UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
AVM FACULDADE INTEGRADA
O Difícil Encontro Entre a Escola e Adolescentes em
Cumprimentos de Medidas Socioeducativas
Por: Edel Carla Ferreira de Almeida
Orientador(a): Fabiane Muniz
Recife
2016
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
AVM FACULDADE INTEGRADA
O Difícil Encontro Entre a Escola e Adolescentes em
Cumprimentos de Medidas Socioeducativas
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada – Universidade Candido Mendes como
requisito parcial para obtenção do grau de
especialista em Psicopedagogia Institucional
Por: Edel Carla Ferreira de Almeida
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, Francisco e Angelina,
por todo apoio dado as minhas
escolhas. A minha irmã, Fábia Almeida
por sua atenção e dedicação a esse
trabalho.
METODOLOGIA
Por se tratar de uma pesquisa revisão de literatura, que tem por objetivo
revisar conceitos, acompanhar a sua evolução e descrevê-los com intuito de
propor novas significações, este trabalho se inscreve dentro de uma
abordagem qualitativa, pensada dentro do modelo proposto por Minayo (1993).
Segundo a autora, “é no campo da subjetividade e do simbolismo que se
afirma a abordagem qualitativa” (MINAYO, 1993, p. 244). Estudar a história da
educação no Brasil e as causas que produz a exclusão escolar de crianças e
adolescentes até os dias atuais.
A pesquisa será realizada organizada dentro dos seguintes
procedimentos:
1ª etapa: análise da história da educação no Brasil, com objetivo de
relacionar o processo de exclusão educacional atual com a forma que a
educação foi instituída no nosso país.
2ª etapa: pesquisar sobre a adolescência, seus conflitos e desafios
nesse período de moratória.
3ª etapa: investigar e analisar o fenômeno da adolescência e sua
relação com os atos infracionais, drogas, família e escola.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 10
CAPÍTULO I - A Exclusão Educacional na História do Brasil 12
CAPÍTULO II - Adolescência e Medidas Socioeducativas 20
2.1 Adolescência e Ato Infracional 25
2.2 Medidas Socioeducativas 26
CAPÍTULO III - Escola, Adolescência e Drogas 32
CONCLUSÃO 38
BIBLIOGRAFIA 41
Os Ninguéns
Eduardo Galeano
As pulgas sonham em comprar um cão, e os ninguéns com deixar a pobreza, que em algum dia mágico de sorte chova a boa sorte a cântaros; mas a boa
sorte não chova ontem, nem hoje, nem amanhã, nem nunca, nem uma chuvinha cai do céu da boa sorte, por mais que os ninguéns a chamem e
mesmo que a mão esquerda coce, ou se levantem com o pé direito, ou comecem o ano mudando de vassoura.
Os ninguéns: os filhos de ninguém, os dono de nada. Os ninguéns: os nenhuns, correndo soltos, morrendo a vida, fodidos e mal
pagos: Que não são embora sejam.
Que não falam idiomas, falam dialetos. Que não praticam religiões, praticam superstições.
Que não fazem arte, fazem artesanato. Que não são seres humanos, são recursos humanos.
Que não tem cultura, têm folclore. Que não têm cara, têm braços.
Que não têm nome, têm número. Que não aparecem na história universal, aparecem nas páginas policiais da
imprensa local. Os ninguéns, que custam menos do que a bala que os mata.
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INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como tema central a inclusão educacional de
adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto
Liberdade Assistida (L.A) e Prestação de Serviço à Comunidade (PSC).
O interesse para essa pesquisa foi despertado pela experiência atuando
como pedagoga do Centro de Referência Especializado da Assistência
Social (Creas) em Recife-PE. De acordo com o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA) o eixo principal da medida socioeducativa é a educação,
porém, na prática é o grande obstáculo para execução das medidas. As
Secretarias de Educação, as escolas e seus dirigentes apresentam
resistência para realizar as matrículas dos adolescentes.
Diante do difícil encontro entre a escola e os adolescentes em
cumprimento de medidas socioeducativa, é possível observar a violação dos
direitos e garantias fundamentais estabelecidos na Constituição Federal\88.
A escola apresenta a negação do direito a educação desses jovens. Na
sociedade e na escola ainda existe as marcas instituída pelo primeiro
Código de Menores de 1927, que repercute até hoje no imaginário popular e
ainda é reproduzido diariamente pela mídia, do “menor infrator”, do
“trombadinha”,o qual destitui esse adolescente do seu lugar de sujeito de
direito.
O presente trabalho faz uma explanação sobre a importância da inclusão
educacional para o cumprimento das medidas socioeducativas. Serão
abordados os principais entraves educacionais na inclusão dos adolescentes
à escola.
O primeiro capítulo tem uma breve análise da educação no Brasil com
início no período colonial, passando pela república e finalizando com as
legislações regentes da educação na atualidade.
O segundo capítulo, adolescência e medidas socioeducativas, apresenta
conceitos e as características da adolescência e dos adolescentes. O
mesmo capítulo contextualiza essa fase da vida com o ato infracional e as
medidas cabíveis de acordo com o Estatuto da Criança e do adolescente
(ECA). O terceiro capítulo; Escola, adolescência e Drogas, mostra o perfil
desses adolescentes; faixa etária, grau de escolaridade, situação
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socioeconômica, resistência do adolescente ao retorno da vida escola e o
uso de drogas legais e ilegais. Outro ponto relevante nesse capítulo a
importância da função materna e paterna na formação dos adolescentes, a
formação da subjetividade em uma sociedade de consumo, a negação do
sistema educacional para os adolescentes em cumprimento de medidas
socioeducativas e a marginalização da população em vulnerabilidade social.
A pesquisa foi realizada por meio de revisão de uma literatura de autores
como, Freitas, Freud, Winnicott, Caligares, Dor, Osório, Romanelli, entre
outros. Portanto, nesse trabalho a adolescência, os aspectos sociais, a
família, a escola e a legislação brasileira o código de menores, o eca e o
sinase são fontes de pesquisa e analise do tema abordado.
12
CAPÍTULO I
A exclusão educacional na história do Brasil
Em todo contexto da história da educação no Brasil constatamos sempre
um interesse em manutenção do elitismo educacional, ou seja, a educação do
Brasil ao longo da sua história vem defendendo e mantendo os interesses da
classe dominante de cada época.
No período colonial a grande dominação da educação ficou a cargo da
obra dos jesuítas, que de acordo com Romanelli (2014) foi a importação de
formas de pensamento e ideias dominantes da cultura medieval europeia
destinados ao branco colonizador. A essa classe que já era detentora do poder
político e econômico, cabia também o acesso à cultura implantada pelos
jesuítas. De acordo com Ramanelli (2014);
A escola era destinada somente pelos filhos homens que não os primogênitos. Estes recebiam apenas, além de uma rudimentar educação escolar, a preparação para assumir a direção do clã, da família e dos negócios, no futuro. Era, portanto, um limitado grupo de pessoas pertencentes à classe dominante que estava destinada a educação escolarizada.
A obra dos jesuítas foi implantada já segmentada e com objetivos
distintos para cada parte da população. A população indígena era catequizada
e recebia educação básica junto com a população de homens brancos, a
continuação do sistema educacional era destinada a elite. Esse tipo de
educação permaneceu no Brasil até o período republicano, mesmo com a
expulsão dos jesuítas.
A primeira parte de educação brasileira é instituída pela exclusão das
mulheres, negros, mestiços e fundamentada na importação e implantação de
uma cultura europeia sem respeitar a diferenças regionais. O sistema
educacional também é limitante e fragmentado, pois vai oferecendo a
educação como forma de reprodução da classe dominante. Para os índios e
brancos pobres a educação elementar, a educação média e a continuação para
a elite.
13
As mudanças vão acontecendo e o surgimento da pequena burguesia
aponta para novas necessidades e interesses educacionais. A educação
escolarizada ganha destaque como meio de ascensão social, pois, a pequena
burguesia não possui terras para receber o título de doutor, então cabia a ela
busca através do sistema educacional o prestigio, o reconhecimento social e o
poder político.
A criação dos primeiros cursos superiores no Brasil colônia destinados a
aristocracia produz uma mudança na função o ensino médio, pois, esse passa
a ter como função a preparação para o ensino superior. Assim, o país passa
por uma falta de organização educacional, pois a educação básica passa por
um abandono e a secundária passa para iniciativa privada. Uma educação
voltada para a classe dominante vai sendo a característica do sistema
educacional brasileiro.
De acordo com Serafim, (2009, p. 139 in Cohen (org)) “... nesse
processo, o ensino privado toma vulto em detrimento do ensino público. Assim,
o direito de estudar de forma digna fica restrito às classes economicamente
privilegiadas”.
Na república em 1891, o sistema educacional permanece dual, uma
educação para elite e outra para o povo. Para Romanelli (2014,) a dualidade do
sistema educacional brasileiro, se de um lado, representava a dualidade da
própria sociedade escravocrata, de onde acabara de sair a República, de outro,
representava ainda, no fundo, a continuação do antagonismo em torno da
centralização e descentralização do poder.
Algumas reformas foram feitas nesse período da República, porém, de
acordo com Romanelli (2014) a velha mentalidade escravocrata não era
privilégio das camadas dirigentes: era também uma característica marcante do
comportamento das massas que se acostumaram, após três séculos, a ligar
trabalho a escravidão.
Para Romanelli (2014, p. 24):
a necessidade de manter os desníveis sociais teve, desde então, na educação escolar, um instrumento de reforço a desigualdade. Nesse sentido, a função da escola foi a de ajudar a manter privilégios de classes, apresentando-se ela mesma como uma forma de privilégio, quando se utilizou de mecanismo de seleção escolar e de um conteúdo cultural e não foi capaz de propiciar às diversas camadas sociais sequer uma preparação eficaz para o trabalho.
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A educação elitista e conservadora é uma característica evidente na
educação brasileira. As transformações do sistema político vão acontecendo,
porém, o objetivo de uma educação para poucos é predominante.
A sociedade muda com a industrialização e com sistema capitalista, mas
a escola não acompanha a demanda do mercado o permanece com seu traço
dualista, ou seja, como uma educação voltada para elite e uma educação
basilar para o resto da população. Até 1930 a educação não era tida como
direito. O manifesto dos pioneiros da educação em 1932 traz em suas
reivindicações a educação como direito de todos.
De acordo com os fundamentos do movimento a finalidade da educação
se define com a filosofia de cada época. Nesse contexto o próprio manifesto
identifica o momento histórico de uma educação igualitária e como direito de
todos. Para Romanelli (2014), a educação deve vincular-se ao meio social,
saindo à escola do seu secular isolamento.
O manifesto dos pioneiros da educação é um marco na história da
educação brasileira, pois é através desse manifesto que inicia a luta pela
escola pública e igualitária. Esse movimento foi a luta para modificar a ideia da
educação como privilégio de uns em detrimento de outros. A visão é da
educação como problema social, o qual requer uma escola pública gratuita,
obrigatória e leiga.
A constituição de 1934 deu ênfase a educação como dever do Estado, já
a constituição de 1937 apresenta ação do Estado como supletiva na educação.
O que verificamos até esse momento da história da educação no Brasil ,é que
apenas 82 anos se iniciou a luta da educação como direito, com avanços e
retrocessos.
O art. 166 da constituição de 1946 garante a educação com seguinte
texto; “A educação é direito de todos e será dada no lar e na escola. Deve
inspirar-se nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana.”
A constituição de 1946 retoma a questão da educação como direito, que estava
explicito na constituição de 1934 e não foi contemplado na constituição de
1937, até então a constituição vigente.
Portanto, a educação como direito no Brasil até esse momento histórico
é feito de avanços e retrocessos, pois, mesmo estabelecido na constituição de
15
1934, não permanece de 1937, e, é retomado na de constituição de 1946. O
fato é que na prática a educação continuava dual, elitista e exclusiva.
A nossa história da educação é marcada pelos interesses dos
colonizadores e depois por um sistema frágil que continuou na essência a
reproduzir o mesmo modelo, sem conseguir efetivar a educação como um
direito de todos. Segundo Romanelli (2014, p. 59), “... as mudanças ocorridas
na escola, em atendimento as exigências da demanda, foram
predominantemente quantitativas...”.
Para Romanelli (2104, p. 71) “... Retratando a sociedade, o sistema
educacional brasileiro fora, até então, um sistema acentuadamente dualista; de
um lado, o ensino primário, vinculado às escolas profissionais, para pobres, e,
de outro, para os ricos, o ensino secundário articulado ao ensino superior, para
o qual preparava o ingresso...”
De acordo, FLORESTAN FERNANDES (1966, p. 614 apud
ROMANELLI, 2014, P. 73);
“ É certo que a República falhou em suas tarefas educacionais. Mas falhou por incapacidade criadora: por não ter produzido modelos de educação sistemática exigidos pela sociedades de classes e pela civilização correspondente, fundada na economia capitalista, na tecnologia científica e no regime democrático. Em outras palavras, suas falhas provêm das limitações profundas, pois omitiu diante da necessidade de converter-se em Estado educador, em vez de manter-se como Estado fundador de escolas e administrador ou supervisor do sistema nacional de educação. Sempre tentou, não obstante, enfrentar e resolver os problemas educacionais tidos como “graves”, fazendo-o naturalmente segundo forma de intervenção ditada pela escassez crônica de recursos materiais e humanos. Isso explica por que acabou dando preeminência às soluções vindas do passado, tão inconsistente diante do novo estilo de vida e opções republicanas, e por que simplificou demais a sua contribuição construtiva, orientando-se no sentido de multiplicar escolas invariavelmente obsoletas, em sua estrutura e organização, e marcadamente rígidas, em sua capacidade de atender às solicitações educacionais das capacidade humanas brasileiras.”
O sistema político muda no Brasil, porém, o sistema educacional
continua em descompasso com a realidade e as necessidades da população.
O podemos observar até o momento é que a educação não foi prioridade no
sistema governamental e existe sempre a predominância de interesses para o
favorecimento dos objetivos da classe dominante.
Em síntese do Brasil colônia até a República, o país não conseguiu
instituir um modelo próprio de educação. A marca da educação dos jesuítas e
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a não substituição do modelo educacional causou no Brasil a falta de um
sistema educacional que correspondesse às necessidades da população e
respeitasse a cultura e suas diversidades.
A cultura da importação de modelos de educação parece ser
estabelecida no Brasil. Com o período da industrialização e investimento capital
estrangeiro o país faz o acordo com os Estados Unidos e institui o acordo
MEC-USAID. Portanto, a mais uma vez na história a educação do Brasil vem
abraçar interesses de uma cultura estrangeira dominante com objetivos de
manutenção e privilégios de classes.
Os acordos MEC-Usaid no Brasil foram executados no período de 1964
a 1968 e em alguns lugares até 1971. Esses acordos envolvia todo o ensino
brasileiro do básico até a universidade, com a elaboração e execução de
planejamentos de técnicos americanos. Na prática era dominação da cultura
desenvolvida sobre um país subdesenvolvido.
Dessa forma é possível uma comparação do acordo MEC-Usaid com a
ordem dos jesuítas no Brasil. No período da colonização a imposição da cultura
europeia e uma educação voltada para a elite. Os acordos MEC- Usaid traz a
nova versão para um tipo de “colonização” industrial capitalista. Mais uma vez
o Brasil recebe a imposição da cultura dominante para a formação de mão de
obra “qualificada” para os interesses estrangeiros.
De acordo com Assis (2012, p. 337);
A ditadura militar no Brasil foi um período marcado por mudanças sociais, políticas, econômicas, culturais e educacionais, e principalmente, por lutas e repressão. No bojo deste regime autoritário, a educação precisou se ajustar às precárias condições de financiamento, espaço físico, recursos materiais, qualificação profissional, dentre outras.
A Lei de Diretrizes e base da Educação (LDB) de 1961, que passou 13
anos para ser aprovada, e, não apresentou mudanças significativas. As
mudanças ocorridas na lei em 1971 apontam mudanças no ensino de 1º e 2º
grau. A mais significativa foi a obrigatoriedade do ensino de 7 a 14 anos, que
ficou no papel, já que na prática não houve aplicabilidade da lei.
A Constituição Federal de 1988, conhecida como a constituição cidadã,
é estabelecida após um longo período de regime militar no país, a democracia
volta a ser instituída no Brasil. Depois desse período de luta a CF\88 apresenta
grandes avanços para a construção de um Estado Democrático de Direito. A
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CF\88 apresenta vários princípios e direitos, e a educação é um direito. No Art.
205 da CF\88 que apresenta o texto da educação como direito;
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
A educação como Direito enfatizado na CF\88, na LDB e no Eca,
atualmente o acesso a esse direito é garantido para o ensino obrigatório,o que
nos faz questionar agora é a questão da qualidade do serviço ofertado, pois o
que o pleno desenvolvimento citado no art. 205 parece ser utópico na realidade
da rede educacional pública do país.
Para Freitas (2009, p. 61);
A Constituição de 1988, preocupada com a tutela integral do ser humano, relaciona educação com formação profissional, mas sem este condão exclusivamente econômico, de formação de mão-de-obra. O propósito do legislador é fazer da educação um instrumento de inclusão no mercado de trabalho; para a subsistência.
A constituição de 1988 no seu Art. 206 os princípios básico da educação;
I – igualdade de condições para o acesso e a permanência na escola; II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III – pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino; IV – gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais; V – valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas; VI – Gestão democrática do ensino público, na forma da lei; VII – garantia do padrão de qualidade; VIII – piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos da lei federal.
Os princípios básicos apresentados no Art. 206 mostra uma
preocupação com a oferta da educação, permanência na escola, e aborda
conceitos para valorização dos profissionais e aplicação da gestão
democrática. O padrão de qualidade é apresentado no inciso VII, articular
oferta e qualidade de ensino no ensino público é um grande desafio para a
política educacional brasileira.
Buscar entender o bom emprego da qualidade no ensino público
brasileiro é questionar o que se define por qualidade. PEDRO DEMO (1999, p.
18
28 apud FREITAS, 2009, p.66) define cinco princípios que podem identificar a
qualidade na educação. O primeiro é focado na educação básica;
Por qualidade educativa da população entende-se acesso universalizado a conhecimento básico educativo, capaz de garantir a todos condições de participar e produzir. Para resumir numa expressão, trata-se de desenhar a formação básica necessária e que deveria estar ao alcance de todos, sobretudo via universalização do 1º grau.
Os cinco princípios definidos por Pedro Demo, são sintetizados por
Freitas (2009, p. 69) da seguinte forma;
A educação de qualidade é o ensino com currículo que compreenda o máximo do conhecimento científico formulado até o presente; desenvolvido com profundidade e com a atuação conjunta do professor e do aluno, voltados aos problemas concretos da humanidade e ao estímulo a atualização permanente.
O Direito a educação está posto na constituição de 1988, porém, a
responsabilização pela efetivação do direito é algo que deve ser exigido pela
sociedade de acordo com o Art. 211;
Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino. § 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios. § 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil. § 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio. § 4º Na organização de seus sistemas de ensino, os Estados e os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurará a universalização do ensino obrigatório. § 5º A educação básica pública atenderá prioritariamente ao ensino
regular.
No art. 211 mostra o modelo do sistema educacional descentralizados,
dividindo a responsabilização com município, estado e união. Todos são
responsáveis pela educação, mas deve priorizar para execução determinada
na lei. O processo da universalização do ensino no Brasil teve grandes
avanços quando a educação é concebida como direito, porém, ainda hoje é um
direito violado para muitas famílias.
19
A Lei de Diretrizes e Base da Educação (Lei 9394\96) e o Estatuto da
Criança e do Adolescente (Lei 8069\90) reforça a educação como diretito de
todos e obrigação do Estado. A CF\88, a LDB\96 e o ECA\90 fundamentam o
acesso e permanência a rede pública de ensino. Porém, mesmo com a
garantia da lei a inclusão do adolescente em cumprimento de medida
socioeducativa ainda é pautada no sistema separatista e excludente da
educação.
O Estado democrático de Direito no Brasil ainda é um sistema falho e
frágil. A sociedade brasileira em pleno século XXI traz um ranço de uma
sociedade aristocrática, o qual influi na prática a dificuldade de aplicabilidade
das leis e os avanços da democracia. A educação ainda é tida como privilégio
para boa parte da população.
Os adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas é o
recorte populacional onde podemos visualizar a continuação educação dualista
tão enfatizada por Romanelli no seu livro da História da Educação no Brasil.
A construção do vínculo entre a escola e o adolescente é complexa
diante da história da educação, pois em muitas dessas escolas o que parece
predominar ainda é um discurso de dominação, do opressor, que se encontra
na representação do professor e\ou na gestão escolar, figuras que poderiam
ser a referência para os adolescentes passam a reproduzir um discurso
repressor.
A história da educação no Brasil até o momento aparenta pouco
transformadora, apresenta durante vários períodos da história a doutrinação da
classe dominante sobre as demais, na atualidade mesmo que o ensino
obrigatório esteja quase universalizado no país, a realidade do sistema
continua dominadora e excludente. O desafio para a educação no Brasil é
garantir o acesso e melhora a qualidade do ensino público. A escola não pode
continuar com ideologia de doutrinação.
20
CAPÍTULO II
Adolescência e Medidas Socioeducativas
De acordo com Àries (1981), o século XX, é considerado o “século da
adolescência”, pois foi o período de sua conceituação na história. Muitos
autores utilizam o conceito de E. Erikson para definir adolescência como um
período de moratória do desenvolvimento humano. É nesse momento que o
sujeito vive o luto da saída da infância, porém não tem acesso ao mundo
adulto.
Esse período de transição é difuso para os adolescentes e adultos.
Geralmente os adultos tratam em alguns momentos esses adolescentes como
criança e em outros cobram um posicionamento de adulto, porém, ao
adolescente cabe esse conflito da perda da infância e a entrada em uma fase
indefinida, cheia de questionamentos.
De acordo com Osório (1989);
“A adolescência é uma etapa evolutiva peculiar ao ser humano. Nela culmina todo o processo maturativo biopsicossocial do indivíduo. Por isso, não podemos compreender a adolescência estudando separadamente aspectos biológicos, sociais ou culturais. Eles são indissociáveis e é justamente o conjunto de suas características que confere unidade ao fenômeno adolescência”.
Para Costa (2012), a adolescência apresenta características
predominantes no seu desenvolvimento, que é a busca por experiências e
sensações, a ousadia, a coragem, a condição de fazer as coisas de sua
geração, as quais se diferenciam do mundo adulto. Para os pais e\ou
responsáveis a forma de relacionamento tornar-se confuso, pois não é criança
e ainda não é adulto, e também é nessa fase que os adolescentes se afastam
dos pais e\ou responsáveis para passar mais tempo com os seus grupos.
Para o mesmo autor, essa fase se vive entre o mundo infantil e o adulto,
mas não chega a identificar-se com nenhum deles. Na adolescência as
transformações são diversas; do corpo, hormonais, de comportamento, entre
outras. Essas modificações são rápidas e precisam de um período de
adaptação para quem estar vivendo diretamente e para os que convivem com
ele.
21
Segundo Freitas (2002) os pais até um determinado momento tratavam
com uma criança, quando deparam com um adolescente, com seus
questionamentos muitas vezes hostis, ficam inteiramente pedidos. Nessa fase
os pais se deparam com a finitude da vida, percebem que estão envelhecendo
e perdendo lugar para os mais jovens.
De acordo com Costa (2012), na sociedade ocidental faltam ritos de
passagem objetivos, que definam o fim da adolescência e o começo de uma
nova etapa na vida em sociedade.
Para o autor (2012, p. 129);
“No contexto atual, a compreensão de que é adulto, ou mesmo adolescente, depende de muitos fatores, relacionados à condição social do sujeito, e, especialmente ao exercício de experiências afirmativas da identidade adulta, como trabalhar, engravidar, ter filhos, ter uma vida sexualmente ativa, sustentar a família.”
A adolescência é um período confuso para constituição da identidade,
pois existe uma necessidade de identificação. Para Eliane Brum (2011),
“Identidade é uma exigência do nosso tempo”. Essa identidade relacionada ao
que se tem, ao que se pode ter de acordo com o lugar social que ocupa, desta
forma é aprisionante.
Nesse lugar encontram-se os adolescentes com necessidades de
identificação. Segundo Freitas (2002), “está buscando objetos de identificação
para aliviar o seu drama edípico”.
De acordo com Nasio (2007, p. 12);
O Édipo é a experiência vivida por uma criança de cerca de quatro anos que, absorvida por um desejo sexual incontrolável, tem de aprender a limitar seu impulso e ajustá-lo aos limites do seu corpo imaturo, aos limites de sua consciência nascente, aos limites de seu medo e, finalmente, aos limites de uma Lei tácita que ordena que pare de tomar seus pais por objetos sexuais. Eis a questão essencial da crise edipiana: aprender a canalizar um desejo transbordante.
Para Winnicott (1999), na infância os que foram bem sucedidos
desenvolveram o complexo de Édipo, que pode ser definido como a
capacidade para enfrentar relações triangulares – aceitar a força total da
capacidade de amar e as complicações que daí resultam.
22
Para FERREIRA (apud COSTA, 2012, p. 132) a identidade em
construção resulta de dois pontos principais: “da afirmação ou rejeição seletiva
de identificações infantis; e da maneira como o processo social da época
identifica os jovens.”
De acordo Winnicott (1999) a adolescência é um período da vida que
tem que ser vivido, de descobertas pessoais e cada sujeito passa por uma
experiência vital, um problema de existência, e de estabelecimento de
identidade. Para o autor, o amadurecimento é a cura dessa fase.
Um bom desenvolvimento da infância é importante para o
amadurecimento da adolescência. Segundo Winnicott (2012) a criança
saudável chega à adolescência já equipada como um método pessoal para
atender aos novos sentimentos, tolerar situações de apuro e rechaçar
situações que envolvam ansiedade intolerável.
Conforme Freitas (2002) a adolescência é uma fase para elaboração de
lutos, pela perda do corpo, da identidade e dos pais da infância, o que é
definido como crise da adolescência. A passagem da crise da adolescência
estar sujeito a possibilidade de elaboração desses lutos, que dependem do
investimento libidinal no objeto perdido.
Para Winnicott (1999) o meio ambiente é extremamente relevante nessa
fase, e a maior parte dos adolescentes atinge a maturidade adulta, mesmo que,
tenham dado aos seus pais muitas dores de cabeça. Mesmo com o ambiente
favorável, cada adolescente passa por seus problemas pessoais difíceis de
atravessar.
Para Freitas (2002, p.34, 35);
“adolescência é um dos momentos mais conturbados do percurso dos homens. Esta fase implica uma desestabilização dos processos e valores que eram anteriormente estabelecidos, gerando, com isto, uma crise de perplexidade na medida em que estes valores e processos não podem ser utilizados de forma satisfatória neste momento de vida – período este propício ao aparecimento de sintomas que incomodam não só os pais como a todo o grupo social.”
De acordo com autor citado, a adolescência é uma fase de perdas, de
ganhos e de muito sofrimento. Negar o sofrimento é a causa de muitas
patologias nesse momento da vida. A negação pode conduzir a
comportamentos antissociais e autodestrutivos, encobridores de uma grande
angústia existencial.
23
Para VINCENT (2009, p. 114, Cohen, org, apud LACAN, 1988, p. 102)
“A angústia é justamente algo que se situa allures em nosso corpo, é
sentimento que surge dessa suspeita que nos vem, de nos reduzirmos ao
nosso corpo. Para Lacan, “tudo se passa como se algo estivesse escrito em
nosso corpo, algo que se oferece como um enigma”. (LACAN,1988, p.13)
Diante do fenômeno adolescência vamos fazer um paralelo na
contrariedade de ser adolescentes no mesmo país, mas com as diferenças
sociais e culturais que interferem completamente na vivencia dessa moratória,
que é a adolescência. Para OUTEIRAL (2001, p. 130);
“Para as classes sociais menos favorecidas, o processo de adolescer tem começado e terminado mais cedo, pois está condicionado à iniciação em experiência do mundo adulto, que tendem a ser antecipadas, com a iniciação sexual e o ingresso no mundo do trabalho. De outra parte, também tem sido uma tendência contemporânea o fato que a adolescência nas classes mais favorecidas poder ser prolongada, sendo adiadas etapas de iniciação profissional e da saída da casa dos pais.”
Segundo Costa (2012) os fenômenos sociais e culturais podem
influenciar e acelerar o ritmo de desenvolvimento precocemente, por exigir
escolhas quando os adolescentes não estão emocionalmente preparados. Para
o autor, situações de trabalho infantil, a trajetória de rua, o acúmulo de
responsabilidade no seio da família, assumir responsabilidade e sobreviver
financeiramente, entre outras. Esses desafios podem apresentar impactos
negativos sobre o seu desenvolvimento moral, cognitivo e afetivo. De acordo
com mesmo autor;
“O fato é que a adolescência é uma fase especial para todos, mas acaba constituindo-se em uma etapa difícil para meninos e meninas das famílias pobres do Brasil. Tudo fica mais complicado, quando as vicissitudes da idade somam-se a problemas de rejeição em casa e fora de casa, desemprego, pobreza e alcoolismo.”
Esses fatores proporcionam aos adolescentes frustrações, que em
muitos casos vão repetir os históricos familiares, que são famílias com
dificuldades econômicas, sem atendimento básico de saúde, fazendo parte de
sistema educacional precário e excludente, e, desta forma continua a violação
dos direitos, que “parece” fazer parte da existência dessas famílias. Os
24
adolescentes com a vida sexual iniciada muitas vezes na infância e ao chegar
nessa fase do ciclo de vida já estão constituindo sua família.
O que pode levar esses adolescentes na formação precoce de uma
família parece ser uma busca pela segurança, pelo amor, por aparentar ser um
único projeto de vida que ele pode realizar, desta forma outras crianças vão ser
geradas pela “falta”. E como canta Chico Buarque (1981);
Quando, seu moço Nasceu meu rebento Não era o momento Dele rebentar Já foi nascendo Com cara de fome E eu não tinha nem nome Prá lhe dar Como fui levando Não sei lhe explicar...
Essas famílias que são originárias da exclusão. Na sociedade
contemporânea o acesso aos direitos é negado, porém, consumo, o
imediatismo e o individualismo são incentivados a todos. De acordo com
Freitas (2002, p. 62);
“o bombardeio dos meios de comunicação em direção a um consumo desenfreado, a um modo de vida como na televisão, faz com que valores éticos fundamentais sejam descartados em detrimento de valores imediatista de prazer e consumo. A sociedade urbana impõe suas regras que vão desde o que vestir até o que pensar, formando assim opiniões que vão influir, de forma decisiva, sobre suas vidas”.
Segundo BHABHA (2005), vivem a dualidade, ou o limbo do interstício
cultural (citado em Rer. Bras. Adolescência e Conflitualidade, 2012 (6), p. 135);
“São realidades que estão em permanente relacionamento e em contato direto. Não existem muros claros e definidos quanto ao desejo de ter e pertencer. Existem muros claros que separam a possibilidade de ter de quem vive nas periferias das cidades, tendo a pobreza como limite objetivo. Se a realidade de não pertencer torna-se insuportável, estratégias de sobrevivência são acessadas, como a compra de produtos falsificados, ou sua aquisição por meios ilícitos”
Para Rosa (2006), independente de ser uma crise ou um processo, a
adolescência implica, necessariamente, um acertamento subjetivo em que os
25
trilhamentos do complexo de Édipo estarão presentes. O seu desenvolvimento
e suas relações vão depender do estilo como o sujeito foi estruturado.
A adolescência período complexo na vida do ser humano, fase de
conflitos, insegurança, indefinições e angústias. Tornando-se mais complexa
quando é necessária a intervenção do Estado para aplicação da Lei.
2.1 Adolescência e Ato Infracional
A adolescência fase de transição da infância para a fase adulta,
passando por todas as mudanças físicas, sociais e hormonais. Essa ainda é
um período de incertezas, que em muitos vão eclodi traumas e privações
vividos na infância. Talvez, a adolescência seja o período de maior indefinição
e dúvidas vivenciadas pelo sujeito. A falta de um lugar definido pode
proporcionar um comportamento de rebeldia e violência.
Para muitos adolescentes essa fase é caracterizada com suas
transgressões a lei, seja as regras familiares ou as leis sociais. Para Winicotti
(1999), existe uma estreita relação entre as dificuldades normais da
adolescência e anormalidade que se pode chamar de tendência antissocial.
De acordo com o autor, na raiz da tendência antissocial existe sempre uma
privação. Pode ser simplesmente que a mãe, num momento crítico, encontra-
se num estado de depressão, ou talvez a família tenha se dissolvido. Para ele;
A criança antissocial está procurando de um modo ou de outro, violenta ou brandamente, levar o mundo a reconhecer sua dívida com ela, está tentando fazer com que o mundo reconstitua o quadro de referência que se desmantelou.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) define ato infracional a
conduta descrita como crime ou contravenção penal. Para Salum (2012) O
ECA está fundamentado em uma doutrina jurídica conhecida como doutrina da
Proteção integral.
A Doutrina da Proteção Integral é decorrente da Declaração Universal
dos Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas (ONU) de 1950,
que implanta uma inovação na maneira de pensar a criança e o adolescente,
dando-lhes um tratamento diferenciado e prioritário por serem sujeitos em
desenvolvimento.
26
O Ato Infracional não pode ser avaliado de forma isolada, pois a
adolescência é uma fase de conflitos e experimentações. A Criminologia Crítica
considera o comportamento desviante do adolescente como um fenômeno
social normal, com exceção dos casos graves de violência pessoal, patrimonial
ou sexual. Nessa perspectiva uma transgressão a lei não é pré-requisito para
se constituir um adulto criminoso. Para Rosa (2006, p.283);
“...a estrutura psíquica condiciona o sujeito nas suas relações com o meio, constituindo-se a adolescência, no caso do ato infracional uma possibilidade de intervenção em Nome-do-Pai, na perspectiva de trazer o adolescente para o laço social, sabendo-se, ademais, que a maneira como será significada depende de cada singularidade do sujeito adolescente, sem que acha, portanto uma regra universal de outro.”
Segundo Costa (2012) a prática do ato infracional não é uma
características da personalidade do adolescente, ou um fato isolado. É uma
ação que precisa que precisa ser enfrentada pelo adolescente e sua família,
sociedade e Estado. É possível que o ato infracional cometido pelo adolescente
aponte justamente um sintoma.
De acordo com Rosa (2006) a partir da psicanálise, o ato infracional
pode ser um sintoma de que alguma coisa não está bem, especialmente nesta
fase de acertamento subjetivo – encontro com o real do sexo, conflito de
gerações, desligamento do Outro, angústia quanto ao futuro.
Em muitos casos o adolescente só perde a sua invisibilidade diante da
exposição ao risco de cometer um ato infracional. Nesses casos aparece o
Estado com a representação da lei para o cumprimento das medidas
socioeducativas e protetivas, já que a maioria não possui os seus direitos
básicos garantidos de educação, saúde e assistência social, entre outros.
Para Costa (2012), o fato é que os adolescentes têm tido protagonismo
na reprodução da violência e criminalidade, mas também têm se constituído em
suas maiores vítimas.
2.2 Medidas Socioeducativa
27
De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (lei 8.069\90)
capítulo IV, art. 112 as medidas socioeducativas são seis; advertência,
obrigação de reparo ao dano, prestação de serviço à comunidade, liberdade
assistida, inserção do regime de semi-liberdade, internação em
estabelecimento educacional.
Para COSTA (2009, apud ALVES, 2010 p. 25 ); “as medidas sócio-educativas visam educar o adolescente para o convívio social, por isso o nome socioeducativo. Educar para o convívio social é educar o adolescente para o exercício da cidadania, ou seja, temos uma relação direta das medidas socioeducativas com o direito à educação e com a escola, que é a instituição que encarna, concretiza e expressa o direito à educação.”
A aplicação das medidas socioeducativas tem como proposta a
responsabilização do adolescente perante o ato infracional cometido. Segundo
Salum (2012) a medida socioeducativa rompe com a lógica da punição prevista
pelo direito penal. Para a autora, medidas socioeducativas devem ser vistas
como possibilidade de que um adolescente seja responsabilizado pelos seus
atos.
O Estatuto da Criança e do adolescente (ECA) considera adolescente
aquele entre doze e dezoito anos de idade. O mesmo concebe a
inimputabilidade penal para os adolescentes. A legislação brasileira adotou o
critério de aferição da inimputabilidade do menor de 18 anos, presumindo, de
forma absoluta a imaturidade penal do mesmo, vinculando-o à regulamentação
especial, fora do Código Penal.
Para Rosa (2006, p. 281);
Cada adolescência é única, singular, e como tal deve ser respeitada em sua alteridade. Aí reside a ética de respeito ao desejo do sujeito e dos atores jurídicos. Sem esta compreensão o mero fato biológico de se completar a idade respectiva significaria o início da adolescência, situação de fato, ilusória.
A Constituição Federal\88 iniciou essa mudança quando tornam crianças
e adolescentes sujeitos de direitos, essa evolução estabelece as diretrizes para
a elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente. Por isso as medidas
socioeducativas devem romper com a lógica punitiva do Código Penal e
possibilitar aos adolescentes a responsabilização pelo ato. De acordo com
Salum (2012, p.166);
28
“As medidas socioeducativas para os adolescentes em conflito com a
lei consideram as particularidades de cada situação, as condições de vida difíceis que eles enfrentam, as diversas determinações, mas, mesmo assim, elas são modalidades para que eles respondam, juridicamente, pelo ato infracional que cometeram.Assim concebida, uma medida pode ser considerada um chamado para que o adolescente possa responder em sua condição de pessoa humana, ainda que considerado sua situação peculiar de desenvolvimento, com o ECA designa. Neste sentido, uma medida é um chamado da justiça àquele que se inscreveu no social através de um fato social.”
Para a autora, as medidas socioeducativas, previstas pelo ECA, para
adolescentes que cometeram atos infracionais, permitem considerar a
responsabilidade numa perspectiva mais próxima da forma concebida pela
psicanálise. A lógica que fundamenta o Estatuto torna possível o trabalho numa
concepção de responsabilidade diferente da que comentamos em relação ao
direito penal, quer dizer, como decorrência de uma faculdade abstrata, ideal e
inerente da pessoa humana, fruto de sua razão.
Das medidas socioeducativas estabelecidas pelo ECA, destacaremos a
Prestação de Serviço à Comunidade (PSC) e Liberdade Assistida (LA), as
quais são definidas no Art. 117, 118 e 119:
Art. 117. A prestação de serviço à comunidade consiste na realização de
tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses,
junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos
congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais.
Parágrafo único. As tarefas serão atribuídas as aptidões do adolescente,
devendo ser cumpridas durante jornada máxima de oito horas semanais, aos
sábados, domingos e feriados ou em dias úteis, de modo a não prejudicar a
frequência à escola ou à jornada de trabalho.
Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a
medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o
adolescente.
§ 1º Autoridade designará pessoa capacidade para acompanhar o caso,
a qual poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento.
§ 2º A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis meses,
podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por outra
medida, ouvido o orientador, o Ministério Público e o defensor.
29
Art. 119 Incumbe ao orientador, com apoio e a supervisão da autoridade
competente, a realização dos seguintes encargos, entre outros:
I – promover socialmente o adolescente e sua família fornecendo-lhes
orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou comunitário
de auxílio e assistência social;
II – supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do
adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula;
III – diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e sua
inserção no mercado de trabalho;
IV – apresentar relatório do caso.
De acordo com Rosa (2012) cometido o ato infracional, a medida
socioeducativa somente será executada a partir de uma decisão jurisdicional,
homologatória de remissão ou presa a pressuposto: a reconstituição
significante de conduta imputada, acolhida por decisão fundamentada, a partir
de uma visão de verdade processual decorrente de um processo contraditório e
acusatório.
As medidas socioeducativas em meio aberto, prestação de serviço à
sociedade (PSC) e liberdade assistida (LA) são executadas pelo governo
municipal, as quais devem ser priorizadas de acordo com a lei n. 12597\2012
que instituiu o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), que
tem com objetivo tornar mais efetivas as disposições contidas no ECA.
De acordo com Salum (2012, p 170) uma medida socioeducativa deve
ser tomada como uma forma de se dirigir a um adolescente para que ele possa
responder por seu ato. O adolescente ao ser sentenciado para cumprimento de
uma medida socioeducativa deverá encontrar no local da execução um espaço
de possibilidades, respeito e transformação.
O Sinase apresenta o Plano de Individual de Atendimento (PIA) para que
seja elaborado com a equipe técnica de acompanhamento, o adolescente e a
família dentro da perspectiva de participação popular. De acordo com Jimenez,
Jesus, Malvasi e Salta (2012, p.7):
o documento enfatiza os procedimentos que garantem os direitos individuais no transcorrer do processo e, além disso, avança ao destacar que o adolescente tem direito de receber informações sobre
30
o seu desenvolvimento de seu plano individual e, obrigatoriamente, participar de sua elaboração ( Inc. VI, art. 49).
Para os autores (2012, p.8), o PIA é importante para singularizar a
medida de acordo com as demandas efetivas dos indivíduos e das demandas
de políticas públicas que deveriam amparar os programas socioeducativos,
segundo o princípio da incompletude institucional. Ele pode ser um importante
instrumento de previsão, registro e gestão de atividade.
A construção do PIA reforça a ideia de um sujeito de direito, no processo
de formação e com responsabilidade para os seus atos. De acordo com Salum
(2012, 169);
No trabalho com esses adolescentes em cumprimento de medida ressalta-se uma construção de um projeto de vida que envolva diversos parceiros, além de um conjunto de profissionais e várias instituições: a família; o estado – através das políticas de saúde, educação assistência social, dentre outras -, as instâncias judiciária, executiva e o ministério público; e a sociedade de forma ampla.
A parceria entre as políticas públicas para excursão das medidas
socioeducativas é um grande desafio, por que mesmo com o avanço da
legislação nas últimas décadas que reforça a conceito de crianças e
adolescentes como sujeitos de direito, o que parece permanecer ainda na
sociedade é a ideia de punição. Nessa perspectiva a inclusão do adolescente
que cometeu um ato infracional na escola é garantir um direito diante de tantos
outros que geralmente foram e são negados a eles.
Para ATHAYDE, BILL, e SOARES (2005, p. 214 apud COSTA, 2012, p.
124); “Meu filho vai sair. Tem uns que não conseguem sair. Isso é um labirinto;
ele ainda não encontrou a saída, mas vai encontrar.”
Por todos esses aspectos, qual seria o saída para o labirinto, como
encontrar o caminho no meio dos conflitos subjetivos e sociais, para onde
correr quando as referências e os modelos estão sendo distorcidos pela falta
de ética e a necessidade de aceitação na sociedade de consumo. Se a
possibilidade, o caminho é a educação como admitir tanta exclusão nessa
área. Talvez, os questionamentos sejam o primeiro passo para encontrar o
caminho.
31
CAPÍTULO III
Escola, Adolescência e Drogas
É possível percebe o avanço educacional das duas últimas décadas no
Brasil. O acesso quase universalizado as escolas para crianças em idade
obrigatória teve grande investimento das políticas públicas educacionais. O que
podemos perceber é que investimento ainda é quantitativo, portanto, a
qualidade da educação precisa ser o foco das políticas públicas educacionais.
Fazer a associação entre quantidade e qualidade é o desafio atual da
educação brasileira.
A escola na maioria das vezes não é um lugar atraente para os
adolescentes. É necessário uma analise crítica do sistema educacional, que
mesmo com todo avanço continua desigual, elitista e com muitas falhas no
ensino.
As desigualdades sociais no país torna a escola um lugar de exclusão
para muitos adolescentes. Os adolescentes pobres da periferia das cidades em
muitos casos abandonam a escola para trabalhar e suprir necessidades de
subsistência e para corresponder muitas vezes ao apelo publicitário do
consumo.
De acordo com Freitas (2002) “normalmente, adolescentes de classe
baixa deixam cedo a escola, muitas vezes incentivados pelos próprios pais
que, numa visão imediatista, querem que os filhos tragam dinheiro para casa –
já está em idade de trabalhar.”
Segundo CASTEL (2008 apud COSTA, 2012) “a ausência de qualquer
perspectiva de futuro é o testemunho de uma desesperança profunda. O
presente cristaliza assim todas as recusas (...). Segundo o autor, para essa
parcela da população o trabalho é raro, que o sucesso escolar não garante
vitória profissional. Isso porque são os (as) jovens do grupo social mais exposto
a racismo, xenofobias e outras formas de preconceitos.
Assim, escola é um espaço despreparado para atender adolescentes em
cumprimento de medida, o sistema socioeducativo é falho e a sociedade em
grande parte ver esse adolescente como uma ameaça social. É notável com
32
esse tipo de estrutura social não existe espaço para esses meninos e meninas
que de alguma forma transgrediram a lei. De acordo com Alves (2010, p. 23);
De um lado, a escola fragilizada, com salas superlotadas, salários baixos e com a infraestrutura comprometida; do outro, o adolescente autor de ato infracional, entediado do cotidiano escolar, em situação de vulnerabilidade social, que busca na criminalidade seu protagonismo juvenil. Não raro essa cena se repete nas diversas instituições públicas de ensino, seja nas grandes metrópoles ou até nos municípios de pequeno porte, resguardadas as devidas proporções.
A transgressão a lei é um comportamento característico da
adolescência, porém, o que difere socialmente é a quem se aplica a Lei. Os
adolescentes das comunidades são os mais atingidos, pois, o dualismo social
existente no país que “criminaliza” o jovem da periferia.
De acordo com Costa (2012); “O estigma possui duas dimensões: uma
objetiva, como raça, diferença de renda, gênero, ou idade; e outra subjetiva,
que diz respeito à atribuição negativa (ou de inferioridade) que se dá a primeira
dimensão”.
São também esses adolescentes estigmatizados com o fracasso
escolar. De acordo com Serafim (2009, p.143 in Cohen, org) o fracasso escolar
se expõe como uma forma de segregação. Para a mesma autora, o fracasso
escolar poder estar sustentado por uma lógica capitalista, na medida em que a
atenção é desviada do um para o todo, isto é, do singular para o coletivo.
O que podemos analisa é que a sociedade geralmente identifica os
adolescentes em situação de vulnerabilidade social através dos estereótipos e
preconceitos tão marcantes no contexto social brasileiro, o que pesa é o
estigma “do trombadinha”, da ameaça e do risco que é para a sociedade.
Segundo SOUZA ( 2006, p.145, apud 2012, p. 137);
“quando seu estereotipo é identificado, são considerados como um problema a ser superado, como se todos fizessem parte do mesmo balaio, como se não fossem pessoas em sua individualidade e humanidade. Além da invisibilidade, a inferioridade está presente na avaliação ou juízo social. Trata-se de consenso pré-reflexivo que determina o valor diferencial dos seres humanos, o qual identifica quem merece respeito e quem não merece.”
Na adolescência sujeito encontra-se mais vulnerável ao envolvimento
com substâncias psicoativas devido a algumas características dessa fase, tais
como; necessidade de aceitação pelo grupo de amigos, sensação de
33
onipotência, desejo de experimentar comportamentos vistos como “de adultos”,
mudanças corporais que geram insegurança, início de envolvimento afetivo,
aumento da impulsividade e busca de novas sensações (SENAD, 2014).
Para muitos adolescentes onde a violência é sua realidade de vida, o
uso de drogas pode ser uma fuga da dura realidade, uma forma de apaziguar
seu sofrimento e suas faltas. Porém, nas regiões de periferias das cidades o
usuário não é diferenciado do traficante pela polícia. A mesma sociedade, a
mesma lei, porém aplicabilidade é diferente em cada ponto da cidade. Para
Freitas (2002, p.18);
É importante salientar que o adolescente é extremamente vulnerável apelos oriundos do mundo das drogas em virtude das modificações pelas quais passa o seu mundo interno. Todas as transformações, tanto ao nível psíquico quanto corporal, o levam, com facilidade, a ser cooptado pelo mundo fascinante e mortífero das drogas. Podemos afirmar que o adolescente, em virtude do particular momento que atravessa, não só podem tornar-se um consumidor contumaz de drogas, como também, em casos mais complexos, participar ativamente do comércio ilegal desses produtos.
De acordo com o mesmo autor, a questão das drogas, narcotráfico é
vinculado ao fenômeno sociopolítico. A diminuição dos valores éticos é uma
das maiores incentivadoras do consumo de entorpecentes. Para ele o viver
com os seus prós e contras, amores e ódios, sucessos e fracassos é da ordem
do impossível – é necessário anestesiar. FREUD (1980 p. 97 apud Freitas,
2002, p. 25);
“O serviço prestado pelos veículos intoxicantes na luta pela felicidade e no afastamento da desgraça é tão altamente apreciado como um benefício, que tanto indivíduos quanto povos lhes concederam um lugar permanente na economia de sua libido. Devemos a tais veículos não só a produção imediata de prazer, mas também um grau altamente desejado de independência do mundo externo, pois sabe-se que, com auxílio desse “amortecedor de preocupações”,é impossível, em qualquer ocasião, afastar-se da pressão da realidade e encontrar refúgio num mundo próprio, com melhores condições de sensibilidade. Sabe-se igualmente que é exatamente essa propriedade dos intoxicantes que determina o seu perigo e a sua capacidade de causar danos.”
As substancias psicoativas em muitas situações parecem amenizar o
sofrimento desse período de transição e acesso ao mundo adulto ainda não
alcançado. Porém, o alivio do sofrimento é uma sensação ilusória, entorpecida,
uma redução momentânea. O que podemos destacar que para essa prática
34
existe o risco real do uso abusivo e como isso também a prática sexual sem
proteção.
É importante destacar, que a Organização Mundial da Saúde (OMS)
aponta o álcool como sendo a substância psicoativa mais consumida por
crianças e adolescentes. O fato é que para a sociedade esse uso não é visto
como fator de risco, pois é legalizado. O uso do álcool é varias situações é
incentivado pelos pais, principalmente para os meninos, pois é visto como
sinônimo de masculinidade.
O uso de substancias psicoativas faz parte dessa fase da vida, ainda tão
indefinida e cheia de inseguranças. É fundamental ressaltar que, uma grande
parcela deles diminui significativamente o consumo no início da idade adulta,
para adequar-se às expectativas e obrigações da maturidade, como trabalho,
casamento e filho (SENAD, 2014).
O que foi vivido pelo adolescente até chegar à fase adulta, sua história
de vida é o que aponta a diferença dos que vão se adequar a vida adulta tendo
o controle do consumo e a menor parte, a qual dependência vai dominar sua
vida e junto todos os danos pessoais e familiares causados pelo uso abusivo
de substancias. De acordo com Freitas (2002, p. 46);
Em certas famílias, a criança, e posteriormente o adolescente, não respeita a Lei (no sentido amplo), até porque a Lei, para ser respeitada, tem que ser temida, e este respeito só pode ser estabelecido se tanto o pai quanto a mãe se impuserem como figuras de autoridade, para seus filhos poderem participar do contexto social, com suas normas e regras, e onde o respeito a elas é necessário, com vistas a facilitar a conivência entre os seres humanos.
Conforme o autor citado (2002, p. 28) a falência da função paterna
apresenta a falta de modelos identificatórios consistentes, onde a
representação da Lei é incerta. Os chefes das quadrilhas de traficantes em
muitos casos vão ser os modelos de identificação. A procura inconsciente dos
limites não adquiridos pelos jovens no início das suas vidas podem ser
impostos pela polícia, o hospital ou o cemitério.
Para Vincent (2009 p. 109 in Cohen, org). A função paterna faz a
interdição da relação mãe e filho. Desta forma o filho tem a possibilidade de
tornar-se um sujeito cujo desejo terá outra direção. Nesse caso o pai é o
representante da Lei, que interdita, falta e permite que surja o desejo.
35
Nos casos em que a polícia se faz como representação da Lei e dos
limites ausentes na formação dos adolescentes com a falta da função paterna,
o Estado atua como representante. As medidas socioeducativas é a ruptura
com um mundo desmedido, é o limite, é a representação da castração
simbólica. Nesses casos o adolescente como sujeito em formação deveria
receber os cuidados e oportunidades do sistema “teoricamente” preparado para
recebê-los.
As medidas socioeducativas geralmente são aplicadas a população
de baixa renda, negra e com baixa escolaridade. O ato infracional é cometido
por adolescente de todas as classes sociais, a transgressão da lei ocorre, mas
a muitas vezes a proteção da família e o acesso aos direitos barra a ação da
polícia para essa parte da população. Segundo Freitas (2002, p. 60);
“os adolescentes são aqueles que compõem preferencialmente a mão-de-obra necessária ao bom andamento desse negócio informal que é o crime organizado. Eles são atraídos por uma oportunidade de trabalho que lhes dá um ganho de dinheiro bem acima das possibilidades que a sua escolaridade permitiria.”
O fato é que o sistema socioeducativo em meio aberto e fechado atende
basicamente a população em vulnerabilidade social. De acordo com Alves
(2010 p. 29);
“É salutar ponderar que não são apenas os adolescentes pobres, negros, moradores de aglomerados que cometem atos infracionais, entretanto, a maioria absoluta dos adolescentes que estão cumprindo algum tipo de medida socioeducativa apresentam este perfil.”
Podemos observar que as medidas socioeducativas são aplicadas a
população que sofre diariamente com a miséria e a violação dos seus direitos.
Diante da negação e violação de tantos direitos a aplicação da Lei é justamente
para quem o Estado negligencia seus serviços. Ainda é comum o sistema
socioeducativo em meio fechado ter o mesmo modelo do sistema prisional.
Para Costa (2012, p. 130);
“Vergonha, medo, ira, humilhação, violação de direitos, falta de acesso a políticas públicas mais do que integrantes de baixa-estima, conduzem a caminhos sem volta no labirinto em que estão inseridos. O lugar de inferioridade e desvalia torna-se componente da identidade. E o lugar de igualdade e de reconhecimento dos direitos previstos na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente torna-se retórica e abstração.”
36
A educação na forma com é estabelecida no Brasil não aponta solução
para inclusão dos adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas.
O sistema regular de ensino e o próprio sistema socioeducativo encontra-se
ainda no modelo ideal no papel. Alguns Estados se adequar a legislação na
aplicação das medidas como realmente socioeducativas, mas ficam limitados a
experiências ou unidades modelos, ou seja, o sistema no geral não é
socioeducativo.
37
CONCLUSÃO
A educação no Brasil ao longo de sua história vem sendo oferecida
como privilegio de classe. Inicialmente de forma clara existia a separação e o
direcionamento para os homens de classe alta, no decorrer da história essa
marca continua sendo reproduzida, mesmo com todos os avanços que temos
nos dias atuais a educação ainda é separada entre ricos e pobres.
O Brasil demorou a reconhece a educação como direito de todos e
nesses mais de 500 anos de história a universalização do ensino obrigatório é
uma realidade atual. O fato é que a falta do incentivo educacional nos tornou
um país desigual, injusto e com sistema público de ensino pouco atrativo para
os adolescentes pobres do país.
A maioria das escolas públicas faz parte de um sistema que reproduz
um modelo educacional do século passado, reproduzindo uma educação para
oprimidos dentro da ideologia do opressor. A educação oferecida à maioria dos
jovens não corresponde aos seus anseios e necessidades, porém, mesmo com
todas suas limitações para muitas crianças e adolescentes desse país é a
única forma de acesso ao mundo letrado.
O processo educacional não igualitário que é ofertado no Brasil, é mais
diferenciado quando o adolescente cometeu um ato infracional. O que deveria
ser o caminho para mudança de vida e a possibilidade de um futuro diferente
do que geralmente é estabelecido para esses jovens, a educação reproduz o
seu histórico de exclusão.
Portanto, o sistema educacional parece não compreender a
adolescência. Essa fase de incertezas, transformações, desejo de transgredir e
também com a necessidade de reconhecimento e identificação. Assim, os
jovens buscam nos seus amigos e nos grupos identificação, pois existe a
necessidade de está entre os iguais.
Os adolescentes em seu sofrimento e conflitos típicos da idade ficam
mais vulneráveis ao consumo de drogas, seja como fuga da realidade, para
apaziguar seu sofrimento ou para ser aceito no grupo. Essa fase da
experimentação, das descobertas e de desafios. O que acontece é que
maioria passa dessa fase tendo o controle do consumo, assim para essa
38
maioria a relação com o consumo é realmente por um período. Aos que
permanecem não existe um único motivo e as questões subjetivas precisam
ser analisadas.
Os adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativa é um
recorte que traz um marca social da exclusão, da negação dos direitos e
principalmente do “medo” que impõem a sociedade. O medo construído por
uma sociedade que discrimina e julga. O fato é que as medidas
socioeducativas não é para todos que comentem ato infracional, e sim para os
que estão dentro do estereótipo do “trombadinha”.
Portanto, o consumo de drogas para os adolescentes em vulnerabilidade
social é no cotidiano uma ameaça real de punição, ou seja, na hora da ação da
polícia em uma comunidade muitos adolescentes são aprendidos como
traficantes, o mesmo não acontece em bairros de classe média e alta. Desta
forma existe um risco maior para os adolescentes pobres, já que eles também
são aliciados por traficantes.
A inclusão dos adolescentes em cumprimento de medida na escola
parece ser a repetição da história da educação no Brasil, pois, esse meninos e
meninas é a parcela social que são excluídos da escola antes mesmo de
cometerem algum ato infracional. Quando os adolescentes chegam para o
cumprimento das medidas socioeducativas à maioria já havia deixado à escola,
estão fora de faixa e muitas vezes mesmo tendo comprovação escolar não
sabem ler nem escrever.
O mais comum hoje na tentativa de inclusão no sistema educacional do
adolescente em cumprimento de medida socioeducativa em meio aberto é uma
imposição, pois o mais importante no cumprimento da medida são as questões
socioeducativas. Desta forma, para obter a extinção da medida na justiça o pré-
requisito mais importante é voltar para a escola.
O adolescente volta escola por imposição judicial, porque na maioria das
vezes é a única forma dos gestores de escola aceitar. Assim, o adolescente
geralmente é inserido na educação de jovens e adultos (EJA) por estarem fora
de faixa e a maioria das escolas só dispõe dessa modalidade no turno da noite.
Portanto, a inclusão de adolescente em cumprimento de medida
socioeducativa é um desafio, pois muitos desses jovens não tem o desejo de
voltar, tem experiências ruins do período em que estavam na escola e sendo
39
inserido agora de forma impositiva. Grandes partes das escolas públicas não
estão preparadas e nem com abertura para receber esses adolescentes.
É necessário que a escola seja um lugar atrativo para os adolescentes.
Uma das possibilidades de ser um lugar acolhedor, que mude o seu olhar em
relação a esses jovens, ou seja, é necessário superação dos preconceitos em
relação a esses meninos e meninas que na turbulência de suas transformações
transgridem as leis e em muitos casos é uma forma de se tornarem visíveis
socialmente.
40
BIBLIOGRAFIA
Brasil, Estatuto da Criança e do Adolescente, 1990.
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