Grupo de Trabalho: Indstrias Miditicas
RECREIO: UMA ANLISE COMPARATIVA DE MDIAS INFANTIS
Mayra Fernanda Ferreira
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Resumo:
A proposta deste trabalho analisar a produo cultural infantil Recreio em dois suportes
miditicos: a revista impressa e o website. Tendo em vista a presena miditica no cotidiano
infantil como fonte de informaes e entretenimento, importante que se verifiquem os
contedos transmitidos, a fim de pensar na percepo infantil e na formao do usurio/leitor.
Dessa forma, metodologicamente, adotamos como objeto de estudo uma edio da Revista
Recreio e sua correspondente no website.
Palavras-chave: Mdia Infantil. Anlise de mdia. Percepo Infantil. Ideologia.
1 Introduo
No dia 11 de outubro de 1905, as crianas conquistaram um novo espao: uma mdia
especfica para o pblico infantil. A revista Tico-Tico inaugurou esse cenrio, ao introduzir
tcnicas para a produo do que chamamos de imprensa infantil. Posteriormente, as empresas de
jornalismo impresso vislumbraram na infncia um pblico-leitor e passaram a editar
suplementos, revistas e cadernos especiais para crianas. Com o advento das Novas Tecnologias
da Informao e da Comunicao, a Internet tornou-se tambm um suporte para produo e
difuso de produtos para a infncia.
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Mayra Fernanda Ferreira. Mestranda em Comunicao Miditica no Programa de PsGraduao da Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho (Unesp). Bolsista
acadmica junto ao Departamento de Cincias Humanas da Unesp/Bauru (2008). Graduao em
Comunicao Social Habilitao em Jornalismo pela Unesp (2006). Bolsista Fapesp de
Iniciao Cientfica (2005) com a pesquisa Olhar da Infncia: um relato da mdia impressa. Email: [email protected]
Tendo em vista a presena desses produtos miditicos no cotidiano infantil, fundamental
que se observem os contedos e conceitos empregados nas mensagens, verbais e no-verbais,
transmitidas, uma vez que a construo do conhecimento infantil ocorre a partir das trocas de
experincias que a criana realiza com o mundo exterior. Alm disso, analisar as mdias infantis
um dos caminhos que nos permite conhecer as representaes que os produtores miditicos fazem
da e para a criana, ao mesmo tempo em que podemos verificar sua contribuio para a formao
do usurio/leitor.
Como as crianas contam com produtos culturais em diferentes suportes miditicos, o
objetivo do presente trabalho realizar uma anlise comparativa do produto Recreio, editado
semanalmente pela editora Abril desde 1999, que possui uma edio impressa e uma on-line.
Com a finalidade de verificar os contedos transmitidos, realizaremos uma anlise de contedo
quantitativa para identific-los, categorizando-os em informao, entretenimento, servio e
publicidade. Ao mesmo tempo, delimitamos como amostragem a capa e a homepage da edio
para analisar a construo e representao de conceitos e elementos inerentes ou no infncia,
uma vez que pretendemos observar como o infantil est presente e como pode se efetuar a
percepo das crianas ao receberem tais mensagens.
2 Suportes Miditicos infantis
Considerando a edio de jornais e revistas por veculos da chamada imprensa adulta,
Alberto Dines (2001, p. 116) define-os como a concluso lgica de um esforo em prol da
educao e da criana. Entretanto, um estudo da Agncia de Notcias de Direitos da Infncia -
ANDI (2002, p. 03) verificou que nos cadernos infantis faltam linhas editoriais, que ultrapassem
a formatao tradicional baseada em passatempos, e conscincia da importncia destes cadernos
enquanto instrumento pedaggico para o desenvolvimento da cidadania desde a infncia.
Aliado a isso, o jornalismo infantil impresso precisa se concentrar em informar seu leitor
com objetividade e iseno sobre os assuntos de seu interesse, utilizando tcnicas e linguagens
adequadas s suas caractersticas. Ao mesmo tempo, o jornal deve valorizar a visibilidade, porque 447
um jornal primeiramente visto, antes de ser lido. Segundo Freinet (1974, p. 30), as crianas se
interessam pelos jornais, sobretudo se eles so ilustrados e coloridos.
Infncia e o Ciberespao
Lvy (2000) define o ciberespao como novo meio de comunicao que surge da
interconexo mundial dos computadores, abrigando no apenas a infra-estrutura material da
comunicao digital, mas tambm o universo de informaes e os usurios. Diante disso, as
crianas, enquanto usurias e pblico de sites nesse ambiente, deparam-se com uma nova
linguagem e estrutura: a hipermdia.
Ao considerar a hipermdia como exemplo mximo de hibridismo do verbal, do som e da
imagem, Santaella (2001) explica que essa nova mdia por meio da digitalizao permite a
compresso dos dados, permitindo a circulao de uma grande quantidade de informao,
independentemente do meio de transporte. Alm disso, a linguagem hipermiditica proporciona
um processo de comunicao dialgico e interativo.
A hipermdia uma linguagem eminentemente interativa. O leitor no pode us-
la de modo reativo ou passivo. Ao final de cada pgina ou tela, preciso
escolher para onde seguir. o usurio que determina que informao deve ser
vista, em que seqncia ele deve ser vista e por quanto tempo. Quanto maior a
interatividade, mais profunda ser a experincia de imerso do leitor, imerso
que se expressa na sua concentrao ateno e compreenso da informao. O
desenho da interface feito para incentivar a determinao e tomada de deciso
por parte do usurio. (SANTAELLA, 2001, p. 394)
A respeito do texto verbal, temos no hipertexto a possibilidade de interao, uma vez que o
usurio pode navegar no-linearmente, conforme seus interesses e curiosidades. Dessa forma, ele
estabelece sua co-participao na produo das mensagens. A quebra de linearidade do texto
proporcionada pelo hipertexto permite que o usurio participe da redao ou edio do texto final
porque ele quem determina seu percurso de leitura. Tal fato se assemelha ao fluxo de
pensamento e raciocnio, o que permite que as crianas e jovens tenham mais facilidade de se
adaptar a essas novas linguagens. 448
So mais prximas tambm das crianas devido s caractersticas do hipertexto,
com a convergncia de linguagens e, especialmente, com a interatividade. Esse
conjunto de caractersticas leva o aprendizado a adquirir caractersticas cada vez
mais ldicas, se bem que estamos ainda na infncia dessa nova pedagogia.
(CAPPARELLI, 2002, p. 143)
A partir do contato com esse novo ambiente informacional, os usurios tm sua cultura
modificada, adquirindo uma nova denominao: cibercultura. Para Lvy (2000), a cibercultura
o conjunto de tcnicas (materiais e intelectuais), de prticas, de atitudes, de modos, de
pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespao.
Restringindo os usurios ao pblico infantil, observa-se uma alterao nos valores e costumes,
construindo assim o que Capparelli (2002) denomina de cibercultura infantil, j que as
tecnologias originadas na cultura ajudam a criar novas situaes sociais e culturais para a
infncia.
Entretanto, criar essas novas situaes para a infncia exige que se conheam os
elementos do cotidiano e os interesses dessas crianas para que no se cometam equvocos de
representao, ao mesmo tempo em que se deve ter uma preocupao sobre como elas vo
receber, perceber e interpretar as mensagens. E, essa interpretao pode se diferenciar ou no de
acordo com o suporte.
Conhecimento no discurso
Para Peirce (1981) no h separao entre percepo e conhecimento, assim, todo
pensamento lgico (leia-se cognio) entra pela porta da percepo e sai pela porta da ao
deliberada. importante frisar tambm que tanto a percepo quanto a cognio so inseparveis
das linguagens por meio das quais o homem pensa, sente, age e se comunica.
Segundo Santaella (1993), a percepo a porta de entrada do conhecimento, uma vez
que nosso contato com os objetos, que esto no mundo, ocorre primeiramente pela impresso que
eles causam em nossos sentidos e depois pela intermediao do signo que se refere a esse objeto.
Os sentidos so dispositivos para a interao com o mundo externo que tm por funo receber 449
informao necessria sobrevivncia. [...] so sensores cujo desgnio perceber de modo
preciso, cada tipo distinto de informao. (SANTAELLA, 2001, p. 70).
Como o homem est no mundo e um ser cognitivo por excelncia, ele no espera
passivamente pelos estmulos, ele os busca numa percepo ativa do mundo (SANTAELLA,
2001, p. 77). Em relao aos estmulos, que so exteriores, so eles quem pressiona o mundo
interno, impondo linhas, traos e pontos, que so absorvidos por meio de nossa percepo.
Porm, como ocorre o processo perceptivo? Diante dos objetos do mundo exterior objetos
reais, existentes -, o homem recebe estmulos que so denominados de percepto, que pode ser
compreendido como tudo que se fora sobre ns, impelindo o receptor a reconhec-lo. A partir de
um signo mediador, o percepto passa a ser reconhecido em nosso mente como percipuum, que
seria o interpretante imediato. Na mente humana, esse percipuum recebe um julgamento
perceptivo que gera um signo novo, o interpretante final. O julgamento perceptivo formado por
mecanismos mentais que escapam ao controle humano.
Tendo em vista que o juzo depende de nossos esquemas mentais, Peirce (1981) afirma
que s percebemos o que estamos aptos para interpretar. Assim, o conhecimento comea com a
percepo, e no com estmulos de dvida. Dessa forma, a criana constri seu conhecimento de
mundo a partir do seu contato com o mundo fsico, por meio de seus sentidos, desenvolvendo
julgamentos que estabelecem a significao das coisas percebidas. No processo de comunicao,
que circular por natureza, qualquer produto miditico que se dirija a um pblico definido
precisa conhecer suas significaes para que possa ser compreendido. o que chamamos de
conhecimento compartilhado, adquirido tambm pela representao que o emissor e o receptor
tm de si mesmo, do outro e da mensagem. O fundamento dessa anlise est na obra de Michel
Pcheux.
Segundo Pcheux (1997), todo sujeito humano/social s pode ser agente de uma prtica
social enquanto sujeito. Entre as prticas sociais encontramos os discursos, os quais se
apresentam como reflexo do conhecimento objetivo da realidade do sujeito. Pensando nos lugares
ocupados pelos sujeitos no discurso, deparamo-nos com dois papis: o de emissor e o de receptor
de dada mensagem.450
O que funciona nos processos discursivos uma srie de formaes imaginrias
que designam o lugar que A [emissor] e B [receptor] se atribuem cada um a si e
ao outro, a imagem que eles se fazem de seu prprio lugar e do lugar do outro.
Se assim ocorre, existem mecanismos de qualquer formao social regras de
projeo que estabelecem as relaes entre as situaes (objetivamente
definveis) e as posies (representaes dessas situaes). (PCHEUX, 1997,
p.82)
Diante disso, todo processo discursivo formado por uma antecipao das representaes
do receptor, supostas pelo emissor, a fim de que este formule seu discurso. Essa antecipao
depende da distncia que o emissor julga haver entre ele e seu receptor. Dessa forma, os
discursos podem se caracterizar pela tentativa do orador de transformar o ouvinte, via persuaso,
ou pela identificao entre o orador e seu ouvinte, uma vez que estes compartilham significaes.
De acordo com Orlandi (1988), todo falante e ouvinte ocupam um lugar na sociedade, fato que
faz parte da significao.
Alm dessas representaes imaginrias que fazem os sujeitos se reconhecerem, h a
imagem que ambos fazem do referente (contexto, situao na qual ocorre o discurso), que se
constitui, ento, em um objeto imaginrio. Assim, a percepo da realidade sempre
atravessada pelo j ouvido e o j dito, atravs dos quais se constitui a substncia das
formaes imaginrias enunciadas (PCHEUX, 1997, p. 85-86). Nessa relao entre os sujeitos
no discurso e a mensagem, importante destacar que a leitura um processo de interao porque
o leitor real, diante de um texto, interage com um leitor virtual, ou seja, com o leitor imaginado
pelo autor, ou com o prprio autor. no momento da leitura que, segundo Orlandi (1988), h a
produo de significados, porque o leitor apreende o sentido do texto ao mesmo tempo em que
atribui sentidos ao mesmo.
A construo de sentido a um dado texto somado identificao do sujeito, emissor e/ou
receptor, o que constitui a formao discursiva. Nesse processo, os sujeitos se reconhecem a
partir do consenso intersubjetivo (a evidncia de que eu e tu somos sujeitos) em que, ao se
identificar, o sujeito adquire identidade. (PCHEUX apud ORLANDI, 1988, p.58). Alm disso,
o sentido adquire unidade. No entanto, no podemos esquecer a ideologia que perpassa a
construo dos discursos e que, diretamente ou indiretamente, afeta a atribuio de sentido.
Face a essas consideraes sobre os discursos, necessrio analisar sua construo, uma 451
vez que j temos as crianas como sujeitos definidos para o processo de identificao e
significao a partir de mdias especficas para o pblico infantil.
3 Recreio: anlise quantitativa
Com a finalidade de verificar os contedos apresentadas pela revista e pelo website da
Recreio, adotamos, metodologicamente, a anlise de contedo como ferramenta para identificar e
categorizar as temticas presentes. Segundo Bardin (1977), a anlise de contedo possibilita
descrever os contedos das mensagens, a fim de obter indicadores sobre a produo e recepo
dessas mensagens.
Tendo em vista que nosso objetivo categorizar os contedos, realizamos uma anlise de
contedo quantitativa para que possamos articular as caractersticas grfico-editoriais da edio
impressa e os elementos hipermiditicos na construo da Recreio. A categorizao das temticas
tem como base a classificao sugerida por Marques de Melo (1992, p. 09), segundo a qual
existem quatro categorias comunicacionias: Jornalismo, Educao, Lazer e Publicidade. A partir
desse estudo, adotamos as seguintes categorias para nossa anlise: informao, servio,
publicidade e entretenimento.
Na categoria informao, consideramos os textos jornalsticos ou no, com a funo de
informar, educar ou formar o usurio/leitor. No servio, encontramos dicas, sugestes e textos
afins, com a inteno de divulgao. A publicidade verificada nos anncios para promover
determinado produto ou programa. No entretenimento, enquadram-se elementos que exploram o
ldico, seja por meio de brincadeiras, quadrinhos ou textos destinados ao lazer infantil.
Entretanto antes de apresentar os resultados comparativos de nossa categorizao,
apresentaremos uma breve descrio dos elementos da revista e do website, veiculados no
perodo de 20 a 27 de setembro de 2007.
Revista Recreio452
Com 44 pginas muito coloridas, a revista apresenta 14 sees que abordam diferentes
temticas. H uma matria central, que a chamada da capa, cuja temtica tambm abordada
em outras sees, como a de teste, a de passatempo e a para brincar. A linguagem verbal bem
acessvel, com frases curtas e em ordem direta. A utilizao de verbos no modo imperativo e de
perguntas uma forma de interlocuo com o leitor. A linguagem visual bastante valorizada
com o uso de muitas cores, ilustraes e uma diagramao diversificada em cada pgina. Embora
tenha muitas imagens, no h sobrecarga visual nas pginas. Entretanto, o aporte visual se
sobrepe ao verbal, uma vez que as imagens so meramente ilustrativas, sem um carter
informativo significativo. H tambm sees que possibilitam a participao dos leitores a partir
do envio de desenhos, fotos e comentrios sobre a revista. Um detalhe a ser mencionado o
brinde que acompanha a revista: uma letra-rbo que, ao mesmo tempo em que um jogo de
cartas, uma coleo de dicas de Lngua Portuguesa.
Levando em considerao os contedos, o grfico abaixo apresenta numericamente a
representatividade das categorias da anlise quantitativa:
Grfico 01: Porcentagem das categorias na edio
A tabulao acima demonstra que a edio impressa da Recreio apresenta uma valorizao
dos contedos referentes ao entretenimento infantil, o que fica evidenciado nas seguintes sees:
teste, passatempo, piadas, tirinhas, mo na massa, games, na TV e para brincar. As sees pelo
mundo e curiosidades caracterizam o informativo na revista. Em relao publicidade, 453
identificamos cartazes de bonecas, bolachas, refrigerantes e DVDs para o pblico infantil.
Apenas uma das publicidades se porta como propaganda, j que segundo Torquato (2001, p.
129), a propaganda vende idias, sendo supostamente educativa ou instrutiva, ao contrrio da
publicidade que persuasiva, utilizando da linguagem plstica para atrair o leitor. A propaganda
aparece na atividade ldica do refrigerante que traz dicas ambientais reciclagem e extino dos
animais. O servio est apenas no cartaz promocional da estria de um filme.
Diante desses resultados, observamos que o carter ldico e de diverso prevalece no
contedo da revista, o que ratifica a afirmao da ANDI (2002) de que a mdia infantil no
valoriza satisfatoriamente seu papel enquanto instrumento pedaggico. No caso dessa edio
analisada, quando trouxe temticas informativas, o contedo foi bem explorado, de uma maneira
atraente e divertida para o pblico infantil. Tal fato pode ser observado na matria sobre plo
norte e plo sul que aparece na forma de teste, alm de contar com ilustraes representativas e
piadinhas. Nas abordagens de entretenimento, h uma variedade de temas, que pode contemplar
diferentes gostos infantis, como televiso, jogos e atividades manuais. importante frisar a
representao da publicidade: das 44 pginas, 08 comportam essa categoria em todo seu espao,
sendo que 05 esto em pginas mpares que so aquelas para as quais o leitor direciona seu
primeiro olhar ao abrir um par de pginas.
Website Recreio
O layout do website j se diferencia pela sua construo, uma vez que os elementos
verbais e visuais esto dispostos como peas de uma mquina. Alm das caractersticas
relacionadas ao contedo do site, tambm se encontram na homepage janelas promocionais e
links para sites da editora Abril. Na homepage, h a imagem da capa da edio impressa da
revista e as chamadas relacionam-se aos temas trabalhados na edio impressa, que integram
algumas das 05 sees fixas do website. Ao passar o mouse sobre essas sees, h movimento
e som diferentes que se relacionam a proposta de cada seo. Alm disso, h um link para que o
usurio conhea a capa da prxima edio da revista, que ao ser visitado mostra o contedo da
revista completa ao deslizar o mouse sobre o canto inferior da direita da capa. Tambm h janelas 454
de busca, shopping e publicidade. Esta se apresenta como jogos de videogame, mas so vdeos
publicitrios feitos por crianas para promover o produto anunciado. Alm do contedo para
crianas, h duas sees que se remetem aos pais e aos professores. Esses links so dicas e a
apresentao da Revista para esses adultos.
O carter visual do website marcado por ilustraes e cores. A linguagem verbal em
todas as sees no apresenta dificuldades de compreenso: as frases so curtas e em ordem
direta. H tambm vrias interlocues com a utilizao de perguntas diretas e verbos no
imperativo. Em vrios links, o website promove a interatividade, seja por meio da participao do
usurio no envio de contedos, na busca de informaes e na possibilidade de indicar a pgina
visitada para um amigo ou imprimi-la. Cabe ressaltar que essa interatividade no apenas entre o
usurio e a mquina, o computador, mas tambm com os demais usurios, o que promove a
comunicao interpessoal, ou seja, h interao.
Partindo para nossa categorizao, observamos a seguinte incidncia das temticas a partir
da navegao nos links disponveis no website.
Grfico 02: Porcentagem das categorias no website
A categorizao realizada demonstra que o website tem no servio sua maior
representatividade, devido presena de sees e links promocionais e de divulgao, como das
edies impressas, de atividades para os pais e professores levarem s crianas, de demais
produtos da editora Abril e de promoes para as crianas. O entretenimento encontrado nas 455
sees jogos, colees e atividades que, apesar da existncia de opes de temas, visam ao lazer e
diverso infantis. Aliado informao, tambm h entretenimento na seo Fique por dentro,
que resgata elementos da infncia como testes, lbum de fotos e piadas para explicar determinado
tema, e no Clube Recreio porque, devido participao do usurio, encontram-se elementos
dessa categoria como piadas e blogs. O contedo informativo aparece nestas sees porque
fornecem dicas, curiosidades e, na Fique por dentro, uma ficha informativa sobre o tema
escolhido. O link de busca tambm informativo porque direciona o usurio a outras
informaes, mesmo que estas versem para o entretenimento. A publicidade, alm de contar com
um link especfico para esse fim, tambm est presente na seo Colees e na Loja Recreio.
Cabe destacar que, nesta anlise, no categorizamos todas as chamadas de capa, uma vez
que elas remetem ao contedo da seo correspondente, sendo que esta j foi categorizada.
Apenas uma das chamadas foi categorizada como informao e entretenimento porque abre uma
nova janela independente das sees, na qual h um passatempo informativo sobre o plo norte e
plo sul.
Diante dos dados apresentados, podemos afirmar que o website apresenta uma variedade de
opes ao usurio, com destaque para o servio, uma vez que pretende ser uma ponte para outras
informaes, alm de promover a interatividade com o mundo no-digital. Entretanto, sua carga
informativa no satisfatria se compararmos com o ideal de uma mdia infantil, conforme os
estudos da ANDI (2002). O website no tem uma proposta pedaggica, embora na seo Fique
por dentro haja uma explorao de temas da cincia e do conhecimento de forma divertida, que
podemos caracterizar como ensinar brincando. J a relao que se estabelece com a editora
Abril impe um carter mercadolgico ao website, ao mesmo tempo em que o Clube Recreio
uma forma de inserir o usurio em sua dinmica e propiciar a interao interpessoal.
Anlise Comparativa
Articulando os resultados obtidos na categorizao temtica da revista e da edio on-line
da Recreio, observamos que ambos valorizam a linguagem visual, utilizando como aporte cores,
ilustraes e uma diagramao/layout diversificado e atraente para o pblico infantil. Entretanto, 456
devido ao seu aporte visual e nos movimentos, os contedos no website aparecem de uma forma
diferenciada da revista porque possibilitam uma maior interao com o usurio, uma vez que ele
quem direciona e define seu percurso de leitura e interesses. Estes tambm so contemplados de
diferentes maneiras, principalmente via entretenimento.
Em relao aos contedos e chamadas da homepage, h uma semelhana com a edio
impressa. Tal semelhana pode ser exemplificada nas chamadas para a coleo da letra-rob e
para as matrias sobre plo norte e plo sul e sobre piquenique. A abordagem verbal no
apresenta problemas de concepo, embora na edio on-line haja menos linearidade de
informao. Ao mesmo tempo, as atividades e os passatempos do website so mais diversificados
e modernos, talvez pela possibilidade de interligao com outras sees, movimentos e sons.
A publicidade uma categoria com grande expressividade nos dois suportes. No website,
ela bem demarcada e explcita, j na revista observa-se sua valorizao ao ocupar pginas e
contracapas inteiras. Nos anncios publicitrios, o carter mercadolgico acentuado, muitas
vezes, direcionando-se aos pais dos leitores/usurios.
Por fim, verifica-se que o website pode ser considerado um complemento para a edio
impressa, levando em conta que ele faz ligaes com a revista, principalmente por apresentar seu
contedo e sua prxima edio antecipadamente. Dessa forma, podemos considerar a revista
como uma mdia com temticas especficas com uma abordagem mais direta e o website, uma
mdia com uma possibilidade maior de dilogo com o usurio e seus pais e professores. Alm
disso, o suporte on-line permite, por meio de links, uma liberdade ao usurio para que este
identifique o que realmente lhe interessa.
Cabe, ento, um questionamento sobre os contedos, j que observamos que a informao
no se apresenta como preocupao primeira. E, quando pensamos em uma mdia, visamos ao
seu carter informativo e educativo, mesmo quando direcionado s crianas. Porm, quanto
atratividade para o pblico, as edies contemplam as suas especificidades em um primeiro
momento pela linguagem visual, condizendo com a afirmao de Freinet (1974).
4 Discurso e representao na Recreio457
Com a finalidade de verificar os conceitos empregados pela mdia infantil Recreio em
seus suportes, adotamos como amostragem a anlise da capa da edio impressa e a homepage do
website. Segundo Godoy (arquivo digital), uma amostragem pode indicar, ou melhor, representar
o todo.
A Teoria da Amostragem afirma que possvel recuperar-se totalmente um sinal
contnuo a partir de uma coleo de amostras do sinal original, obtidas em um
determinado perodo de tempo. Isto , os fenmenos que na Realidade
apresentam-se como continuidades infinitesimais podem ser recuperados em
toda a sua extenso utilizando-se como ponto de partida uma coleo finita de
amostras discretas daquela continuidade. Para isso necessrio que as amostras
sejam feitas em quantidade suficiente para que a informao contida no sinal
original possa ser recuperada posteriormente. (GODOY, arquivo digital)
Dessa forma, nossa amostra capa e homepage da Recreio - se torna suficiente para
demonstrar como a infncia representada nessa mdia e quais os valores que so transmitidos
pelos seus produtores. De acordo com Perrotti (1990), a produo cultural para crianas apresenta
valores do mundo adulto, uma vez que os produtores julgam o que seria de interesse delas .
Pensando nesse olhar conduzido, a partir do discurso miditico, nossa anlise pretende
identificar os elementos que demonstram o foco da Realidade adotado pela produo da Recreio
que ser recebido pelas crianas. Para tanto, utilizaremos com aporte a teoria peirciana dos signos
e a representatividade dos sujeitos nos discursos, conforme j destacamos da obra de Michel
Pcheux.
Capa em anlise 458
A capa da edio tem como destaque a figura feminina da personagem principal do desenho
infantil Creepie. A ilustrao totalmente estereotipada: so utilizadas formas e cores fortes para
marcar a menina. A proporo do corpo tambm demonstra novos valores: o de magreza (corpo
esguio) e inteligncia (cabea em destaque em detrimento do corpo). A maquiagem e as unhas
pintadas so smbolo da beleza feminina, da vaidade que hoje tambm atinge as crianas. O
visual da personagem condiz com os novos grupos urbanos que se vestem de preto e roxo e tm
um corte de cabelo diferente.
A ilustrao da menina acompanhada de insetos que ganham um carter humano, uma
vez que seus olhares e sorrisos so expressivos e j denotam sua personalidade.
Concomitantemente, diante da relao da personagem com os insetos, observa-se um retorno
natureza humana: o homem um animal simblico. Animal porque possui instintos que
conduzem parte de suas aes, e simblico porque suas relaes so envoltas por smbolos
criados por ele e que o constroem como ser racional.
Dessa forma, a viso antropocntrica perde seu valor e o foco volta-se para a relao
natural do homem com seu entorno social. Alm disso, a prpria chamada de capa referente ao
desenho infantil faz essa relao natural: Insetos na famlia, significando que o homem precisa
dividir seu espao, uma vez que ele no o centro do universo, ao mesmo tempo em que
necessita se relacionar harmonicamente com seu ambiente para compreender a continuidade de
sua existncia. 459
A leitura da capa ainda nos mostra o jogo de cores que expressam a sensao de alegria,
animosidade e diverso que pode ser encontrada ao se abrir a revista. Ao mesmo tempo, a
linguagem verbal das quatro chamadas de capa j insere o leitor por meio do emprego de verbos
no modo imperativo: saiba e aventure-se. Tais verbos tambm fazem referncia curiosidade
natural das crianas, tambm marcada pela espontaneidade infantil. Desse modo, a criana, no
contato com a capa, j recebe uma imagem que o produtor da revista fez sobre ela: criana
esperta, curiosa e feliz, que procura um divertimento. O prprio nome da revista Recreio faz
aluso diverso, uma pausa necessria e muito esperada pela criana no ambiente escolar.
Em suma, a capa demonstra ideologicamente o novo padro de homem que deve ser
buscado e construdo: o homem em dilogo e intercmbio com a natureza, priorizando seus
instintos. Assim, a criana recebe a mensagem de que no necessrio ter medo dos insetos
porque eles so como membros da famlia, alm do padro fsico que ela deve ter para se situar e
ser reconhecida no mundo.
Anlise da Homepage
A hompage como j foi citada construda como uma mquina, na qual cada pea
apresenta funes (links) diferentes. Essas peas constituem o contedo do website. Nessa
relao homem-mquina, j existente entre a criana e o computador que ela utiliza para navegar
no website, mantm-se o padro de supremacia da tecnologia, uma vez que ela quem fornece os 460
elementos para a criana. Apesar disso, os links que remetem a janelas diversificadas que
possibilitam ao usurio definir sua rotina ao adentrar na mquina Recreio, um espao no qual ele
pode se aventurar e desvendar caminhos. A sensao de liberdade que o website permite
transmite a ideologia da autonomia infantil conquistada via Novas Tecnologias da Informao e
da Comunicao. No entanto, ao apresentar os links para pais e professores, a homepage refora a
presena do adulto e do controle deste na vida da criana.
A cor vermelha como plano de fundo para a apresentao dos destaques da home,
estrategicamente, refora a emoo e alegria caso a criana navegue pelo website. Da mesma
forma, as ilustraes despertam a ateno e a curiosidade j que so bem representativas, embora
nada informativas. A linguagem verbal dos ttulos e chamadas tambm preza pelo despertar a
ateno infantil. A escolha das chamadas pretende oferecer um panorama da diversidade temtica
que se encontra ao navegar o website.
A apresentao das sees no canto esquerdo da tela assemelha-se ao jogo de memria
infantil Genius, no qual as crianas tm que seguir a luminosidade e som de quatro botes
coloridos para acertar a ordem em que as cores aparecem. Alm disso, h um som e movimento
especficos dos cones/ndices que ilustram cada seo. Tais ilustraes so cones porque se
assemelham ao real, no caso da seo de jogos a ilustrao cone do jogo quebra-cabea,
porm ndice de jogos porque quando o usurio se depara com um quebra-cabea logo se
remete a um jogo, passatempo, diverso. Dessa forma, esses elementos se identificam com o
cotidiano infantil, fazendo que a criana sinta-se representada no website.
Em sntese, a ideologia e o discurso da homepage apontam para a relao de
(in)dependncia e liberdade da criana em relao mquina e suas peas. H tambm uma
interlocuo entre a imagem que o produtor do website tem da criana com o que caracteriza o
cotidiano infantil, principalmente pelos cones/ndices presentes na home.
Comparao analtica
As duas amostras revelam o padro de infncia pretendido e difundido pelos produtores
da mdia infantil Recreio: uma criana independente, autnoma, vaidosa, mas que respeite os 461
limites do cotidiano, uma vez que um ser de relaes naturais. Ao mesmo tempo, observamos
uma preocupao das mdias de se reportarem a elementos da infncia para caracterizar a
publicao e, conseqentemente, chamar a ateno de seu usurio/leitor. Tais elementos so
recorrentes nas demais pginas da revista, principalmente no ndice, e nos links das sees no
website.
Em relao ao discurso pretendido, observa-se uma valorizao da incluso da criana no
produto para que esta se sinta representada e identifique seus interesses. No entanto, essa
preocupao perpassada pela ideologia do consumo do produto, tanto que, em um primeiro
momento, sem se ater aos elementos e suas articulaes com o todo na capa e na home, as
publicaes valorizaram a linguagem visual para prender a ateno da criana. Ao conquistar a
ateno do usurio/leitor, que se articulam os elementos da infncia, os quais transmitem os
valores do que os produtores acreditam ser a infncia.
Nessa perspectiva, h um distanciamento do que essa infncia na realidade, j que no
verificamos uma interveno infantil direta nas publicaes. A construo visual e definio dos
contedos ficam restritas aos interesses e julgamentos dos produtores, o que pode chegar a
descaracterizar a publicao, desde que no houvesse um dilogo implcito com o cotidiano
infantil por meio da sensao de alegria e diverso. Esse dilogo torna-se essencial para capturar
esse usurio/leitor e, assim, fazer com que a mensagem final da ilustrao ou do texto alcance sua
cognio e no fique apenas nos sentidos. Partindo da percepo para a construo do
conhecimento da criana, a revista e o website promovem uma ideologia de uma nova infncia
que, ao ser decodificada, comea a integrar o repertrio infantil. Porm, isso s se torna eficaz
porque h um conhecimento compartilhado entre os produtores e os interesses das crianas.
5 Consideraes finais
Com o cotidiano infantil permeado de produtos miditicos, necessrio verificar a
representao infantil a fim de que se construam prticas comunicativas para a infncia com o
objetivo de (in)form-la de acordo com seus interesses e caractersticas. Diante dos diferentes 462
suportes miditicos disponveis, o pblico infantil encontra na publicao Recreio um exemplo de
dilogo entre o impresso e on-line, entre a informao, a ludicidade e o entretenimento.
Entretanto, as anlises quantitativas, aliadas breve descrio dos elementos da edio
impressa e on-line da Recreio, apontam que o carter informativo ocupa um papel secundrio
diante da valorizao do entretenimento, no caso da revista, e do servio, no website. Este fato
implica a construo da identidade infantil, uma vez que a partir das experincias com o mundo
exterior que ela formula suas teorias sobre o mundo. Ao se deparar com contedos que no visam
sua (in)formao, sua percepo pode se restringir a esses elementos que tm como objetivo
central lhe fornecer diverso. claro que a infncia um perodo marcado pela liberdade e
brincadeira, mas se consideramos as crianas como futura base da sociedade, necessrio que
tenham informaes sobre a realidade para que conhea o que acontece no ambiente em que vive.
Dessa forma, devemos nos ater ao discurso empregado nas mdias infantis, uma vez que
estas podem atuar como fonte de ideologias e valores para as crianas, que, devido a sua
atratividade visual e ldica, podem ser incorporados, sem que haja um processo de significao
significativo. A partir da percepo infantil diante dessa mdia, considera-se que os produtores
tm uma imagem da infncia, j que constroem elementos que remetem ao cotidiano infantil, ao
mesmo tempo em que valorizam os passatempos e a linguagem visual. Quanto aos valores e
conceitos empregados na mdia Recreio, a amostragem selecionada capa e homepage
demonstram como o conhecimento compartilhado com o universo infantil explorado para
despertar a ateno desse usurio/leitor.
Aliado a isso, so transmitidos, ideologicamente, valores e imagens de uma nova infncia,
na qual as crianas devem se espelhar para se inserir na sociedade. Elas devem almejar seu
divertimento, buscar sua autonomia, exercitar sua liberdade e se relacionar com o mundo exterior
com sua natureza tambm para que possam sentir prazer e ser felizes. A construo e leitura
dessa infncia s so possveis porque os produtores da mdia compartem significaes sobre as
crianas e utilizam suas ferramentas miditicas de um modo intencional para atrair o
usurio/leitor. Ao mesmo tempo, as crianas tambm tm uma imagem desse produtor e da
mensagem dessa mdia, uma vez que os elementos utilizados na elaborao dos discursos
pertencem ao seu cotidiano. No entanto, somente se tornam fundamentadas a percepo e a 463
identificao infantil nessa mdia quando nos voltarmos para a criana e permitir que ela
manifeste sua opinio sobre o produto miditico, alm de observamos seu contato e percurso de
leitura.
Como no h, na mdia analisada, uma participao efetiva das crianas na produo e
difuso das mensagens e discursos, so os produtores miditicos quem assumem o controle e
definem o que ser transmitido. claro que observamos uma contribuio dos contedos para o
pblico infantil, ao mesmo tempo em que h uma atratividade visual e ldica inegvel, porm,
permanecem os questionamentos se a infncia representada e contemplada em sua totalidade
nessa mdia infantil e se no h uma construo idealizada e/ou de consumo dessa gerao que se
forma com as Novas Tecnologias da Informao e Comunicao. Alguns apontamentos sobre
essas questes j foram realizados neste trabalho. Talvez, em trabalhos futuros, encontremos
subsdios para responder mais concretamente tais indagaes.
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