Um andarilho no labirinto das leituras
Depois da ida a banhos, o regresso inevitável a casa proporciona a pausa ideal para colocar as
leituras em dia, por vezes noites passadas em branco a ler livros deliciosos e inesperados.
Decorria o mês de agosto meteorologicamente atípico pelas terras beirãs, ora brisa no rosto, ora sol
escaldante e abrasador. O tempo dos encontros de amigos de longa data, as festas e romarias festejam os
padroeiros de aldeias e vilas desconhecidas, colocadas no roteiro das folganças de verão, pelos cartazes
convidativos das comissões de festas.
O acaso tem destas coisas, a caminho do Douro para passar uns dias de
descanso decidi visitar um amigo, o qual me endereçou um convite para o
lançamento de um livro, em Alvite, mesmo em pleno coração da Serra da Nave.
Aí chegados, deparei com uma sala anexa à igreja repleta de alvitanos, miúdos e
graúdos, onde os mais idosos de rosto enrugado e vestes negras compareceram
para ouvir um dos seus: o filho da Preciosa, para falar do seu último livro,
Tempos sem Remição. O autor leu um conjunto de passagens do livro,
dedicadas aos seus progenitores e a todos aqueles que alimentaram com as
suas histórias a narrativa deste livro.
Ao regressar a casa, já com o livro na alma, a sua leitura confirmou as expectativas criadas, pelo
Coronel Gertrudes da Silva, naquele momento mágico de comunhão entre conterrâneos. A narrativa
descreve a persistência e a força daqueles que desde do princípio e a duras penas fizeram brotar o pão
desta terra tão madrasta. Em conjunto, lavradores e cabaneiros arrotearam e semearam nas fraldas da
serra o seu vale de lágrimas, mas também enraizaram a sua tenacidade destemida. E quando o labor
despendido é fraco em proventos, não resta outra solução senão procurar sustento mais longe.
A partida reforça a vontade do regresso e citando o autor, também para ele “ (…) não é a saudade
desses tempos e viveres que, mesmo assim, por vezes, ainda lhe atrapalham os passos, que neste livro
motivam verdadeiramente o autor, mas esta indomável vontade de voltar, comum a todos os alvitanos
que por qualquer razão daqui tiveram de se ausentar, de regressar a esta terra, a esta nossa casa, a este
lar primordial, a este modo ainda hoje tão singular de encarar e de viver a vida.”
Este livro perpetua a história das gentes de Alvite, tendo como pano de fundo a Serra da Nave. Do
livro Tempos sem Remição, pode dizer-se que, dispensar a sua leitura seria um pecado sem remissão. Viseu, 4 de outubro de 2011
Carlos Cruchinho