que só se convertem em problemas sociais quando estabeleceu com sucesso um movimento de reivindicação que definia estas situações como problema.

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Um problema social só se constitui em razão de todo um processo de reivindicação e reacção social.

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2 – Perspectivas político-doutrinárias sobre os problemas sociais 2.1 – Os problemas sociais e a alteração do papel do estado 2.1.1 – O estado protector A progressiva centralização do poder nas mãos do soberano que se registou concomitantemente com a desagregação da sociedade do Ocidente medieval, deu origem a um modelo de Estado a que alguns autores chamaram Estado Protector. Partindo da ideia de que o poder não é uma simples capacidade de obrigar, mas que traduz a resultante da tensão entre tal capacidade e a vontade de obedecer. Quadro da página 56. Para garantir a eficiência do estado Protector, o príncipe recorreu a dois tipos de pessoas:

• Por um lado, aos politico profissionais e semi-profissionais, • Por outro, aos funcionários profissionais que pouco a pouco foram aumentando na Europa.

2.1.2 – O Estado Providencia Com a revolução industrial e a emergência de problemas económicos e sociais que daí resultaram, O Estado foi chamado a assumir funções de regulação e de orientação progressivamente maiores. Para realizar tal finalidade, o seu aparelho administrativo teve de assumir uma dimensão progressivamente maior, com uma organização cada vez mais complexa e uma pilotagem progressivamente mais profissionalizada. Quadro da página 58. 2.2 – As perspectivas liberais Duma forma simplificada pode dizer-se que a perspectiva liberal foi resultado de uma lenta sedimentação de natureza económica, doutrinária e politica que ocorreu na Europa a partir do século XV. 2.2.1 – Génese O liberalismo deve ser compreendido no sentido mais global (como uma) doutrina baseada na denúncia de um papel demasiado activo do estado e na valorização das virtudes reguladoras do mercado. Quadro página 60. 2.2.2 – As teses E esta a tese defendida por grande parte dos principais autores do liberalismo positivista clássico, como Adam Smith, Jeremias Bentham, Burke, Humbold, do liberalismo utópico como Paine e Godwin e do neoliberalismo como Robert Nozick ou John Rawls. Em todos estes autores encontramos uma forte critica à excessiva dimensão do estado, variando no entanto, nos critérios definidores das suas funções e na definição do seu campo de actuação. E o caso, mais recente, da corrente neoliberal, que deve ser entendida como uma critica, da crítica à economia do mercado. Para discutir esta questão, Rosanvallon (1984) parte da teoria das internalidades. De acordo com esta teoria, a acção do estado tem, com frequência, efeitos imprevistos (internalidades), que pervertem as intenções de justiça e de promoção do Bem-Estar das suas politicas. No que respeita aos problemas sociais económicos, o pensamento liberal tem evoluído, ainda que partilhe de uma ideia comum: o mercado é melhor regulador que o estado e, por consequência, os problemas socio-económicos devem ser atacados predominantemente pela sociedade civil. Em suma – a posição liberal face aos problemas socio-económicos pode resumir-se em dois aspectos:

• A maior parte dos problemas sociais e económicos resultam de uma excessiva intervenção do estado,

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• A resolução dos problemas sociais e económicos deveria ser deixada aos mecanismos (naturais) de auto-regulaçao do mercado.

2.2.3 – As limitações Em traços gerais os críticos à perspectiva liberal apontam-lhe as seguintes limitações:

• Os limites da acção do Estado são, em regra, insuficientemente operacionalizados, • Os efeitos imprevistos do funcionamento do mercado que condicionam fortemente a emergência e o agravamento dos problemas socio-económicos não são convenientemente equacionados.

Suzanne de Brunhoff – a conjuntura é vista como um cenário de guerra económica o que implica, por parte dos decisores políticos, uma atitude de nacionalismo económico. Neste contexto, as funções económicas e sociais do estado procuram atingir dois objectivos:

• Reforçar a frente de combate económica, • Ajudar a tratar dos feridos da guerra económica.

2.3 – As perspectivas marxistas 2.3.1 – Génese O pensamento marxista enquadra-se historicamente na Europa do século XIX, em plena revolução industrial, na tentativa de analisar a sociedade coeva e de propor soluções para as disfunções sociais que então se viviam. Quadro página 64. 2.3.2 – As teses O pensamento de Marx relativamente ao papel do estado não é idêntico ao longo da sua obra, nela se encontrando:

• Desde uma posição idealista, • Passando pela afirmação de que o estado era uma expressão da alienação humana semelhante à religião • Ao direito e à moralidade, • Até à afirmação de que poderia desempenhar, apesar de todas as criticas, algum papel positivo em favor das classes oprimidas.

Se esta constatação acrescentarmos que, na perspectiva marxista, os problemas económicos e sociais são resultantes, em última análise, da situação de exploração de uma classe em beneficio de outra num cenário de permanente luta de classes, poderemos entender as duas estratégias defendidas por esta corrente, consoante detenha ou não o controlo do estado:

• Quando o Estado não é controlado pela classe trabalhadora, às organizações desta classes cabe fazer pressão, • Quando o estado é controlado pela classe trabalhadora, neste sentido, deve-lhe competir um papel dominante no planeamento e organização da economia e da protecção social.

2.3.3 – As limitações As críticas, podemos agrupá-las em dois:

• Do ponto de vista doutrinário, provocou danos elevados na coesão social, colocando as classes sociais umas contra as outras, • Do ponto de vista político, falta de eficácia e de eficiência.

2.4 – As perspectivas conciliatórias Procurando conciliar as doutrinas liberal e marxista, emergiu uma terceira tendência no século XIX que veio dar origem ao que se convencionou de Estado-Providencia.

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2.4.1 – Os fundamentos Os fundamentos da intervenção do estado relativamente aos problemas sociais e económicos podem encontrar-se na constatação de efeitos imprevistos (positivos ou negativos) do funcionamento do mercado a que Pigou, em 1920, chamou externalidades. A teoria das externalidades servia, assim, de suporte para legitimar a intervenção do estado no próprio interior da lógica liberal, criando paradoxalmente uma fonte inesgotável de motivos de extensão do estado-regulador. 2.4.2 – Os pilares do estado Intervencionista A expressão Estado-Providencia surge na França do segundo império. Em grandes linhas pode dizer-se que este modelo de Estado integrou três tipos de contribuições principais:

• O primeiro pilar: o seguro obrigatório de Bismarck O primeiro passo para a construção do modelo de Estado intervencionista foi dado na Alemanha, nas décadas de 1870 e1880, por iniciativa dos governos de chanceler Bismarck. Num conjunto de leis que procuraram melhorar a protecção social dos trabalhadores através de mecanismos de seguro obrigatório, numa altura em que os sistemas de protecção eram meramente mutualistas. As leis estruturantes de tal sistema foram as seguintes: *** Lei da responsabilidade limitada dos industriais em caso de acidente de trabalho (1871), *** Lei do seguro obrigatório (1881), *** Leis do seguro-doença (1883), dos acidentes de trabalho (1884), e do seguro velhice-invalidez (1889). • O segundo Pilar: a teoria intervencionista de Keynes Foi dada pelo economista John Maynard Keynes que mostrou a forma como o capitalismo de mercado podia ser estabilizado através da gestão da procura e da adopção de um sistema de economia mista. Os princípios defendidos por este autor, aplicados para combater a crise de 1929 pelo Presidente americano Franklim Roosevelt na política do New Deal, basearam-se numa vigorosa intervenção estatal através de investimento públicos que criaram muitos empregos. Ao faze-lo, aumentaram o poder de compra das famílias o que provocou um crescimento da procura, revitalizou a economia e, por consequência, reduziu os problemas sociais e económicos. • O terceiro pilar: o relatório Beveridge E, em plena segunda guerra mundial (1942), com o Relatório Beveridge, que se lançam as bases recentes dos sistemas de segurança social, de acordo com quatro princípios: *** O principio da universalidade, *** O principio da unicidade (de inputs do sistema), *** O principio da uniformidade (de outputs do sistema), *** O principio da centralização (organizacional).

2.4.3 – A situação actual Os ingredientes básicos que proporcionaram consistência politica a este modelo de estado intervencionista, foram três:

• O pleno emprego como objectivo estratégico, a organização da protecção social em torno de um sistema de serviços universais ou quase universais para a satisfação das necessidades básicas e • O empenhamento em manter um nível nacional mínimo de condições de vida.

Com as duas crises de petróleo ocorridas nos anos 70, iniciou um período de recessão que teve dois efeitos conjugados:

• Por um lado, aumentou a procura de Estado, devido ao crescimento do desemprego provocado pela recessão económica, • Por outro lado, a diminuição das contribuições, condicionou a redução da oferta de Estado.

2.5 – Em Portugal 2.5.1 – A perspectiva intervencionista na evolução constitucional

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Procura registar algumas características das constituições portuguesas desde 1822: • As constituições do período monárquico, • A primeira constituição republicana, de1911 – assunção da educação como dever de estado, • A constituição de 1933 é intervencionista, num quadro doutrinário corporativista.

Quadro página 73. • A constituição de 1976 foi também intervencionista, mas fortemente influenciada pela perspectiva marxista, nomeadamente no que respeita ao controlo da actividade económica social e politica.

2.5.2 – A perspectiva intervencionista na evolução do planeamento Outro indicador interessante, revelador do modo como evoluiu o interesse político pelos problemas sociais e económicos é a sua presença no planeamento. Em Portugal, a primeira experiência de planeamento, no sentido que hoje lhe damos, parece ter surgido apenas em 1935, com a Lei 1914 de 24 de Maio, que ficou conhecida por lei da Reconstituição Económica. O primeiro Plano de Fomento (1953-58). Quadro página 75. O segundo Plano de Fomento (1959-64) – foi então criado o Banco de Fomento Nacional. Com o Plano Intercalar (1965-67) O terceiro Plano de Fomento (1968-73), onde são explicitadas medidas de Planeamento Regional. No quarto Plano de Fomento (1973-79). O primeiro esforço de planeamento após revolução regista-se no Plano Económico e Social (1975). A Constituição de1976.

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3 – Grandes problemas ambientais »»«« Gestão de água

• Disponibilidade de água • Qualidade de água

»»«« Efeito de estufa e alterações climáticas

• Introdução • Alterações climáticas • Protocolo de Quioto – o encontro mundial onde pela primeira vez se regulamentaram as emissões do gases com efeito de estufa foi a III Conferencia das Partes da Convenção – quadro das Alterações Climáticas ocorridas em Quioto em 1997, onde vários países assinaram um protocolo no sentido da redução global. O protocolo de Quioto foi um pouco mais além e permitiu ainda a implementação de mecanismos de mercado denominado “mecanismos de Quito”. Estes mecanismos permitem o comércio de emissões entre países industrializados, a implementação conjunta entre países industrializados, a cooperação entre países industrializados e em desenvolvimento para implementação de mecanismos de tecnologias limpas. • O encontro em Buenos Aires – na IV Conferencia das Partes da Convenção – Quadro das Alterações Climáticas ocorrida em Buenos Aires em 1998, mais alguns passos foram dados, tendo sido acordado um plano de acção finalizada no ano 2000 e do qual se destacam: *** Os mecanismos de financiamento para apoiar os países em desenvolvimento relativamente aos efeitos adversos das alterações climáticas, nomeadamente através de medidas de adaptação, *** O desenvolvimento e transferência de tecnologias para os países em desenvolvimento, *** As actividades implementadas conjuntamente, *** O programa de trabalho dos Mecanismos de Quioto, com prioridade no desenvolvimento de mecanismos de tecnologias limpas.

»»«« rarefacção da camada de ozono

• Introdução Camada de ozono – esta camada funciona como filtro às radiações solares ultra-violetas B, que são prejudiciais à fauna, flora e saúde humana, sendo responsáveis pelo desenvolvimento precoce do cancro de pele, aparecimento de cataratas e diminuição da capacidade do sistema imunitário. • O protocolo de Montreal Em 1988, acerca de 40 países assinaram o protocolo de Montreal que pretendeu assinalar a preocupação da comunidade internacional relativamente aos problemas do ozono e que visa, entre outras medidas, alcançar uma redução de 50% na utilização de CFCs 1999.

»»«« Biodiversidades

• Introdução Biodiversidade para designar a diversidade de habitats e espécies existentes nos diferentes ecossistemas. • Diminuição da biodiversidade • Biodiversidade aplicada A diversidade genética dos seres vivos, deve ser guardada, constituindo-se bancos de genes para a utilização futura. A biotecnologia e a engenharia genética podem contribuir para a criação de novos organismos transgénicos, com capacidades até então inexistentes. • Protecção da biodiversidade A preservação da biodiversidade tem um grande impacte social. Este facto foi abordado na Conferencia de Rio em 1992.

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»»«« Desertificação e desflorestação

• Introdução E a este processo, natural ou artificial, que leva à redução da área coberta com um sistema florestal que se dá o nome de desflorestação. Ao processo regressivo em que os ecossistemas tendem para situações de deserto, dá-se o nome de desertificação. • Floresta e biodiversidade Saelizaçao – processo regressivo em que os ecossistemas tendem para situações de pré-deserto. • Medidas futuras Os impactes antropogénicos sobre a floresta são demasiado alarmantes para que não se tome qualquer atitude. Muitas soluções que se propõem são político-económicas, mas o problema tem importância social e ética.

»»«« Resíduos

• Introdução Resíduo – qualquer substancia ou objecto de que o detentor se desfaz ou tem intenção ou obrigação de se desfazer. • Resíduos sólidos urbanos (RSU) • Resíduos industriais • Medidas futuras.

»»«« Instrumentos de Politica de Ambiente

• Enquadramento Em 1984 foi constituída pela assembleia-geral das Nações Unidas, a Comissão Mundial para o Ambiente e o desenvolvimento (CMAD), como um órgão independente e integrado por 21 países Desenvolvimento sustentável – tal como enunciado no relatório Brundtland, define-se desenvolvimento sustentável como o desenvolvimento que satisfaz as necessidades das gerações actuais, sem com isso comprometer a possibilidade das gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades. O desenvolvimento sustentável envolve, assim, a integração das políticas socio-económicas e ambiente. Agenda 21, com o objectivo de preparar o mundo para os desafios do século XXI face aos actuais problemas de ambiente e desenvolvimento, contendo programas de acção detalhados e bem fundamentados numa variedade de matérias, desde a gestão da água à pobreza. • Estratégias para a implementação da Agenda 21

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4 – Problemas demográficos 4.1 – Explosão demográfica 4.1.1 – Evolução da população mundial »»«« Evolução da população mundial

• Até ao século XVIII – até ao século XVIII, o crescimento da população foi lento, ainda que a taxa da natalidade fosse alta a taxa da mortalidade era também muito alta. Taxa de natalidade – numero de dados vivos ocorridos durante um certo período de tempo, normalmente o ano, referido à população média desse período. Taxa de mortalidade – numero de óbitos ocorridos durante um certo período de tempo, normalmente o ano, referido à população média desse período. • De 1750 até 1950 Melhores condições sanitárias, permitiram uma baixa da taxa da mortalidade e um aumento da esperança média de vida. Consequentemente um grande aumento populacional que incidiu, sobretudo, na Europa a América do Norte. • De 1950 até 1999 A partir da II Grande Guerra Mundial, nos países menos desenvolvidos verificou-se uma acentuada melhoria das condições de vida, no acesso a cuidados médicos e a água potável permitindo um decréscimo da mortalidade. • 1999 – O ano dos seis biliões A 12 de Outubro de 1999 o planeta atingiu 6 mil milhões de habitantes. E, pela primeira vez na historia da humanidade, com um quantitativo populacional muito jovem. • DE 1999 até 2050 Prevê-se que a população mundial continue a crescer nos próximos 50 anos.

»»«« Causas principais do crescimento demográfico Podemos apontar como principais causas do crescimento da população, que se verifica nos países menos desenvolvimento, a baixa da taxa da mortalidade e a persistência de uma elevada taxa da fecundidade. Ainda que se tenham verificado alterações, no sentido de baixar a natalidade, esta continua a ser elevada, podendo apontar-se como causas:

• Estatuto e papel da Mulher centrados na maternidade, • Valor da criança, • Mortalidade infantil elevada, • Baixo nível educacional da mulher, • Planeamento familiar reduzido e baixo uso de contraceptivos.

»»«« Consequências principais do acelerado crescimento demográfico Página 129. Quadro página 139. 4.2 – Envelhecimento demográfico ou populacional 4.2.1 – Envelhecimento da população Assiste-se hoje, na generalidade das sociedades mais desenvolvidas, ao fenómeno do envelhecimento demográfico ou populacional, ou seja, ao aumento da percentagem relativa de indivíduos com 65 e mais anos de idade no conjunto da população total. 4.2.2 – Evolução da população por grupos etários nas grandes Regiões. 4.2.3 Causas do envelhecimento demográfico O envelhecimento demográfico ou populacional deriva de uma de três principais razoes:

• A primeira consiste no envelhecimento natural do topo, resultante do acréscimo da percentagem da população idosa, em consequência de tendências demográficas endógenas normais. O acréscimo do numero de indivíduos com 65 e mais anos resulta, da baixa da taxa de mortalidade e

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da mortalidade infantil, com consequente aumento da esperança média de vida. • Uma segunda razão, refere-se ao envelhecimento artificial do topo, que acrescenta à primeira, a concentração de idosos em regiões particularmente atraentes, devido, entre outras causas, às boas condições climáticas e existência de serviços especializados. • Por fim, há a considerar o envelhecimento natural na base, resultante da quebra da natalidade, característica de sociedades urbanas e industriais, com a consequente redução progressiva da camada mais jovem, no total da população.

4.2.4 – Consequências do envelhecimento populacional ou demográfico »»«« Consequências Económicas e Sociais A nível económico, o aumento da população idosa acarreta maiores custos com a segurança social (com pensões e reformas), com a saúde (hospitais e medicamentos), com a criação de infra-estruturas (lares, centros de dia). »»«« Consequências politicas Politicamente os mais idosos terão maior peso eleitoral, podendo, de forma indirecta, alterar o funcionamento da sociedade e da economia. »» «« Consequências individuais do envelhecimento Quer a nível físico quer a nível individual e social os mais idosos têm maior tendência para se sentirem mais isolados e excluídos da sociedade.

• Consequências físicas • Consequências económicas e sociais.

4.2.5 – Tendências do envelhecimento populacional

• A maioria da população com 60 e mais anos viverá em países mais desenvolvidos, • O maior acréscimo da população com 60 e mais anos dar-se-á nos países menos desenvolvidos, • Feminizaçao da população envelhecida, • Estima-se que aumente o numero de pessoas com 80, 90 e 100 anos, • Redução do numero de activos por cada idoso.

4.2.6 – Possíveis estratégias de intervenção Quadro página 143. 4.3 – Migrações Migrações – entende-se o movimento de uma população, temporário ou permanente, de um local físico para outro. A migração envolve necessariamente uma transição social bem definida, implicando por regra uma mudança de estatuto ou uma alteração no relacionamento com o meio envolvente, quer físico quer social. 4.3.1 – Classificação das migrações As migrações podem ser classificadas em:

• Migrações internas • Migrações internacionais

»»«« Migrações Internas Por migrações internas, entendem-se os movimentos definitivos ou sazonais das populações dentro de um país, território ou área restrita:

• Classificação das migrações internas: *** Definitivas, *** Sazonais. • Causas das migrações internas, exemplos: *** Ordem económica,

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*** Ordem não económica: ecológicas, Sociais. • Consequências das migrações internas: A principal consequência das migrações internas é a crescente urbanização que trará problemas sérios a vários níveis: *** Ao nível demográfico – desertificação do interior e zonas rurais que contribui para o envelhecimento destas regiões e ao aumento da densidade populacional nas áreas urbanas dando origem a mega cidades. *** Ao nível familiar – o abandono de mulheres, crianças, e idoso, enquanto os homens vão para as cidades, *** Ao nível social – desemprego ou subemprego, baixos salários, bairros com precárias condições de vida, tensões sociais e pressão sobre os sistemas de prestações de serviços.

»»«« Migrações internacionais Por migrações internacionais entendem-se os movimentos populacionais que ocorrem entre países. Considera-se emigrante o indivíduo que sai do seu pais para ir trabalhar para outro país.

• Migrações internacionais. Alguns factores No estudo das migrações internacionais deve-se ter em conta diversos factores, por exemplo: *** Natureza das motivações – de deslocação, em que se enquadram as migrações politicas (guerras, revoluções, perseguições étnicas ou religiosas) e as migrações económicas (desemprego, baixos salários, más condições de vida), *** Distancia percorrida – que poderá envolver grandes distancias, ou curtas distancias, *** Duração de permanência – que poderá ser definitiva (geralmente é o caso das migrações transoceânicas, como, no passado, as de Portugal para o Brasil) ou temporária (migrações sazonais, anuais ou plurianuais, contratos por temporada, ex: na construção civil ou na área da agricultura). *** Duração do fluxo, *** A estrutura familiar dos grupos migrantes, *** As qualificações dos migrantes, *** Proximidade cultural entre os migrantes e a população anfitriã • Causas das migrações internacionais Podemos distinguir como principais causas dos fluxos migratórios internacionais. *** As de ordem económica – as que se referem fundamentalmente, a questões de natureza laboral, *** As de ordem não económica – que podem ser de vária natureza, nomeadamente: 1. Politicas – guerras, revoluções, perseguições, 2. Demográficas – maior densidade populacional, 3. Sociais – falta de infra-estruturas sociais, escolas, hospitais, etc, 4. Religiosas/Culturais – 5. Familiar 6. Pessoal

• Consequências da Migrações Internacionais As desigualdades económicas, cada vez maiores, entre os países mais desenvolvidos e os países menos desenvolvidos, e as pressões politicas, ecológicas e demográficas, levarão a que um número cada vez maior de indivíduos procure outros países. • Consequências para o País de destino As consequências são fundamentalmente de três ordens, económicas, demográficas e socio-políticas: *** Ordem económica *** Ordem demográfica *** Ordem socio-política • Consequências para os países de origem *** Ordem económica – por exemplo: contribuição financeira dos seus emigrantes através do envio de remessas, redução da população activa qualificada, *** Ordem demográfica – por exemplo: envelhecimento das suas populações,

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*** Ordem social – por exemplo: abandono de mulheres e crianças, contacto com outras culturas e tradições que poderão levar à extinção de determinadas praticas tradicionais ou à adopção de praticas novas como, por exemplo: maior recurso às técnicas de planeamento familiar. • Tendências das migrações internacionais para os próximos 20 anos: *** Globalização das migrações – tendência para que um maior numero de países seja afectado ao mesmo tempo por movimentos migratórios, oriundos de uma maior diversidade de áreas, *** Crescimento das Migrações – tendências para que o volume dos movimentos migratórios se torne cada vez maior, *** Indiferenciaçao das Migrações – inicialmente os movimentos migratórios eram de um só tipo; por exemplo, ou só de trabalhadores ou só de refugiados. Hoje, assiste-se a movimentos migratórios simultâneos, da vários tipos, *** Feminizaçao das Migrações – • Processo migratório internacional: o modelo das 4 fases: Quadro página 158.

4.4 – Politicas demográficas ou politicas da população 4.4.1 – Evolução da população mundial 4.4.2 – Politicas demográficas. O que são? Politicas demográficas – o conjunto de medidas tomadas pelas entidades governamentais, que de forma directa ou indirecta, visam alterar a evolução da população. Estas alterações do movimento da população podem ser feitas com base nas áreas do processo populacional, ou seja:

• Da natalidade, • Da mortalidade, • Das migrações (internas ou internacionais).

»»«« Politicas demográficas ou da população na área da natalidade As políticas na área da natalidade tem como principal objectivo alterar o volume dos nascimentos, para o aumentar, manter ou baixar. Temos assim, três tipos de politicas:

• Politicas Natalistas – que visam o aumento da taxa da natalidade, • Politicas Anti-natalistas – que visam a diminuição da taxa da natalidade, • Politicas de Neutralidade – cujos resultados variarão de acordo com as circunstâncias de cada país.

Da analise geral dos dados, constata-se que , a nível mundial, predominam as politicas anti-anatalistas, de maneira geral embora nas regiões mais desenvolvidas (com destaque para a Europoa9 se privilegiem as politicas para aumentar a fecundidade, dado o seu do índice sintético de fecundidade, ser baixo não permitindo a renovação das gerações e ainda, provocando o envelhecimento das populações. Medidas natalistas e da família – Exemplos: As medidas adoptadas para o aumento da natalidade, podem ser directas ou podem ser indirectas (como são as politicas da família que incidem nas áreas dos abonos). Vejamos áreas de possível intervenção:

• Área dos benefícios fiscais • Área das infra-estruturas sociais, • Área do apoio à maternidade • Área da legislação, • Área laboral.

»»«« Politicas anti-natalistas ou neomalthusianas As medidas adoptadas para a diminuição da natalidade, podem como as anteriores, ser directas ou indirectas:

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Quadro página 173. »»«« Politicas sem intervenção especifica na área da natalidade. Politicas de imigração Face à baixa da taxa da natalidade e ao consequente envelhecimento populacional, alguns países adoptam medidas populacionais. A adopção destas medidas permite o aumento do seu efectivo populacional com o aumento da natalidade, acréscimo da população activa e rejuvenescimento demográfico, uma vez que quem imigra, maioritariamente são os jovens.

• Politicas que podem influenciar as migrações. As medidas poderão ser adoptadas, por exemplo, com base em: *** Factores profissionais – limitando a entrada de indivíduos estrangeiros consoante a qualificação que possuam, *** Factores sanitários – recusando a entrada de indivíduos com base no seu cadastro criminal ou ainda, com base em controlos sanitários destinados a impedir a entrada de indivíduos portadores ou potenciais portadores de determinadas doenças, *** Factores étnicos e raciais – adoptando medidas tendentes a beneficiar determinadas etnias em detrimento de outras.

Quadro página 175. 4.4.3 – Conferencias mundiais sobre a população Com diferentes situações demográficas a nível mundial, surgiu a preocupação de se discutirem as questões relacionadas com o crescimento demográfico, a mortalidade e migrações e a tomada de medidas no sentido de melhor se solucionarem os vários problemas. Neste âmbito, forma organizadas, pela Organização das Nações Unidas até hoje, três conferencias mundiais sobre a população:

• Conferencia Mundial de Bucareste (1974), • Conferencia Internacional do México sobre a População (1984), • Conferencia Internacional do Cairo sobre a População e desenvolvimento (1994).

As três conferencias mundiais partem da premissa de que o crescimento da população é um potencial obstáculo ao desenvolvimento económico e que o bem estar das populações passa por uma estratégia de limitação do crescimento populacional. Em relação às outras duas conferências, a conferência do cairo, introduziu uma nova ênfase no programa de acção mundial: a importância social atribuída às mulheres e aos direitos da saúde reprodutiva. Quadro página 177.

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5 – Globalização económica 5.1 – Introdução Este capítulo apresenta os principais conceitos usados na análise dos determinantes da globalização, assim como a moldura analítica básica necessária para a compreensão das relações entre globalização, desnacionalização e vulnerabilidade externa. O argumento central é que o processo de globalização económica provoca relações mais complexas e profundas de interdependência entre economias nacionais e, no caso de alguns países (Brasil e, basicamente, toda a América Latina) essas relações levam à consolidação ou ao agravamento de uma situação de vulnerabilidade externa. O investimento externo directo refere-se a todo o fluxo de capital estrangeiro destinado a uma empresa (residente) sobre a qual o estrangeiro (não-residente) exerce controlo sobre a tomada de decisão. “Empresa de capital estrangeiro” (ECE) trata-se, em alguns momentos, da empresa-matriz (não-residente) e, noutros, da filial ou subsidiária (residente) no país. A ECE é também referida, às vezes, como empresa internacional, multinacional, transnacional ou, mais simplesmente, como empresa estrangeira. 5.2 – Da internacionalização à globalização A globalização pode ser definida como a interacção de três processos distintos que têm ocorrido ao longo dos últimos vinte anos e afectam as dimensões financeiras, produtiva, comercial e tecnológica das relações económicas internacionais. Esses processos são:

• A expansão extraordinária dos fluxos internacionais de bens, serviços e capitais, • a ocorrência desenfreada nos mercados internacionais, • a maior integração entre os sistemas económicos nacionais.

a) O primeiro processo refere-se à expansão extraordinária dos fluxos internacionais de bens, serviços e capitais. De facto, houve uma extraordinária expansão dos fluxos de capitais em todos os mercados que compõem o sistema financeiro internacional (títulos, acções, empréstimos, financiamentos, moedas e derivados). No que se refere ao processo de globalização na esfera produtiva, deve-se ressaltar que a internacionalização da produção ocorre sempre que residentes de um país têm acesso a bens e serviços com origem noutros países. Esse acesso pode ocorrer por meio do comércio internacional, investimento externo directo e relações contratuais. O investimento externo directo significa que um agente económico estrangeiro actua na economia nacional por meio de subsidiárias e filiais, enquanto as relações contratuais permitem que agentes económicos nacionais produzam bens ou serviços que têm origem no resto do mundo. A partir de meados dos anos 80 houve um aumento extraordinário dos fluxos de investimento externo directo e das relações contratuais, assim como da actuação das empresas transnacionais. b) O segundo processo característico da globalização é o acirramento/agitação da concorrência internacional. Há uma rivalidade cada vez maior no sistema económico mundial. Deve-se notar, ainda, que grupos transnacionais também passaram a actuar mais directamente no sistema financeiro internacional por intermédio de instituições financeiras próprias. c) O terceiro processo refere-se à crescente integração dos sistemas económicos nacionais. Esse processo manifesta-se quando, no caso da globalização financeira emitidos por residentes está nas mãos de não-residentes e vice-versa.

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A especificidade da globalização económica no final do século XX consistiu na simultaneidade dos processos de crescimento extraordinário dos fluxos internacionais, “acirramento” da concorrência no sistema internacional e integração crescente entre os sistemas económicos nacionais. 5.3 – Determinantes da globalização Os determinantes da globalização podem ser agrupados em três conjuntos de factores:

• Tecnológicos • Institucionais, • Sistémicos.

a) O primeiro conjunto de determinantes da globalização económica refere-se aos desenvolvimentos tecnológicos associados à revolução da informática e das telecomunicações. O resultado foi uma extraordinária redução dos custos operacionais e dos custos de transacção numa escala global. b) O segundo conjunto de determinantes envolve os factores de ordem politica e institucionais vinculados à ascensão das ideias liberais ao longo dos anos 80, tendo como marco de referência os governos Thatcher na Grã-Bretanha e Reagan nos Estados Unidos. O resultado dessa ascensão foi uma onda de desregulamentação do sistema económico à escala global. c) O terceiro e último conjunto de determinantes da globalização refere-se a factores de ordem sistémica e estrutural. O ponto central reside aqui em ver a globalização económica como parte integrante de um movimento de acumulação à escala global, caracterizado pelas dificuldades de expansão da esfera produtiva das economias capitalistas sólidas/maduras. Na realidade, nesse ponto, a questão central refere-se ao menor potencial de crescimento dos mercados domésticos dos países desenvolvidos, ricos em capital, isto é, trata-se do problema clássico de realização do capital. Como resultado, há um deslocamento de recurso da esfera produtiva para a esfera financeira e, portanto, um efeito de expansão dos mercados de capitais domésticos e internacional. No início dos anos 80, após o período de crise (estagnação e inflação) dos anos 70, a situação das economias capitalistas “maduras” era particularmente difícil. As economias capitalistas desenvolvidas defrontavam-se com quatro respostas básicas para sair da crise de acumulação:

• A primeira é a conhecida “saída Keynesiana”, com políticas fiscais expansionistas e défices públicos. A expansão dos investimentos públicos é uma das principais formas de realizar essa saída da crise.

• A segunda resposta consiste na “saída Shumpeteriana” de indução do processo de destruição criadora, por meio do qual se promove uma nova onda de inovações tecnológicas e organizacionais capaz de aumentar os gastos (consumo e investimento).

• A terceira saída centra-se na distribuição do produto e riqueza • A quarta e última saída encontra-se no mercado externo e procura transformar as exportações na

“locomotiva” da economia nacional. Nesse sentido, as economias avançadas devem alcançar uma trajectória de crescente competitividade internacional.

O processo de globalização por meio da abertura e exploração dos mercados externos – tem permitido uma recuperação das taxas de lucro. Deve-se notar ainda que o período que precedeu o processo recente de globalização foi marcado por uma redução extraordinária da taxa de crescimento da produtividade. Em serviços (non-tradeables), não directamente envolvidos no processo de globalização) o que se observa é a manutenção da tendência da queda da produtividade ao longo das últimas quatro décadas. Entretanto, recentemente, houve uma forte recuperação das taxas médias de crescimento da produtividade, liderada pelo sector produtor de bens.

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Assim, no período recente marcado pelo processo de globalização, tem-se verificado uma recuperação das taxas de crescimento da produtividade, principalmente no sector produtor de bens - sector de tradeables. Na realidade, a saída preferencial usada pelas economias capitalistas desenvolvidas desde o início dos anos 80 tem sido aquela que procura maior acesso aos mercados internacionais de bens, serviço e capitais. Essa estratégia surge como reacção à insuficiência de procura interna nos países capitalistas desenvolvidos, sendo activamente promovida por governos e empresas transnacionais. Portanto, a insuficiência da procura colectiva nos países desenvolvidos constitui-se no mais importante e determinante fenómeno da globalização económica deste final de século. 5.4 – Capital estrangeiro e poder O estudo das relações internacionais exige a análise das fontes de poder dos agentes envolvidos no processo político uma vez que a conduta de cada agente apoia-se sobre uma base específica, isto é, sobre uma base de poder. O poder é entendido como “a probabilidade que um actor, dentro de uma relação social, estará em posição de realizar a sua própria vontade, apesar da resistência de outro actor social e independentemente da base sobre a qual essa probabilidade se apoia” (Weber). Há três diferentes formas de exercício de poder:

• Coação - “existe quando o consentimento é baseado na privação física ou a ameaça de privação física”

• Autoridade – refere-se a consentimento legitimado. • Influencia – é um termo residual, referindo-se a um consentimento não-legitimado e não coercivo”

Martin. O objectivo é apontar as principais fontes de poder ou os elementos na base do poder das ECE. Essas empresas têm poder para iniciar, decidir e vetar questões na tomada de decisões. O conceito de decisão refere-se a “uma escolha entre alternativos de acção”. Entretanto, tem-se em consideração o papel das ECE como agente de “mobilização de viés”, isto é, não se deixa de lado os efeitos das ECE sobre a “tomada de não-decisão” (Gonçalves). A não-decisão é 2uma decisão que resulta na supressão ou impedimento de um desafio latente ou manifesto para os valores ou interesses do tomador de decisões”. Nesse sentido, uma tomada de não-decisão é “uma maneira pela qual demandas por mudanças na alocação existente de benefícios e privilégios na comunidade podem ser sufocados antes mesmo que sejam anunciadas; ou mantidas encobertas; ou eliminadas antes que ganhem acesso à arena relevante da tomada de decisão; ou faltando todos esses procedimentos, mutilados ou destruídos no estágio de implementação de decisão do processo político” (Gonçalves). No que se refere às EC, esse poder sobre a tomada da não-decisão parece ser significativo quando se considera a capacidade dessas empresas de influenciar ou moldar percepções e preferências por meio, até, dos tipos de bens e serviços fornecidos, assim como pelo uso dos meios de comunicação de massa. Dado o conjunto apresentado dos conceito básicos o objectivo é examinar as principais fontes ou elementos da base de poder de ECE. Essas fontes são divididas em dois tipos:

• As fontes externas são derivadas de elementos fora do controlo dos países receptores de IDE (investimento externo directo), de modo que o governo tem pouca, se alguma, probabilidade de mudar esses elementos. Assim, estes podem ser vistos como “parâmetros” na análise do papel das ECE.

• As fontes internas de poder podem, até certo ponto e sob certas circunstâncias, ser colocadas

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sob o controlo dos governos dos países receptores e, consequentemente, vistas como variáveis a serem usadas para reduzir o poder das ECE.

Entretanto, deve-se assinalar que, nalguns casos, é difícil definir um elemento da base de poder das ECE como externo ou interno. Além disso, esses elementos nem sempre são independentes uns dos outros, já que a própria existência de um elemento externo pode criar condições para o aparecimento de um elemento interno. No que se refere às fontes internas de poder das ECE pode-se mencionar: Página 202. Uma parte substantiva das fontes internas mencionadas também as plica ao caso das empresas privadas nacionais, particularmente aos grandes grupos económicos nacionais. 5.5 – Fontes externas de Poder As principais fontes externas de poder das ECE são: Página 204. a) Capacidade de mobilização de recursos As ECE têm uma capacidade extraordinária de deslocar recursos de uma subsidiária para outra, de um país para outro. As ECE podem usar subsídios cruzados como uma táctica para controlar mercados, gerar poder económico e, consequentemente, poder político. b) Grau de integração O grau de integração do sistema matriz-subsidiárias permite às ECE uma maior flexibilidade no uso do mecanismo dos preços de transferência (sub e superfacturamente) por meio do comércio externo. Por meio dos preços de transferência as ECE podem realizar a sua própria vontade (transferência internacional de recursos) apesar da resistência do governo do país receptor. c) Assimetria da informação A posse de um activo específico à propriedade é uma das condições básicas que determinam a própria existência das ECE. Essas empresas possuem informações sobre a situação e perspectivas a respeito de produtos e mercados, que não estão disponíveis. d) Estrutura do mercado internacional Mercados com um elevado grau de concentração à escala global tendem a aumentar o poder de comercialização menos claro das ECE. e) Interdependência do mercado A natureza da concorrência – concorrência oligopolista ou monopolista – pode restringir a rivalidade por meio da moderação ou cooperação, como uma táctica para controlar mercados e também para criar solidariedade, reciprocidade e, consequentemente, uma comunidade de interesses no plano internacional. f) Concentração segundo a origem Deve-se esperar maior probabilidade de acordos formais ou informais quando há um grau mais elevado de concentração do país de origem das ECE. g) Importância relativa do país receptor O poder das ECE num determinado país está inversamente relacionado com a importância relativa do país receptor no cenário internacional, particularmente no que se refere ao volume de investimento externo directo à escala global. h) Dinâmica da inovação tecnológica

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As ECE caracterizam-se por certo dinamismo tecnológico. Assim quanto mais rapidamente se processar a inovação tecnológica num sector especifico, maior tende a ser o poder de intervenção económica das ECE num país isoladamente. i) Concentração do desenvolvimento tecnológico O poder de intervenção de proprietários de tecnologia é uma fonte evidente de pressão. j) O Governo do país de origem As ECE tendem a influenciar a politica externa dos governos dos seus países de origem, a fim de obter algumas vantagens nos países receptores. l) Elementos institucionais Num processo de resolução de situações de conflito entre as ECE e os países receptores, essas empresas podem apelar de forma directa ou indirecta para elementos externos de natureza institucional, que podem ampliar a sua bae de poder. O objectivo central da AMI é definir um conjunto de direitos para as ECE e, por outro lado, restringir o grau de manobra de governos na direcção da regulamentação dessas empresas. 5.6 – Os consumidores e a globalização Os próximos parágrafos são uma tentativa de descrever/entender a forma como as mudanças na maneira de consumir alteraram as possibilidades e as formas de exercer a cidadania numa época de globalização. Num tempo em que as campanhas eleitorais se mudam dos comícios para a televisão, das polémicas doutrinárias para o confronto de imagens e da persuasão ideológica para as pesquisas de Marketing, embora ainda nos interpelem como cidadãos é mais fácil e coerente sentirmo-nos convocados como consumidores. 5.6.1 – Do nacional ao global As lutas de gerações a respeito do necessário e do desejável mostram outro modo de estabelecer as identidades e construir a nossa diferença. Vamo-nos afastando da época em que as identidades se definiam por essências a-historicas: actualmente configuram-se no consumo, dependem daquilo que se possui, ou daquilo que se pode chegar a possuir. Os objectivos perdem a relação de fidelidade com os territórios de origem. A cultura é um processo de montagem multinacional, uma articulação flexível de partes, uma colagem de traços que qualquer cidadão de qualquer país, religião e ideologia pode ler e utilizar. O que diferencia a internacionalização da globalização é que no tempo da internacionalização das culturas nacionais era possível não se estar satisfeito com o que se possuía e ir procurá-lo noutro lugar. Mas a maioria das mensagens e dos bens que consumíamos era gerada na própria sociedade, e havia alfândegas estritas, leis que protegiam o que se produzia em cada país. Agora o que se produz em todo o mundo está aqui e é difícil saber o que é próprio. A internacionalização foi uma abertura das fronteiras geográficas de cada sociedade para incorporar bens materiais e simbólicos das outras. A globalização supõe uma interacção funcional de actividades económicas e culturais dispersas, bens e serviços gerados por um sistema com muitos centros, no qual é mais importante a velocidade com que se percorre o mundo do que as posições geográficas a partir das quais se está agir. A maneira neoliberal de fazer a globalização consiste em reduzir empregos para reduzir custos, competindo entre empresas transnacionais, cuja direcção tem origem a partir de um ponto desconhecido, de modo que os interesses sindicais e nacionais quase não podem ser exercidos.

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5.6.2 – A cidadania numa época de consumo Quando admitimos a globalização como uma tendência irreversível, também é necessário ter em atenção que partilhamos algumas suspeitas quanto ao modelo:

• Primeiro, existem muitas duvidas fundamentadas que o global se apresente como substituto do local,

• Segundo, os últimos acontecimentos mundiais, nomeadamente a reunião do OMC, fragilizou completamente a ideia que o modo neoliberal de nos globalizarmos seja o único possível.

5.7 – O novo cenário sociocultural perante a globalização As mudanças socioculturais que estão a ocorrer em todos estes campos podem ser sintetizadas em cinco: Página 212 e213.

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7 – A educação como problema social 7.1 – A nova equação educativa Durkheim definia educação como uma “acção exercida pelas gerações adultas sobre as que ainda se não encontram amadurecidas para a vida social. Ela tem por objectivo suscitar e desenvolver na criança um certo número de condições físicas, intelectuais e morais que dela reclamam, seja a sociedade politica, no seu conjunto, seja o meio especial a que ela se destina particularmente.” O fundador da primeira cátedra de Educação e Sociologia da Sobornne, escrevia para a sociedade do seu tempo, que aceitou, sem polémica, a ideia de que a educação se traduzia num processo unilinear de preparação das novas gerações, pelas mais antigas, para o exercício de papeis sociais. Resultante da força conjugada do aumento da esperança média de vida das populações e da redução drástica do ciclo de vida do Conhecimento, a formação inicial perdeu peso relativo, circunscrevendo-se à aprendizagem básica de conhecimentos, técnicas e atitudes, susceptíveis de virem alicerçar a aprendizagem ao longo do resto da vida. Em contrapartida regista-se o alargamento da formação continua, à mediada em que se vai tomando consciência da degradablidade do saber e do seu ciclo de vida cada vez mais curto. Em termos genéricos podem distinguir-se duas vertentes principais do processo educativo, consoante a aprendizagem de papéis esteja codificada e institucionalizada ou não: a educação formal e a educação não formal. Como atrás se referiu, as necessidades de educação formal, hoje, não se circunscrevem à educação inicial – que integra o ensino básico (pré-escolar e escolar), secundário, profissional e superior – mas abrangem a chamada formação continua, em múltiplas facetas de formação profissional (actualização, reciclagem, extensão e reconversão) e de formação continua superior, esta ultima em contexto académico (pós-graduação) ou mais direccionada para a investigação e desenvolvimento de unidades produtivas (formação avançada). Por seu turno, a consciência progressivamente maior de que a educação institucionalizada não cobre todas as necessidades educativas, tem vindo a desenhar um quadro de necessidades educativas, que podemos agrupar em dois conjuntos que se interpenetram:

• Em primeiro lugar uma educação que permita às gerações vivas, não só adaptarem-se à mudança acelerada da sociedade contemporânea, mas também aprenderem a geri-la em seu proveito,

• Um outro conjunto de necessidades de aprendizagem que podemos englobar sob a designação de educação cívica e comunitária.

O processo de complexificação do conceito de educação que se acabou de esboçar resulta de três macrotendências da sociedade contemporânea, a que se fará referencia nos pontos seguintes: as tendências para a aceleração da mudança, para as assimetrias sociais e para a alteração dos sistemas de poder. 7.1.2 – Efeitos da mudança na educação O sistema educativo contemporâneo encontra-se sob o fogo cruzado de variados críticos, que o consideram completamente desajustado à actual situação de mudança. Entre os diversos sinais que traduzem esse desajustamento, vejamos alguns indicadores:

• No relatório da Comissão Nacional (EUA) a Qualidade do Ensino (1983), significativamente intitulado Uma Nação em Risco, refere-se que a “presente geração de finalistas do liceu é a primeira na historia da América a concluir o curso com menos conhecimentos do que os seus pais”

• As estimativas do numero de analfabetos funcionais no Estado Unidos variava entre 18 a 64

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milhões, • As taxas de absentismo e de abandono no ensino secundário aumentaram dramaticamente a

partir dos anos setenta, • Para agudizar, à invasão dos postos de trabalho pelos computadores, obrigando os titulares a

uma familiarização mínima com estas ferramentas da sociedade da informação, o sistema educativo não conseguiu responder ao mesmo ritmo, correndo-se sérios riscos de estar a criar uma geração de analfabetos informáticos.

Podemos tipificar essas novas necessidades educativas em dois grupos que mutuamente se interligam: necessidades relacionadas com a adaptação ao processo de mudança e necessidades ligadas à gestão dos conteúdos dessa mudança. Aprender a adaptar-se à mudança A compressão do Tempo, acelerando o metabolismo social, torna imperiosa a aprendizagem da adaptação aos novos ritmos de vida, através da racionalização de processos de decisão cada vez mais rápidos. Isto implica, aprender a dominar o medo ao desconhecido e a assumir o estatuto de imigrante no tempo. Neste sentido, torna-se importante aprender a:

• Adaptar-se a novos instrumentos e a novos processos de trabalho para que deles possa extrair um desempenho qualificado,

• A ser um consumidor crítico e não um mero objecto das estratégias de venda do sistema massificador da sociedade de consumo,

• A adaptar-se rapidamente a novos lugares e ambientes sabendo deles tirar partido. Aprender a gerir a mudança Neste sentido põe-se, com particular urgência, a necessidade de aprender a:

• Tirar partido dos recursos e sistema energéticos, • Utilizar da melhor forma as novas tecnologias como instrumentos e não como fins em si,

contrapondo à dominante cultura do individualismo uma cultura da solidariedade, • Produzir, distribuir e consumir bens e serviços, à escala mundial, tendo em vista a melhoria da

qualidade de vida, • Lidar com a diversidade de modelos de organização social (família, escola e empresa), • Orientar e controlar a sua vida de for autónoma, • Utilizar de maneira ética e critica os media (telemática, self-media e multimedia), • Aprender novas formas de se relacionar com o tempo e com as culturas vigentes em presença.

7.1.3 – A educação e as assimetrias sociais Desta segunda característica do mundo contemporâneo, traduzida na manutenção ou, certos aspectos, no agravamento das desigualdades da qualidade de vida das populações, emerge um conjunto de necessidades educativas e de formação para a população (e não só para as suas camadas mais jovens como tradicionalmente tem sido considerado) que poderíamos englobar na expressão educação para o desenvolvimento e para a solidariedade. Esta expressão, integra duas vertentes indissociáveis: Por um lado, a necessidade de educar as gerações contemporâneas para o desenvolvimento, ou seja, ensiná-las a:

• Tirar partido, de forma sustentada, do meio ambiente e dos recursos que dispõe, • Evitar mortes desnecessários e prolongar a vida com qualidade, • Pôr a render as potencialidades humanas de produção, distribuição e consumo de bens escassos

no quadro de uma efectiva cidadania económica. Por outro lado, a necessidade de o educar para a solidariedade, novo nome da fraternidade, o valor central da revolução francesa mais esquecido durante a época industrial. 7.1.4 – A educação e a alteração dos sistemas de Poder

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Uma terceira tendência que se observa na sociedade contemporânea é para uma substancial alteração dos sistemas de poder devido, entre outras, a duas circunstâncias:

• Em primeiro lugar, o avanço das novas tecnologias de informação e comunicação (NTICs) e o desenvolvimento da sociedade de informação fizeram com que a principal fonte de poder deixasse de ser a riqueza e passasse a ser o conhecimento,

• Em segundo lugar, como expressão politica do duplo processo de planatarização e de localização registado na segunda metade do século XX, observou-se um aumento dos protagonistas políticos e uma diversificação das suas relações, de acordo com uma tendência para complexidade crescente.

Tais alterações traduzem-se, em termos mundiais, em três macrotendências politicas: a participação crescente dos cidadãos, o fim do socialismo de economia centralizada e a privatização do Estado Providência. 7.1.5 – Três níveis de análise O contexto que se acaba de descrever configura a questão da educação, em qualquer sociedade, como um problema social complexo, com efeitos imediatos na sua coesão interna e na sua locomoção em direcção a objectivos globais como o Desenvolvimento e a Democracia. Outros tantos níveis de complexidade:

• Numa perspectiva macro-sociologica, a questão da educação deve ser concebida como um problema económico e politico, tanto pela amplitude das necessidades e dos recursos envolvidos como pelos efeitos globais do seu funcionamento,

• Numa óptica meso-sociologica é indispensável entendê-la como um problema organizacional, uma vez que a organização dos recursos tem efeitos imediatos na eficácia e nas eficiência do processo educativo,

• Numa aproximação micro-sociologica interessa equacioná-la como um problema psico-social, dado o processo educativo resultar fundamentalmente de relações inter-pessoais, estabelecidas entre os diversos protagonistas envolvidos no processo.

7.2 – A educação como problema económico e politico A breve análise que se segue, será feita a partir da perspectiva do ensino como indústria. Isto porque como já referia Khôi em 1970. Edgar Faure, no seu já clássico Aprender a Ser (1977), já partilhava da mesma opinião, afirmando. 7.2.1 – Os factores de produção Os principais factores de produção em presença são os recursos humanos, entre os quais se encontram os aprendentes (alunos e formandos), os ensinantes (professores e formadores) e os outros protagonistas do processo educativo, os recursos materiais. Quanto aos aprendentes, observa-se que nos últimos anos o seu número e diversidade aumentaram significativamente, devido a diversos factores:

• Crescente consciência da importância que tem a melhoria do nível de educação de um povo para o seu desenvolvimento económico e social,

• Aumento da população infantil e juvenil, em termos absolutos, nos países menos desenvolvidos, • Aumento das necessidades de formação contínua da população adulta, criando um enorme

contingente adicional de aprendentes. Para fazer face à pressão da procura educativa muitos sistemas educativos têm-se confrontado com um duplo problema político: os recursos são escassos e frequentemente são desviados para fins militares.

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Parece portanto que o investimento em educação tem sido globalmente assimétrico, em detrimento dos países mais pobres. Se, a esta assimetria, juntarmos as carências de outros recursos materiais, como instalações, equipamentos, materiais de ensino, abastecimento de água, electricidade e outros bens e serviços, poderemos concluir que a indústria do ensino está claramente falha de recursos materiais e que tal carência é mais grave nos países que apresentam baixos índices de desenvolvimento humano. Ligado a este problema está o da carência de ensinantes e o do seu custo crescente. 7.2.2 – Os produtos Diferente situação em que os diversos sistemas de ensino se encontram relativamente aos recursos disponíveis e às exigências a que têm de fazer face, naturalmente afecta os seus produtos, que se traduzem na qualidade das qualificações produzidas pelo sistema e no numero de pessoas qualificadas nos vários níveis de ensino. A qualidade das qualificações, sendo difícil de medir, pode no entanto ser revelada por alguns indicadores como o número médio de anos de escolaridade da população adulta e o número de diplomados, de cientistas e técnicos por mil habitantes. A partir dos dados apresentados, podem extrair-se três conclusões:

• A qualidade das qualificações produzidas pelos sistemas de ensino contemporâneo é ainda insuficiente,

• O fosso de qualidade entre os sistema de ensino dos países em desenvolvimento e dos países industriais é ainda muito alto,

• O segmento feminino ainda é particularmente discriminado no acesso ao conhecimento. Registou nos últimos decénios uma melhoria global da alfabetização mas a um ritmo demasiado lento para as necessidades que o fosso entre países ricos e pobres, neste domínio, está a reduzir-se; que a taxa de alfabetização está claramente relacionada com o estádio de desenvolvimento, que, em função disso, são os países mais carecidos que apresentam índices piores; que, finalmente, o segmento feminino se encontra claramente em piores condições e que estas são agravadas com o estádio de desenvolvimento. Em síntese, observando os sistemas de ensino contemporâneos como industriais, regista-se uma crise global, resultante de uma insuficiente oferta de ensino perante uma crescente pressão da procura:

• As necessidades do mercado aumentaram vertiginosamente tanto pelo aumento numérico dos aprendentes, como pela diversidade das exigências feitas,

• Os recursos materiais, humanos e ambientais, indispensáveis para fazer face ao acréscimo de necessidades, são claramente insuficientes, sendo muitas vezes desviados para outros fins,

• A falta de recursos é mais grave nos países menos desenvolvidos, simultaneamente os mais carecidos de investimentos em educação.

• As assimetrias observadas reflectem-se nos produtos dos sistemas educativos, quer no que respeita à sua qualidade quer no que concerne à quantidade, e são agravadas directamente pela condição feminina e pelo nível de desenvolvimento.

7.3 – A educação como problema organizacional Reduzindo a escala do nosso olhar, podemos afirmar que a educação também se pode encarar como um problema organizacional uma vez que independentemente da justeza das politicas aprovadas, a sua execução depende do modo como os recursos são geridos no terreno, tornando o processo educativo mais ou menos eficiente. Estes dois conceitos são extremamente importantes mas muitas vezes confundidos:

• A eficácia – do processo educativo tem a ver com a convergência entre objectivos (resultados) previstos e alcançados,

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• A eficiência – relaciona os objectivos alcanças com os recursos afectados ara os atingir. 7.3.1 – Gestão da dinâmica externa Quanto às relações da escola com o exterior, é indispensável garantir um desempenho adequado da organização em duas principais vertentes:

• Na relação da escola com a estrutura de tutela é fundamental identificar os papéis específicos que cabem às várias agências em presença, de modo a propiciar um efectivo espaço de manobra à organização escola, no quadro da política educativa. Definidos os papeis, a criação de regras de comunicação (padrões, canais e suportes) é condição indispensável para que o relacionamento se processe com qualidade e com rapidez,

• Na relação da escola com a comunidade envolvente é indispensável o mesmo tipo de cuidados, tanto na definição dos papéis que cabem aos protagonistas como na manutenção de uma rede de comunicações adequada.

7.3.2 – Gestão da dinâmica interna A dinâmica interna da organização escola deve ser posta ao serviço de um projecto educativo comum, que agregue as contribuições dos vários protagonistas (estudantes, e pessoal docente e não docente). Para que tal aconteça, a gestão da organização deve procurar coordenar diversas áreas chave, das quais podemos salientar as seguintes:

• Circuitos, • Estrutura formal, • Estrutura informal, • Rede comunicacional, • Cultura.

Pelo que se acaba de referir, para que a organização escola funcione com eficácia e eficiência é exigido que os seus decisores tenham uma formação específica para o desempenho como gestores educativos. Tal formação deve ser não só dotá-los das competências técnicas necessárias ao desempenho da função de gestão – saber planear, organizar e controlar – mas também treinar a sua inteligência emocional de modo a poderem desempenhar as funções de liderança organizacional – motivação, comunicação e desenvolvimento dos recursos humanos em presença. 7.4 – A educação como problema psicossocial Procedendo a uma terceira aproximação, de natureza micro-sociológica, podemos equacionar a educação como um problema psico-social, dado o processo educativo ocorrer sobretudo numa moldura de relações interpessoais. Em qualquer acto educativo formal estão presentes três subsistemas que o condicionam: um aprendente, um estudante e um sistema de comunicação educacional. 7.4.2 – Condicionadores do ensinante Os factores que condicionam o desempenho do ensinante podem agrupar-se também em variáveis exógenas e endógenas. São variáveis exógenas, a coerência curricular, os recursos disponíveis na escola e na comunidade envolvente. São variáveis endógenas do ensinante, a competência científica e pedagógica adquirida através da formação inicial e contínua, e a inteligência emocional. 7.4.3 – Condicionadores da comunicação educacional Ainda que motivados é necessário que o sistema de comunicação educacional seja adequado. Isto implica, entre outros aspectos:

• Materiais educativos de qualidade em suporte escrito, audiovisual e informático,

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• Espaços específicos como laboratórios, bibliotecas, ginásios e salas para actividades expressivas bem como espaços polivalentes, onde estudantes e professores possam trabalhar e conviver em regime de cooperação educativa,

• Estratégias activas para melhorar a comunicação educacional. 7.5 – Algumas politicas relevantes Quadro página 265. 7.5.1 – À escala “macro” À escala macro-soial, os sistemas educativos devem procurar responder à sobrecarga da procura com uma politica que privilegie a qualificação e a diversificação da oferta. Página 266. 7.5.2 – À escala “meso” A uma escala organizacional, as politicas educativas têm vindo a direccionar-se frequentemente em três diferentes sentidos:

• Na clarificação dos papeis e das regras de comunicação entre a escola e os organismos de tutela, • No estabelecimento de parcerias entre a organização escola e a comunidade e os organismos de

tutela, • Na qualificação da gestão interna da escola.

7.5.3 – À escala “micro” A uma escala psicossocial, têm vindo a defender-se a implementação de uma gama muito diversificada de politicas de intervenção, da qual seleccionamos apenas algumas pela sua relevância:

• Relativamente aos aprendentes, têm vindo a multiplicar-se programas compensatórios, • No que respeita aos ensinantes, a formação contínua tem vindo a assumir-se simultaneamente

como um direito e um dever, • Finalmente têm vindo a desenhar-se politicas que visam dotar ambos os principais protagonistas

do processo educativo, de empowerment para vencer as dificuldades quotidianas do processo complexo que é ensinar e aprender em circunstâncias por vezes muito difíceis.

7.6 – Em síntese Página 268.

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8 – Problemas de origem ideológica Introdução Nesta unidade iremos apresentar as questões do racismo, da xenofobia, dos fundamentalismos, do sexismo e dos atentados aos Direitos Humanos como problemas resultantes de diferendos ideológicos. 8.1 – Racismo A grande parte da história que se têm debruçado sobre o racismo identifica o século XIX como o período de impulso deste fenómeno, devido precisamente ao desenvolvimento de várias “teorias da raça”. Esta diferenciação entre “raças superiores” e “raças inferiores” e a legitimação da supremacia das primeiras face a estas designa-se por racialismo. O racialismo designa, portanto, a vertente ideológica do racismo. 8.1.1 – O determinismo biológico A Europa do século XIX assistia ao estabelecer de laços estreitos entre a ciência e as doutrinas teóricas, estas alicerçadas nas interpretações que as ciências avançavam sobre Humanidades. O pensamento social era, então, dominado pelo determinismo biológico, em que se destacam três teorias fundamentais para a legitimação científica do racismo:

• A obra de Gobineau, “Essai sur l'inégalité des races humaines” (1852), que alertava para a degenerescência das “raças” como resultado da mistura entre si,

• O darwinismo social, de Spencer (1862) • O eugenismo, de Francis Galton (1883)

8.1.2 – A evolução do racismo no século XX A passagem para o século XX é feita com a herança do determinismo biológico. Mas é apenas nos finais da década de 20 que nasce o conceito de racismo, definido como uma ideologia que defende a superioridade de determinadas “raças” e legitima a sua supremacia em relação às “raças” identificadas como “inferiores”.

• A emergência do “novo racismo” No entanto, o discurso sobre as diferenças persistiu. A classificação das populações em “raças” foi substituída pela definição de grupos étnicos ou culturais, substituindo-se a ênfase na “raça” pela ênfase na cultura. Esta viragem é a característica central do conceito de “novo racismo”, construído por oposição ao “velho” racismo biológico.

• O racismo institucional A segunda metade do século XX viu também nascer ma nova interpretação do racismo que não apela a uma componente ideológica: rata-se da construção do conceito de “racismo institucional”. Originalmente defendido pelo movimento “Black Power” nos EUA, nos anos 60, a ideia de “racismo institucional” assenta no pressuposto de que a sociedade está estruturada de maneira a manter a exclusão de um grupo especifico (naquele caso os negros Afro-Americanos) e a evitar a sua progressão na sociedade. 8.1.3 – As facetas da desigualdade e da diferença O racismo encerra em si três componentes (Wieviorka, 1995):

• A “naturalização” de um grupo, que consiste na identificação desse grupo com base em características físicas naturais,

• A percepção do “outro” como ameaça, • O apelo a medidas de protecção, discriminação ou segregação.

Nem sempre a discriminação de outrem é uma expressão de racismo, mas tão só se incorporar estas três componentes. Por outro lado, o racismo combina dois princípios de exclusão: a desigualdade e a diferença.

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A relação entre as dimensões da diferença e da desigualdade não é consensual entre os autores que se dedicam à análise do racismo. Assim, Taguieff (1988) defende que estes duas dimensões estão separas, resultado em dois tipos de racismo: a desigualdade está relacionada com a naturalização do “outro” (sobretudo o “outro” enquanto colonizado ou sujeito à dominação por parte de outrem) e com a sua inferiorização; a diferença está ligada à ideia de preservação da especificidade de cada cultura. Em contrapartida, Wieviorka define o racismo pela complementaridade entre estas duas dimensões, afirmando que se o tema da desigualdade está fortemente ligado à dominação colonial, o racismo só existe se a consciência da inferioridade dos povos colonizados for acompanhada pelo medo de invasão ou de perda de identidade do colonizador. Por outro lado, a percepção da diferença cultural só produz racismo se a cultura ou culturas minoritárias forem entendidas como ameaçadoras pela cultura dominante. Como afirma Wieviorka, para que o racismo se manifeste é necessário que «(...) haja o sentimento de que o superior está ameaçado pelo inferior, a qualidade pela quantidade, a riqueza pela pobreza(...)». 8.1.4 – O racismo como uma doença da Modernidade Numa contradição notória da Modernidade, o esbater das diferenças pelo contacto entre culturas, ao invés de reforçar uma consciência universal e tender à globalização cultural, reforça o receio da perda das especificidades e faz nascer o racismo ou outras manifestações de rejeição e discriminação dos outros. É por este motivo que Todoov define o racismo como uma doença de passagem para a Modernidade. Também Wieviorka agarra esta ideia do racismo enquanto doença social da Modernidade, afirmando que esta não aceita facilmente a diferença, transformando parte dela em desigualdade e outra parte em exclusão. Também o medo da descaracterização da cultura e identidade nacionais, aliado ao aumento do desemprego, deu espaço ao surgimento de partidos de extrema-direita em França, como o Front National, e ao surto de violência racista em Portugal no início dos anos 90 do século XX. Nas sociedades contemporâneas, o discurso da diferença surge assim mesclado por argumentos de cariz biológico, cultural, económico ou político, dando origem a uma pluralidade de manifestações de racismo, ao contrario da unidade ideológica a que assistimos nos séculos anteriores. 8.2 – Xenofobia e fundamentalismos A xenofobia e o racismo estão interrelacionados, pois ambos os conceitos se referem a uma diferenciação entre grupos que resulta na exclusão de uns face a outros. No entanto, a xenofobia diz respeito a um leque muito mais abrangente de diferenciações, na medida em que traduz toda a rejeição de outrem, identificado como dissemelhante do “eu” ou do “nós”, quer essa diferença seja baseada em traços físicos, na cultura, na pertença nacional ou em outros aspectos, ou resulte tão só da subjectividade implícita à atribuição de uma identidade diferente a esse “outro”. Em termos etimológicos, xenofobia significa medo do estrangeiro. Ora, é a conjugação destas duas caracteristicas – rejeição daquele que identificamos como diferente e medo face a ele – que fazem associar frequentemente o fenómeno da xenofobia à questão dos fundamentalismos. O fundamentalismo reporta-se à crença e à defesa de um conjunto de princípios religiosos (ou fundamentos), que são entendidos como verdades fundamentais. Nas interpretações fundamentalistas, defende-se que esses princípios religiosos deverão alicerçar a organização social de toda uma sociedade. 8.2.1 – A origem dos fundamentalismos modernos

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A emergência dos fundamentalismos modernos remonta a meados da década de 70 do século XX, através do desenvolvimento de movimentos religiosos, tanto no Cristianismo como no Judaísmo e no Islamismo, que procedem à re-interpretação dos textos sagrados com o objectivo de mudar a ordem social existente. À procura de novos espaços de solidariedade onde os indivíduos se sentissem protegidos, sendo a religião e a pertença étnica espaços privilegiados para tal, e, por outro lado, à construção de novos projectos de sociedade, fortemente marcados pelo retorno ao religioso. Vemos assim surgir movimentos fundamentalistas nas três religiões monoteístas, onde se incluem tanto os movimentos tele-evangelistas nos Estados Unidos da América como os movimentos islâmicos no irão ou na Argélia. No entanto, no mundo islâmico existe uma mais forte base social de apoio do fundamentalismo religioso do que no mundo judeu ou cristão, facto que determina a sua maior extensão e a intensidade com que é definido. A Europa Ocidental de finais do século XX vê precisamente no fundamentalismo islâmico a grande ameaça do futuro, sendo esse medo o motor de muitos sentimentos xenófolos contra as comunidades imigrantes muçulmanas aí instaladas. 8.2.2 – A interligação entre xenofobia, fundamentalismos e nacionalismos A análise dos temas da xenofobia e do fundamentalismos deve, porém, também ter em conta a sua estreita ligação com o nacionalismo, uma vez que a identificação a uma nação integra, muitas das vezes, uma quota parte de exclusão xenófoba e, por um lado, a identificação nacionalista levada ao extremo pode resultar em manifestações de fundamentalismo, onde o motor politico se confunde com o religioso. 8.2.3 – A interligação entre xenofobia, fundamentalismos e conflitos étnicos Para alguns autores, o enfraquecimento de poder dos Estados e a sua incapacidade em assegurar segurança e bem-estar para todos os grupos é uma condição directa para a emergência de conflitos de cariz étnicos, pois faz com que os grupos se organizem com base numa identidade comum (excluindo portanto os estrangeiros, os outros, aqueles a quem o “nós” atribuí uma identidade diferente) para zelarem pelos seus interesses. Os conflitos que têm vindo a eclodir no fim dado século XX revestem-se, assim de um carácter multifacetado, onde as manifestações de racismo e xenofobia, a intolerância étnica e os fundamentalismos religiosos se apresentam conjugados com nacionalismos politico, ou fortemente intrincados nas próprias mudanças de ordem económica e social que atravessam as sociedades de todo o mundo. 8.3 – Sexismo O sexismo define-se por preconceitos, estereótipos e discriminações baseadas no sexo da pessoa. O termo sexismo é, assim, utilizado mais frequentemente quando nos reportamos às desigualdades sofridas pelas mulheres. O pensamento feminista contemporâneo define, aliás, sexismo como uma relação social em que os homens detêm a autoridade sobre as mulheres. 8.3.1 – A questão da “natureza feminina” Para alguns autores, a discriminação das mulheres reside fundamentalmente nas diferenças físicas e de personalidade que distinguem opõem a feminilidade da masculinidade, estando associadas à primeira traços como a emotividade, a intuição e a submissão, enquanto que à masculinidade se associa a racionalidade, a lógica e a dominação. 8.3.2 – A família como fonte de desigualdades Outros autores argumentam que a interpretação da desigualdade entre os sexos dada pela diferenciação biológica é muito incompleta, argumentando que a origem da discriminação da mulher reside na organização das sociedades patriarcais, assentes na lei paternal e sendo a família a sua celula-base.

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Neste tipo de sociedade, a lei concede ao homem, enquanto pai e marido, o direito à propriedade privada, sendo o exercício do poder sobre a mulher e os filhos visto como uma extensão do direito à propriedade. 8.3.3 – As desigualdades na esfera do trabalho O facto da revolução industrial ter permitido criar postos de trabalho femininos, que não existiam anteriormente, retirando a exclusividade da mulher ao espaço do lar, veio colocar a questão da compatibilidade ou incompatibilidade da feminilidade com o trabalho assalariado. Uma vez que socialmente a função dominante da mulher é a maternidade, facto que a obriga a interromper a sua actividade produtiva, os postos de trabalho que ela viria a ocupar não são especializados e a eles correspondem menores salários. 8.3.4 – O novo rosto das desigualdades no século XX O século XX herda os pressupostos da Economia Politica do século anterior e, apesar de se assistir à entrada maciça das mulheres no mundo da educação e do trabalho, as desigualdades entre os sexos vão persistir. A 1ª Guerra Mundial permitiu a emancipação das mulheres uma vez que a mobilização dos homens exigia a sua participação, sem concorrência, na esfera da produção económica. No entanto, o pós-guerra rapidamente exigiu o retorno das mulheres ao lar e à função da maternidade, dada a urgência de restabelecer as taxas de natalidade e de assegurar o emprego aos homens então desmobilizados. A imagem da mulher dona-de-casa voltou a pesar nas elações sociais.

• Dois exemplos de sistemas politico-ideologicos sexistas Encontramos, neste século, dois exemplos extremos da discriminação das mulheres, fundamentada por sistemas politico-ideologicas: a politica natalista do regime fascista italiano, comandado por Mussolini; e a politica sexual nacional-socialista da Alemanha de Hitler.

• Os efeitos da democratização É com a recuperação económica verificada após a 2ª Guerra Mundial, concretamente entre 1945 e1975, que se assiste a uma cada vez maior democratização do mercado de trabalho, do acesso à educação (não só para as mulheres como também para as classes sociais mais pobres) e, consequentemente, a uma democratização das elações socais. No campo da educação, apesar do acesso maciço das raparigas à escola, rapazes e raparigas continuam a ser orientados para carreiras específicas, reproduzindo a divisão sexual do trabalho. No campo do trabalho, têm surgido nas últimas décadas novas formas de trabalho que têm vindo a acentuar as desigualdades entre os sexos. O trabalho a tempo parcial, a expansão do trabalho domiciliário. Por fim, o trabalho temporário e os contratos a prazo são o resultado da mais recente re-estruturação económica, afectando mais duramente as mulheres e os jovens. O sexismo contemporâneo, à semelhança do novo racismo, revela-se com um rosto multifacetado, onde argumentos naturalistas e culturalistas se interpenetram para justificar a manutenção de uma ordem social alicerçada no poder masculino – ao nível económico, cientifico, politico, jurídico. 8.3.5 – As analises feministas e o conceito de género Daqui resulta a construção do conceito de género. Enquanto que o conceito de sexo apenas ilustra as diferenças físicas entre homens e mulheres, o conceito de género analisa as razoes históricas, culturais, económicas e sociais que num determinado momento e num determinado espaço moldam as relações entre as pessoas. A analise das relações de género insiste no carácter fundamentalmente social e não sexual das diferenças entre homens e mulheres, rejeitando o determinismo biológico e destacando, em simultâneo, o carácter relacional e assimétrico entre os dois sexos. 8.4 – Atentados aos Direitos Humanos

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A Declaração Universal dos Direitos Humanos (assinada a 10 de Dezembro de 1948) nasce no rescaldo da 2ª Guerra Mundial, simbolizando a vontade dos Estados com assento nas Nações Unidas de introduzirem um novo quadro legal que regulasse as relações internacionais. 8.4.1 – A ONU e a nova ordem mundial A Declaração Universal surge como um primeiro passo tomado pela Organização das Nações Unidas (ONU), constituída em Maio de 1945, na construção dessa nova ordem mundial. Enquanto a ONU tem como principio fundador a busca e a manutenção da paz mundial, a Declaração torna claro que este objectivo só é alcançado mediante o respeito dos direitos humanos. 8.4.2 – A evolução dos Direitos Humanos A Declaração de Independência dos Unidos da América (1776) e a declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) saída da Revolução Francesa, marcam a “primeira geração” dos Direitos Humanos, caracterizada pela fase da «proclamação jurídica», que pretendia garantir no plano formal a dignidade dos cidadãos perante um Estado de direito e donde resultou a instituição dos direitos civis e políticos. A “segunda geração» nasce meados do século XIX, constituindo a fase da «socialização», caracterizada pelo reconhecimento de que as liberdades não estavam garantidas apenas pela sua inclusão na lei e de que era necessário instituir novos direitos, tais como os direitos económicos, sociais e culturais. A Declaração Universal de 1948 nasce na “terceira geração” dos direitos humanos, a qual corresponde à fase da «internacionalização». 8.4.3 – O desrespeito pelos Direitos Humanos O próprio texto da Declaração refere, no artigo 28º, que os estados subscritores deverão assegurar o cumprimento e o reconhecimento efectivo desses direitos mediante “medidas progressivas”, nacionais e internacionais. Ora, o não desenvolvimento de medidas concretas no plano nacional em muitos dos países não tem permitido consolidar os direitos humanos na legislação nacional e facilmente conduz à sua violação. Os fenómenos de racismo, xenofobia, fundamentalismos e sexismo, que tratámos anteriormente, são manifestações actuais da incapacidade dos Estados subscritores assegurarem o cumprimento dos princípios que aprovaram.


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