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A arte do real e a teoria crítica: algumas considerações

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Este ensaio foi escrito para o I Encontro de Cinema e Educação, realizado no dia 14 de março, na Universidade Estadual de Goiás, Unidade Universitária de Pires do Rio. O encontro é uma das atividades do projeto de extensão "Cinema e educação: uma análise crítica na sala de aula", coordenado pela Prof. Ms. Andréa Kochhann da UnU de São Luís de Montes Belos em parceria com a Prof. Ms. Liberalina Teodoro Resende da UnU de Pires do Rio.

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS

PROJETO DE EXTENSÃO

“CINEMA E EDUCAÇÃO:

uma experiência crítica na sala de aula”

“CINEMA E EDUCAÇÃO:

Uma experiência crítica na sala de aula” PRIMEIRO ENCONTRO DE

CINEMA E EDUCAÇÃO

Coordenadoras:

Prof. Ms. Andréa Kochhann

UnU de São Luís de Montes Belos

Prof. Ms. Liberalina Teodoro Rezende

UnU de Pires do Rio

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O REAL E A TEORIA CRÍTICA: algumas considerações1

KOCHHANN, Andréa2

CARNEIRO, Jéssica3

RESUMO: O ensaio apresenta algumas considerações sobre a arte cinematográfica relacionando-

a com a teoria crítica aliando esses conceitos a análise do filme “Escola da vida”. Análises

fílmicas podem ser realizadas com critérios da arte e das implicações enquanto indústria cultural,

influenciando ou sendo influenciados pela realidade social.

Palavras-chaves: Cinema. Teoria Crítica. Indústria Cultural.

INTRODUÇÃO

Abordar o uso de filmes como uma experiência crítica na sala de aula pode ao mesmo

tempo ser um assunto fácil e complexo. O filme discutido enquanto arte cinematográfica pode ser

mais complexa do que pensa. Perceber a concepção crítica do que se passa por trás das imagens e

das falas dos atores de um filme, pode ser tarefa difícil para muitos.

Associar criticamente as ideias e concepções que mostram claramente ou que ocultam em

suas ações, também não é tão simples. A sensação do real no filme pode ser uma forma de

alienação em massa produzida pela indústria cultural. Na sala de aula o uso dos filmes devem

proporcionar a análise crítica e o crescimento teórico.

Nessa tentativa o percurso teórico se fará em relação ao filme como arte cinematográfica,

enquanto teoria crítica e como metodologia da ensinagem. O filme que proporcionará suporte para

tal discussão será “Escola da vida”.

1 Ensaio organizado para o “I Encontro de Cinema e Educação” realizado na Universidade Estadual de Goiás –

Unidade Universitária de Pires do Rio, no dia 14 de março de 2014. Evento organizado pela Prof. Andréa

Kochhann e Prof. Liberalina Teodoro, como parte das atividades do Projeto de Extensão “Cinema e Educação:

uma experiência crítica em sala de aula”. Projeto em parceria entre as UnUs de São Luís de Montes Belos e Pires

do Rio.

2 Pedagoga pela UEG. Especialista em Docência Universitária pela UEG. Mestre em Educação pela PUC – GO.

Pesquisadora e Extensionista. Idealizadora e Editora Chefe da PAIDOS – Revista de Educação e Ensino.

Idealizadora e Coordenadora do GEFOPI – Grupo de Estudos em Formação de Professores e Interdisciplinaridade.

Dedicação Exclusiva da UEG na UnU de São Luís de Montes Belos. [email protected]

3 Graduanda do curso de Pedagogia, bolsista PIBID/UEG- Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à

Docência, e bolsista voluntária PVIC/UEG - Programa Voluntário de Iniciação Científica da UEG. Bolsista de

ações de extensão. E-mail: [email protected]

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O CINEMA COMO ARTE E METODOLOGIA DE ENSINAGEM CRÍTICA

Hoje é muito comum as pessoas irem ao cinema. Até mesmo é difícil encontrar alguém que

nunca tenha visto um filme ou qualquer produção cinematográfica, seja em salas de projeção

cinematográfica, na televisão, em DVDs de reprodução ou outras possibilidades. Porém nem todos

refletem a respeito de como, o porquê e pra que tais filmes foram elaborados e, quais influências

esses filmes afetam os pensamentos dos seus espectadores.

Pensando nisso, torna-se interessante refletir sobre o cinema, pois além de seu poder

ideológico, ele é hoje uma ferramenta fundamental para o processo de aprendizagem. E para isso

faz necessário cogitar acerca do cinema desde sua formação como uma indústria cinematográfica

até os dias atuais com o seu poder ideológico, enquanto indústria cultural.

Há várias teorias a respeito do cinema. Uma das mais importantes é a da ilusão de verdade

experimentada pelo espectador diante do filme. Segundo Mets (2010), o cinema proporciona um

sentimento de as pessoas estarem assistindo diretamente a um espetáculo quase real, pois era como

se vissem a própria realidade.

Segundo Bernardet (2006) esta ilusão de verdade ficou conhecida como impressão de

realidade, onde os espectadores tinham a impressão de que se tratavam da própria vida, retratada

ali na tela, mesmo quando se trata de algo que foge do real. A imagem cinematográfica permitia

assistir a essas fantasias como se fossem verdadeiras, atribuindo impressão de realidade a elas.

Bernardet (2006) aponta que o cinema não seria apenas a reprodução da realidade, mas

seria também a reprodução da própria visão do homem. Isto significa que as imagens produzidas

inicialmente traziam um efeito da realidade vivida pelos espectadores. Porém, o cinema não

exercia somente o papel de expressar o real, mas ele demonstrava uma visão, um ponto de vista,

uma ideologia, não do espectador “passivo”, mais daquele que produz. Assim surgem discursos

acerca dessa tal “expressão do real” que procuram atribuir ao cinema, por mais perto da realidade,

eles sempre são manipulados, montados demonstrando o pensamento tanto da sociedade da época

quanto do produtor.

Aos poucos o cinema foi se tornando uma mercadoria, as películas começaram a ser

reproduzidas, vendidas e exibidas, facilitando a divulgação de ideologias. Desta forma o cinema

começa a se tornar uma indústria cinematográfica, como descreve Leite (2005):

A indústria cinematográfica é um fenômeno historicamente novo com um pouco mais de

cem anos. [...] A primeira atividade comercial ligada ao cinema restringiu-se a compra e à

venda de equipamentos. Em fins do século XIX vendiam-se projetores e rolos de filmes

que passaram a ser propriedade de seus compradores. Tal comércio foi disputado

principalmente por dois grandes fabricantes: os irmãos Lumière, franceses inventores do

cinematógrafo, e o eclético norte-americano Thomas Edison, com o seu aparelho

vitascópio, mais pesado e difícil de operar que o dos concorrentes europeus (p.07).

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Nesta disputa destes dois fabricantes, o cinema norte-americano se desenvolve. Pois

Thomas Edison com a força dos grupos industriais dos Estados Unidos registrou o invento

primeiro que os franceses. Assim iniciou o sistema de astros e estrelas e celebridades de

Hollywood, formando os grandes estúdios de produção. Estúdios estes que foram se fortalecendo

primeiro que nos demais países, de acordo com Leite (2005).

Segundo Leite (2005) o cinema foi chegando ao Brasil com grande dificuldade de

fortalecer-se como uma indústria e, principalmente cultural. Desta forma tornava-se necessário

que se utilizasse de meios para que o público tomasse gosto em ver as produções brasileiras.

Os documentários foram uma das formas utilizadas para fortalecer o cinema brasileiro no

princípio da sua formação. Os documentários e os cinejornais foram estabelecidos como um

grande aliado do cinema brasileiro, com o intuito de despertar na população o interesse pelo

cinema nacional, tornando-se fundamentais para mantê-lo e quiçá fazer do cinema e da televisão

de forma em geral, uma arma poderosa para a alienação da população, por ser cultura de massa.

Na concepção de Coelho (2006, p. 24) “a cultura de massa aliena, forçando o indivíduo a perder

ou a não formar uma imagem diante da sociedade.”.

Porém, em algumas determinadas épocas o cinema era visto como o destruidor da família,

pois muitos saiam do seio familiar e iam para o cinema. Foi com tempo que muitos intelectuais

começaram a ver no cinema outros aspectos, assim com descreve Leite (2005, p. 35):

A capacidade dos filmes de difundir valores agiu em tais grupos de formas diferentes,

pois o que mais despertou a atenção desses segmentos da intelectualidade brasileira nas

décadas de 1920 e 1930 foram as possibilidades de o cinema ser empregado como

instrumento pedagógico e como propaganda.

Historicamente situados, no Brasil, essa década ficou conhecida como a década do debate.

O cenário artístico aparece nesse momento como um período de contestação e crítica, durante a

Semana da Arte Moderna. Foi também o período em que educadores brasileiros, críticos de seu

tempo e da forma de perceber a brasilidade, iniciaram discussões com o intuito de tornar a cultura

brasileira de fato brasileira, sem interferências de outras nacionalidades.

Assim alguns educadores perceberam a enorme capacidade educacional das produções

cinematográficas, procurando métodos para introduzir os filmes nas relações de ensino e

aprendizagem. Eram usados filmes históricos ou películas que falavam sobre conhecimentos

restritos a física, química, história natural, entre outros. É inevitável citar que o cinema educativo

teve além desta finalidade, também foi um dos meios encontrados para fortalecer a indústria

cinematográfica brasileira. Sobre isso Leite (2005, p. 38) assevera que:

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É importante destacar que o cinema educativo atuou como um dos principais pilares de

um projeto mais amplo, isto é, a tentativa de organizar a produção, o mercado exibidor e o

importante e, concomitantemente, servir aos propósitos do Estado, notadamente a

integração nacional, à centralização da ação governamental e à difusão da ideologia

nacionalista (LEITE, 2005, p. 38).

Neste momento o Brasil está passando pela Ditadura Vargas, contexto marcado pela

grande repressão e censura do governo. Desta forma, quando Leite (2005) se refere “á

centralização da ação governamental e á difusão da ideologia nacionalista”, refere-se à prática

alienante do governo com a sociedade procurando acalmar e estabelecer o controle.

As políticas governamentais de Vargas acerca das ações cinematográficas brasileiras,

tornavam-se, o que segundo Leite (2005, p.38), “uma via de mão dupla”. De um lado, ele

destacava a importância das produções cinematográficas, pelo fato de compreender que no mundo

contemporâneo o filme estaria ocupando a função que o livro desempenhava até então. Do outro

lado, os filmes produzidos neste período, passaram a ter o objetivo de propagar as ideologias desta

nova política governamental exercida no Brasil, através da intervenção do Estado nestas

produções, por meio da transmissão da propaganda política, e principalmente pelo fato que os

filmes não eram lançados sem passar pelas “mãos do Estado”. Situação que se repetiu durante a

Ditadura Militar, entre 1964 e 1985.

Esse período, um pouco crítico da história do cinema brasileiro, mesmo com o rigor da

ditadura militar, sua linguagem foi se modificando. Segundo Leite (2005) no final dos anos 60 e

no inicio da década de 70, na cidade de São Paulo, em uma região chamada “Boca de Lixo”,

formou-se um movimento que marcou a história do cinema nacional, onde iniciou a produção das

comédias eróticas, as “pornochanchadas”, como ficaram mais conhecidas. E tudo isso para

diversificar o seu público e alcançar a chamada masscult, que conforme aponta Coelho (2006),

quando a população de classe menos favorecida se envolve com as questões do cinema ou da

televisão de forma geral, em especial as novelas.

Segundo Moraes (1986) o crítico e pesquisador Ismail Xavier em um seminário na

Universidade de Brasília, faz uma série de avaliações e críticas do cinema em suas perspectivas

estéticas. Onde é abordado aspectos do cinema brasileiro dos anos 40 aos tempos atuais,

analisando alguns filmes. Em suas análises Ismail descreve que as formas de linguagem tanto

quanto agressivas, as chanchadas, procuravam trazer a interpretação de clássicos da literatura,

como os melodramas extraídos de Nelson Rodrigues, nas adaptações de livros de Jorge Amado e

na adoção do pitoresco nacional como forma de comunicação.

Independente da abordagem e do teórico que cada leitor assume, o importante é perceber

que o cinema pode ser visto como arte cinematográfica e como metodologia no processo de

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ensinagem e do despertar da criticidade. A Escola de Frankfurt, na Alemanha, inaugura as críticas

em relação à indústria cultural.

Stam (2003, p. 86) apresenta que “Adorno preocupava-se com os efeitos do que os teóricos

frankfurtianos denominavam como 'indústria cultural', na qual identificaram um enorme potencial

para a alienação e a comodificação.”. Nessa concepção o cinema ou principalmente a televisão,

são vistas como alienadores das pessoas e não como uma fonte crítica de ver a realidade.

A arte cinematográfica como cultura de massa e indústria cultural com o objetivo de

alienação é muito forte nas sociedades capitalistas, principalmente em países com pouco

desenvolvimento. Sobre isso Stam (2003) apresenta que Adorno e Horkheimer em seus escritos da

Dialética do Esclarecimento: fragmentos filosóficos abordam que o cinema pode alienar ou

libertar, mas geralmente percebem os espectadores como consumidores.

O cinema e a televisão são formas de vitrine para o consumo e a própria alienação ou a

concepção de estar na moda. Essa não deve ser a visão dos educadores em relação ao cinema e a

televisão como forma de metodologia da ensinagem. É papel do professor fazer suas escolhas

metodológicas de acordo com o objetivo do conteúdo teórico a ser trabalhado. Assim, o professor

somente poderá passar um filme em sala de aula, se houver um planejamento.

Seja um pedagogo ou um historiador, os motivos que levam o professor a passar um filme

na sala de aula ou levar sua turma ao cinema, deve ter princípios teóricos e críticos da realidade,

pois como aponta Ferro (2010, p. 14) “Nisso, a imagem televisual vem se juntar à imagem fílmica:

ela é por sua vez documento histórico e agente da História numa sociedade que a recebe, mas que

também – e não se pode esquecer disso – a produz.” Por este motivo, geralmente, as pessoas ao

assistirem um filme associam seu tema à sua realidade, como já citaram Mets (2010) e Bernardet

(2006).

O planejamento do professor deve levar em conta as cenas dos filmes que convergem ou

divergem da teoria que será analisada posterior ao filme. Convém que o professor apresente aos

estudantes os pontos principais que devem ficar atentos para depois conseguirem discutir a teoria.

Um filme em sala de aula, sem um propósito teórico e crítico, pode ser comparado com o

que Ferro (2010) chama de vampirismo do cinema. O autor afirma que “Na verdade, a televisão,

de certo modo, vampirizou um pouco o cinema” (p.10) e da mesma foram pode ser interpretada a

metodologia fílmica sem um planejamento com objetivos claros, teóricos e críticos.

Pode-se dizer que quando o cinema vai para a televisão perdeu-se em partes a concepção

de arte cinematográfica. Assim, quando o professor passa um filme na sala de aula sem as devidas

proposituras, sua ação é inóquia e condiz com o paradigma cartesiano que Costa Neto (2003)

discute e com a aprendizagem mecânica que Ausubel (1982) apresenta. Essa ação inóquia não

proporciona a aprendizagem significativa.

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“ESCOLA DA VIDA”: algumas considerações fílmicas

O filme “Escola da Vida” (School of Life), dirigido por William Dear, tem como principais

atores Ryan Reynolds (Sr. D’Ângelo) e David Paymer (Matt Warner). O filme caracteriza-se

como um longa-metragem, no gênero de drama, com duração de 115 minutos, teve sua estreia no

dia 19 de fevereiro de 2005. Conta à trajetória de dois professores, um chamado Michael

D’Ângelo, o professor de história, e o Sr. Matt Warner, professor de ciências, ambos lecionavam

na instituição de ensino Fallbrook Middle Schoo, em uma cidade dos Estados Unidos da América.

Logo após a morte do Professor de história o Sr. Storning’ Norman Wanner, que morre de parada

cardíaca após receber, pela 43ª vez consecutiva, o prêmio de professor do ano, o Sr. D’Ângelo

assume suas aulas na instituição.

O Sr. Matt no ano seguinte à morte de seu pai (Sr. Stormin’ Norman) almejava conquistar

o troféu “professor do ano”. Mas suas metodologias ainda estavam alçadas no tradicionalismo. Ao

invés disso o Sr. D (D’Ângelo) possuía uma postura mais dinâmica, ensinando de uma maneira

divertida onde todos aprendiam, fato que provocou a inquietação do Sr. Matt, pois desde o

primeiro dia de aula o Sr. D já havia conquistado toda a escola até mesmo aqueles que não eram

seus alunos.

Sr. Matt preocupado com popularidade do Sr. D passou a procurar explicações para acusá-

lo. Veio a ideia de segui-lo. Neste momento ele pode garantir que o Sr. D além de um bom

professor, que gostava de ajudar a todos, descobriu que o Sr. D tinha câncer pulmonar e isso o

deixou sensibilizado. E com essa descoberta, o Sr. Matt muda sua prática educacional, passando a

se relacionar mudar melhor com seus alunos.

O filme Escola da Vida se classifica como arte cinematográfica hollywoodiana,

apresentando questões culturais e históricas do país. Inclusive quando em várias passagens do

filme mostram as salas de aulas em uma organização diferenciada das salas de aulas brasileiras, ou

seja, cada sala de aula da escola é a sala de aula da disciplina. O professor não muda de sala. Os

alunos é quem mudam de sala.

Outro ponto que é possível associar do filme com a questão da arte cinematográfica é

conforme apresentou Mets (2010) no tocante às cenas proporcionarem um sentimento nas pessoas

como se elas estivessem assistindo a um espetáculo da vida real ou sua própria realidade. Isso

pode ser percebido quando o Sr. Matt descobre a doença do Sr. D e também quando os alunos do

Sr. D se comovem com a sua situação.

Bernardet (2006) também apresentou que a ilusão de verdade era conhecida como

impressão de realidade. Algumas partes do filme mostram a vida amarga do Sr. Matt, do

sentimento de viver sempre a sombra de seu pai, o Sr. Stormin Norman. Com a chegada do novo

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professor, que fica mais popular que ele, acaba afetando sua relação familiar, seu casamento e em

especial a relação entre pai e filho.

Outro momento do filme que os espectadores relacionam com sua experiência vicária é

com a morte do Sr. Stormin, pai do Sr. Matt. A dor da perca numa ficção comove os espectadores

como se fosse uma perca real. Estas passagens fílmicas permitem que o espectador faça relação ao

seu cotidiano, se imaginando no lugar dos personagens atribuindo-lhes sentimentos e desejos, e

consequentemente dando realidade a algo ficcional.

Profissionalmente o filme transmite a existência de um professor quase que perfeito, pois o

Sr. Stormin foi reconhecido como professor do ano por mais de 40 anos. Esse professor perfeito

pode ser uma forma de alienar ou libertar os espectadores. A crítica neste momento se faz no

sentido de que o autor do filme exagerara na valorização da questão. Pois, será que este professor

perfeito existe, levando em conta as diferentes turmas, os diferentes momentos históricos.

O filme de uma forma geral chama a atenção da massa populacional, mas não traz grandes

questões de alienação, mas idealiza um perfil de professor – o que seria de certa forma alienação.

Se todos que assistirem ao filme chegarem a conclusão que o professor ideal é como o Sr. D ou

como o Sr. Stormin, seria uma forma de alienação.

Transpondo essa questão para a realidade brasileira, seria muito difícil de existir o

professor ideal. No Brasil, são poucos os professores que se dedicam apenas a uma escola ou

instituição. Geralmente trabalham em várias escolas para conseguirem um salário melhor.

Outra questão são os recursos didáticos e metodológicos disponíveis para se trabalhar.

Organizar uma aula concreta como o Sr. D fez para trabalhar a história da independência dos EUA

demanda de tempo de planejamento e recursos, inclusive financeiros, para confeccionar as roupas

e todo arsenal que represente a situação.

Dessa forma ao assistir esse filme, os educadores que não conseguem ser “professores do

ano” não podem se sentirem totalmente frustrados. Talvez não sejam professores do ano, por

questões que fogem de seu controle. Contudo, mesmo assim o professor deve buscar dentro das

possibilidades, ser o professor do ano. Um caminho para isso é fazer do espaço da sala de aula, o

espaço adequado para a crítica, o crescimento teórico, a partir do uso de filmes e ou outros

métodos didáticos.

CONSIDERAÇÕES

Nos dias atuais tanto o cinema quanto a televisão caracterizam-se como o maior e mais

conhecido meio de transmissão de ideologias, e são caracterizados como meio de entretenimento

da massa popular. Assim utilizar estes meios de comunicação em sala de aula deve ser uma ação

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bem planejada. Pois se assim realizar, eles permitirão um novo pensamento, outra forma de

percepção de realidade, e proporcionará uma ampliação dos conhecimentos e da capacidade

crítica.

O filme em sala de aula ele não deve ser apenas um instrumento de preenchimento de

lacunas escolares. Ele deve ser analisado e interpretado criticamente. Desta forma o uso do cinema

pode oferecer diversas ações, a partir da experiência cinematográfica. E é esta experiência que o

professor deve incitar em seus alunos. Assim como o professor D’Ângelo fazia com que seus

alunos interagissem e se interessassem pela história por meio de aulas experimentais, o uso do

cinema em sala de aula se bem planejado, proporcionará experiências fascinantes através da

análise e da crítica.

A compreensão do filme como arte e como indústria cultural é um fator importante a ser

destacado. O professor ao pensar em um filme para passar em sala de aula deve refletir em sua

finalidade ideológica como indústria cultural e em seus aspectos relacionados aos conteúdos

aplicados em sala de aula.

Os filmes proporcionam diversas experiências aos seus expectadores como: sonhos,

emoções, identificações, conhecimentos, consumos, ideologias, consciência da realidade, enfim,

diferentes formas de apropriação da realidade ficcional associada à realidade cotidiana. O cinema

possibilita nova visão de mundo, amplia o conhecimento e a capacidade critica. Ainda que o

cinema seja uma ficção, ele tem base cultural, na representação do real.

REFERÊNCIAS

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COELHO, Teixeira. O que é Indústria Cultural. São Paulo: Brasiliense, 2006.

FERRO, Marc. Cinema e História. Trad. Flávia Nascimento, 2ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 2010.

COSTA NETO, Antônio da. Paradigmas em educação no novo milênio. 2. ed. Goiânia: Kelps,

2003.

LEITE, Sidney F. Cinema brasileiro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2005.

METZ, Christian. A significação no cinema. São Paulo: Perspectiva, 2010.

MORAES, Malu (Org). Perspectiva Estética do Cinema Brasileiro: Seminário. UNB,

Embrafilme, 1986.

SATM, Robert. Introdução à teoria do cinema. Campinas, SP: Papirus, 2003.