UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA
INSTITUTO DE BIOLOGIA
PÓS-GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA E CONSERVAÇÃO DE RECURSOS NATURAIS
Livro da Disciplina ECR 03
ECOLOGIA DE CAMPO
2º SEMESTRE DE 2005
Organizadores:
Ariovaldo Antonio Giaretta
Kátia Gomes Facure
Ricardo Ildefonso Campos
Coordenador do Curso de Pós-Graduação:
Kleber Del Claro
Uberlândia
Novembro de 2005
ii
Apresentação
Este livro contém os trabalhos realizados pelos alunos da disciplina Ecologia de
Campo, do Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Conservação de Recursos Naturais da
Universidade Federal de Uberlândia.
A disciplina foi ministrada no Parque Estadual de Caldas Novas (PESCAN), Caldas
Novas, GO, no período de 18 de outubro a 03 de novembro de 2005 e teve como objetivos
identificar diretamente na natureza problemas ou questões que puderam ser transformadas em
hipóteses e, a partir destas hipóteses, elaborar premissas e testá-las durante o curso.
Esses objetivos foram alcançados através de práticas orientadas, abordando conceitos
e questões de interesse ecológico, de ecologia comportamental ou de história de vida. As
práticas foram conduzidas de forma a gerar resultados quantitativos, passíveis de análises
estatísticas. Na primeira etapa da disciplina foram desenvolvidos projetos de um dia em
grupos e ao final da disciplina os alunos desenvolveram um projeto individual.
Ariovaldo Antonio Giaretta e Kátia Gomes Facure
Coordenadores da Disciplina
iii
Professores colaboradores
Celine de Melo (IB, Universidade Federal de Uberlândia)
Glein Monteiro de Araújo (IB, Universidade Federal de Uberlândia)
Heraldo L. Vasconcelos (IB, Universidade Federal de Uberlândia)
Ivan Schiavini (IB, Universidade Federal de Uberlândia)
John Du Vall Hay (ECL, Universidade de Brasília)
Helena Castanheira de Morais (ECL, Universidade de Brasília)
Paulo Eugênio Oliveira (IB, Universidade Federal de Uberlândia)
Ricardo Ildefonso Campos (PG Ecologia e Conservação de Recursos Naturais – UFU)
Solange Cristina Augusto (IB, Universidade Federal de Uberlândia)
Monitor
Ronan Caldeira Costa (PG Ecologia e Conservação de Recursos Naturais – UFU)
iv
Agradecimentos
À direção do Parque Estadual de Caldas Novas (PESCAN) pela permissão de trabalho
na área e pelo apoio logístico.
Aos funcionários do PESCAN pelo apoio nos trabalhos de campo e laboratório.
Aos professores colaboradores por terem aceitado o convite para participar da
disciplina, pela contribuição nos projetos em equipe e discussão dos projetos individuais.
Ao aluno Ronan Caldeira Costa pelo auxílio como monitor da Disciplina.
À Universidade Federal de Uberlândia por disponibilizar os recursos financeiros.
v
Programa
Data Professores Atividades 18/10 Ariovaldo A. Giaretta
Glein Monteiro de Araújo Ivan Schiavini
Chegada ao PESCAN
19/10 Glein Monteiro de Araújo Ivan Schiavini
Projetos em grupo
20/10 Glein Monteiro de Araújo John Du Vall Hay
Projetos em grupo
21/10 Ivan Schiavini John Du Vall Hay
Projetos em grupo
22/10 Ricardo Ildefonso Campos Troca de professores 23/10 Helena Castanheira de Morais
Heraldo L. Vasconcelos Projetos em grupo
24/10 Celine de Melo Heraldo L. Vasconcelos
Projetos em grupo
25/10 Celine de Melo Helena Castanheira de Morais
Projetos em grupo
26/10 Ricardo Ildefonso Campos Troca de professores Projetos em grupo
27/10 Paulo Eugênio Oliveira Solange Cristina Augusto
Projetos em grupo
28/10 Paulo Eugênio Oliveira Solange Cristina Augusto
Projetos em grupo
29/10 Paulo Eugênio Oliveira Solange Cristina Augusto
Projetos em grupo
30/10 Ariovaldo Antonio Giaretta Projeto individual 31/10 Ariovaldo Antonio Giaretta Projeto individual 01/11 Ariovaldo Antonio Giaretta Projeto individual 02/11 Ariovaldo Antonio Giaretta Projeto individual 03/11 Ariovaldo Antonio Giaretta Retorno à Uberlândia
vi
Projetos em Grupo
Chave Dicotômica para 57 espécies do cerrado sensu strictu no platô do PESCAN
01 - 04
Comparação florística e estrutural entre trechos de cerrado sensu stricto ao longo de um gradiente edáfico e altitudinal no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN), GO
05 - 13
Variação espacial na predação de frutos de Syagrus flexuosa (Arecaceae) em três áreas de cerrado sensu stricto, no Parque Estadual de Caldas Novas, GO
14 - 17
Descrição da estrutura de duas áreas de Cerradão no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Goiás
18 - 23
Investimento no Crescimento de Módulos em Caryocar brasiliense A. St.-Hil.: evidências de Trade-Off?
24 – 29
Freqüência de danos por pilhadores de néctar em flores de Tocoyena formosa (Cham. & Schitdl.) K. Schum.
30 – 33
Investimento reprodutivo de quatro espécies de Arecacea no Parque Estadual de Caldas Novas, Goiás
34 - 37
Visitantes Florais de Caryocar brasiliense Camb. e Palicourea rigida Kunth na transição das estações climáticas (seca-chuvosa) no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
38 – 43
Levantamento preliminar da avifauna em um gradiente de Cerrado do Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Goiás
44 – 49
Ontogenia e características edáficas determinam a susceptibilidade de Caryocar brasiliense à herbivoria foliar?
50 – 53
Existem diferenças no dano foliar causado por herbívoros e patógenos entre plantas sempre verdes e decíduas?
54 – 58
Avifauna em áreas perturbadas e não-perturbadas no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
59 – 65
Visitantes florais em manchas de Vellozia sp. 66 – 70 Distribuição e oferta de recursos florais de Vellozia sp. em uma área de Campo Rupestre no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO
71 – 75
Disponibilidade de recursos e comportamento de forrageamento de beija-flores em Palicourea rigida (Rubiaceae) em uma área de cerrado
76 - 81
vii
Projetos Individuais
Distribuição espacial de Stryphnodendron polyphyllum Mart. em área de cerrado sensu stricto no PESCAN – Caldas Novas – GO........................... ..........................................................................Adnilton Fonseca da Costa
82 - 85
Variações florais de Palicourea rígida Kunt. (Rubiaceae) no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Goiás...Adriana de Oliveira Machado
86 - 91
Abundância de formigas (Formicidae) e cupins (Isoptera) de solo em área aberta (campo sujo) e área fechada (mata semi-decídua) no Parque Estadual da Serra de Caldas – GO................................Alan Nilo da Costa
92 – 96
Relações entre fogo, assimetria flutuante e dano foliar em Salvertia sp. em uma área de cerrado sensu stricto.......................André de Sousa Jorge
97 – 103
Relações alométricas de Caryocar brasiliense Camb em área de cerradão e cerrado sensu strictu no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.......................................................................Ariane de Souza Siqueira
104 – 108
Troncos de árvores representam uma área de transição para artrópodos de serapilheira? Uma avaliação sobre a riqueza de espécies, microclima e efeito de área de transição.........................................Everton Tizo Pedroso
109 – 130
Estrutura de uma população de Stryphnodendron polyphyllum Mart. (“barbatimão”) em mancha de cerrado sensu stricto no PESCAN.............. .............................................................................Fabrício Alvim Carvalho
131 - 139
Densidade de tocas de tatus e seu uso por fauna comensal em dois ambientes no PESCAN, GO, Brasil..................Frederico Gemesio Lemos
140 – 149
Padrões alométricos de Miconia ferruginata DC. (Melastomataceae) em duas fisionomias rupestres do Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Goiás.................................................Marina Aparecida de Oliveira e Silva
150 – 160
Estratificação vertical de formigas em cerrado sentido restrito na Serra de Caldas Novas, GO………....………………Ricardo Ildefonso de Campos
161 – 176
Aspectos ecológicos da interação Roupala montana (Proteaceae) e Gonioterma sp. (Lepidoptera)...........................................Ricardo V. Kilca
177 - 191
Distribuição espacial de Miconia ferruginata DC. (Melastomataceae) ao longo de um gradiente altitudinal no PESCAN: um estudo de caso............ ...................................................................Rosely Ferreira Freitas da Mata
192 – 199
Influência da cobertura vegetal e recurso alimentare na densidade de abrigos de Clyomys sp. em área de Campo Cerrado no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO..........Vanessa Nascimento Ramos Furtado
200 – 205
Crescimento em módulos do Caryocar brasiliense: um método alternativo para analisar a alocação de biomassa para a reprodução........... ......................................................................Victor Hugo Paula Rodrigues
206 – 213
Estratégias adaptativas em plantas de cinco fisionomias de Cerrado do Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.................Wender Faleiro
214 - 225
1
CHAVE DICOTÔMICA PARA 57 ESPÉCIES DO CERRADO SENSU STRICTU NO
PLATÔ DO PESCAN
1. Folhas Simples 21’. Folhas compostas 39 2. Folhas Alternas 32’. Folhas Opostas ou Verticiladas 23 3. Presença de espinhos Solanum lycocarpum 3’. Ausência de espinhos 4 4. Presença de escamas do tipo ramenta Erythroxylum suberosum4’. Sem essa característica 5 5. Presença de látex 65’. Ausência de látex 12 6. Folhas laxas 76’. Folhas congestas 9 7. Folha com látex translúcido, ovadas ou elípticas, com
pecíolo longo e fino Maprounea guianensis
7’. Folha com látex leitoso 8 8. Folhas glabras 118’. Folhas pilosas, com margens lisas Pouteria ramiflora 9. Folhas glabras 109’. Folhas pilosas Aspidosperma tomentosum 10. Borda do limbo translúcida, elípticas, nervura central
muito espêssa Kielmeyera speciosa
10’. Ausência de borda translúcida no limbo Hymatanthus obovatus 11. Folhas elípticas, com margem serreada, ápera Brosimum gaudichaudii11’. Folhas obovadas ou elípticas Kielmeyera coriacea 12. Folhas laxas 1312’. Folhas congestas Erythroxylum tortuosum 13. Folha discolor, margem ondulada, pecíolo longo Piptocarpha rotundifolia13’. Folha concolor 14 14. Folhas com glândulas translúcidas no limbo Casearia sylvestris14’. Folha sem essa característica 15 15. Folhas glabras 1615’. Folhas pilosas 19
2
16. Folhas adultas muito coriáceas Licania humilis 16’. Folhas membranáceas ou levemente coriáceas 17 17. Folhas com nervuras secundárias curvas Ouratea hexasperma17’. Folhas pilosas 18 18. Folhas com bordas lisas Annona crassiflora18’. Folhas de bordas denteadas Austroplenckia populnea 19. Folhas elípticas, com pilosidade macia em ambas as
faces, margem lisa Diospyros burchellii
19’. Folhas sem essas características 20 20. Folhas elípticas, com pilosidade na face inferior,
margem lisa Styrax ferrugineus
20’. Folhas sem essas características 21 21. Folhas com elípticas ou ovadas, pilosidade macia
somente na face inferior, margem serreada Roupala montana
21’. Folhas sem essas características 22 22. Folhas ásperas, com 8-11 cm de comprimento, borda
lisa ou levemente serreada Davilla elliptica
22’. Folhas ásperas, com 15-18 cm de comprimento, com margem ondulada
Curatella americana
23. Folhas Verticiladas 2423’. Folhas Opostas 27 24. Presença de nervura coletora com nectários na base da
folha Qualea parviflora
24’. Sem essa característica 25 25. Folhas pilosas, discolores Vochysia cinnamonea25’. Folhas glabras 26 26. Folhas obovadas, coriáceas quando maduras, média de
8 folhas por nó Salvertia convallariaeodora
26’. Folhas obovadas, membranáceas, média de 6 folhas por nó
Vochysia rufa
27. Presença de nectários na extremidade da folha Lafoensia pacari27’. Sem essa característica 28 28. Com látex Hancornia speciosa28’. Sem látex 29 29. Nervuras curvinérveas 3029’. Nervuras peninérveas 31
3
30. Folha com borda lisa e face abaxial cor branca Miconia albicans30’. Folha com borda crenada e face abaxial cor ferrugínea Miconia ferruginea 31. Folha com nervura coletora 3231’. Folha sem essa característica 33 32. Folhas com ambas as faces pilosas e caule liso Qualea multiflora32’. Folhas somente com face abaxial pilosa e caule rugoso Qualea grandiflora 33. Folha pilosa 3433’. Folha glabra 36 34. Com tricomas ferrugíneos na face abaxial Guapira noxia34’. Com tricomas claros na face abaxial 35 35. Folhas com consistência coriácea, nervura secundária
curva Strichnus pseudoquina
35’. Folhas com consistência membranácea, estípulas intrapeciolares
Byrsonima verbascifolia
36. Folhas coriáceas e com estípulas Palicourea rigida36’. Folhas sem essas características 37 37. Folhas de consistência carnosa, séssil e rápida oxidação Neea theifera37’. Sem essa característica 38 38. Presença de estípulas intrapeciolares, nervuras róseas Byrsonima coccolobifolia38’.
Ausência de estípulas Eugenia sp.
39. Folha composta com 2 folíolos Hymenaea sticonocarpa39’.
Composta com mais de 2 folíolos 40
40. Composta com 3 folíolos Caryocar brasiliensis40’. Composta com mais de 3 folíolos 41 41. Composta palmada 4241’. Composta penada 46 42. Folha oposta 4342’. Folha alterna 44 43. Folíolos pilosos, terço superior dos folíolos com
margem serreada Tabebuia ochracea
43’.
Folíolos glabros ou levemente pilosos, coriáceos, com margem lisa
Tabebuia aurea
44. Folhas alternas, folíolos sésseis 45
4
44’. Folíolos peciolados, fortemente discolores Schefflera macrocarpa 45. Folíolos glabros Eriotheca gracilipes45’.
Folíolos pilosos Eriotheca pubecens
46. Folha composta penada 4746’.
Folha recomposta penada 54
47. Folhas paripenadas 4847’. Folhas imparipendas 49 48. Folíolos pilosos nitidamente discolores Sclerolobium aureum48’. Folíolos pilosos concolores Sclerolobium paniculatum 49. Folíolos elípticos, com manchas negras (fungo) Dalbergia miscolobium49’. Folíolos sem essas características 50 50. Folíolos predominantemente alternos 5150’. Folíolos predominantemente opostos 52 51. Folíolos membranáceos, com domáceas na nervura
central e folíolo terminal atrofiado Matayba guianensis
51’. Folíolos coriáceos, ovados Machaerium opacum 52. Raque com tricomas ferruginosos Andira paniculata52’. Raque sem tricomas ferruginosos 53 53. Com até 7 folíolos, folíolo terminal ovado Acosmium dasycarpum53’. Com mais de 7 folíolos, folíolo terminal elíptico Bowdichia virgilioides 54. Folha recomposta com nectários extraflorais 5554’. Folhas recomposta sem nectários extraflorais, folíolos
pilosos Dimorphandra mollis
55. Nectários na inserção do pecíolo Plathymenia reticulata55’. Nectários no pecíolo 56 56. Foliólolos elípticos, geralmente menores que 1 cm Stryphnodendron polyphyllum56’. Foliólolos ovados ou orbiculares, geralmente maiores
que 2 cm Stryphnodendron adstrygens
5
COMPARAÇÃO FLORÍSTICA E ESTRUTURAL ENTRE TRECHOS DE CERRADO
SENSU STRICTO AO LONGO DE UM GRADIENTE EDÁFICO E ALTITUDINAL
NO PARQUE ESTADUAL DA SERRA DE CALDAS NOVAS (PESCAN), GO
Adnilton Fonseca da Costa, Adriana de Oliveira Machado, Ariane de Souza Siqueira, Fabrício Alvim Carvalho, Marina A. de Oliveira e Silva, Paulo Teodoro Garcia, Pablo de Oliveira Pegorari, Ricardo Vargas Kilca, Rodrigo Alves dos Reis, Rosely Ferreira Freitas da Mata,
Victor Hugo Paula Rodrigues & Wender Faleiro. Orientadores: Glein Monteiro de Araújo e Ivan Schiavinni
Introdução
O Cerrado é um bioma notável por sua grande variação fitofisionômica, apresentando
formações florestais, savânicas e campestres (Ribeiro & Walter, 1998). A formação savânica
mais comum no Brasil Central é o cerrado sensu stricto, que apresenta um estrato herbáceo
com predominância de gramíneas e um lenhoso que varia de 3 a 5 metros de altura, com
cobertura arbórea de 10 a 60% (Eiten, 1979).
Os estudos até agora realizados no Cerrado buscaram caracterizar e classificar suas
fitofisionomias para que sua estrutura e composição florística fossem reveladas em maiores
detalhes (Mendonça et al., 1998; Castro et al., 1999). Estes trabalhos revelaram a ocorrência
de mais de 6.400 espécies de plantas vasculares e uma série de estudos comparativos
indicaram que as fitofisionomias desse bioma variam significativamente de uma localidade ou
região para outra, em termos de estrutura e composição (Ratter et al., 1973, 1978 e 1996;
Felfili et al., 2000; Fonseca & Silva Júnior, 2004). Contudo, poucos são os estudos que
investigam variações fisionômicas em função de fatores ambientais como altitude e solo
(Felfili et al, 2000).
Nesse sentido, o presente trabalho teve como objetivo comparar flora e estrutura do
componente arbóreo em diferentes trechos de cerrado sensu stricto ocorrentes ao longo de um
gradiente altitudinal e edáfico no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN).
Material e métodos
O estudo foi desenvolvido no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN),
localizado entre os municípios de Caldas Novas e Rio Quente, no sudeste do Estado de Goiás,
durante o mês de Outubro/2005. Foram utilizadas as mesmas 10 áreas de cerrado sensu
stricto, cinco em área de escarpa e cinco em área de platô, de um inventário qualitativo
realizado por Angeluci et al. (2002). Estes sítios seguem uma topossequência, tendo como
6
referência a estrada que atravessa o Parque. Informações sobre localização, altitude e tipo de
solo predominante nos sítios encontram-se na Tabela 1.
Em cada sítio foi estabelecida uma parcela de 20 x 20 m (400 m2), resultando uma
área amostral total de 4.000m2 (0,4 ha). Todos os indivíduos com circunferência do fuste ≥ 15
cm à 0,3 m do solo (CAS30 ≥ 15 cm) foram incluídos na amostragem, medidos quanto à CAS
e altura, e identificados no campo. Foi utilizado o sistema de classificação de famílias de
Cronquist (1981). Os parâmetros utilizados na análise foram número de espécies e densidade
da espécie. Calculou-se também a diversidade florística do conjunto das áreas pelo índice de
diversidade de Shannon (H’) e equidade de Pielou (J’).
A partir das variáveis obtidas, foi calculada a similaridade quantitativa de espécies
(densidade e área basal) entre os sítios, utilizando-se o índice de Morisita (mod. Horn). A
similaridade foi calculada sob duas formas: para todas as espécies amostradas (81 espécies) e
somente para as espécies com densidade superior a 10 indivíduos (24 espécies). Este último
critério de amostragem foi adotado para analisar a influência das espécies mais abundantes na
similaridade entre os sítios. Todas as análises foram desenvolvidas através do programa
FITOPAC®.
Resultados e discussão
Foram amostrados no levantamento 643 indivíduos, pertencentes a 81 espécies e 35
famílias botânicas. A família Leguminosae apresentou o maior número de espécies (16),
seguida por Vochysiaceae (6) e Malpighiaceae/Myrtaceae (5). Estas famílias são típicas dos
ambientes de Cerrado, sendo também citadas como as mais ricas em outros levantamentos
(Felfili et al., 2002). Considerando a riqueza de espécies e famílias obtidas nos levantamentos
quali-quantitativos realizados no PESCAN (Angeluci et al. 2002; Silva et al., 2002 ), este
trabalho destaca-se por apresentar os maiores valores de riqueza.
O índice de Shannon (H’) calculado para o conjunto dos sítios foi de 3,85 nats/ind.,
com índice de equidade de Pielou (J) de 0,88. Este valor é esperado dentre os inventários em
área de cerrado sensu stricto (Felfili et al., 1997, 2000). Por exemplo, Felfili et al. (1997),
amostrando 11 áreas de cerrado sensu stricto encontraram menores valores para este índice
(3,69 nats/ind.) quando comparado com este inventário. A alta diversidade de espécies para a
área amostrada está relacionada com a presença dos gradientes ambientais, que por sua vez,
resultam em um mosaico de habitats propícios para o estabelecimento de um grande número
de espécies.
7
Os dendrogramas de similaridades utilizando as densidades das 81 espécies e das 24
espécies mais abundantes (fig. 1) demonstraram não haver um padrão claro de agrupamento
por sítios. Mesmo nos sítios 8 e 10 (platô) e 1 e 5 (escarpa), que apresentaram as maiores
similaridades (fig. 1), não se pode atribuir uma forte relação florística por preferência de
ambientes, uma vez que as condições de solos (8 e 10) e altitude (1 e 5) não são idênticas
(vide tabela 1). Embora a ligação entre as parcelas tenha apresentado um padrão um pouco
diferente, a similaridade entre os sítios considerando a área basal (dominância) (fig. 2)
concorda com o padrão obtido para o parâmetro densidade, reforçando a idéia de não haver
uma distinção clara de similaridade quantitativa entre os sítios analisados.
Os resultados deste estudo não concordam com a análise qualitativa (similaridade de
SØrensen), realizada anteriormente por Angeluci et al. (2002), que apontavam para uma forte
relação de que os fatores de edáficos e altitudinais estariam condicionando a distribuição das
espécies. Vale ressaltar que embora tais variações graduais na composição da vegetação sejam
constatadas visualmente (observações de campo), o esforço amostral empregado pode não ter
sido capaz de retratar a relação entre a estrutura das comunidades vegetais e seus ambientes
preferenciais ao longo do gradiente. Assim, concluiu-se que a preferência de espécies por
sítios neste gradiente só poderá ser elucidada através de um maior esforço amostral, com
melhor caracterização das condições edáficas.
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8
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2002. Levantamentos florísticos e fitossociológicos
9
Tabela 1: Coordenadas geográficas, altitude e tipos de solos de cerrado strictu sensu no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Goiás.
Sítios Coordenadas Geográficas Altitude Tipo de Solos
Escarpa
Sítio 1 17º46’13”S e 48º39’34”O 769 Litossolo com afloramento rochoso
Sítio 2 17º46’17”S e 48º39’38”O 779 Litossolo sem afloramento rochoso
Sítio 3 17º46’21”S e 48º39’49”O 830 Litossolo sem afloramento rochoso
Sítio 4 17º46’25”S e 48º39’57”O 875 Litossolo sem afloramento rochoso
Sítio 5 17º46’35”S e 48º40’00”O 895 Litossolo sem afloramento rochoso
Platô
Sítio 6 17º46’58,2”S e 48º40’0,43”O 981 Latossolo Vermelho-Amarelo
Sítio 7 17º47’30,9”S e 48º40’20,4”O 1.013 Latossolo Vermelho-Escuro
Sítio 8 17º48’21,8”S e 48º41’45,8”O 982 Latossolo Vermelho-Amarelo
Sítio 9 17º49’37,6”S e 48º43’26,8”O 931 Areia Quartzosa sobre bloco arenito
Sítio 10 17º49’41”S e 48º43’34,2”O 925 Litossolo com cascalho na superfície
10
Tabela 2 – Relação das espécies e suas respectivas densidades em ambientes de escarpa e platô no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Goiás.
Espécies Famílias Escarpa platô TotalAlibertia edulis (L.C.Rich.) A. Rich ex DC. Rubiaceae 1 0 1 Allagoptera campestris (Drude) O. Kuntze Arecaceaae 0 2 2 Annona coriacea Mart. Annonaceae 3 0 3 Annona crassiflora Mart. Annonaceae 0 2 2 Acosmium dasycarpum (Vog.) Yakovl. Leg. Papilionoideae 2 2 4 Aspidosperma macrocarpon Mart. Apocyanaceae 3 1 4 Aspidosperma tomentosum Mart. Apocyanaceae 4 7 11 Asteraceae 1 Asteraceae 1 0 1 Astronium fraxinifolium Schott. Anarcadiaceae 0 1 1 Bauhinia brevipes Vog. Caesalpiniaceae 1 0 1 Bowdichia virgiloides H. B. & K. Leg. Papilionoideae 1 1 2 Byrsonima coccolobifolia H.B. & K. Malpighiaceae 4 7 11 Byrsonima crassa Nied. Malpighiaceae 2 5 7 Byrsonima verbascifolia (L.) Rich. ex A. L. Juss. Malpighiaceae 2 0 2
Cardiopetalum calophyllum Schlecht. Annonaceae 2 0 2 Caryocar brasiliensis Camb. Caryocaraceae 1 10 11 Casearia sylvestris Sw. Flacourtiaceae 1 0 1 Connarus suberosus Planch. Connaraceae 3 5 8 Curatella americana L. Dilleniaceae 6 0 6 Cybianthus sp. Myrsianaceae 2 0 2 Dalbergia miscolobium Benth. Leg. Papilionoideae 0 5 5 Davilla elliptica St. Hil. Dilleniaceae 15 2 17
Dimorphandra mollis Benth. Leg. Caesalpinioideae 1 3 4
Diospyros burchellii Hiern Ebenaceae 0 9 9 Dipteryx alata Vog. Leg. Papilionoideae 1 0 1 Eremanthus glomerulatus Less. Asteraceae 6 16 22 Erythroxylum deciduum St. Hil. Erythroxylaceae 0 1 1 Erythroxylum suberosum St. Hil Erythroxylaceae 0 5 5 Erythroxylum tortuosum Mart. Erythroxylaceae 1 1 2 Guapira graciliflora (Mart. ex Schimidt) Lund Nyctaginaceae 1 0 1
Guapira noxia (Netto) Lund Nyctaginaceae 0 2 2 Hancornia speciosa Gomez Apocyanaceae 17 4 21 Heteropterys byrsonimifolia A. Juss. Malpighiaceae 22 0 22
Hymenea courbaril L. Leg. Caesalpinioideae 6 2 8
Kielmeyera coriacea (Spreng.) Mart. Clusiaceae 5 33 38 Kielmeyera speciosa St. Hil. Clusiaceae 1 21 22 Lafoensia pacari St. Hil. Lythraceae 5 1 6 Licania humilis Cham. ex Schlecht Chrysobalanaceae 0 1 1 Lippia lasiocalycina Cham. Verbenaceae 0 2 2 Machaerium opacum Vog. Leg. Papilionoideae 0 1 1 Malpighiaceae 1 Malpighiaceae 2 0 2 Miconia ferruginata DC. Melastomataceae 16 0 16 Mimosa cf. claussenii Benth. Leg. Mimosoideae 1 0 1
11
Myrcia sp. Myrtaceae 1 2 3 Myrcia tomentosa (Aubl.) DC. Myrtaceae 1 0 1 Myrcia variabilis Mart. ex. DC. Myrtaceae 0 2 2 Neea theifera Oerst. Nyctaginaceae 21 2 23 Ouratea hexasperma (St. Hil.) Baill. Ochnaceae 18 8 26 Palicourea rigida Kunth Rubiaceae 2 4 6
Peltogyne confertiflora (Hayne) Benth. Leg. Caesalpinioideae 1 2 3
Piptocarpha rotundifolia (Less.) Baker Asteraceae 1 4 5 Plathymenia reticulata Benth. Leg. Mimosoideaea 4 10 14 Pouteria ramiflora (Mart.) Radlk. Sapotaceae 0 13 13 Pouteria torta (Mart.) Radlk. Sapotaceae 0 12 12 Psidium rufum Mart. ex DC. Myrtaceae 0 3 3 Psidium sp. Myrtaceae 14 0 14
Pterodon pubescens (Benth.) Benth. Leg. Caesalpinioideae 2 0 2
Qualea grandiflora Mart. Vochysiaceae 3 8 11 Qualea multiflora Mart. Vochysiaceae 0 3 3 Qualea parviflora Mart. Vochysiaceae 27 46 73 Roupala montana Aubl. Proteaceae 2 4 6 Salacia crassiflora (Mart.) G. Don. Hippocrateaceae 1 5 6 Salvertia convallariaeodora St. Hil. Vochysiaceae 10 3 13 Schefflera macrocarpa (Seem.) D.C. Frodin Araliaceae 2 2 4
Sclerolobium paniculatum Vog. Leg. Caesalpinioideae 3 11 14
Solanum lycocarpum St. Hil. Solanaceae 3 0 3 Sthryphnodendron adstringens Mart. Leg. Mimosoideae 2 10 12 Sthryphnodendron polyphyllum Mart. Leg. Mimosoideae 8 1 9 Strichnus pseudoquina St. Hil. Loganiaceae 0 1 1 Styrax ferrugineus Ness & Mart. Styracaceae 4 2 6 Syagrus flexuosa L. Arecaceae 0 6 6 Tabebuia aurea (Manso) Benth & Hook. ex S. Moore Bignoniaceae 0 5 5
Tabebuia ochracea (Cham. Standl.) Bignoniaceae 2 2 4 Tabebuia sp. Bignoniaceae 1 0 1 Tocoyena formosa (Cham. & Schlecht.) K. Rubiaceae 0 4 4 Vatairea macrocarpa (Benth.) Ducke Leg. Papilionoideae 5 5 10 Vellozia flavicans Smith Velloziaceae 0 18 18 Vochysia elliptica Mart. Vochysiaceae 10 2 12 Vochysia rufa Mart. Vochysiaceae 0 3 3 Xylopia aromatica (Lam.) Mart. Annonaceae 1 0 1 Total 289 354 643
12
Nível (a) de fusao sítios 0.004 P3-++ +------------+ 0.037 P8-++ | +----------------------------+ 0.015 P1-+-----+ | | +-------+ | 0.115 P6-+-----+ | +--------+ 0.140 P2-+------------------------------------------+ | +-------------+ 0.040 P5-+--------------+ | | +-------------+ | | 0.079 P10-+--------------+ | | | +----------------------+ | 0.048 P4-+-----------------+ | | +----------+ | 0.176 P7-+-----------------+ | | 0.176 P9-+-----------------------------------------------------------------+ +------+-------+------+-------+------+-------+------+-------+------+ 0.00 | 0.04 | 0.08 | 0.12 | 0.16 | 0.02 0.06 0.10 0.14 0.1 Nível (b) de fusao sítios 0.000 P5-| +-------------+ 0.041 P1-| | +---------------+ 0.090 P6-+-------------+ | +------------------+ 0.032 P3-+----------+ | | +------------------+ | 0.146 P7-+----------+ | +---------------+ 0.002 P8-++ | | +--------------------+ | | 0.065 P10-++ | | | +--------------------------+ | 0.193 P4-+---------------------+ | | 0.166 P2-+-------------------------------------------------------+ | +--------+ 0.193 P9-+-------------------------------------------------------+ +------+-----+------+------+------+-----+------+------+-----+------+ 0.00 | 0.04 | 0.08 | 0.12 | 0.16 | 0.2 0.02 0.06 0.10 0.14 0.18
Figura 1. Dendrograma de similaridade de Morisita (mod. Horn) calculado para a densidade de indivíduos considerando (a) o total de 81 espécies e (b) apenas as 24 espécies com mais de 10 indivíduos amostrados em 10 sítios localizados em gradiente altitudinal e edáfico no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Goiás. Método de agrupamento: UPGMA (média de grupo).
13
Nível (a) de fusao parcelas 0.002 P3-++ +------------+ 0.045 P8-++ | +-+ 0.052 P10-+-------------+ | +-------+ 0.079 P5-+---------------+ | +----------------+ 0.001 P4-| | | +---+ | | 0.012 P1-| | | | +-------------------+ | 0.136 P7-+---+ | +----------------------+ 0.097 P2-+-----------------------------+ | | +----------+ | 0.209 P9-+-----------------------------+ | | 0.209 P6-+---------------------------------------------------------------+ +-----+-----+-----+-----+-----+------+-----+-----+-----+-----+-----+ 0.00 | 0.04 | 0.08 | 0.12 | 0.16 | 0.20 | 0.02 0.06 0.10 0.14 0.18 0.2 Morisita (mod. Horn) Nível (b) de fusao parcelas 0.000 P2-| +------+ 0.022 P8-| | +------------------------+ 0.000 P1-| | | +------+ | 0.105 P6-| | +---------+ 0.009 P5-+--+ | | +--------------------+ | | 0.079 P3-+--+ | | | +-------+ | 0.138 P10-+-----------------------+ | +------------------+ 0.020 P4-+-----+ | | +-----------------------------------+ | 0.201 P7-+-----+ | | 0.201 P9-+------------------------------------------------------------+ +-----+-----+-----+-----+-----+------+-----+-----+-----+-----+-----+ 0.00 | 0.04 | 0.08 | 0.12 | 0.16 | 0.20 | 0.02 0.06 0.10 0.14 0.18 0.2
Figura 2. Dendrograma de similaridade de Morisita (mod. Horn) calculado para a área basal de indivíduos considerando (a) o total de 81 espécies e (b) apenas as 24 espécies com mais de 10 indivíduos amostrados em 10 sítios localizados em gradiente altitudinal e edáfico no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Goiás. Método de agrupamento: UPGMA (média de grupo).
14
VARIAÇÃO ESPACIAL NA PREDAÇÃO DE FRUTOS DE Syagrus flexuosa
(ARECACEAE) EM TRÊS ÁREAS DE CERRADO SENSU STRICTO, NO PARQUE
ESTADUAL DE CALDAS NOVAS, GO
Alan Nilo; André Jorge; Everton Tizo; Frederico Gemesio & Vanessa Ramos Orientador: John Hay
Introdução
No ciclo de vida de uma planta, apenas uma pequena proporção de indivíduos
produzidos sobrevive até o estágio adulto e consegue se estabelecer. A grande maioria
sucumbe a predadores e/ou patógenos antes da germinação ou no estágio de plântula
(Shepherd & Chapman, 1998). Diversos animais, principalmente insetos, procuram
particularmente por frutos, flores e sementes para lhes servirem como alimento, uma vez que
esses órgãos vegetais concentram nutrientes importantes (Lacerda et al., 2000).
Alguns coleópteros depositam seus ovos em frutos e suas larvas se desenvolvem no
interior das sementes até atingirem a fase adulta (Begon et al. 1996). Essas espécies predam
efetivamente as sementes, tornando-as inviáveis (Lopes, 1997). A intensidade e o padrão
deste tipo de predação podem afetar diretamente a biologia de populações de fanerógamas
(Janzen, 1970).
A família Arecaceae é uma das maiores do mundo e, pela forma e aspecto, a mais
característica da flora tropical (Ribeiro et al,. 1999). A espécie Syagrus flexuosa produz frutos
drupóides, de forma elipsóide, amarelo-esverdeado e mede cerca de 3x2cm, ocorrendo em
Cerradão, Cerrado e Mata (Almeida et al., 1998). Larvas de coleópteros da família
Curculionidae comumente predam as sementes de Syagrus flexuosa.
O objetivo deste estudo foi verificar a existência de variabilidade na taxa de predação
de sementes de Syagrus flexuosa por larvas de coleópteros curculionídeos em áreas de
Cerrado sensu stricto.
Metodologia
O estudo foi realizado no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas – GO, em três
áreas de Cerrado sensu stricto. Os pontos de amostragem (Tabela 1) foram localizados ao
longo das estradas no platô do Parque, entre 950 e 1040m de altitude e apresentaram uma
distância mínima de 3,8 km. Em cada ponto os indivíduos reprodutivos com frutos maduros
foram procurados através de caminhada. Quando encontrados, a altura da inserção da raque
15
foi medida e esta foi coletada para contagem de flores e frutos produzidos. Todos os frutos
maduros presentes foram coletados, inclusive os recém caídos no solo, na base da palmeira.
De cada indivíduo foi aferido o comprimento da raque, o número total de flores femininas
produzidas e o total de flores que tiveram sucesso em desenvolver frutos. Foram selecionados
aleatoriamente cinco indivíduos de cada área para medição do comprimento, largura e
determinação da presença do predador. Em cada indivíduo foram selecionados dez frutos, os
quais foram abertos para a verificação do estado do endosperma (intacto/ abortado/predado).
Tabela 1. Coordenadas geográficas dos pontos de amostragem
Ponto Coordenadas Geográficas (GPS)
A 17° 45’ 33,8” S e 48° 41’ 32,6” O
B 17° 46’ 56,7” S e 48° 43’ 04,0” O
C 17° 48’ 34,5” S e 48° 41’ 56,8” O
Resultados e discussão
Dos 150 frutos analisados, em 27 encontrou-se larvas de curculionídeo, 123 estavam
intactos e nenhum abortado. O comprimento médio dos frutos foi 34,08±3,87mm e largura foi
23,34±3,48mm.
Foram encontradas diferenças significativas na taxa de predação entre os indivíduos
somente do ponto B. A diferença na predação de sementes entre os pontos amostrados foi
significativa. (Tabela 2). O número de frutos predados no ponto B foi cinco vezes maior que
no ponto A, enquanto no ponto C foi três vezes maior que no ponto A. As diferenças de
predação observadas provavelmente deveram-se a fatores peculiares de cada ponto amostrado
não considerados no presente trabalho, como, por exemplo, eventuais diferenças na densidade
de Syagrus. Flexuosa.
O sucesso reprodutivo (número de frutos produzidos/ número total de flores) (F=0,36;
p>0,05) não apresentou relação com o comprimento da raquis, apesar da relação significativa
entre este comprimento e o logaritmo do número de flores (F=20,20; R2=0,45; p<0,05) e o
logaritmo do número frutos (F=15,39; R2=0,38; p<0,05) (Figura 1a-c). Embora raques
maiores comportem um maior número de flores, a produção de frutos e consequentemente o
sucesso reprodutivo não estão relacionados com o tamanho da raque de forma similar. Uma
explicação plausível seria admitir que o número de flores abortadas também cresce de acordo
com o tamanho da raques. Além disso, outros fatores importantes para o sucesso do
16
desenvolvimento do embrião, independentes do número de flores produzidas, poderiam
limitar o número de frutos produzidos.
Tabela 2. Diferenças na predação entre indivíduos de uma mesma área e entre
as áreas.
ÁREAS X2 GL p
A 5,67 4 0,225
B 18,10 4 0,001
C 5,96 4 0,202
ENTRE 9,76 2 0,008
A distribuição dos indivíduos em classes de porcentagem de sucesso reprodutivo
indicou que no ponto A, a maioria dos indivíduos apresentou alto sucesso reprodutivo (Figura
2a), enquanto nas áreas B e C, a maioria dos indivíduos apresentou sucesso reprodutivo médio
(Figura 2b-c). Mais uma vez, a diferença entre as áreas provavelmente se deve a fatores não
invetigados nesse trabalho.
Figura 1. Relação entre logaritmo do número de flores (a), logaritmo do número de frutos (b)
e arcoseno da raiz quadrada do sucesso reprodutivo com o comprimento da raques (c).
ba c
17
Figura 2. Distribuição do número de indivíduos de acordo com três classes de sucesso
reprodutivo, em cada um dos pontos amostrados.
Referências bibliográficas
ALMEIDA, S. P.; PROENÇA, C. E. B.; SANO, S. M. & RIBEIRO, J. F. 1998. Cerrado:
espécies vegetais úteis. Planaltina: EMBRAPA – CPAC. 464p.
BEGON, M.; HARPER, J. L.& TOWNSEND, C. R. 1996. Ecology – Individuals populations
and communities. Blackwell Science.
JANZEN, D. H. 1971. Seed predation by animals. Annual Review of Ecology and
Systematics 2: 465-492.
LACERDA, A. C. R.; SILVEIRA, A. B.; ILHA, I. M. N. & NETTO, R. R. 2000. Predação de
sementes de Attalea pharelata (Palmae) em cordilheiras no Pantanal da Nhecolândia.
Ecologia do Pantanal. UFMS.
RIBEIRO, J. E. L. S.; HOPKINS, M. J.; VICENTINI, A.; SOTHERS, C. A.; COSTA, M. A.
S.; BRITO, J. M.; SOUZA, M. A. D.; MARTINS, L. H. P.; LOHMAN, L. G.;
ASSUNÇÃO, P. A. C. L.; PEREIRA, E. C.; SILVA, C. F.; MESQUITA, M. R. &
PROCÓPIO, L. C. Flora da Reserva Ducke. Guia de identificação das plantas vasculares
de uma floresta de terra firme na Amazônia Central. Manaus: INPA, 1999. 816p.
SHEPHERD, V. E. & CHAPMAN, C. A. 1998. Dung beetles as secondary seed dispersers:
impact on seed predation and germination. Journal of Tropical Ecology 14:199-215.
18
DESCRIÇÃO DA ESTRUTURA DE DUAS ÁREAS DE CERRADÃO NO PARQUE
ESTADUAL DA SERRA DE CALDAS NOVAS, GOIÁS
Adnilton Fonseca da Costa, Adriana de Oliveira Machado, Marina A. de Oliveira e Silva, Pablo de Oliveira Pegorari, Rosely Ferreira Freitas da Mata e Wender Faleiro
Orientador: Glein Monteiro de Araújo
Introdução
O Bioma Cerrado compreendia uma superfície estimada em 2.000.000 de km2, ou o
equivalente a cerca de 22% do território nacional (Mendonça et al. 1998), sendo considerado
a flora mais rica entre as savanas mundiais (Klink 1996).
A sua área de distribuição se faz representar por uma diagonal que se estende de 3º a 25º
de latitude sul e de 44º a 63º de longitude oeste, indo da fronteira do Brasil com o Paraguai e a
Bolívia até a faixa litorânea maranhense. O Cerrado ocorre em altitudes que variam de cerca
de 300 m a mais de 1600 m (Lopes 1984).
Os tipos fitofisionômicos do Cerrado são baseados na sua forma (fisionomia), que é
definida por sua estrutura, pelas formas de crescimento dominantes e por sua composição
florística (Barbosa-Silva 2003).
O cerradão é uma das fitofisionomias do Cerrado que se caracteriza pela presença de
espécies que ocorrem no cerrado sentido restrito e também por espécies de mata. Do ponto de
vista fisionômico é uma floresta e apresenta dossel predominantemente contínuo e cobertura
arbórea oscilando de 50 a 90%. A altura média do extrato arbóreo varia de 8 a 15 metros
proporcionando condições de luminosidade que favorecem a formação de estratos arbustivos
e herbáceos diferenciados (Ribeiro & Walter 1998).
Em sua maioria, os solos do cerradão são profundos, bem drenados, de média e baixa
fertilidade, ligeiramente ácidos pertencentes às classes Latossolo Vermelho-Escuro, Latossolo
Vermelho-Amarelo ou Latossolo Roxo. Também pode ocorrer, em proporção menor, em
Cambissolo Distrófico (Ribeiro & Walter 1998).
Embora eminentemente descritivos, trabalhos referentes a cerradões vêm sendo
realizados deste a década de 70 (Ratter et al. 1973). Em estudo de comparação da vegetação
arbórea entre cerrado e cerradão, Costa & Araújo (2001) sugere a ocorrência desta última
formação como uma possível fisionomia de transição entre matas mesófilas e cerrados.
Esse trabalho teve como objetivo descrever a estrutura fitossociológica de espécies
arbóreas de duas áreas de cerradão no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
19
Material e Métodos
A coleta de dados foi realizada no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas
(PESCAN), localizado entre os municípios de Caldas Novas e Rio Quente, no Sudoeste do
estado de Goiás, no mês de outubro de 2005.
Duas áreas de cerradão foram delimitadas para o estudo. A primeira, localizada a 500
metros da base do PESCAN, 755 metros de altitude (17º46’13,7”S e 40º39’26,8”O),
caracterizada por apresentar solo do tipo Litossolo com afloramento rochoso e declividade
acentuada. A segunda está localizada a 932 metros de altitude (17º49’33,5”S e 48º43’17,9”O),
no topo da serra e apresenta solo do tipo Latossolo Vermelho-Amarelo em relevo plano. A
primeira área encontra-se bem preservada e na segunda aparentemente teve corte seletivo de
algumas espécies no passado.
Em cada uma das áreas foram delimitadas 6 parcelas de 10 x 10m, totalizando 0,12 ha
de área amostral. Todos os indivíduos vivos com circunferência do tronco a altura de 30 cm
do solo maior que 15 cm foram amostrados.
Os parâmetros fitossociológicos (dominância, freqüência, densidade e valor de
importância) foram calculados utilizando o programa FITOPAC (Shepherd 1994) e a
similaridade florística foi calculada utilizando o Índice de SØrensen (Müeller-Dombois &
Ellenberg 1974).
Resultados
No total foram amostrados 231 indivíduos pertencentes a 62 espécies distribuídas em 34
famílias. As famílias com maior número de espécies foram Vochysiaceae (6), Fabaceae (6) e
Annonaceae (4). Na área um, foram amostrados 120 indivíduos pertencentes a 36 espécies
distribuídas em 23 famílias. Na área dois amostrou-se 111 indivíduos pertencentes a 37
espécies distribuídas em 23 famílias. As demais características fitossociológicas tais como
altura, índice de Shannon (H’) e Equabilidade (J) estão na tabela 1.
Na área um as três espécies com maior VI foram Sclerolobium paniculatum (54,82)
Qualea grandiflora (29,51) Xylopia aromatica (24,87). Na área dois Sclerolobium
paniculatum (48,52), Xylopia aromatica (32,57) e Eriotheca gracilipes (29,87) tiveram maior
VI (Tabela 2).
O índice de similaridade florística (IS) entre as duas áreas foi de 30,14%.
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Tabela 1. Aspectos gerais de duas áreas amostradas de cerradão no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas - GO
Características Área 1* Área 2** Total (1 e 2)
1. Área de cada parcela (m2) 600 600 1200
2. Número de indivíduos 120 111 231
3. Área basal total (m2) 1464 1494 2958
4. Altura mínima (m) 2,00 1,50 1,50
5. Altura média (m) 5,53 4,73 5,14
6. Altura máxima (m) 15,00 18,00 18,00
7. Número de espécies 36 37 62
8. Número de famílias 23 23 34
9. Índice de Shannon (H’) 3,198 3,141 3,540
10. Equabilidade (J) 0,892 0,870 0,858 * Localizada a 755 m de altitude ** Localizada a 932 m de altitude
21
Tabela 2. Espécies em ordem de valor de importância (VI) de duas áreas de cerradão do PESCAN, GO. N = número de indivíduos amostrados. Área 1 Área 2
Espécie N VI N VI Sclerolobium paniculatum 19 54,82 16 48,52 Qualea grandiflora 7 29,51 6 13,49 Xylopia aromática 13 24,87 17 32,57 Emmotum nitens 8 18,53 3 7,77 Kielmeyera coriaceae 3 11,03 - - Cybianthus detergens 5 10,44 - - Simarouba versicolor 4 9,41 - - Astronium fraxinifolium 5 9,41 - - Styrax ferrugineus 4 9,30 - - Maprounea guianensis 5 9,12 - - Bowdichea virgilioides 2 8,38 1 4,70 Acosmium dasycarpum 2 6,50 - - Vochysia haenkeana 3 6,36 - - Alibertia sp 5 6,30 1 2,70 Sthryphnodendron polyphyllum 3 5,80 - - Matayba guianensis 2 5,35 - - Salacea crassifolia 2 5,01 - - Byrsonima coccolobifolia 2 4,91 - - Alibertia edulis 2 4,85 - - Cardiopetalum calophyllum 2 4,84 - - Erytroxylum daphnites 2 4,70 - - Myrcia rostrata 2 4,67 - - Siparuna guianensis 2 4,63 - - Qualea parviflora 1 4,59 2 5,43 Eremanthus glomerulatus 2 4,58 - - Vochysia rufa 2 4,12 1 2,46 Miconia albicans 2 3,40 - - Salvertia convallariaeodora 1 3,11 - - Virola sebifera 1 3,02 - - Vatairea macrocarpa 1 2,98 2 5,19 Annona crassiflora 1 2,81 - - Myrcia sp 1 2,71 2 5, 32 Caryocar brasiliense 1 2,67 3 14,38 Machaerium acutifolium 1 2,49 - - Magonia pubescens 1 2,44 - - Annona coriacea 1 2,33 - - Eriotheca gracilipes - - 4 29,87 Plathymenea reticulata - - 7 15,66 Pterodon pubescens - - 8 13,51 Guapira noxia - - 3 9,12 Dimorphandra mollis - - 3 8,01 Piptocarpha rotundifolia - - 3 7,93 Lippia sp - - 4 7,58 Syagrus flexuosa - - 3 6,64 Aspidosperma tomentosum - - 2 5,52 Pouteria ramiflora - - 2 5,32 Guapira graciliflora - - 2 4,89
22
Tabela 2. Continuação Área 1 Área 2
Espécie N VI N VI Roupala montana - - 2 4,89 Licania humilis - - 1 4,32 Aspidosperma macrocarpon - - 1 3,34 Kielmeyera rubriflora - - 1 3,12 Hancornia speciosa - - 1 2,91 Byrsonima crassa - - 1 2,59 Machaerium opacum - - 1 2,57 Ouratea hexasperma - - 1 2,49 Brosimum gaudichaudii - - 1 2,48 Schefflera macrocarpa - - 1 2,47 Qualea multiflora - - 1 2,46 Neea theifera - - 1 2,45 Enterolobium gummiferum - - 1 2,45 Peltogyne confertiflora - - 1 2,43 Tocoyena formosa - - 1 2,43
Discussão
Os resultados mostraram que as duas áreas estudadas seguem os mesmos padrões em
relação à ocorrência de espécies e diversidade em áreas de cerradão. Em ambas as áreas
amostradas no PESCAN Schlerolobium paniculatum teve maior VI, confirmando o que já
tinha sido encontrado por Ratter et al (1973) em cerradões em solo distrófico.
O índice de Shannon (H’) e a Equabilidade (J) obtidos, bem como o número de espécies
e famílias, estão dentro dos padrões encontrados em outras áreas estudadas (Costa & Araújo
2001; Andrade et al. 2002).
As duas áreas apresentaram diferenças em relação à composição de espécies. Somente
onze espécies ocorrem simultaneamente nas duas áreas, o que leva a um baixo índice de
similaridade entre as áreas.
Esta baixa similaridade entre as áreas amostradas pode ter ocorrido devido a diferenças
nas condições do solo e antropização.
Referências Bibliográficas
ANDRADE, L.A.Z.; FELFILI, J.M. & VIOLATTI, L. 2002. Fitossociologia de uma área de
cerrado denso na RECOR-IBGE, Brasília-DF. Acta Botanica Brasílica, 16(2) 225-240.
BARBOSA-SILVA, D. 2003. Distribuição Espacial de duas Espécies de Melastomataceae na
Vereda da Estação Ecológica de Águas Emendadas. Monografia final de Curso.
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23
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24
INVESTIMENTO NO CRESCIMENTO DE MÓDULOS EM Caryocar brasiliense A.
ST.-HIL.: EVIDÊNCIAS DE TRADE-OFF?
Ariane de Souza Siqueira, Fabrício Alvim Carvalho, Paulo Teodoro Garcia, Ricardo Vargas Kilca, Rodrigo dos Reis Alves, Victor Hugo Paula Rodrigues.
Orientador: John Hay
Introdução
O desenvolvimento de uma espécie está sensivelmente relacionado às condições
ambientais. A forma de uma planta é, primariamente, direcionada para a aquisição de
recursos, como luz, água, nutrientes, polinizadores ou dispersores. Seu tamanho reflete um
sucesso imediato na captura de recursos, enquanto sua forma reflete a história de ambientes
passados e respostas comportamentais (Waller, 1990). Nos estágios iniciais de
desenvolvimento as plantas investem em crescimento vegetativo. Quando seu crescimento é
suficientemente grande para assegurar sua sobrevivência, os recursos começam a ser alocados
para a reprodução (Waller,1990).
Caryocar brasiliense A. St.-Hil. é uma espécie típica do bioma Cerrado, com ampla
distribuição geográfica, podendo ser encontrada em diferentes fisionomias: campo cerrado,
campo sujo, cerrado sentido restrito e cerradão. É uma espécie decídua que perde as folhas no
início da estação seca (junho) e volta a produzi-las no início da estação chuvosa (setembro).
Sua floração normalmente ocorre de junho a janeiro e frutificação de outubro a fevereiro.
Apresenta dispersão zoocórica e polinização realizada por morcegos (Silva-Júnior, 2005).
Assim como outras espécies decíduas, a periodicidade natural na perda de suas folhas resulta
em ciclos de incremento modular que possibilitam inferir sobre as estratégias de investimento
em tecidos. Baseado nesta característica, o presente trabalho teve como objetivos (1)
investigar variações de crescimento intra-específico de módulos e (2) comparar a variação de
crescimento geral entre indivíduos jovens e adultos de Caryocar brasiliense.
Material e métodos
O presente estudo foi realizado no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN),
localizado entre os municípios de Caldas Novas e Rio Quente, no sudeste do Estado de Goiás,
a 180 Km da capital Goiânia (Silva et al., 2002). A coleta de dados foi realizada em outubro
de 2005.
Foram selecionados, aleatoriamente, 20 indivíduos de C. brasiliense, sendo 10 jovens e 10
reprodutivos (adultos), no platô do PESCAN. Em cada indivíduo foram medidas a
25
circunferência a altura do solo (CAS = 30 cm do solo) e a altura. Além disso, foram
selecionados dois módulos de cada indivíduo nos quais foram contados e medidos, com o
auxílio de um paquímetro, o número e comprimento dos inter-nós (sessão entre duas emissões
de folhas) para a estação de crescimento atual e as duas anteriores.
A análise estatística dos dados foi realizada com o auxílio do programa Systat® 8.0.
Diferenças significativas das variáveis: crescimento da planta x anos, e comprimento dos
módulos x idade foram avaliadas usando o teste t e ANOVA.
Resultados e discussão
Os dados obtidos para os indivíduos jovens e adultos são apresentados na Tabela 1.
Tabela 1. Dados obtidos e calculados para indivíduos jovens e adultos de Caryocar brasiliense em uma área de cerrado sensu stricto no PESCAN.
Jovens Adultos Indivíduos amostrados 10 10 Altura mín – máx (cm) 0,70-1,60 2,20-13,70 CAS mín – máx (cm) 8,5 -20 45,3 – 95 Número de módulos novos 4 - 17 -
Considerando indivíduos jovens e adultos, não houve diferença significativa entre o
crescimento das plantas em relação aos intervalos analisados (2003 a 2005) (F= 2,002 e
p=0,140, gráfico 1). Com relação aos diferentes intervalos, houve diferença significativa do
comprimento dos módulos em relação à idade nos anos de 2003 (t= -2,808, gl=38 e p=0,008,
figura 2) e 2004 (t= -3,274, gl= 38 e p=0,002, figura 3). No entanto, no ano de 2005 não
houve diferença significativa (t= -0,871, gl=38 e p= 0,389, figura 4).
Os resultados indicaram que os indivíduos de C. brasiliense crescem de maneira
homogênea em relação aos anos. Aparentemente, períodos de stress ambiental (como em
2004) podem ter influenciado no baixo desenvolvimento nos indivíduos analisados. Nos
demais anos (2003 e 2005), houve um desenvolvimento superior e com mais eqüidade.
Nos anos de 2003 e 2004, observou-se que os indivíduos jovens desenvolveram seus
módulos mais eficientemente que os indivíduos adultos. Isso parece representar um trade-off,
já que indivíduos adultos talvez diminuem seu crescimento vegetativo para alocar parte do seu
recurso energético em estruturas reprodutivas.
26
7
Figura 1: Variação do crescimento dos módulos dos indivíduos de Caryocar brasiliense (n=20) ao longo dos três períodos considerados (2003-2005) em uma área de cerrado sensu
stricto no PESCAN.
JovemAdulto
IDADE
0
100
200
300
400
C03
_TO
TAL
05101520Count
0 5 10 15 20Count
Figura 2: Variação do comprimento dos módulos dos indivíduos de Caryocar brasiliense (n=20) ao longo do período de 2003 em uma área de cerrado sensu stricto no PESCAN.
27
JovemAdulto
IDADE
0
100
200
300
C04
_TO
TAL
05101520Count
0 5 10 15 20Count
Figura 3: Variação do comprimento dos módulos dos indivíduos de Caryocar brasiliense (n=20) ao longo do período de 2004 em uma área de cerrado sensu stricto no PESCAN.
JovemAdulto
IDADE
0
100
200
300
400
C05
_TO
TAL
05101520Count
0 5 10 15 20Count
Figura 4: Variação do comprimento dos módulos dos indivíduos de Caryocar brasiliense (n=20) ao longo do período de 2005 em uma área de cerrado sensu stricto no PESCAN.
28
Quanto ao número de nós produzidos por jovens e adultos ao longo das três últimas
estações de crescimento é possível verificar que não houve diferença significativa entre os
valores médios para cada grupo (figura 5).
No ano de 2005 não foi observado esse mesmo resultado, pelo fato de que as plantas
amostradas ainda não finalizaram seu ciclo de crescimento. Embora não tenha sido observada
diferença entre indivíduos jovens e adultos neste ano, o gráfico acumulativo (2003-2005) de
incremento em módulos (figura 6) sugere a ocorrência de Trade-off crescimento-reprodução,
representado por um maior investimento no crescimento dos ramos por parte dos indivíduos
juvenis ao contrário dos adultos que investem em crescimento do pedúnculo do fruto (esforço
reprodutivo) que é perdido após o término do período de frutificação. Possivelmente, no final
da estação de crescimento, haverá uma nítida diferença de crescimento entre módulos de
plantas adultas e plantas jovens.
9,1
9,2
9,3
9,4
9,5
9,6
9,7
9,8
Jovem Adulto
Figura 5: Número médio e erro padrão de nós em indivíduos jovens e adultos de Caryocar brasiliense ao longo de três estações de crescimento (2003-2005) em uma área de cerrado
sensu stricto no PESCAN.
29
Least Squares Means
Adulto JovemIndivíduos
40.0
67.8
95.6
123.4
151.2
179.0
Incr
e men
to a
cum
ula t
ivo
(mm
)
Figura 6: Variação do incremento acumulativo médio em comprimento dos módulos dos
indivíduos de Caryocar brasiliense em indivíduos jovens e adultos ao longo de três estações de crescimento (2003-2005) em uma área de cerrado sensu stricto no PESCAN.
Referências bibliográficas
SILVA JR., M.C. 2005. 100 árvores do Cerrado: guia de campo. Ed. Rede de Sementes do
Cerrado: Brasília.
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30
FREQÜÊNCIA DE DANOS POR PILHADORES DE NÉCTAR EM FLORES DE
Tocoyena formosa (CHAM. & SCHITDL.) K. SCHUM.
Alan Nilo, Fabrício Alvim Carvalho, Rodrigo Alves, Rosely Ferreira, Paulo Teodoro & Vanessa Ramos
Orientador: Helena C. Morais
Introdução
Uma parcela significativa de espécies vegetais necessita de um agente polinizador para
realizar a troca de grãos de pólen entre indivíduos, aumentando assim, a variabilidade
genética dentro da espécie. Para isso as plantas oferecem recursos atrativos aos polinizadores
tais como pólen, néctar e óleos. Estes constituem uma fonte alimentar importante ao agente
polinizador (Ricklefs, 2003).
Tais atrativos despertam também as atenções de espécies oportunistas que não realizam
a polinização e que, muitas vezes, podem gerar danos parciais ou totais na estrutura floral e
redução de recursos aos polinizadores efetivos. Dependendo da sua intensidade, estes danos
podem ter como conseqüência a diminuição do sucesso reprodutivo do indivíduo.
Tocoyena formosa (Cham. & Schltdl.) K. Schum. é uma espécie arbórea da família
Rubiaceae que ocorre no Cerrado sensu stricto e Cerradão, tendo ampla distribuição no
território brasileiro. Sua floração ocorre ao longo do ano, sendo mais intensa entre os meses
de outubro e novembro. É uma espécie polinizada por mariposas, sendo que suas flores
apresentam corola tubular com até 15 cm de comprimento, cor branca ou amarelada, antese
noturna e néctar como principal recurso oferecido aos polinizadores (Silva Júnior 2005).
Eventualmente este recurso oferecido pode ser pilhado por organismos oportunistas que vêem
neste material uma fonte alimentar interessante. Dessa forma, o objetivo do presente trabalho
foi determinar a freqüência de danos por pilhadores de néctar em flores de T. formosa.
Material e métodos
O estudo foi conduzido em área de Cerrado sensu stricto, no Parque Estadual da Serra
de Caldas Novas – GO. Foram amostradas todas as inflorescências (Fig. 1) encontradas em
cada indivíduo de T. formosa em trecho de aproximadamente 500 m marginal à estrada que dá
31
acesso à torre de telefonia celular no platô do Parque. Ao todo foram amostradas 156
inflorescências.
Para cada inflorescência foi aferido o número de botões, de flores novas e velhas e o
tipo de perfuração (Fig. 2) encontrado em cada categoria de idade relativa da flor. Os danos
suspeitos de serem causados pelos pilhadores foram classificados segundo local (cálice ou
corola), forma (fenda ou orifício) e posição (base ou ápice da corola). Os dados foram
analisados por teste Qui-quadrado para detecção de diferenças entre cada categoria de dano e
idade relativa das flores.
Figura 1. Inflorescência de Tocoyena formosa
Figura 2. Posição, local e forma das perfurações feitas por pilhadores em Tocoyena formosa.
Resultados e discussão
Quanto ao número de flores pilhadas, os botões apresentaram a menor quantidade de
danos (Fig. 3). Apesar de já ocorrer pilhagem de néctar nos botões, a freqüência é muito baixa
(ca. de 5%), sendo muito provável que, como as flores ainda estão fechadas, não se encontram
atrativas para o polinizador, o que pode passar despercebido pelos pilhadores. Após a antese a
flor fica mais receptiva para seus visitantes florais, e dentre eles encontram-se aqueles
oportunistas que roubam néctar, explicando o aumento na freqüência de danos nas flores
novas. Prosseguindo o desenvolvimento floral aumenta-se a freqüência de atividade desses
pilhadores de néctar, cujo acumúlo de danos permanece registrado nas flores velhas,
explicando a maior freqüência observada (Fig. 3).
32
As diferenças entre as flores com danos e sem danos foram estimadas com o auxílio de
uma tabela de contingência, e a diferença foi significativa entre a quantidade da ocorrência ou
não de dano relacionado com os três estágios de desenvolvimento (2x3, χ2 = 167.25, g. l. = 2,
p < 0.0009), reforçando a idéia de que a freqüência de danos por pilhadores varia muito de
acordo com o estágio de desenvolvimento da flor.
A maior quantidade de danos nas flores foi em forma de fendas na base da corola, seguido
por orifícios na corola (Fig. 4). Também foram observados orifícios no cálice (Fig. 4), o que,
no entanto, parece estar mais relacionado à atividade de insetos herbívoros e não
propriamente dos pilhadores de néctar. Dentre os orifícios em forma de fenda não foi possível
registrar o animal que causa este tipo de dano, mas acredita-se que seja algum tipo de inseto
especialista sugador. Apesar de ser uma fenda comprida externamente, quando analisamos o
dano interno, através da circuncisão da corola, observamos um dano bem menor na parte
interna do tecido, em muitos dos casos representado por um pequeno furo. Já o orifício na
corola geralmente é causado por alguns pássaros como o caso da espécie generalista Coereba
flaveola (Cambacica), eventualmente beija-flores (C. Melo, com. pessoal) ou insetos
mastigadores (ex. vespas e abelhas).
Figura 3.- Proporção de flores de Tocoyena formosa segundo estágio de desenvolvimento e
danos por pilhadores.
33
Figura 4.- Freqüência de danos por pilhadores em flores de Tocoyena formosa segundo
estágio de desenvolvimento e local do dano na flor.
Referências bibliográficas RICKLEFS, R.E. 2003. A economia da natureza. 5 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
504p.
SILVA JUNIOR, M.C. 2005. 100 árvores do cerrado: guia de campo. Brasília: Rede de
Sementes do Cerrado, 278 p.
34
INVESTIMENTO REPRODUTIVO DE QUATRO ESPÉCIES DE ARECACEAE NO
PARQUE ESTADUAL DA SERRA DE CALDAS NOVAS, GOIÁS
Adnilton Fonseca da Costa, Adriana de Oliveira Machado, Marina A. de Oliveira e Silva, Pablo de Oliveira Pegorari, Rosely Ferreira Freitas da Mata e Wender Faleiro
Orientador: Prof. Dr. John Du Vall Hay
Introdução
O Bioma Cerrado é o segundo maior bioma do Brasil e da América do Sul. A
fitofisionomia predominante é o cerrado sensu stricto, uma forma de vegetação tipicamente
savânica com alta diversidade de famílias e espécies (Oliveira-Filho & Ratter 2002).
A família Arecaceae envolve monocotiledôneas conhecidas como palmeiras e é uma das
maiores famílias mundialmente conhecidas, principalmente pelo seu aspecto e forma. Estão
amplamente distribuídas nos trópicos com diversos hábitos e habitats (Ribeiro 1999).
O sucesso reprodutivo de plantas pode ser influenciado por vários fatores tais com
disponibilidade de nutrientes, ausência e/ou presença de polinizadores, predação e herbivoria
e outras condições ambientais bióticas e abióticas (Silva et al 1996).
Os objetivos deste trabalho foram avaliar investimento reprodutivo de quatro espécies
de palmeira, contabilizar e comparar o número de flores entre as espécies e verificar se existe
correlação entre o tamanho da raque e a quantidade de frutos produzidos em cada espécie
estudada.
Material e métodos
Os dados foram coletados numa área de cerrado no topo do Parque Estadual da Serra de
Caldas Novas, Goiás, em quatro pontos aleatórios às margens da estrada de manutenção.
As espécies de Arecaceae estudadas foram: Allagoptera leucocalyx (Mart.), Butia
capitata (Mart.) Beccari, Syagrus flexuosa L.F. e Syagrus petrae (Mart.).
Foram realizadas coletas aleatórias de 5 inflorescências fechadas e 10 infrutescências
com frutos desenvolvidos de cada espécie. Para cada infrutescência foram tomadas medidas
de comprimento da raque principal, do número de frutos desenvolvidos (viáveis) e atrofiados
(inviáveis). O número de flores masculinas e femininas foi contado para cada inflorescência.
Para a análise da distribuição dos dados foi utilizado o teste de Kolmogorov-Smirnov. A
relação entre tamanho da raque e produção de frutos foi analisada utilizando-se a Correlação
de Pearson e o teste t pareado foi utilizado para comparar diferenças entre a produção de
flores masculinas e femininas dentro de cada inflorescência.
35
Resultados e discussão
A análise dos dados revelou que para todas as espécies estudadas, o número de flores
masculinas foi significativamente maior que o de flores femininas, utilizando-se o teste t
pareado (Figura 1). Isto se deve provavelmente ao fato de ser necessária uma grande produção
de pólen para que este possa alcançar, através da polinização, outros indivíduos da mesma
espécie. Além disso, foi observada a abertura de flores masculinas em um período anterior à
abertura das flores femininas, um fenômeno conhecido como protandria, cujo objetivo é
impedir que ocorra a autopolinização.
Figura 1. Produção de flores femininas e masculinas em inflorescências das Arecácias:
a-Allagoptera leucocalyx (t = 18,96; gl = 4; p < 0,0001), b- Syagrus petrae (t = 3,65;
gl = 4; p = 0,02), c-Syagrus flexuosa (t = 15,80; gl = 4; p < 0,0001) e d-Butia capitata
(t = 3,24; gl = 3; p = 0,048).
Os dados aqui encontrados refutam os resultados obtidos em trabalho realizado no
mesmo local e com as mesmas espécies por Caldas et al. (2003), o qual se referia ao número
de flores femininas sendo muito superior ao número de flores masculinas.
A análise dos dados revela que existe diferença significativa entre a quantidade de frutos
desenvolvidos e abortados dentro de cada espécie, exceto em S. flexuosa, na qual não ocorreu
esta diferença (Figura 2).
a b c d
Espécie
0
500
1000
1500
2000
Núm
ero
de F
lore
s
Flores FemininasFlores masculinas
a b c d
Espécie
0
500
1000
1500
2000
Núm
ero
de F
lore
s
Flores FemininasFlores masculinas
36
Figura 2. Produção de frutos desenvolvidos e abortados em infrutescências das Arecácias: a-
Allagoptera leucocalyx (t = 9,78; gl = 9; p < 0,0001), b-Syagrus petrae (t = 2,62; gl = 9; p =
0,028), c-Syagrus flexuosa (t = 1.29; gl = 9; p = 0,230) e d-Butia capitata (t = 7,79; gl = 9; p <
0,0001).
A perda destes frutos pode ter como conseqüência vários fatores dentre os quais
ausência de polinizadores, disponibilidade de nutrientes, sazonalidade, dentre outros.
Podemos notar que a espécie que teve a menor porcentagem de frutos abortados em relação a
frutos desenvolvidos foi Allagoptera leucocalyx (13,28%) (Tabela 1).
Tabela 1. Média e desvio-padrão da produção de flores e frutos de quatro espécies de Arecaceae do
Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Goiás.
Espécies FM
X (SD)
FF
X (SD)
FD
X (SD)
FA
X (SD)
FA
%
Allagoptera
leucocalyx
571,8 (92,91) 132,80 (44,5) 141,60
(48,62)
18,80 (11,09) 13,28
Syagrus petrae 75,00 (36,97) 11,80 (5,89) 9,20 (2,40) 5,60 (2,63) 60,87
Syagrus flexuosa 1476,20
(172,79)
70,60 (43,66) 21,90 (16,98) 16,40 (9,06) 74,89
Butia capitata 768,00 (481,49) 42,50 (8,50) 59,30 (15,24) 25,10 (9,36) 42,33
FM = flores masculinas; FF = flores femininas; FD = frutos desenvolvidos; FA = frutos abortados.
a b c dEspécie
0
50
100
150
200
250
Núm
ero
de F
ruto
s
AbortadoDesenvolvido
a b c dEspécie
0
50
100
150
200
250
Núm
ero
de F
ruto
s
AbortadoDesenvolvido
37
A análise de correlação entre a produção de frutos e tamanho da raque mostrou-se
significativa somente para A. leucocalyx, na qual a produção de frutos é explicada em até
86,12 % pelo tamanho da raquis . Para S. petrae e S. flexuosa houve uma correlação positiva
aparente, mas os valores de correlação para estas espécies não foram significativos. O mesmo
ocorreu para B. capitata, onde apesar de aparentemente ter ocorrido uma correlação negativa,
os valores obtidos de probabilidade não foram significativos. Portanto somente em A.
leucocalyx o número de frutos pode ser influenciado pelo tamanho das raques das
infrutescências.
Tabela 2. Valores da Correlação de Pearson (rp) analisando a influência do tamanho da
raques de infrutescências na produção de frutos desenvolvidos nas espécies de Arecaceae.
Espécie rp p
Allagoptera leucocalyx 0.928 0.000
Syagrus petrae 0.249 0.488
Syagrus flexuosa 0.461 0.181
Butia capitata -0.190 0.600
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38
VISITANTES FLORAIS DE Caryocar brasiliense CAMB. E Palicourea rigida KUNTH
NA TRANSIÇÃO DAS ESTAÇÕES CLIMÁTICAS (SECA-CHUVOSA) NO PARQUE
ESTADUAL DA SERRA DE CALDAS NOVAS, GO.
Ariane de Souza Siqueira, Fabrício Alvim Carvalho, Paulo Teodoro Garcia, Ricardo Vargas Kilca, Rodrigo dos Reis Alves, Victor Hugo Paula Rodrigues.
Orientadora: Celine Melo
Introdução
As plantas apresentam estratégias de fenologias de floração distintas para a atração de
polinizadores, em função da disponibilidade dos diferentes grupos (aves, insetos, morcegos)
presentes em um sistema (Howe & Westley, 1990). Os polinizadores, por sua vez, precisam
captar os recursos de forma mais eficiente possível, fator dependente de sua capacidade de
forrageamento, alimentação ou pilhagem do recurso oferecido pela planta. Estas relações
entre plantas-polinizadores são influenciadas por fatores ambientais (ex. pluviosidade,
temperatura e fotoperíodo) que determinam a ocorrência dos processos de floração. Porém a
oferta de recursos de algumas espécies de plantas varia no decorrer do ano. Durante a estação
seca ocorre uma diminuição dessa oferta para com seus respectivos polinizadores. Dessa
maneira, neste período, espera-se que as poucas espécies vegetais que estejam oferecendo
algum tipo de recurso estarão sujeitas a diferentes vetores de polinização, isto é, o chamado
mutualismo dispersivo.
No Cerrado já são conhecidas algumas síndromes de polinização, tais como a ornitofilia
(plantas polinizadas por aves) e a quiroptofilia (plantas polinizadas por morcegos). E este
bioma é caracterizado por apresentar uma estação seca bem definida, que para muitos animais
correspondem a um período de escassez de recursos, como por exemplo, para a avifauna.
Caryocar brasiliense e Palicourea rigida são espécies lenhosas comuns na vegetação do
cerrado sensu stricto (Silva-Júnior, 2005). Caryocar brasiliense pertence ao grupo de plantas
que florescem durante a estação seca (Oliveira, 1998), possui flores com néctar altamente
energético sendo um recurso muito importante para morcegos (quiroptofilia) (Rebula et al.,
2002). Palicourea rigida floresce durante o início da estação chuvosa, apresentando síndrome
de polinização por aves (ornitofilia) e também com néctar altamente energético (Silva-Júnior,
2005).
O objetivo deste trabalho foi determinar os visitantes florais diurnos e o pico de
atividade destes para estas duas espécies, Caryocar brasiliense e Palicourea rigida, na
39
transição das estações climáticas do ano de 2005 em uma área de cerrado sentido restrito no
Parque Estadual de Caldas Novas, GO.
Material e métodos
O presente estudo foi desenvolvido no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas
(PESCAN), localizado entre os municípios de Caldas Novas e Rio Quente, no sudoeste do
Estado de Goiás, a 180 Km da capital Goiânia (Silva et al., 2002).
Este trabalho foi realizado no dia 23 de outubro de 2005 durante o período matutino
entre 6:00 e 9:00 hs. Foram escolhidos aleatoriamente, três indivíduos de Caryocar
brasiliense, e sete indivíduos de Palicourea rigida em um trecho de cerrado sensu stricto na
área do platô do PESCAN. A coleta de dados consistiu na identificação e avaliação das
interações entre os visitantes florais. Durante o trabalho de campo, foram observados os
visitantes florais através da visualização direta ou com auxilio de binóculos.
A análise dos dados foi realizada com diferentes tabelas da freqüência e horário de
visitação e através do teste do Qui-quadrado para verificar se houve uma preferência das
espécies de beija-flores observadas em relação as duas espécies vegetais.
Resultados e discussão
De maneira geral, a riqueza de visitantes florais foi baixa, sendo observado apenas três
espécies de beija-flores e alguns insetos da ordem Hymenoptera. Esta baixa riqueza ocorreu
devido às condições climáticas no dia das observações (chuva, frio, vento) que interferem na
atividade dos visitantes, especialmente de aves (Krebs et al., 1984 apud Oliveira, 1997).
Foram registradas mais visitas por beija-flores (n = 78) do que por insetos (n = 30) nas
flores de Caryocar brasiliense. No início da manhã houve uma maior visitação de insetos,
porém esta diminuiu drasticamente no final do período de observação. A partir das 7:00 hs os
beija-flores já dominavam a freqüência de visitação desta planta, e este padrão continuou até o
final do período de observação. Isto provavelmente ocorreu devido a alguns beija-flores
apresentarem um comportamento territorialista, no qual muitas vezes foi observado o ataque à
insetos (Fig 1).
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5
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Horário
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ções
InsetosBeija-flores
Figura 1. Distribuição temporal da atividade de insetos e beija-flores visitantes de duas espécies do cerrado sensu strictu no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO. Onde: beija-flores = Eupetomena macroura, Thaluriana furcata e Amazilia fimbriata; Insetos: Hymenoptera (vespas, abelhas e mamangavas).
Para Palicourea rigida não houve visitação de insetos. Relacionando o número de
visitas entre as três espécies de beija-flores para as espécies vegetais citadas, Eupetomena
macroura foi mais freqüente no C. brasiliense que em P.rigida. Este beija-flor é muito
agressivo (C. Melo, com. pessoal), o que poderia estar inviabilizando a visita de outros beija-
flores no C. brasiliense, uma vez que esta era a melhor fonte de recurso no início da manhã.
Ao final da manhã acredita-se que ocorreu a diminuição da produção de néctar pelo C.
brasiliense, diminuindo a sua visita nesta planta e provavelmente passaria a visitar a P. rigida,
pois esta espécie vegetal oferece néctar durante o dia todo (Fig 2).
Figura 2. Distribuição temporal de atividade de Eupetomena macroura em duas espécies do cerrado sensu strictu no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
Entretanto, para Thaluriana furcata, registrou-se mais visitas na P. rigida nas
primeiras horas da manhã. Isto possivelmente ocorreu devido a esta espécie ser um
competidor menos eficiente que Eupetomena macroura, e assim, inviabilizando um maior
41
número de visitas no C. brasiliense. Dessa maneira a freqüência de visitação de T. furcata se
manteve constante, durante o período de observação, nesta última espécie de planta (t = 0.000
df = 5 Prob = 1.000). No período de 7:30 ás 7:59 houve uma diminuição de visitação (t = -0.000
df = 5 Prob = 1.000), porém não significativo. Amazilia fimbriata apresentou maior visita em P.
rigida no início da manhã, depois esta quantidade de visita diminuiu e houve um pico em C.
brasiliense, distribuindo suas visitas em dois períodos de forrageamento para as duas
espécies. Sendo depois esperado no resto do dia, com a diminuição da produção de néctar
pelo C. brasiliense, o decréscimo de sua visita nesta planta e provavelmente passaria a visitar
a P. rigida, pois esta espécie vegetal oferece néctar durante o dia todo (fig. 4).
Com relação aos insetos (abelhas, marimbondos e mamangavas), foram observados
picos de visitação no período das 07:30 a 09:00, após declínio significativo entre 06:00 e
07:00. Isto foi esperado, pois a quantia de beija-flores visitando flores é maior que os insetos
(figura 1 e 5).
Figura 3. Distribuição temporal de atividade de Thaluriana furcata em duas espécies do cerrado sensu strictu no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
Figura 4. Distribuição temporal de atividade de Amazilia fimbriata em duas espécies do cerrado sensu strictu no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
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8:30-8:59
Horário
Núm
ero
de v
isita
ções Abelha
MarimbondoMamangava
Foram observadas 23 interação agonísticas durante todo o período de observação. As
análises desse tipo de interação entre Eupetomena macroura e Thaluriana furcata para dois
indivíduos de C. brasiliense demonstraram que existiu um pico de atividade entre 7:30 e 8:59
h da manhã (Fig. 6). Este intervalo coincidiu com o pico de atividade de Eupetomena
macroura, que por ser mais agressiva tende a diminuir a atividade de visitação das demais
espécies (Oliveira, 1997). Devido a sua elevada demanda energética, beija-flores tendem a se
estabelecer em manchas de recursos propícias ao seu forrageamento (Gass & Sutherland,
1984 apud Oliveira, 1997), e as diferenças nos intervalos de atividades entre as três espécies
observadas estão relacionadas à dinâmica espacial e temporal na utilização dos recursos
florais.
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1012
6:00-6:29
6:30-6:59
7:00-7:29
7:30-7:59
8:00-8:29
8:30-8:59
Horário
Núm
ero
de in
tera
ções Interações Agonistas
Figura 6. Número de interações agonistas entre Eupetomena macroura e Thaluriana furcata em duas espécies arbóreas do cerrado sensu strictu no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
Figura 5. Distribuição temporal de atividade de insetos visitantes de duas espécies do cerrado sensu strictu no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
43
Referências bibliográficas
FRISCH, J. D. 1981. Aves brasileiras. Dalgas- Ecoltec Ecologia Técnica: São Paulo. 353 p.
HOWE, H. F. & WESTLEY, L. C. 1990. Ecology of Pollination and Seed Dispersal. In:
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SANO,M. S. & ALMEIDA S. P. (Eds.) Cerrado: ambiente e flora. EMBRAPA-CPAC:
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REBULA, C., MUNIZ, C.; YAMAMOTO, M. & LOPES, S. 2002. Disponibilidade de néctar
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sensu restrito, Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO. Relatório Final: Métodos
de Campo em Ecologia - UFU. pp. 47-50.
SOUZA, D. 1998. Todas as aves do Brasil. Editora Dall: Feira de Santana-BA. 239 p.
44
LEVANTAMENTO PRELIMINAR DA AVIFAUNA EM UM GRADIENTE DE
CERRADO DO PARQUE ESTADUAL DA SERRA DE CALDAS NOVAS, GOIÁS
Adnilton Fonseca da Costa, Adriana de Oliveira Machado, André de Sousa Jorge, Frederico Gemesio Lemos & Pablo de Oliveira Pegorari
Orientador: Celine de Melo
Introduçaõ
Em regiões tropicais, a fragmentação de habitats tem aumentado consideravelmente.
Nesse contexto, as unidades de conservação, sem dúvida, são essenciais para manter a
integração e biodiversidade dos ecossistemas (Nepstad et al. 1996). Logo, em biomas que
apresentam um alto grau de degradação (desmatamento para formação de pastagens e
culturas, fragmentação), como o Cerrado, tais unidades contribuem enormemente para a
manutenção da diversidade e riqueza de espécies.
Informações sobre a avifauna localizada em tais unidades e o uso de manchas de
vegetação natural por estas espécies podem ser relevantes para a conservação regional, bem
como para predizer a vulnerabilidade de espécies sujeitas ao processo de destruição de
habitats.
Apesar de serem facilmente observadas, apenas recentemente as comunidades de
pássaros têm sido estudadas nesse ambientes (Anjos & Boçon, 1999). Assim, faz-se
necessária a realização de estudos sobre a ecologia de aves em diferentes fisionomias do
Cerrado.
Em virtude da ausência de levantamentos avifaunísticos no Parque Estadual da Serra
de Caldas Novas, qualquer tentativa de identificar as aves que ocorrem na região pode ser
enriquecedora. Portanto, esse trabalho teve como objetivo realizar um levantamento
preliminar da avifauna em um gradiente vegetacional de cerrado do Parque Estadual da Serra
de Caldas Novas.
Material e métodos
O presente estudo foi realizado no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Caldas
Novas, Goiás (PESCAN), durante uma manhã, em outubro de 2005. A avifauna foi amostrada
pelo método de estimativa por ponto de raio fixo. Foram estabelecidos pontos aleatórios de
observação em cada área de amostragem, distantes cerca de 50 m um do outro. Em cada ponto
foi feita a identificação das espécies observadas por meio de zoofonia ou observação direta,
com auxílio de binóculos, num período aproximado de 10 minutos (por ponto) utilizando-se
45
de guias práticos para identificação da avifauna brasileira (Souza, 1998 & Frisch, 1981). As
espécies observadas, ao longo do intervalo de caminhada entre pontos também foram
registradas.
Os pontos estabelecidos foram percorridos no período matutino durante 4 horas (06:00
às 10:00). As espécies encontradas foram agrupadas em guildas alimentares (onívoros,
frugívoros, insetívoros, granívoros, psívoros e carnívoros).
Resultados e discussão
Foram encontradas 31 espécies pertencentes a 18 familias (Anexo1). Este número
fornece uma informação prévia a respeito da riqueza do parque, apesar de ser apenas uma
sub-amostra do número de espécies esperadas para o Cerrado.
Devido ao fato do levantamento ter sido realizado ao longo de apenas uma manhã,
grande parte das espécies visitantes do parque não foi registrada. Isso pode ser constatado
verificando a curva de descobrimento das espécies (Figura 1). Assim, sugere-se que novos
levantamentos sejam realizados, porém com um intervalo de coleta de dados maior (dois
anos) e bem distribuído (abrangendo tanto estações secas quanto chuvosas), uma vez que
certas espécies de aves são migratórias ou são observadas somente em breves períodos do
tempo (épocas reprodutivas).
Figura1. Curva de descobrimento das espécies levantadas no PESCAN.
46
A distribuição do número de espécies encontradas ao longo do tempo acompanhou a
do número de indivíduos. O maior ponto de divergência foi devido aa um grupo de
andorinhas, espécies que encontram-se geralmente em bandos (Figura 2).
Foram registrados dois picos de atividade das espécies. O primeiro por volta das 6:30
horas, correspondendo ao início do levantamento na área aberta. Neste pico registrou-se um
predomínio de Passeriformes, que pode ser explicado pelo fato de serem aves de pequeno
porte, mais sujeitas a stress térmico. O segundo pico foi gerado principalmente pela presença
de espécies Falconiformes, o que pode estar relacionado ao período de atividade de suas
principais presas (lagartos e cobras) (Figura 2).
Figura2. Pico de atividade das espécies levantadas de acordo com o horário no PESCAN.
A partir da análise dos hábitos alimentares das espécies registradas a partir da
utilização de guias, foi possível criar uma tabela das guildas tróficas encontradas no parque
(tabela 1).
Tabela 1 – Estrutura trófica da avifauna observada no PESCAN.
Hábito alimentar N° de espécies Onívoros 6
Frugívoros 7 Insetívoros 9 Granívoros 1 Carnívoros 7 Piscívoros 1
47
A presença relativamente alta de aves que compõem a guilda de frugívoros e
carnívoros é um indicador do bom estado de conservação do parque, pois de acordo com
Puttman (1994), a disponibilidade de recursos alimentares variados é importante para explicar
a variação nas comunidades de aves.
Além disso, a riqueza de Falconiformes (carnívoros) encontrada foi relativamente alta.
Das sete espécies registradas, cinco são animais não comumente avistados, sendo que destas,
uma é de porte grande (Buteo albicaudatus). A riqueza de espécies dessa ordem encontrada
no parque pode ser explicada pela existência de áreas abertas, utilizadas para forrageamento, e
paredões, utilizados como sítios de nidificação. Falconiformes, em sua maioria são predadores
de topo de cadeia (Ricklefs, 2003), apresentando grandes áreas de vida, havendo portando a
necessidade de habitats pouco fragmentados. Por produzir ninhadas pequenas e exigir grandes
populações de presas para sustentar uma população viável, essa ordem pode ser utilizada
como bioindicador positivo, confirmando o bom estado de conservação do parque.
A ocorrência de Momotus momota (observado nidificando na área de mata) e a
ausência de Passer domesticus (pardal) também são bioindicadores de baixa perturbação. A
primeira espécie está relacionada a ambientes de mata de galeria pouco perturbados e a
segunda, a ambientes altamente perturbados, como por exemplo, áreas urbanas. Porém, o
registro de Pitangus sulphuratus (bem-te-vi) pode indicar a ausência de áreas tampão (zonas
de amortecimento). Isso implica em efeitos negativos sobre a conservação da riqueza de
espécies não só de aves, mas também de outras espécies de vertebrados do parque.
Referências bibliográficas
ANJOS, L. & BOÇON, R. 1999. Bird communities and natural forests patches and southern
Brazil. Wilson Bull. 111:397-414.
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tropical landscapes. Washington Island Press.
PUTTMAN, R. J. 1994. Community ecology. London: Chapman & Hall.
RICKLEFS, R. E..2003. A economia da natureza. Ed. Guanabara-Koogan. Pp 117-132.
SOUZA, D. 1998. Todas as aves do Brasil. Editora DALL: Feira de Santana, BA. 239p.
48
Anexo 1. Espécies e famílias de aves encontradas no gradiente vegetacional (cerrado-floresta) no PESCAN.
Família Nome vulgar Ambiente Solitário/Grupo Dieta Frequência Acciptridae Accipiter Bicolor
Gavião-bombacha
Beira de florestas/clareiras
Solitário Carnívoro
1
Buteo albicaudatus
Gavião-de-cauda-branca
Ambientes abertos e acidentados
Solitário Carnívoro 2
Geranospiza caerulescens
Gavião-pernilongo
Mata próxima a campos e pastos
Solitário Carnívoro 1
Ictinia pumblea Gavião-sauveiro
Vários Solitário Carnívoro 1
Leptodon cayanensis
Gavião-de-cabeça-cinza
Florestas perto de água corrente
Solitário Carnívoro 2
Falconidae Polyborus plancus
carcará Áreas abertas Solitário Carnívoro/ detritívoro
2
Pandionidae Milvago chimachima
Carrapateiro Áreas abertas, praias (mar e água doce)
Solitário Carnívoro 1
Cariamidae Cariama cristata
Seriema Cerrado, campos e campinas
Solitário/grupo Onívoro 1
Bucconidade Nystalus maculatus
João-bobo Mata Solitário Insetívoro 1
Pipridae Antilophia galeata
Soldadinho Matas e buritizais Solitário (casal) Frugívoro 1
Tyrannidae Elaenia sp. Matas Solitário Onívoro 1 Suiriri suiriri Siriri Bordas de matas,
ambientes alterados Solitário Insetívoro 1
Pitangus sulphuratus
Bem-te-vi Áreas antropizadas/urbanas
Solitário Insetívoro 3
Myiarchus ferox
Maria-cavaleira Capoeiras e beiras de florestas
Solitário Insetívoro 3
Hirudinidae Progne chalybea
Andorinha-grande
Áreas abertas Grupo Insetívoro 2
Phaeprogne tapera
Andorinha Áreas abertas Grupo Insetívoro 1
Stelgydopteryx ruficollis
Andorinha-serradora
Áreas abertas Grupo Insetívoro 1
Turdidae Turdus amaurochalinus
Sabiá-poca Lugares mais ou menos abertos
Solitário Onívoro 3
49
Turdus leucomelas
Sabiá-de-cabeça-cinzenta
Florestas e capoeiras Solitário Onívoro 3
Parulidae Basileuterus hypoleucus
Pula-pula-pichito
Matas Solitário Insetívoro 1
Parula pitiayumi
Mariquita-do-sul
Matas e suas bordas Solitário Insetívoro 1
Tersinidae Tersina viridis Saí-andorinha Borda de mata / mata
de galeria Solitário Frugívoro 1
Thraupidae Euphonia chlorotica
Vivi Mata baixa, caatinga e Palmares
Solitário Frugívoro 4
Tangara cayanna
Tangará Áreas semi-abertas Solitário Frugívoro 2
Thraupis sayaca
Sanhaço-cinza Ambientes mais ou menos abertos, com árvores
Solitário Frugívoro 2
Fringillidae Volatinia jacarina
Tizil Áreas abertas Grupo Granívoro 2
Momotidae Momotus momota
Udu-coroado Matas próximas a barrancos
Solitário Onívoro 1
Ardeidae Syrigma sibilatrix
Maria faceira Ambientes de água doce, campos, culturas
Solitário Piscívoro 2
Ramphastidae Ramphastos toco
Tucano-toco Vários Solitário Onívoro
Psitacidae Amazona aestiva
Papagaio-curau Campos, buritizal, pomares, ambientes urbanos
Grupo Frugívoro 2
Aratinga sp. Jandaia Campos, buritizal, pomares, ambientes urbanos
Grupo Frugívoro 1
Emberezidae Corysphospingus cucullatus
Tico-tico Mata secundária rala e baixa /cerrado
Solitário Granívoro 1
50
ONTOGENIA E CARACTERÍSTICAS EDÁFICAS DETERMINAM A
SUSCEPTIBILIDADE DE Caryocar brasiliense À HERBIVORIA FOLIAR?
Alan Nilo da Costa, Fabrício Alvim Carvalho, Paulo Teodoro Garcia, Rodrigo Alves dos Reis, Rosely Ferreira Freitas da Mata, Vanessa Nascimento Ramos.
Orientador: Heraldo L. Vasconcelos
Introdução
O processo de herbivoria foliar representa um dos processos funcionais mais importantes
em ecossistemas vegetais (Dirzo & Domínguez 1995; Coley & Barone 1996). O herbívoro
interfere no desempenho da planta através da redução da área de captura de luz, remoção de
nutrientes e aumento da incidência de patógenos, ou até mesmo provocando a sua morte
(Dirzo 1984; Dirzo & Domínguez 1995). De modo geral, plantas estabelecidas em ambientes
de estresse hídrico ou nutricional, como nas savanas, tendem a sofrer elevadas taxas de
herbivoria foliar, devido aos baixos níveis de defesas nas folhas decíduas de curto período de
vida e à redução das populações de herbívoros nas estações secas (Coley & Barone 1996). As
condições edáficas do Cerrado variam consideravelmente em curto espaço geográfico e são os
principais condicionantes da vegetação e dos processos ecológicos associados (Felfili et al.
1994). Considerando o postulado de que plantas com maior oferta nutricional investem mais
em defesa foliar (Coley & Barone 1996), espera-se que diferenças na herbivoria foliar
ocorram entre indivíduos de mesma espécie estabelecidos em condições edáficas distintas do
cerrado.
O pequi (Caryocar brasiliense Camb.) é uma espécie muito comum no Cerrado, ocupando
uma ampla faixa de distribuição em termos de variação na qualidade do solo e disponibilidade
de nutrientes para os indivíduos (Lorenzi 1992). Os processos fisiológicos de floração,
frutificação, queda e produção de folhas, que são importantes para a presença de herbívoros,
podem variar consideravelmente entre as diferentes condições edafo-climatológicas do
Cerrado (Araújo 1994 apud Fernandes et al 2004). Entretanto, ainda são poucas as
informações quantitativas de como a herbivoria foliar varia entre indivíduos em diferentes
estágios de desenvolvimento estabelecidos em condições edáficas distintas.
Neste trabalho nós testamos se existe diferença entre a herbivoria foliar sofrida por
Caryocar brasiliense no cerrado sensu stricto e no cerradão rupestre, decorrente de diferenças
edáficas entre as áreas; e se indivíduos reprodutivos e jovens (não reprodutivos) também
diferem no dano foliar sofrido em cada área por realizarem diferentes alocações de recursos.
51
Material e métodos
O presente estudo foi desenvolvido no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas
(PESCAN). Foram selecionadas duas fitofisionomias distintas no platô do PESCAN: Cerrado
sensu stricto e cerradão rupestre. O primeiro encontra-se estabelecido sobre Latossolo
vermelho-amarelo onde espera-se baixa disponibilidade nutricional para as plantas; o segundo
sobre Cambissolo com afloramento rochoso evidente e acúmulo de matéria orgânica na
camada superficial (horizonte A).
Em cada fitofisionomia, foram selecionados 10 indivíduos de Caryocar brasiliense, sendo
10 jovens (não reprodutivos) e cinco adultos (com estruturas reprodutivas). Em cada
indivíduo foram selecionadas aleatoriamente 10 folhas. Como a folha é composta de três
folíolos, padronizou-se a coleta do folíolo central para a análise quantitativa de dano por
herbívoros. Das folhas aferiu-se o comprimento (C) e maior largura (L) e calculou-se a área
foliar com uso da equação AF = 0,732 (C*L). Para cada individuo foi medido a área foliar
danificada por herbívoros das 10 folhas. As relações entre as fitofisionomias, idade dos
indivíduos e dano foliar médio foram analisados através de uma análise de variância
hierárquica (Nested ANOVA).
Resultados e discussão
O dano foliar diferiu significativamente entre indivíduos jovens e adultos (F1, 2 = 7,45;
p = 0,002), tanto em Cerradão Rupestre quanto em Cerrado sensu stricto (Fig. 1). Uma
provável explicação para esse fato seria a ocorrência de alocação diferencial de recursos, na
qual os indivíduos jovens estariam investindo mais em defesa das folhas visando um melhor
desenvolvimento, ao passo que os adultos, por já estarem estabelecidos, convergiram um
maior investimento em estruturas reprodutivas. Embora tais padrões não tenham sido
quantificados no presente estudo (ex. análise de defensivos estruturais e químicos nas folhas),
já são relativamente elucidados para ambientes tropicais (ver revisão em Coley & Barone,
1996). É interessante levar ainda em consideração o fato de que Caryocar brasiliense, assim
como diversas espécies de Cerrado, talvez possa apresentar um ritmo de crescimento lento, e
portanto o investimento em recursos como compostos defensivos contra herbivoria poderiam
ser bastante privilegiado nos jovens. Não foram encontradas diferenças quanto ao dano foliar
entre as duas fitofisionomias comparadas, Cerradão Rupestre e Cerrado sensu stricto (F1, 2 =
1,25; p = 0,27, Fig. 1). Apesar de ter sido observada uma camada de matéria orgânica no
Cerradão Rupestre, o que teoricamente conferiria maior disponibilidade de nutrientes para as
plantas, esse fator edáfico aparentemente não possibilitou nenhuma vantagem para a
52
Cerradão CerradoFitofisionomia
0.00
0.01
0.02
0.03
0.04
0.05
0.06
0.07
0.08
0.09
Pro
por ç
ão d
e da
no fo
liar
JovemAdulto
IDADE
proteção/redução da herbivoria foliar. Isto contraria nossa hipótese de que os indivíduos
estabelecidos em solos com maior disponibilidade de nutrientes investiriam mais em defesas,
padrão este encontrado em um trabalho anterior nas mesmas áreas estudadas (H.L.
Vasconcelos, com. pessoal). É possível que haja uma forte influência do atraso da estação
chuvosa e da não coincidência desta com o presente estudo, devido à redução de herbívoros
no Cerrado na estação mais seca. Estudos indicando que algumas espécies de planta possuem
mecanismos para o aumento da produção de compostos secundários de defesa em resposta a
uma grande herbivoria ocorrida na estação anterior. Isso explicaria a diferença encontrada nas
duas fitofisionomias no trabalho anterior e a discrepância relativa de resultados obtidos no
presente estudo.
Figura 1. Proporção média de dano foliar em indivíduos jovens e adultos de Caryocar
brasiliense em área de Cerrado sensu stricto e Cerradão Rupestre no PESCAN.
Referências bibliográficas
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Ann. Rev. Ecol. Syst. 27:305-335.
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Dry Tropical Forests. Cambridge University Press, Cambridge, UK, pp. 304-325.
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vegetação e solos. Caderno de Geociências 12:75-166.
LORENZI, H. 1992. Árvores Brasileiras. Manual de identificação e cultivo de plantas
arbóreas do Brasil. Editora Plantarum, Nova Odessa, São Paulo.
FERNANDES, L.C.; FAGUNDES, M.; SANTOS, G.A. & SILVA, G.M. 2004. Abundância
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Revista Árvore 28: 919-924.
54
EXISTEM DIFERENÇAS NO DANO FOLIAR CAUSADO POR HERBÍVOROS E
PATÓGENOS ENTRE PLANTAS SEMPRE VERDES E DECÍDUAS?
Adnilton Fonseca da Costa, Adriana Oliveira Machado, André de Sousa Jorge, Frederico Gemesio Lemos & Pablo de Oliveira Pegorari.
Orientador: Prof. Dr. Heraldo Vasconcelos
Introdução
Os herbívoros podem reduzir o potencial reprodutivo das plantas destruindo suas
superfícies fotossintetizantes, seus órgãos de reserva de nutrientes ou suas estruturas
reprodutivas. Como conseqüência, a planta poderá apresentar seu status fisiológico alterado,
podendo ocorrer a morte ou a eliminação competitiva de alguns indivíduos (Raven, et al.
1999).
As relações entre as plantas e organismos patógenos são semelhantes em seus efeitos,
àqueles causados por herbívoros (Raven, et al. 1999), podendo os patógenos ser considerados
como minúsculos herbívoros que deixam seus resíduos dentro das plantas (Crawley, 1986). O
efeito da herbivoria é um aspecto importante no ciclo de vida de plantas, e depende da área
foliar removida e do estágio de desenvolvimento em que a planta se encontra (Begon et al.,
1996). O conhecimento dessas interações entre plantas e animais pode ajudar a entender como
as comunidades são estruturadas (Raven, et al. 1999).
No cerrado, o investimento em reservas nutricionais subterrâneas evidencia a grande
quantidade de espécies decíduas e semidecíduas (Toledo et al., 2002). Devido a diferenças no
tempo de longevidade das folhas na planta, plantas decíduas provavelmente investem menos
em defesas foliares contra herbívoros (como, por exemplo, compostos secundários) do que
plantas perenes.
Assim, o objetivo desse estudo foi verificar se existem diferenças no dano foliar entre
plantas sempre verdes e decíduas. A hipótese testada foi a de que plantas decíduas apresentam
maior dano foliar causado por herbívoros ou patógenos do que plantas sempre verdes. Para
este tipo de comparação devem ser utilizados grupos proximamente aparentados (de
preferência do mesmo gênero) que difiram na característica em questão, no caso a
deciduidade. Grupos proximamente aparentados provavelmente diferem em um menor grupo
de características do que grupos distantes. Assim a possibilidade de outras características, que
não a característica em questão, estarem interferindo na hipótese a ser testada é menor.
55
Materiais e Métodos
Como não foi possível realizar a comparação no nível de espécie, optou-se pela
comparação entre gêneros. As plantas sempre verdes foram representadas por três espécies do
gênero Vochysia (V. cinnamomea, V. elliptica e V. rufa), enquanto as plantas decíduas foram
representadas por três espécies do gênero Qualea (Q. grandiflora, Q. multiflora e Q.
parviflora).
Foram escolhidos randomicamente 7 indivíduos de cada espécie, para coleta aleatória
de 10 folhas em cada. Aferiu-se visualmente a porcentagem da área foliar danificada, onde
dois observadores estimaram medidas para cada folha e utilizou-se a média das duas
observações. Para verificar a acurácia da medida, foi feita a estimativa da área real de dano
foliar para 11 folhas por meio de um grid de pontos. Foi calculada a média de dano causado
por herbívoros e patógenos para cada indivíduo. Testou-se a normalidade dos dados por meio
do teste de Kolmogorov-Smirnov. As diferenças no dano médio entre gêneros e entre espécies
foram analisadas por meio de ANOVA aninhada.
Resultados e Discussão
A estimativa visual do dano foliar mostrou-se superestimada em relação ao dano foliar
real. Porém como houve relação entre ambos a super-estimativa do dano foliar,
provavelmente não interferiu nas análises subseqüentes (Figura 1).
Foi encontrada diferença no dano foliar médio entre Qualea e Vochysia (F1,36 =
13,199; p = 0,001). Porém, contrariamente ao esperado, Vochysia apresentou maior dano
médio do que Qualea (Figuras 2 e 3). Este resultado pode ser devido ao fato das folhas
amostradas de Vochysia terem sido mais velhas do que as de Qualea. Como os indivíduos de
Qualea provavelmente rebrotaram recentemente, suas folhas tiveram menos tempo para serem
danificadas do que as de Vochysia. Uma outra explicação seria a presença de nectários
extraflorais em Qualea, o que poderia reduzir a herbivoria foliar neste gênero quando
comparado com Vochysia. Os nectários extraflorais geralmente atraem formigas que
defendem seu recurso, no caso as plantas do gênero Qualea, evitando a ação dos eventuais
herbívoros.
Foram encontradas também diferenças no dano foliar médio entre as três espécies de
Qualea e entre as três espécies de Vochysia (F4,36 = 3,151; p = 0,026). O menor dano em
Vochysia rufa pode dever-se ao fato de todas as folhas amostradas terem sido folhas jovens,
portanto tiveram menos temo para serem danificadas por herbívoros e patógenos Nos demais
56
casos, provavelmente, tais diferenças deveram-se a características das plantas ou de seus
herbívoros e patógenos não consideradas neste estudo.
Referêcias Bibliograficas
CRAWLEY, M. 1986. Plant Ecology. Blackwell, Oxford.
MARQUES, E. S. A. & PRICE, P. W. 1998. Altitudinal Gradient in Insect Herbyvory
Communities on Tropical Legumes. Brazilian Jornal of Ecology. 2:66-73.
RAVEN, E. E. 1999. Biology of Plants. 6a ed. Freeman Worth. Ecology. P. 783-785
TOLEDO, E. C. F.; MUNIZ, C.; SANTANA, O.; ANGELUCI, C.; RODRIGUES, M. &
HAY, J. 2002. Dureza, Área Foliar, Cor, Peso e Pilosidade em uma Área Queimada e
Outra Não em Cerrado sensu stricto. Métodos de Campo em Ecologia. UnB. p. 54-59.
57
Figura 1. Relação entre a estimativa visual do dano foliar e a área real de dano foliar estimada por meio de um grid de pontos.
Figura 2. Dano médio (perda de área fotossintetizante) causado por herbívoros e patógenos em Qualea grandiflora, Q. multiflora, Q. parviflora, Vochysia cinnamomea, V. elliptica, V. rufa.
58
Figura 3. Diferença no dano médio foliar (perda de área fotossintetizante) causado por
herbívoros e patógenos entre Qualea e Vochysia (F1,36 = 13,199; p = 0,001).
Qualea
grandiflora
multiflora
parviflora
cinamomea
eliptica rufa
Especie
0
5
10
15
Dan
o M
edio
Vochysia
grandiflora
multiflora
parviflora
cinamomea
eliptica rufa
Especie
0
5
10
15
Dan
o M
édio
Qualea
grandiflora
multiflora
parviflora
cinamomea
eliptica rufa
Especie
0
5
10
15
Dan
o M
edio
Vochysia
grandiflora
multiflora
parviflora
cinamomea
eliptica rufa
Especie
0
5
10
15
Dan
o M
édio
Figura 4. Diferença no dano médio de hevivoria entre três espécies de Qualea e entre três espécies de Vochysia (F4,36 = 3,151; p = 0,026).
59
AVIFAUNA EM ÁREAS PERTURBADAS E NÃO-PERTURBADAS NO PARQUE
ESTADUAL DA SERRA DE CALDAS NOVAS, GO
Ariane de Souza Siqueira, Everton Tizo Pedroso, Marina A. de Oliveira e Silva, Ricardo Vargas Kilca, Victor Hugo P. Rodrigues e Wender Faleiro.
Orientador: Celine Melo
Introdução
O Brasil abriga uma das mais diversas avifaunas do mundo, com um número estimado
de 1690 espécies (CRBO 2003; IUCN 2004; Nature Serve 2004). A riqueza de espécies de
uma comunidade pode ser relacionada a vários fatores, como a produtividade do ambiente,
variação climática, quantidade de predação e competição (Begon 1996). Além disso, a alta
diversidade de ambientes tropicais está relacionada com a heterogeneidade de hábitat criados
pela perturbação (Ricklefs 2003).
Perturbações ocasionadas por eventos estocásticos ou perturbações antrópicas abrem
espaço para a colonização e iniciam um ciclo de sucessão por espécies adaptadas a colonizar
estes lugares perturbados. Com um nível moderado de perturbação, uma comunidade se torna
um mosaico de fragmentos de hábitats em diferentes estágios de sucessão, abrigando uma
completa variedade de espécies características de uma sere sucessional (Ricklefs 2003). A
abundância de espécies de aves em fragmentos florestais aumenta rapidamente após o
isolamento, porém em números menores que obtidos previamente em florestas contínuas
(Hagan et al. 1996).
Nesse sentido, o presente trabalho teve como objetivos (1) determinar a riqueza de
aves em uma área perturbada no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN) e
entorno, e (2) comparar os dados obtidos com o levantamento realizado para o mesmo grupo
em área não-perturbada da mesma localidade.
Material e Métodos
O levantamento da avifauna foi realizado em áreas alteradas localizadas nas
proximidades do alojamento e da entrada do Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (GO)
e ao longo de 2 Km da estrada de acesso à cidade de Caldas Novas, no dia 26 de outubro de
2005, no período de 06:00 às 09:00h.
A identificação foi por observação direta, com o auxílio de binóculos e/ou por
distinção das vocalizações. Para cada indivíduo foi registrado o horário, espécie, família,
60
guilda trófica e comportamento realizado no instante. Foram utilizados para a identificação e
caracterização das espécies os guias de Frish (1981) e Souza (1998).
A partir dos dados obtidos foi realizada uma comparação com a riqueza de avifauna
obtida em áreas não-perturbadas do PESCAN realizado no dia anterior por outro grupo sob
orientação da Dra. Celine de Melo. As análises foram realizadas análises com χ2 para testar as
diferenças entre as duas áreas.
Resultados e Discussão
Neste estudo foram registradas 40 espécies de aves pertencentes a 21 famílias (Tabela
1), enquanto que a área conservada do PESCAN apresentou 31 espécies e 18 famílias.
A similaridade de Sorensen determinada entre as duas áreas foi de 0,45 (45%). Este
valor pode estar subestimado devido ao fato de que alguns trechos amostrados serem
próximos e também pelo pouco tempo de observação.
Observando a figura 1, podemos inferir que a riqueza da avifauna, diminuiu conforme
aumentou a distância da sede em direção à área de pastagem, independentemente do horário.
Isto possivelmente deve-se a fatores como proximidade de algumas áreas amostradas, baixa
disponibilidade de recurso alimentares em um período de transição estacional e aos efeitos de
borda e de heterogeneidade ambiental (Silva, 1992). Um exemplo que pode ser citado é da
espécie tipicamente florestal, Lepidocolaptes angustirostris, observada forrageando em áreas
abertas nos arredores da sede do PESCAN. Este fato também foi verificado para Momotus
momota registradas para bordas de fragmento de cerradão e mata galeria, ambos localizados
ao longo da trilha.
Figura 1: Distribuição da riqueza de espécies de aves amostradas de acordo com o tempo e
locais visitados (sede, borda de mata de galeria e cerradão e pastagem).
0
2
4
6
8
10
12
14
06:00 -06:30
06:30 -07:00
07:00 -07:30
07:30 -08:00
08:00 -08:30
08:30 -09:00
Horário de atividade
Riq
ueza
61
Tabela 1. Lista das espécies de aves encontradas em áreas da sede do PESCAN e entorno com
suas respectivas guildas tróficas.
Família Espécie
Hábito
alimentar
Accipitridae Ictinia plumbea carnívoro
Elanus leucurus carnívoro
Cariamidae Cariama cristata insetívoro
Cathartidae Cathartes aurea detritívoro
Coragyps atratus detritívoro
Columbidae Scardafella squammata onívoro
Columbina talpacoti onívoro
Columba cayenensis onívoro
não identificada onívoro
Cuculidae Crotophaga ani insetívoro
Piaya cayana insetívoro
Dendrocolapitidae Lepidocolaptes angustirostris insetívoro
Emberezidae Coryphospingus cucullatus granívoro
Falconidae Polyborus plancus carnívoro
Milvago chimachima carnívoro
Fringillidae Sporophila nigricollis granívoro
Volatinia jacarina granívoro
Caryothraustes canadensis granívoro
Saltator atricollis granívoro
Sporophila lineola granívoro
Furnaridae Furnarius rufus insetívoro
Hirundinidae Phaeprogne tapera insetívoro
Momotidae Momotus momota insetívoro
Parulidae Coereba flaveola nectarívoro
Basileuterus hipoleucus insetívoro
Psittacidae Amazona aestiva frugívoro
Aratinga aurea frugívoro
Thraupidae Tersina viridis frugívoro
Tangara cayana frugívoro
62
Euphonia chlorotica frugívoro
Thraupis sayaca frugívoro
Threskiornithidae Mesembrinibis cayennensis onívoro
Troglodytidae Thryothorus leucotis insetívoro
Turdidae Turdus amaurochalinus onívoro
Turdus leucomelas onívoro
Tyrannidae Pitangus sulphuratus insetívoro
Suiriri suiriri insetívoro
Elaenia sp. insetívoro
Tytonidade Speotyto cunicularia carnívoro
Vireonidae Cyclarhis guianensis frugívoro
A maioria das atividades estava relacionada com pouso, forrageio e vôo,
respectivamente. A interação agonística foi verificada entre um casal de Ictinia plumbea sobre
Polyborus plancus quando este forrageava sobre o território da primeira espécie (Figura 2).
05
10152025
AgonísticaDe fesa
Forrage io
Pouso vôo
Tipo de atividade
N
Figura 2. Atividades registradas para as espécies de aves amostradas em áreas não
preservadas no entorno e sede do PESCAN.
Em relação à comparação de guildas entre as áreas conservadas e alteradas, constatou-
se que não houve diferença estatisticamente significativa (X2(6)= 5,48 p>0,05). Houve uma
maior porcentagem de carnívoros na área conservada e de granívoros na área não conservada.
Primeiramente, os carnívoros (falconiformes) são topos de cadeia e sensíveis à ambiente
degradados, por isso, ocorreram menos nas áreas degradadas, enquanto que as espécies de
63
granívoros foram melhor representadas nas imediações da sede pela grande oferta de
sementes de gramíneas (figura 3).
Foi verificado várias espécies de aves se alimentando de frutos de Cecropia sp., uma
espécie tipicamente quiroptocórica, nas imediações da sede do PESCAN. Neste mesmo local,
os jardins existentes também ofereceram uma disponibilidade de recursos significativos para
atrair aves que normalmente se alimentam de frutos provenientes de áreas conservadas do
PESCAN.
0,05,0
10,015,020,025,030,035,0
carni
voro
detrit
ivoro
frugiv
oro
graniv
oro
inseti
voro
necta
rivoro
onivo
ro
Hábito alimentar
Porc
enta
gem
% Áreaalterada
% Áreaconservada
Figura 2. Guildas alimentares das espécies amostradas em duas áreas no PESCAN: área
alterada (sede do PESCAN e entorno) e área não alterada (áreas preservadas no
PESCAN).
Referências Bibliográficas
BEGON, M. 1990. Ecology- Individuals, Populations and Communities. Blackwell Scientific
Publishes: London.
CBRO.2003. Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos, São Paulo. Disponível em
<http//www.ib.usp.br/cbro>. Acessado em 16/10/2005.
Frish, J.D. 1981. Aves brasileiras. Dalgas-Ecoltec Ecologia Técnica: São Paulo. 353p.
HAGAN, J.M., HALGAN, W.M.V. & MCKINLEY, P.S. 1996. The early development of
forest fragmentation effect on birds. Conservation Biology, 10:188-202.
IUCN, 2004. 2004 IUCN red listo f threatened species. IUCN Species Survival Commission,
Gland, Suíça e Cambridge, Reino Unido. Disponível em: <http//www.redlist.org>.
Acessado em 16/10/2005.
64
NATURESERVE. 2004. InfoNatura: birds, mammals and amphibians of Latin American
(Web application). Versão 3.2. Arlington, Virgínia. Disponível em <
http//www.natureserve.org.infonatura>.
RICKLEFS, R. E. 2003. A Economia da Natureza. 5 ed. Editora Guanabara Koogan: Rio de
Janeiro.
SOUZA, D. 1998. Todas as aves do Brasil. Editora DALL: Feira de Santana, BA. 239p.
65
VISITANTES FLORAIS EM MANCHAS DE Vellozia sp.
Alan Nilo, Fabrício Alvim, Paulo Teodoro, Rodrigo Alves, Rosely Ferreira & Vanessa Ramos Orientador: Solange C. Augusto
Introdução
Respostas no comportamento de forrageamento de polinizadores são dependentes das
características da planta (recurso), como padrão de fenologia, arquitetura, abundância e
distribuição local, dentre outras (Strong et al., 1984). Diversos estudos têm demonstrado que
os polinizadores tendem a se concentrar em manchas de habitat que lhe rendam mais recursos
(Krebs & Davies, 1984). O tamanho da mancha está diretamente relacionado com a riqueza
de polinizadores em escala local, uma vez que manchas maiores representariam maior
quantidade de recursos florais. Assim, a abundância de flores nas manchas funcionaria como
um indicador da disponibilidade de recursos, na medida em que quanto maior o tamanho da
mancha maior seria a riqueza de polinizadores associados (Strong et al., 1984; Landau et al.,
1998).
Espécies do gênero Vellozia são monocotiledôneas, sub-arbustivas com folhas
congestas no ápice, caule formado por restos de bainha, o que caracteriza um aspecto
semelhante a canela-de-ema. Possuem flores trímeras, hermafroditas, com ovário ínfero, seis
tépalas atrativas, grande número de estames com anteras de deiscência rimosa, néctar
produzido por nectários septais e liberado no ápice do ovário. A floração é explosiva e
imprevisível que pode se repetir em diferentes episódios ao longo do ano. Segundo Ribeiro &
Walter (1998) as espécies do gênero Vellozia são comuns em áreas de cerrado sensu stricto do
Brasil Central. No entanto, estudos sobre aspectos biológicos das espécies do gênero Vellozia
são raros, especialmente no que diz respeito à polinização e padrões dos visitantes florais.
Vellozia sp. é uma espécie comum em certas áreas de cerrado do Parque Estadual da
Serra de Caldas Novas (PESCAN). Observações de campo revelaram sua distribuição em
forma de manchas, de tamanhos variados, onde os indivíduos florescem de forma sincrônica
em curto período do ano (início da estação chuvosa). Segundo a hipótese de concentração de
recursos (Root, 1973 apud Landau et al., 1998) seria esperada uma maior concentração de
polinizadores em manchas de Vellozia sp. de maiores tamanhos. Além disso, pelas
características de sua flor e fenologia de floração (explosiva e efêmera), acredita-se que essa
espécie seja atrativa para abelhas e principalmente abelhas eussociais. Desta forma, este
66
trabalho teve como objetivo observar a freqüência e a riqueza de visitantes florais e potenciais
polinizadores em manchas de Vellozia sp. de diferentes tamanhos no PESCAN.
Metodologia
O presente estudo foi desenvolvido no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas
(PESCAN), localizado entre os municípios de Caldas Novas e Rio Quente, no sudoeste do
Estado de Goiás, a 180Km da capital Goiânia (Silva et al., 2002).
A coleta dos dados foi realizada no dia 27 de outubro de 2005, durante o período
matutino, entre 7h00 e 10h30. Foram selecionadas três manchas de Vellozia sp. de diferentes
tamanhos: uma grande (1566 m2), uma menor (155 m2) e uma área onde as plantas se
encontravam dispersas e praticamente isoladas. Nas manchas maior e menor foi traçado
aleatoriamente um transecto de cinco metros, sendo contadas as flores que se encontravam
dentro de até dois metros de distância para cada lado do transecto.
Foi observado quais os visitantes florais, o seu comportamento e a freqüência de
visitação nas flores. De acordo com os padrões de visitação o animal foi classificado como
polinizador efetivo ou ocasional e como pilhador (de néctar ou pólen). Para ser classificado
como polinizador efetivo, o visitante deveria tocar o estigma todas as vezes que pousasse no
órgão reprodutivo da planta. Aquele que retirasse o recurso e algumas vezes possibilitasse ao
grão de pólen atingir o estigma foi classificado como polinizador ocasional. Já como pilhador
foi caracterizado o visitante que retirasse o atrativo floral e não polinizasse.
Resultados e discussão
Ao longo das três horas de visualização foram registradas 14 espécies de insetos nas
flores de Vellozia sp., sendo 12 na mancha grande, oito na pequena e apenas cinco na isolada.
Destas, quatro espécies (um curculionídeo e três ortópteros) foram consideradas predadoras
de partes florais como anteras e pétalas, tendo sido registradas nas três manchas. Como
visitantes florais, consideramos apenas as espécies que provavelmente estariam sendo atraídas
por néctar ou pólen, representados aqui pelas ordens Hymenoptera e Lepidoptera (Tabela 1).
67
Tabela 1 – Lista de visitantes florais em Vellozia sp.
Mancha
Ordem
Espécie Grande Pequena Isolada
Ação
Hymenoptera Bombus atratus X X X Polinizador efetivo
Angochlora sp. X - - Polinizador ocasional
Apis melifera Linnaeus X X X Polinizador ocasional
Friesiomelita sp X X X Polinizador ocasional
sp1 (vespa-negra) X X - Pilhador de néctar
sp2 (vespa-amarela) X - - Pilhador de néctar
sp3 (vespa-vermelha) X - - Pilhador de néctar
Lepidoptera sp1 (borboleta-cinza) X X X Pilhador de néctar
sp2 (borboleta-preta) X - - Pilhador de néctar
Total 9 5 4
Conforme esperado, nas três manchas as espécies de abelhas eussociais Apis melifera,
Frisiomelita sp. e Bombus atratus corresponderam juntas a mais de 90% dos visitantes florais
(S.C Augusto, comun. pessoal). Isto demonstra que a planta estudada é melitófila e, pelo
comportamento exibido pelos visitantes registrados, é bastante provável que apenas Bombus
atratus seja polinizador efetivo dessa espécie. É interessante notar que todas as espécies de
abelhas registradas aqui são eussociais. A capacidade de recrutamento também favorece a
exploração desse tipo de recurso oferecido com a floração explosiva de Vellozia sp. A partir
disso, podemos levantar uma outra questão interessante sobre a possibilidade de Bombus
atratus também realizar recrutamento, o que ainda não foi registrado.
Quanto aos visitantes florais (Hymenoptera e Lepidoptera), foi observada uma maior
freqüência na mancha de maior tamanho (Figura 1), sendo este resultado condizente com a
hipótese inicial. Isso pode ser explicado pela distribuição espacial de recursos (plantas com
flores) para os visitantes, pois nas manchas maiores, há maior quantidade e densidade de
flores (3,6 flores/m²) e consequentemente de atrativos (pólen e néctar) que nas manchas
menores (2,9 flores/m²) e com flores isoladas.
Com o aumento da temperatura e com a diminuição da umidade, ocorreu um ligeiro
declínio da freqüência de visitação, havendo um padrão semelhante para as três manchas
(Figura 2). Esse resultado também condiz com o esperado, pois os visitantes florais
registrados para Vellozia sp. são todos organismos sensíveis às variações de temperatura e
68
umidade. Em síntese, os resultados sustentaram a hipótese de que manchas maiores possuem
maior quantidade de recursos para seus visitantes, sendo assim mais atrativas. No caso dos
insetos, os resultados mostraram ainda que a freqüência dos visitantes florais em Vellozia sp.
está diretamente relacionada com as variações de temperatura e umidade.
Figura 1 – Frequência acumulada de visitas segundo a distribuição espacial de
indivíduo de Vellozia sp (considerando apenas as ordens Hymenoptera e Lepidoptera).
Figura 2. Freqüência de visitantes florais em Vellozia sp., segundo o tamanho da
mancha de recursos, temperatura e umidade nos três períodos de observação.
0
50
100
150
200
250
Mancha grande
Mancha pequena
Mancha isolada
Freq
üênc
ia a
cum
ulad
a de
vis
itas
0
20
40
60
80
100
120
140
7h30-8h30 8h31-9h30 9h31-10h30
Horário
Freq
uênc
ia d
e vi
sita
s
0
10
20
30
40
50
60
Tem
pera
tura
(ºC
)/um
idad
e
MG MP I temp umi
69
Referências bibliográficas
STRONG, D.R.; LAWTON, J.H. & SOTHWOOD, T.R.E. 1984. Insects on plants:
community patterns and mechanisms. Blackwell Scientific Publications, Oxford.
KREBS, J.R. & DAVIES, N.B. 1984. Behavioural ecology: an evolutionary approach. 2nd
edition. Sinauer Associates, Sunderland.
LANDAU, E.C.; GONÇALVES-ALVIM, S.J.; FAGUNDES, M. & FERNANDES, G.W.
1998. Riqueza e abundância de herbívoros em flores de Vellozia nivea (Velloziaceae).
Acta Botanica Brasilica 12: 403-409.
70
DISTRIBUIÇÃO E OFERTA DE RECURSOS FLORAIS DE VELLOZIA SP. EM
UMA ÁREA DE CAMPO RUPESTRE NO PARQUE ESTADUAL DA SERRA DE
CALDAS NOVAS, GO
Ariane Siqueira, Everton T. Pedroso, Ricardo V. Kilca, Marina A. de O. e Silva, Victor H. P. Rodrigues, Wender Faleiro
Orientador: Paulo Eugênio Oliveira
Introdução
As plantas necessitam otimizar as visitas dos polinizadores para transportar seu pólen.
Nesta relação, a planta pode oferecer aos seus polinizadores pequenas quantidades de néctar
por flor, fazendo com que estes visitem o maior número de plantas (Feisinger, 1983).
As plantas diferenciaram e modificaram suas flores de modo a atrair agentes
polinizadores diferentes. Além das especializações florais, as plantas apresentam fenologias
de floração diferenciadas que permitem o uso em comum de um mesmo grupo de
polinizadores (Stiles, 1985).
O néctar é a fonte básica na dieta de polinizadores, sendo composto, principalmente,
por água e açúcares (Endress, 1994). A apresentação de recursos no espaço e no tempo
influencia o comportamento dos visitantes, sua permanência na área e o tamanho da
população que pode sobreviver com aqueles recursos (Wolf et al., 1975).
Vellozia sp. é uma espécie monocotiledônea de hábito herbáceo, que ocorre em solos
rochosos, nos campos ruprestes do cerrado. Apresentam flores hermafroditas de coloração
lilás, que perduram por dois a três dias. As plantas podem apresentar um número variável de
flores, que posuem uma consistência macia sendo muito atrativa para herbívoros (Landau,
1998). Flores de Vellozia, tipicamente melitófilas podem tornar-se ornitófilas por
ajustamentos (Oliveira, 1998).
O presente trabalho traz informações sobre uma população de Vellozia sp. em uma
área de campo rupestre no Parque Estadual da Serra de Caldas e teve como objetivos (1)
determinar o modo como os recursos florais encontram-se distribuídos no espaço; (2)
investigar a variação do volume e concentração de sacarose no néctar produzido por suas
flores ao longo de uma manhã e (3) quantificar a recompensa calórica por flor.
Material e Métodos
Local de estudo: O presente estudo foi desenvolvido no Parque Estadual da Serra de
Caldas Novas (PESCAN) durante o mês de outurbro/2005 em uma área de campo rupestre no
71
platô da serra. As amostragens foram realizadas no período da manhã do dia 27 de outubro de
2005 entre o período das 7h30min às 11h30min.
Delineamento amostral: Foram instalados oito transectos paralelos com 50m de
comprimento distantes aproximadamente 6m. Cada transecto foi dividido em 10 parcelas 5m
x 4m, onde em cada uma destas unidades amostrais, foram quantificados o número de
indivíduos de Vellozia sp. em antese sendo caracterizados visualmente em jovens e velhos
pelo estado de conservação das peças florais e pela quantidade de pólen em suas anteras.
O tipo de distribuição da planta, que está relacionada com o agrupamento de recurso, foi
definido de acordo com a sua ocorrência dentro dos transectos, sendo considerada agrupada
ou não, de acordo com sua distribuição calculada pelo índice de Morisita.
A produção de néctar foi avaliada em flores abertas no período da manhã (05 flores em
cada transecto) e em botões ensacados em pré-antese, medindo o volume de néctar através de
capilares graduados de 10 μl.
A concentração de solutos no néctar foi medida utilizando-se refratômetro de mão. Esta
concentração foi considerada como equivalente de sacarose.
As médias de volume e concentração foram utilizadas para calcular a quantidade de
recompensa em caloria por flor. Para o cálculo de calorias foi usada a tabela de conversão
apresentada por Kearns e Inouye (1993). Para transformar mg de açúcar em calorias foi usada
a relação apresentada por Dafni (1992): 1 mg açúcar= 4 calorias.
Resultados e Discussão
A população de Vellozia sp. avaliada apresentou uma distribuição espacial agregada,
potencializando as chances de visita/polinização e otimizando, assim, o tempo de forrageio de
seus eventuais visitantes (Tabela 1).
Tabela 1. Padrão de distribuição de uma população de Vellozia sp. em área de Campo Rupestre no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
Nº de indivíduos 565 Média 7,06
Desvio padrão 12,37 Variância 153,05
Índice de dispersão 21,67* Qui-Quadrado 1711,95**
Número de parcelas (N) igual a 80; *Índice de dispersão > 1, agrupado; ** Gl = 79; p <0,00001 A avaliação do néctar produzido pelas flores de Vellozia sp. evidenciou uma diminuição
de seu volume ao longo da manhã (Figura 1). O dado obtido para o horário de 10h58min foi
72
um valor atípico, onde apenas uma das 05 flores apresentou néctar, atuando como um outlier
no conjunto de dados.
As flores ensacadas apresentaram um volume de néctar semelhante àqueles encontrados
no início da manhã, mostrando que esse recurso foi sendo consumido ao longo do dia (Figura
1).
Figura 1. Variação do volume de néctar disponível em flores de Vellozia sp. em uma área de Campo Rupestre no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
Com relação à percentagem de sacarose presente no néctar das flores de Vellozia sp. não
foi possível evidenciar uma tendência de variação clara desse parâmetro com o decorrer das
horas (Figura 2). Em algumas amostras, não foi encontrado néctar para mensuração em
nenhuma flor. Já para as flores ensacadas, foi possível constatar que as mesmas apresentaram
em seu néctar cerca de 15 % de sacarose (Figura 2).
A energia média oferecida por cada flor para seus polinizadores pode ser evidenciada na
Figura 3. Houve uma tendência de diminuição da oferta desse recurso com o passar do tempo
(com exceção do caso das 10h58min que mais uma vez atuou como um outlier). Aquelas
flores que permaneceram ensacadas, fora do alcance dos visitantes, apresentaram um valor
médio de oferta de recurso de 0,003 Kcal/flor.
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
08:00 08:20 08:40 08:45 09:10 09:35 09:45 10:58 11:05 Ensac Hora
Vo L ume
73
Figura 2. Variação da concentração de sacarose do néctar disponível em flores de Vellozia sp. em uma área de Campo Rupestre no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
Figura 3. Estimativa da disponibilidade energética por flores de Vellozia sp. em Campo Rupestre no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
A quantidade de energia oferecida pelas flores de Vellozia sp. indica que as mesmas
devem ser visitadas, preferencialmente, por organismos com baixa exigência energética, como
abelhas. Organismos com alta exigência energética, como beija-flores que requerem de 6 a 10
Kcal/dia (Oliveira, 1998), frequentemente optam por recursos mais energéticos, reduzindo,
dessa forma, seu tempo de forrageamento.
0
2
4
6
8
10
12
14
16
08:00 08:20 08:40 08:45 09:10 09:35 09:45 10:58 11:05 Ensac
Hora
S A C A R O S E (%)
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
08:00 08:20 08:40 08:45 09:10 09:35 09:45 10:58 11:05 Ensac
Hora
Cal/flor
74
Referências Bibliográficas
DAFNI, A. 1992. Pollination Ecology: A Practical Approach. Oxford University Press: New
York.
ENDRESS, P. K. 1994. Diversity and Evolutionary Biology of Tropical Flowers. Cambridg
Universiy Press, Cambridge.
FEINSINGER, P. 1983. Coevolution and Pollination. In: Futuyma, D. J. & Slatkin, M. (Eds.).
Coevolution. Sinauer Associates Inc. Sunderland, Massachussets. P. 282-310.
KEARNS, C. A. & INOUYE, D. W. 1993. Techniques for Pollination Biologists. University
Press of Colorado: Colorado.
LANDAU, E. C.; Gonçalves-Alvim, J. S.; Fagundes, M. & Fernandes, G. W. 1998. Riqueza e
abundância de herbivoria em flores de Vellozia nívea. Acta Bot. Bras. 12 (3): 403-409.
OLIVEIRA, G. M. 1998. Disponibilidade de recursos florais para beija-flores no cerrado de
Uberlândia, MG. Universidade de Brasília, Brasília. Dissertação de Mestrado.
STILES, F. G. 1985. Seasonal patterns and coevolutin in the hummingbird-flower community
of a Costa Rica subtropical forest. Ornith. Monogr. 36: 757-787.
WOLF, L. L.; HAINSWORTH, F. R. & GILL, F. B. 1975. Foraging efficiencies and time
budgets in nectar-feeding birds. Ecology, 56: 117-128.
75
DISPONIBILIDADE DE RECURSOS E COMPORTAMENTO DE
FORRAGEAMENTO DE BEIJA-FLORES EM Palicourea rigida (RUBIACEAE) EM
UMA ÁREA DE CERRADO
Adnilton Fonseca da Costa, Adriana de Oliveira Machado, André de Sousa Jorge, Frederico Gemesio Lemos & Pablo de Oliveira Pegorari
Orientador: Paulo Eugênio de Oliveira
Introdução
As interações entre polinizadores e as flores que esses visitam, são de grande
importância para muitas espécies vegetais realizarem sua reprodução sexuada. No mutualismo
ecológico entre estes organismos está envolvido um elemento de conflito. As plantas
necessitam otimizar as visitas dos polinizadores para contactar o maior número de anteras e
estigmas e consequentemente transportar pólen. Para tanto, podem forçar os animais a visitar
muitos indivíduos, oferecendo pequenas quantidades de néctar por flor e/ou planta. Por outro
lado, os animais buscam obter o máximo de carboidratos e outros recursos com o mínimo de
movimento (Feinsinger, 1983).
O Cerrado abriga uma elevada quantidade de plantas que produzem néctar como
recompensa floral aos polinizadores, sendo grande parte das plantas ornitófilas (Barbosa,
1997). Tais plantas possuem grande quantidade de néctar, geralmente pouco concentrado e
com baixa viscosidade, porém com pouco odor, uma vez que aves possuem um faro restrito.
Logo, essas flores possuem flores vermelhas ou amarelas, grandes ou em inflorescência, ou
seja, fatores que provavelmente estão à acuidade visual das aves (Raven et al., 1999).
Beija-flores têm uma dieta baseada principalmente no consumo de néctar, o qual é
composto por sacarose, aminoácidos, lipídeos e polissacarídeos, sendo pouco viscoso. Essa
dieta é ainda complementada por pequenos invertebrados, os quais garantem o suprimento de
aminoácidos e outros compostos indispensáveis para o metabolismo (Baker & Baker, 1980).
De acordo com Silberbauer-Gottsberger & Gottsberger (1998), beija-flores podem ser tanto
trap-liners (com uma rota específica de forageo) quanto territorialistas (defendendo recursos),
além disso, essas aves diminuem sua atividade nos períodos mais quentes do dia.
A Palicourea rigida (Rubiaceae) é uma planta típica de cerrado que é polinizada por
beija-flores e abelhas grandes. Ela produz flores com corola tubular, de até 2cm de
comprimento, reunidas em uma inflorescência, de coloração vermelho-amarelada. Possui
período de floração entre setembro e março. Suas populações apresentam média de 21 a 34
árvores/hectare (Silva-Junior, 2005).
76
Assim, os objetivos deste trabalho foram avaliar a disponibilidade e a distribuição de
recursos (flores abertas) oferecidos por Palicourea rigida por unidade de área e estudar o
comportamento de beija-flores em relação à disponibilidade de recursos.
Materiais e métodos
O estudo foi realizado no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN) no
estado de Goiás, no mês de outubro de 2005. Foram utilizadas duas áreas de cerrado (sensu
stricto) situadas no platô da serra, distantes 1 km uma da outra. A espécie escolhida para
estudo foi a Palicourea rigida (Rubiaceae). Nestas áreas foram selecionados 30 indivíduos
com flores abertas de acordo com o método das distâncias mínimas (registrava-se um
indivíduo e em seguida, o indivíduo mais próximo à ele). De cada indivíduo estimou-se sua
medida de altura, número de flores abertas e coordenadas geográficas (através do sistema de
posicionamento global -GPS). A partir das coordenadas geográficas foi calculada a distância
entre os indivíduos em graus utilizando-se da fórmula: Distância = raiz quadrada
[(longitude1-longitude2)2 + (latitude1 – latitude2)2]. As medidas de distância obtidas em
graus foram transformadas para metros, calculando-se qual a distância em graus de cinqüenta
metros e em seguida aplicando-se uma regra de três para cada indivíduo. Foi calculada a
distância média entre os indivíduos em metros e a variância. A forma de distribuição dos
indivíduos foi analisada pelo índice de dispersão (índice de dispersão = variância/média). A
significância do índice de dispersão foi testada por Qui-quadrado. Calculou-se o número de
indivíduos por hectare, a partir da área média por indivíduo: área média por indivíduo =
(distância média)2. Foi calculado o número médio de flores por indivíduo e a variância. A
forma de distribuição das flores entre os indivíduos foi analisada pelo índice de dispersão.
Calculou-se o número médio de flores por hectare e a oferta de recursos em calorias/hectare.
Em seguida foram feitas observações comportamentais dos visitantes florais. Tais
observações foram subdivididas em quatro sessões de 15 minutos, com intervalo de 5 minutos
entre elas para descanso do observador no período de 10:00h às 11:15h. Foram observadas
seis manchas, sendo duas naturalmente ricas em recurso (mais de 80 flores), duas
artificialmente enriquecidas com inflorescências de outros indivíduos e duas naturalmente
pobres (menos de 10 flores). Foi registrado o tipo de visitante, número de visitas à mancha,
número de flores visitadas, a ocorrência de vocalizações, interações agonísticas e
comportamento de vigília (quando o beija-flor permanecia pousado em uma árvore próxima à
mancha).
77
Resultados e discussão
Em ambas as áreas amostradas os indivíduos e flores de Palicourea rigida
apresentaram distribuição agrupada (Tabela 1). Distribuições agrupadas de recurso facilitam a
defensibilidade destes, portanto este tipo de distribuição encontra-se relacionada com
comportamentos territorialistas.
Em uma das áreas o número de indivíduos, flores e calorias por hectare foi maior que
na outra (Tabela 1). A quantidade de recursos disponíveis em uma área é fator determinante
do número de consumidores que esta área pode sustentar. Portanto a área com recursos mais
abundantes provavelmente apresenta um maior número de beija-flores. A necessidade diária
de um beija flor está em torno de 2000 a 6000 calorias. Porém sua dieta não se baseia apenas
no consumo do néctar, mas também na predação de insetos, dado não abordado neste estudo.
Tabela 1. Distribuição dos indivíduos e flores, número de indivíduos, flores e oferta de calorias por hectare em cada uma das áreas analisadas.
Índice de
Dispersão Qui-Quadrado p Distribuição
dos indivíduos Ind/ha
Area1 13,79 385,99 < 0,05 agrupada 28,52 Area2 3,72 104,06 < 0,05 agrupada 119,35 Índice de
Dispersão Distribuição das flores
Flor/ha Caloria/ha
Area1 24,88 agrupada 742,53 5494,71 Area2 49,56 agrupada 2569,98 19017,81
As espécies de beija-flores observadas visitando as inflorescências de Palicourea
rigida foram Amazilia fimbriata e Eupetomena macroura.
Apesar do número de visitas, número total de flores e número de flores visitadas terem
sido maior nas manchas ricas e enriquecidas, a relação entre número de flores visitadas e
número total de flores foi maior nas áreas pobres (Figura 1 e 2). Isso indica que nas áreas
pobres, o número de visitas por flor é maior, o que provavelmente confere maior eficiência de
polinização.
Comportamento de vigília, vocalizações, e interações agonísticas ocorreram apenas
nas manchas ricas e enriquecidas indicando que a oferta de recursos por uma mancha
determina se beija-flores irão adotar ou não comportamento territorialista (Figura 2). Em
manchas onde a oferta de recursos é alta, o gasto de energia empregada para a defesa destes
recursos (vocalizações, vigília, interações agonísticas) é compensado pela possibilidade de
78
alto consumo destes. O mesmo não ocorre em manchas pobres, onde a oferta de recursos não
compensa os gastos em defesa.
O comportamento territorialista dos beija-flores pode ter implicações na reprodução de
Palicourea rigida. A reprodução nesta espécie de planta ocorre apenas por polinização
cruzada. Como beija flores territorialistas monopolizam uma mancha de recursos, a troca de
pólen com outras plantas fica comprometida nesta mancha, o que pode ser negativo para a
reprodução sexuada.
0
50
100
150
200
250
300
Manch
a enri
quec
ida1
Manch
a enri
quec
ida 2
Manch
a rica
1
Manch
a rica
2
Manch
a pob
re 1
Manch
a pob
re 2
Número de flores
Número de floresvisitadas
Porcentagem donúmero de floresvisitadas/Número deflores
Figura1. Número total de flores, número de flores visitadas e a relação entre elas em cada uma das manchas.
79
Figura 2. Número de visitas, comportamento de vigília, vocalizações, e interações agonísticas dos beija-flores em cada uma das manchas.
Baseando-se nestas considerações, o alto investimento da planta na produção de flores
pode parecer ter efeitos negativos para a reprodução sexuada em Palicourea rigida. No
entanto, como neste caso as flores são hermafroditas, a função masculina da planta não pode
ser esquecida. Embora durante o pico da produção de flores o indivíduo talvez produza
poucos frutos, o alto número de flores garante que seu pólen seja disperso para outras plantas.
Referências bibliográficas
BAKER, H. G. & BAKER, I. 1980. Studies of nectar-constitution and pollinator-plant
coevolution. In : Gilbert, L. E. & Raven, P. H. (eds). Coevolution of animals and
plants. University of Texas Press. p. 100-140.
BARBOSA, A. A. A. 1997. Biologia reprodutiva de uma comunidade de campo sujo,
Uberlândia, MG. Tese de Doutorado. UNICAMP. Campinas. SP.
FEISINGER, P. 1983. Coevolution and pollination. In: Futuyma, D. J. & Slatkin, M. (eds).
Coevolution. Sinauer Asociates Inc. Sunderlands, Massachusettes. p. 282-310
RAVEN, P.H.; EVERT, R. F.; EICHHORN, S. E.. 1999. Biology of plants. 6th ed. W. H.
Freeman and company, New York. 944 p.
0
5
10
15
20
25
30
Manch
a Enri
quec
ida1
Manch
a Enri
quec
ida2
Manch
a Rica
1
Manch
a Rica
2
Manch
a Pob
re1
Manch
a Pob
re2
VisitasVigíliaVocalizaçãoInteração Agonística
80
SILBERBAUER-GOTTSBERGER, I. & GOTTSBERGER, G. 1998. A polinização das
plantas do cerrado. Revta. Brasil. Biol. 48:651-663.
SILVA-JUNIOR, M. C. 2005. 100 Árvores do Cerrado. Ed. Rede de sementes do Cerrado.
Brasília. DF. p. 278.
81
Distribuição espacial de Stryphnodendron polyphyllum Mart. em área de cerrado sensu
stricto no PESCAN – Caldas Novas – GO
Adnilton Fonseca da Costa
Introdução
A distribuição geográfica das populações é determinada pelos ambientes
ecologicamente adequados para que elas aí possam existir. A extensão da distribuição de uma
população é determinada pela presença ou ausência desses habitats adequados, de espécies
competidoras, organismos patogênicos e barreiras à dispersão, incluindo todos os locais que
seus membros ocupam durante o seu ciclo de vida. Fatores como o clima, a topografia,
química e a textura do solo, exercem influência sobre essa distribuição (Nascimento et al.
2002).
A distribuição espacial dos indivíduos de uma população, em um dado habitat, descreve
o espaçamento existente entre os mesmos e apresenta padrões que variam de uma distribuição
mais agrupada, onde esses indivíduos se encontram muito próximos uns dos outros; passando
por uma distribuição aleatória, em que estão distribuídos randomicamente, até distribuições
uniformes, estando separados uns dos outros por espaçamentos mais ou menos semelhantes.
(Ricklefs, 2003). Esses padrões de distribuição espacial, em nível de comunidade, ou
população sofrem influência de uma série de fatores, tais como: ventos, correntes de água,
intensidade de iluminação, condições edáficas, competição, herbivoria, reprodução vegetativa,
dispersão de sementes, etc (Ludwig & Reynolds 1988).
O padrão espacial de plantas é uma importante característica de comunidades
ecológicas. Essa é geralmente a primeira observação quando da análise de comunidades,
sendo propriedade fundamental em qualquer grupo de organismos vivos (Ludwig & Reynolds
1988). O principal objetivo da detecção de padrões espaciais é gerar hipóteses a respeito da
sua estrutura ecológica (Nascimento et al. 2002).
O gênero Stryphnodendron é amplamente utilizado pela população humana,
principalmente na região do Cerrado, onde é conhecida vulgarmente como barbatimão e sua
freqüência é particularmente notável. Destacam-se pelas suas propriedades medicinais, devido
à alta concentração de tanino em sua casca. Aplica-se também ao curtimento de couro e na
fabricação de tintas de escrever (Corrêa, 1978).
Vários estudos sobre espécies do gênero Stryphnodendron têm sido realizados, voltados
principalmente ao entendimento de suas propriedades fisiológicas e fitofarmacológicas
82
(Jacobson, 2003). Mas no que se refere a características ecológicas e seu comportamento no
ambiente natural, pouco se conhece.
Alguns trabalhos relatam a relação de Stryphnodendron polyphyllum com visitantes
florais, notadamente com a espécie Apis mellifera, sobre a qual o pólen da planta parece ter
efeitos negativos, reduzindo a taxa de recrutamento das abelhas (Carvalho, 1998). Mas
estudos sobre comportamento de populações, para essa espécie, são desconhecidos.
Esse trabalho analisa a distribuição espacial de Stryphnodendron polyphyllum em uma
área de cerrado sensu stricto no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas – GO, e visa
subsidiar informações à cerca de suas características no padrão de distribuição espacial em
ambiente natural.
Material e métodos
O Estudo foi realizado no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN),
situado entre os municípios de Rio Quente e Caldas Novas no Estado de Goiás. Foi escolhida
uma mancha de cerrado sensu stricto de aproximadamente 3 hectares, circundada por
diferentes fitofisionomias (mata de galeria, cerradão e campo rupestre), próxima à trilha da
Cascatinha (17º46’S, 48º39’W). A vegetação está estabelecida sobre solo do tipo Latossolo
Vermelho-Amarelo em altitude de aproximadamente 750 m e declividade suave.
Demarcou-se um transecto de 400 m de comprimento em direção leste-oeste, paralelo à
mata de galeria do Riacho da Cascatinha. A cada 5 m do transecto, estabelecia-se uma parcela
de 4 x 5 m. O número de indivíduos de Stryphnodendron polyphyllum foi registrado em cada
parcela.
As parcelas dispostas ao longo do transecto tiveram sua distribuição espacial testadas
por Métodos de Variância de Quadrados (MQV). Os MQVs avaliam as mudanças na média e
variância do número de indivíduos por unidade amostral, promovendo combinações de
amostras; ou seja, variando o tamanho ou espaçamento das parcelas combinadas (blocos)
(Machado-Filho et al., 2005).
A partir desses testes são gerados gráficos de variância por tamanho ou afastamento de
blocos, gerando uma curva que representa a distribuição dos indivíduos. Assim, a ausência de
picos (linha reta paralela ao eixo x) refere-se à distribuição uniforme, e a presença, à
distribuição agrupada. Para esta análise, utilizou-se o Programa Programs for Ecology
methodology, 2nd ed., usando-se o teste da variância móvel entre blocos (TTLQV).
83
Resultados e Discussão
A análise do TTLQV mostrou suaves picos de variância para os tamanhos de bloco 4 e
10 para na linha de parcelas (figura 1). Estes tamanhos de bloco indicam ocorrência de
discretos agrupamentos às distâncias de 40 e 100 m, em um total de 80 parcelas em 400m.
Esses resultados indicam um padrão de agrupamento de baixa intensidade, revelando
grupos pouco definidos (Ludwig & Reynolds, 1998).
Em análise da distribuição espacial de Vellozia squamata na Fazenda Água Limpa – DF,
Machado-Filho et al. (2005) encontram padrões de distribuição bem evidentes, com altos
picos de variância, corroborando o padrão de distribuição da espécie, nitidamente agrupado.
O padrão de distribuição espacial agrupado ocorre devido a fatores bióticos, tais como
dispersão de propágulos a curta distância e estabelecimento de indivíduos novos próximos à
planta-mãe e a regeneração vegetativa (Westlaken & Maun, 1985). Indivíduos jovens,
estabelecidos próximos a adultos, foram observados durante o levantamento de dados, mas
não há evidência de reprodução vegetativa, no campo, para Stryphnodendron polyphyllum.
Fatores edáficos e físicos, como ocorrência de locais favoráveis ao estabelecimento e
desenvolvimento de plântulas podem está influenciando a distribuição espacial local da
espécie.
Referências bibliográficas
Carvalho, A.C.P de. 1998. Pólen de Stryphnodendron polyphyllum como agente causador da
cria ensacada brasileira. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Viçosa,
Viçosa – MG
Corrêa, M.P. 1978. Dicionário das plantas úteis do Brasil e das Exóticas Cultivadas. 6 ed.
Imprensa Nacional, Rio de janeiro.
Jacobson, T.K.B. 2003. Influência das características edáficas na produção de fenóis totais e
taninos em duas espécies de barbatimão. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal
deGoiás, Goiânia.
Ludwig, J.A. & Reynolds, J.F. Statistical ecology. New York, USA, 296p. 1988.
Machado-Filho, R.A.N., Oliveira, F.F., Anjos, H.O. dos, Dias, R.I.S.C., Andreozzi, M.M.,
Steinke, V.A. & Pinha, P.R.S. 2005. Distribuição espacial de Vellozia squamata Pohl.
(Velloziaceae) em área de cerrado sensu stricto na Fazenda Água Limpa, Brasília (DF).
Universidade de Brasília, Programa de Pós-Graduação em Ecologia, Relatório da
disciplina Ecologia de Populações.
84
Nascimento, N.A.; Carvalho, J.O.P.; Leão, N.V.M. Distribuição Espacial de espécies
Arbóreas Relacionadas ao Manejo de Florestas naturais. Ciência Agrária, n. 37. 2002.
Ricklefs, R.E. 2003. A Economia da Natureza. Guanabara Koogan, 5ª edição, Rio de Janeiro.
503p.
Westlaken, I.L.; Maun, M.A. 1985. Reproductive capacity, germination and survivorship
Lithospermum caroliniense on Lake Huron sand dunes. Oecologia 66 (2): 238-245.
02468
1012141618
0 5 10 15 20 25
tamanho dos blocos
vari
ânci
a
Fig. 1 - Variância do número de indivíduos de Stryphnodendron polyphyllum
observados pelo arranjo de parcelas em blocos, em área de cerrado sensu stricto no
PESCAN, Caldas Novas – GO, segundo o método TTLQV.
85
Variações florais de Palicourea rigida Kunt. (Rubiaceae) no Parque Estadual da
Serra de Caldas Novas, Goiás.
Adriana de Oliveira Machado
Introdução
Heterostilia é um tipo de polimorfismo floral geneticamente controlado e encontrado
em aproximadamente 28 famílias de Angiospermas, sendo interpretado como um mecanismo
que promove a polinização cruzada (Barrett et al. 2000, Li & Johnston 2001). Plantas
distílicas são distinguidas por apresentarem indivíduos cujas flores possuem estiletes longos e
estames curtos (flores longistilas) e indivíduos com flores de estiletes curtos e estames longos
(flores brevistilas) (Ganders 1979).
A hercogamia recíproca poderia efetivamente reduzir a autopolinização e a
polinização intramorfos, enquanto promove o fluxo de pólen entre-morfos florais, porque os
polinizadores tendem a carregar pólen dos dois morfos em partes diferentes do corpo
(Ganders, 1974; Darwin, 1877; Lloyd & Webb, 1992).
As diferenças entre os morfos florais envolvem primariamente estigmas e grãos-de-
pólen, sendo característica para cada espécie (Dulberger, 1992). Além das características
morfológicas de anteras e estiletes, as flores de espécies distílicas podem ainda apresentar
diferenças na morfologia e/ou dimensões da corola; exina, quantidade e/ou tamanho dos
grãos-de-pólen; quantidade e concentração de néctar, entre outras (Passos & Sazima 1995).
Ornelas et al. (2004) encontrou para P. padifolia uma maior quantidade de néctar
produzido por flores longistilas que para flores brevistilas, e em um experimento de
laboratório, Lau & Bosque (2003) verificou que os beija-flores transportam maior quantidade
de pólen das flores longistilas para as brevistilas em P. fendleri.
Com cerca de 637 gêneros e 10.700 espécies essencialmente tropicais (Mabberley,
1987), a família Rubiaceae contém o maior número de espécies distílicas dentre todas as
famílias nas quais é conhecida a heterostilia, sendo encontrada em 416 espécies distribuídas
em 91 gêneros (Ganders 1979, Barrett & Richards 1990).
O gênero Palicourea Aubl., amplamente distribuído nos trópicos americanos, inclui
cerca de 250 espécies de arbustos e pequenas árvores. É tipicamente encontrado nos sub-
bosques e sub-dossel. Suas flores são geralmente tubulares, coloridas e sem odor, e são
polinizadas por beija-flores. A heterostilia parece ser condição ancestral para o gênero (Taylor
1993, Mabberley 1987).
86
Palicourea rigida Kunt., popularmente conhecida como “bate-caixa”, “gritadeira”,
“douradinha”, “douradão”, ”erva de rato” e “erva matadeira”, são arvoretas com copa formada
por ramos terminais suberosos, tronco com até 13 cm de diâmetro, ritidoma com fissuras
profundas e cristas elevadas descontínuas formando blocos retangulares. As folhas são
simples, opostas cruzadas e elípticas, rígido-coriáceas e discolores. As flores são pentâmeras,
vermelho-amareladas, tubulares, medindo em torno de 2 cm de comprimento (Silva Júnior
2005), apresentando heterostilia do tipo distilia.
Ocorre nos cerrados (sentido restrito) e nos cerradões do Brasil central. Sempre-verde,
produz flores ao longo de vários meses, concentrada entre setembro e março, e a frutificação
se concentra na estação chuvosa. A polinização é feita por beija-flores e abelhas grandes
(Silva júnior, 2005). Possui crescimento sazonal modular.
Dadas as diferenças florais em P. rigida, poderia haver diferenças também em outras
características relativas à atratividade de polinizadores como quantidade e concentração de
néctar e/ou tamanho das flores. E ainda, devido à maior exposição do estigma nas flores
longistilas, poderia haver uma maior quantidade de grãos-de-pólen depositados nestes, dando
a estas flores uma possível função feminina.
O objetivo deste trabalho foi avaliar possíveis diferenças no tamanho das flores, na
quantidade de néctar e concentração de equivalentes de sacarose deste; e na quantidade de
pólen germinando nos estigmas dos diferentes morfos de uma população de P. rigida em
Caldas Novas, Goiás.
Material e métodos
O trabalho foi realizado numa área de cerrado (senso estrito) do Parque Estadual da
Serra de Caldas Novas (17º47’S, 48º40’O), entre os dias 30 de outubro e 3 de novembro de
2005.
Foram obtidas medidas de comprimento e diâmetro das flores, volume e concentração
de néctar. Tais medidas foram feitas em cinco flores de dez indivíduos de cada morfo,
totalizando 50 flores brevistilas e 50 longistilas. As medidas de comprimento e tamanho
foram feitas com um paquímetro. Micropipetas graduadas de vidro foram utilizadas para
extração e obtenção das medidas de volume de néctar, e a sua concentração foi obtida por
meio de um refratômetro.
Flores dos dois morfos foram coletadas e fixadas em álcool 70º no final de cada dia
para análise da quantidade de tubos polínicos formados por polinização natural através da
técnica de microscopia de fluorescência de Martin (1959) (N= 30). Para tal, adotou-se quatro
87
categorias de quantidade de grãos-de-pólen com germinação de tubos polínicos; 1 (ausência),
2 (1-10 grãos), 3 (11-50 grãos) e 4 (mais de 50 grãos).
Para avaliar a existência de diferença entre as médias de cada conjunto de dados, foi
aplicado o teste t, para volume e concentração de néctar. Para os dados de comprimento e
diâmetro das flores foi feito o teste U de Mann-Whitney, e para as quantidades de tubos
polínicos, foi feita a porcentagem de grãos-de-pólen germinando nas duas categorias (3 e 4)
em que se apresentaram.
As análises estatísticas foram feitas através do programa Systat 8.0.
Resultados
As flores brevistilas se apresentaram significativamente maiores em comprimento que
as longistilas (U= 782,50; p<0,05), porém elas não diferiram no diâmetro da corola (U=
1239,00; p>0,05). A quantidade de néctar produzido não diferiu significativamente entre as
flores dos dois morfos (t= -1,32; p>0,05), porém as longistilas tiveram néctar mais
concentrado que as brevistilas (t= 3,51; p<0,05) (Tabela 1).
Tabela 1. Variáveis investigadas em flores brevistilas e longistilas de P. rigida. (Média +
Desvio Padrão).
Brevistilas Longistilas
X + (DP) X + (DP)
Volume (μL) 7,88 + (4,58) 6,89 + (2,61)
Concentração 20,46 + (2,17) 21,92 + (1,89)
Comprimento (cm) 1,89 + (0,14) 1,83 + (0,09)
Diâmetro (cm) 0,44 + (0,04) 0,45 + (0,05)
A quantidade de grãos-de-pólen se distribuiu nas categorias 3 e 4. As flores longistilas
apresentaram maioria dos seus pistilos (60%) com 11 a 50 grãos-de-pólen germinando, e as
brevistilas apresentaram maioria (86,67%) com mais de 50 grãos (Figura 1).
88
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
1 2
MORFOS
POR
CEN
TAG
EM D
E PI
STIL
OS
CATEGORIA 3CATEGORIA 4
Figura 1. Porcentagem de pistilos com grãos-de-pólen germinando nos estigmas de
flores de P. rigida (Morfo 1- Longistilas, 2- Brevistilas). Categoria 3: 11 a 50 grãos-de-pólen,
categoria 4: mais de 50 grãos-de-pólen.
Discussão
As características diferenciais entre os morfos florais foram referenciadas de uma
forma geral para as espécies heterostílicas, por Vuilleumier (1967), Ganders (1979) e Barrett
(1992), os quais associaram as dimensões dimórficas entre os grãos de pólen, superfície e
papilas estigmáticas nos morfos florais, com o sucesso nos cruzamentos legítimos,
diminuindo ou anulando a possibilidade dos cruzamentos ilegítimos, os quais poderiam
permitir combinações deletérias de genes.
Morfos
Poucas espécies heterostílicas apresentam diferenças, entre os morfos florais, em
relação ao tamanho da corola (Ganders 1979; Hamilton 1990), como foi para Palicourea
rigida, que apresentou variação significativa de comprimento da corola, sendo as brevistilas
em média maiores para a população estudada.
Quanto ao néctar, este variou em relação à concentração de equivalentes de sacarose.
As flores longistilas apresentaram maior concentração de açúcares no néctar, o que não ocorre
com outra Rubiaceae, Psychotria barbiflora, cujas flores longistilas apresentaram maior
volume e menor concentração de néctar numa população estudada no Parque Estadual Dois
89
Irmãos, Recife-PE (Teixeira & Machado, 2004). Maior quantidade de néctar nas flores
longistilas também ocorreu em Palicourea padifolia (Ornelas et al. (2004).
Monteiro et al. (1991) observaram que as plantas com flores longistilas formaram
mais frutos do que as brevistilas, sugerindo uma possível função feminina a estas flores para
Psychotria barbiflora nas populações observadas por eles no cerrado.
Neste estudo não foi possível observar o sucesso de formação de frutos devido ao
curto espaço de tempo, decidiu-se para tanto, verificar a quantidade de tubos polínicos
germinando nos estigmas, o que foi maior em flores brevistilas, o que poderia sugerir uma
possivel maior produção de frutos nos indivíduos brevistilos. Este resultado confrontaria com
a hipótese da função feminina atribuída às flores longistilas, para esta espécie. Essa maior
quantidade de grãos-de-pólen depositado nos estigmas de flores brevistilas poderia, no
entanto, estar ocorrendo devido à maior superfície estigmática dos pistilos destas flores.
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91
Abundância de formigas (Formicidae) e cupins (Isoptera) de solo em área aberta (campo
sujo) e área fechada (mata semi-decídua) no Parque Estadual da Serra de Caldas - GO
Alan Nilo da Costa
Introduçaõ
O Bioma Cerrado se distribui por 2 milhões Km2, aproximadamente 22% do território
brasileiro. Esse bioma é caracterizado por um mosaico de formações vegetais, desde
fisionomias abertas como campos e veredas, a áreas com vegetação densa e fechada como
matas de galeria e matas semi-decíduas (Ribeiro & Walter, 1998). Decorrente das diferenças
de composição e estrutura da vegetação, os ambientes abertos e fechados diferem em muitas
condições físicas, como luminosidade, temperatura, umidade, incidência de fogo e na
sazonalidade dessas condições (Oliveira & Marquis, 2002).
As mudanças nas condições físicas e biológicas entre ambientes, como entre as
fisionomias de cerrado, podem influenciar na fauna de artrópodes que poderão apresentar
maior abundância nos ambientes com condições mais propicias (Buzzi, 2002). Em especial,
formigas e cupins são grupos de artrópodes sensíveis às condições de temperatura e umidade,
apresentando um conjunto de condições ideais para manutenção se suas colônias e de sua
atividade no ambiente (Wilson, 1970). Esses dois grupos de organismos são responsáveis pela
maior parte da biomassa de artrópodes, apresentando uma grande abundância nos ambientes
tropicais (Fittkau & Klinge, 1973).
As diferenças entre ambientes tão distintos como um campo e uma mata, poderia levar
a diferenças nas abundâncias de formigas e cupins que vivem e forrageiam no solo? O
objetivo desse trabalho foi determinar se existe diferença na abundância de formigas e cupins
de solo entre um ambiente aberto (campo sujo) e um ambiente fechado (mata semi-decídua)
no Parque estadual da Serra de Caldas Novas.
Metodologia
Área de estudo
O estudo foi realizado no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (17º 43´ 56´´ S e
48º 40´00´´ O). O PESCAN tem uma área de 12.500 ha, apresentando um mosaico de
formações vegetais típicas do bioma Cerrado. Os locais específicos de estudo consistiram em:
uma área aberta (campo sujo) e em uma área fechada (mata semi-decídua). O campo sujo
apresenta um extrato herbáceo-graminoso denso com arbustos e pequenas árvores esparsas,
92
com uma fina camada de serapilheira sobre o solo que pode ser encontrado sem essa cobertura
em alguns pontos. Em contraste, a Mata semi-decídua possui uma cobertura arbustiva-arbórea
superior a 90% da área, o que permite apenas a formação de um extrato herbáceo-graminoso
ralo, ocorrendo também no local um grande acúmulo de serapilheira, que forma uma grossa
camada sobre o solo. O clima da região é subtropical, com a precipitação típica do bioma
Cerrado em 1650 mm anuais e a temperatura média anual de 22 ºC. As chuvas se concentram
nos meses da estação úmida (de outubro a maio), ocorrendo uma estação seca bem marcada
(de maio a setembro). Esse trabalho foi realizado no início do mês de novembro, ainda na
transição da estação seca para a chuvosa, tendo ocorrido apenas algumas chuvas.
Medida de abundância de formigas e cupins
Para determinar a abundância de formigas e cupins de solo foram utilizadas
armadilhas de queda (pitfall). Cada armadilha consistiu em um copo plástico descartável de
200 ml, que foi enterrado até o nível do solo e preenchido com 70 ml de água com sabão
diluído (1:0,1). As armadilhas foram instaladas aos pares em 15 pontos de amostragem, que
distavam 10 m um do outro, ao longo de um transecto de 150 m. Foram estabelecidos 3
transectos por ambiente estudado. Durante 48 horas as armadilhas permaneceram no local e
ao final do período de coleta o seu conteúdo foi transferido para um recipiente. Durante a
amostragem em campo, foram registrada a presença de colônias de formigas e cupins no
interior do transecto. No laboratório foi realizada a quantificação do número de formigas e
cupins capturados.
Resultados
As abundâncias totais de formigas e cupins foram muito diferentes entre os dois
ambientes estudados (Tabela 1). Embora a abundância de formigas seja diferente entre campo
sujo e o mata semi-decídua (U = 417; gl = 43 e 37; P < 0,001), os cupins não apresentaram o
mesmo resultado, não sendo a abundância desse grupo diferente entre os dois ambientes (U =
950.5; gl = 43 e 37; P = 0,118), apesar da abundância total de cupins no campo sujo ser 10
vezes maior que na mata semi-decídua (Tabela 1).
93
Tabela 1: Abundância de formigas e cupins em duas diferentes áreas de cerrado, em ambiente
aberto (campo sujo) e em ambiente fechado (mata semi-decídua) no Parque Estadual da Serra
de caldas Novas – GO.
Campo Sujo (n = 43) Mata Semi-decídua (n = 37)
Formigas Cupins Formigas Cupins
Abundância média (+ SD) 245,3 ± 546,3 219,8 ± 689,0 148 ± 89,7 20,3 ± 55,5
Abundância total 10549 9450 5476 750
No ambiente aberto, as formigas e cupins apresentaram uma maior variação em sua
densidade ao longo do espaço, com apenas alguns pontos com grande quantidade de
indivíduos coletados (Figura 1). Em ambos os ambientes as formigas foram coletadas em
todas as amostras. No campo sujo, quase 75 % das 10549 formigas coletadas pertenciam ao
gênero Atta (saúvas) e todas as amostras com mais de 1000 formigas (Figura 1) continham
quase que integralmente saúvas. Na mata semi-decídua também ocorreu à captura de saúvas
em alguns pontos de coleta, sendo menos de 1% das formigas amostradas. No campo sujo
foram registrados três murundus de terra solta de colônias ativas de saúvas (Atta ssp.) e
nenhum de cupim, enquanto que na mata nenhuma colônia aparente foi registrada. Na mata as
formigas mais abundantes foram do gênero Camponotus, mas também sendo capturadas em
poucas amostras em grande quantidade. Outras gêneros de formigas, como Dinoponera e
Ectatomma no campo sujo e Ectatomma e Pachicondyla na mata, apresentaram uma baixa
abundância de indivíduos por ponto, apesar de estarem presentes na maioria das amostras.
Diferente das formigas os cupins não estavam presentes em 40% e 49% das amostras
no campo sujo e na mata semi-decídua, respectivamente. No caso do campo sujo, os cupins
foram coletados em grande quantidade em alguns pontos, com mais de 4300 cupins em uma
única amostra, o que explica a grande variação em torno da abundância média por ponto
(Tabela 1).
94
Figura 1: Variação da quantidade de formigas e cupins em armadilhas de queda (pitfall) em
ambiente aberto (campo sujo) e em ambiente fechado (mata semi-decídua) no Parque
Estadual da Serra de Caldas Novas – GO
Discussão
A diferença na abundância de formigas de solo entre o campo sujo e a mata semi-
decídua foi decorrente da maior densidade de colônias de saúvas no primeiro ambiente. As
colônias dessas espécies são as que atingem maiores densidades, chegando a 1 milhão de
indivíduos em uma única colônia (Holldobler & Wilson, 1990). Na mata não foram avistadas
colônias dessas formigas, diferente do campo sujo que apresentava grandes colônias com
conspícuos murundus entre a vegetação. As saúvas que ocorrem no bioma cerrado são
principalmente espécies de área aberta, ocorrendo apenas na borda das matas ou em baixa
densidade e com colônias pequenas no interior de ambientes fechados (Schoereder, 1998).
Os cupins que forrageiam sobre o solo parecem ser bem menos abundantes em
ambientes fechados do que em ambientes abertos. Talvez, a grande quantidade de húmus e
serapilheira permitam que os cupins não precisem se aventurar fora de suas galerias
subterrâneas para obter alimento, sendo a armadilha pouco eficiente neste ambiente e sub-
amostrando a população de cupins de solo, sendo necessário o uso de iscas de celulose para
atração dos cupins até as armadilhas (Dawes-Gromadzki & Spaint, 2003). Contudo, os cupins
apresentam uma grande abundância local (Tavasu et al, 1998), podendo ser encontrados em
densidades de até 10.000 cupins por m2 próximo a colônia. Esse padrão de distribuição
95
espacial, aliado ao fato da maioria das espécies construírem túneis sobre o solo para
locomoção (Buzzi, 2002) são os fatores que podem ter determinado a forte concentração
pontual da coleta de cupins encontrada neste trabalho em ambos os ambientes.
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96
RELAÇÕES ENTRE FOGO, ASSIMETRIA FLUTUANTE E DANO FOLIAR
EM SALVERTIA SP. EM UMA ÁREA DE CERRADO SENSU STRICTO
André de Sousa Jorge
Introdução
Assimetria flutuante (AF) é uma forma particular de assimetria biológica,
caracterizada por desvios sutis e aleatórios da simetria perfeita, podendo ser utilizada como
um índice de instabilidade de desenvolvimento de um órgão ou organismo bilateral (Tomkins
& Kotiaho 2001, Palmer & Strobeck 1986, Palmer 1996).
A variância da assimetria flutuante de uma população e os valores absolutos da AF dos
indivíduos parecem aumentar com o stress (Leung & Forbes 1996). Um mecanismo possível
para relações entre AF e stress é o fato dos organismos requererem energia para compensar o
stress. Isto deve reduzir a energia para crescimento e reprodução (Koehn & Bayne 1989), o
que pode eventualmente influenciar populações. Além disso, o stress pode reduzir a energia
disponível para manter a precisão do desenvolvimento (Sommer 1996). Assim, a AF deve
aumentar com o stress. A assimetria flutuante pode oferecer vantagens em relação a outros
bioindicadores de stress, uma vez que sua medição é fácil e de baixo custo (Clarke 1993).
Em plantas, foi demonstrado que a AF foliar aumenta com a poluição (Kozlov et al.
1996, Zvereva et al. 1997), competição (Retting et al. 1997), altitude (Wilsey et al. 1998) e
stress genético (Wilsey et al. 1998). Além disso, alguns estudos recentes têm encontrado
correlações positivas entre AF foliar e medidas de herbivoria (Moller 1995, Moller & De
Lope 1998, Martel et al. 1999). No entanto, nada se sabe a respeito do impacto do fogo sobre
a AF foliar.
O fogo é considerado um dos fatores determinantes da estrutura e funcionamento das
savanas (Frost et al. 1985). No cerrado, sua presença é muito antiga, datada de 32.000 A.P.
(Salgado- Labouriau et al. 1998), indicando que a vegetação já coexiste com esta perturbação
há muito tempo. No entanto, a ação antrópica alterou a época natural de ocorrência de fogo no
Cerrado (Ramos-Neto & Pivello 2000), e aumentou sua freqüência. Ele atualmente ocorre
num intervalo de 1-3 anos (Coutinho 1990, Eiten & Sambuichi 1996), submetendo a
vegetação a um tipo de perturbação diferente da qual está adaptada (Hoffman & Moreira
2002). Além disso, o efeito do fogo sobre insetos e outros artrópodes pode alterar os
processos ecológicos mediados por estes animais, como por exemplo, o dano por herbívoros
(McCullough et al. 1998). Assim, é possível que o fogo tenha efeitos sobre AF foliar de
97
algumas espécies vegetais do Cerrado, atuando diretamente como fator de stress ou
indiretamente por meio de modificações no dano foliar causado por herbívoros.
Portanto, neste estudo foi testado, em uma área de cerrado sensu stricto, o efeito do
fogo sobre a assimetria flutuante (AF) e a relação entre AF e dano foliar causado por
herbívoros e patógenos em Salvertia sp., uma espécie abundante e de ampla distribuição do
cerrado sensu stricto. Além disso, foi verificado o efeito do fogo sobre o dano foliar nesta
mesma espécie.
Material e Métodos
Coleta das folhas: O estudo foi realizado em uma área de cerrado sensu stricto
marginal a uma estrada onde um lado foi queimado recentemente e outro não, no Parque
Estadual da Serra de Caldas Novas, município de Caldas (GO). Foram escolhidas
aleatoriamente 10 árvores de Salvertia sp. na região queimada recentemente e 10 na região
não queimada. Foram coletadas 5 folhas jovens de cada árvore.
Cálculo da AF e dano foliar: Para cálculo da AF utilizou-se a distância da nervura
central até a borda no meio da folha. Este caráter morfológico foliar foi medido bilateralmente
em todas as folhas coletadas por meio de um paquímetro digital. A AF foi obtida pela
subtração da medida do lado direito pela medida do lado esquerdo. Para confirmação da
acurácia da medida, o caráter foi aferido três vezes em uma 1 folha de cada indivíduo.
A área foliar danificada por herbívoros e patógenos foi estimada colocando-se sobre a
folha uma transparência contendo um grid de pontos. Foram contados quantos pontos
encontravam-se na área danificada, sendo que cada ponto correspondia a 0,25 cm². Mediu-se
a largura e comprimento foliar por meio de um paquímetro para cálculo da área foliar (área
foliar = Π x largura x comprimento/4). A proporção de dano foi calculada dividindo-se a área
danificada pela área foliar.
Análise estatística: Para análise da AF de um conjunto de dados, certos critérios
devem ser atendidos: as medidas precisam representar desvios reais da simetria e não erros de
medida, a distribuição da AF deve estar conforme o esperado, descartando-se a ocorrência de
assimetria direcional e antissimetria, e, caso o os valores de AF estejam relacionados ao
tamanho do caráter medido, estes valores devem ser corrigidos (Tomkins & Kotiaho 2001).
Para estas análises foi utilizada a sub-amostra de 20 folhas em que a distância da nervura
central até a borda no meio da folha foi bilateralmente aferida três vezes. O cálculo da AF
nesta sub-amostra foi realizado a partir das médias das medidas encontradas para cada um dos
lados.
98
A ANOVA para dois fatores foi utilizada para determinar se as variações entre os
lados foram significativamente maiores que as medidas do erro. Para isso se utilizou como
fatores o indivíduo (folha) e o lado (direito e esquerdo), sendo que cada uma das três medidas
foram consideradas replicações (Palmer & Strobeck 2003). Para descartar a ocorrência de
assimetrias diferentes da AF (antissimetria e assimetria direcional) foi testado se a
distribuição da AF não diferiu de uma distribuição normal com média zero por meio do teste
de Kolmogorov-Smirnov e test t para uma amostra, respectivamente. O teste de correlação de
Pearson foi utilizado para verificar se a AF estava relacionada ao tamanho do caráter medido
(Palmer & Strobeck 1986).
Nas análises subseqüentes foram utilizadas as médias do módulo da AF e da
proporção de dano foliar dos indivíduos (árvores) amostrados. Anteriormente às análises, os
dados foram normalizados quando necessário. As médias do módulo da AF foram submetidas
à transformação logarítmica e as médias da proporção de dano foliar foram transformadas
pelo arcoseno da raiz quadrada. Para verificar a existência de diferenças na AF dos indivíduos
entre local queimado e não queimado, e testar a relação entre AF e dano foliar foi utilizada a
ANCOVA. Para testar a ocorrência de diferenças no dano foliar entre local queimado e não
queimado utilizou-se o teste de Mann-Whitney (Zar 1984).
Todas as análises estatísticas foram feitas utilizando o programa SYSTAT for
Windows (SYSTAT 2000).
Resultados
A ANOVA para dois fatores indicou que houve interação entre indivíduo e lado,
portanto a variação entre os lados (AF) foi significativamente maior do que a esperada devido
ao erro de medida (F19, 80 = 71,268; P < 0,001). O teste de Kolmogorov-Smirnov indicou que a
distribuição da AF não diferiu de uma distribuição normal, descartando a ocorrência de
antissimetria (Dmax = 0,104; P = 0,946). O teste t para uma amostra indicou que a média da
distribuição da AF não diferiu de 0, descartando a ocorrência de assimetria direcional (t = -
0,620; gl = 19; P = 0,543). Não foi encontrada relação entre AF e o tamanho do caráter
medido (r = 0,383; P = 0,096).
A ANCOVA indicou que a interação entre local (queimado e não queimado) e
proporção de dano foliar não foi significativa (F1, 16 = 0,499; P = 0,490). A análise realizada
sem a interação indicou que a AF não diferiu entre os locais (F1, 17 = 0,029; P = 0,866) e que
não houve relação entre AF e proporção de dano foliar (F1, 17 = 0,144; P = 0,709).
99
O teste de Mann-Whitney indicou que houve diferenças quanto ao dano foliar entre
local queimado e não queimado (U = 89,000; P = 0,003), sendo que no local não queimado a
média da proporção de dano foliar dos indivíduos foi maior (Figura 1).
não queimadoLOCAL
0.000
0.001
0.002
0.003
0.004
0.005
0.006
0.007
PR
OP_
DA
NO
Figura 1 - Média e desvio padrão da média da proporção de dano foliar dos indivíduos (árvore
de Salvertia sp.) do local queimado e do local não queimado em uma área de cerrado sensu
stricto.
Discussão
Apesar dos resultados indicarem que não houve diferenças na AF em Salvertia sp.
entre local queimado e não queimado, não há dados suficientes para afirmar que o fogo não
afeta a AF foliar. Novos estudos utilizando mais de uma espécie vegetal são essenciais para o
teste desta hipótese. Além disso, análises de AF utilizando apenas um caráter morfológico
foliar apresentam certas limitações. Análises combinando informações de vários caracteres
morfológicos parecem ser mais confiáveis como detectores de stress (Leary & Allendorf
1989; Watson & Thornhill 1994).
A ausência de relação entre dano foliar e AF em Salvertia sp. pode levar a duas
conclusões: (1) a AF não está relacionada a defesa contra herbívoros; (2) a herbivoria não é
um fator de stress causando aumento da AF nesta espécie. Bañuelos et al. (2004) também não
100
encontrou relações entre dano por herbívoros e AF ao trabalharem com Rhamnus alpinus. No
entanto, uma série de trabalhos encontrou esta relação em outras espécies vegetais, seja
devido ao fato de plantas com alta AF serem mais susceptíveis à herbivoria ou pela própria
herbivoria ser um fator de stress causando aumento da AF (Moller 1995, Moller & De Lope
1998, Martel et al. 1999, Zvereva et al. 1997). Para obtenção de resultados mais precisos em
relação a Salvertia sp. são necessários novos estudos realizando manipulação dos níveis de
dano foliar por herbívoros e empregando análises de AF com informações de vários caracteres
morfológicos foliares (como, por exemplo, distância entre as nervuras).
Os efeitos do fogo em insetos e outros artrópodes podem operar por vários
mecanismos, em diferentes escalas temporais (Miller et al. 1955). Como o local queimado
sofreu a passagem do fogo num período recente em relação a este trabalho, os efeitos
imediatos do fogo provavelmente foram os principais responsáveis pelas diferenças
encontradas no dano foliar entre local queimado e não queimado. Queimadas podem ter um
efeito imediato através da mortalidade (Reichert & Reeder 1972, Bock & Bock 1990),
emigração forçada (Gillon 1970), ou imigração de espécies pirófilas que são atraídas pelo
calor ou fumaça (Komarek 1970). O dano foliar em Salvertia sp. foi maior no local não
queimado, sugerindo que a passagem do fogo reduziu o número de herbívoros por morte ou
emigração.
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103
Relações alométricas de Caryocar brasiliense Camb em área de cerradão e cerrado sensu
strictu no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
Ariane de Souza Siqueira
Introdução
Tamanho e forma são características de grande variação entre os diversos grupos de
organismos. Dentro do padrão morfológico comum a cada espécie, existe uma grande
variedade de adaptações (Begon et al 1996). Variações no tamanho e forma dos organismos
refletem condições ambientais impostas pelo meio, constituindo uma resposta ao estresse
particular experimentado por esses indivíduos (Sposito & Santos 2001). Muitos caracteres
morfológicos de um indivíduo variam dependendo da arquitetura específica, do
microambiente e do grau de restrição ecológica onde se iniciou seu crescimento (Kohyama
1987). Nesse contexto, os estudos alométricos tornam-se necessários para a compreensão de
aspectos ecológicos e evolutivos das espécies (Bond et al 1999).
As relações alométricas em plantas têm sido objeto de estudos exaustivos, pois as
mesmas, têm conseqüências importantes na interação planta-ambiente, além de fornecer
subsídios para o entendimento da estrutura e dinâmica de populações vegetais (King 1996).
Estudos alométricos de caráter comparativo realizados, particularmente, em espécies arbóreas,
constituem uma ferrramenta poderosa em ecologia. A relação entre o diâmetro e a altura em
árvores parece ser moldada pela combinação da força do caule para sustentar a copa em
posição aérea (Sposito 1994).
Caryocar brasiliense Camb é uma espécie semidecídua, característica do cerrado
brasileiro, sendo bastante comum nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Goiás. Ocorre,
geralmente, em agrupamentos mais ou menos denso, tanto em formações primárias como
secundárias e pioneiras (Lorenzi 2002).
O presente estudo teve como objetivo verificar se existe diferença entre as relações
alométricas de duas populações de Caryocar brasiliense que ocorrem em fisionomias
distintas (cerradão e cerrado sensu strictu) no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
Material e Métodos
Área de estudo- O Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN), localiza-se
entre os municípios de Caldas Novas e Rio Quente, no sudeste do Estado de Goiás, distando
apenas 5 km do centro da cidade de Caldas Novas. Possui uma área de 123 km² em formato
104
elipse, sendo o topo formado por um grande platô. A coleta de dados ocorreu durante o mês
de outubro de 2005 em uma área de cerradão e cerrado s.s. do PESCAN.
O cerradão do PESCAN apresenta-se sob a forma de um pequeno fragmento, próximo
ao alojamento do parque. Caracteriza-se pela presença de um dossel contínuo com altura
média de 10m e sub-bosque ralo. Neste local, foi realizada a coleta do primeiro conjunto de
dados. Nas porções mais altas do parque (platô) foi selecionada uma área de cerrado s.s., onde
foi coletado o segundo conjunto de dados. O cerrado s.s. é uma formação bem representativa
do parque, estando em um bom estado de conservação e caracterizando-se pela presença de
indivíduos arbustivos e arbóreos cuja altura pode variar de 1 a 6 metros.
Coleta e Tratamento dos Dados- Em cada ambiente (cerradão e cerrado s.s.) foram
amostrados 30 indivíduos de Caryocar brasiliense que apresentavam circunferência a 30 cm
do solo maior ou igual a 15 cm. Para cada indivíduo amostrado, foi medido o diâmetro a 30
cm do solo (DAS30), diâmetro a altura do peito (DAP), altura total (HT) e altura do fuste
(HF).
Para a análise dos dados foram ajustados diferentes modelos de regressões e
correlações entre as variáveis para os dois ambientes, sendo os resultados analisados
graficamente. Todos os dados que não apresentaram distribuição normal foram
logaritimizados. Com o intuito de se verificar se o afilamento das árvores amostradas diferiu
nos dois ambientes (relação DAS e DAP) foi realizada uma análise de covariância
(ANCOVA). Para a realização dessas análises foi utilizado o programa SYSTAT 8.0.
Resultados e Discussão
O cerradão e cerrado s.s. são ambientes distintos que sofrem diferentes pressões
ambientais. As características particulares de cada ambiente influenciaram nos padrões
alométricos das populações de C. brasiliense estudadas (F= 4,797; p= 0,033 ANCOVA).
A relação DAP/DAS entre os dois ambientes foi distinta (Figura 1A e 1B), revelando
uma variação no formato do caule entre os dois ambientes. No cerrado s.s. as árvores
apresentaram um formato mais cônico, enquanto no cerradão, foi observado um caule mais
cilíndrico. Quando se avalia o padrão alométrico de árvores que sofrem pressões ambientais
diferentes, espera-se encontrar adaptações morfológicas que irão auxiliar estas espécies a
obterem sucesso. Uma dessas adaptações é o aumento da base do caule, visando aumentar a
sustentação e fixação no solo, originando, assim, um formato mais cônico. Áreas de cerrado
s.s sofrem mais diretamente a ação de ventos laterais por se tratarem de ambientes mais
abertos, exigindo assim, indivíduos com troncos mais cônicos.
105
A
B
Figura 1. Relação entre diâmetro à altura do peito (DAP) e diâmetro à altura do solo
(DAS) para árvores de Caryocar brasiliense em área de cerradão (A) e cerrado s.s. (B)
no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
106
Árvores de C. brasiliense do cerradão apresentaram altura total e altura do fuste
maiores que aquelas de cerrado s.s devido, dentre outros fatores, à disputa por luz no
ambiente (Tabela 1). O tamanho e o padrão de ramificação apresentado por uma planta
refletem estratégias adaptativas desse organismo, sendo a competição entre as plantas um
fator que induz a uma semelhança alométrica entre os indivíduos da população (Weiner &
Thomas 1992). A presença de indivíduos mais altos sugere um maior investimento no
crescimento vertical como forma de “fuga” a condições adversas do meio (Portela & Santos
2003).
Tabela 2. Médias e desvio padrão da altura e altura do fuste de indivíduos de espécies arbóreas em áreas cerradão e cerrado strictu sensu do Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
Fisionomia N Altura (m) Altura do Fuste (m) Cerradão 30 6,70 ± 2,18 1,74 ± 0,60
Cerrado s.s. 30 2,75 ± 0,81 0,90 ± 0,40
O fato de indivíduos de Caryocar brasiliense se ajustarem a modelos alométricos
distintos para cada ambiente sugere que os fatores ecológicos podem ter um papel restritivo
na alometria dessa espécie.
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108
Troncos de árvores representam uma área de transição para artrópodos de
serapilheira? Uma avaliação sobre a riqueza de espécies, microclima e efeito de área de
transição
Everton Tizo Pedroso
Introduçao
A ciclagem de nutrientes é um processo importante para a manutenção das formações
florestais (Ricklefs, 1996). Este fenônemo depende da decomposição da serapilheira ou
folhiço (camada de matéria vegetal morta que cobre o solo) (Aber & Melillo, 1991). A
rapidez com que a decomposição acontece depende de fatores abióticos, como temperatura,
umidade e composição química e física do solo e da matéria orgânica acumulada (Ricklefs,
1996); bem como fatores bióticos como consumo direto pela fauna associada ou por
facilitarem a ação de microrganismos (Bradford et al., 2002).
A deposição da matéria orgânica sobre o solo facilita a retenção de umidade e
manutenção de temperaturas mais amenas, favorecendo a formação de um microclima
adequado para a colonização por uma ampla diversidade de organismos. (Ricklefs, 1996)
Neste sentido, a perda da vegetação arbórea pelo desmatamento acarreta a redução da
matéria orgânica acumulada, e conseqüentemente a perda de diversidade, interferindo na
ciclagem de nutrientes no sistema (Eggleton et al., 1995).
Após a eclosão no solo, muitos artrópodos migram para o dosel, utilizando os troncos
de árvores como uma área de transição (highway) (Funke, 1971). Neste sentido Funke (1997)
sugeriu que troncos de árvores podem agir como uma extensão do hábitat para artrópodos
edáficos, contribuindo para a manutenção da diversidade local. Contudo, estudos recentes
demonstraram existir baixa sobreposição de espécies de ácaros Oribatidae (Proctor et al,
2002) e colêmbolos (Prinzing, 2001) vivendo no folhiço e em troncos de árvores, sugerindo
que estes habitats sejam constituídos por conjuntos de espécies distintas. As condições mais
secas e quentes observadas em troncos de árvores em relação ao folhiço permitem a
colonização por um restrito número de espécies tolerantes a uma maior flutuação de
temperatura e umidade (Prinzing, 2001; Proctor et al, 2002).
Este estudo testou a hipótese de que os troncos de árvores representam uma extensão
do hábitat (área de forrageamento e transição) de invertebrados de serapilheira (Funke, 1971).
Para responder a hipótese, os seguintes objetivos foram determinados: a) descrever a fauna
de invertebrados associada com a serapilheira e cascas de árvores vivas; b) determinar a
109
porcentagem de espécies compartilhadas entre os dois microambientes; c) testar a formação
de um microclima em serapilheira e cascas de árvores, que apresenta umidade e temperatura
diferentes do ambiente circundante.
Material e métodos
Área de estudo
O estudo foi realizado no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN),
Caldas Novas, GO, durante o início da estação chuvosa, final de outubro e início de novembro
de 2005. A vegetação do parque abrange diversas fisionamias de Cerrado, tais como cerrado
(s.s.), cerradão, campo sujo, campo rupestre, mata de galeria, entre outras formações vegetais.
Contudo, neste estudo optou-se por amostrar duas áreas, sendo a primeira mata de galeria e a
segunda cerradão (confira Análise preliminar).
Análise preliminar
Uma análise preliminar foi realizada durante a semana que precedeu o período de
amostragem (final da estação seca), tendo o objetivo de testar a eficiência dos métodos de
coleta de artrópodos. Inicialmente, foi ensaiado o método de transecto para se estimar o
número de árvores com cascas suberosas hospedando artrópodos. Três transectos de 20
metros de comprimento foram delineados de forma perpendicular em relação à estrada ou
trilha em cada um dos três ambientes (cerrado, cerradão e mata de galeria). Cada transecto foi
demarcado a 10m de distância do anterior. Todas as árvores vivas distando até 2m para cada
lado do transecto foram registradas quanto a forma da casca e presença de artrópodos na
mesma (Figura 1).
Em área de cerrado (s. s.) a maioria das árvores observadas apresentaram cascas
suberosas, aparentemente havendo condições para hospedar artrópodos. Contudo, não foram
encontrados artrópodos em nenhuma das 19 árvores amostradas. No cerradão, apenas cinco
árvores com cascas suberosas foram amostras, sendo somente uma destas habitada por
artrópodos. E em área de mata de galeria, nenhuma árvore com cascas esfoliantes foi
amostrada pelo método.
Devido o método de transecto ter amostrado poucas árvores suberosas em áreas de
mata de galeria e cerradão, optou-se por utilizar o método de amostragem focal em mata de
galeria e cerradão. As árvores suberosas localizadas visualmente a uma distância máxima de
20m da estrada ou trilha foram examinadas quanto a presença de artrópodos e marcadas para a
amostragem posterior. A área de cerrado (s. s.) não foi amostrada devido a ausência de
artrópodos registrados pelo método de transecto.
110
Figura 1. Representação esquemática do
método de amostragem utilizado para se estimar
o número de árvores suberosas hospedando
artrópodos.
Amostragem da fauna associada a cascas de árvores
A amostragem da comunidade de artrópodos em casca de árvore vivas foi realizada
entre os dias 29 de outubro a 03 de novembro de 2005, durante as primeiras chuvas do
período chuvoso. Seis árvores hospedando artrópodos foram marcadas em cada ambiente. A
captura dos artrópodos foi realizada por dois métodos, tagletrap (armadilha adesiva) (Figura
2) e frasco aspirador (veja kitching, 2005). No instante de aproximação e preparação da
árvore para o tagletrap, os artrópodos observados repousando ou se movimentando no tronco
foram capturados com uso do frasco aspirador e acondicionados em potes plásticos de 10mL
para posterior identificação e quantificação.
Após a captura inicial dos artrópodos foram instaladas as armadilhas adesivas. Para
padronizar a posição das armadilhas, dois pontos foram medidos com uma trena, a 0,5m e
1,5m de altura a partir do solo. As cascas esfoliantes foram raspadas com um canivete em
uma área de 25cm x 15cm em cada ponto para deixar a superfície plana para fixar as
armadilhas e impedir que os artrópodos pudessem evitá-la se movimentando pelas frestas da
casa. Em cada árvore foram colocadas duas lâminas plásticas transparentes de 20cm x 10cm,
fixadas em suas extremidades por alfinetes presos no tronco. Sobre as bordas das lâminas
acrescentou-se tanglefoot® (substância pegajosa) para capturar os artrópodos (Figura 4). As
armadilhas permaneceram expostas por cinco dias. Os artrópodos coletados foram
quantificados, identificados por morfo-espécies e seus respectivos grupos taxonômicos.
111
Para demonstrar a constituição de um microclima nas reentrâncias formadas pelas
cascas de árvores, dados de temperatura e umidade sob as cascas das árvores amostradas e do
ar (2m de distância do tronco) foram registrados com uso de higrotermômetro.
Amostragem da fauna associada a serapilheira em mata de galeria
A amostragem da riqueza de invertebrados de solo foi realizada em mata de galeria,
utilizando o método de coleta e triagem da serapilheira. Perpendicularmente a trilha no
interior da mata de galeria foram delineados 10 transectos de cinco metros de comprimento
com o intervalo de cinco metros entre cada um. Ao final de cada transecto foi estabelecida
uma parcela, construída com barras de PVC, de 50cm x 50cm. Os transectos foram traçados
seguindo a trilha no sentido borda do riacho para exterior da mata. Estando o primeiro
transecto a 10m de distância do riacho e a parcela final posicionada a 60m do mesmo (Figura
3). Registrou-se com uso de higrotermômetro a temperatura e umidade do folhiço e do ar,
imediatamente dois metros acima da parcela delineada. Em cada parcela, a profundidade da
serapilheira foi medida com um paquímetro e toda a matéria orgânica foi coletada e
acondicionada em sacos plásticos pretos de 10L e transportado para o laboratório para triagem
dos invertebrados.
A triagem dos invertebrados seguiu o método de extração por funil de Berlese (veja
Adis, 2002; Kitching, 2005), por ser este um método eficiente na amostragem de micro e
meso-invertebrados. Foram utilizados três funis para a extração dos invertebrados, contendo
cada funil um frasco com álcool 70% posicionado sob a menor abertura e uma lâmpada de
100W sobre a maior abertura. (Figura 4) O método consiste em aquecer e desidratar o
material em decomposição, forçando invertebrados a buscarem as camadas mais inferiores do
funil até caírem no líquido preservante. (para mais detalhes veja Adis, 2002; Kitching, 2005)
Após a dessecação da serapilheira acondicionada nos funis, foi realizada triagem manual antes
do descarte para se certificar que todos os invertebrados fossem amostrados. Os invertebrados
amostrados foram identificados por morfo-espécies e seus respectivos grupos taxonômicos e
quantificados. Os dados obtidos foram comparados com os resultados de Salles e Rodrigues
(2002) para a mesma área.
Análise estatística
A proporção de invertebrados em cada classe de tamanho (micro, meso e
macroinvertebrados) encontrada em cada ambiente foi comparada aos valores esperados
(considerando-se valores esperados como proporções iguais em cada categoria de tamanho)
pelo teste de qui-quadrado.
112
Para análise da formação de microclima, testou-se a diferença entre temperatura e de
umidade do ar e do substrato estudado em cada área pelo teste de Wilcoxon. As diferenças de
temperatura e umidade entre folhiço e cascas de árvores de mata de galeria foram comparadas
por teste U de Mann-Whitney.
113
a
b
Figura 2. (a) Método de captura de artrópodos baseado em tangletrap; (b)Representação
esquemática da metodologia empregada para captura de artrópodos em cascas de árvores com
uso de lâminas plásticas transparentes com substância adesiva.
114
Figura 3. Representação esquemática do método de amostragem por parcelas utilizado para se
estimar a riqueza de invertebrados em serapilheira de mata de galeria.
Figura 4. Representação esquemática do método de amostragem de
invertebrados de serapilheira por funil extrator.
115
Resultados
Invertebrados de serapilheira
Foram identificados no total 258 morfo-espécies de invertebrados, somando-se 654
indivíduos pertencentes a 20 grupos taxonômicos distintos nos três substratos de amostragens,
serapilheira em mata de galeria e troncos de árvores em mata de galeria e cerradão. Contudo,
a maioria das morfo-espécies foi representada por apenas um indivíduo.
Em serapilheira foram identificados 190 morfo-espécies de invertebrados, totalizando
464 indivíduos pertencentes a 19 grupos taxonômicos. Os grupos mais ricos foram
Coleoptera, Formicidae, Araneae e Lepidoptera respectivamente. Porém, os grupos mais
freqüentes neste ambiente foram Formicidae, Coleoptera, Collembola e Lepidoptera. A tabela
1 apresenta um resumo do número de morfo-espécies e de indivíduos de cada grupo
taxonômico amostrado em serapilheira. A Tabela 2 apresenta informações sobre a
profundidade da serapilheira nas parcelas amostradas.
freqüência do grupo taxonômico), (veja Tabela 1).
Os dados obtidos foram comparados com os resultados encontrados em um estudo no
mesmo local realizado anteriormente (Salles & Rodrigues, 2002). No presente estudo foram
amostrados 19 grupos taxonômicos, enquanto o inventário anterior encontrou 14 grupos, oito
novos registros foram feitos, porém não foram amostrados (Manttodea, Opiliones e
Pseudoscorpiones) (veja Tabela 1). O inventário anterior encontrou um número maior de
Hymenoptera, Isoptera e Blattodea em relação ao presente estudo, que obteve maior
freqüência de Coleoptera e de outros grupos não amostrados por Salles e Rodrigues (2002).
A Figura 5 apresenta a porcentagem de cada grupo taxonômico em relação ao número
total de indivíduos amostrados. Insecta e Arachnida apresentaram o maior número de morfo-
espécies, enquanto Insecta, Collembola e Arachnida apresentaram maior número de
indivíduos.
116
Tabela 1. Número de morfo-espécies de invertebrados e número de indivíduos amostrados em
serapilheira de mata de galeria do Parque Estadual da Serra de Caldas, Caldas Novas, GO.
Neste estudo Salles & Rodrigues,
2002
Grupo taxonômico
N.º de morfo-
espécies
%
N.º de indivíduos
%
% de indivíduos
Mollusca Gastropoda 1 0.53 3 0.64 - Anellida Oligochaeta 3 1.58 3 0.64 - Crustacea Isopoda 2 1.05 2 0.43 - Arthropoda Hexapoda Ellipura Collembola 6 3.16 62 13.36 - Insecta Coleoptera 35 18.4 102 21.98 9.94 Diptera 14 7.37 18 3.87 1.24 Blattodea 7 3.68 9 1.94 9.32 Isoptera 3 1.58 5 1.08 16.77 Lepidoptera 24 12.6 44 9.48 1.86 Homoptera 18 9.47 24 5.17 - Hymenoptera 3 1.58 6 1.29 40.37 Formicidae 29 15.3 111 23.9 - Hemiptera 8 4.21 12 2.58 1.86 Thysanoptera 1 0.53 2 0.43 - Psocoptera 3 1.58 4 0.86 2.48 Mantodea - - - - 1.24 Miriapoda Chilopoda 3 1.58 7 1.50 0.62 Diplopoda 1 0.53 3 0.64 - Arachnida Araneae 26 13.7 35 7.54 - Acarina 3 1.58 12 2.58 3.73 Opiliones - - - - 0.62 Pseudoscorpiones - - - - 0.62 Total 190 100 464 100 100
117
Collembola3%
Mollusca1%
Arachnida15%
Anellida2%
Crustacea1%
Miriapoda2%
Insecta76%
Insecta73%
Collembola13%
Arachnida10%
Mollusca1%
Miriapoda2%Anellida
1%
Crustacea0%
a b
Figura 5. Representatividade do número de morfo-espécies (a) e número de indivíduos (b)
amostrados em serapilheira de mata de galeria, PESCAN.
Artrópodos em cascas de árvores
As armadilhas pegajosas utilizadas para amostrar artrópodos em cascas de árvores
mostraram-se um método funcional para se estimar a riqueza. Ao total, foram registradas 68
morfo-espécies, somando-se 292 indivíduos pertencentes a 11 grupos taxonômicos. O maior
número de espécies foi observado em troncos de árvores do cerradão, perfazendo 46 morfo-
espécies e 149 indivíduos, enquanto que em mata de galeria registrou-se 22 morfo-espécies e
143 indivíduos (Tabela 3).
Tabela 2. Altura da serapilheira na parcelas amostradas em mata de galeria.
Profundidade (mm)
N 10.00
Min. 18.15
Máx. 80.20
X 40.98
DP 18.73
Em área de cerradão, os grupos taxonômicos com maior número de morfo-espécies e
maior freqüência de indivíduos foram Hymenoptera, Diptera e Coleoptera, respectivamente.
118
Em mata de galeria, Hymenoptera, Diptera e Collembola apresentaram maior número
do morfo-espécies. Os grupos mais freqüentes em troncos de mata de galeria foram
respectivamente Collembola, Diptera e Hymenoptera.
As comunidades de artrópodos de cascas de árvores mostraram-se distintas em cada
ambiente, havendo apenas sete espécies compartilhadas entre as fisionomias. Significando
que apenas 10,29% (7 de 68) das espécies amostradas não se encontram restritas a um
ambiente específico. Dentre as espécies, foram compartilhadas três espécies de Collembola,
dois Isoptera, um Diptera e um Hymenoptera
Tabela 3 – Número de indivíduos e morfo-espécies de artrópodos amostrados em cascas de árvores
suberosas em mata de galeria e em cerradão no PESCAN.
Cerradão Mata de Galeria
Grupo taxonômico N.º de
morfos
% N.º de
indivíduos
% N.º de
morfos
% N.º de
indivíduos
%
Arthropoda
Hexapoda
Ellipura
Collembola 4 8.70 24 16.11 4 18.18 58 40.56
Insecta
Homoptera 4 8.70 4 2.68 1 4.55 2 1.40
Isoptera 3 6.52 10 6.71 2 9.09 3 2.10
Diptera 11 23.91 35 23.49 5 22.73 57 39.86
Coleoptera 7 15.22 12 8.05 1 4.55 1 0.70
Hymenoptera 11 23.91 58 38.93 4 18.18 13 9.09
Fomicidae 4 8.70 4 2.68 2 9.09 3 2.10
Thysanoptera - - - - 1 4.55 2 1.40
Arachnida
Pseudoscorpiones 1 2.17 1 0.67 - - - -
Araneae 1 2.17 1 0.67 1 4.55 1 0.70
Acarina - - - - 1 4.55 3 2.10
Total 46 100 149 100 22 100 143 100
119
Comparação da fauna associada a serapilheira e troncos de árvores
Em troncos de árvores os dípteros, micro-himenópteros e colêmbolos apresentaram
maior número de morfo-espécies do que o observado em serapilheira. Em contra pronto, no
solo encontra-se maior número de formigas, coleópteros e micro-lepidopteros (Figura 6).
Estes mesmos grupo no solo foram mais comuns do que em troncos de árvores. Nas árvores,
os dípteros, colêmbolos e micro-himenópteros foram mais comuns (Figura 7).
O número de espécies compartilhadas em serapilheira e troncos também foi muito
baixo. Apenas três morfo-espécies foram comuns nos dois ambientes, sendo uma espécie de
Collembola e duas espécies de Isoptera que ocorreram nos três substratos (serapilheira e
troncos de cerradão e mata de galeria). Deste modo, de um total de 258 morfo-espécies
amostradas neste estudo, apenas 1,63% foi comum a todas as áreas.
As classes de tamanho de invertebrados também diferiram entre os ambientes. Os
invertebrados de solo apresentaram homogeneidade entre as classes, não diferindo do valor
esperado (χ2=0,29; GL=2; p=0,86). Em troncos de árvores, os microinvertebrados foram mais
representativos, sendo este bem superior ao valor esperado para a classe (χ2=25,47; GL=2;
p<0,0001). (veja Tabela 4)
Neste estudo, avaliou-se a ação da serapilheira e de cascas de árvores como fatores
físicos que podem proporcionar a formação de microclima. Apenas as variações de
temperatura e umidade do substrato em relação ao ar foram estudadas. Os resultados das
análises demonstraram que em cada local estudado os valores médios de umidade e
temperatura do substrato assemelham-se aos valores obtidos para o ar (Tabela 5). Contudo, a
análise pareada encontrou diferença significativa entre a temperatura e a umidade dos troncos
de árvores do cerradão em relação ao ar. Em cascas de árvores da mata de galeria e
serapilheira apresentaram diferenças significativas apenas para a temperatura do ar. O teste
comparando temperatura e umidade entre cascas de árvores e serapilheira de mata de galeria
não apresentou resultado significativo (Tabela 6).
120
Porcentagem de morfo-espécies de invertebrados em cada grupo taxonômico amostrado em serapilheira (mata de galeria) e troncos de árvores (mata de galeria e cerradão)
0.00
5.00
10.00
15.00
20.00
25.00
30.00C
oleo
pter
a
Dip
tera
Bla
ttode
a
Ara
neae
Isop
tera
Isop
oda
Form
icid
ae
Lepi
dopt
era
Col
lem
bola
Gas
tropo
da
Hom
opte
ra
Aca
rina
Hym
enop
tera
Qui
lopo
da
Hem
ipte
ra
Dip
lopo
da
Thys
onop
tera
Ane
llida
Psoc
opte
ra
Pseu
dosc
orpi
ones
%
Serapilheira
Troncos Cerradão
Troncos Galeria
Porcentagem de indivíduos em cada grupo taxonômico amostrado em serapilheira (mata de galeria) e troncos de árvores (mata de galeria e cerradão)
0.00
5.00
10.00
15.00
20.00
25.00
30.00
35.00
40.00
45.00
Col
eopt
era
Dip
tera
Blat
tode
a
Ara
neae
Isop
tera
Isop
oda
Form
icid
ae
Lepi
dopt
era
Col
lem
bola
Gas
tropo
da
Hom
opte
ra
Aca
rina
Hym
enop
tera
Qui
lopo
da
Hem
ipte
ra
Dip
lopo
da
Thys
onop
tera
Ane
llida
Psoc
opte
ra
Pseu
dosc
orpi
ones
%
Serapilheira
Troncos Cerradão
Troncos Galeria
Figura 6. Porcentagem de morfo-espécies em cada grupo taxonômico amostrados em troncos
de árvores e serapilheira.
Figura 7. Porcentagem do número de indivíduos em cada grupo taxonômico amostrado em
troncos de árvores e serapilheira.
121
Tabela 4. Número de morfo-espécies de invertebrados em cada classe de tamanho em
serapilheira e troncos de árvores.
Serapilheira Troncos
N.º de morfo-
espécies
%* N.º de
morfo-
espécies
%**
Micro 60 31.6 37 54.41
Meso 62 32.6 22 32.35
Macro 68 35.8 9 13.24
Total 190 100 68 100
• - Valor observado semelhante ao esperado, χ2=0,29; GL=2; p=0,86. ** - valores
observados diferentes do esperado, χ2=25,47; GL=2; p<0,0001.
Tabela 5. Médias das variações de temperatura e umidade registradas em serapilheira e cascas
de árvores em área de mata de galeria e de cerradão, PESCAN.
Serapilheira (Mata) Troncos (Mata) Troncos (Cerradão)
Substrato ar Substrato ar Substrato ar
Temperatura
(Cº)
N 10 10 10 10 10 10
X±DP 24,20±0,86 24,90±1,15 24,35±1,12 24,90±1,15 25,59±0,88 26,24±0,88
Mín.* 23,10 23,90 23,20 23,90 24,10 24,90
Máx.* 25,90 28,00 27,30 28,00 27,50 28,30
Umidade
(%)
N 10 10 10 10 10 10
X±DP 81,47±3,35 81,21±4,27 81,20±4,08 81,21±4,27 76,91±2,20 76,51±2,17
Mín.* 76,60 74,60 74,90 74,60 72,50 72,10
Máx.* 87,20 87,70 87,50 87,70 79,40 78,90
* - maior e menor valor registrado.
122
Tabela 6. Resultados das análises das diferenças de temperatura e umidade do ar
e substrato estudado.
Resultado p
Temperatura (Cº)
Ser vs Ar z = -2.807 0,005*
Mat vs Ar z = -2.810 0,005*
Cer vs Ar z = -2.810 0,005*
Ser vs Mat U = 57.500 0,569
Umidade (%)
Ser vs Ar z = 0,510 0,610
Mat vs Ar z = 0,000 1,000
Cer vs Ar z = 2.825 0,005**
Ser vs Mat U = 50.500 0,970
Ser – serapilheira de mata de galeira; Cer – cascas de árvores vivas de cerradão;
Mat – cascas de árvores cicas de mata de galeira; AR – registros para o ar
circundante; z – teste de Wilcoxon; U – teste de Mann-Whitney; * - indica de o
valor obtido para o substrato foi significativamente menor do que o registrado
para o ar. ** - valor obtido para o substrato foi significativamente maior do que
o registrado para o ar. N = 10 pontos de amostragem em cada substrado (valores
médios de temperatura e umidade encontram-se expressos na Tabela 5).
Discussão
A análise preliminar realizada, no final da estação seca, para se testar a eficiência da
amostragem de transectos e estimar o número árvores suberosas hospedando artrópodos, não
obteve resultados satisfatórios. Como esperado, o maior número de espécies arbóreas com
cascas suberosas foi observado em área de cerrado (s. s.), devido à importância desta estrutura
para a sobrevivência das plantas em neste ambiente, já estudado por outros pesquisados.
Contudo, a ausência de artrópodos sob as cascas de árvores no cerrado pode estar associada à
extensão da seca. Períodos prolongados de seca podem provocar migração dos artrópodos
para a serapilheira no solo ou para locais menos expostos (Prinzing, 2001). Coletas de
aracnídeos de habitam as frestas de cascas de árvores e inventários de suas possíveis presas
não obtém resultados satisfatórios durante o final do período de seca (observação pessoal).
123
Formigas, besouros e colêmbolos foram os grupos mais comuns em serapilheira.
Juntamente com os dípteros, estes grupos muito diversificados perfazem a maior parte da
comunidade de artrópodos edáficos, como observado em diversas outras regiões (McColl,
1974; Harada & Bandeira, 1994; Marinho et al., 1997; Deleporte & Tillier, 1999; Pellens &
Garay, 1999).
As diferenças na composição de grupos taxonômicos amostrados em relação ao estudo
anterior de Salles e Rodrigues (2002) na mesma área de mata de galeria, pode ter sido
influenciado pela estação chuvosa e baixo número de repetições. Este estudo foi conduzido no
início da estação chuvosa (final de outubro e início de novembro), enquanto o inventário
anterior foi realizado no final de novembro. Esta diferença quanto ao período de amostragem
pode privilegiar espécies que estão buscando parceiros para reprodução logo após as
primeiras chuvas. Enquanto coletas mais tardias podem ter grande representatividade de
juvenis que eclodiram após os primeiros eventos reprodutivos e que estão a procura de abrigo
e recursos alimentares. Um fato que pode alterar a representatividade de outros invertebrados
em inventários, causando tendenciosidade dos resultados, é a presença de uma colônia de
insetos sociais ou rota de forrageamento nas parcelas de amostragem. A grande diferença na
porcentagem de insetos sociais amostrados nos dois estudos pode ter sido influenciada pela
presença de colônias nas proximidades dos pontos de coletas.
Os colêmbolos representam uma parcela importante das comunidades edáficas
florestais, sendo grupo muito diversificado e abundante, e também por agirem como
detritívoros e serem as principais presas para uma ampla gama de artrópodos (veja Harada &
Bandeira, 1994; Marinho et al., 1997; Brand & Dunn, 1998; Prinzing, 2001; Proctor, et al.,
2002; Addison et al, 2003; Agustí et al., 2003; Meneses et al., 2004; Negri, 2004). Embora
este estudo tenha encontrado um pequeno número de espécies de colêmbolos, o grupo
representou 22,63% de todos os indivíduos coletados nos substratos analisados. Este fato
corrobora outros estudos realizados em serapilheira (Harada & Bandeira, 1994; Marinho et
al., 1997) e troncos de árvores (Prinzing, 2001; Proctor, et al., 2002).
As aranhas compõem um diversificado e abundante grupo de predadores de
organismos que habitam a serapilheira. Embora tenham representado apenas 5,66% do
número total de indivíduos, equivaleram a 10,85% (28 de 258) das morfo-espécies
registradas. Um inventário da araneofauna de mata de restinga realizado na região sul do
Brasil encontrou 44 morfo-espécies (Rodrigues, 2005). No presente estudo, embora a
amostragem tenha sido pontual, foram registradas 28 morfo-espécies, o que sugere haver uma
elevada riqueza de espécies de aranhas no local.
124
Embora muitos estudos tenham sido dedicados para se conhecer a comunidade de
artrópodos de dosel (Tassone & Majer,1997; Srinivasa et al., 2004) e migração vertical (Adis,
1981; Adis & Mahnert, 1993), poucos estudos sobre a fauna associada a cascas de árvores
foram publicados, o que dificulta comparações mais detalhadas. Semelhantemente ao
demonstrado em outros estudos, Diptera e Coleoptera representam os grupos mais abundantes
em cascas de árvores (McWilliam & Death, 1998; Costello et al, 2003). Porém, ao contrário
do esperado os ácaros foram pouco comuns. Isto provavelmente deve-se ao método de
amostragem. O tamanho reduzido dos ácaros pode ter permitido que estes evitassem a
armadilha ao se movimentarem através das fissuras das cascas. Este método pode não ser
efetivo para amostrar grupos muito pequenos que podem evitar a lâmina plástica com
substância adesiva ao se movimentarem através das frestas da casca abaixo da armadilha.
Como esperado, a serapilheira apresentou maior riqueza de espécies em relação aos
troncos de árvores em mata de galeria e cerradão. Isto provavelmente é devido a maior
compartimentalização formada pela matéria acumulada sobre o solo, bem como fatores físicos
como temperatura, umidade, e bióticos como variedade e disponibilidade de recursos
alimentares. Porém, não era esperado encontrar maior riqueza de espécies em árvores de
cerradão do que mata de galeria. As armadilhas posicionadas em troncos nos dois ambientes
capturaram um número semelhante de artrópodos, o que sugere que árvores nos dois
ambientes possam comportar a mesma densidade total de organismos, mas não a mesma
riqueza A temperatura mais amena e maior umidade em mata de galeria deveriam tornar este
ambiente mais atrativo para artrópodos. Contudo, este ambiente revelou riqueza de espécies
duas vezes menor do que os troncos de cerradão. Este resultado pode sugerir um efeito de
“highway” (área de transição) horizontal constituído pelo gradiente de vegetação. A extensão
do período de seca pode ter induzido migração de alguns organismos de áreas de cerrado (s.s.)
para cerradão. Desta forma, o cerradão poderia estar agindo para os artrópodos como uma
área de transição entre mata de galeria e cerrado. E os troncos de árvores estariam
funcionando como áreas de repouso, abrigo e alimentação, para os artrópodos em movimento,
suportando maior riqueza de espécies neste período.
Diferença na oferta de recursos nos dois ambientes, como por exemplo, variedade e
qualidade de itens alimentares não foi testada neste estudo, mas também poderia explicar a
riqueza de espécies. A diferença entre os grupos taxonômicos encontrados entre serapilheira e
troncos de árvores pode ter relação com os hábitos de vida e história natural dos organismos
em questão, e também com a oferta de recursos nos dois ambientes. Isto explicaria porque
alguns grupos são muito comuns em apenas um dos ambientes. Os tipos de recursos
125
alimentares disponíveis e a compartimentalização do substrato podem interferir como um
fator de seleção dos artrópodos que colonizam. O folhiço cobre o solo de toda a área florestal,
suportando uma grande diversidade e abundância de invertebrados (disponibilidade de espaço
físico). Além disso, não funciona como um fator físico limitante que impede a movimentação
de macroinvetebrados, corroborando com o resultado esperado de distribuição semelhante das
classes de tamanho. O contrário é observado em cascas de árvores. O espaço reduzido para
movimentação e abrigo age como um fator restritivo à colonização por macroinvertebrados,
favorecendo maior diversidade de organismo de pequeno porte (54,41% dos artrópodos
coletados).
A compartimentalização formada pela matéria orgânica acumulada no solo das
florestas e pelas cascas esfoliantes dos troncos de árvores, constitui uma barreira física capaz
de reter a umidade e também funciona como um abrigo contra a incidência luminosa direta
(Nicolai, 1986; Prinzing, 2001). A umidade retida na serapilheira e sob as cascas de árvores
da mata de galeria não foi diferente da umidade do ar. A mata de galeria é favorecida pela
umidade provinda da evaporação do leito de água em seu interior. A abundância de água e a
sua constante evaporação podem causar a saturação do ar, tornando a sua concentração mais
homogênea em todo o ambiente. Ao contrário do observado para a umidade, a temperatura na
serapilheira e embaixo de cascas de árvores foi menor do que a temperatura do ar nas
proximidades. Certamente, esta diferença está relacionada a menor incidência luminosa do
substrato do que ar. Como estas áreas estão protegidas da incidência de luz solar, podem atuar
como importantes abrigos protegidos da luz e das temperaturas mais elevadas.
A maior variação de temperada e umidade em relação ao ar foi observada em troncos
de árvores do cerradão. A umidade retida neste substrato foi maior do que a registrada no ar,
enquanto a temperatura revelou-se foi menor. A disponibilidade de água nesse ambiente é
menor do que mata de galeria (veja umidade do ar em mata de galeria e cerradão Tabela 5), o
que sugere que a umidade está distribuída mais heterogeneamente entre os substratos e o ar.
Devido a maior incidência luminosa neste ambiente do que em mata de galeria, a umidade do
ar circundante pode ser perdida para a atmosfera mais rapidamente do que a umidade do
substrato. Neste sentido, as cascas de árvore suberosas apresentam clara funcionalidade de
retentor físico de umidade. A menor área de cobertura vegetal do cerradão em relação à mata
de galeria permite maior incidência luminosa elevando a temperatura do ar, justificando
temperaturas mais amenas embaixo de cascas nos troncos.
Embora não tenham sido encontradas diferenças significativas de temperatura e
umidade entre serapilheira e cascas de árvores de mata de galeria, cada microambiente
126
apresenta uma comunidade específica com menos de 2% de morfo-espécies compartilhadas.
Este resultado demonstra, que ao menos no início do período chuvoso, a hipótese de que os
troncos de árvores funcionem como área de transição (highway) (Funke, 1971) para
artrópodos que migram do solo para o dosel ou o contrário, não se aplica. A diferença na
composição da fauna associada a troncos e serapilheira não pode ser explicada pela umidade e
temperatura. Contudo, cada ambiente disponibiliza diferentes recursos alimentares podendo
favorecer a colonização por diferentes grupos de espécies (Nicolai, 1986; Aberm & Melillo,
1991). Estudos anteriores sugerem que troncos de árvores apenas podem ser colonizados por
um pequeno número de espécies morfológica e fisiologicamente adaptadas para viverem entre
as frestas das cascas e se alimentar de fungos e bactérias incomuns no solo (Nicolai, 1986;
Prinzing, 2001; Proctor, et al., 2002).
Este estudo demonstrou que a serapilheira e os troncos de árvores suberosas em área
florestal constituem um importante componente de diversidade local por hospedar uma alta
riqueza de espécies. Os resultados demonstram que cada microambiente comporta uma fauna
específica de invertebrados, não confirmando a hipótese de que os troncos representam uma
extensão da serapilheira (highway) (alta similaridade) (Funke, 1971). Baixa similaridade entre
comunidade arbórea e de serapilheira foi demonstrada para ácaros Oribatidae e Collembola
(Prinzing, 2001; Proctor, et al., 2002). Este pode ser um dos estudos pioneiros em demonstrar
que a uma alta riqueza de espécies de invertebrados está diferentemente associada aos dois
microambientes, e sugerir que a hipótese de área de transição pode se aplicar horizontalmente
em um gradiente de vegetação no período de seca (cerrado – cerradão – mata de galeria).
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69(1): 148-160.
130
Estrutura de uma população de Stryphnodendron polyphyllum Mart. (“barbatimão”) em
mancha de cerrado sensu stricto no PESCAN.
Fabrício Alvim Carvalho
Introdução
A organização das comunidades e a manutenção da diversidade podem ser discutidas a
partir da análise da estrutura de suas populações (Connell et al. 1984). As estruturas de
populações de plantas resultam da ação de fatores bióticos e abióticos sobre seus indivíduos,
sendo as variações espaciais e temporais destes fatores os principais determinantes do arranjo
espacial e da estrutura etária das populações (Harper 1990; Hutchings 1997). No contexto da
biodiversidade do Cerrado, estudos de estruturas de populações naturais são de grande
importância para o entendimento dos padrões de distribuição e ocorrência das espécies e para
a elaboração de estratégias de manutenção, recuperação e conservação de áreas naturais.
O Cerrado possui uma excepcional riqueza de plantas utilizadas pelo homem (Almeida
et al. 1998). As espécies do gênero Stryphnodendron, típicas de Cerrado, onde são
vulgarmente conhecidas como “barbatimão”, destacam-se pelas suas propriedades taníferas e
medicinais. Devido à elevada concentração de taninos em sua casca, são amplamente
utilizadas na medicina popular e também na indústria do couro (curtume) e na fabricação de
tintas de escrever (Corrêa 1978). Em revisão recente, Jacobson (2003) destacou o
considerável volume de estudos sobre o gênero Stryphnodendron, voltados principalmente
para o entendimento dos padrões fisiológicos e fitofármacos de suas espécies. No entanto,
ainda são poucas as informações sobre o comportamento das espécies em áreas naturais de
cerrado, destacando-se os trabalhos de Felfili et al. (1999) e Jacobson et al. (2005).
Neste trabalho é analisada a estrutura de uma população de Stryphnodendron
polyphyllum no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO, no intuito de fornecer
informações importantes sobre seu comportamento em área natural de cerrado sensu stricto.
Material e métodos
O estudo foi desenvolvido no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN),
localizado entre os municípios de Caldas Novas e Rio Quente, no sudeste do estado de Goiás.
A partir de visitas preliminares em diferentes pontos do PESCAN, foi escolhida uma mancha
de cerrado sensu stricto de aproximadamente 3,0 hectares, circundada por matas de galeria,
cerradão e campo rupestre, próxima à sede do PESCAN (17º46’S, 48º39’W). Esta mancha
131
encontra-se sobre Latossolo Vermelho-Amarelo em área de leve declividade (escarpa) em
cota altitudinal de 750 m. A área foi escolhida por apresentar elevada densidade de indivíduos
de “barbatimão” (Stryphnodendron polyphyllum Mart.). Segundo informações dos
funcionários do PESCAN, esta área encontra-se a cinco anos sem registros de perturbação
antrópica, sendo uma queimada no ano de 2000 o último distúrbio registrado. A coleta de
dados ocorreu em outubro de 2005.
Nesta mancha de cerrado sensu stricto foram alocados sistematicamente seis transectos,
no sentido norte-sul, distantes 20 m entre si. Os transectos foram distribuídos ao longo de toda
a área, visando a obtenção de uma maior heterogeneidade amostral, diminuindo as chances da
amostragem permanecer restrita a uma mancha de fatores ambientais (Causton 1988).
Parcelas de 10 x 10 m distantes 10 m umas das outras foram alocadas ao longo dos transectos.
Ao todo foram alocadas 30 parcelas (0,3 ha). O delineamento amostral encontra-se na figura
1.
Dentro de cada parcela foram amostrados todos os indivíduos vivos de
Stryphnodendron polyphyllum, independente de seu porte, incluindo desde plântulas a
indivíduos arbóreos. Para os indivíduos com até 75 cm de altura (considerados plântulas – até
quatro folhas) foram tomadas somente medidas de altura, e para os indivíduos acima dos 75
cm de altura (considerados jovens e árvores) foram tomadas as medidas de altura e de
circunferência do fuste a 30 cm da superfície do solo (CAS). No caso de indivíduos com mais
de um fuste ou ramificação foi considerado apenas o de maior circunferência. Indivíduos
mortos não foram amostrados pela dificuldade de identificação.
Para a análise da estrutura vertical (altura) e horizontal (circunferência) dos indivíduos
foram utilizados histogramas de freqüência, com intervalos de classes determinados a partir
da fórmula de Spiegel (Felfili & Resende 2003). O quociente ‘q’ de Liocourt, que consiste na
divisão do número de indivíduos em uma classe de circunferência pelo número de indivíduos
na classe anterior, foi utilizado para avaliar o recrutamento (Felfili & Rezende 2003). A
correlação entre altura e circunferência foi avaliada através de análise de regressão simples. A
estrutura da população considerando apenas os indivíduos com CAS ≥ 15 cm foi comparada
com outros trabalhos com a finalidade de identificar possíveis diferenças entre populações
estabelecidas em trechos distintos do PESCAN. Os dados foram analisados através do
programa Microsoft Excel®.
132
Resultados e discussão
Ao todo foram amostrados 322 indivíduos, correspondendo a uma densidade de 1073
ind.ha-1. A análise da estrutura vertical indicou uma maior concentração dos indivíduos na
menor classe de altura (até 75 cm) (figura 2). O mesmo padrão foi obtido com relação à
estrutura horizontal, onde 54% dos indivíduos estavam concentrados na menor classe de
circunferência (até 12 cm) (figura 3).
Ambos os histogramas de freqüências em classes de altura e circunferência
apresentaram curvas resultantes com decréscimo no número de indivíduos no sentido dos
menores para os maiores intervalos de classes, indicando uma grande concentração de
plântulas e jovens. O padrão da curva de circunferência em J-reverso, com 54% dos
indivíduos na primeira classe (até 12 cm), indica um balanço positivo entre recrutamento e
mortalidade sugerindo a ausência de problemas de regeneração.
A baixa taxa de recrutamento entre classes de circunferência foi apontada pelo valor
médio do quociente ‘q’ de Liocourt, calculado em 0,59. A sobrevivência nas menores classes
de circunferência (até 48 cm) foi abaixo da média calculada, indicando alta mortalidade
natural nesta população (figura 3). Os valores do quociente ‘q’ indicam taxas de recrutamento
e mortalidade variáveis com tendência de distribuição balanceada (figura 3).
Conforme o esperado, foi observada uma correlação positiva entre a altura e
circunferência dos indivíduos (figura 4), indicando que os indivíduos de maior altura foram
aqueles que apresentaram maior circunferência.
De forma geral os resultados da análise estrutural concordam com os padrões descritos
por Harper (1990) para populações vegetais naturais bem estabelecidas, caracterizando a
população estudada como auto-regenerante.
Em comparação com outras áreas de cerrado sensu stricto e Cerradão do PESCAN, a
mancha de cerrado analisada destaca-se pela expressiva densidade de indivíduos arbóreos
(CAS ≥ 15 cm) de Stryphnodendron polyphyllum, superando em mais dez vezes a densidade
encontrada nos outros locais (tabela 1).
Lorenzi (1998) descreve a espécie como sendo pioneira, ocorrendo preferencialmente
em formações secundárias estabelecidas sobre solos argilosos (ex. Latossolo), sendo capaz de
tolerar distúrbios antrópicos como fogo e corte. Como a espécie é tolerante a distúrbios, talvez
o fato desta mancha de cerrado ter sofrido queimada há cinco anos tenha favorecido o sucesso
no estabelecimento desta população. Vale ressaltar ainda que o capim-gordura (Melinis
minutiflora) encontrava-se presente ao longo de toda a área amostrada, o que não vêm
impedindo, aparentemente, o desenvolvimento e perpetuação desta população. Neste ponto
133
Jacobson (2003) destaca que a espécie também é capaz de persistir por pastagens extensivas, a
ponto de ser considerada daninha por pecuaristas.
Aparentemente, outras áreas de cerrado sensu stricto em escarpa próximas à mancha
estudada, igualmente submetidas à queimadas recentes, também apresentam elevados
adensamentos de Stryphnodendron polyphyllum (observação pessoal). Apesar do fogo e do
capim gordura serem fatores de distúrbio que provavelmente condicionem o sucesso no
estabelecimento das populações nestas áreas perturbadas do PESCAN, estudos populacionais
comparativos entre áreas queimadas e não queimadas, e com e sem presença do capim-
gordura, serão necessários para elucidar esta questão.
Conforme mencionado anteriormente, o gênero Stryphnodendron possui elevada
importância econômica, especialmente pelas suas características fitoterápicas. Recentemente,
Jacobson et al. (2005) mostraram que entre suas espécies, Stryphnodendron polyphyllum
possui excepcional produção de fenóis totais e taninos, especialmente em solos de baixa
fertilidade com elevada saturação de alumínio. Neste trabalho destaca-se a mancha de cerrado
sensu stricto avaliada no PESCAN como detentora de expressiva densidade de indivíduos
desta espécie, arranjados em uma população estável. Frente a crescente predação desta
espécie pela exploração irracional de sua casca, a área estudada assume considerável
importância na sua conservação, servindo, por exemplo, como banco genético ex situ e como
laboratório de estudos para ações de manejo racional da espécie.
Conclusões
• A população estudada encontra-se bem estabelecida e aparentemente sem problemas de
regeneração, com elevada proporção de indivíduos novos que irão suceder àqueles senis
ou em decrepitude, caracterizada como auto-regenerante.
• A mancha de cerrado sensu stricto estudada destaca-se pela elevada densidade de
indivíduos em uma população bem estabelecida de Stryphnodendron polyphyllum,
ressaltando sua relevância no cenário da conservação da espécie.
Agradecimentos
Agradeço a Adnilton F. Costa e Mardônio Timo pelo auxílio no campo; a Tamiel K. B.
Jacobson pelas referências bibliográficas e informações adicionais sobre a espécie estudada.
134
Referências bibliográficas
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136
Mat
a de
gal
eria
Cerradão
Mancha de Cerrado sensu stricto
Campo rupestre
Cam
po ru
pest
re
10 m
20 m
N
Figura 1 – Delineamento amostral utilizado no estudo da estrutura de uma população de
Stryphnodendron polyphyllum em uma mancha de cerrado sensu stricto (ca. de 3,0 ha) no
PESCAN, GO.
165
74
47
216 4 1 2 0 2
y = -67,575Ln(x) + 134,27R2 = 0,8818
0
50
100
150
200
0 - 0,
75
0,76 -
1,50
1,51 -
2,25
2,26 -
3,00
3,01 -
3,75
3,76 -
4,50
4,51 -
5,25
5,26 -
6,00
6,01 -
6,75
6,76 -
7,50
Classes de altura (m)
Núm
ero
de in
diví
duos
Figura 2 – Distribuição das alturas dos indivíduos de uma população de Stryphnodendron
polyphyllum em mancha de cerrado sensu stricto no PESCAN.
137
174
66
3418 15 6 3 3 2 1
y = -67,132Ln(x) + 133,6R2 = 0,8373
0
50
100
150
200
0,0 - 1
2,0
12,1
- 24,0
24,1
- 36,0
36,1
- 48,0
48,1
- 60,0
60,1
- 72,0
72,1
- 84,0
84,1
- 96,0
96,1
- 108
,0
108,1
- 120,0
Classe de circunferência (cm)
Núm
ero
de in
diví
duos
q1 = 0,38 q2 = 0,52 q3 = 0,53 q4 = 0,83 q5 = 0,40 q6 = 0,50 q7 = 1,00 q8 = 0,67 q9 = 0,50
Média = 0,59
Figura 3 – Distribuição dos diâmetros dos indivíduos e quocientes ‘q’ de Liocourt de uma
população de Stryphnodendron polyphyllum em mancha de cerrado sensu stricto no
PESCAN.
y = 0,0482x + 0,2854R2 = 0,9004
0,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
6,0
7,0
8,0
0,0 20,0 40,0 60,0 80,0 100,0 120,0
Circunferência (cm)
Altu
ra (m
)
Figura 4 – Correlação entre altura e circunferência dos indivíduos de uma população de
Stryphnodendron polyphyllum em mancha de cerrado sensu stricto no PESCAN.
138
Tabela 1 – Densidade de uma população de Stryphnodendron polyphyllum em mancha de
cerrado sensu stricto e comparação com outras áreas no PESCAN.Alt. = altitude; Área = área
amostral; CAS = limite de inclusão de circunferência; Ni = número de indivíduos.
Fisionomia Local Método Alt
(m) Área
CAS
(cm)
Ni
(.ha-1) Referência
Cerrado sensu
stricto Escarpa Parcela
750
0,30 15 412 Este estudo
Cerrado sensu
stricto Escarpa Parcela
770 a 890
0,20 15 40
Costa et al.
(2005a)
Cerrado sensu
stricto Platô Parcela
980 a
1000 0,20 15 5
Costa et al.
(2005a)
Cerrado sensu
stricto Platô
Ponto-
quadrante
980 a
1000 0,58 10 34 Moreno (2003)
Cerrado sensu
stricto Platô
Ponto-
quadrante
980 a
1000 - 13 54
Silva et al.
(2002)
Cerrado sensu
stricto Platô
Ponto-
quadrante
980 a
1000 - 13 28
Silva et al.
(2002)
Cerradão Escarpa Parcela
770
0,06 15 50
Costa et al.
(2005b)
139
Densidade de tocas de tatus e seu uso por fauna comensal em dois ambientes no
PESCAN, GO, Brasil
Frederico Gemesio Lemos
Introdução
Os tatus estão representados por 20 espécies atuais e apresentam uma ampla
distribuição pela América do Sul. Estudos envolvendo tatus (Xenarthra; Dasypodidae) são
escassos e grande parte do que se sabe sobre seu comportamento e ecologia provém de
trabalhos realizados com o tatu-galinha na América do Norte (Carter & Encarnação, 1983).
Além da ampla distribuição geográfica, tatus ocorrem nos mais variados ambientes,
desde áreas de campo aberto no Cerrado até florestas chuvosas, como a Mata Atlântica e a
Floresta Amazônica, logo é de esperar-se que exista uma variação no uso dos diferentes
ambientes (McDonough et al. 2000).
A construção de tocas e complexos subterrâneos é uma característica quase intrínseca
dos dasipodídeos. As tocas fornecem proteção contra fogo, predadores e temperaturas
extremas, reduzem a perda de água por evapotranspiração e servem de ninho e local de
interações sociais (Carter & Encarnação, 1983; McDonough et al. 2000; Platt et al. 2004).
Além disso, as tocas podem abrigar uma grande diversidade de fauna comensal, composta
tanto por invertebrados quanto vertebrados (Platt et al. 2004).
Assim, o objetivo principal deste trabalho foi (1) determinar qual o ambiente mais
utilizado pelos tatus no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, (2) determinar quais
fatores influenciam nesta utilização e (3) conhecer a fauna comensal presente nas tocas de
tatus.
Material e métodos
O presente estudo foi realizado entre 30 de outubro e 02 de novembro de 2005, no
período da manhã e à tarde, no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN) (17°
46’ 8,7” S e 48° 39' 39" W; ca. 800 m altitude), Goiás, Brasil. O PESCAN abrange uma área
de 12.500 hectares do bioma Cerrado. O clima é do tipo AW segundo Köppen, apresentando
duas estações bem definidas, uma quente e chuvosa (outubro a março) e outra seca e fria
(abril a setembro) (Santos 2003). O trabalho foi realizado em uma área de cerrado sentido
restrito, composto por arbustos e gramíneas naturais, e uma área de mata ciliar, caracterizada
por árvores altas e sub-bosque parcialmente aberto (Figura 1).
140
Para a procura das tocas, foram estabelecidos seis transectos de 10 x 150 m (0,15 ha)
na área de cerrado aberto (n=3) e na área de mata (n=3). Na área de cerrado aberto, além de
tatus (Lista 01), ocorre outra espécie de mamífero que constrói tocas, o roedor Clyomys sp.
Assim, para evitar que as tocas deste roedor fossem confundidas com tocas de tatus, assumiu-
se que estas deveriam apresentar pelo menos 10 cm de largura e 10 cm de altura, as quais são
consideradas como medidas de tamanho mínimas de tocas de tatus (Carter & Encarnação,
1983). As tocas com menos de 25 cm de profundidade foram excluídas das análises, pois
estas provavelmente representam locais de forrageio e não abrigos (Zimmerman, 1990). Três
atributos físicos foram medidos em todas as tocas encontradas dentro da área dos transectos.
De acordo com a metodologia de Zimmerman (1990), a altura e a largura foram medidas 10
cm dentro da toca com ajuda de uma trena, além disso, foi medida também a profundidade da
toca. Assim, sempre que possível tentou-se identificar a espécie de tatu que cavou a toca. A
temperatura do ar e a umidade foram medidas no interior das tocas, a uma distância de 10 cm
da entrada e no exterior, a 100 cm acima da toca (Platt et al., 2004). Foi verificado também se
as tocas estavam ativas (menos de dois dias, aproximadamente) ou inativas (mais de dois
dias), sendo consideradas ativas as tocas que apresentavam pegadas de tatus ou marcas
recentes de escavação no túnel e ausência de teias de aranhas e serapilheira. A dureza do solo
em cada parcela foi medida usando uma barra de ferro graduada que era solta a uma altura de
150 cm acima do solo e verificada em seguida. As porções visíveis da toca foram vasculhadas
com uma lanterna à procura de fauna comensal; além disso, espécies avistadas casualmente
durante o estudo utilizando tocas de tatus foram incluídas na lista de fauna comensal. A
densidade de tocas nas duas áreas e a dureza do solo foram comparadas através de teste t. Já
as diferenças de temperatura e umidade dentro e fora das tocas foram analisadas utilizando-se
teste t pareado (para cada ambiente separadamente) e análises de covariância (ANCOVA)
(comparação entre ambientes). Para comparar a presença de fauna comensal entre os dois
ambientes foi utilizado teste de qui-quadrado. As análises utilizadas foram baseadas em Zar
(1996). Os resultados foram considerados significativos quando P < 0,05.
Resultados
Foram encontradas 38 tocas de tatus, sendo 26 no cerrado aberto e 12 na mata. A
densidade de tocas foi 57 tocas/ha no cerrado aberto e 26 tocas/ha na mata. O número de tocas
por transecto variou de 7 a 10 (desvio padrão = 1,52) no cerrado aberto e de 1 a 6 (desvio
padrão = 2,60) na mata. A densidade de tocas no cerrado aberto foi maior que na mata, mas a
diferença não foi estatisticamente significativa (teste-t; t(2), 4 = 2,646; P = 0,057) (Tabela 1).
141
Com exceção de uma toca de Priodontes maximus encontrada, não foi possível
diferenciar as demais espécies de tatus a partir das medidas das tocas (altura e largura).
As tocas apresentaram uma forma horizontalmente oval, sendo que algumas possuíam
um amontoado de terra na entrada. Oito tocas (66,7%) na área de mata e 5 (19,2%) na área
aberta foram construídas embaixo de raízes, troncos ou cupinzeiros, principalmente.
A temperatura média dentro das tocas (cerrado aberto = 24,9 + 1,69° C; n = 26 e mata
= 26,3 + 1,53° C; n = 12) foi significantemente maior que a temperatura média do ar (cerrado
aberto = 23,3 + 1,01° C; n = 26 e mata = 25,7 + 1,55° C; n = 12) tanto no cerrado aberto
(teste-t pareado; t(2), 22 = 7,82; P < 0,001) quanto na mata (teste-t pareado; t(2), 11 = 6,10; P <
0,001) (Tabela 1). A temperatura dentro das tocas aumentou com a temperatura do ar com a
mesma intensidade nos dois ambientes (ANCOVA, F = 3,032; g. l. = 1; P = 0,092), mas foi
mais alta no cerrado aberto que na mata (ANCOVA, F = 12,71; g. l. = 1; P = 0,001).
A umidade média dentro das tocas (cerrado aberto = 90,49 + 10,00; n = 26 e mata =
85,32 + 3,29; n = 12) foi maior que a umidade média do ar (cerrado aberto = 82,40 + 9,66; n =
26 e mata = 76,85 + 5,74; n = 12) nos dois ambientes, cerrado aberto (teste-t pareado; t(2), 22 =
10,38; P < 0,001) e mata (teste-t pareado; t(2); 11 = 7,36; P < 0,001) (Tabela 1). A umidade no
interior das tocas aumentou com a umidade do ar, porém mais acentuadamente no cerrado que
na mata (ANCOVA, F = 7,49; g.l. = 1; P = 0,01).
Na área de cerrado aberto, 19,23% (n = 5) das tocas encontravam-se ativas (Tabela 1),
enquanto que na área de mata nenhuma (n = 0). Em relação à dureza do solo, a
penetrabilidade foi significativamente maior na área de cerrado aberto (média = 7,99 cm;
desvio-padrão = 1,37; n = 44 amostras) que na área de mata (média = 4,55 cm; desvio-padrão
= 1,35; n = 45) (teste-t; t(2); 87 = 11,89; P < 0,001) (Tabela 1).
Foram registradas 10 espécies de fauna comensal, sendo oito espécies registradas
durante o censo das tocas e duas, Ameiva ameiva (Squamata, Scleroglossa) e Speotyto
cunicularia (Aves, Strigidae) por observação casual (Tabela 2). O número de tocas ocupadas
por fauna comensal foi significativamente maior na área de mata (χ2 = 7,785; g.l. = 1; P =
0,005) que na área de cerrado.
142
Discussão
A densidade de tocas no cerrado aberto (n = 26) foi maior que na mata (n = 12), mas a
diferença não foi estatisticamente significativa, diferentemente do encontrado por Platt et al.
(2004) em Belize e McDonough et al. (2000) na Flórida (EUA) e no Rio de Janeiro (Brasil),
onde a densidade de tocas foi significativamente maior na área de mata. De acordo com
McDonough et al. (2000), os tatus estão mais expostos à predação em áreas de floresta, pois
estas apresentam um sub-bosque mais aberto em relação às áreas de cerrado aberto, tendo,
portanto que cavar mais tocas nesse ambiente. Um fator que pode afetar a distribuição das
tocas, o que reflete conseqüentemente a preferência de habitats dos tatus, é a disponibilidade
de presas, existindo, portanto mais tocas onde houver mais alimento. Apesar de saber-se que
tocas não são um indicador fiel da densidade de tatus, uma vez que um só tatu pode cavar
várias tocas em uma noite, ainda assim, é possível que o número de tocas no ambiente esteja
relacionado com a utilização do mesmo por tatus. Porém, é necessário que seja feito um
trabalho sistemático que compare a disponibilidade de presas nos diferentes ambientes. Além
disso, a diferença dos resultados obtidos neste trabalho em relação aos demais pode estar
relacionada ao fato de tal estudo ter sido realizado no Cerrado, diferente dos demais que
foram realizados em florestas de pinheiros e na Mata Atlântica (Reserva Biológica Federal
Poço das Antas, Rio de Janeiro, Brasil). As florestas de pinheiros da América do Norte têm
como representante dos Dasipodídeos somente o Dasypus novemcinctus (tatu-galinha)
enquanto Poço das Antas o D. novemcinctus e o D. septemcinctus, espécies associadas a
matas de galeria e outros tipos de matas. O Cerrado, entretanto, apresenta cinco espécies,
incluindo as duas citadas, logo, é possível que as outras espécies utilizem mais áreas abertas,
diferentemente das espécies do gênero Dasypus (McDonough et al. 2000 ;Platt et al. 2004).
Outro fator que pode influenciar na diferença de distribuição das tocas nos dois
ambientes é a dureza do solo. O solo do cerrado sentido restrito apresentou menor dureza que
o solo da mata. O primeiro é um solo arenoso e macio, o que pode facilitar a escavação tanto
para escapar de predadores quanto para procurar alimento. O solo da mata por sua vez é
constituído principalmente por rochas sólidas e cascalho, o que dificultaria a construção das
tocas. Platt et al. (2004) também atribui a diferença na utilização de habitats ao tipo de solo,
porém em seu estudo a mata é a que apresenta solo mais macio. Ele explica ainda que solos
mais macios e permeáveis além de facilitar a rápida difusão de gases, provendo um micro
ambiente mais favorável à respiração, permitem um escoamento mais rápido da água nas
estações úmidas, diminuindo assim o risco de alagamento do buraco.
143
A densidade média de tocas por hectare manteve-se na média da de outros estudos
(Platt et al. 2004), e próxima da encontrada por McDonough et al. (2000), único estudo
realizado na região Neotropical (Brasil), cuja densidade média variou de 52,5 a 172,5
tocas/hectare. Coletivamente, esses dados mostram que tocas de tatus são uma característica
física comum de ambientes ocupados por tatus, tanto no cerrado, quanto na Mata Atlântica e
nas florestas de pinheiros do sul da América do Norte.
A maior freqüência de tocas entre raízes, troncos e cupinzeiros na mata pode estar
relacionada com uma maior pressão de predação nesse ambiente. Raízes e troncos caídos
fornecem um suporte estrutural para a estabilização dos túneis e dificultam a escavação por
predadores (McDonough et al., 2000).
Apesar de o estudo ter sido realizado em um período chuvoso, diferenciar tocas ativas
de inativas exigiu certo cuidado, uma vez que pegadas foram raras. A diferenciação das tocas
baseou-se principalmente na presença de teias na entrada da toca e de folhas velhas ao longo
do túnel, o que prova que nenhum animal do porte de um tatu teria utilizado aquele buraco.
Ainda assim foram registradas cinco tocas ativas (19,23%) no cerrado sentido restrito e
nenhuma na mata. Platt et al. (2004) encontrou um resultado semelhante na savana (22,9%)
porém diferente na floresta de pinheiros (32,2%), onde o número de tocas ativas foi maior. A
contagem de tocas ativas poderia ser utilizada para estimar o tamanho de populações de tatus
ou sua abundância relativa, porém um fator de correção seria necessário, uma vez que um
mesmo tatu cava várias tocas em um pequeno espaço de tempo.
Com exceção de uma toca de Priodontes maximus (tatu-canastra) encontrada, não foi
possível diferenciar as demais espécies de tatus a partir das medidas das tocas (altura e
largura) uma vez que os valores se sobrepunham, apesar de Carter & Encarnação (1983)
mostrarem em seu estudo que tal diferença interespecífica exista. A impossibilidade de tal
diferenciação neste trabalho poderia ser resultado da ausência de diferenças de tamanho
interespecífica na comunidade de tatus do PESCAN, ao contrário da comunidade da Serra da
Canastra, local onde Carter & Encarnação realizaram o estudo.
A temperatura e a umidade dentro das tocas foram maiores que fora dela nos dois
ambientes, o que tornaria as tocas um bom local para se permanecer em dias chuvosos e frios.
O resultado encontrado difere do obtido por Platt et al. (2004) em Belize, o qual mostra que a
temperatura dentro das tocas é menor que a temperatura do ar. Tal diferença pode ser
atribuída ao fato do presente estudo ter sido realizado em dias nublados e chuvosos. Ainda
assim, este resultado fortaleceria a hipótese de que tatus utilizam as tocas principalmente
como refúgio termal, uma vez que são animais com poucos pêlos no corpo (McNab, 1980).
144
Em regiões de clima temperado as tocas são importantes para evitar o superaquecimento dos
tatus, além de minimizar a perda de água por evaporação, as taxas metabólicas e o gasto de
energia, quando dentro das tocas (Platt et al 2004).
Platt et al. (2004) reporta o encontro de sete espécies, obviamente diferentes das
encontradas no nosso trabalho. Porém, 86% das espécies por eles encontradas tratam-se de
vertebrados, enquanto somente 20% das registradas no PESCAN pertencem a esse táxon.
Ambos resultados provavelmente representam somente uma pequena parte das espécies que
provavelmente utilizem tocas de tatus como abrigo ou mesmo área de vida. O baixo número
de espécies registradas reflete a metodologia adotada. Tocas tiveram vasculhadas somente
suas porções visíveis, sendo que optamos por não destruir as tocas à procura de fauna
comensal de modo a evitar um maior impacto ao micro ambiente ali existente. O número de
tocas ocupadas por fauna comensal foi significativamente maior na área de mata que na área
de cerrado. Outros autores não fornecem dados semelhantes, o que dificulta uma discussão
mais detalhada sobre esse resultado, porém, acreditamos que tal diferença pode ser devido a
uma provável maior riqueza de espécies de invertebrados em áreas de mata. O maior número
de invertebrados encontrados dentro das tocas poderia fortalecer tal hipótese.
Assim, concluímos então que mais estudos envolvendo tatus e sua preferência por
habitats devem ser realizados no Cerrado a fim de podermos entender melhor sua ecologia de
forma geral e sua influência no ambiente como espécie modificadora-chave.
145
A
B
Figura 1. Fotos dos ambientes amostrados no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas,
Goiás. A – Cerrado sentido restrito; B – Mata ciliar.
146
Lista 1. Lista das espécies de tatus que ocorrem no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas,
Goiás, Brasil.
Nome científico Nome popular
Euphractus sexcinctus Tatu-peba, tatu-peludo
Cabassous unicinctus Tatu-do-rabo-mole, tatu-rabo-de-couro
Dasypus novemcinctus Tatu-verdadeiro, tatu-galinha
Dasypus septemcinctus Tatu-china, tatu-galinha
Priodontes maximus Tatu-canastra
147
Tabela 1. Densidade total, número médio/hectare, número médio/transecto e temperatura e
umidade média de tocas de tatus, temperatura e umidade média do ar, número de tocas ativas
e inativas, grau de visibilidade de tocas, dureza média do sol e número de tocas ocupadas e
desocupadas em área de cerrado sentido restrito e área de mata, no Parque Estadual da Serra
de Caldas Novas, Goiás, Brasil.
Parâmetros Cerrado
sentido
restrito
Mata
Tocas
Densidade total 26 12
Número médio/hectare 57,8 26,6
Número médio/transecto 8,67 4
Parâmetros abióticos
Temperatura média da toca (° C) 24,9 26,3
Temperatura média do ar (° C) 23,3 25,7
Umidade média da toca 90,49 85,32
Umidade média do ar 82,40 76,85
Dureza média do solo (cm) 7,99 4,55
Atividade das tocas
Ativas 5 (19,23%) 0
Inativas 21 (81,77%) 12 (100%)
Ocupação das tocas
Ocupadas 7 (26,92%) 9 (75%)
Desocupadas 19 (73,07%) 3 (25%)
148
Tabela 2. Fauna comensal encontrada nas tocas de tatus do Parque Estadual da Serra de
Caldas Novas, Goiás, Brasil.
Táxons Cerrado sentido
restrito
Mata Tipo de
observação
Arthropoda
Aranae n.i. 5 (19,23%)* 9 (75%)* Censo
Quilopoda 1 (3,8%)* Censo
Opiliones 1 (3,8%)* Censo
Blattodea n.i.** 1 Casual
Squamata
Scleroglossa
Ameiva ameiva* 1 Casual
Aves
Strigidae
Speotyto cunicularia* 1 Casual
* Porcentagem de tocas em este táxon foi encontrado
** Espécies excluídas das análises de comparação entre ambientes
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149
Padrões alométricos de Miconia ferruginata DC. (Melastomataceae) em duas fisionomias
rupestres do Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Goiás
Marina Aparecida de Oliveira e Silva
Introdução
Alometria consiste no estudo da mudança nas proporções de diferentes estruturas
morfológicas de um organismo como consequência do crescimento, influenciando a maneira
pela qual plantas e animais se adaptam às condições do meio ambiente (Ricklefs 1996).
As árvores que crescem em diferentes condições ambientais tendem a apresentar
diferentes padrões alométricos, mesmo entre indivíduos da mesma espécie (Niklas 1995,
Wainer & Thomas 1992). Por isso, existem fortes especializações alométricas quando se trata
de espécies tropicais (Kohyama 1987).
A mesma espécie de planta pode ocorrer em condições ambientais adversas e a estrutura
morfológica destas plantas, tais como a altura da planta, a altura do fuste e a circunferência do
tronco são fortemente influenciadas pelas condições físicas do ambiente a que estão expostas
(King 1996, Niklas 1995). As plantas precisam manter relações alométricas que possam
garantir a sua estabilidade no meio e estas relações alométricas são importantes para entender
a estrutura e a dinâmica das comunidades vegetais (Spósito & Santos 2001).
Alguns trabalhos de campo têm demonstrado que entre indivíduos de uma mesma
espécie, localizados em fisionomias distintas, existem variações nos padrões alométricos em
função das condições ambientais (Marimon 2003 e Marimon et al. 2001).
Mesmo para fisionomias rupestres, como é o caso do campo rupestre e cerrado rupestre,
que possuem condições edáficas semelhantes e compartilham elementos florísticos (Ribeiro &
Walter 1998), é esperado que exista uma variação significativa nos padrões e relações
alométricas entre os indivíduos de uma mesma espécie que ocorre nos dois ambientes.
Para verificar a veracidade desta hipótese este trabalho teve por objetivo determinar os
padrões e relações alométricas de Miconia ferruginata em dois ambientes (campo rupestre e
cerrado rupestre).
Metodologia
O trabalho foi realizado nos dias 29 e 30 de outubro e 01 e 02 de novembro de 2005,
no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Goiás (PESCAN). Os dados foram coletados
em uma área de campo rupestre situada a 920 metros de altitude, 17o 47’ 27” de latitude Sul e
150
48o 39’ 49” de longitude Oeste. O solo da área é litólico rochoso com laterito e a vegetação é
caracterizada pela presença de espécies típicas deste tipo fitofisionômico, tais como as
espécies do gênero Vellozia sp. e a espécie Lychnophora ericoides (arnica). E em uma área
de cerrado rupestre situada entre 770 –875 metros de altitude, entre as coordenadas 17o 46’
13” – 17o 46’ 35” Sul e 48o 39’ 34” – 48o 40’ 00” Oeste. O solo apresenta cascalho na
superfície e afloramento rochoso, certa declividade e espécies características da fitofisionomia
tais como, Davilla elliptica, Qualea parviflora e Miconia albicans (Observação pessoal). Esta
observação condiz com a descrição de Ribeiro & Walter (1998).
Para cada área 50 indivíduos de Miconia ferruginata DC. (Melastomataceae)
foram aleatoriamente amostrados quanto a altura total da planta (AT), altura do fuste (AF) e
circunferência do tronco a 15 centímetros do solo maior ou igual a 15 cm (CAS15 ≥ 15 cm).
Os valores de CAS15 ≥ 15 cm foram utilizados para calcular o diâmetro do fuste a 15
centímetros acima do solo (DAS15 ≥ 15 cm), através da fórmula DAS15 = CAS15/π (π = 3,14).
Também foram calculadas as relações AT/DAS15, AF/DAS15 e AT/AF para os dois
ambientes.
Para verificar se havia correlação entre AT/DAS15, AF/DAS15 e AT/AF foi utilizado o
coeficiente de Correlação de Spearman (rS) (valor crítico: rS = 0,235, n = 50) e para
comparação entre as áreas foi utilizado o Teste de Mann-Whitney (Teste U) (SYSTAT 10.2).
O nível de significância considerado foi de 0,05.
A espécie Miconia ferruginata DC. (Melastomataceae) é um arbusto de até dois metros
de altura que ocorre somente no Brasil, nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Mato
Grosso, Goiás, Bahia e Distrito Federal (BDT 2004). Esta espécie está bem representada nas
formações rupestres do Brasil conforme os trabalhos de Giulietti et al. (1987), Baumgratz et
al. (1995), Munhoz & Proença (1998) e Romero & Martins (2002). No Parque Estadual da
Serra de Caldas Novas, Goiás, aparece no cerrado sensu stricto e nas formações rupestres
(Santos 2003).
151
Resultados e Discussão
Alguns valores estatísticos dos parâmetros analisados em Miconia ferruginata no
campo rupestre e cerrado rupestre estão na tabela 1.
O valor médio de DAS15 no cerrado rupestre é 20,9% maior que para o campo rupestre
e existe diferença significativa entre as áreas amostradas (U = 884,0; Gl = 1; P = 0,01) (Fig.
1). Assim como também há diferença significativa para altura total da planta (AT) (U = 662,0;
Gl = 1; P = 0,0001) (Fig. 2), onde os valores médios para o cerrado rupestre são 25,1%
maiores que os valores médios do campo rupestre. Portanto, estes resultados confirmam a
hipótese e podem estar relacionados ao fato dos indivíduos de Miconia ferruginata no cerrado
rupestre terem de investir mais em altura e, consequentemente, em diâmetro do fuste para
garantir a sustentabilidade mecânica e minimizar a competição por luz. Morimon (2003)
verificou que os indivíduos de Sclerolobium paniculatum estabelecidos em áreas florestais
apresentaram altura do fuste maior que o das plantas estabelecidas no cerrado sensu stricto
onde a competição por luz é menor. Provavelmente os indivíduos de Miconia ferruginata
estabelecidos no campo rupestre sofrem mais estresse hídrico e mineral que as plantas
localizadas em cerrado rupestre e devem alocar mais recursos para o crescimento de raízes e
reprodução em detrimento do crescimento em altura e diâmetro do fuste. Morimon (2003)
verificou que algumas plantas utilizam esta estratégia para se estabelecerem no cerrado.
A altura do fuste (AF) não diferiu significativamente entre o cerrado rupestre e o
campo rupestre (U = 1039,5; Gl = 1; P = 0,147) (Fig. 3) mesmo os valores médios da altura
do fuste para o cerrado rupestre sendo 14,1% maiores que para o campo rupestre. Os
indivíduos de Miconia ferruginata no campo rupestre deixam de investir em altura e diâmetro
mas não deixam de investir em altura do fuste.
Os valores AT/DAS e AT/AF são 5,09% e 6,28%, respectivamente, maiores no
cerrado rupestre que no campo rupestre. Já os valores AF/DAS são 6,75% maiores no campo
rupestre que no cerrado rupestre não existindo diferença significativa entre as áreas
amostradas quanto aos valores da relação altura total da planta/diâmetro do fuste (AT/DAS15)
(U = 1119,0; Gl = 1; P = 0,366) (Fig. 4), altura do fuste/diâmetro do fuste (AF/DAS15) (U =
1395,0; Gl = 1; P = 0,317) (Fig. 5) e entre altura total da planta/altura do fuste (AT/AF) (U =
1080,0; Gl = 1; P = 0,241) (Fig. 6).
Os parâmetros altura total da planta/diâmetro do fuste (AT/DAS15) estão fortemente
correlacionados no campo rupestre (rS = 0,815; n = 50) (Fig. 7) e cerrado rupestre (rS = 0,767;
n = 50) (Fig. 8). Não existe correlação significativa entre altura do fuste/diâmetro do fuste no
152
campo rupestre (rS = 0,157; n = 50) mas a correlação é significativa no cerrado rupestre (rS =
0,427; n = 50), também existe correlação significativa entre altura total da planta/ altura do
fuste (rS = 0,311; n = 50) e (rS = 0,370; n = 50) no campo rupestre e cerrado rupestre,
respectivamente.
No campo rupestre os indivíduos de Miconia ferruginata não têm uma boa relação
AF/DAS15 para poderem se manter num ambiente mais instável sujeito a condições
ambientais adversas associadas à altitude com ventos mais constantes e características
edáficas mais severas que aquelas encontradas no cerrado rupestre. Os fustes alongados e
finos encontrados no campo rupestre contradizem o esperado para ambientes mais abertos
onde as plantas investem menos em crescimento do fuste mantendo uma correlação positiva
com o diâmetro do fuste. O padrão alométrico verificado no campo rupestre se assemelha ao
padrão alométrico encontrado por Kohyama & Hotta (1990) para plantas que crescem em
ambientes florestais. Porém a altura do fuste no campo rupestre parece não comprometer a
estabilidade da planta já que as mesmas mantêm uma boa relação Altura /diâmetro do fuste
(AT/DAS15), suficiente para garantir a estabilidade das plantas e sua proteção contra danos
mecânicos. Mas, informações adicionais e detalhadas são necessárias para entender as causas
deste alongamento do fuste não correlacionado ao diâmetro do fuste.
Estes resultados levam a concluir que: (i) existem variações nos padrões alométricos
de Miconia ferruginata que ocorrem no campo rupestre e cerrado rupestre quanto aos
parâmetros altura total da planta (AT) e diâmetro do fuste (DAS), (ii) não existe variação
significativa nos padrões e relações alométricas, entre as áreas de estudo, quanto a altura do
fuste (AF), a altura total da planta/diâmetro do fuste (AT/DAS15), altura do fuste/diâmetro do
fuste (AF/DAS15) e altura da planta/altura do fuste (AT/AF), (iii) a altura da planta está
correlacionada significativamente com o diâmetro do fuste e com a altura do fuste nas duas
populações de M. ferruginata e (iv) a correlação altura do fuste por diâmetro do fuste
(AF/DAS) não é significativa no campo rupestre mas é significativa no cerrado rupestre,
demonstrando que este padrão alométrico difere do padrão encontrado no cerrado rupestre.
Considerações finais
Um fato curioso verificado no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas é que
Miconia ferruginata ocorre em um afloramento rochoso no interior do cerradão, adjacente a
mata de galeria, e também, isoladamente no cerrado sensu stricto onde o solo não apresenta
afloramento rochoso. Esta observação associada ao fato da espécie estar bem adaptada à
153
ambientes litólicos, crescendo em frestas de rochas, leva à inferir que ela seja um importante
agente de intemperização do solo tornando o ambiente propício ao estabelecimento de outras
espécies mais exigentes às condições edáficas.
Fica a dúvida se Miconia ferruginata é ou não uma espécie de estágio sucessional e
até que ponto podemos inferir que algumas das fisionomias verificadas no Parque Estadual de
Caldas Novas realmente abrigam comunidades clímax.
Mais estudos devem ser conduzidos para um melhor entendimento sobre a estrutura
populacional e a função ecológica de Miconia ferruginata.
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155
µ±SD
(Amplitude)(CV)
Áreas
N
DAS15
AT
AF
AT/DAS15
AF/DAS15
AT/AF
Campo
rupestre
50
7,80±2,38
(10,70)(0,30)
148,24±33,98
(150,00)(0,23)
48,24±19,16
(84,00)(0,39)
19,38±2,95
(12,98)(0,61)
6,50±2,81
(11,19)(0,43)
3,73±2,18
(9,78)(0,58)
Cerrado
rupestre
50
9,53±3,44
(14,65)(0,36)
186,36±51,84
(200,00)(0,27)
55,06±22,41
(105,00)(0,40)
20,42±4,59
(22,72)(0,22)
6,06±2,50
(14,32)(0,41)
3,98±2,45
(15,19)(0,61)
µ = média; SD = desvio-padrão; CV = Coeficiente de variação; PESCAN = Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, Goiás
Tabela 1 – Tabela dos valores estatísticos dos parâmetros analisados de Miconia ferruginata no campo rupestre e cerrado rupestre: Diâmetro do
tronco a 15 cm de altura do solo (DAS15), altura total da planta (AT) e altura total do fuste (AF), relação altura total da planta/diâmetro do fuste a
15 cm acima do solo (AT/DAS15), altura do fuste/diâmetro do fuste a 15 cm acima do solo ( AF/DAS15 ) e altura total da planta/altura do fuste
(AT/AF) no PESCAN.
156
Figura 1 – Box-plot para diâmetro do fuste a quinze centímetros do solo (DAS15) de Miconia
ferruginata em duas áreas distintas do PESCAN. Há diferença significativa entre as áreas
(U=884,0; gl=1; P=0,01).
Figura 2- Box-plot para altura altura da planta (AT) de Miconia ferruginata em duas áreas do
PESCAN. Há diferença significativa entre as áreas (U=662,0; gl=1; P=0,0001).
Campo rupestre Cerrado rupestre0
10
20
30DAS15
(cm)
Campo rupestre Cerrado rupestre0
100
200
300
400
500AT(cm)
157
Figura 3- Box-plot para altura altura do fuste (AF) de Miconia ferruginata em duas áreas do
PESCAN. Não há diferença significativa entre as áreas (U=1039,0; gl=1; P=0,147).
Figura 4- Box-plot para para a relação altura total da planta/diâmetro do fuste a 15 cm do solo
(AT/DAS15) de Miconia ferruginata em duas áreas do PESCAN. Não há diferença significativa
entre as áreas (U=1119,0; gl=1; P=0,366).
Campo rupestre Cerrado rupestre0
50
100
150
AF(cm)
Campo rupestre Cerrado rupestre10
20
30
40
AT/DAS(cm)
158
Figura 5- Box-plot para a relação altura do fuste/diâmetro do fuste a 15 centímetros do solo
(AF/DAS15) de Miconia ferruginata em duas áreas do PESCAN. Não há diferença significativa
entre as áreas (U=1395,0; gl=1; P=0,317).
Campo rupestre Cerrado rupestre0
5
10
15
20AF/DAS
(cm)
159
Figura 6- Box-plot para a relação altura total da planta/altura do fuste (AT/AF) de Miconia
ferruginata em duas áreas do PESCAN. Não há diferença significativa entre as áreas (U=1080,0;
gl=1; P=0,241).
Campo rupestre Cerrado rupestre0
5
10
15
20AT/AF(cm)
160
Figura 7 – Correlação Altura total da planta/diâmetro do fuste a 15 centímetros do solo
(AT/DAS15) de Miconia ferruginata no campo rupestre do PESCAN. Correlação forte e positiva
(rS=0,815; n=50).
Figura 8 – Correlação Altura total da planta/diâmetro do fuste a 15 centímetros do solo
(AT/DAS15) de Miconia ferruginata no cerrado rupestre do PESCAN. Correlação forte e positiva
(rS=0,767; n=50).
0 100 200 300Altura da planta (cm)
0
5
10
15
20
DAS(cm)
50 100 150 200 250 300 350Altura da planta (cm)
5
10
15
20DAS(cm)
161
Estratificação vertical de formigas em Cerrado sentido restrito na Serra de
Caldas Novas - GO
Ricardo Ildefonso de Campos
Introdução
As formigas são o grupo de insetos mais importante do cerrado em termos de biomassa,
número de indivíduos e impacto ecológico (Silva 1999, Silvestre 2000). Apesar disso, o número
de levantamentos de formiga no cerrado ainda continuam insatisfatórios (Kempf 1978, Brandão
1995, Reis Menezes 1998, Silva 1999, Silvestre 2000, Ribas et al. 2003; Silva et al. 2004). Tal
fato se torna mais grave devido ao alto grau de destruição a que esse habitat vem sendo
submetido, causado principalmente pela expansão da agricultura extensiva (Klink & Moreira
2002).
Formicidae é um taxon abundante no solo e também largamente distribuído em todos os
estratos da vegetação (Hölldobler & Wilson 1990) sendo dessa forma um bom modelo biológico
para estudos de estratificação vertical (Brühl et al. 1998). Para habitats de mata, a fauna de
formigas parece estar distribuída em três estratos bem definidos: solo, sub-bosque e dossel (Itino
& Yamane 1995, Brühl et al. 1998). Em cada um desses estratos parece existir uma fauna bem
diferenciada, sendo que em um levantamento intensivo na floresta tropical de Borneo (524
espécies amostradas) 75% das espécies foram relacionadas exclusivamente a um determinado
extrato (Brühl et al. 1998).
O cerrado sentido restrito (ver Ribeiro & Walter 1998) devido ao aspecto geralmente mais
aberto da vegetação não possui uma clara subdivisão entre estratos verticais tais como um dossel
e sub-bosque numa mata (Ribeiro 2003). Apesar disso, fatores como locais de nidificação (alta
rugosidade de tronco - Oliveira-Filho e Ratter 2002) e recursos alimentares específicos (nectários
extraflorais, excretas açucaradas de hemípteros - Del-Claro, 2004) podem ser indicativos de uma
mirmecofauna altamente adaptada ao forrageio e nidificação em plantas, sendo assim esperada
uma baixa similaridade de espécies entre a vegetação e o solo. Vasconcelos & Vilhena (2006)
demonstraram que apesar da mirmecofauna possuir alta sobreposição (75%), a abundância
relativa das espécies parece indicar uma clara estratificação da mirmecofauna entre solo e
vegetação. No entanto, a diferença da fauna de formigas entre estratos verticais na vegetação
162
ainda é totalmente desconhecida para formações savânicas. A partir disso, o objetivo geral do
trabalho foi determinar os padrões de estratificação da assembléia de formigas em três estratos
verticais (solo, estrato arbustivo e estrato arbóreo) em uma área de cerrado (sentido restrito) na
Serra de Caldas - GO. Como objetivos específicos serão respondidas as seguintes perguntas:
I. Existe diferença na riqueza de espécies entre os três estratos verticais? Qual seria o
estrato mais rico em espécies?
II. Nos estratos de vegetação, existe efeito do tamanho das plantas sobre a riqueza de
formigas? Esse efeito independe da presença de nectários extraflorais?
III. Existe estratificação vertical (solo, estrato arbustivo e estrato arbóreo) na composição da
fauna de formigas?
Material e Métodos
Área de estudo
Os dados foram coletados no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas em uma área de
cerrado sentido restrito (segundo Ribeiro & Walter 1998). Este parque está localizado na região
sudeste do estado de Goiás, entre os municípios de Caldas Novas e Rio Quente (17º 43’ 56” S a
17º 50’ 55,7” S; 48º 40’ 0” a 48º 42’ 57,6” W).
Desenho amostral
A coleta de formigas foi realizada utilizando-se armadilhas do tipo pit-fall. Essas
armadilhas foram confeccionadas utilizando-se tubos plásticos (5 cm de diâmetro por 8 cm de
altura) contendo água e detergente, usando como atrativo óleo de sardinha comercial que foi
passado dentro e na borda dos tubos. Os pitfalls de solo foram enterrados sendo que a borda
aberta do tubo ficou exatamente ao nível do solo. Já as armadilhas colocadas nos arbustos e nas
árvores foram fixadas com fita adesiva, o mais perto possível das copas das plantas. Os pitfalls
foram recolhidos 48 horas após sua instalação. O material foi triado, montado e identificado até o
nível de espécie quando possível. As formigas encontram-se depositadas na coleção de referência
do Laboratório de Ecologia de Insetos Sociais da Universidade Federal de Uberlândia.
As armadilhas foram distribuídas aleatoriamente em um transecto horizontal distando-se
20m uma da outra. Foram instaladas 11 armadilhas no solo, 17 no estrato arbustivo e 23 no
estrato arbóreo (um pitfall por planta). Todos os pitfalls instalados nas plantas que variaram de
0,5m até 1,5m de altura foram considerados como pertencentes ao estrato arbustivo, incluindo
163
também árvores jovens. Para o estrato arbóreo foram amostradas apenas plantas com no mínimo
5m de altura. Todas as espécies de plantas foram identificadas em campo por Botânico
especialista com vasta experiência em Cerrado. Foram também medidas a circunferência a altura
de 30 cm do solo (CA30) e a altura total de todas as plantas. Devido a alta correlação entre essas
duas medidas (r = 0,84), apenas a altura total foi utilizada nas análises sendo escolhida a variável
representativa do tamanho de plantas. As coletas ocorreram na segunda quinzena de outubro de
2005 sempre entre ás 8 e 14 horas.
Análise dos dados
Para comparar o número de espécies de formigas entre os três estratos amostrados (solo,
estrato arbustivo, estrato arbóreo) foram construídas três curvas de rarefação baseadas no número
de espécies observado (Gotelli & Colwell 2001). As curvas foram geradas a partir de dados
obtidos através do programa Estimates 7.0 (Colwell 2004). Para determinar o efeito do tamanho
da planta e da presença de nectários extraflorais sobre a riqueza formigas foi utilizado um modelo
de ANCOVA (Zar 1999), tendo como variáveis independentes o tamanho da planta (altura total)
e a presença e ausência de nectários extraflorais. A variável dependente do modelo foi a riqueza
de formigas por pitfall. Para as análises estatísticas foi utilizado o programa Systat (SPSS 2000).
Para verificar se existe estratificação vertical na composição da fauna de formigas foram
utilizadas duas análises de agrupamento baseadas no índice de Jaccard (presença e ausência de
espécies) e de Bray-Curtis (freqüência relativa das espécies por estrato). Para a construção do
agrupamento, foi utilizado o método de distâncias médias por UPGMA (McGarigal et al. 2000).
Resultados
Foi coletado um total de 49 espécies de formigas, pertencentes a 15 gêneros e cinco sub-
famílias. Entre estas se destacam as sub-famílias Myrmicinae e Formicinae com 22 e 15 espécies
respectivamente, perfazendo 75,5% do número total (Tabela 1).
Pertencendo ao estrato arbustivo e arbóreo, foram amostradas 40 indivíduos de plantas
distribuídas em 19 espécies e 13 familias. As familias mais ricas foram Fabaceae com quatro
espécies seguida por Volchysiaceae com três espécies. Em relação ao número de indivíduos,
essas duas famílias também se mostraram ser as mais abundantes com oito indivíduos cada
(Tabela 2).
164
Mesmo considerando o menor esforço amostral, o solo foi o estrato mais rico em espécies
de formigas (32 espécies no total). O estrato arbóreo foi o segundo mais rico com 28 espécies
seguido do estrato arbustivo com apenas 16 espécies no total. Considerando um esforço
amostral equivalente (11 amostras), seria esperado encontrar 32 espécies de formigas no solo, 20
nas árvores e 13 nos arbustos (Fig. 1). Ou seja, a partir do esforço amostral mínimo observado na
rarefação pode-se verificar 37,5% a mais de espécies no solo do que nas árvores e 35% a mais de
espécies nas árvores do que nos arbustos. É preciso ressaltar que as curvas de acúmulo de
espécies não atingiram uma assíntota (Fig. 1), e dessa forma é esperado encontrar muito mais
espécies no local amostrado.
Restringindo-se aos estratos de vegetação, foi observado um efeito positivo e significativo
do tamanho de plantas sobre a riqueza de formigas (F1,37 = 6,95; p = 0,01), independente da
presença de nectários extraflorais (F1,37 = 0,16; p = 0,69; fig. 2). Desse modo, não houve
influência da presença de nectários extraflorais sobre a riqueza de formigas.
Em relação a sobreposição da fauna de formigas entre os estratos verticais, uma análise de
agrupamento baseada na presença e ausência de espécies mostrou uma clara separação entre
formigas de solo e vegetação através da formação de dois grupos bem distintos (distância média
UPGMA de 0,8 ; Fig. 3A). Em concordância com esses resultados o índice de Jaccard indica uma
baixa similaridade de espécies entre as formigas de solo e arbustos e solo e árvores
respectivamente (18,4 e 21,4% - Jaccard). Por outro lado, essa mesma análise de agrupamento
não separou a fauna de formigas entre arbustos e árvores (Fig. 3A). Entretanto, o índice de
jaccard demonstrou que a similaridade binária entre esses dois estratos de vegetação é
relativamente baixa (39,1% de similaridade), fato também confirmado pela distância média
UPGMA de 0,61 (Fig. 3A). De fato, 29 espécies (59,2 %) foram restritas a um determinado
estrato (Tabela 1).
Ao observarmos a análise de agrupamento baseada na freqüência relativa das espécies,
apesar do agrupamento manter o mesmo padrão, a dissimilaridade entre os estratos diminui
moderadamente (Fig. 3), sendo a distância média UPGMA 0,61 entre solo e vegetação e 0,44
entre o estrato arbustivo e o estrato arbóreo (Fig. 3B). Essa diferença foi determinada
principalmente por espécies com alta freqüência em um estrato, que também apareceram
eventualmente ou em baixa freqüência em outros (Tabela 1).
165
Discussão
Apesar de um número relativamente baixo de armadilhas, o método do pitfall é
considerado o mais eficiente na captura de formigas em formações savânicas (Romero & Jaffe
1989; Ribas et al. 2003). Em confirmação a isso, o número de espécies coletados aqui (49
espécies) não demonstra ser baixo em comparação a outros trabalhos que também amostraram
estratos de solo em fisionomias de cerrado similares (Silva et al. 2004 - duas áreas de cerrado
sentido restrito - 50 e 56 espécies; Vasconcelos & Vilhena 2006 - cerrado amazônico - 64
espécies). Entretanto, os trabalhos anteriormente citados utilizaram iscas de sardinha, não
existindo até o momento trabalhos comparativos de solo e vegetação que utilizaram pitfalls.
A complexidade estrutural do habitat pode ser apontada como o fator principal no
aumento do número de espécies (Ribas et al. 2003). Assim, para formigas pode haver uma maior
disponibilidade de alimento e locais para nidificação no solo e posteriormente árvores e arbustos.
De fato, para a fisionomia de cerrado sentido restrito, não há interligação entre copas, o que torna
o habitat arbóreo tridimensionalmente menos complexo, dificultando a dispersão e colonização
nesse ambiente em comparação com o solo. Por outro lado, árvores são estruturalmente mais
complexas que arbustos, permitindo que uma fauna mais rica de formigas forrageie e nidifique
em seus troncos, galhos e folhas. Além disso, o tamanho da planta se mostrou ser positivamente
relacionado com o número de espécies também influenciando esse resultado. Por outro lado, a
presença de nectários extraflorais (NEFs) não influenciou na riqueza de formigas mesmo levando
em consideração que o número de plantas com NEFs foi parecido entre os dois estratos. Apesar
de ser considerado um agente de aumento de riqueza em plantas (Blüthgen et al. 2000), além da
baixa quantidade de plantas com NEFs (12 em 40) a maioria dos NEFs das plantas amostradas se
encontravam inativos.
Os resultados de composição de fauna do estudo apontam haver uma baixa sobreposição
de espécies de formigas entre o solo e os estratos de vegetação (arbustivo e arbóreo - 18,4% e
21,4%). Dados comparativos, obtidos em um estudo realizado no cerrado Amazônico indicam
75% de similaridade entre o solo e a vegetação baixa (Vasconcelos & Vilhena 2006). Entretanto,
neste mesmo trabalho, uma análise de composição baseada na abundância relativa das espécies
mostrou uma forte separação da fauna de solo e vegetação. Ademais, é importante ressaltar que
além de existirem diferenças entre o cerrado da Amazônia e do Brasil central, a metodologia
utilizada por Vasconcelos & Vilhena (2006) foi isca de sardinha, sendo que o método de coleta
166
influencia fortemente o padrão de composição de espécies encontrado, principalmente no cerrado
(Cauê Lopes et al. em preparação).
Mesmo para o cerrado, é normalmente esperado que o local de nidificação das formigas
influencie também no local de forrageamento. Dessa forma, existiria uma mirmecofauna
adaptada a nidificar e forragear em plantas e outra no solo. Apesar disso, existem várias exceções
a essa regra como, por exemplo, algumas espécies de formigas dos gêneros Pseudomyrmex,
Ectatomma e Camponotus, que forrageam no solo e nidificam na vegetação (Ricardo Campos,
Obs. pess.; Vasconcelos & Vilhena 2006). No presente trabalho, esse comportamento foi
claramente observado para a espécie Camponotus sp. 10 (Tabela 1).
Por outro lado, considerando o habitat original das formigas o solo (Hölldobler & Wilson
1990), o fato do cerrado ser considerado um bioma extremamente antigo (Ledru 2002), permitiu
que as espécies de formiga se especializassem fortemente ao habitat arborícola, existindo então
atualmente uma fauna de solo adaptada ao habito escavador/predatório e outra de vegetação
adaptada a uma dieta praticamente líquida, a base de néctar de nectários extraflorais e exudatos
de hemípteros (Brühl et al. 1998). Como exemplo disso, pode ser citado o gênero Pheidole e
Cephalotes que são grupos normalmente associados a solo e vegetação respectivamente (Wilson
2002; Andrade & Urbani 1999). Fato confirmado pelo presente trabalho (Tabela 1).
Em relação à sobreposição de espécies entre o estrato arbustivo e arbóreo, foi observada
uma similaridade de 40% para a presença e ausência de espécies (Jaccard) e 56% considerando a
freqüência relativa (Bray-Curtis). Embora a similaridade entre os estratos de vegetação tenha sido
relativamente baixa, o estrato arbustivo nada mais é do que um subconjunto do estrato arbóreo
(Campos et al. Submetido - resultado similar para Mata Atlântica). De fato, apenas 4 das 16
espécies do estrato arbustivo não ocorreram no estrato arbóreo. Realmente, devido ao aspecto
geralmente mais aberto da vegetação do cerrado, não existe uma clara subdivisão entre estratos
verticais como dossel e o sub-bosque em uma mata. Além disso, de uma forma geral, as formigas
que forrageam e nidificam em plantas do cerrado possuem o mesmo requerimento alimentar e de
nidificação e parecem ser influenciadas pela heterogeneidade ambiental (Ribas et al. 2003).
Assim, a estratificação vertical na vegetação não fica clara, pois árvores maiores podem
disponibilizar maior quantidade de recursos do que árvores menores, gerando um padrão de
aninhamento da fauna do estrato arbóreo para o estrato arbustivo.
167
De modo geral, a estratificação vertical pode gerar faunas adaptadas a explorar diferentes
tipos de recursos, diminuindo assim a competição e aumentando o número de espécies que pode
co-existir em um mesmo local (Tobin 1997). Deste modo, assim como para habitats florestais, a
estratificação vertical entre o solo e a vegetação no cerrado pode ser considerada um importante
fator determinante da alta riqueza de formigas no Bioma (Silva 1999). Do ponto de vista da
Biologia da Conservação, a estratificação vertical de formigas mostra a importância da
preservação de áreas de cerrado que possuam diferentes fitofisionomias.
Agradecimentos
Ao programa de Pós-graduação em Ecologia e Conservação de Recursos Naturais da
Universidade Federal de Uberlândia pela possibilidade da participação no curso de campo
juntamente com os dirigentes do Parque Estadual da Serra de Caldas Novas pela disponibilidade
do parque. Ao Prof. Dr. Glein Monteiro Araújo pela identificação das plantas em campo.
Agradecemos também a Sinara Cristina, Ronan Caldeira Costa, Alexandre Gabriel Franchin e
Kelly Cordeiro Spena pela ajuda no campo e confecção do manuscrito.
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170
TABELAS
Tabela 1. Frequência relativa de espécies de formigas por estrato (solo,
arbustivo e arbóreo).
Estrato
Solo Arbustivo Arbóreo
Nº de pitfalls 11 17 23
Dolichoderinae
Azteca sp.1 0.00 0.06 0.22
Dorymyrmex sp.1 0.18 0.06 0.00
Formicinae
Dolichoderus lobicornis 0.00 0.00 0.13
Camponotus atriceps 0.09 0.00 0.17
Camponotus sp.1 0.27 0.35 0.09
Camponotus sp.2 0.09 0.18 0.39
Camponotus sp.3 0.09 0.00 0.04
Camponotus sp.4 0.00 0.00 0.22
Camponotus sp.5 0.00 0.00 0.04
Camponotus sp.6 0.00 0.12 0.35
Camponotus sp.7 0.36 0.41 0.70
Camponotus sp.8 0.45 0.65 0.52
Camponotus sp.9 0.09 0.18 0.04
Camponotus sp.10 0.55 0.06 0.17
Camponotus sp.11 0.18 0.00 0.17
Camponotus sp.12 0.00 0.06 0.00
Camponotus sp.13 0.09 0.00 0.04
Linepithema sp.1 0.00 0.00 0.04
Linepithema sp.2 0.36 0.00 0.00
Paratrechina sp.1 0.00 0.06 0.04
Myrmicinae
Cephalotes atratus 0.00 0.00 0.09
171
Cephalotes sp.1 0.00 0.06 0.09
Cephalotes sp.2 0.00 0.00 0.04
Cephalotes sp.3 0.00 0.00 0.13
Cephalotes sp.4 0.09 0.00 0.04
Crematogaster sp.1 0.09 0.18 0.22
Crematogaster sp.2 0.00 0.00 0.04
Crematogaster sp.3 0.00 0.06 0.00
Crematogaster sp.4 0.09 0.00 0.00
Crematogaster sp.5 0.09 0.00 0.00
Crematogaster sp.6 0.09 0.00 0.00
Pheidole sp.5 0.09 0.06 0.00
Pheidole sp.6 0.09 0.00 0.00
Pheidole sp.7 0.09 0.00 0.00
Pheidole sp.8 0.18 0.00 0.00
Pheidole sp.9 0.09 0.00 0.00
Pheidole sp.10 0.09 0.00 0.00
Pheidole sp.12 0.09 0.00 0.00
Pheidole sp.13 0.18 0.00 0.00
Pheidole sp.14 0.09 0.00 0.00
Solenopsis (Diplorhoptrum) sp.1 0.18 0.00 0.00
Wasmania auropunctata 0.09 0.00 0.00
Ponerinae
Dinoponera sp.1 0.45 0.00 0.00
Ectatomma sp.1 0.18 0.00 0.04
Ectatomma sp.2 0.27 0.00 0.00
Pachycondyla sp.1 0.00 0.00 0.04
Pseudomyrmecinae
Pseudomyrmex gracilis 0.00 0.29 0.35
Pseudomyrmex sp.1 0.09 0.00 0.00
Pseudomyrmex sp.2 0.00 0.00 0.04
172
Tabela 2. Lista de plantas amostadas destacando o estrato, o número de indivíduos e a presença de nectários
(NEF: Sim - S, Não - N) extraflorais de cada espécies coletada.
FAMÍLIA ESPÉCIE ESTRATO
Nº
IND. NEF
ANNONACEAE Annona crassiflora Mart. Arbóreo 4 N
APOCYNACEAE Aspidosperma tomentosum A. DC. Arbustivo 3 N
BOMBACACEAE Eriotheca pubescens Schott. & Endl. Arbóreo 2 N
CLUSIACEAE Kielmeyera coriacea Mart. Arbustivo 2 N
Kielmeyera speciosa St. Hil. Arbóreo 1 N
ERYTHROXYLACEAE Erythroxylum suberosus St. Hil. Arbustivo 2 N
FABACEAE Bowdichia virgilioidis H. B. & K. Arbóreo 3 N
Dalbergia violacea Malme Arbóreo 2 N
Pterodon pubescens Benth. Arbóreo 2 S
Stryphnodendron polyphyllum Mart. Arbustivo 1 S
LOGANIACEAE Sthrychnos pseudo-quina St. Hil. Arbóreo 1 N
MYRTACEAE Psidium sartorianum (O.Berg) Nied. Arbustivo 1 N
RUBIACEAE Tocoyena formosaK. Schum. Arbóreo 2 S
SAPOTACEAE Pouteria ramiflora (Mart.) Radlk Arbóreo 2 N
SAPINDACEAE Matayba guianensis Aubl. Arbustivo 3 N
TILIACEAE Lafoencia pacari St. Hil. Arbustivo 1 S
VOCHYSIACEAE Qualea grandiflora Mart. Ambos 5 S
Qualea parviflora Mart. Arbustivo 1 S
Salvertia convallarieodora St. Hil. Arbóreo 2 N
173
LEGENDA DAS FIGURAS
Figura 1. Número cumulativo de espécies coletadas nos três diferentes estratos verticais, em
função do esforço amostral. Foram amostrados no total 11 pitfalls no solo, 17 no estrato arbustivo
e 23 no estrato arbóreo.
Figura 2. Relação entre a riqueza de espécies de formigas e a altura de plantas com presença
(pontos vazios - reta pontilhada) e ausência (pontos preenchidos - reta contínua) de nectários
extraflorais.
Figura 3. Análises de agrupamento da composição da fauna de formigas coletadas em três
diferentes estratos verticais no PESCAN. Agrupamentos gerados a partir de matrizes de
similaridade de Jaccard - presença e ausência (A) e de dissimilaridade de Bray-Curtis -
freqüência relativa (B). Para ambos o método de agrupamento utilizado foi o das distâncias
médias por UPGMA.
174
Figura 1
175
Figura 2
176
Figura 3
177
Aspectos ecológicos da interação Roupala montana (Proteaceae) e Gonioterma sp.
(Lepidoptera)
Ricardo V. Kilca
Introdução
Dentre as diversas interações planta-herbívoro, pode-se destacar as relações entre a dieta
de um herbívoro que pode estar relacionada diretamente com a distribuição e abundância da
planta hospedeira (Fox & Morrow, 1981) ou a forma e estatura desta (Marquis et al. 2002).
Larvas de mariposas e borboletas (ordem Lepidoptera), em particular, são os principais
consumidores da biomassa foliar (folívoros) em ecossistemas terrestres, incluindo as exuberantes
florestas tropicais. Populações desses e de outros insetos folívoros chegam a desfolhar por
completo suas hospedeiras, provocando danos extensivos em populações vegetais. A literatura
cita que aproximadamente 18 famílias de lepidópteros constroem abrigos foliares em plantas
(Jones et al. 2002). Dentre as diferentes funções atribuídas aos abrigos foliares, pode-se destacar
sua importância para a criação de um microclima, aumento na qualidade nutricional da folhas e
como proteção contra inimigos naturais (Damman, 1993; Jones et al, 2002). Larvas de
lepidópteros constroem estas estruturas em suas plantas hospedeiras utilizando folhas mortas,
jovens, restos foliares juntamente com seda, que serve para enrolar, dobrar e juntar estas partes
(Fornier et al. 2003). Muitas vezes estas estruturas foliares são colonizadas secundariamente por
outros artrópodos, que o utilizam como refúgio ou local de forrageio (Damman, 1993).
A fauna de Lepidoptera do Cerrado brasileiro é bastante rica, sendo estimada em mais de
10.000 espécies (Diniz & Morais 1997). Alguns dos estudos com interações lepidópteros-plantas
hospedeiras, têm procurado descrever a abundância e riqueza de lepidópteros em plantas
hospedeiras (Diniz & Moraes 1995: Diniz & Moraes, 1997; Andrade et al. 2000), a associação
destes com estruturas particulares das plantas (Diniz & Moraes 2002), sua biologia
comportamental (López, 2000; Morais et al. 2005) e a especificidade do herbívoro com espécies
de plantas em particular (Diniz et al, 1999; Costa &Varanda, 2002). Estudos preliminares
indicam que R. montana tem uma maior preferência por larvas de lepidópteros entre 60 espécies
de plantas analisadas, sendo que três espécies de lepidópteros foram consideradas monófagas, ou
seja, possuem hábitos alimentares restritos à R. montana (Morais com. pess.). Estes resultados
178
demonstram uma clara relevância desta espécie de planta com a manutenção da diversidade deste
grupo de artrópodos.
Roupala montana é uma espécie arbórea, semidecídua, que possui uma ampla distribuição
nos cerrados do Brasil Central, ocorrendo em todas as principais fitofisionomias do Bioma
Cerrado, sendo apontada uma maior abundância para o cerrado sentido restrito sob Latossolos
vermelho-escuro (Felfili, 1997). Dados da biologia desta espécie indicam que possui boa
capacidade de se reproduzir vegetativamente por rebrote em áreas de cerrado sentido restrito logo
após a ocorrência de fogo (Hoffman, 1998).
Para compreender alguns aspectos da interação de Gonioterma sp. (Lepidoptera) X
Roupala montana (Proteaceae) no cerrado do Brasil Central, este trabalho se propôs analisar as
seguintes questões: 1) Como diferentes condições edáficas e variações na fisionomia da
vegetação do cerrado influenciam na distribuição e densidade populacional de R. montana; 2) em
que proporção a altura da planta hospedeira pode determinar a freqüência e número de abrigos
foliares construídos por larvas de Gonioterma sp. (Lepidoptera); e 3) qual a variação na riqueza e
abundância de artrópodos associados a estes abrigos foliares após o início da época das chuvas.
Material e métodos
Local de estudo: O estudo foi desenvolvido no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (GO),
entre os dias 30 de setembro e 2 de outubro de 2005, logo no início do período das chuvas. Foram
escolhidas duas áreas para a instalação de dois transectos de 1.500m cada (Figura 1). O primeiro
transecto (T1) percorreu grande parte da estrada “da casa do pesquisador” localizada na escarpa
sudoeste do parque. Em uma topografia declivosa, a classe de solo predominante foi Latossolo
Vermelho-Amarelo nos primeiros 200m, predominando posteriormente solos Litólitos. A
fisionomia da vegetação de cerrado muda significativamente ao longo do transecto 1, variando
entre cerrado sentido restrito, campo sujo, campo murundun e finalmente campo limpo. O
transecto 2 (T2), localizado em uma das estradas principais que corta o platô, caracteriza-se por
situar-se sob Latossolos Vermelho-Escuro, topografia plana predominando a vegetação de
cerrado sentido restrito em toda a extensão.
Delineamento amostral: Para a determinação do número de indivíduos de R. montana nos
transectos mencionados, foi estabelecido um critério de inclusão onde todos os indivíduos que se
encontravam à cinco metros de distância da borda da estrada em direção ao interior da vegetação
179
foram amostrados. Após serem identificados visualmente, os indivíduos foram enquadrados
conforme três classes de tamanho (menor que 1 metro, entre 1 e 2 metros e maiores que 2 metros
de altura) e anotados número total de abrigos foliares que continham na planta.
Durante a coleta nos transectos de 1.500m, foram demarcadas subunidades à cada 100m
de comprimento, utilizando uma fita métrica (100m) alocada ao longo da estrada. Desta forma
pode-se estimar como as fitofisionomias e os solos mudavam ao longo de cada subunidade.
Para estimar a riqueza de artrópodos nos abrigos foliares, foi previamente estabelecido o
número de 30 abrigos em cada transecto para serem coletados, sendo coletado um abrigo para
cada indívíduo de R. montana. Utilizou-se como critério sistemático de coleta dos abrigos a sua
localização na copa da árvore. Os abrigos localizados dentro de um quadrante imaginário, sentido
leste-norte, da copa foram os primeiros a serem considerados na coleta, caso não existissem
abrigos neste quadrante, foi considerado o quadrante norte-oeste e assim subseqüentemente.
Persistindo a incidência de mais abrigos dentro do mesmo quadrante, foi coletado o abrigo de
maior tamanho.
Após coletados, os abrigos foram acondicionados em sacos plásticos marcados e
transportados para o laboratório para serem triados. Durante a triagem, os abrigos foram
desmontados e contados todas as folhas (contadas pelo número de pecíolos) que compunham a
estrutura do abrigo. Posteriormente, os artrópodos encontrados foram coletados e acondicionados
em frascos com álcool 70° e identificados no laboratório LERF na Universidade Federal de
Uberlândia.
Resultados e discussão
Distribuição de R. montana – Registrou-se para o PESCAN uma grande variação na densidade
e distribuição de R. montana entre os transectos. No T1, onde os solos predominantes foram
litólicos apresentando diversas fitofisionomias (de cerrado sentido restrito até campo limpo)
foram registrados 176 indivíduos de R. montana (117,3 ind/ha) sendo encontrados indivíduos em
todas as fitofisionomias (observação de campo). Sobre Latossolos-Vermelho Escuro (T2) foram
encontrados apenas dois indivíduos (1,33 ind/ha) localizados muito próximos (Quadro 1). Estes
resultados vão de encontro à maioria dos dados obtidos na bibliografia. Entre oito levantamentos
fitossociológicos registrados para cerrados sentido restrito sob Latossolos Vermelho-Escuro no
Brasil Central, seis apontam uma densidade de R. montana variando entre 10 a 64 ind/ha (Costa
180
& Araújo, 2001; Assunção & Felfili, 2004; Neto & Saporetti Junior, 2002; Andrade et al. 2002;
Fonseca & silva Junior, 2004; Balduíno et al. 2005). As menores densidades de R. montana
foram registradas para um cerrado sob solo litólito (3,3 ind/ha) em Minas Gerais (Cardoso et al.
2002) e sob Latossolos no PESCAN (Silva et al, 2002). Este estudo demonstrou que parece haver
uma tendência de R. montana não atingir elevadas densidades sobre LVE no PESCAN. Por outro
lado, os resultados aqui apresentados refutam duas outras tendências existentes, que as
populações de R. montana teriam baixas densidades sobre LVA e sobre solos Litólicos. A
densidade de R. montana registrada áreas de cerrado sentido restrito sobre LVE e LVA no platô
do PESCAN foi baixa para as duas classes de solos (3 ind/ha) (Silva et al., 2002). Outro fator
relacionado com a elevada densidade de R. montana no T1, foi sua distribuição na área. Embora
tenha sido observada a forma de agrupamento das populações em determinadas condições
edáficas e fitofisionomicas, como por exemplo, Latossolos Vermelho-Amarelo em cerrado
sentido restrito (dados não medidos à campo), foram encontrados indivíduos em todas as
fisionomias apresentando em cada um delas densidades variadas.
As causas específicas destas baixas densidade de R. montana sobre LVE permanecem
como uma incógnita e passíveis a novas pesquisas na área. Talvez estudos venham confirmar que
esta espécie pode ter uma densidade muito variável em áreas de cerrado, ou então, podem revelar
que outros fatores de ordem biótica podem estar determinando o definhamento destas populações.
Número de AFs em R. montana - Dos 176 indivíduos de R. montana amostrados no
levantamento para o T1, 122 indivíduos (69,3%) não apresentaram abrigos foliares. Dos 53
indivíduos de R. montana com presença de AFs (30,7%), foram registrados uma elevada
densidade (122 AFs), sendo observado no campo que geralmente as árvores com maior número
de abrigos se encontravam próximas uma das outras. A distribuição destes AFs por classe de
tamanho de R. montana, registra que o maior número de abrigos foi encontrado para plantas com
porte médio (58) , entre 1 a 2m, seguido das árvores com alturas maiores que 2m (48) e depois
pelas menores que 1m (15). Entretanto, a proporção do número de abrigos por classe de tamanho
foi maior para as árvores grandes com as maiores densidades de AFs (70,6%), demonstrando
assim a preferência das fêmeas da mariposa de Gonioterma sp. em fazer seus ninhos nas árvores
mais altas (Figura 2). O teste estatístico para as três classes de altura demonstrou ter significativa
diferença para árvores grandes e médias e grandes e pequenas (Tukey: P= 0,01 e 0,005
respectivamente) (quadro1).
181
Foi demonstrado também que existiu um maior número de plantas que comportavam
poucos AFs em relação àquelas que comportavam muitos AFs. Árvores pequenas comportaram
geralmente 1 AF apenas, enquanto que nas árvores grandes e médias foram registrados um
número variável de abrigos (Figura 3).
De acordo com Marquis et al. (2002) uma planta alta pode ser colonizada por um maior
número de mariposas pelo simples fato de apresentar uma maior quantidade de recursos. Hayson
& Coulson (1998) demonstraram que a altura pode ser mais importante que outras variáveis da
vegetação (idade da planta, e densidade de folhas e flores), mesmo em diferentes sítios, para o
estabelecimento de larvas de lepidópteros. De uma forma geral, a variação entre os indivíduos de
uma espécie de planta hospedeira afeta na disponibilidade de recursos para os herbívoros, sendo a
idade da planta, o genótipo e a influência do ambiente os três principais geradores desta
variabilidade (Hunter & Price, 1998).
Riqueza de artrópodos nos AFs – Houve pouca diferença entre o número de abrigos foliares
com a presença (13AF) ou ausência (17AF) de Gonioterma sp. (larva ou pupa). O número de
folhas por abrigo ficou em torno de 10 folhas (10,5±5,2) para os abrigos do T1, não sendo
identificado uma diferença significativa entre o número de folhas por classe de tamanho de
árvore (Tabela 3). A riqueza de artrópodos existentes nos 30 abrigos coletados na T1 foi de 41
morfoespécies e a densidade total de 80 indivíduos, no T2 foi coletado apenas um indivíduo.
Desta forma, a densidade média de artrópodos por AF foi maior no T1 (2,66 ind/AF) que no T2
(0,5 ind/AF) (Tabela 1). Os resultados demonstraram que 33 espécies (81%) tiveram apenas 1
indivíduo amostrado (Tabela 2).
Uma estimativa de diversidade e riqueza da fauna de invertebrados associadas aos abrigos
foliares de R. montana por Lepidoptera no PESCAN foi realizada no mesmo mês deste trabalho
(Siqueira et al., 2005), porém antes do início das chuvas. O trabalho destes autores registrou
maiores valores na porcentagem de abrigos com artrópodos (92,85%), número de táxons (48) e
densidade total (147), entretanto utilizando métodos de amostragem um pouco deferentes deste
estudo. Embora este estudo tenha registrado valores menores para estes parâmetros (76,6% AF,
41 morfoespécies e 80 indivíduos) estes valores podem ser considerados representativos quando
analisados a proporção do número de abrigos por plantas em cada estudo. No inventário de
Siqueira et al. (2005), estes resultados foram atribuídos para 60 AF coletados em 30 indivíduos
182
de R. montana (2 AFs/planta ), enquanto que neste estudo foram coletados 30AF em 30
indivíduos desta planta (1 AF/planta).
Dessa forma, pode-se inferir muito pouco acerca do fator pluviosidade no início do
período das chuvas como fator determinante para reduzir a riqueza e densidade de artrópodos em
abrigos foliares de R. montana na região do Cerrado.
A elevada diversidade de artrópodos em AFs de R. montana pode ser atribuída a esta
planta hospedeira apresentar uma grande abrangência geográfica, ou que ocorra em muitas
comunidades vegetais. Espécies vegetais com estas características tendem a possuir uma maior
fauna de invertebrados associadas do que em plantas que apresentam uma distribuição geográfica
limitada ou restrita a poucos ambientes (Lawton & Schröder, 1977 apud Hayson & Coulson,
2002).
Conclusão
Pode-se concluir com os resultados apresentados, que a espécie R. montana pode
apresentar uma abundância muito variável sobre classes diferentes de solos em áreas de cerrado
sentido-restrito no Brasil Central. Especificamente para o platô do PESCAN a densidade desta
espécie em Latossolos Vermelho-Escuro são as menores registradas dentre os levantamentos
considerados, necessitando assim estudos de avaliações abióticas e bióticas para ver se este
fenômeno é restrito ou pode ocorrer em outras áreas. Por outro lado, apresentou elevadas
densidades desta planta em solos onde a bibliografia registrava baixas densidades. A distribuição
dos AFs de Gonioterma sp. em plantas parecem ser do tipo agrupada, onde poucos indivíduos de
uma população de R. montana (±30%) podem comportar uma densidade alta de abrigos (122
AFs). A mariposa fêmea de Gonioterma sp. depositou seus ovos, que construíram abrigos
foliares, em indivíduos de R. montana com diversos tamanhos tendo, entretanto, apresentou uma
elevada preferência pelas plantas com maior estatura (>2m) e menor por indivíduos com estatura
baixa (<1m). Os abrigos construídos pela larva desta espécie podem comportar uma elevada
riqueza e densidade de artrópodos, sendo que a transição climática do período seco para o
chuvoso parece não acarretar grandes mudanças nestes atributos.
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Relatório Final/UFU-UnB.
Agradecimentos
O autor agradece a profa. Dra. Helena C. de Morais/UnB pelo incentivo à pesquisa e aos
colegas Everton “tizonoptera” Tizo/UFU pela identificação dos artrópodos e Vitor “vitão”
Hugo/UFU pelo empréstimo da máquina fotográfica digital e ao André “andrezão” pelas dicas
com a metodologia.
186
1. 2. Figuras 1 e 2. Localização do município de Caldas Novas no estado de Goiás e a localização dos dois transectos alocados no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (1), onde T1: instalado em uma escarpa com diferentes fitofisionomias (área de declive), e T2: instalado no platô apresentando apenas cerrado senso restrito (área com topografia plana). 2. fotografias de algumas fitofisionomias características do T1 e no T2 (fotografias tiradas pelo autor em 2/11/2005).
T1 cerrado sentido restrito T1 campo
T1 campo sujo e cerrado T2 cerrado sentido restrito
187
Tabela 1. Esquema das variações fisionômicas, das classes de solos e da topografia ao longo dos transectos realizados no platô do Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO. Onde: Fitofisionomias: C.S.R= cerrado sentido restrito, C.C= campo cerrado, C.M= campo com murunduns; Classe de solos: Latossolos Vermelho-Amarelos, Latossolos Vermelho-Escuros, solos Litólitos com afloramento rochoso.
Fitofisionomias Classe de solos Topografia Distâncias
(m) T1 T2 T1 T2
T1 T2 0-100 C.S.R C.S.R Lato V-A Lato. V-E declive plana
100-200 C.S.R C.S.R Lato V-A Lato. V-E declive plana 200-300 C.S.R – C.C C.S.R Lito aflora Lato. V-E declive plana 300-400 C.S.R – C.C C.S.R Lito aflora Lato. V-E declive plana 400-500 C.S.R – C.C C.S.R Lito aflora Lato. V-E declive plana 500-600 C.S.R – C.M C.S.R Lito aflora Lato. V-E declive plana 600-700 C.S.R – C.M C.S.R Lito aflora Lato. V-E declive plana 700-800 C.S.R – C.M C.S.R Lito aflora Lato. V-E declive plana 800-900 C.C C.S.R Lito aflora Lato. V-E declive plana 900-1000 C.C C.S.R Lito aflora Lato. V-E declive plana 1000-1100 C.C C.S.R Lito aflora Lato. V-E declive plana 1100-1200 C.C C.S.R Lito aflora Lato. V-E declive plana 1200-1300 C.C C.S.R Lito aflora Lato. V-E declive plana 1300-1400 C.C C.S.R Lito aflora Lato. V-E declive plana 1400-1500 C.C C.S.R Lito aflora Lato. V-E declive plana
188
Tabela 2. Presença e ausência de abrigos foliares de Gonioterma sp. (Lepidoptera) em três classes de altura de R. montana, para duas áreas de cerrado no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
Transecto 1 Transecto 2 Tamanhos de R.
montana sem A.F. com A.F.* Total sem
A.F. com A.F. Total
Árvores grandes (> 2m) 5 (29,4%) 12
(70,6%) 17 0 2 2
Árvores médias (< 1m) 56 (65,9%) 29
(34,1%) 85 0 0 0
Árvores pequenas (1 a 2m) 62 (85%) 11 (15%) 73 0 0 0
*ANOVA P= 0,03, R: 0,206; sendo significativo com teste Tukey para árvores grandes e médias 0,01; e grandes e pequenas 0,005.
3
16
9
2
6
12
3
01
21 1
0 0 01
0 01
01
0 0
2
0 002
468
101214
16
Núm
ero
de R
. mon
tana
1 2 3 4 5 6 7 8 9Número de abrigos
G M P
Figura 2. Relação do número de indivíduos, agrupados em classes de tamanho, de R. montana com as diferentes densidades de abrigos foliares de Gonioterma sp. (Lepidoptera) no transecto 1, Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO. Onde: G= grande (≥2m), M= médio (>1 e <2) e P= pequeno (<1m).
189
Tabela 3. Alguns valores gerais obtidos em dois transectos realizados para a coleta de abrigos foliares de Gonioterma sp. (Lepidoptera) em R. montana, no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
Abrigos foliares em R. montana T1 T2 Abrigos com Gonioterma sp. 13 1 Abrigos sem Gonioterma sp. 17 1 Abrigos com artrópodos 23 (76,6%) 1 Abrigos sem artrópodos 7 (23,4%) 0 Riqueza de morfoespécies 41 1 Densidade total de artrópodos 80 1 Número de folhas por abrigo** 10,5±5,2 3,5±0,7 Táxons por abrigo* 1,3±1,3 1
*valores expressos pela média±desvio padrão. **ANOVA para o n° de folhas por classe e tamanho de R. montana não foi significativo para T1 (R: 0,029; F: 0,409; P: 0,669).
190
Tabela 2. Relação dos táxons de artrópodos (morfoespécies) registrados para uma amostragem de 30 abrigos foliares de Gonioterma sp. (Lepidoptera) em R. montana, nas duas áreas de cerrado no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO.
Morfoespécie ARTHROPODA N° ind.
ARANAE Araneidae sp. 1 1 Araneidae sp 2 1 Araneidae sp.3 1
Lycosidae 1 Oxyopidae sp. 3 2 Salticidae sp. 1 1 Salticidae sp. 2 3 Salticidae sp. 3 1 Salticidae sp. 4 1 Salticidae sp. 5 1
Scytodes sp. 1 BLATODEA Blatodea sp. 1 6 Blatodea sp. 2 1 HEXAPODA Colembola sp 15
COLEOPTERA Bruchidae sp. 2 1 Bruchidae sp. 3 1 Coleoptero sp. 1 1 Coleoptero sp. 2 1 Coleoptero sp. 3 1 Coleoptero sp. 4 1 Coleoptero sp. 5 1
Meloidae 1 HYMENOPTERA
Formicidea sp. 1 1 Formicidea sp. 2 1 Formicidea sp. 3 2 Formicidea sp. 4 1 Formicidea sp. 5 1 Formicidea sp. 6 1 Formicidea sp. 7 1 Formicidea sp. 8 1 Formicidea sp. 9 1 Formicidea sp. 10 1 Hymenoptero sp. 1 1 Hymenoptero sp. 2 1 LEPIDOPTERA Gonioterma sp. 12
Lepidoptero sp. 2 3
191
Lepidoptero sp. 3 1 Lepidoptero sp. 4 1 HOMOPTERA Homoptero sp. 1 1 Homoptero sp. 2 1
DIPTERA Diptero sp. 1 4
TOTAL N° abrigos
Morfoespécies 41 Indivíduos 80
192
Distribuição espacial de Miconia ferruginata DC. (Melastomataceae) ao longo de um
gradiente altitudinal no PESCAN: um estudo de caso
Rosely Ferreira Freitas da Mata
Introdução
O domínio Cerrado é classificado como savana arbórea com densidade variando de 10 a 60%
neste tipo de composição. Apresenta fitofisionomia variada, desde vegetação rasteira até matas de
galerias, cobrindo mais de 20% do território brasileiro em altitudes que variam do nível do mar
até 1800m (Felfili 1998), sendo que, essa vegetação vem sendo aceleradamente substituída
principalmente por plantios de soja e para a produção de carvão devido à expansão urbana
(UNESCO 1998).
Segundo Hutchings (1997), as estruturas das populações vegetais resultam da ação de
fatores bióticos e abióticos sobre seus membros atuais e ancestrais, que afetam o arranjo espacial
e as estruturas etária e genética de seus componentes. A exploração do hábitat modifica
severamente sua estrutura (Lieberman & Dock 1982, Hoffman 1998), atuando diretamente no
padrão de distribuição espacial (Almeida et al. 1998) e fenológico das espécies nativas (Clark &
Clark 1987, Costa & Magnusson 2003), já que diferentes fatores do ambiente, como luz incidente
umidade e disponibilidade de nutrientes, também serão afetados (Rossi & Huguchi 1998). Assim,
a alteração de ambientes naturais permite a entrada de novas espécies nestes locais,
principalmente aquelas que possuam uma grande resistência a condições ambientais mais
extremas e que podem ser consideradas espécies pioneiras ou invasoras (Roy 1990).
A família Melastomataceae possui mais de 4800 espécies, sendo que a maior parte se
distribui na região Neotropical (Stiles & Rosselli 1983). O gênero Miconia é o maior da família
com cerca de 1000 espécies (Meyer 1998), que podem ser componentes do sub-bosque de
florestas primárias, porém ocorrem principalmente em áreas secundárias, bordas de floresta e
clareiras naturais no interior de florestas, por esta razão podendo ser consideradas como espécies
pioneiras ou invasoras (Schupp et al. 1989, Denslow et al. 1990, Ellison et al. 1993). Em geral,
as plantas desse gênero são extremamente diversas em sua arquitetura reprodutiva e vegetativa,
produzem uma grande quantidade de sementes e suas plântulas podem se estabelecer rapidamente
no solo de ambientes degradados (Snow 1965; Stiles & Rosselli 1983; Judd 1986).
193
A espécie Miconia ferruginata DC. (Melastomataceae) é um arbusto de até dois metros de
altura que ocorre somente no Brasil, nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso,
Goiás, Bahia e Distrito Federal. Esta espécie está bem representada nas formações rupestres do
Brasil conforme os trabalhos de Giulietti et al. (1987), Baumgratz et al. (1995), Munhoz &
Proença (1998) e Romero & Martins (2002). No Parque Estadual da Serra de Caldas Novas,
Goiás, aparece no cerrado sensu stricto e nas formações rupestres (Santos 2003).
Os solos do cerrado, em geral, são profundos, bem drenados, possuindo uma reduzida
fertilidade natural, a soma de bases trocáveis é baixa, a acidez é alta, resultando em altos níveis
de saturação por alumínio (Batmaniam & Haridasam 1985). Alguns autores explicam a
ocorrência das diversas fitofisionomias que compõem o cerrado como conseqüência da natureza
distrófica dos solos em combinação com fatores climáticos (Coutinho 1990) que, juntamente com
a altitude, respondem pelas variações locais na estrutura florística, sendo de grande importância
para a explicar a heterogeneidade que caracteriza este ambiente.
Considerando que a altitude pode afetar a estrutura florística e influenciar a distribuição de
algumas espécies de plantas do cerrado, o objetivo deste trabalho foi analisar o padrão de
distribuição espacial de uma população de Miconia ferruginata DC. ao longo de um gradiente
altitudinal no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas.
Especificamente, procurou-se responder às seguintes questões: 1) A variação no número de
indivíduos de M. ferruginata está relacionada à altitude? e 2) Qual é o padrão de distribuição da
população de M. ferruginata na área estudada?
Material e Métodos
Os dados foram coletados em diferentes altitudes ao longo da estrada principal do Parque
Estadual da Serra de Caldas Novas-GO (PESCAN), localizado no município de Caldas Novas–
GO, em outubro/novembro de 2005. A extremidade inferior da estrada, 755m de altitude,
apresenta uma fitofisionomia de cerradão com uma alta densidade vegetal, contendo algumas
espécies arbóreas de 12m ou mais de altura, solos profundos com cascalho e latossolo vermelho.
À medida que aumenta a altitude, esta fitofisionomia cede lugar ao cerrado rupestre, que
apresenta estrato arbóreo-arbustivo mais espaçado e solo raso e pedregoso, com afloramentos
rochosos bem evidentes. Na extremidade superior, 988m de altitude, se encontra o platô da serra
composto de cerrado sensu stricto, com um estrato arbóreo-arbustivo geralmente em torno de 6
194
ou 7 metros e um estrato rasteiro mais ou menos contínuo, solos mais profundos e latossolo
amarelo.
Foram amostrados sete pontos aleatórios ao longo de uma área de escarpa, variando de 755
até 988 m acima do nível do mar. Para cada ponto, foram feitos 10 parcelas de 10 x 10 m, em
transectos perpendiculares à estrada do Parque, totalizando uma área amostral de 0,1 ha para cada
ponto, onde foram registrados os números de indivíduos de M. ferruginata.
A caracterização do solo foi feita nos locais através de visualização. Cada ponto foi geo-
referenciado com o auxílio de um GPS, e suas altitudes indicadas (Tabela 1).
Para a análise dos dados realizou-se o índice de dispersão de Morisita (Id) (Brower & Zar
1984), cuja significância do valor do Id foi testada a partir da estatística F, com nível de confiança
de 0,05 (Poole 1974).
Tabela 1. Características de solo, altitude e coordenadas geográficas das áreas amostradas do PESCAN
Local
Solo
Altitude
Coordenadas
1 Profundo com cascalho, latossolo vermelho 755 17º16’10,0”S, 48º39’30,0”O
2 Raso, rochoso, com acentuado declive 796 17º46’17,2”S, 48º39’37,9”O
3 Raso, rochoso, com acentuado declive 831 17º46’19,9”S, 48º39’45,7”O
4 Raso, rochoso, com acentuado declive 888 17º46’24,8”S, 48º39’55,8”O
5 Raso, rochoso, com acentuado declive 904 17º46’29,3”S, 48º40’00,8”O
6 Raso, rochoso, com acentuado declive 946 17º46’45,2”S, 48º40’00,0”O
7 Profundo sem cascalho, latossolo amarelo, plano 988 17º47’00,0”S, 48º40’04,8”O
Resultados e Discussão
A análise da Figura 1 indica que a maior abundância de M. ferruginata ao longo da escarpa
está concentrada entre as altitudes de 830 a 900 m acima do mar. Desta forma, aparentemente
existe relação da variação do número de indivíduos de M. ferruginata com a altitude, embora o
195
aumento do número de indivíduos seja máximo por volta dos 900m de altitude, sendo mais difícil
encontrar a espécie em altitudes superiores a esse valor.
Figura 1. Número de indivíduos de M. ferruginata encontrados ao
longo de um gradiente altitudinal no PESCAN
Entretanto, o fator edáfico e a luminosidade do local também poderia estar corroborando
para que a espécie se restrinja às altitudes supracitadas, uma vez que estas áreas apresentam
acentuada declividade, solos rasos e pedregosos, com afloramentos rochosos bem evidentes e
estrato arbóreo-arbustivo mais esparso. Vários trabalhos relatam que os representantes da família
Melastomataceae costumam ser encontrados em regiões de solo degradado (Snow 1965, Stiles &
Rosselli 1983, Judd 1986) e com incidência luminosa, tais como bordas de floresta e clareiras
naturais no interior de florestas (Schupp et al. 1989, Denslow et al. 1990, Ellison et al. 1993).
Considerando que as áreas a 755 e 988m de altitude apresenta solos profundos, sem afloramentos
rochosos e menor luminosidade, em decorrência da maior cobertura vegetal, diferentemente das
altitudes intermediárias, estes ambientes poderiam ser um fator limitante para a espécie. Como a
diversidade de fitofisionomias do cerrado é explicada por alguns autores como uma associação
entre a natureza dos solos, fatores climáticos e altitude atuando diretamente sobre as variações na
estrutura florística, a distribuição populacional de M. ferruginata no local poderia ser explicada
por estas variáveis atuando em conjunto.
0
20
40
60
80
100
120
140
750 800 850 900 950 1000
Altitude (m)
Núm
ero
de In
diví
duos
0
20
40
60
80
100
120
140
750 800 850 900 950 1000
Altitude (m)
Núm
ero
de In
diví
duos
196
Foram amostrados o total de 270 indivíduos M. ferruginata. O valor do Índice de Dispersão
de Morisita (Id) encontrado foi de 5,22 (F = 17,45; p < 0,05), indicando um padrão de
distribuição agregado para a população (Id > 1; Brower & Zar 1984). Este padrão de distribuição
está relacionado às diferentes condições estruturais do ambiente, que produz nichos ecológicos
diferentes que podem vir a ser ocupados por espécies mais adaptadas. Nesse caso, o solo, a
altitude e a luminosidade, como mencionados anteriormente, poderiam ser as variáveis
direcionadoras deste padrão. O padrão agregado de distribuição é, ainda, característico de
espécies vegetais dispersas por animais ou que realizam sua dispersão por autocoria (barocoria) e
está relacionado, também, com a quantidade de sementes produzidas e a duração do período de
frutificação (Janzen 1976). Assim, a dispersão de sementes poderia ser outro fator importante na
manutenção deste padrão de distribuição da espécie na área estudada. Os dados obtidos não
permitem afirmar categoricamente quais variáveis atuam positivamente para direcionar as áreas
de ocorrência da espécie. Desta forma, faz-se necessário estudos em outras áreas a fim de
verificar quais os fatores que norteiam efetivamente a distribuição de M. ferruginata.
Conclusões
Aparentemente existe relação da variação do número de indivíduos de M. ferruginata com o
aumento da altitude, embora este aumento possa estar intimamente relacionado à altitude, ao solo
e luminosidade atuando em conjunto. O número máximo de indivíduos é encontrado por volta
dos 900m de altitude, sendo mais difícil encontrar a espécie em altitudes superiores a esse valor.
A população estudada possui distribuição agregada. Isto pode ser decorrente das
características ambientais descritas acima, bem como do padrão de dispersão de sementes da
espécie.
197
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200
Influência da cobertura vegetal e recurso alimentare na densidade de abrigos de Clyomys
sp. em área de Campo Cerrado no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas, GO
Aluna: Vanessa Nascimento Ramos Furtado
Introdução
O gênero Clyomys (Rodentia: Echimyidae) é constituído por apenas duas espécies,
Clyomys laticeps e Clyomys bishopi, sendo que estas ocorrem em áreas abertas, como o Cerrado
(Walker, 1975; Eisenberg & Redford, 1999). São coloniais, e distinguem-se de outras espécies de
equimídeos por apresentarem garras nas patas dianteiras, (Alho et al., 1987; Anciães et al., 1997).
Suas tocas contribuem para o aumento da complexidade do hábitat e da biodiversidade no
Cerrado, pois quando abandonadas, servem de abrigo para inúmeros outros animais (Uezu et al.,
2000).
Os frutos da palmeira Attalea sp., comum no Cerrado (Joly, 1975), representam um item
importante de sua alimentação (Contrera et al., 2000). É importante ressaltar que esses roedores
podem não somente ter o papel de predadores desses frutos , mas também de dispersores, uma
vez que é encontrada grande quantidade de frutos em galerias abandonadas (Belentani & Cunha,
2000) muitas vezes sem dano às sementes, que poderiam vir a germinar.
A distribuição de um animal em um ambiente pode estar associada a sua preferência por
locais específicos (Alcock, 1984). Essa preferência é direcionada, muitas vezes, pela presença de
recursos alimentares e locais que sirvam como abrigo. A presença de abrigos tem várias
implicações para a sobrevivência da espécie. Representa um refúgio contra intempéries
ambientais (como a exposição ao sol), além de um local no qual o animal pode se esconder de
predadores.
Dentre predadores potenciais de Clyomys sp., destaca-se o Lobo-guará (Chrysocyon
brachyurus) (Bueno, 2003). A predação pode atuar como uma pressão seletiva nas populações de
presas porque, para sobreviver, é necessária a habilidade de evitar sua detecção (Krebs e Davis,
1987). Nesse ínterim, um comportamento passível de ter evoluído nesta espécie é a escolha de
locais mais apropriados para a construção de tocas. Uma cobertura vegetal densa o suficiente para
escondê-las de predadores, considerando que o Cerrado é uma formação de vegetação aberta,
dificultaria a detecção visual das tocas por seus predadores, além de camuflar os próprios animais
durante o forrageamento. É interessante a consideração desse fator, e não apenas pensar em
201
escolha de hábitat direcionada pelo recurso alimentar, uma vez que a estratégia ótima para uma
espécie seria a de maximizar a diferença entre os benefícios (alimento abundante e próximo) e os
custos (risco de ser predado), segundo prediz a teoria do forrageamento ótimo (Pianka, 1994).
Objetivos
Verificar se o número de tocas de Clyomys sp está relacionado com a densidade de
palmeiras e com a cobertura vegetal.
Hipóteses
1. Espera-se encontrar um maior número de tocas nos locais com maior cobertura vegetal.
2. Existe uma correlação positiva entre o número de tocas e de palmeiras (recurso alimentar).
3. Existe correlação positiva entre o número de tocas recentes e o número de palmeiras com fruto.
Materiais e Métodos
O estudo foi realizado entre os dias 30 de outubro e 02 de novembro de 2005, em área de
Campo Cerrado, no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas (PESCAN), Caldas Novas, Goiás.
Foram traçados cinco transectos lineares de 150m cada, distantes 300m um do outro,
perpendiculares à estrada e distando 10m desta. Foi marcada a cada 50m uma parcela de 10 x
50m, destinada à área amostral localizada à direita do transecto.
Em cada parcela, foi contado o número total de tocas e o número de tocas recentes; o
número total de palmeiras Attalea sp. e quantas estavam frutificadas. A cobertura vegetal foi
estimada de acordo com o grau de dificuldade em se observar a entrada das tocas, classificado em
1-fácil (abertura da maioria das tocas bastante visível sem o afastamento manual da vegetação),
2-médio (abertura da maioria das tocas visível apenas após o afastamento manual da vegetação) e
3- difícil (grande dificuldade para visualizar o orifício de abertura da maioria das tocas, mesmo
após afastamento manual da vegetação).
Foram feitos os testes de Correlação de Spearman entre tipo de cobertura vegetal e
número de tocas e Correlação de Pearson entre número total de tocas e de palmeiras e número de
tocas recentes e de palmeiras com frutos (Zar, 1999). Todos os dados foram analisados com o
auxílio do Programa Systat 10.0 para Windows.
202
Resultados e Discussão
Foi encontrada alta densidade de tocas e palmeiras por parcela (Tabela 1). No entanto,
vale lembrar que muitas das aberturas amostradas podem ser extensões de uma mesma colônia,
que pode chegar a ter mais de dez aberturas a até 36m de extensão (Belentani & Cunha, 2000).
Das tocas amostradas, 26,9% haviam sido construídas recentemente. Quanto às palmeiras, 21,4%
estavam frutificadas.
Tabela 1. Número médio de palmeiras e tocas amostradas em área de Campo Cerrado no
PESCAN.
Por parcela (500m²) Por hectare
Palmeiras 87,9 1802,0
Palmeiras com fruto
18,8 376,0
Total de tocas 54,6 1000,0
Tocas recentes 14,7 294,0
Apesar de haver referência sobre a ocorrência desse roedor ser muito pequena em locais
onde essas palmeiras não estão presentes (Contrera et al., 2000), neste estudo o aumento do
número de palmeiras não explica o aumento do número de tocas (r = 0,20; n = 15; p = 0,47)
(Figura 1). Pode-se considerar que este recurso é importante para a escolha do local de
construção de abrigos, mas certamente existem outros fatores que influenciam mais na diferença
entre o número de tocas de cada local.
Houve alta correlação positiva entre número de tocas recentes e palmeiras com fruto
(Figura 2), sendo que grande parte da variação no número dessas tocas pode ser explicado pela
variação na quantidade de palmeiras frutificadas (r = 0,85; n = 15; p < 0,01). Isso reforça a
importância da disponibilidade de recursos alimentares e nos remete a idéia de que o fator que
realmente interfere no maior número de tocas é a presença de frutos, e não apenas das palmeiras.
203
Figura 1. Quantidade de tocas de Clyomys sp. em relação à densidade de Attalea sp.
Figura 2. Densidade de tocas recentes de Clyomys sp. em relação à densidade de palmeiras com
fruto.
0 50 100 1500
50
100
Número de palmeiras
Núm
ero
de to
cas
0 50 100 1500
50
100
Número de palmeiras
Núm
ero
de to
cas
0 10 200
10
20
30
Número de palmeiras com fruto
Núm
ero
de to
cas
rece
ntes
0 10 200
10
20
30
Número de palmeiras com fruto
Núm
ero
de to
cas
rece
ntes
204
O aumento do número de tocas se correlacionou positivamente com o aumento da
cobertura vegetal, sendo que grande parte de sua variação pode ser explicada por este fator (rs =
0,80; n = 15; p < 0,01) (Figura 3). A correlação encontrada reforça a hipótese de que áreas com
cobertura vegetal mais densa são selecionadas para a construção das tocas, em detrimento
daquelas nas quais os orifícios de entrada das tocas ficam mais expostos, por exemplo, à detecção
por predadores.
Figura 3. Quantidade de tocas de Clyomys sp. em relação à densidade de cobertura vegetal.
Conclui-se que Clyomys sp. possui uma estratégia de forrageamento que maximiza os
benefícios, construindo abrigos próximo à fonte de recursos alimentares e onde estes são mais
abundantes, em relação aos custos, selecionando áreas nas quais há maior proteção contra
predadores. Além disso, o que direciona a escolha das áreas com maior disponibilidade de
alimento é a presença dos frutos de Attalea sp., e não somente a presença das palmeiras.
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Núm
ero
de to
cas
Cobertura vegetal
0
50
100
1 2 3
(Visualização das tocas)
1 – fácil2 – médio3 – difícil
Núm
ero
de to
cas
Cobertura vegetal
0
50
100
1 2 30
50
100
1 2 3
(Visualização das tocas)
1 – fácil2 – médio3 – difícil
(Visualização das tocas)
1 – fácil2 – médio3 – difícil
205
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206
Crescimento em módulos do Caryocar brasiliense: um método alternativo para analisar a
alocação de biomassa para a reprodução
Victor Hugo Paula Rodrigues
Introdução
O crescimento de uma planta é uma resposta sensível ao ambiente. De maneira geral, o
desenvolvimento das plantas e de suas variadas formas são as personificações físicas deste
comportamento; estes representam uma resposta na variação do ambiente. Tal como o
comportamento de um animal, a forma da planta é principalmente direcionada para a aquisição de
recursos, sejam estes luz, água, nutrientes, ou agentes polinizadores e dispersores. (Waller, 1986)
De acordo com Hallé (1978), a altura total, a arquitetura, o diâmetro do tronco, o
crescimento, a alocação de recursos e as respostas fisiológicas são características que podem
variar entre as espécies conforme a disponibilidade de recursos e estabilidade (i.e. ocorrência de
fogo) do ambiente que elas ocupam.
O balanço entre o investimento em reprodução e em crescimento na vida de uma planta
pode ser quantificado por medidas de idade da maturidade reprodutiva, idade específica de
produção de sementes e de sua sobrevivência. Para isso é necessário realizar diferentes medidas
para quantificar o balanço entre reprodução e crescimento de uma planta numa determinada
estação. Este balanço é expresso como alocação reprodutiva (RA), na qual é definida como a
proporção do total de recursos assimilados anualmente pela planta que é investida na reprodução.
Na prática isto é determinado pela divisão do peso seco das partes das plantas, isto é, o peso seco
das partes reprodutivas e não reprodutivas (Silvertown, 1982).
Como conseqüência da ação dos fatores abióticos e disponibilidade de nutrientes no
habitat, as plantas apresentam distintos padrões de alocação de energia e matéria nas suas
estruturas. Estas diferentes estratégias têm por fim maximizar o sucesso reprodutivo do indivíduo
(Andrade et al, 2003).
Dessa forma, alguns estudos já foram realizados para se determinar alocação de biomassa
para as partes reprodutivas e não reprodutivas da planta (Jaramillo-Botero, 2003; Oliveira Neto et
al, 2003; Pereira et al, 2004). Porém estes estudos se concentram em espécies vegetais de
interesse comercial, como pinheiros, eucalipto e café.
207
Nestes, a proporção de biomassa alocada é mensurada a partir dos pesos secos de
diferentes partes das plantas, nos quais os indivíduos são submetidos a diferentes estresses
ambientais como a ausência de luminosidade, de água ou de nutrientes necessários às plantas.
Alguns trabalhos de cunho conservacionista como o de Thome et al (2003), analisaram a
alocação de biomassa através do peso seco dos verticilos reprodutivos e estéreis em quatro
plantas lenhosas nativas do Cerrado: Vellozia squamata Pohl (Velloziaceae), Vochysia elliptica
Mart. (Vochysiaceae), Styrax ferrugineus Nees & Mart. (Styracaceae), Solanum lycocarpum St.
Hill. (Solanaceae). Neste estudo verificou-se uma diferença significativa na alocação de biomassa
para as partes vegetativas (P<0,01) superior do que para as partes reprodutivas de V. elliptica, S.
ferrugineus e S. lycocarpum. Resposta diferente foi observada em relação à alocação de biomassa
de V. squamata que não apresentou diferença significativa (P=0,078) nessa variável.
Sendo assim, este estudo foi realizado com o objetivo de avaliar o investimento no
crescimento vegetativo e reprodutivo do Caryocar brasiliense, para testar as seguintes hipóteses:
1) Existe um incremento de biomassa diferenciado em módulos com e sem frutos de pequi? e 2)
Indivíduos de Caryocar brasiliense de áreas de cerrado sensu strictu apresentam diferenças de
crescimento dos módulos em relação aos indivíduos localizados em cerrado rupestre?
Material e Métodos
Local do estudo
O presente estudo foi desenvolvido no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas
(PESCAN), inserido no bioma Cerrado. É um dos mais importantes biomas do País, ocupando
22% do território nacional. Possui muitos tipos fisionômicos de vegetação, conferindo-lhe uma
alta biodiversidade. No entanto, é nessa área que se encontram os maiores produtores de grãos e
pecuaristas do país. Em conseqüência desse apelo econômico, boa parte da vegetação nativa foi
derrubada, existindo, hoje, poucas unidades de conservação.
Foram selecionadas duas fitofisionomias distintas do PESCAN: o cerrado sensu stricto,
no platô, e o cerrado rupestre da encosta da Serra. O primeiro encontra-se estabelecido sobre
Latossolo vermelho-amarelo onde se espera baixa disponibilidade nutricional para as plantas; o
segundo sobre Litossolo com afloramento rochoso, e possivelmente com mais recursos
disponíveis.
208
Espécie Estudada
Caryocar brasiliense é uma espécie representativa da flora do cerrado, tanto pela área de
ocorrência como pelo potencial de utilização (alimentação, medicinal, melífero, ornamental,
oleaginoso e tanífero). Seu período reprodutivo ocorre de setembro a outubro, coincidindo com o
início da estação chuvosa. As flores são grandes e vistosas, de cor amarelada, reunidas em
inflorescências terminais paniculadas. Androceu formado por numerosos estames, soldados na
base ou formando grupos com filetes glandulares (Joly, 1976).
Coleta e análise dos dados
Em cada fitofisionomia, foram selecionados 15 indivíduos de Caryocar brasiliense, sendo
todos adultos (com estruturas reprodutivas). Em cada indivíduo foram escolhidos aleatoriamente
dois galhos (um com estrutura reprodutiva e um sem estruturas reprodutivas), onde a partir da
última bifurcação foi medido o crescimento modular do ramo.
Com o auxílio de uma fita métrica foram mensurados os comprimentos dos módulos
vegetativo e reprodutivo. Utilizando um paquímetro realizamos três medidas de diâmetro ao
longo dos módulos, para posteriormente obtermos a média. Utilizando – se da fórmula
matemática: Vcilindro: ÁreaBase x Altura, onde ÁreaBase = π*R2, foi possível calcular o volume dos
módulos.
As análises estatísticas foram realizadas utilizado o programa Systat 10.2 a uma
probabilidade de 5%. Os dados foram normalizados e, posteriormente realizado um Test-t
pareado para testar a hipótese de que existe diferença nos volumes dos módulos com e sem frutos
seguido de um Teste-t não pareado para verificar se existe diferença entre o volume dos módulos
de indivíduos de pequi do cerrado sensu strictu e cerrado rupestre de encosta.
Resultados e Discussão
O crescimento dos módulos diferiram significativamente entre os ramos com e sem frutos,
tanto na fisionomia do cerrado sensu strictu (T = 2,204; P = 0,045) quanto no cerrado rupestre (T
= 2,703; P = 0,017). Assim sendo, no cerrado sensu strictu e no cerrado rupestre os módulos com
frutos apresentaram maior volume do que os ramos sem frutos.
209
Tabela 1.0. Média do volume dos ramos de C. brasiliense com e sem frutos, nas fisionomias de cerrado sensu strictu e cerrado rupestre. Os dados apresentados são as médias e os desvios padrões.
Fisionomia Com frutos Sem Frutos
Cerrado 24,378 ± 2,366 14,928 ± 2,366
Rupestre 20,417 ± 3,112 9,247 ± 3,112
Esses resultados diferem dos encontrados por Thome et al (2003) com relação à
proporção de matéria seca para os verticilos reprodutivos e estéreis nas espécies estudadas, no
qual verificou em V. elliptica, S. ferrugineus e S. lycocarpum a alocação de biomassa para as
partes vegetativas foi significativamente (P<0,01) superior do que para as partes reprodutivas.
Resposta diferente foi observada em relação à alocação de biomassa de V. squamata que não
apresentou diferença significativa (P=0,078) nessa variável.
No caso do Caryocar brasiliense, esta diferença pode ser explicada, pelo fato de que os
ramos possuidores de frutos precisariam de um incremento maior de biomassa para suportar os
pesos desses até o final da maturação.
No entanto, não foi encontrada diferença significativa no crescimento dos ramos
vegetativos e reprodutivos nas duas fisionomias (Fig. 1 e 2).
210
Gráfico 01. Gráfico representando o volume dos ramos vegetativos nos diferentes ambientes (cerrado sensu strictu e cerrado rupestre). (t= 1,576; P= 0,126).
Gráfico 02. Gráfico representando o volume dos ramos reprodutivos nos diferentes ambientes (cerrado sensu strictu e cerrado rupestre). (t=0,825; P= 0,417).
Neste caso, é plausível imaginar que os ramos vegetativos, isto é, sem frutos, poderiam
estar investindo num crescimento longitudinal. No entanto, após a análise de um teste t pareado,
não foi observado nenhuma diferença no tamanho dos ramos no cerrado sensu strictu (Gráfico
3.0). Resultado ainda não definitivo, uma vez que a estação de crescimento para o Caryocar
brasiliense ainda não cessou. Até o fim desta, é possível encontrar alguma diferença, pois as
plantas continuarão alocando recursos tanto para o incremento de volume nos ramos reprodutivos
quanto para a formação do fruto, enquanto que os ramos vegetativos continuariam os
investimentos no crescimento longitudinal.
RupestreCerrado
AREA
3
10
31
100
RE
PRO
DU
TIVO
(cm
3 )
024681012 0 2 4 6 8 10 12RupestreCerrado
AREA
3
10
31
100
RE
PRO
DU
TIVO
(cm
3 )
024681012 0 2 4 6 8 10 12
RupestreCerrado
AREA
1
3
10
31
100
VEG
ETA
TIVO
(cm
3 )
024681012 0 2 4 6 8 10 12RupestreCerrado
AREA
1
3
10
31
100
VEG
ETA
TIVO
(cm
3 )
024681012 0 2 4 6 8 10 12
211
Grafico. 03. Gráfico representando o comprimento dos ramos vegetativos e reprodutivos no cerrado sensu strictu. (t= 1,815; P= 0,091). Gráfico 04. Gráfico representando o comprimento dos ramos vegetativos e reprodutivos no cerrado rupestre. (t= 2,355; P= 0,034).
VEGETATIVO
REPRODUTIVO
Ramo
5
10
20
40
Com
prim
ento
(cm
) VEGETATIVO
REPRODUTIVO
Ramo
5
10
20
40
Com
prim
ento
(cm
)
VEGETATIVO
REPRODUTIVO
Ramo
3
3,1
10
31
56
Com
prim
ento
(cm
)
VEGETATIVO
REPRODUTIVO
Ramo
3
3,1
10
31
56
Com
prim
ento
(cm
)
212
No cerrado rupestre foram encontradas a existência de um maior crescimento no
comprimento dos ramos reprodutivos (Gráfico 4.0). Tal fato poderia ser explicado pela presença
de fatores abióticos que estariam diminuindo os custos da reprodução dos indivíduos de
Caryocar brasilense do cerrado rupestre, pois, como já são conhecidos, os solos litólicos
possuem uma maior riqueza de nutrientes quando comparados com os latossolos do cerrado
sensu strictu. Um fator interessante observado durante a coleta de dados, foi de que os indivíduos
do cerrado rupestre apresentavam uma menor produção de frutos. Se este fato puder comprovar-
se com futuros estudos, conclui-se que o gasto destes também estaria sendo menor, podendo
deste modo não “sacrificar” tanto seu crescimento longitudinal em função do processo
reprodutivo. E como já dito anteriormente, com o final da estação de crescimento do pequi,
espera-se encontrar um maior crescimento do comprimento nos ramos vegetativos.
Os dados obtidos nesse trabalho foram capazes de apresentar evidências na alocação de
biomassa em virtude do processo reprodutivo do pequi, demonstrando a eficácia deste método em
estudos desta natureza. Aliando isto às políticas burocráticas das Unidades de Conservação de
nosso país, como por exemplo, a proibição da retirada de qualquer tipo de material biológico dos
Parques, este método se mostra pertinente, uma vez que a coleta de dados é feita no local, sem
que seja necessário a retirada de partes das plantas.
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214
Estratégias adaptativas em plantas de cinco fisionomias de Cerrado do Parque Estadual da
Serra de Caldas Novas, GO
Wender Faleiro
RESUMO
Comunidades Vegetais variam em composição e riqueza de espécies dependendo das condições
abióticas locais. O sucesso reprodutivo de colonização de uma espécie em um ambiente depende
das estratégias adaptativas que a planta apresenta. Este estudo analisou respostas morfológicas
foliares, em relação à variação de cinco diferentes fisionomias do Cerrado. Detectou-se uma
tendência da mata de galeria apresentar espécies com folhas mais alongadas, maiores e com
pecíolos mais compridos e o campo e cerrado rupestre folhas menores e sésseis. As variações
fenotípicas observadas nas 34 espécies, nas cinco áreas de estudo, devem estar ocorrendo como
meio de aumentar a captação de luz. Deste modo, as diferenças morfológicas significativas
encontradas, podem ser consideradas adaptativas, haja vista estarem contribuindo para a
estabilidade funcional destas plantas.
Palavras-chaves: Estratégias ecológicas, Variações fenotípicas, Cerrado.
Introdução
O Cerrado, que se localiza no Planalto Central, é um complexo vegetacional que ocupava
originalmente cerca de 22% do território brasileiro (Ribeiro & Walter 1998; Ratter & Oliveira-
Filho 2002) com diversas fisionomias, englobando formações florestais, savânicas e campestres.
Este bioma é caracterizado por clima não muito variável, com estação seca bem definida (Nimer
& Brandão 1989), e por apresentar grande variação edáfila quanto à textura, fertilidade e
composição mineral, que influencia no aspecto geral da vegetação (Furley & Ratter 1988). Deste
modo, a manifestação de plasticidade fenotípica e até mesmo a formação de ecótipos podem ser
bastante favorecidas, por este bioma apresentar ambientes heterogêneos e de transição (Fuzeto &
Lomônaco 2000).
O conjunto de espécies que compõe uma comunidade varia no tempo e no espaço, sendo
determinado por processos ecológicos e evolutivos. Nesta dinâmica, os fatores abióticos servem
215
como importantes filtros ambientais, definindo quais das espécies presentes em escala regional
estarão representadas em escala local, através das estratégias adaptativas que apresentam. Desta
forma, pode-se notar em espécies de plantas uma série de atributos relacionados à variação das
condições ambientais e da disponibilidade de recursos, que podem ser vistas como estratégias
estruturais, fisiológicas, ou comportamentais (Crawley 1997).
Dentre os fatores ambientais que influenciam a dinâmica de comunidades vegetais, a
disponibilidade de água é, provavelmente, um dos fatores mais limitantes já que representa um
recurso essencial para as plantas, estando envolvida em sua composição, estrutura e metabolismo.
A altura da planta e o tamanho da folhas estão fortemente relacionados à competição por luz e
trocas gasosas, e ambas são dependentes da disponibilidade de água e nutrientes. A espessura
foliar pode ser determinada tanto por fatores abióticos, luz, água e nutrientes, como por bióticos,
defesa contra herbívoros. Neste caso, a planta tende a alocar mais carbono no espessamento da
folha em locais mais pobres em recursos, já que nestes casos o custo de dano ou perda de uma
folha é superior àquele de locais mais ricos (Pinheiro 2001).
Essa habilidade, que as plantas possuem, em alterar caracteres fenotípicos em decorrência
da interação com o ambiente pode contribuir para a sua estabilidade funcional, em especial
quando a plasticidade fenotípica age sobre caracteres ligados à sobrevivência, tornando-se, deste
modo, uma ferramenta muito importante para sua adaptação (Reis 2003).
O grau de plasticidade em relação à variação de luz é inerente a cada espécie, e pode ter
papel fundamental na sobrevivência de plantas em ambientes heterogêneos e variáveis (Petit et
al. 1996), como o dos Cerrados, e pode explicar diferenças na distribuição ecológica e geográfica
das espécies. Em vista disso, o presente trabalho analisou respostas morfológicas foliares, em
relação à variação típica de cinco diferentes fisionomias do Cerrado, com o intuito de ajudar a
explicar a ocorrência e distribuição das espécies na natureza.
O trabalho procurou responder às seguintes questões: a) as respostas morfológicas
apresentadas pelas espécies diferem entre as fisionomias? b) as fitofisionomias com
características mais abertas (cerrado sensu stricto, cerrado rupestre e campo rupestre) apresentam
folhas menores, concolor, coriáceas e com maior pilosidade em relação às de áreas mais fechadas
(cerradão e mata de galeria)? c) as respostas dadas pelas espécies em relação às variações foliares
são coerentes com o ambiente de ocorrência?
216
Material e métodos
O estudo foi realizado no Parque Estadual da Serra de Caldas Novas - PESCAN -
(17º46’03,0”S e 48º39’37,4”W – 755 m de altitude), localizado entre os municípios de Caldas
Novas e Rio Quente, no sudoeste de Estado de Goiás. A região apresenta clima do tipo AW,
segundo a classificação de Koppen, com verão quente e úmido e inverno frio e seco.
As coletas foram realizadas no mês de outubro/2005, início da estação chuvosa, em cinco
fisionomias diferentes de Cerrado (cerrado sensu stricto, cerrado rupestre, campo rupestre,
cerradão e mata de galeria). O cerrado apresenta uma vegetação xeromorfa, semidecídua e de
porte médio. Os campos são formados por uma vegetação baixa, constituída por um estrato
herbáceo-arbustivo contínuo, composto principalmente por gramíneas. O cerradão apresenta uma
expressiva quantidade de espécies de Cerrado, sobrepostas a um número de espécies de mata, sua
estrutura e fisionomia são florestais, com dossel fechado, devido a elevada densidade de árvores.
As matas de galeria são formações perenifólia que ocorrem nos terrenos úmidos ao longo dos
cursos d’água.
Em cada comunidade vegetal foram escolhidas, aleatoriamente, 10 espécies lenhosas
diferentes, de folhas simples (Tabela 4). Dessas, foram selecionados três indivíduos de porte
semelhante, para coleta de três folhas de suas copas, totalizando nove folhas para cada espécie.
Somente foram utilizadas folhas sem danos causados por herbívoros ou patógenos e plenamente
expandidas, permitindo assim minimizar a interferência do estágio de desenvolvimento foliar
sobre suas dimensões. As folhas utilizadas foram provenientes dos três primeiros nós, contados a
partir da base, de ramos coletados em três pontos ao longo da altura da copa.
Os caracteres foliares utilizados, para a distinção dos ecótipos, foram: Filotaxia, forma,
coloração, presença de pêlos, consistência, tipo de borda, área foliar (AFo),comprimento do
pecíolo (CP), índice foliar (IF).
As medidas do CP foram feitas com auxílio de paquímetro (precisão de 0,05mm). Para
todas as espécies foram medidos o comprimento e a largura do limbo foliar. A largura da folha
foi obtida na região que compreende a metade do comprimento do limbo (figura 1A). Em
seguida, era calculado o IF dividindo-se o valor do comprimento do limbo (CL) pelo da sua
largura (LL). O IF caracteriza o formato foliar, folhas com valor de IF~ 1 (um) são arredondadas,
ou seja, tão longas quanto largas; IF < 1 são mais largas que longas; IF> 1 são proporcionalmente
217
mais alongadas (figura 1B). Por se tratar de uma razão entre duas variáveis de comprimento, o IF
não apresenta unidade de medida.
Para cálculo da AFo utilizou-se transparência com grides de 0,5cm², com pontos
centralizados, onde os pontos que preenchiam o limbo eram contados e posteriormente
multiplicados por 0,5 e, o valor obtido correspondia à sua AFo.
Os testes estatísticos foram conduzidos utilizando o programa SYSTAT® versão 10.2. Os
valores de cada variável foram submetidos ao teste Kolmogorov-Smirnov (opção: Lilieforms),
para verificar se apresentavam distribuições normais. Baseando nos resultados deste pré-teste,
optou-se pelo uso de estatística não-paramétrica para todas as variáveis, exceto para IF.
Diferenças entre as áreas de estudo, em relação ao CP e à AFo foram obtidas com o teste Kruskal-
Wallis, e em relação ao IF com Análise de Variância (ANOVA). Comparações múltiplas foram
realizadas empregando-se o teste Tukey (Zar 1984). As correlações fenotípicas entre AFo e as
variáveis IF e CP foram verificadas pelo teste de correlação simples de Pearson (Zar 1984).
v
*
Figura 1 A - Caracteres morfológicos medidos nas folhas. B - Relação entre índice foliar (IF) e o formato das folhas. CL = Comprimento do Limbo; LL Largura do Limbo.
Resultados e discussão Apenas Palicourea rigida do campo rupestre, apresentou IF ~ 1, ou seja, formato do
limbo arredondado. As demais espécies apresentaram IF > 1, o que caracteriza limbos foliares
com formatos alongados. A análise estatística indicou não haver significativa variação do IF entre
as cinco fitofisionomias estudadas (Figura 2). A maior média de IF foi encontrada na Mata de
Galeria, o que significa maior alongamento das folhas nessa área, e o menor no Campo Rupestre
(Tabela 1).
Largura do Limbo
Com
prim
ento
do L
imbo
Pecíolo Área Foliar
Metade do Comprimento
Limbo
A
IF ~1 IF <1 IF >1
IF = CL.LL-1
218
A Área Foliar (AFo), da mata de galeria, foi significativamente maior em relação às
outras quatro áreas de estudo (Figura 3) e, também, apresentou maior média de AFo (Tabela 1)
para todas as espécies, com exceção de Xylopia emarginata (5,67 cm²).
Em relação a outros caracteres morfológicos (Tabela 2), observou-se que a disposição das
folhas no caule do tipo verticilada é o mais raro em todas as áreas. Quanto à forma, folhas do tipo
elitica foram as mais encontradas, as do tipo lanceolada foram mais comuns nas áreas com maior
cobertura vegetal e as ovadas ou obovadas, nas de menor. Folhas concolor foram mais comuns
nas áreas mais abertas e não houve diferença nas áreas fechadas. Folhas coriáceas tiveram
maiores porcentagens no campo e cerrado rupestres, no Cerrado sensu stricto houve alto índice
de folhas membranáceas, porém destas 57% apresentaram látex. Bordo inteiro foi o mais comum,
principalmente, nas áreas com maior cobertura vegetal. Em relação à presença de pêlos, foi
similar, entre as áreas, esperava-se que esta fosse maior nas áreas mais abertas, pois os tricomas
protegeriam e reduziriam a velocidade de transpiração. Johnson (1975); Chazdon & Kaufmann
(1993) têm opinião contrária e afirmam serem os tricomas responsáveis pelo aumento da
transpiração por constituírem superfície adicional de evaporação.
219
Least Squares Means
Campo rupest
Cerradão
Cerrado
Cerrado Rupe
Mata de Gale
AMBIENTE
-2.0
0.6
3.2
5.8
8.4
11.0
IND
ICE
FOL I
AR
Figura 2 – Comparação entre cinco fitofisionomias do Cerrado do PESCAN-GO, quanto ao Índice Foliar (IF). Letras diferentes indicam diferenças significativas, a 5% de significância, segundo o teste não-paramétrico Tukey. Analysis of Variance Test Statistic (F0,05(1)4,455) = F1,078 P 0,369.
Least Squares Means
Campo rupest
Cerradão
Cerrado
Cerrado Rupe
Mata de Gale
AMBIENTE
21.0
51.5
82.0
112.5
143.0
AREA
FOLI
AR
Figura 3 – Comparação dos valores de Área Foliar (AFo, em Cm²) entre cinco fitofisionomias do Cerrado do PESCAN-GO. Letras diferentes indicam diferenças significativas, a 5% de significância, segundo o teste não-paramétrico Tukey. Kruskal-Wallis Test Statistic (H0,05;60;60;60;60;60) = 17.256 P=0.002 GL 4.
a a
a
a
a
220
Muitos trabalhos mostram que o sombreamento pode induzir aumento da área foliar,
como uma maneira de se compensar a baixa intensidade luminosa (Pons et al. 2001;
Niinemets 1999; Pigliucci et al. 1995). Isto porque o adensamento da vegetação reduz a
luminosidade na região abaixo do dossel, o que demandaria aumento da área foliar para
melhor captação da luz. Uma vez que as folhas de ambiente sombreado transpiram menos que
folhas expostas diretamente à luz, o aumento na área foliar poderia ocorrer sem
necessariamente causar excessiva perda de água por transpiração. De fato, Hlwatika & Bhat
(2002), estudando anatomia e morfologia de onze espécies lenhosas, sugeriram que a
folhagem responde primeiramente às funções fotossintéticas ao invés do controle da perda de
água pela transpiração.
Vários outros fatores podem, ainda, influenciar o tamanho foliar. Killingbeck &
Tainsh (2002), por exemplo, investigaram a relação entre as dimensões do limbo e
potencialidades para reabsorção de nitrogênio e fósforo em duas espécies de florestas
decíduas. O número e o tamanho de células epidérmicas foi influenciado pela elevação de gás
carbônico atmosférico (Ferris et al. 2002). A morfologia foliar pode refletir a ação de
inimigos naturais, tendo sido observado que a ação de nematóides parasitas em raízes resultou
em drástica redução do crescimento da planta, diminuindo também o tamanho foliar (Carneiro
et al. 2001). Passioura (2002) e Schmidt & Zotz (2001) advertem que as condições do solo
podem afetar indiretamente a aparência da folha, por meio de múltiplas interações hormonais.
Além disso, quando as restrições hídricas são muito severas, as plantas podem apresentar
respostas plásticas que envolvem redução do limbo foliar (Pedro et al. 2002). Entretanto, em
alguns trabalhos, as variações nas características foliares não se relacionam com a umidade do
solo (Engel et al. 2002), nem com índices pluviométricos (Lamont et al. 2002).
221
Tabela 1 – Média de alguns caracteres foliares em cinco fitofisionomias do Cerrado do PESCAN-GO. AFo – Área Foliar; IF - Índice Foliar; CP - Comprimento do Pecíolo; X –Média Aritmética; Vmáx –Valor máximo; Vmin – valor mínimo.
AFo (Cm²) IF CP (Cm)
Fisionomias
X Vmáx Vmin
X Vmáx Vmin
X Vmáx Vmin
Cerrado sensu stricto 65,83 133,00 12,66 2,37 5,92 1,57 1,32 5,30 0,27
Cerrado Rupestre 43,78 183,68 5,33 1,95 3,52 1,18 0,53 2,10 0,10
Campo rupestre 60,57 213,00 10,00 1,74 3,38 0,96 0,58 1,90 0,10
Cerradão 56,61 138,33 16,33 2,49 4,32 1,60 1,11 3,33 0,10
Mata de Galeria 121,58 666,00 5,67 2,86 5,00 1,63 1,64 4,25 0,10
Tabela 2 – Porcentagem de alguns caracteres foliares em cinco fitofisionomias do Cerrado do PESCAN-GO. Filotaxia:Alt –alterna;Opo –oposta; Ver –verticilada. Forma: Lan –lanceolada; Eli –elitica; Ov –ovada; Ob-obovada. Coloração: Con –concolor; Dis –discolor. Presença de Pêlos: Gla – glabra; Pil –pilosa; Consistência: Cor –coriácea; Men –membranácea. Tipo de borda: Int –inteiro; NInt –não inteiro.
Filotaxia Forma Coloração Pêlos Consistência Borda
Fisionomias Alt Opo Ver Lan Eli Ov/Ob Con Dis Gla Pil Cor Mem Int N Int Látex
Cerrado sensu stricto 50 50 0 20 50 30 80 20 40 50 30 70 60 40 40
Cerrado Rupestre 20 70 10 0 70 30 60 40 60 40 70 30 70 30 10
Campo rupestre 30 60 10 10 30 50 70 30 50 50 90 10 70 30 10
Cerradão 50 40 10 30 70 0 50 50 50 50 30 50 100 0 10
Mata de Galeria 50 40 10 40 50 10 50 50 60 40 40 60 100 0 10
*valores expressos em %
Least Squares Means
Campo rupest
Cerradão
Cerrado
Cerrado Rupe
Mata de Gale
AMBIENTE
0.0
0.5
1.0
1.5
2.0
PE
CIO
LO
Figura 4 – Comparação entre cinco fitofisionomias do Cerrado do PESCAN-GO, quanto ao Comprimento do Pecíolo (CP, em Cm). Letras diferentes indicam diferenças significativas, a 5% de significância, segundo o teste não-paramétrico Tukey. Kruskal-Wallis Test Statistic (H0,05;60;60;60;60;60) = 29,550 P=0.0001 GL 4.
a a
ab
b
b
222
No presente estudo, o tamanho do pecíolo diferiu significativamente entre as áreas, o
campo e o cerrado rupestres diferiram do cerrado e da mata de galeria (Figura 4). Roupala
Montana, coletada no cerrado, apresentou o maior comprimento de pecíolo (5,3 cm), bem
superior à média (x =1,049 cm) das outras espécies, coletadas nessa área. As maiores médias
foram encontradas na mata de galeria para todas as espécies, com exceção de Xylopia
emarginata (x = 0.1 cm). E, encontrou-se quatro espécies sésseis, duas no cerrado rupestre e
duas no campo rupestre.
Pecíolos podem, adaptativamente, ajustar seu comprimento para aumentar a exposição
do limbo à luz, evitando a superposição (King & Maindonald 1999; Kimura & Simbolon
2002). Niklas (1999) e King (2001) advertem que, embora pouco se conhece sobre a estrutura
mecânica e funções adaptativas do pecíolo, descobertas nos campos da computação gráfica e
arquitetura de plantas revelam padrões de regulação complexos, envolvendo harmônios,
influencia de fatores ambientais, além de descartarem sua importância na estruturação
arquitetônica da planta. Deste modo, a tendência para o alongamento do pecíolo nas áreas
mais sombreadas pode não ter ocorrido somente por influencia direta de determinado fator
ambiental.
Detectou-se, uma tendência, da mata de galeria apresentar espécies com folhas mais
alongadas, maiores e com pecíolos mais compridos e o campo e cerrado rupestre folhas
menores e sésseis. Essa tendência, na área mais sombreada, pode estar relacionada com a
maximização do aproveitamento da energia luminosa, possivelmente diminuindo a
sobreposição das folhas de um mesmo ramo. Musil et al. (2002) detectaram alterações no
formato foliar, quando estas eram expostas a elevadas concentrações de radiação ultravioleta,
indicando respostas adaptativas morfofotogenéticas.
Correlação significativa positiva foi encontrada, somente, no cerrado sensu stricto
entre AFo e CP, e correlação negativa entre AFo e IF, na mata de galeria (Tabela 3).
Na escolha, aleatória, das espécies (Tabela 4), algumas se repetiram em outra área de
estudo, e para elas, foi feita Análise de Variância, para verificar diferenças na mesma espécie
ocorrendo em ambientes diferentes. Para Neea theifera, Vockisia eliptica, Byrsonima
Coccolobifolia e Miconia ferruginata não foram encontradas diferenças significativas quanto
AFo, IF e CP, possivelmente, devido à similaridade entre as áreas (campo e cerrado rupestres)
em que estas espécies foram coletadas, repetidamente. Em Ouratea hexasperma, encontrou-se
diferenças significativas entre o cerrado e campo rupestre para AFo (F0,05(1)17 24,846; P
0,008); e IF (F0,05(1)17 16.721, P 0,01), também, foi encontrado diferenças significativas quanto
a AFo (F0,05(1)25 46,716; P 0,001); e ao IF (F0,05(1)25 70,375, P 0,0001) para Davilla eliptica do
223
cerrado, campo e cerrado rupestres. Nessas duas espécies, foram encontrados AFo e IF bem
maiores nas área de cerrado sensu strictu (mais sombreada) que nas de campo e cerrado
rupestres. Emmotum nitens teve diferença significativa para CP (F0,05(1)17 = 22,429; P 0,009)
entre mata de galeria e cerradão.
Tabela 3 – Correlações fenotípicas entre alguns caracteres foliares em cinco
fitofisionomias do Cerrado do PESCAN-GO. Valores, em negritos, indicam diferenças
significativas. AFo – Área Foliar; IF - Índice Foliar; CP - Comprimento do Pecíolo
Variáveis Correlacionadas AFo x IF AFo x CP
Fisionomias
r CV* r CV* Cerrado sensu stricto -0,136 0,361 0,375 0,361
Cerrado Rupestre -0,294 0,361 0,320 0,361
Campo rupestre 0,025 0,361 0,225 0,361
Cerradão -0,449 0,361 0,309 0,361
Mata de Galeria -0,340 0,361 0,749 0,361
*Tabuted critical value, P 0,05 (Zar 1986)
224
Tabela 4 – Relação das espécies estudas em cinco fitofisionomias do Cerrado do PESCAN-GO.
Cerrado sensu stricto Cerrado Rupestre Campo rupestre Cerradão Mata de Galeria
Brosimum gaudichaudii Davilla eliptica Byrsonima
Coccolobifolia Alibertia edulis Rubiaceae*
Davilla elíptica Curratela americana Davilla eliptica Austroplenckia populnea
Xylopia emarginata
Erythroxylum campestre
Byrsonima Coccolobifolia Miconia ferruginata Byrsonima
Coccolobifolia Austroplenckia populnea
Erythroxylum tortuosum Neea theifera Myrtaceae* Diospyrus hispida Chryrophyllum sp.
Hancornia speciosa Vockisia eliptica Neea theifera Emmotum nitens Emmotum nitens
Ouratea hexasperma Miconia ferruginata Ouratea hexasperma
Hirtella glandulosa Lauraceae*
Pouteria ramiflora Heteropterys brysonimifolia Palicourea rigida Miconia albicans Melastomataceae*
Qualea grandiflora Myrtaceae* Styrax ferrugineus Qualea parviflora Myrtaceae*
Roupala Montana Myrtaceae* Vockisia eliptica Siparounea guianensis NI 2*
Solanum licocarpum NI 1* Vockisia speciosa Xylopia aromatica NI 3*
* não foi possível identificação, ao nível de espécie.
Considerações finais
Apesar das significativas diferenças encontradas nas características foliares das
diferentes fisionomias estudadas, é importante ressaltar a grande variabilidade registrada entre
os indivíduos de uma mesma área. Niinemets (1999) já havia indicado que, em plantas, a
plasticidade morfológica era maior que a plasticidade fisiológica. Puntieri et al (2001)
verificaram, por exemplo, um padrão de variação de folhas num mesmo indivíduo, com
tendência para aumento do tamanho foliar nos galhos mais antigos, da região distal para a
proximal.
As variações fenotípicas observadas nas 34 espécies, nas cinco áreas de estudo, devem
estar ocorrendo como meio de aumentar a capacitação de luz. Deste modo, as diferenças
morfológicas significativas encontradas, podem ser consideradas adaptativas, haja vista
estarem contribuindo para a estabilidade funcional destas plantas.
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