A Última CeiaSinal, Memorial, Mistério
A Páscoa judaicaObservareis esse costume como uma instituição perpétua para vós e vossos filhos (Ex 12,24)
Calendário lunissolar
O primeiro mês inicia após o equinócio da primavera
Os meses começam na neomênia
O dia 14 de um mês lunar cai na lua cheia
O domingo seguinte a Páscoa é o dia das Primícias
Duas festas em uma
Eis as festas do Senhor, santas assembleias que anunciareis no devido tempo.No 1º mês, no 14º dia do mês, entre as duas tardes, será a Páscoa do Senhor. E no 15º dia desse mês, realizar-se-á a festa dos Pães sem Fermento em honra do Senhor: comereis pães sem fermento durante sete dias. Tereis no primeiro dia uma santa assembleia, e não fareis nenhum trabalho servil. Durante sete dias oferecereis ao Senhor sacrifícios pelo fogo. No 7º dia haverá uma santa assembleia; e não fareis trabalho algum servil.(Lv 23,4-8)
Preparação da Festa
Sacrifício vespertino: pelas 14h30 o pai de família degolava o cordeiro, cujo sangue era recolhido pelo sacerdote para vertê lo no altar‑
Ao norte do Templo havia ganchos, em paredes e colunas, para destrinchar a vítima, a qual, uma vez limpa, era levada para casa envolta em sua pele
Ázimos, vinho tinto, ervas amargas (aipo, escarola, rabanetes e pepinos)
Acompanhamentos: salsa de mostarda, caldo de pescado, água com sal e vinagre; figos, amêndoas e canela; jarōset (mescla doce de maçãs picadas, mel, canela e um pouquinho de vinho rosado)
CronologiaO ano e o dia da Páscoa do Senhor
a.u.c. 776 777 778 779 780 781 782 783 784 785 786
A.D. 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35
O ano da morte do SenhorAno 29 Ano 30 Ano 33
Pelo calendário moderno, a véspera da Páscoa caiu num
sábado (16 de abril). Mas há quem defenda 18 de março (sexta-feira,
14 de Adar II)
A véspera da Lua cheia coincidiu com a sexta‑feira (7 de abril).
Contudo, pelo calendário moderno, com a quinta-feira (5 de abril)
A véspera da Páscoa coincidiu com a sexta‑feira (3 de abril)
Parece coincidir com a 69º Semana de Daniel (cf. Dn 9,26)
Ajusta-se melhor à tradicional duração de três anos da vida
pública do Senhor
Torna o martírio do Batista mais próximo da derrota de Herodes
para Aretas IV, marido de Herodíades, em 34‑36 (cf. FLÁVIO
JOSEFO, Antigüidades Judaicas, 18, 113s)
Segundo Tertuliano (Adversus Judæos, 8), a crucifixão ocorreu a 8 das calendas de abril, durante o
geminis consulibus (C. Fufio Gémino e L. Rubélio Gémino), 15°
ano de Tibério César (29 AD)
João Malalas assim data a morte de Cristo na sua Cronografia:
“Quando a Lua se encontrava no 14° dia, durante o consulado de Sulpício e de Silas, sendo Cássio Governador da Síria, nomeado
procônsul daquele país por Tibério”
Santo Irineu afirma que Jesus morreu aos 40 anos (Adv. hær., II,
32, 5)
Ocorreu em Jerusalém um eclipse parcial de Lua. O eclipse durou das
17h44 às 18h37, tendo a Lua nascido às 18h03. O Evangelho
dos Hierosolimitas acrescenta ao luto cósmico: “e a Lua perdeu o
seu brilho” (cf. Jl 4[3],15)
O ano do Mistério Pascal
Solução do problema
Santo Epifânio Prat e Vosté Lagrange e Braun
Fouard eLe Camus
Annie Jaubert
Jesus teria seguido o calendário dos essênios, para quem o dia 15
sempre era quarta‑feira.
Assim, a Ceia teria sido na terça, o
processo nos dois dias seguintes e a crucifixão na sexta
Jesus teria seguido um
cômputo adotado pelos fariseus mas evitado pelos
saduceus.Pois a
coincidência da festa do dia 15 de Nisã com a
sexta‑feira obrigaria os sacerdotes a
prepararem no sábado a festa das Primícias
Jesus teria seguido um
pretenso calendário
galileu
Cristo teria se valido de sua própria autoridade
para antecipar a
festa
Haveria dois calendários
em funcionamento em Israel, um lunar e outro solar
A Ceia derradeiraA Páscoa de Jesus
14 argumentos de J. Jeremias
A Ceia foi em JerusalémNuma sala disponível com este fim aos
peregrinosFoi noturnaJesus a celebrou em família com os
discípulosComeram reclinadosFoi comida em estado de pureza ritualO pão foi partido durante, e não no
começoFoi consumido vinhoEra vinho tintoHouve preparativosFoi dada esmolaCantaram-se hinosPermaneceram em JerusalémJesus comentou seu significado
simbólico
Da sombra para a luz
RITOS JUDAICOSRitos introdutórios Bênção da primeira copa e da festa Bebe-se a primeira copa Lavatório de mãos e bênção das ervas Entrada do cordeiroLiturgia pascal Enche se a segunda copa‑ Hagadah pascal
Primeira parte do Hallel (Sl 113–114) Bebe se a segunda copa‑ Lavatório de mãos Bênção sobre o pão e distribuição Bênção sobre o cordeiro Ceia com pães ázimos, ervas amargas, jarōset e vinhoBênção após a ceia Enche se a terceira copa e se faz a ação de graças‑ Bênção sobre o vinho Bebe-se a terceira copaRitos finais Serve se a quarta copa‑ Segunda parte do Hallel (Sl 115–118; 136) Oração de louvor sobre a copa Bebe-se a quarta copa
CEIA DE JESUSRitos introdutórios Disse-lhes: “Desejei ardentemente comer esta Páscoa
convosco, antes de sofrer. Pois vos digo: não tornarei a comê-la, até que ela se cumpra no Reino de Deus”.Pegando o cálice, deu graças e disse: ‘Tomai este cálice e distribuí-o entre vós. Pois vos digo: já não tornarei a beber do fruto da videira, até que venha o Reino de Deus”(Lc 22,15-18)
LavapésLiturgia pascal Saída de Judas Instituição do Pão eucarísticoBênção após a ceia Instituição do Vinho eucarísticoRitos finais Terminado o canto dos Salmos, saíram para o monte
das Oliveiras(Mc 14,26)
As palavras da instituição
TRADIÇÃO CULTUAL, PETRINA OU JEROSOLIMITANA (Mt; Mc)
Bênção Durante a Ceia Meu Corpo Sangue da Aliança
TRADIÇÃO SALVÍFICA, PAULINA OU ANTIOQUENA (Lc; 1Cor)
Graças Depois da Ceia Meu Corpo dado por vós Aliança no Sangue Mandato de reiterar
Tomai e comei: isto é o meu Corpo, que é entregue por muitos.Fazei isto em minha memória.
Tomai dele todos: isto é o meu Sangue, da (nova) Aliança, que é derramado por muitos (para remissão dos pecados).Fazei isto (cada vez que o beberdes) em minha memória.
Uma homilia de Bento XVIArquibasílica do Latrão, Missa in Cœna Domini, 5 de abril de 2007
A Última Ceia
Jesus celebrou esta ceia, de múltiplos significados, juntamente com os seus na noite precedente à sua Paixão. Com base neste contexto, temos de compreender a nova Páscoa, que Ele nos entregou na Sagrada Eucaristia. Nas narrações dos Evangelistas existe uma aparente contradição entre, por um lado, o Evangelho de João e aquilo que, por outro, nos comunicam Mateus, Marcos e Lucas. Segundo João, Jesus morreu na cruz precisamente no momento em que, no templo, eram imolados os cordeiros pascais. A sua morte e o sacrifício dos cordeiros coincidiram. Porém, isto significa que Ele morreu na vigília da Páscoa e, portanto, não pôde pessoalmente celebrar a ceia pascal pelo menos é assim que parece. No entanto, segundo os três Evangelhos sinópticos, a última Ceia de Jesus foi uma ceia pascal, em cuja forma tradicional Ele inseriu a novidade da oferta do seu corpo e do seu sangue. Até há alguns anos, esta contradição parecia insolúvel. A maioria dos exegetas julgava que João não queria comunicar-nos a verdadeira data histórica da morte de Jesus, mas tinha escolhido uma data simbólica, para tornar assim evidente a verdade mais profunda: Jesus é o novo e autêntico Cordeiro, que derramou o seu sangue por todos nós.
Jesus, o Cordeiro de Deus
Entretanto, a descoberta dos escritos de Qumran levou-nos a uma possível solução convincente que, embora ainda não seja aceite por todos, contudo possui um elevado grau de probabilidade. Agora, podemos dizer que quanto foi mencionado por João é historicamente exato. Jesus deveras derramou o seu sangue na vigília da Páscoa, na hora da imolação dos cordeiros. Porém, Ele celebrou a Páscoa com os seus discípulos, provavelmente, segundo o calendário de Qumran, portanto, pelo menos um dia antes celebrou-a sem o cordeiro, à maneira da comunidade de Qumran, que não reconhecia o templo de Herodes e estava à espera do novo templo. Portanto, Jesus celebrou a Páscoa sem o cordeiro, aliás, não sem o cordeiro: em lugar do cordeiro, entregou-se a si mesmo, o seu corpo e o seu sangue. Assim, antecipou a sua morte de modo coerente com a sua palavra: “Ninguém me tira a vida; sou Eu que a dou por mim mesmo” (Jo 10,18). No momento em que oferecia aos discípulos o seu corpo e o seu sangue, Ele cumpria realmente esta afirmação. Ele mesmo ofereceu a própria vida. Somente assim a Páscoa alcançaria o seu verdadeiro sentido.
Jesus, Templo de Deus
Nas suas catequeses eucarísticas, certa vez São João Crisóstomo escreveu: “O que estás a dizer, Moisés? O sangue de um cordeiro purifica os homens? Salva-os da morte? Como pode o sangue de um animal purificar os homens, salvar os homens, ter o poder contra a morte? Com efeito — continua São João Crisóstomo — o cordeiro podia constituir somente um gesto simbólico e, portanto, a expressão da expectativa e da esperança em Alguém que podia realizar aquilo de que o sacrifício de um animal não era capaz. Jesus celebrou a Páscoa sem cordeiro e sem templo e, todavia, não sem cordeiro nem sem templo”. Ele mesmo era o Cordeiro esperado, o verdadeiro, como João Baptista tinha prenunciado no início do ministério público de Jesus: “Aí está o Cordeiro de Deus, que vai tirar o pecado do mundo!” (Jo 1,29). E Ele mesmo é o templo verdadeiro, o templo vivo onde Deus tem a sua morada e onde nós podemos encontrar Deus e adorá-lo. O seu sangue, o amor daquele que é Filho de Deus e, ao mesmo tempo, verdadeiro homem, um de nós, aquele sangue pode salvar-nos. O seu amor, o amor no qual Ele se entrega livremente por nós, é que nos salva. O gesto nostálgico, de certa forma desprovido de eficácia, que era a imolação do cordeiro inocente e imaculado, encontrou a resposta naquele que por nós se tornou Cordeiro e, contemporaneamente, Templo.
Memorial e presença
Assim, no centro da nova Páscoa de Jesus encontrava-se a Cruz. Dela provinha o novo dom por Ele oferecido. E deste modo ela permanece na Sagrada Eucaristia, onde podemos celebrar a nova Páscoa com os Apóstolos ao longo dos tempos. É da Cruz de Cristo que provém o dom.
“Ninguém me tira a vida; sou Eu que a dou por mim mesmo”. Agora, Ele oferece-a a nós. O haggadah pascal, a comemoração da ação salvífica de Deus, tornou-se memória da cruz e da ressurreição de Cristo, uma memória que não recorda simplesmente o passado, mas atrai-nos à presença do amor de Cristo. E assim a berakha, a oração de bênção e de ação de graças de Israel, tornou-se a nossa Celebração Eucarística, em que o Senhor abençoa as nossas oferendas pão e vinho para, nelas, se entregar a si mesmo. Oremos ao Senhor para que nos ajude a compreender cada vez mais profundamente este mistério maravilhoso, a fim de o amarmos sempre mais e, nele, para que O amemos cada vez mais. Peçamos-lhe que nos atraia com a Sagrada Comunhão cada vez mais para junto de si. Rezemos para que Ele nos ajude a não conservar a vida para nós mesmos, mas a oferecê-la a Ele e, desta forma, a trabalhar juntamente com Ele, a fim de que os homens encontrem a vida a vida verdadeira, que só pode vir daquele que Ele mesmo é, o Caminho, a Verdade e a Vida!
Feliz Páscoa!
@narajr