Upload
filofrei
View
544
Download
4
Embed Size (px)
Citation preview
Portugal para miúdos
Vem um cavalo a galope
já cansado da jornada,
enquanto se vêem no céu
os restos da madrugada.
Vem armado o cavaleiro
com espada e armadura;
dão-lhe o título de rei,
o único à sua altura.
É um rei chamado Afonso
e já parte à reconquista
do agreste território
que em seu redor avista.
Évora, Beja, Leiria,
também Alcácer do Sal,
Lisboa, Serpa e Moura
para dilatar Portugal.
No meio de tanta batalha
deita-se o rei a pensar:
«Já venci os sarracenos,
pela frente tenho o mar.»
«Mas eu no mar não me afoito,
por não ter embarcações;
deixo esse sonho entregue
a futuras gerações.»
Um dia apaga-se a luz
nos olhos do rei fundador;
adeus Afonso Henriques,
é Sancho o continuador.
José Jorge Letria ( Portugal para miúdos)
As naus do verde pinho
E da flor de verde pinho
das trovas do seu trovar
mandou plantar um pinhal.
Depois a flor foi navio.
E lá se foi Portugal
caravela a navegar.
(…)
Manuel Alegre ( As naus do verde pinho)
De um lado o chão e a raiz
do outro o mar e o seu cântico.
Era uma vez um país
entre a Espanha e o Atlântico.
Tinha por rei D. Dinis
que gostava de cantar.
Mas o reino era tão pouco
que se pôs a perguntar:
- E se o mar fosse um caminho
deste lado para o outro?
25 de Abril
João Pedro Mésseder
(Romance do 25 de Abril em prosa rimada e versificada)
..."Esse dia sem igual,
como um dia inicial,
esse dia inteiro e limpo
foi o 25 de Abril.
Dia em que as ruas cresceram
e as horas se esqueceram
e em praças e avenidas
se agitaram cravos mil.
Em que o povo levantou,
de voz armado e razão, a sua
Revolução,
p´ra, sem mortos nem feridos,
ao país restituir
a liberdade roubada e à terra lançar
sementes de um recto e claro
porvir..."
Dia dos Monumentos e dos Sítios
Os monumentos e os sítios
existem para nos lembrar
que foi longa a caminhada
que fizemos para aqui chegar,
tendo pouco para esquecer
e tanta coisa para lembrar.
José Jorge Letria (O Livro dos Dias)
Nós somos o chão e a pedra,
a igreja e o convento,
a muralha da cidadela,
o cais de onde partiu
certo dia a caravela,
o forte e o pelourinho
que por vezes encontramos
no meio de um caminho,
mas também a velha anta
pré-histórica e soberana
que ganhou verdete e fama
e a pegada do dinossáurio
ou as gravuras do Coa,
ou um teatro romano
numa rua de Lisboa.
MAR PORTUGUÊS
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
Fernando Pessoa ( X. Mar Português – “Mensagem”)
MAR PORTUGUÉS
Oh mar salado, cuánta de tu sal son lágrimas de Portugal! Por cruzarte, cuántas madres lloraron, Cuántos hijos en vano rezaron! Cuántas novias quedaran por casar Para que fueses nuestro, oh mar! Valió la pena? Todo vale la pena Si el alma no es pequeña Quien quiere pasar más allá de Bojador Tiene que pasar más allá del dolor. Dios al mar el peligro y el abismo dio, (*) Mas en él es que espejó el cielo.
©2003-07-20 by Sebastián Santisi, all rights reserved.
MER PORTUGAISE
O mer salée, combien de ton sel
Est fait des larmes du Portugal !
Parce que nous t'avons franchie,
que de mères ont pleuré !
Que d'enfants ont en vain prié !
Que de fiancées ne se sont pas mariées,
Pour que tu sois nôtre, ô mer !
Cela en valait-il la peine ? Tout vaut la peine
Si l'âme n'est pas mesquine.
Qui veut dépasser le Cap Bojador
Doit dépasser la douleur.
Dieu a donné à la mer l'abîme et le péril
Mais c'est sur elle qu'Il a reflété le ciel.
Traduction par les élèves de la classe Européenne de Portugais (Lycée François Magendie -
Bordeaux )
THE SEA O salty sea, so much of whose salt
Is Portugal’s tears! All the mothers
Who had to weep for us to cross you!
All the sons who prayed in vain!
All the brides-to-be who never
Married for you to be ours, O sea!
Was it worth doing? Everything’s worth doing
If the soul of the doer isn’t small.
Whoever would go beyond the Cape
Must go beyond sorrow.
God placed danger and the abyss in the sea,
But he also made it heaven’s mirror.
Fernando Pessoa (translated by Richard Zenith)
Queria que os Portugueses
teriam sido capazes
de constituir cultura
por tudo que a vida ensina
e mais do que livro dura
e tem certeza de sol
mesmo que a noite se instale
visto que ser-se o que se é
muito mais que saber vale
até para aproveitar-se
das dúvidas da razão
que a si própria se devia
olhar pura opinião
que hoje é uma manhã outra
e talvez depois terceira
sendo que o mundo sucede
sempre de nova maneira
Queria que os portugueses
tivessem senso de humor
e não vissem como génio
todo aquele que é doutor
sobretudo se é o próprio
que se afirma como tal
só porque sabendo ler
o que lê entende mal
todos os que são formados
deviam ter que fazer
exame de analfabeto
para provar que sem ler
alfabetizar cuidado
não me ponham tudo em culto
dos que não citar francês
consideram puro insulto
se a nação analfabeta
derrubou filosofia
e no jeito aristotélico
o que certo parecia
deixem-na ser o que seja
em todo o tempo futuro
talvez encontre sozinha
o mais além que procuro.
Agostinho da Silva (Poemas )
SER PORTUGUÊS
Visitar Alfama,
Dar uma volta e descer ao Ribatejo.
Ver as touradas,
À noite cantar o fado.
Ouvir gritar «ó freguesa»,
Junto à rua do mercado.
Ser português
É lutar,
Descobrir,
Remar,
Viver com o cheiro do mar.
Ser português
É ser esperança
E encontrar todos os dias
Um caminho para a mudança. Joana (pseudónimo de Ana Isabel Santos Silva)
Ser português
É ser sonhador,
É ser poeta
De tantos poemas de amor.
É remar ao encontro da aventura,
Prometendo um futuro brilhante.
É ser herói,
Pegar na espada do Infante.
É rever as tuas paisagens belas,
Espreitar o norte à lareira.
Descobrir o Porto num segundo,
Ir ao S. João,
Brincar e saltar à fogueira.
Ver Belém ao longe,
Passear de mão dada com o Tejo.
Trova do Vento que Passa
Vi florir os verdes ramos
direitos e ao céu voltados.
E a quem gosta de ter amos
vi sempre os ombros curvados.
E o vento não me diz nada
ninguém diz nada de novo.
Vi minha pátria pregada
nos braços em cruz do povo.
Vi meu poema na margem
dos rios que vão pró mar
como quem ama a viagem
mas tem sempre de ficar.
Vi navios a partir
(Portugal à flor das águas)
vi minha trova florir
(verdes folhas verdes mágoas).
Há quem te queira ignorada
e fale pátria em teu nome.
Eu vi-te crucificada
nos braços negros da fome.
Pergunto ao vento que passa
notícias do meu país
e o vento cala a desgraça
o vento nada me diz.
Pergunto aos rios que levam
tanto sonho à flor das águas
e os rios não me sossegam
levam sonhos deixam mágoas.
Levam sonhos deixam mágoas
ai rios do meu país
minha pátria à flor das águas
para onde vais? Ninguém diz.
Se o verde trevo desfolhas
pede notícias e diz
ao trevo de quatro folhas
que morro por meu país.
Pergunto à gente que passa
por que vai de olhos no chão.
Silêncio - é tudo o que tem
quem vive na servidão.
E o vento não me diz nada
só o silêncio persiste.
Vi minha pátria parada
à beira de um rio triste.
Ninguém diz nada de novo
se notícias vou pedindo
nas mãos vazias do povo
vi minha pátria florindo.
E a noite cresce por dentro
dos homens do meu país.
Peço notícias ao vento
e o vento nada me diz.
Mas há sempre uma candeia
dentro da própria desgraça
há sempre alguém que semeia
canções no vento que passa.
Mesmo na noite mais triste
em tempo de servidão
há sempre alguém que resiste
há sempre alguém que diz não.
Manuel Alegre (Praça da Canção )
Esta Língua Portuguesa
A língua que falas e escreves
é uma árvore de sons
que tem nos ramos as letras,
nas folhas os acentos
e nos frutos o sentido
de cada coisa que dizes.
É uma língua tão antiga
como isto de ser português.
Teve o latim por avô,
que primeiro foi romano,
depois bárbaro,
mais tarde monge medieval
ou copista do renascimento.
A língua cresceu com o país,
que se alongou até ao sul
e depois chegou às ilhas,
vencendo os tormentos do mar.
O país ganhou a forma
de uma língua de terra
capaz de usar palavras
como “lonjura” e “saudade”.
(…)
José Jorge Letria ( Esta Língua Portuguesa)
Portugalidade
Sete colinas são as tuas,
És grande, pelo Tejo banhada
Bela, és por todos amada
Na luz que ilumina as ruas.
Planícies de perder o fim,
Chaparros, searas de trigo,
Gaiatos a brincar no milho,
É o quadro mais belo p’ra mim.
Algarve de sol e do mar azul
Dos ingleses e laranja doce
É agora, como se fosse
O nosso outro reino ao sul
Na verdade não há ideal,
A minha terra é Portugal!
Pelo Norte com Chaves abri,
Lugares vivos e boas gentes
De tempo frio e Homens quentes
A outra invicta havia ali.
Para sul, vendo, olhando, rumei,
Bebi vinho, iguarias comi,
Paisagens lindas e praias eu vi,
Belas montanhas de neve amei.
De saber, cheguei à cidade
De doutos e outros senhores
Bom português, fado e amores
Encantos de vida na verdade.
Mário L. Soares