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UNIP – UNIVERSIDADE PAULISTA VALMIR MONDEJAR A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

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A falta de conhecimento e conseqüente despreparo para reconhecer e saber lidar com a dislexia, por parte dos educadores, foi minha motivação para realizar esta pesquisa assim como promover a ampliação do conhecimento e assim possibilitar aos portadores deste distúrbio maiores taxas de sucesso no ensino superior e uma melhor inserção na sociedade. A complexidade da compreensão do que é dislexia está diretamente vinculada ao entendimento do ser humano: de quem somos, do que é Memória e Pensamento - Pensamento e Linguagem, de como aprendemos e do porque nós podemos nos encontrar em situações as vezes geniais, as vezes de dificuldade, mesmo quando se tratam de questões básicas, em um processo individual de aprendizado. O maior problema para assimilarmos esta realidade está no conceito arcaico de que: "quem é bom é bom em tudo", isto é, a pessoa sendo inteligente tem que tudo saber e ser habilidosa em tudo que faz. Posição equivocada que Howard Gardner alterou, aprofundando nosso conhecimento sobre o tema com excepcional maestria em suas pesquisas e estudos registrando especialmente em sua obra Inteligências Múltiplas, insight que o alçou à posição de um dos maiores educadores de nossos tempos. Maria Eugenia Ianhez e Maria Angela Nico colocam às claras e de forma inequívoca, em sua obra Nem sempre é o que parece: como enfrentar a Dislexia e os fracassos escolares (São Paulo - Elsevier, 2002.), quão importante é manter nossos educadores diligentes e adequadamente instrumentados para que estes possam auxiliar no diagnóstico e desenvolvimento de ferramentas de aprendizagem específicas para esta população de jovens portadores deste distúrbio. RÉSUMÉ Le manque de connaissances et le refus par conséquent de reconnaître et de faire face à la dyslexie, par les éducateurs, a été ma motivation pour cette recherche ainsi que de promouvoir le développement des connaissances pour permettre aux transporteurs de ce trouble taux de réussite supérieur au enseignement supérieur et leur intégration dans la societé. La complexité de la compréhension de ce qui est la dyslexie est directement liée à la compréhension de l'être humain: qui nous sommes, ce qui est la mémoire et la pensée - la pensée et du langage, d'apprendre pourquoi et comment nous pouvons nous trouver dans des moments à la fois brillante, à la fois difficile, même s’il s’agit des questions de base, dans um processus de l'apprentissage individuel. Le plus gros problème à assimiler cette réalité est que la notion archaïque de «qui est bon est bon à tout", c'est à dire, la pérsonne à puce ont tout savoir et être habile dans tout ce qu'il fait. Ce positionnement trompe Howard Gardner a changé approfondissent nos connaissances sur le sujet avec une maîtrise exceptionnelle de leurs recherches et les études s'inscrivent en particulier dans son livre Intelligences Multiples, qui a lui levé à la position de l'un des plus grands éducateurs de notre temps. Maria Eugenia Ianhez et Maria Angela Nico ont mis au clair et sans ambiguité, dans son travail N'est pas toujours ce qu'elles semblent être: comment faire face à la dyslexie et l’échec scolaire (São Paulo - Elsevier, 2002.), quelle est l'importance de garder nos éducateurs diligent et bien instrumenté pour qu’ils puissent élaborer des diagnostics et au développement d'outils d'apprentissage spécifiques à cette population d'adolescents atteints de ce trouble.

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Page 1: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

UNIP – UNIVERSIDADE PAULISTA

VALMIR MONDEJAR

A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

SÃO PAULO, SPOUTUBRO/2010

Page 2: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

VALMIR MONDEJAR

A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

Monografia apresentada à Universidade Paulista - UNIP como exigência parcial para participar do curso de Pós - Graduação Latu Sensu de Formação de Professores para o Ensino Superior.

Orientadora: Prof. Dra. Mônica Cintrão

SÃO PAULO, SPOUTUBRO/2010

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Page 3: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

VALMIR MONDEJAR

A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

Monografia apresentada à Universidade Paulista - UNIP como exigência parcial para participar do curso de Pós - Graduação Latu Sensu de Formação de Professores para o Ensino Superior.

RESULTADO ____________________________________________

ORIENTADOR PROFA. DRA MONICA CINTRÃO

PRIMEIRO EXAMINADOR __________________________________

SEGUNDO EXAMINADOR __________________________________

São Paulo, 8 de Outubro de 2010

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Page 4: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

Simplicidade é a complexidade resolvida

Constantin Brancusi

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Page 5: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

RESUMO

A falta de conhecimento e conseqüente despreparo para reconhecer e saber lidar com

a dislexia, por parte dos educadores, foi minha motivação para realizar esta pesquisa

assim como promover a ampliação do conhecimento e assim possibilitar aos portadores

deste distúrbio maiores taxas de sucesso no ensino superior e uma melhor inserção na

sociedade. A complexidade da compreensão do que é dislexia está diretamente

vinculada ao entendimento do ser humano: de quem somos, do que é Memória e

Pensamento - Pensamento e Linguagem, de como aprendemos e do porque nós

podemos nos encontrar em situações as vezes geniais, as vezes de dificuldade, mesmo

quando se tratam de questões básicas, em um processo individual de aprendizado. O

maior problema para assimilarmos esta realidade está no conceito arcaico de que:

"quem é bom é bom em tudo", isto é, a pessoa sendo inteligente tem que tudo saber e

ser habilidosa em tudo que faz. Posição equivocada que Howard Gardner alterou,

aprofundando nosso conhecimento sobre o tema com excepcional maestria em suas

pesquisas e estudos registrando especialmente em sua obra Inteligências Múltiplas,

insight que o alçou à posição de um dos maiores educadores de nossos tempos. Maria

Eugenia Ianhez e Maria Angela Nico colocam às claras e de forma inequívoca, em sua

obra Nem sempre é o que parece: como enfrentar a Dislexia e os fracassos

escolares (São Paulo - Elsevier, 2002.), quão importante é manter nossos educadores

diligentes e adequadamente instrumentados para que estes possam auxiliar no

diagnóstico e desenvolvimento de ferramentas de aprendizagem específicas para esta

população de jovens portadores deste distúrbio.

Palavras – chave: DISLEXIA. EDUCADOR. ALFABETIZAÇÃO. DISTÚRBIO DE

APRENDIZAGEM.

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Page 6: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

RÉSUMÉ

Le manque de connaissances et le refus par conséquent de reconnaître et de faire face

à la dyslexie, par les éducateurs, a été ma motivation pour cette recherche ainsi que de

promouvoir le développement des connaissances pour permettre aux transporteurs de

ce trouble taux de réussite supérieur au enseignement supérieur et leur intégration dans

la societé. La complexité de la compréhension de ce qui est la dyslexie est directement

liée à la compréhension de l'être humain: qui nous sommes, ce qui est la mémoire et la

pensée - la pensée et du langage, d'apprendre pourquoi et comment nous pouvons

nous trouver dans des moments à la fois brillante, à la fois difficile, même s’il s’agit des

questions de base, dans um processus de l'apprentissage individuel. Le plus gros

problème à assimiler cette réalité est que la notion archaïque de «qui est bon est bon à

tout", c'est à dire, la pérsonne à puce ont tout savoir et être habile dans tout ce qu'il

fait. Ce positionnement trompe Howard Gardner a changé approfondissent nos

connaissances sur le sujet avec une maîtrise exceptionnelle de leurs recherches et les

études s'inscrivent en particulier dans son livre Intelligences Multiples, qui a lui levé à

la position de l'un des plus grands éducateurs de notre temps. Maria Eugenia Ianhez et

Maria Angela Nico ont mis au clair et sans ambiguité, dans son travail N'est pas

toujours ce qu'elles semblent être: comment faire face à la dyslexie et l’échec

scolaire (São Paulo - Elsevier, 2002.), quelle est l'importance de garder nos éducateurs

diligent et bien instrumenté pour qu’ils puissent élaborer des diagnostics et au

développement d'outils d'apprentissage spécifiques à cette population d'adolescents

atteints de ce trouble.

Mots - clés: La dyslexie. Éducateur. Les troubles d’aprentissage. D'alphabétisation. 

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Page 7: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

SUMÁRIO

RESUMO...........................................................................................................................5

RESUMÉ...........................................................................................................................6

INTRODUÇÃO..................................................................................................................9

DESENVOLVIMENTO

Capítulo 1..............................................................................................................12

1.1 Definições.......................................................................................................12

1.2 Outras definições oficiais para Dislexia.........................................................16

Capitulo 2..............................................................................................................18

2.1 O significado da palavra................................................................................18

2.2 A palavra como elemento regulador da conduta da criança.......................19

Capitulo 3.............................................................................................................24

3.1 Os principais sintomas.................................................................................24

3.2 Os sintomas mais freqüentes segundo a faixa etária..................................28

3.2.1Dos quatro aos seis anos...........................................................................28

3.2.2 Dos seis aos nove anos............................................................................28

3.2.3 Acima de nove anos..................................................................................29

3.3 Sinais distintivos...........................................................................................30

3.3.1 Até os três anos de idade..........................................................................30

3.3.2 Acima dos sete anos de idade..................................................................32

Capitulo 4............................................................................................................35

4.1 Os distúrbio de leitura...................................................................................35

4.2 A difícil arte de tipificar a Dislexia.................................................................41

4.3 Dislexia visual...............................................................................................43

4.3.1 Principais entraves....................................................................................43

4.3.2 Diagnóstico rápido.....................................................................................43

4.3.3 Ferramentas de desenvolvimento.............................................................44

4.4 Dislexia auditiva............................................................................................44

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Page 8: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

4.4.1 Principais entraves...................................................................................44

4.4.2 Diagnóstico rápido....................................................................................45

4.10 Ferramentas de desenvolvimento.............................................................45

Capitulo 5..........................................................................................................43

5.1 A incapacidade de transcrever o visual e o oral: disgrafia e disortografia.46

Capitulo 6..........................................................................................................48

6.1 Dislexia de desenvolvimento e a alfabetização..........................................48

6.2 Sinais da dislexia na idade escolar............................................................49

Capítulo 7.........................................................................................................51

7.1 A missão do educador...............................................................................51

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................53

BIBLIOGRAFIA................................................................................................................54

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Page 9: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

INTRODUÇÃO

O objetivo do presente trabalho é trazer luzes aos profissionais de educação sobre um

distúrbio de aprendizado que atinge de forma severa cerca de 10% das crianças em

idade escolar. Se forem considerados também os distúrbios leves, este percentual

chega a 25% (CAPOVILLA, 2002; PIÉRART, 1997).

O distúrbio específico de leitura é geralmente chamado de dislexia nos países de língua

francesa e de distúrbio de leitura (reading disability) nos países de língua inglesa

(GREGOIRE,1997). A palavra “dislexia” foi o primeiro termo genérico utilizado para

designar vários problemas de aprendizagem. Em seu devido tempo, com o intuito de

descrever as diferentes formas de transtornos de aprendizagem, esses problemas

foram subdivididos e classificados. Por esta razão, podemos chamar a dislexia de “a

mãe dos transtornos de aprendizagem” (RONALD D. DAVIS, 2004).

A dislexia de desenvolvimento, objeto deste estudo, é uma dificuldade específica de

aprendizagem da leitura e escrita que condiciona a forma como o indivíduo se percebe

e como se relaciona com os seus pares nos mais diversos contextos desde

educacionais até familiares.

Conforme a explanação de Frith, num primeiro momento condições

biológicas (como os aspectos genéticos), em interação com condições

ambientais (como a exposição a toxinas ou a baixa qualidade da

nutrição da mãe durante a gestação), podem ter efeitos adversos sobre

o desenvolvimento cerebral, predispondo o indivíduo a distúrbios do

desenvolvimento. Num segundo momento, este desenvolvimento

neurológico não-usual pode levar a sutis alterações no funcionamento

cognitivo. Num terceiro momento, esta alteração cognitiva poderá levar

a padrões específicos de desempenho comportamental. Tais padrões

poderão ou não consistir em problemas de leitura e escrita,

dependendo de fatores ambientais como o tipo de ortografia e o tipo de

instrução ao qual a criança está exposta. A adaptação da criança diante

desses problemas de leitura e escrita também dependerá de outros

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Page 10: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

fatores, como motivação, relações afetivas, habilidades intelectuais

gerais, idade e condições sociais (CAPOVILLA, 2002)¹.

Hoje já é possível compreender os aspectos neurológicos e cognitivos subordinados

aos padrões comportamentais encontrados na dislexia, o que permite além de uma

compreensão teórica mais abrangente da dislexia, uma atuação prática mais eficaz.

O modelo de memória verbal de Baddeley é usado para comparar o

processamento de informação em dislexia do desenvolvimento e surdez

congênita profunda. Em curvas de posição serial, o efeito de primazia

revela a integridade do circuito fonológico, que permite reter

fonologicamente a informação e consolidá-la na memória; o de

recência, a integridade do circuito fonético, que permite reter

articulatoriamente a informação sob audição e leitura orofacial. O

Circuito Fonológico é composto de duas alças: uma, conectando

Entrada a Saída, permite repetir pseudopalavras ouvidas; outra,

conectando Saída a Entrada, permite ouvir-se pensando, refrescar a

informação fonológica e memorizá-la. A alça conectando Entrada a

Saída está comprometida na afasia de condução gerando inabilidade

de repetir pseudopalavras ouvidas. A alça conectando Saída a Entrada

está comprometida na dislexia de desenvolvimento, dificultando ouvir

internamente o fluxo da fala durante leitura. O Circuito Fonético opera

sempre que a fala é ouvida, articulada oralmente, ou lida

orofacialmente. Nele, a Entrada é ativada na audição ou leitura

orofacial; a Saída, na articulação subvocal. A alça conectando Entrada

a Saída permite repetir pseudopalavras lidas orofacialmente. A alça

conectando Saída a Entrada produz efeito de recência, permitindo

manter traços de memória recente e elos da fala interna. Diferente da

surdez congênita em que estão preservadas, na dislexia do

desenvolvimento, as alças fonológica e fonética conectando Saída a

Entrada estão comprometidas, dificultando o monitoramento do próprio

ouvido interno e da própria voz interna durante a leitura e a escrita

(CAPOVILLA, FERNANDO; CAPOVILLA, ALESSANDRA 2002).²

De acordo ainda com COLLARES e MOYSES (1992), o uso da expressão distúrbio de

aprendizagem tem se expandido de maneira assustadora entre os professores, apesar

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Page 11: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

da maioria destes profissionais nem sempre conseguir explicar claramente o significado

desta expressão ou os critérios em que se baseiam para utilizá-la no contexto escolar.

Na opinião destas autoras, a utilização desmedida desta expressão no cotidiano seria

mais um reflexo do processo de patologização da aprendizagem ou da biologização das

questões sociais.

De acordo com Hout (2001) a World Federation of Neurology, com sede no Reino

Unido, definiu a dislexia como um transtorno da aprendizagem da língua escrita que

ocorre apesar de uma inteligência normal, da ausência de problemas sensoriais ou

neurológicos, de instrução escolar considerada adequada e de oportunidades

socioculturais suficientes. Trata-se de uma definição formulada em função de critérios

excludentes: um conceito que destaca os fatores causais que não podem determinar ou

explicar a chamada dislexia.

A falta de conhecimento e conseqüente despreparo para reconhecer e saber lidar com

a dislexia, por parte dos educadores, foi minha motivação maior para realizar esta

pesquisa e assim ampliar o conhecimento: possibilitando aos portadores deste distúrbio

maiores taxas de sucesso no ensino superior assim como sua inserção na sociedade.

Os educadores, desde o ensino fundamental até o ensino superior, encontram-se

diariamente em dificuldade para lidar com as questões que envolvem o processo de

aprendizagem, principalmente na compreensão das patologias da linguagem, por

simples despreparo devido a falta de informação. Imprescindível é ainda esclarecer as

diferenças entre as alterações pertinentes ao processo normal de aprendizagem e

aquelas compatíveis com o distúrbio. Estas reflexões pretendem promover uma atitude

menos excludente, em que o “diferente” seja considerado e atendido adequadamente e,

assim, deixe de contribuir para o crescimento dos índices do fracasso escolar.

Do educador se espera parcimônia ao atuar com grupos inevitavelmente heterogêneos,

considerando as diferentes dificuldades de aprendizagem de sua classe, exigindo dele

um preparo que vai muito além do nível atual.

_____________

¹ Revista da ABPp, Dislexia do desenvolvimento: definição, intervenção e prevenção² Revista do Centro de Educação, edição 2006, número 28, Memória em dislexia do desenvolvimento e surdez congênita: comparando arquiteturas cognitivas

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Page 12: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

DESENVOLVIMENTO

CAPÍTULO 1

1.1 DEFINIÇÕES

Existem, hoje, muitas teorias diferentes sobre o que é a dislexia e sobre suas causas. A

maior parte dessas teorias foi formulada para explicar os sintomas ou as características

da dislexia e por que o transtorno ocorreu.

A função mental que causa a dislexia é um dom, no mais verdadeiro sentido da palavra:

uma habilidade natural, um talento. Alguma coisa especial que engrandece o indivíduo.

Nem todos os disléxicos desenvolvem os mesmos dons, mas eles certamente possuem

algumas funções mentais em comum. Aqui estão as habilidades básicas de que todos

os disléxicos compartilham, segundo Ronald D. Davis / 2004:

1. São capazes de utilizar seu dom mental para alterar ou criar percepções (a

habilidade primária).

2. São altamente conscientes do meio ambiente.

3. São mais curiosos que a média.

4. Pensam principalmente em imagens, em vez de palavras.

5. São altamente intuitivos e capazes de muitos insights.

6. Pensam e percebem de forma multidimensional (utilizando todos os sentidos).

7. Podem vivenciar o pensamento como realidade.

8. São capazes de criar imagens muito vívidas.

Estas oito habilidades básicas, se não forem suprimidas, anuladas ou destruídas pelos

pais ou pelo processo educacional, resultarão em duas características: inteligência

acima do normal e extraordinária criatividade. A partir daí, o verdadeiro dom da dislexia

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Page 13: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

pode emergir – o dom da maestria. Antes que um disléxico possa perceber e apreciar

plenamente o lado positivo da dislexia deve-se considerar seu lado negativo. Isto não

quer dizer que o lado positivo não possa vir à tona enquanto os problemas ainda

existirem. O dom está sempre presente, mesmo que não seja reconhecido. De fato,

muitos disléxicos adultos usam o lado positivo da dislexia em suas carreiras sem se

darem conta. Acreditam apenas que têm um jeito para fazer determinadas coisas, sem

perceberem que seu talento especial vem das mesmas funções mentais que os

impedem de ler e escrever muito bem.

As dificuldades mais comuns da dislexia ocorrem na leitura, na escrita ou na

matemática, mas também aparecem em muitas outras áreas. Cada caso é diferente do

outro, porque a Dislexia é uma condição auto-gerada. Não existem dois disléxicos que

a tenham desenvolvido exatamente da mesma maneira. (RONALD DAVIS, 2004)

A dislexia é o resultado de um talento perceptivo. Em algumas situações, ele pode se

tornar uma desvantagem. O individuo não percebe que isso acontece porque o uso

desse talento tornou-se parte integrante do seu processo de pensamento.

Normalmente, quando se ouve a palavra dislexia pensa-se apenas em problemas que

crianças estariam tendo na escola com leitura, escrita e matemática. Alguns associam-

na apenas à troca de letras ou palavras, outros à lentidão de aprendizagem. Quase

todos a consideram uma forma de transtorno da aprendizagem. Na verdade, isso é

apenas um aspecto da dislexia. Quanto ao lado positivo da dislexia, não é incomum

encontrarmos, na história, disléxicos que foram considerados gênios.

A genialidade deles não ocorreu apesar da dislexia, mas por causa dela!

Ter dislexia não faz de cada disléxico um gênio, mas é bom para a autoestima de todos

os disléxicos saberem que suas mentes funcionam exatamente do mesmo modo que as

mentes de grandes gênios. Também é importante saberem que o fato de terem um

problema com leitura, escrita, ortografia ou matemática não significa que sejam inábeis

ou incapazes. A mesma função mental que produz um gênio pode também produzir

esses problemas (RONALD D. DAVIS, 2004).

A palavra “dislexia” foi o primeiro termo genérico utilizado para designar vários

problemas de aprendizagem. Em seu devido tempo, com o intuito de descrever as

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Page 14: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

diferentes formas de transtornos de aprendizagem, esses problemas foram subdivididos

e classificados. Por esta razão, podemos chamar a dislexia de “a mãe dos transtornos

de aprendizagem” (RONALD D. DAVIS, 2004).

Originalmente, os pesquisadores acreditavam que os disléxicos teriam sofrido algum

tipo de lesão cerebral ou nervosa ou seriam portadores de uma disfunção congênita.

Em qualquer um dos casos, haveria uma interferência nos processos mentais

necessários à leitura.

No fim da década de 1920, o Dr. Samuel Torrey Orton redefiniu a dislexia como uma

“lateralização cruzada do cérebro”. Isto significava que o lado esquerdo do cérebro

estaria fazendo o que o lado direito supostamente deveria fazer e o lado direito estaria

fazendo o trabalho do lado esquerdo. Contudo, isto era apenas uma teoria e, em pouco

tempo, o Dr. Orton concluiu que estava incorreta. Ele apresentou então uma segunda

teoria, afirmando tratar-se de uma “dominância hemisférica mista”, o que por sua vez

significava que o lado esquerdo do cérebro estaria às vezes fazendo o que o lado

direito deveria fazer e vice-versa.

Reinhld Berlin , em 1884, foi o primeiro a introduzir o conceito de dislexia; sua definição

era "condição que ocorria quando uma pessoa de inteligência normal tinha dificuldades

em ler”.

A definição que reúne maior consenso hoje em dia é a de Critchley (1970): trata-se de

uma perturbação que se manifesta na dificuldade em aprender a ler, apesar de o ensino

ser convencional, a inteligência adequada, e as oportunidades socioculturais

suficientes. Deve-se a uma incapacidade cognitiva fundamental, frequentemente de

origem constitucional.

DISLEXIA – dificuldades na leitura e escrita.

A definição mais usada na atualidade é a do Comitê de Abril de 1994, da International

Dyslexia Association - IDA, que diz:

Dislexia é um dos muitos distúrbios de aprendizagem. É um distúrbio específico da

linguagem, de origem constitucional, caracterizado pela dificuldade de decodificar

palavras simples. Mostra uma insuficiência no processo fonológico. Estas dificuldades

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Page 15: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

de decodificar palavras simples não são esperadas em relação à idade. Apesar de

submetida à instrução convencional, adequada inteligência, oportunidade sócio-cultural

e não possuir distúrbios cognitivos e sensoriais fundamentais, a criança falha no

processo de aquisição da linguagem. A dislexia é apresentada em várias formas de

dificuldade com as diferentes formas de linguagem, frequentemente incluídas

problemas de leitura, em aquisição e capacidade de escrever e soletrar.

A dislexia é uma função, um problema, um transtorno, uma deficiência, um distúrbio.

Refere a uma dificuldade de aprendizagem relacionada à linguagem.

A dislexia é um transtorno, uma perturbação, uma dificuldade estável, isto é, duradoura

ou parcial, portanto temporária, do processo de leitura que se manifesta na insuficiência

para assimilar os símbolos gráficos da linguagem.

A dislexia não é uma doença, portanto não podemos falar em cura. Ela é congênita e

hereditária e seus sintomas podem ser identificados logo na pré-escola.

A dislexia é uma dificuldade de aprendizagem na qual a capacidade de uma criança

para ler ou escrever está abaixo de seu nível de inteligencia.

A dislexia não é uma doença, é um distúrbio de aprendizagem congênito que interfere

de forma significativa na integração dos símbolos lingüísticos e perceptivos. Acomete

mais o sexo masculino que o feminino, numa proporção de 3 para 1.

A dislexia é caracterizada por dificuldades na leitura, escrita (ortografia e semântica),

matemática (geometria, cáIculo), atraso na aquisição da linguagem, comprometimento

da discriminação visual e auditiva e da memória sequencial.

Dislexia é um tipo de distúrbio de leitura que provoca uma dificuldade específica na

aprendizagem da identificação dos símbolos gráficos, embora a criança apresente

inteligência normal, integridade sensorial e receba estimulação e ensino adequados.

Ainda sobre a questão terminológica, diversas nomenclaturas - dificuldade de leitura e

escrita, problema de aprendizagem, dislexia de evolução, dislexia do desenvolvimento,

dislexia escolar - vêm sendo utilizadas para referirem-se, de forma indiscriminada, a

questões relacionadas à apropriação da escrita. Vale enfatizar que, de acordo com

Moysés e Collares (1992), os termos dislexia e/ou distúrbio de aprendizagem têm sido

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Page 16: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

substituídos pelas expressões dificuldade de aprendizagem e/ou dificuldade de leitura e

escrita, na tentativa de exprimirem uma posição menos violenta sobre o aprendiz.

Segundo as autoras, porém, independentemente da terminologia adotada, a dificuldade

continua sendo equivocadamente localizada em quem aprende, excluindo todos os

fatores que podem influenciar negativamente o processo ensino-aprendizagem.

1.2 OUTRAS DEFINIÇÕES OFICIAIS PARA DISLEXIA: NACIONAIS E

INTERNACIONAIS

De acordo com Hout (2001) a World Federation of Neurology, com sede no Reino

Unido, definiu a dislexia como um transtorno da aprendizagem da língua escrita que

ocorre apesar de uma inteligência normal, da ausência de problemas sensoriais ou

neurológicos, de instrução escolar considerada adequada e de oportunidades

socioculturais suficientes. Trata-se de uma definição formulada em função de critérios

excludentes: um conceito que destaca os fatores causais que não podem determinar ou

explicar a chamada dislexia.

Nos Estados Unidos, o reconhecimento da dislexia como um transtorno específico de

aprendizagem da linguagem escrita foi aprovado, em 1960, pelo Congresso Nacional

daquele país. Segundo Bolaffi (1994), a importância atribuída ao diagnóstico

neurológico e em um representativo número de crianças diagnosticadas como

disléxicas provocaram a criação de leis que garantem a elas uma educação especial,

em classes separadas das crianças consideradas “normais”.

Nos Estados Unidos, os critérios para definir a dislexia são similares aos utilizados pela

World Federation of Neurology, ou seja, são critérios fundamentados em fatores

excludentes. Nesse sentido, salienta-se, uma vez mais, o fato de a chamada dislexia

ser considerada uma perturbação caracterizada pela eliminação de fatores capazes de

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Page 17: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

determinar sua causa, isto é, uma perturbação no processo de apropriação da escrita

que se caracteriza por não contar com qualquer explicação causal capaz de justificá-la.

Apesar dos escores de testes que determinam o quociente de inteligência ser

amplamente utilizados e tomados como principal critério para indicar a capacidade

intelectual de uma criança, tais escores não garantem uma distinção clara entre

deficiência mental, normalidade e super-dotação.

De acordo com a Associação Brasileira de Dislexia (ABD) a definição que vem sendo

utilizada:

“É um distúrbio ou transtorno de aprendizagem na área da leitura, escrita e soletração,

a dislexia é o distúrbio de maior incidência nas salas de aula”

Pesquisas realizadas em vários países mostram que entre 5% e 17% da população

mundial é disléxica.

Ao contrário do que muitos pensam a dislexia não é o resultado de má alfabetização,

desatenção, desmotivação, condição sócio-econômica ou baixa inteligência. Ela é uma

condição hereditária com alterações genéticas, apresentando ainda alterações no

padrão neurológico.

Cabe esclarecer que a Associação Brasileira de Dislexia, além de exercer influência

sobre estudos, pesquisas e atividades profissionais envolvidas com a temática em todo

o país, está vinculada à International Dyslexia Association e compartilha dos mesmos

pressupostos dessa organização, que goza de grande prestígio em todos os estados

norte-americanos e em outros países. Portanto, o conceito divulgado por essas

instituições é amplamente aceito e representativo da visão vigente em torno do que se

entende por dislexia.

Sobre a definição em si, a International Dyslexia Association – pela Associação

Brasileira de Dislexia – deixa claro que entende a linguagem como um código, ao

buscar caracterizar a dislexia como um distúrbio especificamente de ordem linguística.

Ela ressalta que a dificuldade do individuo estaria relacionada à codificação e

decodificação de palavras simples.

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Page 18: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

Porém essa visão que concebe a Iíngua como um código – organizado em função de

um amontoado de sons, letras, sílabas e palavras isoladas de um contexto significativo

– e o aprendiz como um ser passivo, mero memorizador de repetições, está

explicitamente pautada em uma perspectiva behaviorista. Tal perspectiva, desenvolvida

fundamentalmente por Skinner (1957), toma a linguagem como comportamento verbal,

produto de reforço e modelagem que o meio externo proporciona ao aprendiz, negando

o papel do sujeito e desconsiderando o processo interlocutivo na construção de objetos

linguísticos.

CAPÍTULO 2

2.1 O SIGNIFICADO DAS PALAVRAS

De acordo com Vygotsky (1922), todas as atividades cognitivas básicas do indivíduo

ocorrem de acordo com sua história social e acabam se constituindo no produto do

desenvolvimento histórico-social de sua comunidade. Neste processo de

desenvolvimento cognitivo, a linguagem tem papel crucial na determinação de como o

sujeito vai aprender a pensar, uma vez que formas avançadas de pensamento são

transmitidas à criança através de palavras.

A palavra influi sobre a criança, enriquecendo e aprofundando sua percepção direta e

conformando sua consciência (LURIA e YUDOVICH, 1985)

Inicialmente, a criança não tem consciência da composição verbal da palavra que vai

surgindo no decorrer de um período; nas primeiras etapas do desenvolvimento, a

criança confunde a palavra com o objeto. Os experimentos que evidenciaram o

caminho percorrido pela criança nessa tomada de consciência da estrutura verbal da

Iinguagem foram propostos por Vygotsky em 1856 e depois por Karpona em 1967.

No inicio do desenvolvimento da criança, a consciência tem caráter afetivo. Segundo

Luria (1985) esse caráter reflete o mundo afetivamente; a seguir, a consciência passa

ao concreto imediato, assim como as palavras que se refletem em seu mundo; no

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Page 19: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

estágio seguinte, a consciência passa a ser lógica, verbal e abstrata mesmo que os

estágios anteriores permaneçam encobertos.

O significado da palavra muda substancialmente quanto ao seu significado no decorrer

do desenvolvimento da criança: inicialmente, o papel fundamental da palavra e

desempenhado pelo afeto, pelo agradável ou desagradável; mais tarde, pela imagem

imediata, a memória, reproduzindo uma situação determinada; para o adulto, são os

enlaces lógicos presentes nas palavras que configuram o papel principal.

A partir do momento em que a criança descobre que tudo tem uma nomenclatura, cada

novo objeto que surge representa um problema que ela resolve atribuindo-lhe um

nome. Quando lhe falta a palavra para nomear este novo objeto, a criança recorre ao

adulto. Esses significados básicos de palavras assim adquiridos funcionarão como

embriões para a formação de novos e mais complexos conceitos.

2.2 A PALAVRA COMO ELEMENTO REGULADOR DA CONDUTA DA CRIANÇA

Levando-se em consideração essas assertivas, caso que nos interessa diretamente no

fazer psicopedagógico, examina-se as considerações de autores como Vygotsky e

Luria, em relação à subordinação da criança ao adulto: quando a criança adquire uma

palavra que designa um objeto em particular e serve como sinal de uma ação concreta,

ela se subordina a esta palavra, assim como à instrução verbal do adulto. A palavra,

portanto, regula a conduta da criança, organizando sua atividade num nível mais alto e

qualitativamente novo. Esta subordinação das reações da criança à palavra de um

adulto é o começo de uma longa cadeia de formação de aspectos complexos da sua

atividade consciente e voluntária.

Luria (1985) enfatiza que "além da função cognoscitiva da palavra e sua função como

instrumento de comunicação, há sua função pragmática ou reguladora; a palavra não é

somente um instrumento de reflexo da realidade, é o meio de regulação da conduta".

Vygotsky (1933) ensina que é indispensável examinar como os processos voluntários

se formam no curso do desenvolvimento da atividade concreta do sujeito e na sua

19

Page 20: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

comunicação com o adulto, cuja organização está baseada no desenvolvimento

lingüístico da criança.

Segundo Luria (1985), a primeira etapa da função reguladora da Iinguagem da criança

– função base do comportamento voluntário – é a capacidade de subordinação à

instrução verbal do adulto e, a partir dessa "subordinação primitiva", forma-se o ato

voluntário. Quando a mãe nomeia um objeto e junta a ele um gesto indicador, está

reorganizando a atenção da criança e separando o objeto mencionado dos demais,

assim a criança começa a se subordinar à ação da linguagem do adulto.

Para fortalecer o papel regulador da linguagem nessa etapa (até 2-3 anos), é preciso

assinalar o objeto nomeado com gestos ou indicações, reforçando-os pela ação. Pais,

alunos e educadores precisam entender que a dislexia, ao contrário do que definem

alguns profissionais de educação terapêutica ou de saúde mental, não é,

definitivamente, uma doença ou transtorno.

Para os que atuam, em sala de aula, com disléxicos no ensino fundamental ou no

ensino médio, cabe o juízo critico e o discernimento pedagógico de que a dislexia é,

apenas, uma dificuldade específica no aprendizado da leitura no período escolar. Os

disléxicos podem aprender. Aliás, todas as crianças especiais são aprendentes em

potencial. Se fracassam no período escolar, não fracassam sozinhas: a escola, do

gestor ao educador, também fracassou.

Entender a Dislexia como dificuldade e não como patologia, por exemplo, não quer

dizer que os educadores, para poder explicar as dificuldades leitoras, não possam

recorrer a aportes teóricos das ciências da saúde ou da linguagem clínica,

especialmente as pesquisas na Neurologia e Psicologia Clínica, que nos ajudam,

realmente, a compreender o que ocorre durante a aquisição, desenvolvimento e

processamento da linguagem escrita dos disléxicos. Conhecer o cérebro dos disléxicos

é um passo que ilumina a atuação profissional dos docentes, pais e os próprios alunos.

A Psicologia Cognitiva pode e deve ser uma grande aliada dos profissionais de

educação que atuam na intervenção pedagógica (quando o método escolar de ensino

de leitura falha) ou psicopedagógica (quando a criança apresenta, por exemplo, um

déficit de memória ou falta de motivação para a leitura). (PIAGET, 1975)

20

Page 21: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

A dislexia passou a ter uma explicação mais plausível com a vinculação da linguagem à

cognição, no chamado cognitivismo. A aquisição e o desenvolvimento da linguagem

são processos, segundo a teoria cognitivista, derivados dos processos do

desenvolvimento do raciocínio na criança. Para se entender a dislexia é necessário

aprofundar conhecimentos sobre a criança, daí estabelecermos relação com os

distintos estágios do desenvolvimento do pensamento infantil à luz das teorias

piagetianas. (PIAGET, 1975)

Todavia, é bom lembrar que Piaget, assim como Vygotsky, não estão interessados

diretamente em assuntos linguísticos ou patológicos da aquisição da linguagem, mas

na relação linguagem / pensamento. Estão sempre preocupados com a epistemologia

da linguagem. Aqui, então, podemos explicar o disléxico como alguém que é capaz de

construir estruturas (conhecimento) com base na experiência com o mundo físico, ao

interagir e ao reagir biologicamente a ele, no momento da interação. (PIAGET, 1975)

Graças às teorias piagetianas e construtivistas não se vê o disléxico como um doente

ou paciente, mas como alguém saudável que apresenta especificidade na

aprendizagem da linguagem escrita, no momento de interação com o sistema de escrita

(bastante complexo) e com os falantes de sua língua materna (marcada pela

diversidade regional, por exemplo).

Dislexia e estágio sensório-motor: neste estágio, não se pode apontar com segurança

se uma criança sofre ou não de dislexia, em que pese o atraso na fala ter um caráter

preditivo no que se refere à dificuldade em leitura a partir dos seis anos de idade,

quando se espera que já seja alfabetizado em leitura. (PIAGET, 1982)

Como dizer com segurança se uma criança, na educação infantil, apresenta dislexia? A

desconfiança de um problema futuro com a linguagem escrita, por apresentar déficit de

fala, é um indício forte, mas, seria precipitação do educador ou dos próprios pais o

rótulo de "disléxico" para toda criança que, na educação infantil, tem atraso na fala ou

uma fala confusa.

Este estágio vai do nascimento aos dois anos de idade. Aos dois anos de idade idade,

época em que é possível desconfiar, em algumas crianças com risco em dislexia, da

21

Page 22: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

sua dificuldade de reconhecimento imediato das palavras que deveriam fazer parte de

seu vocabulário ativo, especialmente rótulos.

A respeito dos rótulos, tão freqüentes na pedagogia construtivista ou método global de

leitura, vale destacar que estes são aqui definidos como impressos, afixados em

recipientes e embalagens, que apresentam informações sobre o produto ali contido

(p.ex., sua marca, principais características, apelos mercadológicos, nome e endereço

do fabricante, peso, composição, teor alcoólico etc.). (PIAGET, 1975)

Assim, as dificuldades iniciais dos "virtuais disléxicos", na educação infantil, se dariam,

a partir dessa abordagem, quando a criança deixa de memorizar os rótulos, sem fazer

uma associação que considera, em princípio, arbitrária, entre uma nova forma escrita e

uma outra forma que ela já conhece.

Em todo caso, vale lembrar que, neste estágio de desenvolvimento cognitivo, não há,

ainda, a mediação fonológica uma vez que não está alfabetizada em leitura. Pelo

menos, não é na educação infantil, que criança, no ambiente escolar, precisa aprender

a ler no sentido de decodificação leitora, mas, claro, poderá a ler o mundo, na

perspectiva mais ampla, através das várias manifestações dos signos visuais,

linguísticos, icônicos e símbolos em que estamos imersos na sociedade letrada.

(PIAGET, 1982).

Dislexia e estágio pré-operacional: neste estágio, pode ser levantada a suspeita de

dislexia no caso de insensibilização do educando à rimas. Este estágio vai dos dois aos

sete anos de idade. Esta insensibilização à rima pode ser explicada pelo déficit

fonológico dos disléxicos que, diante de textos em versos, por exemplo, deixam de

perceber: (PIAGET, 1982).

1 - A reiteração de sons (vocais, consonantais ou combinados) iguais ou

similares, em uma ou mais sílabas, geralmente, acentuadas, que ocorrem em intervalos

determinados e reconhecíveis;

2 – O apoio fonético recorrente, entre dois ou mais versos, que consiste na

reiteração total ou parcial do segmento fonético final de um verso a partir da última

tônica, com igual ocorrência no meio ou no fim de outro verso. Os disléxicos

desenvolvimentais são potencialmente disléxicos fonológicos.

22

Page 23: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

Dislexia e estágio operatório-concreto: em se tratando de idade, vai de sete ou oito a

onde ou doze anos de idade. É o estágio da construção da lógica. Crianças, por

exemplo, que têm dificuldade de fazer a correspondência entre letras e fonemas, isto é,

de perceber o princípio alfabético do sistema de escrita da sua língua materna, são

aspirantes à dislexia. Aqui, sim, uma criança não tem assegurado no seu aprendizado o

princípio alfabético tem tudo para apresentar dificuldade em ler um texto, seja em prosa

ou em verso. (PIAGET, 1982).

Como decantar um texto escrito senão pela conversão dos grafemas em fonemas ou

sons da fala? Mesmo que cogitemos, à luz das teorias construtivistas ou inatistas, aqui,

que as crianças trazem consigo um "potencial leitor" e que poderão, uma vez

estimulados pedagogicamente, a ler os textos com seus conhecimentos prévios,

portanto, ler o texto antes de decodificá-los, aos 8, 9, 10, 11 ou 12 anos, esperamos

que tenham aprendido a soletrar palavras, frases e tenham, pois, a proficiência literal

em leitura inicial.

Os disléxicos cometem erros visuais e, em geral, negam-se a responder questões de

compreensão literal do texto lido, utilizando, quase sempre, estratégias grafêmicas

parciais que podem estar em desacordo com seu estoque de fonemas e grafemas do

sistema escrito de sua língua materna.

Dislexia e estágio operatório-formal: este estágio vai de onze ou doze anos em diante,

fase em que a criança raciocina. Crianças que aprendem a deduzir informações,

aprendem a aprender. Aqui se espera que a criança já tenha a automatização dos

processos de leitura, em que pode realizar uma leitura de texto com fluência, rápida,

uma vez que não efetua mais uma decodificação sistemática da sequência ortográfica

da palavra. (PIAGET, 1982)

Os disléxicos neste estágio dão aos educadores os primeiros indícios de suas

dificuldades de leitura, de escrita e ortográficas, ao conseguirem, inesperadamente,

depois de tantos anos de bancos escolares, a automatização leitora, fracassando na

hora de ler um texto em voz alta ou de soletrar algumas palavras não familiares, e com

isso, em geral, acabam perdendo um tempo precioso na leitura eficaz ao se

concentrarem no tratamento das letras que constituem as palavras, a fim de decodificá-

23

Page 24: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

las para não errar, o que acaba por conduzir a leitura de forma lenta, sofrível e analítica

(PIAGET, 1982).

No discurso dos pais e educadores, o "defeito inesperado" na leitura dos disléxicos, em

geral, com quociente de inteligência acima da média, gera uma gama de reações

inusitadas e, por isso, surgem rótulos, dentro e fora da escola, do tipo: meu filho ou meu

aluno tem uma leitura abrupta, acidental, brusca, casual, episódica, impensada,

imprevisível, imprevista, incalculada e incomum.

A leitura, sim; o leitor, não. A leitura em voz dos disléxicos poderá ser assim percebida

pelos que estão ao seu redor, mas não tenhamos dúvida, eles, os disléxicos, já buscam

compensações para superar suas dificuldades específicas, o que certamente exigirá,

dos que atuam no campo educacional, um princípio de tolerância no desenvolvimento

da capacidade de aprender a ler desses alunos especiais.

Numa palavra, os disléxicos requerem uma intervenção paciente e encorajadora dos

que realmente têm a vocação de ensinar a crianças, jovens ou adultos inteligentes e

interessados em aprender, mas com necessidades educacionais especiais e que nos

levam a entender que as diferenças linguísticas nos tornam mais especiais, belos e

excelentes aos olhos magníficos dos seres humanos.

CAPÍTULO 3

3.1 OS PRINCIPAIS SINTOMAS

Ianhez e Nico (2002) e Cuba dos Santos (1987) listam vários "sinais" e "sintomas" como

decorrentes do que tomam por dislexia. Nessas listas, citam questões como: dificuldade

com cálculos mentais, dificuldade em organizar tarefas, dificuldade com noções

espaço-temporais, entre outras, tais como:

Desempenho inconstante com relação à aprendizagem da leitura e da

escrita;

24

Page 25: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

Dificuldade com os sons das palavras e, consequentemente, com a

soletração;

Escrita incorreta, com trocas, omissões, junções e aglutinações de

fonemas;

Relutância para escrever;

Confusão entre letras de formas vizinhas, como "moite" por "noite",

"espuerda" por "esquerda";

Confusão entre letras foneticamente semelhantes: "tinda" por "tinta",

"popre" por' “pobre", "gomida" por "comida";

Omissão de letras ou sílabas, como "entrando" por "encontrando", "giado"

por "guiado", "BNDT" por "Benedito";

Adição de letras ou sílabas: "muimto" por "muito", "fiaque" por "fique",

"aprendendendo" por “aprendendo";

União de uma ou mais palavras ou divisão inadequada de vocábulos:

"Eraumaves um omem" por "Era uma vez um homem", "a mi versario" por

"aniversário";

Leitura e escrita em espelho.

A partir de uma ancoragem teórica que nos possibilita ir além de uma noção de língua

como um código estanque, compreendendo a linguagem como uma atividade que se

realiza no espaço interlocutivo, todos esses itens tornados como fenômenos

patológicos devem ser questionados (MASSI, 2004).

Inicialmente, com relação ao dito desempenho inconstante, não entendemos como o

processo de apropriação da escrita – que implica tentativas, "erros", hipóteses e

"acertos" – poderia se desenvolver livre de instabilidades.

Para Vygotsky (1931), não é possível pensar na construção da escrita como um

processo linear e constante. Durante a aquisição da linguagem oral, a criança também

apresenta instabilidades: errando, tentando, manipulando e acertando. É preciso aceitar

que todo processo de apropriação de novos conhecimentos requer reflexões e

25

Page 26: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

comparações em um percurso de idas e vindas, o qual, longe de estabilidades, nos leva

a perguntas, indagações e perplexidades.

Na sequência, quanto aos ítens que se referem, respectivamente, à dificuldade com os

sons das palavras, bem como a uma escrita “incorreta” – trocas, omissões, junções e

aglutinações de fonemas – cabe ressaltar que, antes de serem tomados como sinais de

uma patologia, tais itens relacionados como manifestações sintomáticas parecem

revelar falta de clareza a respeito das diferenças existentes entre fonemas e letras.

Afinal, fonemas são unidades sonoras e, portanto, dizem respeito à linguagem oral.

Dessa forma, seria impossível afirmar que uma criança troca, omite ou aglutina sons na

sua escrita. Os sons de uma língua não podem ser confundidos ou tomados como

integrantes da escrita.

É muito comum, por exemplo, ouvirmos alfabetizadores, psicólogos, fonoaudiólogos,

entre outros profissionais, afirmarem que trocas fonêmicas, relativas ao uso da

linguagem oral, resultam em trocas de letras na escrita. Assim, Caraciki (1983) aposta

na existência de tal dislexia-dislálica, a qual define como um distúrbio da palavra falada

– caracterizado por trocas ou inversões de sons da fala -, cujos efeitos acompanhariam

a escrita. Atribui-se o nome de dislexia-dislálica a um distúrbio decorrente de uma

transferência que a criança faz de trocas sonoras apresentadas na fala para a

modalidade escrita da linguagem.

Afirmações como estas derivam do equívoco de que a escrita é um espelho da fala.

Nesse sentido, convém esclarecer que, apesar de o nosso sistema de escrita ter um

compromisso direto com os sons da língua, a relação entre as letras e os sons da fala

não é pareada. A propósito, vale ressaltar que a única forma de escrita que retrata a

oralidade, correlacionando univocamente letra e som, é a transcrição fonética. Na

escrita ortográfica, os símbolos gráficos e os sons, em diversos contextos, não fazem

relação um a um. Por isso, é equivocada a afirmação de que trocas, substituições,

acréscimos ou inversões fônicas podem acarretar, de forma direta e certeira,

dificuldades na apropriação da escrita.

É preciso tomar cuidado com essas questões e enfrentar a falta de entendimento que a

escola e profissionais relacionados a ela, direta ou indiretamente, muitas vezes têm

26

Page 27: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

acerca da natureza da escrita, de suas características, de suas funções e,

principalmente, do fato de ser diferente da oralidade. De um lado, a fala conta com

aspectos prosódicos, gestos, expressões faciais que não são revelados na escrita, a

qual, por outro lado, apresenta elementos significativos próprios, como tamanho,

formato e tipo das letras, elementos pictóricos, e assim por diante.

Além disso, a fala é uma prática lingüística que está intimamente relacionada a um

dialeto usado por dada comunidade. Já a escrita ortográfica segue uma convenção que

estabelece uma única maneira de grafarmos as palavras. Por conseguinte, a oralidade

deixa espaço para pronúncias diferentes: "iscada" ou "escada"; "pexe" ou "peixi";

"lapsu" ou "lapiso", sem que isso nos traga constrangimentos. A ortografia, ao contrário,

pelo seu caráter convencional, torna-se inflexível e nos leva a escrever de um único

modo: "escada", "peixe" e "lapso", embora o sistema de escrita permita que palavras

sejam escritas conforme sua pronúncia. (MASSINI CAGLIARI, 2001)

Ainda sobre as diferenças entre oralidade e escrita, cabe dizer que na linguagem oral

contamos com a presença do outro na conversa, enquanto na manipulação da escrita

preenchemos o vazio deixado pela ausência do interlocutor, assumindo, ao mesmo

tempo, o papel de quem escreve e de quem Iê. Ou seja, na atividade com a escrita,

precisamos imaginar um interlocutor para quem planejamos e organizamos nosso

discurso.

Sem levar em conta essas diferenças, não é possível entender o processo de

apropriação da escrita e, sem tal entendimento, "erros" transitórios são tomados como

sintomas de um déficit, levando o aluno a sistematizar uma doença e a fazer confusões

que podem interferir negativamente em tal processo.

Nesse caminho, educadores, médicos, fonoaudiólogos e psicólogos nem sempre

auxiliam o aprendiz a reconhecer as especificidades da escrita: sua uniformização

gráfica, sua convencionalidade, as relações variáveis entre sons e letras. Dessa forma,

a oralidade influencia continuamente sua produção escrita. Se não compreendermos

essa questão, continuaremos a acompanhar alunos sendo rotulados equivocadamente

como portadores de um distúrbio, o qual pode refletir o não-entendimento da escola –

27

Page 28: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

alinhada a profissionais da saúde – acerca da linguagem escrita e seu processo de

apropriação.

No que tange à relutância para escrever, chamamos a atenção para o fato de tal

atitude, antes de um sintoma inerente ao aprendiz, evidenciar o medo e a repulsa que o

aluno desenvolve – com a ajuda da escola e de diversos profissionais vinculados a ela

– diante da atividade da escrita. Medo de escrever e de ser rotulado como imaturo,

lento, incapaz, disléxico. Medo, enfim, de manipular a escrita, de tentar, de errar, de

criar hipóteses e saídas para resolver os impasses gerados por uma situação em que

se vê diante de algo desconhecido que se quer compreender.

3.2 OS SINTOMAS MAIS FREQUENTES SEGUNDO A FAIXA ETÁRIA

3.2.1 Dos quatro aos seis anos:

A omissão, inversão ou a confusão de fonemas;

Vocabulário empobrecido;

Dificuldade na expressão oral;

Baixo nível de compreensão da Iinguagem;

Dificuldade em aprender a diferenciar cores, formas, tamanhos, posições;

Problemas de lentidão motora e

Atraso na aquisição de conhecimento do esquema corporal, orientação e

sequenciação.

3.2.2 Dos seis aos nove anos:

28

Page 29: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

Permanecem ou aumentam as inversões, confusões, trocas e omissões de

fonemas;

O vocabulário passa a ser cada vez mais empobrecido em relação à faixa etária e

escolaridade alcançada;

Na leitura, geralmente silabada, hesitante e mecânica, é freqüente a presença de

confusão entre letras como, por exemplo, entre: a/o; a/e; u/o; b/d; p/q; u/n, assim

como aparecem omissões, inversões e adições de sílabas nas palavras Iidas, o que

dificulta ainda mais o entendimento do texto;

Na escrita, percebem-se confusões de letras semelhantes pelo som ou forma;

Há omissões e inversões de letras, sílabas ou palavras, que persistem apesar do

treino ortográfico; é freqüente a escrita de letras ou símbolos isolados em espelho e

A escrita e a estruturação das idéias são confusas.

3.2.3 Acima de nove anos:

Dificuldade na estruturação das frases;

Inadequação no uso dos tempos verbais;

Dificuldade persistente na compreensão da leitura, assim como na expressão oral e

escrita;

Escrita muito irregular, com incorreções ortográficas, semântica e sintática;

Transparecem as dificuldades às outras aprendizagens escolares que tenham como

base a leitura e sua compreensão;

Negam-se ou evitam ler, principalmente em voz alta;

Compreendem melhor o que é lido para eles do que o que lêem e

Como se cansam devido ao esforço mental, escrevem mais devagar e sua caligrafia

pode ser muito irregular.

29

Page 30: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

Infelizmente, as crianças não superam por si só esses problemas relacionados à leitura

e escrita. Precisam de profissionais especializados por um período de sua

escolarização e quanto mais cedo for iniciado esse atendimento, menos complicações

serão desenvolvidas, tanto no âmbito escolar, como no emocional e social.

Espera-se da escola que tenha sensibilidade à questão e busque atualizar seus

conhecimentos para detectar os sintomas sugestivos da Dislexia. A escola deve

comunicar adequadamente aos pais suas suspeitas, incentivando o encaminhamento

para o diagnóstico clínico, apoiar e adotar as condutas orientadas pelos profissionais

especializados como ensino personalizado, avaliação adaptada e maior compreensão

do comportamento e necessidades da criança disléxica. Necessário também promover

a integração social através do respeito e do conhecimento de suas particularidades de

aprendizagem, visando melhorar a imagem negativa que em geral esses alunos têm de

si.

3.3 Sinais distintivos

3.3.1 Até os três anos de idade

1 - atraso no desenvolvimento motor desde a fase do engatinhar, sentar e andar;

2 - atraso ou deficiência na aquisição da fala, desde o balbucio à pronúncia de palavras;

3 - parece difícil para essa criança entender o que está ouvindo;

4 - distúrbios do sono;

5 - enurese noturna;

6 - suscetibilidade a alergias e a infecções;

7 - tendência à hiper ou a hipo-atividade motora;

8 - chora muito e parece inquieta ou agitada com muita frequência;

9 - dificuldades para aprender a andar de triciclo;

30

Page 31: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

10 - dificuldades de adaptação nos primeiros anos escolares.

Observações:

Nem toda criança com dificuldade de aquisição da fala é disléxica, mas que tal

dificuldade, aliada a outros sintomas, pode determinar o diagnóstico. Quando este

sintoma está associado a outros casos familiares de dificuldades de aprendizado –

dislexia e, comprovadamente, genética, afirmam especialistas que essa criança pode

vir a ser avaliada já a partir de cinco anos e meio, idade ideal para o início de um

programa adequado a esta especificidade que pode trazer as respostas mais favoráveis

para superar ou minimizar essa dificuldade. (MARINA S. R. ALMEIDA, 2004)

A dificuldade de discriminação fonológica leva a criança a pronunciar as palavras de

maneira errada. Essa falta de consciência fonética, decorrente da percepção imprecisa

dos sons básicos que compõem as palavras, acontece, já a partir do som da letra e da

sílaba. Essas crianças podem expressar um alto nível de inteligência, "entendendo tudo

o que ouvem", como costumam observar suas mães, porque têm uma excelente

memória auditiva. Portanto, sua dificuldade fonológica não se refere à identificação do

significado de discriminação sonora da palavra inteira, mas da percepção das partes

sonoras diferenciais de que a palavra é composta. Esta é a razão pela qual o disléxico

apresenta dificuldades significativas em leitura, que leva a tornar-se, até, extremamente

difícil sua soletração de sílabas e palavras. Por isto, sua tendência é ler a palavra

inteira, encontrando dificuldades de soletração sempre que se defronta com uma

palavra nova.

Porque, freqüentemente, essas crianças apresentam mais dificuldades na conquista de

domínio do equilíbrio de seu corpo com relação à gravidade, é comum que pais possam

submetê-Ias a exercícios nos chamados "andadores" ou "voadores". Prática que,

advertem os especialistas, além de trazer graves riscos de acidentes, é absolutamente

inadequada para a aquisição de equilíbrio e desenvolvimento de sua capacidade de

andar, como interfere, negativamente, na cooperação harmônica entre áreas motoras

dos hemisférios esquerdo-direito do cérebro. Por isto, crianças que exercitam a marcha

em "andador", tendem a adquirir o domínio de andar sozinhas, sem apoio, mais

tardiamente do que as outras crianças

31

Page 32: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

Além disso, o uso do andador como exercício para conquista da marcha ou visando

uma maior desenvoltura no andar dessa criança, também contribui, de maneira

comprovadamente negativa, em seu desenvolvimento psicomotor potencial-global, em

seu processo natural e harmônico de maturação e colaboração de lateralidade

hemisférico-cerebral.

3.3.2 Acima dos sete anos de idade:

1 – pode ser extremamente lento ao fazer seus deveres;

2 – ao contrário, seus deveres podem ser feitos rapidamente e com muitos erros;

3 – tem boa caligrafia mas tem pobre compreensão do texto ou não Iê o que escreve;

4 – a fluência em leitura é inadequada para a idade;

5 – inventa, acrescenta ou omite palavras ao ler e ao escrever;

6 – só faz leitura silenciosa;

7 – ao contrário, só entende o que Iê, quando Iê em voz alta para poder ouvir o som da

palavra;

8 – sua letra pode ser mal grafada e, até, ininteligível; pode borrar ou ligar as palavras

entre si;

9 – pode omitir, acrescentar, trocar ou inverter a ordem e direção de letras e sílabas;

10 – esquece aquilo que aprendera muito bem, em poucas horas, dias ou semanas;

11 – é mais fácil ou só é capaz de bem transmitir o que sabe através de exames orais;

12 – ao contrário, pode ser mais fácil escrever o que sabe do que falar aquilo que sabe;

13 – tem grande imaginação e criatividade;

14 – desliga-se facilmente, entrando "no mundo da lua";

15 – tem dor de barriga na hora de ir para a escola e pode ter febre alta em dias de

prova;

32

Page 33: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

16 – porque se liga em tudo, não consegue concentrar a atenção em um só estímulo;

17 – baixa autoimagem e auto-estima; não gosta de ir para a escola;

18 – esquiva-se de ler, especialmente em voz alta;

19 – perde-se facilmente no espaço e no tempo; sempre perde e esquece seus

pertences;

20 – tem mudanças bruscas de humor;

21 – é impulsivo e interrompe os demais para falar;

22 – não consegue falar se outra pessoa estiver falando ao mesmo tempo em que ele

fala;

23 – é muito tímido e desligado; sob pressão, pode falar o oposto do que desejaria;

24 – tem dificuldades visuais, embora um exame não revele problemas com seus olhos;

25 – embora alguns sejam atletas, outros mal conseguem chutar, jogar ou apanhar uma

bola;

26 – confunde direita-esquerda, em cima-embaixo; na frente-atrás;

27 – é comum apresentar lateralidade cruzada; muitos são canhestros e outros

ambidestros;

28 – dificuldade para ler as horas, para seqUências como dia, mês e estação do ano;

29 – dificuldade em aritmética básica ou em matemática mais avançada;

30 – depende do uso dos dedos para contar, de “truques” e objetos para calcular;

31 – sabe contar, mas tem dificuldades em contar objetos e Iidar com dinheiro;

32 – é capaz de cálculos aritméticos, mas não resolve problemas matemáticos ou

algébricos;

33 – embora resolva cálculo algébrico mentalmente, não elabora cálculo aritmético;

34 – tem excelente memória de longo prazo, lembrando experiências, filmes, lugares e

faces;

35 – boa memória longa, mas pobre memória imediata, curta e de médio prazo;

33

Page 34: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

36 – pode ter pobre memória visual, mas excelente memória e acuidade auditivas;

37 – pensa através de imagem e sentimento, não com o som de palavras;

38 – é extremamente desordenado, seus cadernos e Iivros são borrados e amassados;

39 – não tem atraso e dificuldades suficientes para que seja percebido e ajudado na

escola;

40 – pode estar sempre brincando, tentando ser aceito nem que seja como "palhaço";

41 – frustra-se facilmente com a escola, com a leitura, com a matemática, com a

escrita;

42 – tem pré-disposição à alergias e a doenças infecciosas;

43 – tolerância muito alta ou muito baixa à dor;

44 – forte senso de justiça;

45 – muito sensível e emocional, busca sempre a perfeição que lhe é difícil atingir;

46 – dificuldades para andar de bicicleta, para abotoar, para amarrar o cordão dos

sapatos;

47 – manter o equilíbrio e exercícios físicos são extremamente difíceis para muitos

disléxicos;

48 – com muito barulho, o disléxico se sente confuso, desliga e age como se estivesse

distraído;

49 – sua escrita pode ser extremamente lenta, laboriosa, ilegível, sem domínio do

espaço na página;

50 – cerca de 80% dos disléxicos têm dificuldades em soletração e em leitura.

Crianças disléxicas apresentam combinações de sintomas, em intensidade de níveis

que variam entre o sutil ao severo, de modo absolutamente pessoal. Em algumas delas,

há um número maior de sintomas e sinais; em outras, são observadas somente

algumas características. Quando sinais só aparecem enquanto a criança é pequena, ou

se alguns desses sintomas somente se mostram algumas vezes, isto não significa que

possam estar associados à dislexia. Inclusive, há crianças que só conquistam uma

34

Page 35: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

maturação neurológica mais lentamente e que, por isto, somente têm um quadro mais

satisfatório de evolução, também em seu processo pessoal de aprendizado, mais

tardiamente do que a média de crianças de sua idade.

Pesquisadores vêm enfatizando que a dificuldade de soletração tem-se evidenciado

como um sintoma muito forte da Dislexia. Há o resultado de um trabalho recente,

publicado no jornal Biological Psychiatry e referido no The Associated Press em

15/7/02, onde foram estudadas as dificuldades de disléxicos em idade entre sete e

dezoito anos, que reafirma uma outra conclusão de pesquisa realizada com disléxicos

adultos em 1998, constando do seguinte: quanto melhor uma criança seja capaz de ler,

melhor ativação ela mostra em uma específica área cerebral, quando envolvida em

exercício de soletração de palavras. Esses pesquisadores usaram a técnica de Imagem

Funcional de Ressonância Magnética, que revela como diferentes áreas cerebrais são

estimuladas durante atividades específicas. Esta descoberta enfatiza que essa região

cerebral é a chave para a habilidade de leitura, conforme sugerem esses estudos. Essa

área, atrás do ouvido esquerdo, é chamada região ocipto-temporal esquerda. Cientistas

que, agora, estão tentando definir quais circuitos estão envolvidos e o que ocorre de

errado em Dislexia, advertem que essa tecnologia não pode ser usada para

diagnosticar.

Esses pesquisadores ainda esclarecem que crianças disléxicas mais velhas mostram

mais atividade em uma diferente região cerebral do que os disléxicos mais novos. Isto

sugere que essa outra área assumiu esse comando cerebral de modo compensatório,

possibilitando que essas crianças conseguissem ler, porém somente com o exercício de

um grande esforço.

CAPÍTULO 4

4.1 OS DISTÚRBIOS DE LEITURA

35

Page 36: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

Os distúrbios de leitura e escrita atingem, de forma severa, cerca de 10% das crianças

em idade escolar. Se forem considerados também os distúrbios leves, este percentual

chega a 25% (PIÉRART, 1997).

Logo, uma das tarefas mais freqüentes de psicólogos, psicopedagogos e profissionais

de áreas afins é a avaliação de distúrbios de leitura. É essencial, portanto, que o

profissional conheça os vários tipos de distúrbios de leitura, possa conduzir o

diagnóstico diferencial entre eles e, com base neste diagnóstico, realize a intervenção

apropriada.

Conforme descrito por Grégoire (1997), o distúrbio específico de leitura é geralmente

chamado de dislexia nos países de língua francesa e de distúrbio de leitura (reading

disability) nos países de língua inglesa. Apesar das divergências quanto ao nome da

síndrome, há uma razoável concordância sobre sua definição. Segundo a World

Federation of Neurologists (1968), dislexia do desenvolvimento é o distúrbio em que a

criança, apesar de ter acesso à escolarização regular, falha em adquirir as habilidades

de leitura, escrita e soletração que seriam esperadas, de acordo com seu desempenho

intelectual. Segundo a definição do National Institute of Health americano, a dislexia é

"um dos vários tipos de distúrbios de aprendizagem. É um distúrbio específico de

linguagem de origem constitucional e caracterizado por dificuldades em decodificar

palavras isoladas, geralmente refletindo habilidades de processamento fonológico

deficientes. Essas dificuldades em decodificar palavras isoladas são frequentemente

inesperadas em relação à idade e outras habilidades cognitivas e acadêmicas, elas não

são resultantes de um distúrbio geral do desenvolvimento ou de problemas sensoriais."

(THE ORTON DYSLEXIA SOCIETY, 1995, p. 2).

Para diagnosticar a dislexia do desenvolvimento, deve ser excluída a presença de

alguns outros distúrbios. A dislexia caracteriza-se por um distúrbio na linguagem

expressiva e/ou receptiva que não pode ser atribuído a atraso geral do

desenvolvimento, distúrbios auditivos, lesões neurológicas importantes (como paralisia

cerebral e epilepsia) ou distúrbios emocionais.( TALLAL, 1997)

Além da dislexia do desenvolvimento, anteriormente descrita, há a dislexia adquirida,

também denominada de alexia. Nas dislexias adquiridas, a perda da habilidade de

36

Page 37: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

leitura é devida a uma lesão cerebral específica e ocorre após o domínio da leitura pelo

indivíduo. Nas dislexias do desenvolvimento, ao contrário, não há uma lesão cerebral

evidente, e a dificuldade já surge durante a aquisição da leitura pela criança. De acordo

com Frith (1985) este processamento da informação escrita pode ocorrer por meio de

três estratégias: a logográfica, a alfabética e a ortográfica.

Na primeira delas, a logográfica, a leitura e a escrita ainda são incipientes, pois se

caracterizam pelo uso de pistas contextuais e não lingüísticas. Sem estas pistas, o

reconhecimento não é possível. As cores, o fundo e a forma das palavras são algumas

das pistas utilizadas para a leitura logográfica. Nesta estratégia, o leitor relaciona a

palavra com seu contexto específico e a palavra é tratada como um desenho. Um

exemplo dessa estratégia é a leitura dos rótulos mais comuns no dia-a-dia do leitor.

A segunda estratégia, a alfabética, com o desenvolvimento da rota fonológica, implica o

conhecimento das correspondências entre letras e fonemas, durante a codificação e a

decodificação. Aqui, a palavra não é mais tratada como um desenho e sim como um

encadeamento de unidades menores (letras ou sons) que, unidas, resultam em uma

unidade maior e com significado (a palavra). Assim, nesta estratégia, o leitor é capaz de

converter o som em escrita (e vice-versa), conseguindo ler e escrever palavras novas e

pseudopalavras.

Num primeiro momento, a leitura alfabética pode ser sem compreensão porque, apesar

da conversão letra-som, o significado não é alcançado, visto que os recursos centrais

de atenção e memória estão totalmente voltados à tarefa de decodificação

grafofonêmica. Num segundo momento, com a automatização da decodificação, o leitor

consegue ter acesso ao significado.

Finalmente, na estratégia ortográfica, os níveis lexical e morfêmico são reconhecidos

diretamente, sem a necessidade de conversão fonológica, de modo que a leitura

caracteriza-se pelo processamento visual direto das palavras.

Nesta etapa, a partir da representação ortográfica, a criança tem acesso direto ao

sistema semântico. Ou seja, o leitor já possui um léxico mental ortográfico, podendo

relacionar a palavra escrita diretamente ao seu significado, fazendo urna leitura

competente. Torna-se possível a leitura de palavras irregulares.

37

Page 38: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

Tais estratégias não são mutuamente excludentes e podem coexistir simultaneamente

no leitor e no escritor competentes. A estratégia a ser utilizada, em qualquer dado

momento, depende do tipo de item a ser lido ou escrito, sendo influenciada pelas

características psicolingüísticas dos itens, tais como lexicalidade, freqüência,

regularidade grafo-fonêmica e comprimento (CAPOVILLA; CAPOVILLA, 2000, MORAlS,

1995).

A divisão clássica dos tipos de dislexia foi feita com base nos quadros de dislexia

adquirida, e se pauta em qual etapa, ao longo do processamento de informação, está

afetada (MORAIS, 1995). Os principais tipos são:

Dislexia visual – há distúrbios na análise visual das palavras. Os erros de leitura

mostram uma semelhança visual entre a escrita da palavra pronunciada e a da

palavra alvo. Por exemplo, diante de "bandagem" ler "bobagem".

Dislexia de negligência – os distúrbios também estão no sistema de análise visual, e

o leitor consistentemente ignora partes das palavras, geralmente deixando de ler a

parte inicial.

Leitura letra-a-letra – há distúrbios no reconhecimento global de palavras, ou seja,

no processamento paralelo das letras. A leitura é feita corretamente somente após a

soletração (em voz alta ou não) de cada letra. Há dificuldade com letras cursivas,

pois a separação das letras é menos evidente, sendo mais fácil ler palavras escritas

em letra de forma.

Dislexia atencional – há dificuldades na codificação das posições das letras nas

palavras, mas a identificação paralela das letras está preservada. Assim, pode haver

migrações de letras dentro de uma mesma palavra ou, principalmente, de uma

palavra a outra durante a leitura de frases.

Dislexia fonológica – há dificuldades na leitura pela estratégia alfabética, que faz uso

do processamento fonológico. Porém, a leitura visual-direta pela estratégia

ortográfica está preservada. Logo, há dificuldades na leitura de pseudopalavras e

palavras desconhecidas, mas a leitura de palavras familiares é adequada.

Representa cerca de 67% dos quadros disléxicos (BODER, 1973).

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Page 39: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

Dislexia morfêmica ou semântica - há dificuldades na leitura pela estratégia

ortográfica, sendo a leitura feita principalmente pela estratégia alfabética. Logo, há

dificuldades na leitura de palavras irregulares e longas, com regularizações.

Representa cerca de 10% dos quadros disléxicos.

Esta divisão, feita inicialmente a partir dos quadros de dislexias adquiridas, tem sido

aplicada também às dislexias do desenvolvimento, especialmente a distinção entre a

dislexia fonológica e a dislexia morfêmica, ou seja, o distúrbio alfabético e o distúrbio

ortográfico (STANOVICH; SIEGEL; GOTTARDO, 1997). Porém, os achados mais

recentes sobre os tipos de dislexia têm sido mais negativos que positivos, ou seja, há

cada vez menos evidências de que as dislexias do desenvolvimento tenham, de fato,

diferentes tipos com padrões de leitura distintos entre si.

Ao contrário, as pesquisas têm sugerido que as dislexias do desenvolvimento

caracterizam-se, basicamente, pelos distúrbios na leitura alfabética, e não pelos

distúrbios na leitura ortográfica. A dislexia morfêmica seria mais o resultado de um

atraso geral da leitura do que de um padrão desviante. Será abordado, a seguir, um dos

estudos que confirmam tal suposição.

Stanovich, Siegel e Gottardo (1997) avaliaram sessenta e oito crianças disléxicas em

tarefas de leitura de palavras irregulares (i.e., com relações entre letra e som

imprevisíveis, como “táxi”) e de pseudopalavras. Enquanto a leitura de palavras

irregulares só pode ser feita corretamente pela rota lexical, a leitura de pseudopalavras

só pode ser feita corretamente pela rota fonológica. Com base nos resultados, as

crianças foram divididas em três grupos: disléxicas fonológicas (que apresentavam

pobre leitura de pseudopalavras, mas boa leitura de palavras irregulares), disléxicas

morfêmicas (boa leitura de pseudopalavras, mas pobre leitura de palavras irregulares) e

disléxicas mistas (leitura similar em ambas as tarefas).

Tais crianças foram, então, comparadas a quarenta e qautro crianças-controle não-

disléxicas. Ambos os grupos tinham o mesmo nível de leitura, ou seja, foram

controlados o efeito da exposição à leitura e as possíveis conseqüências que tal

exposição poderia ter sobre o desenvolvimento cognitivo das crianças. Assim, enquanto

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Page 40: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

as crianças disléxicas freqüentavam a 3ª terceira série, as crianças não-disléxicas

freqüentavam da primeira a segunda séries.

Quando os resultados das crianças disléxicas foram comparados aos resultados das

crianças não-disléxicas com mesmo nível de leitura, mas idade cronológica inferior, foi

observado que:

a) os disléxicos morfêmicos apresentaram um padrão de leitura bastante similar

ao padrão das crianças-controle mais novas em idade cronológica, mas com mesmo

nível de leitura. Ou seja, os disléxicos morfêmicos tinham mais um atraso na leitura do

que um desvio;

b) os disléxicos fonológicos apresentaram, de fato, um padrão desviante. Seus

desempenhos não foram similares aos de crianças mais jovens. Ao contrário, enquanto

sua leitura lexical foi significativamente superior à do grupo controle mais jovem, sua

leitura fonológica foi significativamente inferior. Ou seja, apesar do escore geral ter sido

o mesmo entre o grupo controle e o grupo de disléxicos fonológicos, a distribuição dos

escores foi diferente.

Além do desempenho em leitura, os disléxicos morfêmicos apresentaram desempenhos

semelhantes ao grupo controle mais jovem em habilidades de consciência fonológica,

processamento sintático e memória de trabalho. Por outro lado, os disléxicos

fonológicos tiveram desempenhos rebaixados em relação às crianças de mesmo nível

de leitura nestas três habilidades.

A dislexia fonológica é, realmente, um padrão desviante de leitura, enquanto a dislexia

morfêmica parece ser mais um atraso na leitura, apresentando um padrão consistente

com um nível de leitura menos desenvolvido. Os disléxicos fonológicos parecem ter, na

verdade, um processamento fonológico alterado, que não pode ser simplesmente

devido à falta de exposição à leitura.

Grande parte dos disléxicos apresenta um perfil misto, isto é, apresentam dificuldades

significativas em ambas as rotas, fonológica e lexical. Porém, essa proporção de

disléxicos mistos é maior com crianças jovens (27,9%) do que com crianças mais

velhas (9,8%), sendo que os disléxicos jovens mistos podem evoluir para disléxicos

fonológicos quando mais velhos. Tal evolução provavelmente ocorre porque essas

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Page 41: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

crianças conseguem desenvolver habilidades de leitura lexical, com estratégias de

reconhecimento visual, diminuindo, portanto, suas dificuldades com palavras irregulares

de alta freqüência.

Há uma diversidade de quadros disléxicos que podem ocorrer, e há evidências de que

os problemas alfabéticos são os mais frequentes entre os disléxicos de ortografias

alfabéticas. Neste contexto, a presente pesquisa teve como objetivo verificar, em

crianças disléxicas, quais são as estratégias de leitura mais comprometidas.

4.2 A DIFÍCIL ARTE DE TIPIFICAR A DISLEXIA

Desde o princípio dos anos 60 têm-se proposto diferentes tipos de dislexia, baseando-

se em classificações de 2, 3, e 4 tipos. A reunião das diferentes classificações até à

presente data é uma tarefa inacabada (GONZÁLEZ, 1996). As propostas, ainda

segundo González, de Bakker, com propósitos de reabilitação, de Mattis, com critérios

de diagnóstico estandardizados e de Watson & Goldar, merecem especial referência.

Baker, Pirozzolo, Bravar & Fabro (1996), de acordo com o quadro proposto por

González, distinguem a dislexia de tipo auditivo-linguístico, o L-type (L-ingual type),

equivalente à dislexia verbal ou disfonética de outros autores e que se caracterizaria

por deficiências na aprendizagem e nos skills de estratégias linguísticas por parte do

hemisfério esquerdo e déficits na memória verbal imediata. Um segundo tipo visuo-

espacial, o P-type (P-erceptual type), equivalente à dislexia visuo-perceptiva ou

diseidética, seria caracterizado por deficiências na aprendizagem e nos skills

perceptivos do hemisfério direito, com problemas visuo-motores e nível de atenção

deficitário. A dislexia mista, M-type (M-ixed type) participaria em ambos os tipos de

problemas. A dislexia-plus, ficaria reservada para aqueles casos de dislexia que se

fazem acompanhar de um problema na atenção (ADD, Attention Déficit Disorder).

Mattis, French & Mattis (1996) distinguem a dislexia de tipo linguística, de tipo

articulatória-grafomotor e de tipo perceptivo visuo-espacial. A dislexia de tipo lingüístico

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Page 42: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

caracteriza-se por anomia, compreensão deficitária, linguagem “imitativa” alterada e

falha na discriminação de sons verbais. Na Dislexia de tipo articulatório e grafomotor a

linguagem receptiva estaria preservada, destacando-se as deficiências articulatórias e

grafomotoras. E, na dislexia de tipo perceptivo vísuo-espacial, o coeficiente intelectual

(Q.I.) verbal destacar-se-ia sobre o manipulativo (WAIS / WISC) e rendimento inferior no

teste de funções não-verbais (Raven Progressive Matrices, Benton Visual Retention

Test).

Watson & Golgar (1996) distinguem, por seu lado, a dislexia onde predominaria o

problema de linguagem com déficits associados de memória auditiva e combinação de

sons (sound blending), a dislexia com marcada alteração do processamento visual e

auditivo e dislexia com problemas na memória auditiva e do processamento visual.

Seja qual for a classificação escolhida, segundo González (1996), todas parecem ter

em comum pelo menos duas grandes tipologias em função da alteração primaria

linguística ou visuoperceptiva: a dislexia de tipo auditivo-linguística com problemas

fonológicos acentuados e que implicariam disfunção do hemisfério esquerdo e a

dislexia de tipo vísuo-perceptivo com problemas vísuo-espacial e vísuo-perceptivos

implicando disfunção do hemisfério direito. Também é comum aludir a um terceiro tipo

de Dislexia mista que participaria de ambas as alterações. As correspondências das

descobertas neuroanatômicas e neurológicas anteriormente resumidas com as

tipologias disléxicas ainda permanecem em debate, desta forma todos os tipos devem

reunir-se considerando que a Dislexia é, em si mesma, um problema eminentemente

linguístico, quer a leitura-escrita se apresente fonológica, seqüencial ou visualmente

problematizada. A incidência acrescida de atraso na linguagem (15%) em disléxicos, a

sua dificuldade de etiquetar ou nomear objetos comuns (disnomia) e perceber que as

palavras são formadas por unidades (fonemas, sílabas e morfemas) depende este

caráter lingüístico da Dislexia. (GONZALIEZ, 1996).

Moysés e Collares (1992) explicam que se faz necessário distinguir os quadros de

dislexia e dislexia do desenvolvimento. O primeiro refere-se à perda da capacidade

adquirida de leitura e escrita devido a um comprometimento causado por traumatismo

craniano ou acidente vascular cerebral. O segundo trata-se da tentativa de extrapolar

este dado, partindo do pressuposto de que crianças com supostas alterações no SNC –

42

Page 43: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

a princípio, a existência de uma possível lesão; depois, de uma possível disfunção

cerebral mínima – manifestaria, como consequencia, comprometimento no processo de

aprendizagem.

4.3 DISLEXIA VISUAL

4.3.1 Principais entraves

1 – Dificuldades na interpretação e diferenciação de palavras;

2 – Dificuldades na memorização de palavras;

3 – Confusão na configuração de palavras;

4 – Frequentes inversões, omissões e substituições;

5 – Problemas de comunicação não verbal;

6 – Problemas na grafomotricidade e na visuomotricidade;

7 – Dificuldades em relacionar a linguagem falada com a linguagem escrita.

4.3.2 Diagnóstico rápido

1 – Dificuldades em construir “puzzles”;

2 – Dificuldades em copiar figuras geométricas e grafismos rítmicos;

3 – Dificuldades de controle visual (perseguição, fixação e rotação binocular;

4 – Dificuldades em diferenciar: forma, cor, tamanho e posição;

5 – Problemas de organização espacial e de seqüência visual;

6 – Dificuldades em identificar letras e palavras;

7 – Dificuldades no uso de plurais e de tempos dos verbos;

43

Page 44: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

8 – Não rememoriza palavras e imagens.

4.3.3 Ferramentas de desenvolvimento

1 – Usar métodos analíticos e métodos fônicos;

2 – Relacionar letras com sons singulares;

3 – Utilizar palavras com a mesma configuração;

4 – Identificar sons não verbais e verbais;

5 – Associar sons (sintetizar sílabas);

6 – Trabalhar com famílias de palavras;

7 – Criar pequenas frases e pequenas histórias;

8 – Aperfeiçoar as dificuldades visuais com situações de visuomotricidade;

9 – Realizar discriminação de formas e figuras;

10 – Detectar pormenores em figuras incompletas;

11 – Treinar a visualização de orientação diferenciada de palavras;

12 – Valorizar a velocidade de discriminação visual.

4.4 DISLEXIA AUDITIVA

4.4.1 Principais entraves

1 – Dificuldades sutis de discriminação de sons;

2 – Não-associação dos símbolos gráficos com as suas componentes auditivas;

3 – Não-relacionamento dos fonemas com os monemas (partes e o todo da

palavra);

44

Page 45: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

4 – Confusão de sílabas iniciais, intermédias e finais;

5 – Problemas de percepção auditiva;

6 – Problemas de articulação;

7 – Dificuldades em seguir orientações e instruções;

8 – Dificuldades de memorização auditiva;

9 – Problemas de atenção;

10 – Dificuldades de comunicação verbal.

4.4.2 Diagnóstico rápido

1 – Inêxito em distinguir semelhanças e diferenças de sons (não diferencia “tua”

de “sua”, nem “mão” de “não”;

2 – Não identifica sons em palavras, nem sintetiza sons;

3 – Não realiza a análise silábica;

4 – Dificuldades na composição de sons;

5 – Dificuldades na sequência de sons

6 – Dificuldades na retenção e reprodução de atividades rítmicas;

7 – Dificuldades na leitura oral (inverso na DV);

8 – Dificuldades na compreensão da leitura;

9 – Não fixa rimas nem lenga-lengas;

10 – Dificuldades na articulação de palavras polissilábicas.

4.4.3 Ferramentas de desenvolvimento

1 – Desenvolver a correspondência entre a visão e a audição;

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Page 46: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

2 – Utilizar métodos visuais, com o recurso de imagens e fichas coloridas e

ilustradas;

3 – Frases simples;

4 – Refinar as aquisições auditivas (treino auditivo, discriminação e seqüências

auditivas);

5 – Imitação de sons;

6 – Códigos rítmicos;

7 – Agrupamento de sons;

8 – Análise e síntese de sons com reforço visual;

9 – Utilizar métodos táctilo-quinestésicos (letras móveis);

10 – Utilizar a leitura silenciosa;

11 – Discussões orais e exposição de acontecimentos;

12 – Utilização de figuras e bandas desenhadas.

CAPITULO 5

5.1 A INCAPACIDADE DE TRANSCREVER O VISUAL E O ORAL: DISGRAFIA E

DISORTOGRAFIA

A disgrafia é a falta de habilidade motora para transpor através da escrita o que captou

no plano visual ou mental, a criança apresenta lentidão no traçado e letras ilegíveis. É

uma desordem resultante de um distúrbio de integração visual-motora. Isso acontece

devido a uma incapacidade de recordar a grafia da letra. Também conhecido como

“caligrafia feia”. A criança com esse tipo de dificuldade não possui deficiência visual

nem motora, e tampouco qualquer comprometimento intelectual ou neurológico. No

entanto, não consegue transmitir informações visuais ao sistema motor.

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Page 47: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

Alguns estudos atribuem a causa destas dificuldades a fatores sociais, outros a fatores

emocionais, e alguns, ainda, a atrasos no desenvolvimento psicomotor.

As principais características são: lentidão na escrita; caligrafia ilegível; escrita

desorganizada; traços irregulares (ou muito fortes que chegam a marcar o papel ou

muito leves); desorganização geral na folha por não possuir orientação espacial;

desorganização do texto, pois não conservam a margem parando muito antes ou

ultrapassando; quando este último acontece, tende a amontoar letras na borda da folha;

desorganização das letras: letras retocadas, hastes mal feitas, atrofiadas omissão de

letras, palavras, números, formas distorcidas, movimentos contrários a escrita (um s ao

invés do 5, por exemplo); desorganização das formas: tamanho muito pequeno ou

muito grande, escrita alongada ou comprida; liga as letras de forma inadequada e com

espaçamento irregular.

O disgráfico não apresenta características isoladas, mas um conjunto de algumas

destas citadas. Podemos encontrar dois tipos de disgrafia: a disgrafia motora

(discaligrafia), onde a criança consegue falar e ler, mas encontra dificuldades na

coordenação motora fina para escrever as letras, palavras e números, ou seja, vê a

figura gráfica, mas não consegue fazer os movimentos pra escrever e a disgrafia

perceptiva onde a criança não consegue fazer a relação entre o sistema simbólico e as

grafias que representam os sons, as palavras e frases. Possui as características da

Dislexia senda que esta está associada à leitura e à disgrafia à escrita.

O tratamento requer uma estimulação lingüística global e um atendimento

individualizado complementar a escola. Os pais e educadores devem evitar repreender

a criança. Os educadores devem reforçar o aluno de forma positiva sempre que

conseguir realizar uma conquista, na avaliação escolar dar mais ênfase a expressão

oral, evitar o uso de canetas vermelhas na correção dos cadernos e provas,

conscientizar o aluno de seu problema e ajudá-lo de forma positiva.

A disortografia é a incapacidade para transcrever corretamente a linguagem oral;

caracteriza-se pelas trocas ortográficas e confusões com as letras. Esta dificuldade não

implica a diminuição da qualidade do traçado das letras. Essas trocas são normais nas

primeiras séries do primeiro grau, porque a relação entre a palavra impressa e os sons

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Page 48: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

ainda não está totalmente dominada. Porém, após estas séries, se as trocas

ortográficas persistirem repentinamente, é importante que o educador esteja atento já

que pode se tratar de uma disortografia.

Os principais erros que uma criança com disortografia costuma apresentar são:

Confusão de letras (trocas auditivas: consoante surdas por sonoras: f/v, faca/vaca,

etc.), vogais nasais por orais: na/a, en/i, on/o, um/u; confusão de sílabas com tonicidade

semelhante: cantarão/cantaram; confusão de letras (trocas visuais: simétricas: b/d, p/q,

semelhantes: e/a, b/h, f/t, confusão de palavras com configurações semelhantes,

exemplo copia pedreiro em lugar de padeiro).

CAPÍTULO 6

6.1 A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO E A ALFABETIZAÇÃO

Lima (2002) coloca que é função da escola ampliar a experiência humana, portanto a

escola não pode ser limitada ao que é significativo para o aluno naquele momento, mas

criar situações de ensino que ampliem a experiência, aumentando os campos de

significação.

Do ponto de vista do desenvolvimento e da construção de significados, só pode ser

significativo para a pessoa aquilo do qual ela possui um mínimo de experiências e de

informação.

Por isso, o disléxico precisa olhar e ouvir atentamente, observar os movimentos da mão

quando escrever e prestar atenção aos movimentos da boca quando fala. Desta

maneira, a criança disléxica associará a forma escrita de uma letra tanto com seu som

como com os movimentos, pois falar, ouvir, ler e escrever, são atividades da linguagem.

Fonseca (1995) retrata muito bem isso quando diz que uma coisa é a criança que não

quer aprender a ler, outra é a criança que não pode aprender a ler com os métodos

pedagógicos tradicionais. Não podemos assumir atitudes reducionistas que afirmam

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Page 49: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

que a Dislexia não existe. De fato, a Dislexia é muito mais do que uma dificuldade na

leitura. A Dislexia normalmente não aparece isolada, ela surge integrada numa

constelação de problemas que justificam uma deficiente manipulação do

comportamento simbólico que trata de uma aquisição exclusivamente humana.

Muitos autores têm defendido o método fonético como o mais adequado na

alfabetização de disléxicos e não disléxicos. Os métodos fonéticos favorecem a

aquisição e o desenvolvimento da consciência fonológica que é a capacidade de

perceber que o discurso espontâneo é uma sequência de sentenças e que estas são

uma sequência de palavras (consciência da palavra); que as palavras são uma

seqüência de sílabas (consciência silábica) e que as sílabas são uma seqüência de

fonemas (consciência fonêmica), o que auxiliaria muito nas dificuldades dos alunos

disléxicos.

É importante conscientizar toda a comunidade escolar de que estas “facilidades” dadas

aos disléxicos, na verdade, representam a única forma que estes têm para competir em

igualdade de condições com seus colegas. Fique alerta se a criança apresentar alguns

desses sintomas:

Atraso no desenvolvimento da fala e da linguagem.

Dificuldade em aprender rimas e canções.

Falta de interesse por livros impressos.

O fato de apresentar alguns desses sintomas não indica necessariamente que ela seja

disléxica; há outros fatores a serem observados. Porém, com certeza, estaremos diante

de um quadro que pede uma maior atenção ou estimulação.

6.2 SINAIS DE DISLEXIA NA IDADE ESCOLAR

Para Ianhez (2002) estes são sinais importantes de Dislexia na idade escolar:

Trocas ortográficas podem ocorrer mas dependem do tipo de Dislexia;

Problema para reconhecer rimas e alterações (fonemas repetidos em uma frase);

49

Page 50: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

Desatenção e dispersão;

Desempenho escolar abaixo da média, em matérias específicas, que dependem da

linguagem escrita;

Lentidão na aprendizagem dos mecanismos da leitura e escrita;

Melhores resultados nas avaliações orais do que nas escritas;

Dificuldade de coordenação motora fina (para escrever, desenhar e pintar) e grossa;

Dificuldade de copiar as lições do quadro ou de um livro;

Problema de lateralidade (confusão entre esquerda e direita, ginástica);

Dificuldade de expressão: vocabulário pobre, frases curtas, estrutura simples,

sentenças vagas;

Dificuldade em manusear mapas e dicionários;

Esquecimento de palavras;

Problema de conduta: retração, timidez, excessiva e depressão;

Desinteresse ou negação da necessidade de ler;

Leitura demorada, silabadas e com erros. Esquecimento de tudo o que lê;

Salta linhas durante a leitura, acompanha a linha de leitura com o dedo;

Dificuldade em matemática, desenho geométrico e em decorar sequências;

Desnível entre o que ouve e o que lê. Aproveita o que ouve, mas não o que lê;

Demora demasiado tempo na realização dos trabalhos de casa;

Não gosta de ir à escola;

Apresenta “picos de aprendizagem”, em alguns dias parece assimilar e

compreender os conteúdos e em outro, parece ter esquecido o que tinha aprendido

anteriormente;

Pode evidenciar capacidade acima da média em áreas como: desenho, pintura, música,

teatro, esporte, etc.

50

Page 51: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

O estudo da Dislexia, em sala de aula, tem como ponto de partida a compreensão,

(sem vírgula) das quatro habilidades fundamentais da linguagem verbal: a leitura, a

escrita, a fala e a escuta. Destas, a leitura é a habilidade linguística mais difícil e

complexa, e a mais diretamente relacionada com a dificuldade específica de acesso ao

código escrito denominada “Dislexia”. (PINTO, 2003).

No caso da criança em idade escolar, a psicolinguística define a Dislexia como um

déficit inesperado na aprendizagem da leitura (Dislexia), da escrita (disgrafia) e da

ortografia (disortografia) na idade em que essas habilidades já deveriam ter sido

automatizadas. É o que se denomina “Dislexia de desenvolvimento”.

Para ensinar crianças com distúrbios de aprendizagem, é preciso conhecer os

processos educacionais. Daí resulta a importância da pré-escola, que é a época

propícia para desenvolver a capacidade cognitiva da criança normal ou mesmo

disléxica, através de métodos ativos e baseados na psicologia de Jean Piaget. É

preciso então atender aos estágios de desenvolvimento mental da criança, sem pressa

de alfabetizar, antes que ela esteja madura neurologicamente.

Para a criança disléxica, o método multissensorial surge com o objetivo de trabalhar a

criança, para que aprenda a dar respostas automáticas duradouras (nomes, sons e

fonemas) e desenvolver habilidades como sequenciar palavras. Na alfabetização, a

introdução de cada letra, com ênfase na sua relação com o nome/som e com a

importância em dar a sua forma correta, torna o ensino sistemático e cumulativo, e

deverá ser avaliado regularmente, de forma a verificar a sua eficiência.

CAPITULO 7

7. A MISSÃO DO EDUCADOR

Coll (1995) propõe que os educadores estejam em contato permanente com grupos de

alunos com diferentes níveis na área da comunicativo-linguística e com crianças que

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diferem quanto aos usos que fazem da linguagem, em função da procedência

geográfica, social e cultural.

Os educadores precisam estar atentos para esta realidade e para as particularidades

de seu grupo. Suspeitando dos sintomas, deve sugerir um encaminhamento clínico

para a criança e, após diagnosticado o quadro, é necessário que ele se dedique muito

ao aluno, em sala de aula, e ao longo do tratamento, que envolve em partes iguais a

escola, a família e profissionais da saúde.

A primeira tarefa do educador é resgatar a autoconfiança do aluno. Descobrir suas

habilidades para que possa acreditar em si mesmo ao se destacar em outras áreas

O papel do educador é dirigir um olhar flexível para cada aluno que tenha dificuldade, é

compreender a natureza dessas dificuldades, buscar um diagnóstico especializado,

uma orientação para melhorar o dia-a-dia da criança, e se instrumentar, pois há muitos

educadores que lecionam e não sabem ainda o que é Dislexia.

Somos de opinião de que o educador primário deve ele próprio construir

os seus instrumentos de diagnóstico pedagógico (diagnóstico informal)

a fim de conduzir sua atividade mais coerentemente e do maior

interesse o uso de instrumentos que permitam detectar precocemente

qualquer dificuldade de aprendizagem, pois só assim uma intervenção

psicopedagógica pode ser considerada socialmente útil, uma vez que

quanto mais tarde for identificada a dificuldade, menos alternativas

haverá para solucionar corretamente(FONSECA, 1995).

O educador que deseja ajudar seus alunos sabe que é necessário encaminhá-lo para

tratamento e colaborar nesse tratamento. Mas ele sabe também que o atendimento

gratuito é sujeito a grande espera e que o nível econômico da maioria dos escolares

não permite tratamento particular. Só através de um trabalho paciente e constante,

poderá prestar a ajuda, que a criança tanto necessita.

O ideal é trabalhar a autonomia da criança, para que ela não comece a sentir-se

dependente em tudo. O educador deve acolher e respeitá-lo, em suas diferenças, sem

cair no sentimento de pena.

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Cabe ao educador recorrer a diversas atividades e técnicas de ensino e descobrir qual

delas melhor se adapta a cada estudante e a cada situação.

É importante que o educador explique à criança o seu problema, sente ao lado dela,

não a pressione com o tempo, não estabeleça competições com os outros, que seja

flexível quanto ao conteúdo das lições, que faça críticas construtivas, que estimule o

aluno a escrever em linhas alternadas (o que permite a leitura da caligrafia imprecisa),

que certifique-se de que a tarefa de casa foi entendida pela criança, peça aos pais que

releiam com ela as instruções, evite anotar todos os erros na correção (dando mais

importância ao conteúdo), não corrija com lápis vermelho (isso fere a suscetibilidade da

criança com problemas de aprendizagem), e procure descobrir os interesses e leituras

que prendam a atenção da criança.

É de grande importância ressaltar, que a manutenção de turmas pequenas, com no

máximo vinte alunos, ou menos, é de extrema relevância, para que o educador tenha

oportunidade de observar de maneira adequada a todos os educandos, como também

dispor de tempo para auxiliá-los.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escola pode ainda não estar preparada para receber o aluno disléxico uma vez que o

educador não teve uma formação acadêmica para trabalhar com este aluno. A escola

não possui recursos didáticos adequados para o aprendizado deles. Nota-se que o

diagnóstico precoce pode oferecer ao aluno subsídio para que ele construa

perspectivas de sucesso em todos os aspectos de sua vida.

A síndrome pode ser identificada desde cedo – já que nasce com o indivíduo –

principalmente na alfabetização, quando a leitura e escrita são formalmente

apresentadas à criança. Os profissionais que realizam o seu diagnóstico são

fonoaudiólogos, que trabalham junto a psicólogos especializados no assunto. Os

adultos que fizeram um tratamento adequado terão a possibilidade de desenvolver

estratégias que compensarão estas dificuldades, facilitando-lhes a vida acadêmica.

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Page 54: A DISLEXIA DE DESENVOLVIMENTO

A divulgação está ajudando a popularizar os conhecimentos sobre a Dislexia. Esta, por

sua vez, está começando a ser vista de uma maneira diferente. Muitos que antes

acreditavam que fosse uma doença, hoje Já percebem que é, na verdade, um distúrbio,

uma dificuldade que pode ser amenizada através de tratamento específico. No entanto,

a difusão entre os leigos ainda é muito restrita, de forma que ainda pode-se conferir um

comportamento preconceituoso em relação aos disléxicos.

Atualmente, já existe educador preocupado com a aprendizagem de todos os alunos,

incluindo os com necessidades educacionais especiais, buscando-se aperfeiçoar cada

vez mais através de leitura, cursos e palestras objetivando maior conhecimento acerca

das diferentes dificuldades e distúrbios que acometem muitos alunos em quase todas

as salas de aula do nosso país e também pelo mundo afora.

Cada vez mais, é dever do educador buscar aperfeiçoar-se para trabalhar com todos os

tipos de alunos. Faz-se necessário que o educador conheça os diferentes tipos de

problemas de aprendizagem que podem aparecer em uma sala de aula, como

diagnosticá-los, o que fazer, como trabalhar com esta criança e quais as estratégias e

recursos disponíveis para transmitir e construir o conhecimento para este ser que tem

direito a aprender como os demais.

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