Processamento de dados GNSS Com o advento da Lei 10.267/01, a precisão posicional no levantamento do perímetro do imóvel rural
adquire uma importância fundamental.
No levantamento por GNSS, a precisão posicional é verificada pelo resultado do ajustamento vetorial,
através do Método dos Mínimos Quadrados, que é proporcionado pelo módulo de ajustamento dos
programas de processamento de dados GNSS.
Para se chegar à precisão da Norma Técnica para Georreferenciamento de Imóveis Rurais do Incra
(NTGIR), devemos tomar alguns cuidados antes e após o processamento dos dados.
Os cuidados mais usuais a priori que devemos verificar são:
- Distância da linha de base;
- PDOP;
- Razão sinal/ruído mínima do sinal GNSS;
- Horizonte mínimo de rastreamento (máscara de elevação);
- Mínimo de satélites;
- Intervalo de gravação;
- Tempo de permanência no ponto.
Além destes cuidados, devem-se verificar também alguns elementos posteriores ao processamento dos
dados GNSS. Para isso, é necessário ter um olhar mais clínico nos relatórios de processamento e
ajustamento fornecidos pelos programas.
Alguns cuidados a serem tomados a posteriori são os de verificar os seguintes parâmetros:
- Tipo de solução apresentada pelo programa;
- Desvio padrão de cada uma das componentes da base dN, dE e dh;
- Variância de referência após o ajustamento;
- Resultado do teste de hipótese (teste chi quadrado);
- Matriz variância-covariância;
- Erro Médio Quadrático (RMS);
- Ratio;
- Fator de referência;
- Graus de liberdade;
- Teste Tau.
Tenho observado, na rotina dos prestadores de serviço relacionados à NTGIR, que os cuidados a priori
raramente são negligenciados. Já para os cuidados a posteriori, percebe-se o desconhecimento de
parte dos profissionais sobre o significado de cada item gerado nos relatórios de processamento de
linhas de base e ajustamento de redes GNSS.
Mas como proceder para saber o significado destes parâmetros? Os valores apresentados indicam
algo?
Para encontrar as respostas, é necessário primeiro responder outras questões, como por exemplo: o
que significa solução fixa L1? O que é chi quadrado? E o tal do teste Tau?
A intenção deste artigo é responder de maneira breve e prática a estas e outras questões envolvidas na
análise de dados GNSS.
Começa-se falando sobre o tipo de solução obtida. Adota-se como padrão o tipo de solução fixa, ou
seja, quando se consegue chegar a um valor conhecido para a ambigüidade, que é o número inteiro de
ciclos entre a antena do satélite e a do receptor. E também porque a NTGIR, na maioria dos casos, exige
uma solução fixa respeitando as limitações, de acordo com a linha de base, observáveis, tempo de
ocupação dos vértices de interesse e finalidade (determinação de apoio ou de perímetro).
Os programas existentes geralmente classificam as soluções em:
- L1 Fixa;
- L1, L2 Fixa;
- Banda Larga (Wide Lane);
- Banda Estreita (Narrow Lane);
- L3 Fixa e Livre de Ionosfera (Iono Free).
Mas o que significam estes termos e quando utilizar um ou outro?
Abordando as soluções mais usuais, temos:
- L1 Fixa – Usa medidas de fase da portadora L1 com ambigüidades fixadas. Recomendada para linhas
de base menores que 20 km;
- L1, L2 Fixa – Usa medidas de fase das portadoras L1 e L2 com ambigüidades fixadas. Utilizada para
linhas de base maiores que 20 km.
A partir das portadoras L1 e L2, pode-se também deduzir combinações lineares para obtermos outras
ondas, com diferentes características, que possibilitem um tratamento mais adequado e a resolução de
problemas que persistam em L1 Fixa ou L1, L2 Fixa.
Algumas possíveis combinações são:
- Banda Larga (Wide Lane) L4=L1-L2. É útil na determinação das ambigüidades, porque tem um
comprimento de onda maior, o que torna mais fácil a fixação das ambigüidades, no entanto tem
associado um ruído bastante elevado;
- Banda Estreita (Narrow Lane) L5=L1+L2. Esta combinação reduz o ruído das observações, com a
desvantagem de dificultar a determinação das ambigüidades;
- L3 Iono Free: combinação ionosférica L3=αL1+βL2. É a melhor solução a ser obtida na maioria das
vezes. Esta solução é livre de interferências ionosféricas e ambigüidades fixas, e garante o melhor dos
resultados. Recomendada para linhas de base maiores que 20 km. Uma solução Iono Free em uma linha
de base curta, entretanto, pode ser uma solução inadequada. Alguns softwares gerenciam
automaticamente a rejeição deste tipo de solução, em detrimento de outra mais adequada.
Verifica-se que as soluções não se limitam a uma única situação, podendo variar de acordo com as
características do levantamento GNSS executado.
No próximo artigo serão abordados outros cuidados a posteriori, como o chi quadrado e o tal do teste
Tau.
A indicação de parâmetros estatísticos nos relatórios resultantes do processamento de dados GNSS
muitas vezes gera confusão e levanta algumas dúvidas, como por exemplo: O que significam esses
valores? Ou ainda, esses valores indicam que meu processamento foi bem sucedido ou não?
Fundamentado nestas questões, tentarei desmistificar alguns desses parâmetros, explicando de
maneira breve o que significam seus valores.
Os relatórios geram um grande número de observações capturadas e processadas automaticamente,
sem que os profissionais possam interferir nos parâmetros de processamento. Mas como podemos
verificar se existem erros grosseiros nas observações GNSS, e como tomar as devidas precauções para
que o ajustamento dessas observações não forneça resultados comprometedores?
Ajustamento de observações
Esse processo objetiva a estimativa da qualidade da solução gerada. No ajustamento de observações
por mínimos quadrados, são aplicadas pequenas correções às linhas de base, para obter a que melhor
se ajuste a todas as linhas de base, produzindo assim uma única solução para todos os pontos. Essas
pequenas correções são chamadas resíduos. As linhas de base possuem três resíduos, um para cada
componente do vetor (X, Y, Z).
Quantificar os resíduos ajuda a identificar problemas nas linhas de base utilizadas no ajustamento de
redes.
Os programas, em geral, analisam os resíduos em duas formas: resíduos em unidades lineares (metros)
e resíduos normalizados. Os resíduos normalizados levam em conta que os resíduos gerados por erros
acidentais são, de alguma maneira, estatisticamente previsíveis. Os resíduos normalizados são valores
dos resíduos atuais, escalonados e sem unidade.
A verificação dos valores dos resíduos é um bom indicativo da qualidade das linhas de base.
Pra que serve o teste Tau?
O teste Tau é uma técnica estatística para determinação de erros grosseiros. É um valor interno,
calculado em uma distribuição e baseado no número de observações, nos graus de liberdade e em uma
probabilidade fornecida (95%).
O teste utiliza os resíduos normalizados de uma observação para determinar se, estatisticamente, o
resíduo se encontra dentro dos limites esperados. Um valor de entrada é calculado, a fim de examinar
cada resíduo normalizado. Cada resíduo é testado e pode passar, indicando que o resíduo não é maior
do que o limite esperado, ou falhar, indicando que a magnitude do resíduo normalizado é maior do que
o limite esperado.
É importante ter consciência que, se um resíduo não passa no teste estatístico, isso não significa que
exista um erro naquela observação. A observação é simplesmente marcada como um erro grosseiro
outlier, a fim de que seja examinada, e se possa tomar uma decisão, mantendo-na ou eliminando-na da
rede.
Pra que serve o teste qui-quadrado (Chi Square)?
É um teste estatístico global para uma rede de ajustamento. É um teste da soma dos pesos dos
quadrados dos resíduos, o número de graus de liberdade e uma probabilidade crítica de 95% ou maior.
O propósito desse teste é rejeitar, ou aceitar, a hipótese de que os erros previstos tenham sido
precisamente estimados. Permite conhecer a qualidade do ajustamento de uma rede. Tipicamente,
quando o fator de referência se aproxima de 1.0 e os graus de liberdade são aceitáveis, e ainda a rede
está matematicamente coesa, então esse teste passa.
Ele verifica a validade dos resultados obtidos no ajustamento, analisando se a diferença entre a
variância de peso para unidade a posteriori (calculada) e a variância de peso para unidade a priori,
geralmente 1, é significativa. Se o valor da variância de peso para unidade a posteriori for,
estatisticamente, igual a 1, os valores dos resíduos determinados são próximos às incertezas das
observações.
O teste qui-quadrado apenas detecta inconsistências no ajustamento. Logo, é necessário o uso de
ferramentas adicionais para detectar outros possíveis erros. Se, no processamento, seus dados não
passarem (fail) nesse teste, pode ser uma indicação de que alguns (ou todos) os erros a priori tenham
sido incorretamente modelados.
Ao fazer um ajustamento pelos mínimos quadrados, o fechamento matemático da rede é um importante
fator. Considere o teste do qui-quadrado um primeiro indicador no processamento de dados GNSS.
Não é raro uma rede de boa qualidade falhar no teste qui-quadrado, e resíduos isolados excederem o
critério Tau. Porém, isso não representa, necessariamente, razões para se rejeitar o ajustamento.
Outros parâmetros
Existem ainda outros parâmetros que podem ser analisados nos relatórios. Esses parâmetros, junto
com os testes estatísticos Tau e qui-quadrado, ajudam-nos a entender como está a qualidade das
observações, do processamento e do ajustamento de uma rede GNSS.
Existe uma variação nos nomes desses parâmetros, mas normalmente são utilizadas expressões em
inglês. A seguir estão relacionados alguns parâmetros e seu significado:
Erro Padrão da Unidade de Peso (Standard Error of Unit Weight): é a medida da magnitude dos
resíduos das observações em uma unidade de peso adotada no ajustamento de rede, quando
comparada com erros das observações estimados por um pré-ajustamento;
Fator de Referência (Network Reference Factor): esse valor permite conhecer quão bem os erros de
ajustamentos a priori (pré-ajustamento) estão de acordo com os erros a posteriori (pós-ajustamento).
Em outras palavras, o Fator de Referência é útil para mostrar quando os erros aleatórios nas
observações são aceitáveis, e se eles fecham com os desvios padrão para essas observações. Uma vez
que o Fator de Referência se aproxima de 1.0, significa que os erros nas observações estão
adequadamente estimados;
Graus de Liberdade (Degrees of Freedom): permitem saber a quantidade global de redundâncias
numa rede. Graus de Liberdade identificam o número de observações independentes incluídas no
ajustamento, que foram usadas para determinar as soluções. Quanto maior o número, maior
redundância tem-se no ajustamento;
Nível de Significância (Level of Significance): é uma expressão de probabilidade. Um sigma é dito ter
um nível de significância de 68%. Para erros unidimensionais, com 95% de nível de significância é
expressado como 1.96 sigma;
Ratio: é uma medida de quão boa foi a determinação de solução fixa, e números grandes são
considerados bons. Geralmente, o teste Ratio é ignorado quando a solução final for flutuante (float) ou
de código. O Ratio deve ser acima de 5 para inicializações OTF (On The Fly);
Variância de Referência (Reference Variance): é um valor de medida que mostra como está sua linha
de base em relação à determinação de seu erro. Idealmente, a variância de referência deve ser 1.0.
Valores menores do que esses indicam que erros menores do que o esperado foram encontrados.
Valores maiores indicam que mais erros do que o esperado foram encontrados.
Vimos que as opções de análise dos resultados não se limitam a uma apenas. Esses testes estatísticos
podem, e deveriam sempre, ser utilizados como ferramentas para se chegar ao final do ajustamento,
com resultados condizentes com os objetivos do levantamento.
Para se chegar à precisão da Norma Técnica para Georreferenciamento de Imóveis Rurais do Incra
(NTGIR), devemos levar em consideração alguns desses cuidados.
Espero que, com as considerações desse artigo e do anterior, tenha contribuído para o conhecimento
dos profissionais que trabalham com a tecnologia GNSS.
Devemos agora, aguardar a reformulação da NTGIR para saber se haverá novos parâmetros de precisão
aceitáveis nos levantamentos GNSS, além do tipo de solução, dos desvios-padrão e da aceitação no
teste qui-quadrado.
Wilson Holler é engenheiro cartógrafo e consultor em geotecnologias