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A ABORDAGEM DOS SISTEMAS DE AVALIAO DE SUSTENTABILIDADE DA ARQUITETURA NOS QUESITOS AMBIENTAIS DE ENERGIA, MATERIAIS E GUA, E SUAS ASSOCIAES S INOVAES TECNOLGICAS

ANDREA BAZARIAN VOSGUERITCHIAN ORIENTADOR: PROF. DR. UALFRIDO DEL CARLO

Universidade de So Paulo - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo rea de concentrao: Tecnologia da Arquitetura Projeto realizado com o apoio da FAPESP - Fundao de amparo pesquisa do Estado de So Paulo a partir de 01.08.2005

A abordagem dos sistemas de avaliao de sustentabilidade da arquitetura nos quesitos ambientais de energia, materiais e gua, e suas associaes s inovaes tecnolgicas.Palavras-chave: Edifcios sustentveis Avaliao; Inovaes tecnolgicas; Impactos ambientais

Andrea Bazarian Vosgueritchian Orientador Prof. Dr. Ualfrido Del Carlo Dissertao de mestrado So Paulo, 2006

AUTORIZO A REPRODUO E DIVULGAO PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA CIENTFICA, EXCLUINDO QUAISQUER FINALIDADES COMERCIAIS,

DESDE QUE CITADA A FONTE. ANDREA BAZARIAN VOSGUERITCHIAN E-MAIL: [email protected]

Vosgueritchian, Andrea Bazarian V968a A abordagem dos sistemas de avaliao de sustentabilidade da arquitetura nos quesitos ambientais de energia , materiais e gua, e suas associaes s inovaes tecnolgicas / Andrea Bazarian Vosgueritchian.- - So Paulo, 2006. 247 p.: il. Dissertao (Mestrado rea de Concentrao: Tecnologia da Arquitetura) FAUUSP. Orientador: Ualfrido Del Carlo. 1. Edifcios sustentveis Avaliao 2. Inovaes tecnolgicas 3. Impactos ambientais I. Ttulo CDU 721:504

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DEDICATRIA

A Mouses, meu pai, por seu apoio integral; A Ivany, minha me, por seu eterno sorriso; A Noni, minha irm, por sua fiel convico; Ao Aldo, pelo contnuo incentivo.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente ao imensurvel estmulo e energia do meu orientador Prof. Dr. Ualfrido Del Carlo, sem o qual a completude desta pesquisa no teria tido o mesmo gosto. Seu entusiasmo e sabedoria sero marcas eternas na minha formao. Ao srio apoio da FAPESP Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo para a realizao desta pesquisa. Joana Carla S. Gonalves e a Denise Duarte pela ateno e suporte em todas as etapas da pesquisa. Roberta Kronka Mulfarth e a Maria de Assuno Ribeiro Franco pelas sugestes e apoio para finalizao deste trabalho. Mrcia Alluci pelas conversas e questionamentos essenciais, no apenas para a pesquisa como para a existncia. s amigas e tambm pesquisadoras: Ceclia Mattos Mueller, Giselle de Benedetto, Mnica Marcondes, Alessandra Prata, Daniela Laudares, Sandra Regina Pinto e Rita Buoro, pela troca de experincias, pelo companheirismo, compreenso e apoio nas dificuldades. Tambm aos professores, pesquisadores e companheiros do LABAUT Laboratrio de Conforto Ambiental e Eficincia Energtica - pelas idias, discusses e esforos compartilhados: Prof. Ansia Frota, Anna Miana, Bruna Luz, Carolina Gaspar Leite, Daniel Cstola, rika Eumakoshi, Joerg Spangenberg, Jos Ovdio, Leonardo Monteiro, Paula Shinzato, Rafael Brando, Rodrigo Castro Cavalcante e Norberto Moura. minha prima Carla Bazarian pela amizade e cuidadosa reviso. A todos, os meus mais sinceros agradecimentos.

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EPGRAFE

A terra prov o suficiente para satisfazer as necessidades de todos os homens, mas no sua ganncia Mahatma Gandhi

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RESUMOO objetivo desta pesquisa foi elucidar o modo como os sistemas de avaliao de sustentabilidade na arquitetura ponderam o impacto ambiental e as tecnologias referentes energia, aos materiais e gua. Para este fim foram selecionados sete sistemas de avaliao de sustentabilidade, como o: BREEAM - Reino Unido, 1990; GBTool - Internacional, 1996; LEED - Estados Unidos, 1996; SPEAR - Inglaterra, 2000; HQE - Frana, 2002; CASBEE - Japo, 2002; e NABERS - Austrlia, 2004. Paralelamente, fez-se uma pesquisa das tecnologias relacionadas energia, materiais e gua. Nesta etapa o enfoque da pesquisa nestes trs campos foi em relao ao uso de tecnologias renovveis; os impactos ambientais associados escolha de cada processo e suas atuais conjunturas no Brasil. O fato da pesquisa se tratar das tecnologias a serem inseridas no projeto de arquitetura incutiu a necessidade de conhecer a opinio de experientes profissionais que atuam hoje na rea de sustentabilidade. Foram ento, realizadas dez entrevistas com arquitetos, engenheiros e consultores ambientais na cidade de Londres, que atuam em projetos ao redor do mundo. Desta forma foi possvel concluir a pesquisa com um conhecimento mais aprofundado em relao ao que se conhece na teoria e o que atualmente feito na prtica, no sentido de se construir edifcios e cidades de menor impacto ambiental.

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ABSTRACTThe objective of this research was to elucidate how architecture sustainability assessment methods evaluates environmental impact and energy, materials and water management technologies. Seven assessment methods were therefore selected, which were: BREEAM - BRE EcoHomes (United Kingdom, 1990); GBTool (International, 1996); LEED (United States, 1996); SPEAR (United Kingdom, 2000); HQE (France, 2002); CASBEE (Japan, 2002) e NABERS (Australia, 2004). In addition, an investigation of technologies related to energy, materials and water was done. At this phase, the research focused the use of renewable technologies, as well as environmental impacts associated with the choice of each process and its current conjunctures in Brazil. Since the research deals with the insertion of technologies in the architecture design, which requires studying the opinion of experienced professionals who act today in the sustainability field, ten interviews were carried among architects, engineers and environmental consultants in the city of London, who act in international designs. Therefore, it was possible to conclude the research with a deeper knowledge of what is known as theory, and what is currently being done in practice, regarding buildings and cities construction that cause fewer environmental negative impacts.

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LISTA DE FIGURASFigura 1. Representao do cu por caixa de espelhos e cu artificial de mltiplas lmpadas com simulador da trajetria sol. ......................................................... 62 Figura 2. Imagens resultantes de simulaes do Ecotect. Trajetria aparente do sol, anlise de iluminao natural e radiao solar incidente nas superfcies externas do edifcio. ........................................................................................................ 65 Figura 3. Tas modeler e Tas Ambiens. Ambas as imagens do endereo eletrnico do Tas. ............................................................................................................. 66 Figura 4. Figura esquemtica de um modelo de uma zona com as informaes quanto s superfcies. direita imagem da tela do editor IDF. Ambos do manual do EnergyPlus. ................................................................................................... 67 Figura 5. Estgios de desenvolvimento e consumo de energia. Fonte: GOLDEMBERG, 2003. ........................................................................................................... 71 Figura 6. Representao da variao de temperatura global. Desde 1900, a mdia das temperaturas mundiais aumentou mais que um grau inteiro. Fonte: HAWTHORNE, 2003 ............................................................................................................ 71 Figura 7. IDH versus consumo anual de energia per capita (1991-1992). Modificado de GOLDEMBERG, 2003. ..................................................................................... 72 Figura 8. Representao da distribuio global de renda. Fonte: GOLDEMBERG, 2003. ................................................................................................................... 72 Figura 9. Impactos ambientais em funo da renda. Fonte: GOLDEMBERG, 2003. ... 73 Figura 10. Indicadores ambientais em diferentes nveis de renda dos pases. Ao centro, representao da relao entre as concentraes urbanas de matria particulada e a renda per capita. direita, representao da relao entre emisses CO2 per capita e a renda. Fonte: GOLDEMBERG, 2003. ........................................ 73 Figura 11. Ilustrao das emisses de CO2 norte-americanas por setor. Enquanto os nveis de emisso de gs carbnico produzidos pela indstria permanecem fixos, os nveis produzidos pela ao da arquitetura esto aumentando, o que sinaliza uma necessidade urgente de uma mudana difundida pelos arquitetos no modo de projetarem os edifcios. Fonte: HAWTHORNE, 2003............................................. 75

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12/247Figura 12. Representao do consumo de energia norte-americano por setor. Uma reorganizao de dados existentes combinando a energia exigida na produo de edifcios residenciais, comerciais, e industriais, junto com a energia incorporada de materiais produzidos pela indstria, como tapete, azulejo, e hardware, expem a arquitetura como um poluidor mascarado. Fonte: HAWTHORNE, 2003. .................. 75 Figura 13. esquerda. Aquecedor Solar. Fonte: CALIFORNIA ENERGY COMMISSION, 2005. ........................................................................................................... 78 Figura 14. direita. Aquecedor Solar de Baixo Custo. Fonte: SOCIEDADE DO SOL, 2005. ........................................................................................................... 78 Figura 15. esquerda. Parabolic Trough Collector. CALIFORNIA ENERGY COMISSION, 2005. ........................................................................................................... 80 Figura 16. direita. Parabolic Sundish with Stirling. NATURAL RESOURCES, 2005. .. 80 Figura 17. esquerda. Piscina solar de El Paso, Texas, EUA. Fonte:GUEDES, 2001.. 82 Figura 18. Superior direita. Corte esquemtico de piscina solar. Fonte: POND DOCTOR, 2006. ............................................................................................. 82 Figura 19. Inferior direita. Corte esquemtico de piscina solar. Fonte: MATERIALS SCIENCE AND TECHNOLOGY, 2006 ................................................................... 82 Figura 20. esquerda. Galpo industrial com o uso de resfriamento evaporativo. Fonte: RENOVAR VENTILAO, 2006. ............................................................... 84 Figura 21. direita. Fachada com asperssores de gua. Fonte: AUBURN UNIVERSITY POULTRY VENTILATION & HOUSING, 2006. ....................................................... 84 Figura 22. esquerda. Sistema aberto vertical. Fonte: GROUND LOOP, 2006. ........ 93 Figura 23. Ao centro. Sistema fechado horizontal. Fonte: GROUND LOOP, 2006. ..... 93 Figura 24. direita. Sistema fechado vertical que funciona nas duas direes. Fonte: GROUND LOOP, 2006. .................................................................................... 93 Figura 25. Turbinas Elicas no mar. Fonte: IMAGEBANK, 2005. ............................ 94 Figura 26. Turbina elica de eixo vertical. Fonte: MARLBOROUGH PRIMARY SCHOOL, 2006 ............................................................................................................ 96 Figura 27. Turbina elica de pequena escala. ..................................................... 96

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Figura 28. Turbina elica para reas rurais. Fonte: ENGINEERING TECHNOLOGIES CANADA LTD, 2006. ....................................................................................... 96 Figura 29. Esquerda. Rede de eletricidade por painis fotovoltaicos. ................... 97 Figura 30. Direita. Cobertura de painis fotovoltaicos. ...................................... 97 Figura 31. Configurao caracterstica da clula combustvel. ............................... 98 Figura 32. Imagem externa da Usina Nuclear de Angra dos Reis. .......................... 99 Figura 33. Usina Nuclear de Angra 2. ................................................................ 99 Figura 34. Imagens que demonstram o uso de material vegetal como fonte energtica. Fonte: BIOMASSA INFORMATIE, 2006 ............................................. 101 Figura 35. O uso de restos de material vegetal para a produo de energia. Fonte: DURZAAM ZEELAND, 2006 ............................................................................. 101 Figura 36. Pequena central hidroeltrica brasileira. Fonte: MINISTRIO DE MINAS E ENERGIA, 2006. ........................................................................................... 104 Figura 37. Pequena central hidroeltrica. Fonte: NEW RULES PROJECT, 2006. ....... 104 Figura 38. Pequena central hidroeltrica. Fonte: BUILDING IN SUSTENTABILITY, 2006. ..................................................................................................................104 Figura 39.Exemplo de um dispositivo em funcionamento. Fonte: WAVE DRAGON, 2006. .......................................................................................................... 106 Figura 40. Imagem de uma caixa de concreto por onde passa a gua do mar cuja energia aproveitada na gerao de eletricidade. Fonte: GUERRINI, 2001. ........... 106 Figura 41. Modelo genrico do ciclo de vida dos materiais do edifcio. Adaptado de LAWSON, 1996. ............................................................................................ 114 Figura 42. O ciclo dos materiais adaptado de BERGE, 2001. ................................ 114 Figura 43. Distribuio do consumo de gua por atividade em 1990 e em 2010. Fonte: BNDES,2005. ............................................................................................... 138 Figura 44. Diagrama de causas e efeitos da urbanizao. Adaptado de Barreto, 1998. ..................................................................................................................141 Figura 45. Representao esquemtica de uma Estao de Tratamento de gua Bruta (ETA) Convencional. Na figura os pontos A, B, C e D representam os pontos de aplicao de cloro. ........................................................................................ 148

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14/247Figura 46. Fluxograma de um sistema de tratamento fsico qumico de guas residurias. ..................................................................................................151 Figura 47. Fotos de tanques spticos seguidos de filtros anaerbios. Fonte: ESCOLA POLITCNICA DE SANEAMENTO DA UFRJ (2005) ............................................... 152 Figura 48. Corte esquemtico de um tanque sptico seguido de filtro anaerbio. .... 152 Figura 49. Fotos de tanques de lodo ativado. Fonte: ESCOLA POLITCNICA DE SANEAMENTO DA UFRJ, 2005. ........................................................................153 Figura 50. Fluxograma do processo convencional de tratamento por lodo ativado. .. 153 Figura 51. Fotos da filtrao biolgica aerbia. Fonte: Escola Politcnica de Saneamento da UFRJ, 2005. ...........................................................................154 Figura 52. Fluxograma de um sistema de tratamento biolgico de guas residurias com filtro biolgico. .......................................................................................154 Figura 53. Fotos da lagoa de estabilizao. Fonte: ESCOLA POLITCNICA DE SANEAMENTO DA UFRJ, 2005. ........................................................................155 Figura 54. Esquema de lagoa de estabilizao. ..................................................155 Figura 55. Esquema em corte demonstrando a infiltrao sub-superficial. ............. 156 Figura 56. Esquema em corte demonstrando o escoamento superficial. ................ 156 Figura 57. Esquema de uso de gua pluvial em uma residncia. .......................... 158 Figura 58. esquerda. Esquema de filtro de gua pluvial. .................................. 158 Figura 59. direita. Esquema com a seqncia do percurso da gua no reservatrio. ..................................................................................................................158 Figura 60. Ciclo de vida de um edifcio genrico. Fonte: Adaptado de Silva, 2003. .. 164 Figura 61. Esquema dos fluxos ambientais ao longo do ciclo de vida de um edifcio. Fonte: Adaptado de Silva, 2003. .....................................................................165 Figura 62. Notas finais do mtodo de Avaliao BRE EcoHomes (2004) ................. 169 Figura 63. Notas finais do mtodo de Avaliao BRE EcoHomes (2004). ................ 170 Figura 64. Planilhas da avaliao do sistema GBToll. Fonte: GBC2000, 2004.......... 176 Figura 65. Tabela simplificada LEED. Fonte: US GREEN BUILDING COUNCIL, 2002. 181 Figura 66. Esquema com as quatro reas avaliadas pelo sistema SPeAR. ..............182

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A avaliao consiste no desempenho de quatro grandes reas, cada uma delas subdivida em outras seis. Atribuem-se pontos que vo de 3 a -3, que ilustrados numa roscea como representado na Figura 67. Quanto melhor o desempenho em cada tema, mais o ponto se aproxima do alvo. O resultado grfico bastante didtico, pois se visualiza rapidamente as reas fortes ou fracas do projeto, o que facilita novas intervenes para melhorias. .......................................................................... 183 Figura 68. Modelo de quatro-quadrante. Nesta figura quanto mais as cunhas verdes se aproximam do alvo do centro do crculo, melhor o desempenho naquele item. ....... 183 Figura 69. Imagem da lista de verificao SPeAR. .............................................. 184 Figura 70. Os 14 itens da avaliao HQE divididos em quatro grupos: Eco-construo, Eco-gesto, Conforto e Sade. Fonte: CARDOSO, 2003. ..................................... 185 Figura 71. Planilha de avaliao da eco-construo do HQE. Fonte: CARDOSO, 2003. ..................................................................................................................187 Figura 72. Planilha de avaliao de gesto do HQE. Fonte: CARDOSO, 2003. ......... 188 Figura 73. Planilha de avaliao da qualidade da gua do HQE. Fonte: CARDOSO, 2003. .......................................................................................................... 189 Figura 74. Ferramentas de avaliao do mtodo CASBEE de acordo com cada etapa do projeto. ....................................................................................................... 190 Figura 75. Mtodo de clculo do sistema de avaliao, que considera os efeitos positivos, divididos pelos efeitos negativos da edificao. ................................... 191 Figura 76. Grfico com o resultado final de duas simulaes de edifcios no CASBEE. ..................................................................................................................191 Figura 77. Qualidade e cargas ambientais consideradas no clculo CASBEE. .......... 192 Figura 78. Planilha de clculo das cargas ambientais consideradas em relao energia, materiais e gua no mtodo CASBEE. .................................................. 193 Figura 79. Planilha CASBEE para edifcios novos. ............................................... 194 Figura 80. Tabela com a pontuao e interpretao dos resultados nos diferentes grupos avaliados na metodologia do sistema NABERS. ....................................... 196 Figura 81. Imagem da planilha final de avaliao do sistema australiano NABERS. . 196

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16/247Figura 82. Planilhas referentes avaliao de energia, materiais e gua da metodologia NABERS. ....................................................................................198 Figura 83. Estrutura temtica para organizao dos indicadores qualitativos e quantitativos proposto. Fonte: SILVA, 2003. .....................................................199 Figura 84. Imagem da tela de entrada do aplicativo e imagem da tela de sada com a avaliao final. .............................................................................................200 Figura 85. Sadas grficas do aplicativo e tabela com a relao de pontos e estrelas correspondentes. ..........................................................................................200 Figura 86. Planilhas de avaliao durante a etapa de projeto que correspondem anlise em energia, materiais e gua. ..............................................................202

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LISTA DE TABELASQuadro 1. Sntese de caractersticas bsicas da sustentabilidade segundo Silva, (2000). ........................................................................................................ 43 Quadro 2. Princpios e estratgias gerais de sustentabilidade segundo Silva, 2000. . 44 Quadro 3. Sntese de alguns exemplos de projetos ao redor do mundo que se utilizam de uma linguagem que tem por referncia a natureza. Fonte: EDWARDS, 2001. ..... 56 Quadro 4. Tabela de avaliao dos projetos de acordo com Evans (2004). ............. 68 Quadro 5. Tabela com sugestes de modificao na avaliao dos projetos. ........... 69 Quadro 6. Matriz da Energia Eltrica no Brasil. Fonte: ANEEL, 2002. .................... 107 Quadro 7. Os valores de porcentagem so referentes Potncia Fiscalizada. A Potncia Outorgada igual considerada no Ato de Outorga. A Potncia Fiscalizada igual considerada a partir da operao comercial da primeira unidade geradora. . 107 Quadro 8. ndices de reciclagem de diferentes tipos de materiais de embalagem. Fonte: ABRE-Associao Brasileira de Embalagens (2006). ................................. 117 Quadro 9. Pases com escassez crnica de gua abaixo de 2.740 litros per capita por dia em 2000, 2025 e 2050, comparados com alguns outros pases. Fonte: LOMBORG, 2002. .......................................................................................... 139 Quadro 10. Sntese da avaliao dos sistemas quanto energia, materiais e gua. 203

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18/247LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLASABCP. Associao Brasileira de Cimento Portland ABRE. Associao Brasileira de Embalagens ACV. Anlise do ciclo de vida ANEEL. Agncia Nacional de Energia Eltrica AWWA. American Water Works Association BEES. Building for Environmental end Economic Sustainability BREEAM. Building Research Establishment Environmental Assessment Method CASBEE. Comprehensive Assessment System for Building Environmental Efficiency CEMPRE. Compromisso Empresarial para a Reciclagem CFD. Computational Fluid Dinamics CIB. Conseil International du Btiment CMMAD. Comisso Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento COV. Componentes Orgnicos Volteis CSTB. Centre Scientifique et Tecnique du Btiment DBO. Demanda Qumica de Oxignio E T A. Estao de Tratamento de gua EPS. Poliestireno Expandido ETE. Estao de Tratamento de Esgoto FSC. Forest Stewardship Council GBC. Green Building Challenge GHG. Green house gas HQE. La Haute Qualite Environnementale IPCC. Painel Intergovernamental sobre Mudana do Clima LCA. Life Cycle Analyses LEED. Leadership in Energy and Environmental Design

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NABERS. National Australian Building Environmental Rating Scheme NIST. National Institute of Standards and Tecnhnology ONGs. Organizaes No Governamentais ONU. Organizao das Naes Unidas, Organizao das Naes Unidas PAD. Polmero Plstico Biodegradvel PCH. Pequena Central Hidreltrica PET. Polietileno Tereftalato PIS. Pneumatically Impacted Stabilized Earth PVC. Policloreto de Vinila, Policloreto de Vinila QEB. Qualit Environmentale du Btiment RCD. Resduos de Construo e Demolio RCRA. Resource Conservation and Recovering Act Spear. Sustainable Project Appraisal Routine SST. Slidos suspensos totais tep. Toneladas equivalentes de Petrleo tpa. Toneladas por ano

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SUMRIODEDICATRIA ................................................................................................ 1 AGRADECIMENTOS ......................................................................................... 3 EPGRAFE ....................................................................................................... 5 RESUMO ......................................................................................................... 7 ABSTRACT ...................................................................................................... 9 LISTA DE FIGURAS ....................................................................................... 11 LISTA DE TABELAS ....................................................................................... 17 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ............................................................. 18 SUMRIO...................................................................................................... 21 PARTE 1 1.1 1.2 1.3 1.4 1.5 PARTE 2 2 2.1 2.2 2.3 2.4 2.5 2.6 2.7 2.8 2.9 2.10 3 3.1 ..................................................................................................... 27 Colocao do Problema e Justificativa da pesquisa ............................. 29 Objeto de Estudo .......................................................................... 34 Objetivos da dissertao ................................................................ 34 Recursos e Restries .................................................................... 34 Metodologia ................................................................................. 34 ..................................................................................................... 37 Fundamentaes........................................................................... 39 Limitaes ................................................................................... 42 Definies .................................................................................... 43 A Histria .................................................................................... 44 A Busca ....................................................................................... 48 A Natureza e as Religies ............................................................... 51 O Consumo .................................................................................. 53 O Desafio..................................................................................... 53 A Amrica do Norte ....................................................................... 56 2.9.1 Barreiras ..................................................................................... 58 As Ferramentas de suporte de projeto ............................................. 59 ambientais da escolha dos sistemas aplicados Implicaes A Evoluo do conceito de sustentabilidade .......................................... 39 CAPTULO 1INTRODUO .......................................................................... 29

arquitetura ................................................................................................... 71 Energia ...................................................................................... 71 3.1.1 Energia, Meio Ambiente e Desenvolvimento ...................................... 72

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22/2473.1.2 Conceitos Gerais. Energia Renovvel e Eficincia Energtica ................ 74 3.1.3 Programas nacionais para o uso sustentvel das fontes de energia....... 76 3.1.4 Tecnologias .................................................................................. 77 3.1.4.1 3.1.4.2 3.1.4.3 3.1.4.4 3.1.4.5 3.1.4.6 3.1.4.7 3.1.4.8 3.1.4.9 3.1.4.10 3.2 Energia Solar Trmica ............................................. 77 Tcnicas eficientes para refrigerao ......................... 83 Energia Geotrmica ................................................ 92 Energia Elica ........................................................ 94 Clulas Fotovoltaicas .............................................. 97 Clulas Combustveis .............................................. 98 Biomassa .............................................................101 Pequenas usinas ...................................................103 Pequenas centrais hidroeltricas .............................. 104 Ondas e Correntes ...............................................106

3.1.5 Panorama da Situao Energtica Brasileira ..................................... 106 Materiais ................................................................................... 109 3.2.1 Conceituao ............................................................................... 111 3.2.1.1 3.2.1.2 3.2.1.3 3.2.1.4 3.2.2.1 3.2.2.2 3.2.2.3 3.3 Energia incorporada............................................... 112 Anlise do ciclo de vida .......................................... 114 Resduos e Reciclagem ........................................... 115 Trs passos bsicos ...............................................117 Orgnicos ............................................................118 Cermicos ............................................................127 Metlicos .............................................................133

3.2.2 Da matria-prima aos materiais de construo ................................. 118

gua .........................................................................................136 3.3.1 O consumo de gua no Brasil e no mundo ....................................... 137 3.3.2 Impactos dos sistemas urbanos ..................................................... 140 3.3.3 Gesto dos Recursos Hdricos ........................................................ 143 3.3.3.1 3.3.3.2 3.3.3.3 3.3.3.4 3.3.3.5 3.3.3.6 3.3.3.7 Captao da gua .................................................144 Estratgias para a Conservao da gua ................... 144 Transporte ...........................................................146 Tratamento de gua bruta ......................................146 Reuso e reciclagem da gua ...................................149 Tratamento de guas residurias ............................. 151 Uso da gua da chuva ............................................ 157

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Sistemas de avaliao de sustentabilidade: Energia, Materiais e gua 160 Indicadores de Sustentabilidade ..................................................... 160 4.1.1 Definio dos Indicadores ............................................................. 160 4.1.2 Funo dos Indicadores ................................................................ 161 4.1.3 A Avaliao dos Edifcios ............................................................... 162

4.2

Indicadores de sustentabilidade de edifcios ..................................... 165 4.2.1 BREEAM ..................................................................................... 167 4.2.2 GBTool ....................................................................................... 171 4.2.3 LEED .......................................................................................... 176 4.2.4 SPeAR ........................................................................................ 182 4.2.5 HQE ........................................................................................... 185 4.2.6 CASBEE ...................................................................................... 189 4.2.7 NABERS...................................................................................... 195 4.2.8 Modelo brasileiro.......................................................................... 198

4.3 PARTE 3 5 5.1 5.2 5.3 6 7

Sntese dos Sistemas.................................................................... 203 ................................................................................................... 205 Concluses ................................................................................. 207 Quadro histrico .......................................................................... 224 Perspectivas para pesquisas futuras ............................................... 227 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS.......................................................... 229 BIBLIOGRAFIA .................................................................................... 237 CONSIDERAES FINAIS..................................................................... 207

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ESTRUTURA DOS CAPTULOS I CONTEDO DOS CAPTULOS

A dissertao est estruturada da seguinte forma: Parte 1Introduo e Metodologia Captulo 1- Introduo, descreve a delimitao do tema abordando aspectos como: a colocao do problema, a justificativa da pesquisa, os objetos de estudo, os objetivos da dissertao e os recursos e restries da pesquisa. Neste captulo tambm descrita a Metodologia. Parte 2 Reviso Bibliogrfica Captulo 2- Aborda a literatura existente a respeito da evoluo do conceito de sustentabilidade. Aborda as ferramentas de suporte de projeto. Captulo 3- Aborda as implicaes ambientais da escolha dos sistemas aplicados arquitetura, mais especificamente em relao energia, aos materiais e a gua. Captulo 4 Aborda os sistemas de avaliao de sustentabilidade com enfoque em energia, materiais e gua. Parte 3Concluses Captulo 5 Apresenta as consideraes finais com uma sntese das entrevistas realizadas a arquitetos, engenheiros e consultores ambientais e apresenta um quadro histrico da evoluo do conceito de sustentabilidade. Alm das consideraes finais, este captulo apresenta sugestes de temas para pesquisas futuras que visam dar continuidade ao trabalho.

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PARTE 1

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CAPTULO 1INTRODUO1.1 Colocao do Problema e Justificativa da pesquisa

intrnseco ao pensamento arquitetnico a busca de solues que visam a proteo em relao ao ambiente externo, criando assim condies climticas apropriadas no ambiente interno do abrigo. Para esta soluo, o arquiteto deve naturalmente se atentar para a orientao do edifcio, o uso de materiais adequados, o uso de tecnologias passivas para o condicionamento ambiental, o uso racional da gua, entre outras preocupaes recorrentes. Neste sentido, no h nada de novo em relao ao que se deve pensar no momento do projeto at os dias de hoje. Mas por que atualmente ouve-se tantos termos como Arquitetura Ecolgica, Arquitetura Sustentvel, Bio-Arquitetura? Ser apenas um modismo? Dentro da prtica profissional do arquiteto houve, na realidade, uma mudana nos paradigmas, devido aos problemas ambientais aos quais os profissionais hoje se deparam. De acordo com a ABEMA inadequado, pela contaminao e1

(1999), alguns dos principais problemas ineficaz gerenciamento das bacias

ambientais brasileiros podem ser classificados como: a escassez de gua pelo uso pelo hidrogrficas; a contaminao de corpos hdricos por esgotos sanitrios, industriais e por outros resduos; a degradao dos solos pelo mau uso; a perda de biodiversidade devido ao desmatamento e s queimadas; a degradao da faixa litornea por ocupao desordenada e a poluio do ar nos grandes centros urbanos. No se tem como negar que muitos destes problemas ambientais se intensificaram e continuam se intensificando, devido ao crescimento descontrolado da populao e das cidades e por conseqncia da construo, no s desordenada, como baseada no princpio da disponibilidade infinita dos recursos. Nos nveis atuais de consumo, a espcie humana requer aproximadamente trs planetas Terra para sustentar-se. No mundo ocidental a capacidade de suporte dos sistemas naturais foi excedida por em mdia, de trs a seis planetas Terra, e cerca de um e meio na frica. Em todos os ndices medidos, o consumo de recursos naturais da Amrica Latina superior ao da sia, do Oriente Mdio e da frica. O maior consumo

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Associao Brasileira de Entidades Estaduais de Meio-Ambiente.

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30/247 da populao da Amrica do Norte - a "pegada ecolgica"2 de um norte-americano equivale a de dois europeus e a sete vezes o tamanho da pegada de um asitico ou de um africano. No ranking mundial, a "pegada" do brasileiro fica em 60 lugar na lista de 149 pases considerados no estudo. Quando se compara o consumo somente de alimentos, fibras e madeiras, no entanto, o Brasil sobe para 27 lugar. No item energia o Brasil fica em 82 lugar e em gua fica em 70 lugar. As reas de stress de recursos esto nos combustveis fsseis, nas terras para agricultura, na disponibilidade de gua potvel, nas madeiras densas, na disponibilidade de peixes e, o mais importante, na questo do clima global. Enquanto a Terra modificada para responder s necessidades humanas, h uma perda de espcies, de diversidade gentica e de habitats virgens. O planeta est se transformando em uma enorme fazenda para suportar as cidades que crescem rapidamente. A destruio ecolgica evidente em toda parte e a raa humana prontamente aceita a extino global de talvez 4.000 espcies ao ano a fim de reorganizar a terra em uma linha de produo que suporte suas prprias atividades. Segundo Fuller (apud ROGERS, 2001), antes de mais nada devemos reconhecer que a abundncia dos recursos imediatamente consumveis, inevitavelmente desejveis ou absolutamente essenciais, at agora, foi suficiente para permitir que continuemos nossa jornada, apesar de nossa ignorncia. Estes recursos, em ltima instncia esgotveis e dilapidveis, foram adequados at este momento crtico. Aparentemente, essa ovo espcie se de amortecedor dos erros de do lquido envoltrio, sobrevivncia e para uma crescimento etapa de da seu humanidade foi alimentado, at agora, da mesma forma que um pssaro dentro do alimenta necessrio desenvolvimento somente at certo ponto. Atividade humana de maior impacto sobre o meio-ambiente, a indstria da construo, particularmente construo, operao e demolio de edifcios, segundo (SILVA; SILVA; AGOPYAN, 2004), possui grande responsabilidade no panorama

Criada por William Rees e Mathis Wackernagel a Pegada Ecolgica, baseada no conceito de capacidade de carga, permite calcular a rea de terreno produtivo necessria para sustentar o estilo de vida atual. Foram escolhidas vrias categorias de terrenos: agrcola, pastagens, oceanos, florestas, energia fssil e reas construdas; e de consumo: alimentao, habitao, energia, bens de consumo, transportes, etc. Neste clculo, cada categoria de consumo convertida em uma rea de terreno por meio de fatores calculados para o efeito. No caso da alimentao, por exemplo, divide-se o consumo de dada cultura agrcola, expresso em toneladas, pela produtividade da terra, expressa em hectare. Para que a pegada ecolgica seja sustentvel, ela ter de ser inferior capacidade de carga do planeta ou regio, dependendo da escala da avaliao (REDEFINIG PROGRESS, 2006).

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ambiental global. Enquanto a economia e a populao continuam a se expandir, os projetistas e construtores tm o dever de enfrentar um desafio sem igual na demanda de conhecimento em novos ou renovados mecanismos que sejam acessveis, seguros, saudveis, e produtivos, enquanto minimizando seu impacto ambiental (WHOLE BUILDING DESIGN GUIDE, 2004). Apesar de o arquiteto sempre ter uma preocupao ambiental e humana na concepo de seus projetos, novas exigncias advindas do aumento da populao, maior consumo de materiais, energia e gua, exigem uma postura mais dirigida para as questes ambientais e de sustentabilidade. Pesquisas recentes para este desafio pedem uma aproximao integrada, que considere todas as fases do ciclo de vida destes mecanismos. Esta aproximao sustentvel suporta um compromisso crescente com a condio ambiental e sua conservao e resulta em um timo equilbrio de custo, benefcios ambientais, sociais, e humanos enquanto considera a misso e funcionamento da infra-estrutura projetada. O que freqentemente ignorado nos crculos arquitetnicos a maneira como o desenvolvimento sustentvel como conceito constri quatro grandes questes centrais para o projeto do edifcio: a tecnologia e sua influncia para com o impacto ambiental, o propsito social, a identidade cultural e a moderao econmica. Mas a arquitetura consegue unir estes campos da sustentabilidade? A vinculao destes no somente revigora a arquitetura como tambm d validez moral criao de assentamentos humanos. E ai encontra-se a base do novo florescimento da arquitetura aps um perodo de indefinio posterior ao sculo XX. A unio da tecnologia e da sustentabilidade social traz, de um lado, a necessidade de compreender os materiais e seus impactos, e de outro, o bem estar dos agentes da sociedade. Os objetivos principais da construo sustentvel esto sempre evoluindo, porm podem ser resumidos em: evitar o desperdcio dos recursos de energia, gua, e matrias-primas; prevenir a degradao ambiental causada por instalaes e infraestrutura ao longo do ciclo de vida; e criar ambientes construdos habitveis, confortveis, seguros, e produtivos. Mais de 90% destes princpios baseiam-se em decises que devem ser tomadas no momento do projeto arquitetnico (GHOUBAR, 1990). O arquiteto ento se v diante

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32/247de uma nova realidade, se v diante de uma nova problemtica, na qual est evidente sua responsabilidade. Nesta realidade, ele no deve apenas se preocupar com a implantao do edifcio, e sim, em como este edifcio est causando efeitos sobre o solo, em como estes materiais se comportam, no apenas termicamente, mas tambm em funo de seu ciclo de vida, sua capacidade de ser reutilizvel, ou mesmo reciclvel. Neste sentido o gerenciamento das etapas do projeto arquitetnico essencial, onde se espera o inverso do efeito projeto pobre. Nesta idia o tempo investido no projeto mnimo, enquanto o tempo na obra maximizado, devido insuficincia de informaes no momento da construo. Conforme Barnett; Browning (1999), um dos princpios filosficos no desenho do edifcio de menor impacto ambiental o do planejamento, onde se tem primeiramente o trabalho, depois o retorno. Esta questo implica na necessidade de competncias especializadas e projetos complementares, que dem suporte a um projeto completo de acordo com os parmetros de desempenho ambiental. Decises realizadas previamente no apenas definem a direo do projeto, como tambm provam ter seu custo mais eficiente durante a vida til do edifcio. Um projeto claramente estruturado e desenvolvido guia o processo de tomada de decises, enquanto incorpora assuntos relacionados escolha do stio, o desenho do edifcio e seus sistemas, o processo de construo, operao e manuteno do empreendimento (UNITED STATES GREEN BUILDING COUNCIL, 1996). Apesar da importncia do gerenciamento na arquitetura, esta no se encontra muito desenvolvida neste ramo como em outras atividades produtivas no setor comercial e industrial, onde se dispe de metodologias bem elaboradas e disponveis (Maffei, 1989). Aliado a este fato, os modelos gerenciais concentram-se prioritariamente na otimizao da produtividade, focada em mtodos quantitativos. Da mesma forma com que os modelos gerenciais esto ampliando seu

desenvolvimento no Brasil, mtodos de avaliao de sustentabilidade de edifcios comeam a ser pesquisados e aperfeioados. Aps a crise energtica mundial vieram tona problemas relacionados aos impactos ambientais, que se desencadearam em diversas iniciativas focadas na avaliao da eficincia energtica de edifcios. Desta maneira foram desenvolvidos mtodos para a avaliao dos edifcios estabelecidos indicadores de sustentabilidade.

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H uma quantidade muito grande de sistemas de avaliao de edifcios desenvolvidos por diversos pases j absorvidos pelo mercado e pela pesquisa em um cenrio internacional, devido a sua abrangncia quanto aos parmetros de avaliao de sustentabilidade, do conforto ambiental a eficincia energtica. Podemos citar alguns deles, em ordem crescente de acordo com a data de criao dos mesmos: BREEAM Reino Unido, 1990; GBTool - Internacional, 1996; LEED - Estados Unidos, 1996; SPEAR - Inglaterra, 2000; HQE - Frana, 2002; CASBEE - Japo, 2002; e NABERS Austrlia, 2004. O desenvolvimento destes modelos evidencia um esforo global de transformao das bases conceituais da arquitetura internacional. Inmeros so os exemplos que apontam este novo rumo da arquitetura, focado nas condies ambientais e nas preocupaes de salubridade e sustentabilidade. Segundo Baker e Steemers (2000), o grande propsito da boa arquitetura conciliar o projeto de baixo consumo energtico com o conforto interno dos ocupantes, sem prejudicar ou reduzir a qualidade de vida dos mesmos. Grandes nomes da arquitetura mundial como Norman Foster, Renzo Piano, Richard Rogers tm realizado projetos de edifcios de baixo impacto ambiental que so exemplos de como utilizar a tecnologia no s a favor do homem, como tambm a favor do meio ambiente. As questes a serem hoje respondidas pelo que se pode chamar de novo movimento ou movimento verde, rebatem a apreenses ambientais globais, questes estas que envolvem todas as regies do planeta. Apesar desta responsabilidade generalizada, alguns exemplos focalizados se destacam no cenrio arquitetnico global. Os exemplos de projeto que se apresentam como parte deste novo movimento so encontrados predominantemente nos pases desenvolvidos, apesar de saber que existam modelos sustentveis em paises de menores recursos, paises de terceiro mundo. Estes exemplos nem sempre usam a palavra arquitetura verde, ou sustentvel, porm possuem estes conceitos embutidos em sua produo construda (EDWARDS, 2001). E quais so os parmetros avaliados para definir um projeto de arquitetura como sustentvel, ou de menor impacto ambiental? Desta forma esta pesquisa tem como objetivo elucidar os parmetros ambientais que so considerados em sistemas de avaliao de sustentabilidade na arquitetura, de modo a sintetizar como ponderam o impacto ambiental e as tecnologias referentes energia, aos materiais e gua.

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34/2471.2 Objeto de Estudo

O objeto da pesquisa so os sistemas de avaliao de sustentabilidade da arquitetura com enfoque nos quesitos ambientais de energia, materiais e gua, e suas associaes s inovaes tecnolgicas.

1.3

Objetivos da dissertao

O objetivo geral da pesquisa analisar a abordagem dos sistemas de avaliao de sustentabilidade da arquitetura nos quesitos ambientais de energia, materiais e gua, e suas associaes s inovaes tecnolgicas. A pesquisa teve como objetivos especficos analisar a evoluo do conceito de sustentabilidade do ambiente construdo: desde as estratgias tecnolgicas de energia, materiais e gua aos sistemas de avaliao de sustentabilidade de edifcios, assim como construir uma linha do tempo com a organizao cronolgica dessas informaes.

1.4

Recursos e Restries

Esta pesquisa foi realizada com o apoio financeiro da FAPESP Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo - a partir de 01 de agosto de 2005. A bibliografia utilizada para a realizao desta pesquisa foi consultada nas bibliotecas do sistema Dedalus pertencente Universidade de So Paulo, nos sistemas informatizados de busca de demais Universidades brasileiras, alm de artigos cientficos, dissertaes e teses disponibilizadas na internet. Foi realizada uma viagem internacional para a coleta de dados primrios provenientes de entrevistas com profissionais ligados sustentabilidade do ambiente construdo, entre eles arquitetos, engenheiros e consultores ambientais. A coleta de dados primrios esteve restrita a poucas semanas de investigao direta junto aos entrevistados, devido a limitaes financeiras e burocrticas.

1.5

Metodologia

O trabalho caracteriza-se como terico e pragmtico com enfoque analtico. A coleta de dados secundrios caracterizada como a parte terica da pesquisa foi composta de:

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Reviso bibliogrfica do conceito de sustentabilidade; Reviso bibliogrfica de estratgias tecnolgicas para edifcios de melhor desempenho ambiental: Energia, Materiais e gua; Reviso bibliogrfica de sistemas de avaliao de sustentabilidade de edifcios, onde sero levantados parmetros de sistemas internacionais como: BREEAM - Reino Unido, 1990; GBTool - Internacional, 1996; LEED Estados Unidos, 1996; SPEAR - Inglaterra, 2000; HQE - Frana, 2002; CASBEE - Japo, 2002; e NABERS - Austrlia, 2004. Aps esta etapa foram sintetizados os parmetros de avaliao analisados na pesquisa e construdo um quadro para melhor visualizao dos critrios avaliados nos sistemas. Paralelamente foi construda uma linha do tempo com a organizao cronolgica dos dados levantados em relao evoluo do conceito de sustentabilidade. Este quadro no tem a funo de esgotar o tema e sim, indicar eventos marcantes que exemplifiquem a evoluo do conceito de sustentabilidade, podendo ser preenchido no decorrer de pesquisas futuras. Foi realizada uma viagem internacional para a coleta de dados primrios provenientes de entrevistas com profissionais ligados sustentabilidade do ambiente construdo, entre eles arquitetos, engenheiros e consultores ambientais. O fato da pesquisa se tratar das tecnologias a serem inseridas no projeto de arquitetura incutiu a necessidade de conhecer a opinio de experientes profissionais que atuam hoje na rea de sustentabilidade. Foram ento, realizadas dez entrevistas com arquitetos, engenheiros e consultores ambientais na cidade de Londres, que atuam em projetos ao redor do mundo. Estes profissionais foram selecionados devido a sua produo publicada em revistas tcnicas, assim como indicados por Professores do grupo de pesquisa do LABAUT. O nmero de entrevistas realizadas limitou-se a restries financeiras quanto ao tempo de viagem e a disponibilidade dos profissionais em ceder seu tempo e informaes. Desta forma foi possvel concluir a pesquisa com um conhecimento mais aprofundado em relao ao que se conhece na teoria e o que atualmente feito na prtica, no sentido de se construir edifcios e cidades de menor impacto ambiental.

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PARTE 2

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2 2.1

A EVOLUO DO CONCEITO DE SUSTENTABILIDADEFundamentaes

O perodo que sucedeu a Segunda Guerra Mundial foi caracterizado por uma trajetria desenvolvimentista, quando passaram a ser constatados os danos ambientais a diversos ecossistemas e a exausto dos recursos naturais. O crescimento econmico acelerado e a expanso do mercado de consumo do perodo ps-guerra entraram em colapso devido s crises que se estabeleceram nos anos 70, como a crise do petrleo, do dlar, entre outras fragilidades do mercado financeiro. Algumas publicaes abordaram as conseqncias das excessivas aes humanas sobre o meio-ambiente e os seres vivos, manifestando o colapso ambiental, como o caso do livro Silent Spring de Rachel Carson, publicado em 1962. Outra publicao de carter alarmista foi o relatrio The limits to growth, de 1972, de Donella Meadows em conjunto com um grupo de estudiosos denominado como Clube de Roma. Este relatrio alertou para os riscos de escassez de recursos naturais caso a humanidade continuasse a crescer e a explor-los indevidamente. Na mesma data desta ltima publicao, em 1972, foi realizado um encontro em Estocolmo, quando as questes ambientais passam as ser politicamente admitidas como um problema global a ser debatido. Neste encontro j se ressaltam esforos conjuntos de diversos organismos governamentais e no governamentais, universidades, institutos de pesquisa, agncias, programas da ONU Organizao das Naes Unidas entre outros. Um dos marcos principais para a consolidao das principais noes da idia da sustentabilidade foi a publicao, em 1987, do Relatrio Brundtland sob o ttulo de Nosso Futuro Comum, fruto do trabalho elaborado pela Comisso Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD). Segundo Silva (2000), o conceito para o desenvolvimento sustentvel que foi difundido internacionalmente, remete s condies genricas da qualidade da preservao das condies scio-ambientais intra e inter geraes: O Desenvolvimento Sustentvel aquele que atende s necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das geraes futuras atenderem s suas prprias necessidades (CMMAD, 1991).

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40/247Segundo Silva (2000), alm da ausncia de discusso de algumas questes pertinentes produo no relatrio, as relaes de consumo no so debatidas criticamente de forma a explicitar as desigualdades dos padres e a impossibilidade econmica e ecolgica de se estender a todos os mesmos nveis de consumo praticados pelas naes mais ricas. Outro aspecto polmico refere-se proposio da necessidade de crescimento, tanto para as naes no industrializadas como para as industrializadas, que prev que a superao do subdesenvolvimento do hemisfrio sul implica no crescimento contnuo dos pases industrializados. Segundo a autora, as respostas de como conciliar esta proposio com a perspectiva ecolgica da finitude de recursos naturais um aspecto conflitante que foi evitado. Publicada cinco anos depois do Relatrio Brundtland, a Agenda 21 tratou de alguns aspectos no enfocados anteriormente, tanto o consumo energtico e de matrias primas, a conservao da biodiversidade e a proteo de ecossistemas frgeis, como a questo da equidade na distribuio das riquezas, das oportunidades e das responsabilidades. Este documento amplamente difundido no mundo, foi produto do evento chamado Eco-92 realizado na cidade do Rio de Janeiro na Conferncia das Naes Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. A grande participao e o envolvimento de diversas ONGs Organizaes No Governamentais e associaes civis resultaram em uma fundamental contribuio para a sociedade civil e para o mundo oficial das naes na explicitao dos vnculos indissociveis entre os aspectos ambientais, sociais, econmicos e polticos. Outra contribuio relevante da Agenda 21 foi o delineamento de propostas operacionais para a obteno de dados que permitissem a avaliao e monitoramento dos impactos ambientais, fator fundamental para o incentivo para a formulao de indicadores ambientais em todo o mundo. J na dcada de 80, a considerao de que uma concepo de desenvolvimento estratgico para melhorias sociais deve corresponder a potencialidades locais gerou a idia das sociedades sustentveis, por um movimento liderado por Lester Brown por meio do Worldwatch Institute. Segundo Silva (2000), embora a concepo de uma sociedade sustentvel tambm faa aluso solidariedade entre as geraes, inclui a condio de um desenvolvimento tecnolgico necessrio para a compensao de perdas do capital natural.

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O destino da biosfera exige, ento, mais do que nunca uma agenda de pesquisas cientficas. Segundo Murray Gell-Mann, prmio Nobel de Fsica de 1969 (1996), uma agenda que conclamasse pessoas de diversas instituies e de uma ampla variedade de disciplinas a pensarem juntas sobre a possibilidade de cenrios evolutivos que conduzam a um mundo quase-sustentvel no sculo XXI seria necessria e consensualmente desejvel. Para ele o significado de sustentvel j inadequado, j que a ausncia completa de vida na Terra pode ser sustentvel por milhes de anos. Para Gell-Mann (1996) o que se est procurando abarca um tantinho de desejo junto sustentabilidade, e h certo consenso das aspiraes da humanidade a este desejo. Trata-se de obter qualidade de vida para o homem e para a biosfera que no seja conseguida principalmente custa do futuro. Abarca a sobrevivncia de diversidade cultural humana e tambm de muitos dos organismos com os quais ela divide o planeta, assim como as comunidades que eles formam. Ou seja, para ele, o principal desafio para a humanidade realizar um conjunto de sete transies interligadas para uma situao mais sustentvel no sculo XXI. Porm, segundo Veiga (2005), a fsica anterior ao surgimento da termodinmica trabalhava com a hiptese de que quase todos os fenmenos poderiam ser reversveis. No entanto as pesquisas cientficas dos ltimos vinte anos indicam uma rejeio bem generalizada da hiptese de que uma reverso do sentido do movimento de qualquer varivel permite facilmente volta ao equilbrio anterior. No h retorno ao estado inicial. Segundo Sachs (2002) a abordagem fundamentada na harmonizao de objetivos sociais, ambientais e econmicos, primeiro chamada de eco desenvolvimento, e depois de desenvolvimento sustentvel, no se alterou substancialmente nos vinte anos que separaram as conferncias de Estocolmo e do Rio. Segundo ele, permanece vlida nas recomendaes de objetivos para oito de suas dimenses: social, cultural, ecolgica, ambiental, territorial, econmica, poltica nacional e poltica internacional. Quanto s dimenses ecolgicas e ambientais, os objetivos da sustentabilidade formam o trip: preservao do potencial da natureza para a produo de recursos renovveis; limitao do uso de recursos no renovveis; respeito e realce para a capacidade de autodepurao dos ecossistemas naturais. A abordagem de desenvolvimento explicitada at ento, proveniente de encontros, conferncias, entre outros, possibilitou uma grande integrao dos mais diversos

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42/247setores, porm importante salientar a dificuldade de se chegar a consensos nos acordos internacionais devido a grande diversidade de interesses envolvidos. H outras correntes de pensamento em relao temtica de gerar alternativas ao desenvolvimento tradicional, provenientes de instituies distintas. Segundo Silva (2000) so trs as correntes principais: a Economia Ecolgica, a Permacultura e a Economia Solidria. Essas correntes explicitam interesses de setores civis diversos, e no sero aprofundadas neste trabalho, porm so iniciativas que no podem deixar de ser citadas devido tica de cooperao intrnseca que possuem.

2.2

Limitaes

No estabelecimento dos princpios fundamentais para a idia de sustentabilidade necessrio que sejam enfrentadas algumas questes bsicas que suscitam indagaes a respeito de determinadas fragilidades, no repertrio de componentes de uma perspectiva de desenvolvimento mais equilibrado e duradouro. Muitos aspectos desses ns, ainda no foram resolvidos ou superados e ficam na dependncia da evoluo de outros fatores cruciais. Entre eles, uma evoluo cientfica e tecnolgica que faculte procedimentos menos agressivos s apropriaes e s exploraes do meio ambiente e dos recursos naturais que dele tm sido extrados. O desenvolvimento da cincia e da tecnologia tem-se dado, geralmente, de forma subordinada aos interesses do capital financeiro e das relaes de poder (SILVA, 2000). Outros dos ns dizem respeito s formas de organizao poltica, econmica e social da sociedade, suas relaes de trabalho, de produo e consumo, bem como as conseqncias scio-ambientais de um perodo marcado pela hegemonia de uma economia de mercado globalizado. Desta forma, de um lado tem-se a demanda por uma capacitao tecnolgica e cientfica que favorea as condies de uma relao menos danosa ao meio ambiente e, de outro, a perspectiva de um novo desenho para as relaes institucionais, polticas e econmicas que viabilize uma maior equidade na sociedade (SILVA, 2000). A limitao dos ecossistemas diz respeito ao antrpica, que no acompanha o ciclo de transformao natural do ambiente fsico. Enquanto no se obtiver conhecimento e no se agir de acordo com este ciclo, com este limitante, no se estar assegurando s geraes futuras a paisagem e o bem estar que merecem.

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2.3

Definies

Segundo Silva (2000), a sustentabilidade pode ser caracterizada pelo carter progressivo (de tendncia e dinmico); holstico (plural, de indissociabilidade e interdisciplinar) e histrico (espacial, temporal e participativo). Suas caractersticas podem ser mais bem compreendidas na Quadro 1.Quadro 1. Sntese de caractersticas bsicas da sustentabilidade segundo Silva, (2000).CARTER PROGRESSIVO CARTER DE TENDNCIA A sustentabilidade se apresenta como uma condio a ser introjetada em um processo onde se pretende atingir determinadas metas devendo ser continuamente e permanentemente reavaliada. No se trata de algo tangvel que se adquira definitiva e completamente, mas uma condio que deve interagir com o dinamismo da realidade em que se insere, adequando-se a fatores conjunturais, estruturais ou imprevisveis. CARTER HOLSTICO CARTER PLURAL A sustentabilidade pluridimensional e envolve aspectos bsicos tais como: ambientais, econmicos, sociais e polticos. Novas dimenses podem ser acrescentadas se o problema em questo assim o exigir. Alm do carter plural que pressupe o envolvimento de vrios aspectos, existe um vnculo indissocivel entre eles exigindo a sua plena considerao para que se garanta uma condio sustentvel. Devido amplitude de interaes que so contempladas em suas consideraes, demanda-se a confluncia de diferentes reas do conhecimento, tanto para a construo de suas compreenses tericas como de suas aes prticas. CARTER HISTRICO CARTER ESPACIAL Embora a noo de sustentabilidade tenha um forte perfil de origem que valoriza as condies endgenas, ela no pode prescindir da insero e interao dos contextos locais com os mais amplos, contemplando tambm as causas e conseqncias das pegadas ecolgicas. A relao de tempo adquire uma importncia fundamental no equacionamento das aes praticadas no passado, no presente e as que sero exercidas no futuro. Quando se trata do meio urbano, geralmente se adota o tempo social do universo antrpico. A preservao de uma condio sustentvel tem uma forte interdependncia com o aspecto da diversidade participativa dos agentes sociais, na medida em que a presena ou no deste fator pode tanto contribuir, como comprometer as metas pretendidas.

CARTER DINMICO

CARTER DE INDISSOCIABILIDADE

CARTER INTERDISCIPLINAR

CARTER TEMPORAL

CARTER PARTICIPATIVO

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44/247Quadro 2. Princpios e estratgias gerais de sustentabilidade segundo Silva, 2000.ASPECTO AMBIENTAL PRINCPIOS E ESTRATGIAS GERAIS Manuteno da integridade ecolgica por meio da preveno das vrias formas de poluio, da prudncia na utilizao dos recursos naturais, da preservao da diversidade da vida e do respeito capacidade de carga dos ecossistemas. Viabilizao de uma maior equidade de riquezas e de oportunidades, combatendo as prticas de excluso, discriminao e reproduo da pobreza e respeitando a diversidade em todas as suas formas de expresso. Realizao do potencial econmico que contemple prioritariamente a distribuio de riqueza e renda associada a uma reduo das extremidades scio-ambientais, buscando resultados macro sociais positivos. Criao de mecanismos que incrementem a participao da sociedade nas tomadas de decises, reconhecendo e respeitando os direitos de todos, superando as prticas e polticas de excluso e permitindo o desenvolvimento da cidadania ativa.

SOCIAL

ECONMICO

POLTICO

2.4

A Histria

Segundo Brian Edwards (2001), muitas publicaes ilustram os projetos verdes sem distinguirem suas diferenas culturais, sociais e ambientais. A publicao GREEN ARCHITECTURE (2001), visa demonstrar: A existncia de diferenas regionais na filosofia da sustentabilidade e na sua prtica; A maneira que a sustentabilidade enderea no somente os problemas globais (tais como as mudanas climticas), mas tambm questes ambientais locais (tais como a regenerao de cidades); A existncia de solues high-tech e low-tech, normalmente utilizadas conjuntamente eu um s projeto; A maneira como o espao alterado pela sustentabilidade. O maior argumento feito pelos editores desta publicao de que existe uma interpretao diferenciada quanto ao projeto sustentvel ao redor do mundo. As foras que levam para esta complexidade climtica, cultural, profissional e os fatores sociais podem ser facilmente oprimidas pela internacionalizao da sustentabilidade, so balanceadas. o que evidenciada pela literatura cientfica. Uma prtica sustentvel mais apropriada ocorre quando tanto as questes locais quanto as globais

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Existe uma importante distino entre o termo low-energy e projeto ecolgico. Em edifcios onde a questo da energia associada proteo das florestas ou conservao da gua, o conceito de sustentabilidade fornece uma estrutura para uma tomada de deciso integrada. Nesta abordagem surge uma nova linguagem arquitetnica associada a disposio urbana, a planta e a seo do edifcio; o uso de materiais e os servios de manuteno do edifcio. Cada qual se altera pela agenda local de sustentabilidade e ser explorado pelos especialistas que conhecem a prtica de seu pas. A nova ordem da sustentabilidade no universal, mas, como o classicismo, modificada por circunstncias regionais. uma ordem de processo e pensamento necessariamente ajustados por circunstncias locais a apropriao da sustentabilidade e sua relevncia cultural atm-se a celebrao da diferena. Neste sentido a nova arquitetura deve procurar o detalhe, mostrando como as tradies culturais, agendas polticas, habilidades de ofcio e tecnologias locais esto conectadas com a sustentabilidade, dando forma a uma rica e diversa arquitetura global para o sculo XXI. Segundo Brian Edwards e Christina du Plessis (ARCHITECTURAL DESIGN, 2001), as razes do movimento ambiental podem ser remetidas ao sculo XIX. John Ruskin, William Morris e Richard Lethaby, cada qual de diversas maneiras questionaram a suposio de que a industrializao satisfaria as necessidades espirituais e fsicas da humanidade. Ruskin no livro The Seven Lamps of Architecture escreveu que o desenvolvimento deveria ser modelado em cima da ordem harmnica encontrada na natureza. Morris advogou um retorno ao campo com implicaes para a autosuficincia e um retorno s habilidades locais de ofcio. Lethaby, em um de seus diversos conselhos retricos, chamou os arquitetos para que reconhecessem a magnfica ordem da natureza. Todos os trs usaram o termo natureza o que hoje pode ser substitudo pela palavra sustentabilidade. O sculo XIX terminou com a emergncia de um movimento claro quanto aos projetos sustentveis. Patrick Geddes na Esccia, Buckminster Fuller e Frank Lloyd Wright nos EUA, Hassan Fathy no Egito e, mais recentemente, Richard Rogers e Norman Foster no Reino Unido. Todos estes desenvolveram as idias destes pioneiros. Mas suas respostas foram completamente diferentes. A natureza foi substituda por projetos low-energy pela presso do problema imediato do aquecimento global. Visto que Rogers e Foster tm desenvolvido novos prottipos para escritrios energeticamente eficientes,

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46/247escolas e mesmo terminais de aeroportos, h uma presso oposta de que os projetos do sculo XX devam melhorar as condies ambientais de reas urbanas. Isto encontrou expresso em cidades climatologicamente modificadas, por exemplo, por grandes estruturas de vidro ou plstico que absorvem o calor para dentro do ambiente, enquanto eliminam o ar frio. Geddes e Fueller argumentaram que novas plantaes dentro de reas urbanas fazem com que a natureza seja trazida para um contato direto com a raa humana. Fathy e Wright possuam uma viso diferente: ambos buscavam os materiais e ofcios locais com o esforo de produzir uma arquitetura moderna de acordo com as tradies regionais. No processo, introduziram a idia que a sustentabilidade social e o projeto ecolgico esto intimamente ligados. O grupo Archigram, no incio dos anos 60, tambm vislumbrou uma distintiva reconciliao entre a alta tecnologia e os problemas ambientais. Alguns de seus projetos urbansticos demonstram uma grande preocupao com as reas verdes, atribudas noo da migrao de espcies e integrao de complexidades ecolgicas e ordens arquitetnicas. A questo ecolgica nunca realmente extinguiu-se apesar do movimento moderno. A alta tecnologia, maior florescimento da modernidade, j havia planejado incorporar a sustentabilidade, no com esse termo, pelos anos 1990. No fim do sculo, a precisa engenharia, a computao e a ecologia, fizeram com que os edifcios deixassem de ser pesados, tornando-se mais leves, flexveis e em parte mveis. Como Rogers notou, edifcios devem ser como pssaros que movem suas partes e mudam suas formas metabolizando-se s diferentes condies ambientais. Esta forma que responde s condies ambientais construiu, com sucesso, a ponte entre os mundos do homem e da natureza, respondendo assim s predies de Ruskin, Morris e Lethabe. Adotando um panorama mais amplo da histria, possvel discutir que a prtica da sustentabilidade existiu durante todo o perodo medieval e continua sobrevivendo em reas subdesenvolvidas. Os monastrios da Europa produziam seu prprio alimento, construam os edifcios com os materiais locais, coletavam e reciclavam a gua, e desenvolviam tecnologias com uso de energia renovvel (como moinhos de gua e de vento). Estas eram sociedades estruturadas que tomavam cuidado com os velhos e com os doentes, cultivavam a terra de acordo com os princpios ecolgicos e cultivavam peixes, pssaros e animais com humanidade. Tais prticas podem ainda ser encontradas em comunidades rurais na Amrica latina, frica e na sia. O

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desenvolvimento sustentvel no um termo que se ouve nestes locais, mas na realidade estes so os lugares de onde o resto da humanidade extrai as maiores lies. O Iluminismo na Europa promulgou uma viso cientfica e racionalista do mundo. Sobreviveu ao presente na percepo mecanicista da sustentabilidade, compartilhada pela maioria dos arquitetos e engenheiros do ocidente. Esta expresso refletida em relao energia, aos combustveis fsseis, aos indicadores e definies. O ocidente tende a medir a sustentabilidade enquanto o oriente e o sul simplesmente a sente. A sia e a frica acabam por serem bons praticantes da arquitetura consciente atravs do instinto e seu ponto da referncia no Newton ou Einstein, mas sim o xaman, ou guardio da sabedoria local. Uma das maiores ironias do mundo moderno que as sociedades que mais falam sobre a sustentabilidade (como EUA, Alemanha e Frana) so freqentemente as menos ecolgicas na prtica. H uma relao inversa entre a retrica ecolgica e a prtica. A maior parte da frica e da sia possui um impacto ambiental minsculo per capita comparado aos pases desenvolvidos e seus exemplos de projeto verde so raramente encontrados nos livros e publicaes mais recentes que tratam da sustentabilidade. Como uma indicao geral, a aproximao espiritual ao projeto verde encontrada no mundo subdesenvolvido e o termo low-energy, no mundo desenvolvido. Tanto a histria como a geografia fornecem lies valiosas que permitem que a prtica atual seja ajustada a um mais amplo contexto social e cultural. A sustentabilidade tem sido um desafio recorrente para a humanidade desde que os homens e as mulheres comearam a se estabelecer na superfcie da terra. O nomadismo aliviou a raa humana de um dever de cuidado com a terra, porm assim que deram forma a vilas no poderiam mais se esconder das conseqncias ambientais do desenvolvimento fsico. Estas conseqncias expressaram-se de diversas maneiras: poluio, escassez de recursos e doenas. A sade um problema perene em cidades que tendem ao crescimento possivelmente a doena um motor da sustentabilidade mais forte do que a energia. A busca para uma vida saudvel foi o que assegurou a existncia do espao aberto nas cidades medievais, regulou o uso dos materiais no edifcio, controlou a extrao e o uso da gua e construiu uma rede de drenagem. Este legado aparente nos

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48/247incontveis cdigos de edificaes e nos modelos de lei do sculo XIX. O que bvio que no foi a questo da energia, a necessidade de preservar a biodiversidade ou a proteo dos recursos ambientais que estruturaram os adensamentos humanos, mas sim a sade pblica. E hoje a sade global, alm da pessoal, que est emergindo como a questo mais radical da sustentabilidade. O futuro promete um novo contrato entre o uso da energia e a sade, e, nesta equao, os edifcios e as cidades tero um papel crucial. Uma lio da histria que, o que restringe o desenvolvimento sustentvel raramente a escassez de recurso. O limite da prosperidade nas cidades como Londres ou Hong Kong no a restrio de recurso, mas sim a poluio. A poluio urbana causada pelo setor de transportes causa muitas mortes por ano, entre cncer, doenas de corao e bronquite. Com uma mudana de nfase, vem uma nova e clara agenda para o projeto do edifcio. A arquitetura, que responsvel por metade de todo o consumo de recurso do mundo (entre materiais, energia, gua), tem de se conscientizar do fato de que os desperdcios produzidos pelos edifcios esto desordenadamente poluindo o planeta e destruindo a sade e o bem-estar no somente dos ocupantes dos prdios, mas tambm das cidades. O consumo por si prprio um problema. Hoje consumimos muito mais per capita do que antes j se viu, dos bens de consumo, aos carros e at os espaos. O excesso de consumo comumente expressado nas exposies de arquitetura, na postura exagerada da alta tecnologia, de espaos ambiciosos e de parmetros de conforto ultra dimensionados. Os edifcios so acessrios da moda, o cenrio da vida comercial e privada. Dentro dos edifcios, espaos so criados para proteger bens materiais associados ao um estilo de vida baseado no consumo. Portanto enquanto as construes utilizam a metade de todos os recursos ambientais, tambm provem o espao para futuras atividades, aonde ser consumida a outra parte.

2.5

A Busca

Em um mundo de valores cada vez mais padronizados, a sustentabilidade oferece uma possibilidade de desenvolver projetos relacionados ao que h de mais especfico dos lugares. Se o Verde for examinado como a representao de uma aproximao que demonstra interesse tambm cultura, e no somente quanto ao clima, ento a arquitetura sustentvel dever emergir como uma fora significativa para realar o

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valor da vida, das tradies locais. Em um nico pas h uma rede complexa de diversidade cultural, de tradies, de tcnicas construtivas. No possvel que o clima possa ser respondido atravs de um ar-condicionado universal, de uma implantao comum em todos os edifcios. A sustentabilidade quebra o monoplio de solues arquitetnicas globalizadas. As foras que conduziram s cidades globalizadas hoje parecem ser desafiadas por um movimento que valoriza novamente respostas ajustadas a problemas especficos. Como diz Brian Edwards (2001) a sustentabilidade politicamente subversiva. (...) No pode haver nenhum outro caminho ambiental a no ser o de se tornar sustentvel: a civilizao teve que repensar mais de dois sculos de filosofia ocidental industrial.. A conferncia da Organizao das Naes Unidas de mudana climtica de Kyoto (1998) e a conferncia da mudana climtica mundial em Haia (2000) ameaaram quebrar o monoplio de solues arquitetnicas universais. Os edifcios no sero mais como antes e, em pouco tempo, tambm no sero as cidades. As quotas de emisses de carbono significam que ser necessrio queimar menos combustveis fsseis nos carros, indstria e nos edifcios. A perda de significado do lugar, do tempo e da funo desaparecer e as cidades transformar-se-o outra vez em lugares identificveis, baseados em uma sntese de valores culturais e ambientais. No h nenhum argumento tangvel que possa separar a ao ambiental da ao cultural. O lugar uma declarao sobre a geografia, a histria e os recursos. O desenvolvimento do sculo XX foi em muito indiferente a todos os trs. Para depararse com as novas metas de emisso de CO2 necessitamos considerar os combustveis fsseis como recursos escassos e em processo de extino, e necessrio explorar novas fontes de energia renovveis (sol, vento, biomassa). necessrio desenvolver novas tecnologias e solues aos programas do edifcio. Considerando que cada lugar diferente quanto aos recursos, ao clima, as demandas energticas, ao modo de vida das pessoas, as solues do edifcio devem diferenciarse mais eficazmente. Isto significa mais cuidado na escolha de tecnologias mais apropriadas, no necessariamente as mais baratas, o mtodo da construo, o emprego de avaliaes do ciclo de vida, o uso de recursos locais, o emprego de habilidades construtivas locais.

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50/247Mas a diferenciao no somente uma questo futura. uma validao do passado. A arquitetura vernacular evidencia em sua esttica os padres do edifcio melhor adequados s circunstncias locais. As solues ineficientes extintas ao longo do tempo fizeram prevalecer as construes mais aptas. Cidades antigas sejam na Amrica Latina, na frica, na Europa, so lembretes de como construir quando os materiais so escassos, elas demonstram como recursos de energia, de alimento e de gua so buscados localmente. O prmio Aga Khan para a arquitetura est entre os poucos que do o

reconhecimento ao passado, de forma a informar o futuro. Os projetos sustentveis devem aprender suas lies com as cidades que cresceram em perodos de escassez. E no somente uma questo construtiva, tais lies estendem-se ao inteiro ecossistema das cidades com seus padres de reciclagem, reuso e renovao. Espaos particulares, vernaculares ou projetados, so valorizados pelos significados que carregam. O significado social permite s cidades e aos seus edifcios serem apreciados. Suas razes so variadas, e dependem da sujeio cultural das pessoas. O que avaliado pelos arquitetos no o mesmo avaliado pela sociedade em geral. H uma grande diferena entre o gosto profissional e o do pblico. A sustentabilidade oferece a possibilidade de unio de valores em torno dos objetivos ambientais comuns, trazendo estas questes para o estgio da arquitetura. Para que isto acontea necessrio olhar alm da questo da eficincia energtica do edifcio. Este tipo de edifcio pode produzir uma arquitetura maante, culturalmente pobre. Um projeto verdadeiramente sustentvel abrange a complexidade ecolgica com o enaltecimento da vida, nele a arquitetura no deve morrer, no deve se subordinar a apenas funes. A natureza usa o mnimo de recursos para criar o mximo de riqueza e beleza, sendo totalmente reciclvel em seus processos. O homem ocidental, por outro lado, usa o mximo dos recursos para construir as cidades, com o mnimo de riqueza e beleza, empregando menos de 10 por cento de reciclagem em seu processo. O homem e a natureza necessitam urgentemente comear a unir seus sistemas, este deve ser o objetivo para o novo sculo. Haver camadas de interaes entre cada sistema utilizando os desperdcios de outros, para assim criarem prosperidade, beleza e auto-suficincia. A ambio social, cultural e arquitetural dever mudar de rumo para uma nova corrente, aonde a velha

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diviso entre a cidade e o campo, o homem e a natureza, a ecologia e a cultura devero ser dissolvidas.

2.6

A Natureza e as Religies

Pode-se discutir que a filosofia crist tenha em muito ajudado a espalhar as sementes do anti ambientalismo no mundo ocidental. A Bblia est cheia de referncias quanto ao controle, ordem e ao domnio do mundo natural. O papel do homem na vida era o de subjugar a Terra (Bblia Gnesis 1.28) e de governar o jardim (Bblia Gnesis 2.15). O que a Bblia descreve como o domnio da humanidade sobre a natureza pode ter conduzido a uma tica de dominao. A base crist por sobre a qual a sociedade ocidental construda possui uma tendncia de colocar o homem distante da ordem natural. De maneira oposta, algumas religies orientais integram a humanidade em um sistema global ecolgico. Tal integrao no somente fsica, mas, o mais importante, tambm espiritual. Os lemas cristos: multiplicar, explorar e prosperar; transformaram-se em muitos aspectos na ordem internacional do negcio. o motor das trocas, a base por sobre a qual as empresas conduzem seus negcios e os governos controlam seus recursos. tambm a base conceitual para a construo de cidades e edifcios. O meio pela qual a dominao sobre a natureza foi conseguida foi em grande parte atravs da cincia e tecnologia. Ambos esto no centro da prtica arquitetnica. A tecnologia do edifcio tornou o mais leve, mais eficiente e melhor integrado. Isso possibilitou uma maior eficincia no uso de energia, dos materiais, da gua. Estes ganhos objetivos, entretanto, no se dirigem a realidade que est atrs do racional e cientfico. As cidades modernas, poludas, caticas e estressantes so um tipo de doena que reflete no somente a ambiental, mas tambm uma crise da condio humana. Conceitualmente, a sustentabilidade busca no o domnio sobre a criao, mas uma delicada vigilncia aos abundantes recursos da Terra. A base da definio da ONU de desenvolvimento sustentvel de que a raa humana no est separada do sistema global, porm integrada a ele atravs da disciplina da ecologia humana, social e ambiental. Embora a face exterior da natureza parea hostil e imprevisvel, os homens atribuem significado para a vida, buscam uma introspeco mais profunda, que diferentemente interpretada de acordo com cada cultura e religio.

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52/247Ainda que todos os povos dependam igualmente da natureza para sua subsistncia, diversas so as atribuies a ela. A posio crist sempre foi a de que a fora superior estava alm da natureza, a qual a humanidade teria controle. Os cristos olham seu Deus atravs da natureza e, neste processo, dominam todas as coisas vivas. Os gregos, por outro lado, olharam a natureza atravs dos deuses. O papel dos deuses era o de expressar as leis naturais e de serem seus intermediadores junto aos homens. O Classicismo celebrava a natureza como um objeto de harmonia e beleza. No Brasil, o candombl, religio afro-brasileira, cultua os orixs, as foras

elementares oriundas da gua, da terra, do ar, do fogo, entre outros elementos. Essas foras em equilbrio produzem uma enorme energia (ax), que fornece ajuda para que o destino das pessoas seja mais favorvel. Nesta religio, quando se adoram os deuses, adorando-se as foras da natureza, pertencentes criao do grande pai. A integrao com a natureza fundamental nesta crena, pois quanto maior o contato com ela, maior ser o desenvolvimento, a energia, o ax adquirido, portanto, maior ser o elo cordo de ligao com seu orix, aproximando-o ainda mais de lorum, o deus criador do universo. A viso budista trata a natureza como arte, criando uma iluso e distorcendo o mundo natural. A filosofia budista um acordo entre o homem e deus, a natureza como um cenrio perfeito para a meditao. H uma interdependncia entre a humanidade e o mundo em geral, uma harmonia interna e externa que coloca a natureza dentro de uma ordem csmica maior. A posio Taosta outra vez completamente diferente: aqui h uma apreciao da natureza de forma aesttica. O mundo natural no a realidade final, mas a preparao da humanidade para a beleza eterna da vida aps a morte. A natureza moldada, capturada e idealizada. Em religies xamnicas antigas, o xam agia como um intermediador entre os espritos dos povos do passado e do presente, dos lugares e das plantas. Ele possua o poder de curar o povo e o ambiente, dentro de espaos especiais. Destes cresceram as construes culturais e sociais que colocaram a natureza dentro da condio humana. O conhecimento coletivo era essencialmente ecolgico. Estas interpretaes gerais das diferentes religies ajudam a explicar o paradoxo das atitudes modernas frente natureza. No h uma viso universal, mas uma srie de tradues culturais. Conseqentemente, no se pode esperar uma nica leitura global da crise ecolgica. Todos os povos interpretam a mudana da realidade climtica e

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natural de uma

forma

diferente. A arquitetura, especialmente

a arquitetura

sustentvel, influenciada necessariamente por fatores religiosos, sociais e culturais. A maneira como os edifcios so vistos central para o modo como so projetados. Santiago Calatrava (TZONIS, 1999) usa o olho como um exemplo da adaptao s diferentes condies externas. Nossa tarefa a de ir alm do racional, procurar uma arquitetura que seja algo vivo, que enriquea a vida em diferentes nveis.

2.7

O Consumo

Como j foi visto na introduo, nos nveis atuais de consumo a espcie humana requer aproximadamente trs planetas Terra para sustentar-se. As reas de stress de recursos esto nos combustveis fsseis, nas terras para agricultura, na disponibilidade de gua potvel, nas madeiras densas, na disponibilidade de peixes e, o mais importante, na questo do clima global. Enquanto a Terra modificada para responder s necessidades humanas, h uma perda de espcies, de diversidade gentica e de habitats virgens. O planeta est se transformando em uma enorme fazenda para suportar as cidades que crescem rapidamente. A destruio ecolgica evidente em toda parte e a raa humana prontamente aceita a extino global de talvez 4.000 espcies ao ano a fim de reorganizar a terra em uma linha de produo que suporte suas prprias atividades. As duas reas de estresse iminentes de recursos, combustveis fsseis e instabilidade climtica, so ambas influenciadas diretamente por decises realizadas pelo setor da construo civil. Os edifcios consomem a metade de toda a energia de combustvel fssil e a totalidade das cidades consome trs quartos. As decises de incorporadores, de arquitetos, engenheiros, de planejadores das cidades so cruciais sobrevivncia da humanidade e tambm dos sistemas naturais.

2.8

O Desafio

A evidncia da existncia do aquecimento global devastadora. A cincia estabeleceu alm da dvida a correlao entre a queima de combustveis fsseis e o aquecimento planetrio. Uma evidncia mais recente demonstra que outras atividades humanas esto acelerando a ascenso das temperaturas globais. Estas incluem a destruio das florestas (principalmente para fornecimento da indstria da construo) e o desperdcio e a liberao associada a gases txicos. O aquecimento global um fato incmodo para polticos, projetistas, para a indstria da construo, para os homens

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54/247em geral. tambm uma realidade para muitas outras espcies que tm seus habitats destrudos pelas florestas, ascenso do nvel dos oceanos e desertificao. No s o homem que est sob ameaa; todo o ecossistema pressionado pelo aquecimento global. Porm o aquecimento global somente parte do desafio. O ano de 2000 marcou, pela primeira vez na historia da humanidade, a populao urbana excedendo a rural. Isto envolve no somente uma intensificao de problemas urbanos como a poluio, a aglomerao e a presso sobre os recursos, mas tambm eleva a expectativa de vida. Com isso consomem-se mais e mais objetos pessoais como ar condicionado, automveis e dispositivos consumidores de energia. Enquanto a espcie humana se torna mais urbana, ela consome mais e polui mais. A grande pergunta atual para ecologistas se o sucesso humano como uma espcie estar confinada pela escassez ou pela poluio de recursos. Os edifcios de hoje necessitaro acomodar a escassez de recursos do futuro. A poluio e a presso intensiva nos espaos resultaro em um crescimento da populao por sobre uma rea geogrfica cada vez menor: a cidade. Durante a dcada passada a problemtica do aquecimento global, com seus associados acordos internacionais (Rio, Kyoto), moveu-se para um interesse mais amplo em relao ao estado das cidades, do meio-ambiente e da sade. Esta mudana central noo do desenvolvimento sustentvel. A sustentabilidade intelectualmente mais interessante, profissionalmente mais desafiadora e nas questes de projeto mais exigente do que qualquer outra agenda. Emergiu como o novo limite da cincia, a base para inovadoras tecnologias e novas aproximaes de projeto, um novo paradigma para a equidade social e a lente atravs da qual pode-se ver o desenvolvimento humano. Os pioneiros (Fuller, Brundtland, the Vales) de uma arquitetura consciente em relao a questes ambientais enfatizaram a dimenso da energia no conceito de sustentabilidade. Isto permanece como um interesse primrio por causa da crescente acelerao nos nveis de emisses globais de carbono. Mas o projeto eficientemente energtico produz uma boa arquitetura? H pouca evidncia que conecte a esttica conservao de energia.

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O fluxo humano s cidades acompanhado por conseqncias adicionais para o projeto sustentvel. A raa humana gasta hoje maior parte de seu tempo dentro de ambientes. O habitat humano essencialmente um interior. Os ambientes internos construdos afetam o homem em termos de sua sade fsica e mental, por isso devem melhorar sua produtividade e a harmonia social. Os benefcios sociais esto comeando a ser trazidos ao foco do novo milnio. Representam a fuso de uma base tecnolgica, da sustentabilidade social, produtividade e coeso social baseados em um estilo de vida saudvel. Tambm para arquitetos, o reconhecimento de uma dimenso social da sustentabilidade permite que os edifcios respondam a questes de projeto que vo alm da questo energtica. Segundo Edwards (2001) diferentes projetistas aprenderam a empregar a ordem da natureza em suas prprias formas, desde Future System