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Sábado, domingo e segunda-feira, 6, 7 e 8 de dezembro de 2014 | Valor | A13 É pelos 20 centavos sim! Cúpula reúne grupos de países que caminham a velocidades diferentes. Por José Llorente “Os EUA são a melhor casa de um quarteirão ruim. O ciclo global está dessincronizado”. De Vincent Reinhart, economista-chefe para os Estados Unidos do Morgan Stanley, para quem a mudança da política monetária pelo Fed deslanchará um ‘teste de estresse em tempo real’ David Kupfer As decisões de investimento concentram-se em reestruturação patrimonial A coluna passada, “O Câmbio e o Saldo”, de 10 de novembro últi- mo, enfocou os im- pactos da trajetória da taxa de câmbio sobre as decisões de pro- dução dos agentes econômicos. Sugeriu-se que quanto mais vo- látil for essa trajetória, menores em grau ou mais lentos em rit- mo serão os seus efeitos sobre essas decisões devido ao fato primordial de que para bens co- mercializáveis as expectativas quanto ao nível futuro da taxa de câmbio são mais relevantes do que o seu nível corrente. Nesta coluna, a reflexão é dire- cionada para a relação entre a tra- jetória da taxa de câmbio e as de- cisões de investir. Embora o fator expectacional mantenha a sua primazia, é importante ter claro que tratar do investimento requer um quadro analítico mais amplo. Em primeiro lugar, o cálculo eco- nômico deixa de se referir apenas a valores correntes e esperados de custos e receitas e passa a refletir também valores presentes e futu- ros dos diferentes ativos envolvi- dos na formação de capital, alar- gando os horizontes temporais e aumentando as exigências dos agentes em termos do grau de confiança na economia. Em segundo lugar, enquanto nas decisões de produção a volati- lidade do câmbio afeta mais in- tensamente os bens comercializá- veis, nas decisões de investimento seu alcance recai sobre a totalida- de da economia. Isso porque todo e qualquer investimento engloba um conjunto de bens de capital que, sendo comercializáveis, po- dem e, pelo menos em parte, são importados pelo país. Em terceiro lugar, a decisão de investimento é tomada em mó- dulos e, portanto, é mais indivisí- vel, mais irreversível e mais cru- cial para o sucesso dos negócios do que as decisões de produção. A imprevisibilidade quanto à ta- xa de câmbio futura afeta a esti- mativa do custo do investimento e tende a provocar uma preferên- cia por adiar a aquisição do ativo à espera de que mais à frente fi- que mais claro para qual valor a taxa de câmbio está efetivamente rumando. É a chamada preferên- cia pela flexibilidade. A preferência pela flexibilida- de ajuda a explicar porque no Brasil as decisões de investimen- to concentram-se em operações de reestruturação patrimonial que aumentam a eficiência do capital já imobilizado em detri- mento de investimentos em ati- vos realmente novos (green- field), que teriam impacto muito maior sobre a produtividade e o dinamismo da economia. Essa é a essência da hipótese da rigidez estrutural que há anos sustento como a maior mazela enfrentada pelo sistema produtivo brasilei- ro. Vem daí, por exemplo, uma possível razão para o aparente paradoxo representado pela convivência de um nível de utili- zação da capacidade instalada relativamente alto (81,5% cf. CNI, média do primeiro semestre de 2014) com o quadro de virtual estagnação exibido pela econo- mia brasileira no período. Sem pretender sequer arranhar os termos do debate que a teoria econômica reserva para o processo de formação de expectativas, é possível delinear uma explicação. Olhando para trás, percebe-se que nos quatro últimos anos está em curso uma trajetória de desvalori- zação do real em relação ao dólar em degraus de aproximadamente vinte centavos ao ano. Esse proces- so não é linear, havendo um overshooting de outros quinze centavos que, por sua vez, é reverti- do dentro de cada período. Esse movimento pode ser depreendido simplesmente da análise da evolu- ção dos valores das médias móveis de 6 meses e dos máximos das ta- xas de câmbio nominais nesses in- tervalos tomando-se como refe- rência o final do mês de junho de cada ano, a saber: em 2011, R$ 1,61 e R$ 1,67; em 2012, R$ 1,87 e R$ 2,02; em 2013; R$ 2,05 e R$ 2,22 e em 2014, R$ 2,28 e R$ 2,43. No entanto, a despeito dessa trajetória, os agentes se baseiam em um modelo expectacional que associa aumento da inflação hoje com valorização do real amanhã, pois entendem que a âncora cambial ainda é parte ativa da estratégia de estabiliza- ção monetária. Por isso, quando vêem a inflação em ascensão an- tecipam que o real irá se valori- zar (via aumento da taxa de ju- ros) e passam a exercer a prefe- rência pela flexibilidade. Resul- tado: as decisões de investimen- to são adiadas em toda a econo- mia, incluindo as atividades de serviços nas quais as decisões de produção podem ser mais imu- nes à volatilidade do câmbio, mas não as de investimento. Essa (falta de) dinâmica é par- ticularmente preocupante dian- te do fato de que o ciclo de inves- timento em andamento na eco- nomia brasileira está apoiado na expansão da infraestrutura sen- do, portanto, muito capital-in- tensivo e envolvendo muita tec- nologia incorporada nos bens de P rovavelmente ninguém fez tanto pela integra- ção ibero-americana co- mo o recém-falecido Roberto Gómez Bolaños, com seus inesquecíveis personagens Chaves e Chapolin Colorado. Em espanhol ou português, ele con- seguiu nos mostrar um pouco da realidade da nossa região em ca- da uma de suas histórias. E talvez esse seja o ambiente que muitos esperam encontrar no México, sua terra natal, durante a XXIV Cúpula Ibero-americana, hoje e amanhã na cidade de Veracruz. Mesmo com a Educação e a Ino- vação como eixos centrais do en- contro, o panorama econômico da região para o próximo ano sem dúvida marcará grande parte das discussões. E a participação confir- mada de pelo menos 20 presiden- tes parece endossar ainda mais a importância do debate. No ano passado, no Panamá, um número ainda menor esteve presente. Porém, esta não será uma discus- são fácil em uma Ibero-América que caminha a duas velocidades: de um lado estão os países da Aliança do Pacífico. Chile, Colôm- bia, México e Peru chegam ao en- contro com perspectiva de cresci- mento que vai desde 2%, no Chile, até os quase 4,8% na Colômbia, de acordo com o FMI, e com a firme in- tenção de seguir investindo em processos de liberalização econô- mica. E apoiados por uma econo- mia mexicana revitalizada que pre- vê um crescimento acima do 3%. Do outro lado, o bloco do Mer- cosul, mais propenso ao prote- cionismo, chega a Veracruz com um cenário mais pessimista: com exceção do Paraguai e Uruguai (com crescimentos em torno ao 4% e 2,8%, respectivamente), Bra- sil, Argentina e Venezuela aguar- dam por um ano difícil. Argenti- na e Venezuela com números ne- gativos de crescimento, enquan- to o Brasil terá que se esforçar muito para superar o 1%. Entre esses dois blocos, países como a Bolívia, Panamá ou Repú- blica Dominicana esperam, de acordo com o FMI, crescimentos espetaculares acima de 5%. Diante de um cenário tão desi- gual, somado à ausência confir- mada de Cristina Kirchner, o Bra- sil tem o desafio de dar um passo a frente e assumir o papel de pro- tagonista no México. Quer pela simples necessidade de fortalecer os laços comerciais com os seus “vizinhos prósperos”, ou porque capital. Estrategicamente, isso implica perceber que para reto- mar uma taxa mais robusta de in- vestimento não basta lubrificar os circuitos regulatórios e de fi- nanciamento que vem travando a aceleração dessas obras. Se as indústrias fornecedoras não lo- grarem reverter mesmo que par- cialmente o hiato de competiti- vidade que se acumulou nos úl- timos anos, e principalmente, não intensificarem o ritmo de inovação, as pesadas importa- ções de bens de capital poderão contaminar o processo de inves- timento com o virus da prefe- rência pela flexibilidade. Nesse ponto, cabe lembrar as manifestações de junho de 2013 cuja irrupção foi motivada — o que não quer dizer explicada — pelo aumento de vinte centavos de real nos preços das passa- gens de ônibus. Com relação à taxa de câmbio, cabem mani- festações similares em favor de uma condução mais decidida da política cambial. É pelos vin- te centavos sim! Ironias à parte, feliz ano velho para todos nós. David Kupfer é professor licenciado e membro do Grupo de Indústria e Competitividade do Instituto de Economia da UFRJ (GIC-IE/UFRJ) e assessor da presidência do BNDES. Escreve mensalmente às segundas-feiras. E-mail: [email protected]) www.ie.ufrj.br/gic. As opiniões expressas são do autor e não necessariamente refletem posições do BNDES. o crescimento de toda a região necessita de um “Brasil saudável”, especialmente diante de um ce- nário internacional de redução na demanda de matérias-primas. Mas não é só isso. As melhores perspectivas do México — impul- sionado pela recuperação dos Es- tados Unidos — ameaçam roubar os investimentos que poderiam vir para o Brasil. E o Brasil não se pode dar ao luxo de perder um trem que já avança a uma veloci- dade maior que a sua. A presença da Espanha pode ser útil tanto por ser o segundo maior investidor estrangeiro no Brasil, como pela necessidade de viabilizar o acordo entre o Merco- sul e a União Europeia. E Veracruz pode abrir novos caminhos. Como dizem os especialistas, a Espanha saiu do poço mas ainda está no purgatório. Ainda que os sinais de recuperação convidem ao otimismo, o fantasma de 23% de desemprego reflete o fato que, al- gumas vezes, a economia melhora sem melhorar a vida das pessoas. Assim, também a Espanha es- pera que o Brasil seja esse sócio que tanto precisa, para continuar sendo um dos principais desti- nos da suas empresas, mas tam- bém para ter mais e maiores in- vestimentos brasileiros. Depois de um período de des- confiança, os primeiros sinais do segundo mandato de Dilma Rousseff têm sido bem recebidos pelos empresários no Brasil. Ago- ra essa mensagem deve chegar aos vizinhos da Ibero-América e do mundo. E a cúpula ibero-ame- ricana será essa oportunidade. Mas, junto a estas complexida- des econômicas, existe também o desafio político de liderança regio- nal. Com o México atravessando dificuldades institucionais e a pró- pria Espanha em um processo de transição política e econômica, a região requer que a diplomacia brasileira assuma, como já fez no passado, a liderança que lhe cor- responde. O Brasil deve ser o gran- de articulador da região diante dos diferentes blocos e foros inter- nacionais. Isto também é parte do fortalecimento institucional que se espera deste governo nos espa- ços internacionais. Hoje, mais do que nunca, a diplomacia tem a oportunidade de se consolidar co- mo questão de Estado, acima de qualquer outra questão, social, econômica ou política. Apesar das complexidades polí- ticas que o país enfrenta hoje, a Cú- pula Ibero-americana é a oportu- nidade que o Brasil tem para colo- car em prática o seu compromisso assumido com a inovação e educa- ção. O país é, junto com a Espanha e Portugal, o único da região a in- vestir mais de 1% de seu PIB em pesquisa e desenvolvimento tec- nológico. É verdade que deveria (e deve) ser mais, porém é inegável que este é um país de grandes em- presários e com uma inesgotável capacidade para inovar. E, em mo- mentos em que as grandes empre- sas do país se encontram no centro de uma crise provocada por obscu- ras gestões é importante não es- quecer o seu papel como referên- cia para toda Ibero-América. Manter a constância em ciclos de crescimento depende da capa- cidade para inovar. Para transfor- mar riqueza em mais riqueza. E se existe uma parte do continente que deseja manter o seu ciclo de prosperidade, existe outra que de- seja muito retomá-lo. E no meio está o Brasil, o gigante do qual to- dos esperam alguma coisa. Sem dúvida, a Cúpula de Vera- cruz pode ser o momento espera- do para que o país retome o cami- nho do crescimento e a liderança a partir da educação, da inovação e da integração ibero-americana. Como bem dizia o personagem Chaves “acho que é bem difícil amar inimigos, mas amar os idio- tas é quase impossível”. José Antonio Llorente é sócio fundador e presidente da Llorente & Cuenca. Cartas de Leitores Desafios do Brasil em Veracruz Frase do dia Corrupção e trens Após excelente trabalho, a Polí- cia Federal encerrou as investiga- ções e acusou 33 pessoas como suspeitas de corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, evasão fiscal, fraude licitatória, formação de quadrilha e outros crimes no cartel de trens em São Paulo, durante o governo do PSDB (1998 - 08). Entre os acusa- dos, então ex diretores de em- presas como Siemens e Bombar- dier, o deputado federal José Aníbal (PSDB) e o ex presidente da CPTM. Por aí se vê o tamanho da corrupção, licitações frauda- das, obras superfaturadas e des- vio de verbas públicas que impe- ram no país, sangrando os cofres públicos em bilhões de dólares. Seja o partido político que for, a corrupção é um crime nefasto, com gravíssimas consequências para toda a sociedade e que não pode ficar impune'. Renato Khair [email protected] Nova equipe O governo por enquanto caiu na real e não chama mais os analis- tas econômicos de pessimistas. E dando mostras de que quem vai mandar mesmo na economia não será mais a Dilma, mas sim o novo indicado para o ministério da Fazenda, Joaquim Levy, final- mente a comunicação do Planal- to se alinha com a do mercado e de forma realista reduz de 2% pa- ra 0,8% a projeção de crescimen- to do PIB para 2015. Até quando a presidente vai obedecer esta nova ordem, eu não sei. Mas, que é um bom começo, e melhor ain- da para o país, que se respeite as regras do mercado, isso eu não tenho dúvidas. Paulo Panossian [email protected] Ao projetar um crescimento de 0,8% para o PIB em 2015, pratica- mente coincidindo com o bole- tim Focus (0,77%) e incorporan- do à proposta de Lei de Diretri- zes Orçamentárias (LDO) de 2015, ora encaminhada ao rela- tor da matéria no Congresso, a equipe econômica do segundo mandato da presidente Dilma mostra sua disposição em traba- lhar com as perspectivas de mer- cado, bem distante, portanto, das projeções delirantes que vi- goraram nos últimos anos e que sempre se chocaram com a reali- dade. Tal novidade deve ser sau- dada como um grande avanço na direção certa. Dirceu Luiz Natal [email protected] Previdência O crescimento da expectativa de vida do brasileiro é um dado muito importante, refletindo o momento que estamos passan- do. Mas isto cria um problema para que o sistema previdenciá- rio continue funcionando. Este é um assunto que exige avaliação na busca de alternativas que pos- sam evitar crises futuras, por fal- ta de verba para cobrir as apo- sentadorias. Uriel Villas Boas [email protected] Diante de um cenário tão desigual, o Brasil tem o desafio de dar um passo a frente e assumir o papel de protagonista. O crescimento da região necessita de um “Brasil saudável”, em especial diante de um cenário internacional de redução na demanda de matérias-primas Opinião Correspondências para Av. Francisco Matarazzo, 1.500 - Torre New York - CEP 05001-100 - Água Branca - SP ou para [email protected], com nome, endereço e telefone. Os textos poderão ser editados.

Artículo de José Antonio Llorente en Valor Económico

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Valor Económico, el diario financiero más influyente de Brasil, dedica media página de su sección de Opinión a este artículo de José Antonio Llorente sobre los desafíos de Brasil en la Cumbre Iberoamericana en Veracruz.

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Page 1: Artículo de José Antonio Llorente en Valor Económico

Jornal Valor --- Página 13 da edição "08/12/2014 1a CAD A" ---- Impressa por GAvenia às 07/12/2014@20:59:46

Sábado, domingo e segunda-feira, 6, 7 e 8 de dezembro de 2014 | Valor | A13Enxerto

JornalValor Econômico -CADA-BRASIL - 8/12/2014 (20:59) - Página 13-Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW

Épelos 20 centavos sim!

Cúpula reúne grupos de países que caminham a velocidades diferentes. Por José Llorente

“OsEUAsãoamelhorcasadeumquarteirãoruim.Ocicloglobal estádessincronizado”.DeVincentReinhart,economista-chefeparaosEstadosUnidosdoMorganStanley,paraquemamudançadapolíticamonetáriapeloFeddeslancharáum‘testedeestresseemtemporeal’

DavidKupfer

Asdecisõesdeinvestimentoconcentram-se emreestruturaçãopatrimonial

Acoluna passada, “OCâmbio e o Saldo”, de10 de novembro últi-mo, enfocou os im-

pactos da trajetória da taxa decâmbio sobre as decisões de pro-dução dos agentes econômicos.Sugeriu-se que quanto mais vo-látil for essa trajetória, menoresem grau ou mais lentos em rit-mo serão os seus efeitos sobreessas decisões devido ao fatoprimordial de que para bens co-mercializáveis as expectativasquanto ao nível futuro da taxade câmbio são mais relevantesdo que o seu nível corrente.

Nesta coluna, a reflexão é dire-cionada para a relação entre a tra-jetória da taxa de câmbio e as de-cisões de investir. Embora o fatorexpectacional mantenha a suaprimazia, é importante ter claroque tratar do investimento requerum quadro analítico mais amplo.Em primeiro lugar, o cálculo eco-nômico deixa de se referir apenasa valores correntes e esperados decustos e receitas e passa a refletir

também valores presentes e futu-ros dos diferentes ativos envolvi-dos na formação de capital, alar-gando os horizontes temporais eaumentando as exigências dosagentes em termos do grau deconfiança na economia.

Em segundo lugar, enquantonas decisões de produção a volati-lidade do câmbio afeta mais in-tensamente os bens comercializá-veis, nas decisões de investimentoseu alcance recai sobre a totalida-de da economia. Isso porque todoe qualquer investimento englobaum conjunto de bens de capitalque, sendo comercializáveis, po-dem e, pelo menos em parte, sãoimportados pelo país.

Em terceiro lugar, a decisão deinvestimento é tomada em mó-dulos e, portanto, é mais indivisí-vel, mais irreversível e mais cru-cial para o sucesso dos negóciosdo que as decisões de produção.A imprevisibilidade quanto à ta-xa de câmbio futura afeta a esti-mativa do custo do investimentoe tende a provocar uma preferên-cia por adiar a aquisição do ativoà espera de que mais à frente fi-que mais claro para qual valor ataxadecâmbioestáefetivamenterumando. É a chamada preferên-cia pela flexibilidade.

A preferência pela flexibilida-de ajuda a explicar porque noBrasil as decisões de investimen-to concentram-se em operaçõesde reestruturação patrimonialque aumentam a eficiência docapital já imobilizado em detri-

mento de investimentos em ati-vos realmente novos (green-field), que teriam impacto muitomaior sobre a produtividade e odinamismodaeconomia.Essaéaessência da hipótese da rigidezestrutural que há anos sustentocomo a maior mazela enfrentadapelo sistema produtivo brasilei-ro. Vem daí, por exemplo, umapossível razão para o aparenteparadoxo representado pelaconvivência de um nível de utili-zação da capacidade instaladarelativamente alto (81,5% cf. CNI,média do primeiro semestre de2014) com o quadro de virtualestagnação exibido pela econo-mia brasileira no período.

Sem pretender sequer arranharos termos do debate que a teoriaeconômicareservaparaoprocessode formação de expectativas, épossível delinear uma explicação.Olhando para trás, percebe-se quenos quatro últimos anos está emcurso uma trajetória de desvalori-zação do real em relação ao dólarem degraus de aproximadamentevinte centavos ao ano. Esse proces-so não é linear, havendo umovershooting de outros quinzecentavosque,porsuavez, é reverti-do dentro de cada período. Essemovimento pode ser depreendidosimplesmente da análise da evolu-ção dos valores das médias móveisde 6 meses e dos máximos das ta-xas de câmbio nominais nesses in-tervalos tomando-se como refe-rência o final do mês de junho decadaano, a saber: em2011,R$1,61

e R$ 1,67; em 2012, R$ 1,87 e R$2,02; em 2013; R$ 2,05 e R$ 2,22 eem2014,R$2,28eR$2,43.

No entanto, a despeito dessatrajetória, os agentes se baseiamem um modelo expectacionalque associa aumento da inflaçãohoje com valorização do realamanhã, pois entendem que aâncora cambial ainda é parteativa da estratégia de estabiliza-ção monetária. Por isso, quandovêem a inflação em ascensão an-tecipam que o real irá se valori-zar (via aumento da taxa de ju-ros) e passam a exercer a prefe-rência pela flexibilidade. Resul-tado: as decisões de investimen-to são adiadas em toda a econo-mia, incluindo as atividades deserviços nas quais as decisões deprodução podem ser mais imu-nes à volatilidade do câmbio,mas não as de investimento.

Essa (falta de) dinâmica é par-ticularmente preocupante dian-te do fato de que o ciclo de inves-timento em andamento na eco-nomia brasileira está apoiado naexpansão da infraestrutura sen-do, portanto, muito capital-in-tensivo e envolvendo muita tec-nologia incorporada nos bens de

Provavelmente ninguémfez tanto pela integra-ção ibero-americana co-mo o recém-falecido

Roberto Gómez Bolaños, comseus inesquecíveis personagensChaves e Chapolin Colorado. Emespanhol ou português, ele con-seguiu nos mostrar um pouco darealidade da nossa região em ca-da uma de suas histórias. E talvezesse seja o ambiente que muitosesperam encontrar no México,sua terra natal, durante a XXIVCúpula Ibero-americana, hoje eamanhã na cidade de Veracruz.

Mesmo com a Educação e a Ino-vação como eixos centrais do en-contro, o panorama econômico daregião para o próximo ano semdúvida marcará grande parte dasdiscussões. E a participação confir-mada de pelo menos 20 presiden-tes parece endossar ainda mais aimportância do debate. No anopassado, no Panamá, um númeroaindamenorestevepresente.

Porém,estanãoseráumadiscus-são fácil em uma Ibero-Américaque caminha a duas velocidades:de um lado estão os países daAliança do Pacífico. Chile, Colôm-bia, México e Peru chegam ao en-contro com perspectiva de cresci-mento que vai desde 2%, no Chile,até os quase 4,8% na Colômbia, deacordocomoFMI,ecomafirmein-tenção de seguir investindo emprocessos de liberalização econô-mica. E apoiados por uma econo-miamexicanarevitalizadaquepre-vêumcrescimentoacimado3%.

Do outro lado, o bloco do Mer-cosul, mais propenso ao prote-cionismo, chega a Veracruz comum cenário mais pessimista: comexceção do Paraguai e Uruguai(com crescimentos em torno ao4% e 2,8%, respectivamente), Bra-sil, Argentina e Venezuela aguar-dam por um ano difícil. Argenti-na e Venezuela com números ne-gativos de crescimento, enquan-to o Brasil terá que se esforçarmuito para superar o 1%.

Entre esses dois blocos, paísescomo a Bolívia, Panamá ou Repú-blica Dominicana esperam, deacordo com o FMI, crescimentosespetaculares acima de 5%.

Diante de um cenário tão desi-gual, somado à ausência confir-mada de Cristina Kirchner, o Bra-sil tem o desafio de dar um passoa frente e assumir o papel de pro-tagonista no México. Quer pelasimples necessidade de fortaleceros laços comerciais com os seus“vizinhos prósperos”, ou porque

capital. Estrategicamente, issoimplica perceber que para reto-marumataxamais robustade in-vestimento não basta lubrificaros circuitos regulatórios e de fi-nanciamento que vem travandoa aceleração dessas obras. Se asindústrias fornecedoras não lo-grarem reverter mesmo que par-cialmente o hiato de competiti-vidade que se acumulou nos úl-timos anos, e principalmente,não intensificarem o ritmo deinovação, as pesadas importa-ções de bens de capital poderãocontaminar o processo de inves-timento com o virus da prefe-rência pela flexibilidade.

Nesse ponto, cabe lembrar asmanifestações de junho de 2013cuja irrupção foi motivada — oque não quer dizer explicada —pelo aumento de vinte centavosde real nos preços das passa-gens de ônibus. Com relação àtaxa de câmbio, cabem mani-festações similares em favor deuma condução mais decididada política cambial. É pelos vin-te centavos sim! Ironias à parte,feliz ano velho para todos nós.

DavidKupfer é professor licenciado emembro doGrupo de Indústria eCompetitividade do Instituto deEconomia daUFRJ (GIC-IE/UFRJ) eassessor da presidência doBNDES.Escrevemensalmente àssegundas-feiras. E-mail: [email protected])www.ie.ufrj.br/gic. As opiniões expressassão do autor e não necessariamenterefletemposições doBNDES.

o crescimento de toda a regiãonecessita de um “Brasil saudável”,especialmente diante de um ce-nário internacional de reduçãona demanda de matérias-primas.

Mas não é só isso. As melhoresperspectivas do México — impul-sionado pela recuperação dos Es-tados Unidos — ameaçam roubaros investimentos que poderiamvir para o Brasil. E o Brasil não sepode dar ao luxo de perder umtrem que já avança a uma veloci-dade maior que a sua.

A presença da Espanha podeser útil tanto por ser o segundomaior investidor estrangeiro noBrasil, como pela necessidade deviabilizar o acordo entre o Merco-sul e a União Europeia. E Veracruzpode abrir novos caminhos.

Como dizem os especialistas, aEspanha saiu do poço mas aindaestá no purgatório. Ainda que ossinaisderecuperaçãoconvidemaootimismo, o fantasma de 23% dedesemprego reflete o fato que, al-gumas vezes, a economia melhorasemmelhoraravidadaspessoas.

Assim, também a Espanha es-pera que o Brasil seja esse sócioquetantoprecisa,paracontinuarsendo um dos principais desti-nos da suas empresas, mas tam-bém para ter mais e maiores in-vestimentos brasileiros.

Depois de um período de des-

confiança, os primeiros sinais dosegundo mandato de DilmaRousseff têm sido bem recebidospelosempresáriosnoBrasil.Ago-ra essa mensagem deve chegaraos vizinhos da Ibero-América edomundo.Eacúpula ibero-ame-ricana será essa oportunidade.

Mas, junto a estas complexida-des econômicas, existe também odesafiopolíticodeliderançaregio-nal. Com o México atravessandodificuldades institucionais e a pró-pria Espanha em um processo detransição política e econômica, aregião requer que a diplomaciabrasileira assuma, como já fez nopassado, a liderança que lhe cor-responde. O Brasil deve ser o gran-de articulador da região diantedos diferentes blocos e foros inter-nacionais. Isto também é parte dofortalecimento institucional quese espera deste governo nos espa-ços internacionais. Hoje, mais doque nunca, a diplomacia tem aoportunidade de se consolidar co-mo questão de Estado, acima dequalquer outra questão, social,econômicaoupolítica.

Apesar das complexidades polí-ticasqueopaísenfrentahoje,aCú-pula Ibero-americana é a oportu-nidade que o Brasil tem para colo-car em prática o seu compromissoassumido com a inovação e educa-ção. O país é, junto com a Espanha

e Portugal, o único da região a in-vestir mais de 1% de seu PIB empesquisa e desenvolvimento tec-nológico. É verdade que deveria (edeve) ser mais, porém é inegávelque este é um país de grandes em-presários e com uma inesgotávelcapacidade para inovar. E, em mo-mentos em que as grandes empre-sasdopaís seencontramnocentrodeumacriseprovocadaporobscu-ras gestões é importante não es-quecer o seu papel como referên-ciapara toda Ibero-América.

Manter a constância em ciclosde crescimento depende da capa-cidade para inovar. Para transfor-mar riqueza em mais riqueza. E seexiste uma parte do continenteque deseja manter o seu ciclo deprosperidade, existe outra que de-seja muito retomá-lo. E no meioestá o Brasil, o gigante do qual to-dos esperam alguma coisa.

Sem dúvida, a Cúpula de Vera-cruz pode ser o momento espera-do para que o país retome o cami-nho do crescimento e a liderançaa partir da educação, da inovaçãoe da integração ibero-americana.Como bem dizia o personagemChaves “acho que é bem difícilamar inimigos, mas amar os idio-tas é quase impossível”.

JoséAntonio Llorente é sócio fundadore presidente da Llorente&Cuenca.

CartasdeLeitores

Desafios doBrasil emVeracruz

Frasedodia

Corrupçãoe trensApós excelente trabalho, a Polí-cia Federal encerrou as investiga-ções e acusou 33 pessoas comosuspeitas de corrupção ativa epassiva, lavagem de dinheiro,evasão fiscal, fraude licitatória,formação de quadrilha e outroscrimes no cartel de trens em SãoPaulo, durante o governo doPSDB (1998 - 08). Entre os acusa-dos, então ex diretores de em-presas como Siemens e Bombar-dier, o deputado federal JoséAníbal (PSDB) e o ex presidenteda CPTM. Por aí se vê o tamanhoda corrupção, licitações frauda-das, obras superfaturadas e des-vio de verbas públicas que impe-ram no país, sangrando os cofrespúblicos em bilhões de dólares.Seja o partido político que for, acorrupção é um crime nefasto,com gravíssimas consequênciaspara toda a sociedade e que nãopode ficar impune'[email protected]

NovaequipeO governo por enquanto caiu nareal e não chama mais os analis-tas econômicos de pessimistas. Edando mostras de que quem vaimandar mesmo na economianão será mais a Dilma, mas sim onovo indicado para o ministérioda Fazenda, Joaquim Levy, final-mente a comunicação do Planal-to se alinha com a do mercado ede forma realista reduz de 2% pa-ra 0,8% a projeção de crescimen-to do PIB para 2015. Até quandoa presidente vai obedecer estanova ordem, eu não sei. Mas, queé um bom começo, e melhor ain-da para o país, que se respeite asregras do mercado, isso eu nãotenho dú[email protected]

Ao projetar um crescimento de0,8% para o PIB em 2015, pratica-mente coincidindo com o bole-tim Focus (0,77%) e incorporan-do à proposta de Lei de Diretri-zes Orçamentárias (LDO) de2015, ora encaminhada ao rela-tor da matéria no Congresso, aequipe econômica do segundomandato da presidente Dilmamostra sua disposição em traba-lhar com as perspectivas de mer-cado, bem distante, portanto,das projeções delirantes que vi-goraram nos últimos anos e quesempre se chocaram com a reali-dade. Tal novidade deve ser sau-dada como um grande avançona direção [email protected]

PrevidênciaO crescimento da expectativa devida do brasileiro é um dadomuito importante, refletindo omomento que estamos passan-do. Mas isto cria um problemapara que o sistema previdenciá-rio continue funcionando. Este éum assunto que exige avaliaçãona busca de alternativas que pos-sam evitar crises futuras, por fal-ta de verba para cobrir as apo-sentadorias.Uriel [email protected]

Diantedeumcenáriotãodesigual, oBrasiltemodesafio dedarumpassoa frente eassumiropapel deprotagonista.O crescimentoda regiãonecessitadeum“Brasilsaudável”, emespecialdiantedeumcenáriointernacional dereduçãonademandadematérias-primas

Opinião

Correspondências paraAv. FranciscoMatarazzo, 1.500 -TorreNewYork - CEP05001-100 -ÁguaBranca - SP ou [email protected], comnome,endereço e telefone. Os textospoderão ser editados.