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Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

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Primeiro módulo do curso Formação em Aprendiz de Mídias Digitais da United Way Brasil.

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Vivemos na Era da hiperconec-tividade, onde tudo e todos estão interliga-

dos à tudo e a todos, o tempo todo. Um mundo

onde não conseguimos mais nos imaginar sem

a Internet e a todo este novo comportamento so-

cial que surgiu a partir de sua democratização.

Estamos no meio de uma silenciosa revolução,

responsável por mudanças profundas na for-

ma como nos comunicamos, como nos infor-

mamos, como consumimos, como vendemos,

como nos entretemos, nos relacionamos e até

mesmo como trabalhamos. Mas, como toda re-

volução em andamento, ainda não temos o cha-

mado ‘distanciamento histórico’ para conseguir

compreender para onde estamos indo. A ques-

tão é que definitivamente estamos indo à algum

lugar, em uma velocidade nunca imaginada até

mesmo pelos mais engenhosos profetas.

O ritmo quase transcendental em que a Revolu-

ção Digital nortea as relações humanas no sé-

culo XXI não tem mais do que 20 anos de histó-

ria, apesar de sua gênese nos remeter à década

de 60 do século passado.

Enquanto a televisão e o rádio foram inventa-

dos há cerca de um século, a Internet - com sua

popularização a pouco mais de 20 anos - já al-

cança a marca de mais de 2 bilhões de pessoas

conectadas1, em um mundo com 7 bilhões de

habitantes. Isso sem contar a aceleração da mo-

bilidade da informação, a partir dos celulares e

smartphones, que podem chegar até 5 bilhões

de usuários. Só no Brasil, segundo a Agência

Nacional de Telecomunicações (Anatel), exis-

tem mais de 255 milhões de celulares ativos2

(algo como 1,20 celular por habitante, dados de

outubro de 2012), sendo que quase 20% desses 1.0

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03

1 Internet World Stats (http://www.internetworldstats.com/stats.htm) Acesso: novembro 20122 UOL Economia (http://economia.uol.com.br/ultimas-noticias/infomoney/2012/06/19/celulares-brasil-tem-quase-255-milhoes-de-linhas-ati-vas.jhtm) Acesso: novembro 2012

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é compatível com o sistema 3G, tecnologia que

possibilita acesso à Internet.

Com a crescente difusão do acesso à Internet

por diversos meios, percebemos que a profun-

da domesticação das tecnologias digitais tende

a não só mais nos conectar uns aos outros mas

também aos objetos do nosso dia a dia, como

carros, roupas, eletrodomésticos, serviços pú-

blicos, etc, fazendo com que a Internet seja

o que já é para muitas pessoas: uma relação

de uso quase imperceptível e intrinsecamen-

te adaptada as suas rotinas, assim como é a

energia elétrica: não se nota sua presença até

a sua ausência.

Com tamanha naturalidade em que as tecno-

logias digitais estão no nosso dia a dia, não no-

tamos que interagimos com ela desde o ama-

nhecer até o anoitecer. Mas essa intimidade

corriqueira com o mundo digital precisa e deve

ser vista com olhos mais apurados para con-

seguir absorver e aproveitar o máximo de suas

possibilidades.

O escritor especializado em tecnologia Kevin

Kelly, editor da revista Wired, refletiu sobre a

velocidade das mudanças e, principalmente,

como não a enxergamos diante de tanta ‘nor-

malidade’ dos usos digitais nos dias de hoje:

“Tive de convencer a mim mesmo a acreditar no

impossível com mais regularidade (…) Vinte anos

atrás, se eu fosse contratado para convencer uma

plateia de pessoas sensatas e esclarecidas que

dali a vinte anos as ruas do mundo estariam ma-

peadas por fotos de satélites e à disposição em

nossos aparelhos portáteis – e de graça -, e com

vista para as ruas de muitas cidades, não teria

conseguido. Não saberia ilustrar as razões eco-

nômicas para que isso fosse oferecido “de graça”.

Eram completamente impossível naquela época3.”

04

3 CHATFIELD, Tom: Como viver na era digital. PP.11

Page 4: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

Ou seja, vivemos num ‘tempo de milagres’, se-

gundo Tom Chatfield, filósofo da comunicação

digital. Num tempo de colaborações, intera-

ções e microrrevoluções com alcance mun-

dial e com possibilidades ainda inimagináveis,

principalmente pelo fato de que os telefones

com conexão à Internet são mais poderosos

que muitos computadores, e que temos aces-

so livre à informações o que antes era restri-

to apenas aos governos a menos de vinte anos

atrás.

Então, é preciso mais do que nunca refletir e

pensar sobre essas novas possibilidades. Ao

mesmo tempo em que nos sentimos livres por

ter acesso ilimitado à informações dstintas, de

várias fontes, uma grande ansiedade surge a

partir da tamanha liberdade que temos e por

não conseguir absorver todo esse conteúdo.

Sabemos que não é suficiente apenas saber

usar essas tecnologias. É preciso entender sua

linguagem e seus processos para criar um dos

elementos mais vitais de diferenciação de pro-

fissionais (e, por que não, de seres-humanos)

do século XXI: saber filtrar, interpretar e co-

municar todo esse conteúdo disponível da for-

ma mais clara possível e nos canais corretos.

A ideia básica desse módulo é resgatar o iní-

cio de toda essa revolução, seus processos e

fases, para compreender de uma forma mais

lúcida e crítica de como a comunicação digital

é hoje um elemento indispensável nas rela-

ções humanas mas também uma grande fonte

de possibilidades profissionais para, principal-

mente, criar um senso de discernimento de

como, quando, onde e por que usar as ferra-

mentas digitais disponíveis para cada objetivo

planejado e sua aplicação no mercado da co-

municação, seja para a publicidade de produ-

tos, marcas ou serviços, de criação de estra-

05

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tégias de marketing digital ou mesmo para o

engajamento de pessoas em prol de uma cau-

sa ou movimento.

Para isso, esse módulo foi estruturado em 2

capítulos onde vamos entender os principais

elementos que sustentam a comunicação di-

gital do século XXI: 1. O passado não distante,

onde vamos refazer o trajeto da revolução di-

gital, desde a criação dos primeiros computa-

dores em rede até o fenômeno da tecnologia

móvel; 2. Da restrição ao acesso à informação,

onde veremos como em pouquíssimo tempo

temos acesso a mais informação em um dia

do que um homem do começo do século XX ti-

nha em toda sua vida, e como saber lidar com

tanto conteúdo, além de conhecer um pouco

mais sobre a profissão de Analista de Mídias

DIgitais. Por fim, esse módulo pretende então

refletir como essa visão holística do ambiente

digital (o conhecimento de seu passado para

entender o contexto do presente, saber lidar

com a linguagem do meio e com o excesso de

informação disponível para se tornar relevante

em um ambiente caótico e as técnicas e meto-

dologias de comunicação) pode contribuir para

a formação de um profissional completo e crí-

tico em um universo em eterna construção.

06

Page 6: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

Pela primeira vez em toda a história, uma rede (prática humana muito

antiga) permite a comunicação de muitos com

muitos, em um momento definido e em escala

global. (CHATFIELD 2012)

Mas o que experimentamos hoje como co-

municação digital é fruto de um processo em

constante evolução, desde sua concepção

como uma poderosa ferramenta militar restri-

ta aos governos até uma tecnologia acessível a

bilhões de pessoas.

Tudo começou nos anos 1940, com a criação de

enormes e complexas máquinas, do tamanho

de quarteirões, operadas por cientistas extre-

mamentes capacitados para cumprir tarefas

ainda mais complexas como a decodificação

de mensagens cifradas dos alemães durante a

Segunda Guerra Mundial, por exemplo.

Já na década de 50 do século XX, começaram

os primeiros experimentos para aquilo que

hoje chamamos de computadores, presentes

principalmente em universidades norte-ame-

ricanas e instituições militares. Ainda eram

máquinas enormes, operadas apenas por es-

pecialistas. Durante esse período ainda não

havia a ideia de ‘rede’ e seu funcionamento era

07

2.0

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Sala de operações do Electronic Numerical Integrator Analyzer and Computer (ENIAC) em 1943, um dos primeiros computadores.

Foto: Microsoft Encarta Encyclopedia Online

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basicamente por informações inseridas atra-

vés de comandos abstratos e as respostas que

não faziam sentido algum para quem não fosse

um cientista da computação.

Mas com o aumento da tensão da Guerra Fria,

onde dois blocos, politica e ideologicamen-

te antagônicos (Estados Unidos e União So-

viética), dominavam o cenário internacional,

percebeu-se que um eficaz controle e uso dos

meios de comunicação era uma ferramante

fundamental para a manutenção do status quo

de ambos os lados, ao mesmo tempo que havia

um temor mútuo de um ataque em suas bases

de informações, expondo conteúdos sigilosos

para o inimigo.

Uma forma de se prevenir de um possível ata-

que foi descentralizar a informação, a partir da

ideia de ‘rede descentralizada’ utilizando um

modelo de troca e compartilhamento de dados,

preservando sua integridade em caso de uma

guerra. O Pentágono, nos Estados Unidos, fo-

ram os primeiros a experimentar uma nova

tecnologia baseada em computadores chama-

da ARPANET, uma rede criada pela Agência de

Projetos Avançados em Pesquisa (ARPA em in-

glês) onde o objetivo era dividir as informações

sigilosas em ‘pacotes’ enviadas à diferentes

computadores que, quando conectados a par-

tir de uma chave específica, permitia a remon-

tagem da mensagem original.08

Mapa de distribuição de arquivos da ARPANET, 1971.

Foto: Atlas of Cyberspace

Page 8: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

Paralelamente às tensões da Guerra Fria e do

desenvolvimento de uma rede de computado-

res para compartilhamento de informações,

uma outra revolução começava a se desenro-

lar com a chegada dos microprocessadores,

o que permitiu a considerável diminuição do

tamanho das máquinas e na queda dos pre-

ços, possibilitando a chegada dos primeiros

computadores pessoais às casas de cidadãos

comuns e não apenas mais restrito aos labo-

ratórios de pesquisa, apesar da descrença da

própria indústria quanto à sua popularização.

Com o lançamento do primeiro computador

pessoal em 1971, ainda em forma de Kit (o pro-

cessador deveria ser ligado à uma televisão),

poucos esperavam que o mercado doméstico

fosse além de alguns aficionados por tecnolo-

gia. Porém, já no final da década de 70, novas

empresas de tecnologia para consumidores

finais como a Apple, Commodore e Tandy es-

tavam vendendo centenas de milhares de uni-

dades, iniciando então a chamada revolução

digital.

09Exemplos de estrutura de redes centralizada, descentralizada e distri-buída.

Kenbak-1, o primeiro computador pessoal, produzido em 1971.

Page 9: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

Como o crescimento do mercado doméstico

para computadores pessoais e a diminuição

da tensão entre os Estados Unidos e a URSS,

a chamada dètente ou coexistência pacífica, o

governo dos EUA permitiu que as universida-

des pudessem participar do desenvolvimento

de uma rede acadêmica e civil, dividindo a AR-

PANET em dois sistemas distintos: a MILNET,

rede específica para uso militar e a ARPANET,

que agora poderia ser usada para fins de pes-

quisa acadêmica. Essa descentralização mi-

litar da rede permitiu o seu desenvolvimento

em um ambiente livre, onde não só cientistas

e professores, mas alunos e amigos de alunos

pudessem participar desse processo de de-

senvolvimento de uma novo universo.

Os jovens da contracultura, envolvidos ideolo-

gicamente na difusão de uma informação livre,

começavam a se tornar empresários em um

ambiente extremamente fértil e para o empre-

ededorismo, rico culturalmente e tecnologica-

mente (o Vale do Silício, na Califórinia), foram

os grandes responsáveis pelo modelo de rede

que hoje conhecemos como Internet.

Ou seja, a descentralização do ambiente mili-

tar da tecnologia, o interesse do mercado in-

terno por computadores pessoais e, talvez o

elemento mais importante, o engajamento de

10

Steve Jobs, fundador da Apple e Bill Gates, fundador da Microsoft em foto de 1982.

Foto: George Lange/ Getty Images

Page 10: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

jovens pesquisadores e empresários, que den-

tro de um contexto de democratização do co-

nhecimento e na preservação de um espírito

de liberdade, pano de fundo da contracultura

utópica da época, criaram um fenômeno que

transcendeu as barreiras técnicas e mecânicas

da tecnologia. Se criou uma nova realidade de

interações entre as pessoas e um novo com-

portamento. Segundo o sociólogo espanhol

Manuel Castells, a Internet é, acima de tudo

uma criação cultural4 . A partir dessas obser-

vações podemos concluir então que a liberda-

de é um dos principais elementos da criação

da Internet.

Desde então, a Internet vem passando por evo-

luções em sua tecnologia de acesso em gran-

de velocidade. Desde pequenas microrrevolu-

ções como a criação do protocolo de Internet

(IP), que permitia que o tráfego de informação

fosse encaminhado de uma rede para a outra,

passando pela concepção, em 1992, do WWW,

protocolo que inaugurou uma Internet visual

através de páginas (antes a troca de informa-

ção era feitra apenas por códigos e linguagens

específicas) até a constante melhoria na expe-

riência de conexão, possibilitado pela evolução

tecnológica dos computadores e da infraestr-

tura que, de um desktop em casa ou um laptop

na mochila está sendo gradualmente substitu-

ído por um smartphone na mão ou um tablet

na mesa, ligados e conectados o tempo todo.

Em sua origem, fora do âmbito militar, a In-

ternet tem como elemento fundamental a tro-

ca, o compartilhamento e o fluxo contínuo de

informações pelo mundo todo. Hoje, todas as

tecnologias intelectuais presentes em nossa

vida - de palavras, imagens, videos a músicas,

textos, livros, etc, podem ser supridas por um

11

4 CASTELLS, Manuel: A Galáxia da Internet. PP.32

Page 11: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

único sistema integrado5 , o computador ou um

celular.

Mas essa radicalização do acesso à informação

que temos hoje é algo muito novo, mesmo em

unidade de tempo da Internet – que é sensivel-

mente mais rápida que o nosso tempo crono-

lógico - a rede passou por cerca de 5 fases de

evolução para chegar até onde estamos.

A primeira fase foi o que vimos no início do ca-

pítulo com a ARPANET, seu processo de des-

centralização militar, seu desenvolvimemto

civil, a difusão pelas universidades como uma

ferramenta de livre expressão de conheci-

mento, mas ainda muito restrita ao ambiente

acadêmico e necessitando conhecimentos de

informática avançados, mesmo que o fim não

seja apenas a troca de conteúdo científico. Sua

conexão dependia de mainframes e backbo-

nes, grandes infraestruturas mantidas pelo

governo que permitiam a conexão entre vários

computadores de redes distintas. Sua principal

característica nessa fases se resume a trocas

esporádicas de mensagens eletrônicas e leitu-

ras de fóruns técnicos, com baixa interativida-

de entre pessoas. Neste momento chamamos

de Fase ARPA.

Já o segundo momento veio com o barate-

amento e popularização dos computadores

12

Cientista manipulando um dos computadores de rede ARPA, 1969

Foto: prairiehill.org

5 CHATFIELD, Tom: Como viver na era digital. PP.24

Page 12: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

pessoais, em meados da década de 80. Nes-

se período, a infraestrutura de rede já estava

difundida para fora das universidades e já era

possível ter acesso à Internet domesticamen-

te.

Porém seu acesso dependia de um aparelho

externo chamado Modem e de uma linha tele-

fônica, o que tornava-se extremamente caro.

Normalmente se tinha apenas uma linha nas

casas e enquanto se acessava à internet, a li-

nha mantinha-se ocupada. Seu valor era co-

brado por minuto de ligação, o que tornava a

Internet um artigo de luxo. Normalmente as

navegações eram rápidas, pois cada minuto

contava. Durante esse período se inicia a na-

vegação via web, com elementos multimídias e

as trocas de mensagem eletrônicas se conso-

lidam, mas ainda com baixo nível de interativi-

dade em tempo real. Este período a chamamos

de Fase Modem.

Na terceira fase vemos um alargamento da

infraestrutura de navegação através de novas

tecnologias de transmissão de dados, como a

fibra ótica e rádio, o que aumentou conside-

ravelmente sua velocidade. Nesse período, o

acesso à rede não depende mais de uma linha

telefônica e o seu custo é fixo, através de uma

assinatura mensal. Com a liberdade de aces-

sar sem se preocupar com os minutos e com

uma qualidade e velocidade de conexão con-

13Terminal Teleguide, sistema de incorporação de linha telefônica ao computador pessoal, meados de 1980.

Foto: wikipedia.org

Page 13: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

sideravelmente maior, o comportamento do

usuário acompanha essas mudanças, onde ele

passa de espectador passivo para o produtor

de seus próprios conteúdos. É no final da dé-

cada de 1990 que surgem os prosumers, um

novo comportamento social onde o consumi-

dor e o produtor de conteúdo é muitas vezes

a mesma pessoa. Foi durante essa fase que

houve a explosão dos diários pessoais, os blo-

gs e video blogs, o início da interatividade entre

pessoas em tempo real através de programas

de mensagens instântaneas e uma maior ex-

periência na navegação, com sites recheados

de elementos multimídias.

É nesse período também que é lançado o em-

brião para a grande mudança de paradigma

nas comunições que são as redes sociais (ou

mídias sociais). Esse momento chamamos de

Fase Banda Larga.

A quarta fase tem uma característica muito-

clara de transformação profunda de hábitos e

comportamentos. É o momento onde os aplica-

tivos, pequenos programas para infinitas fun-

ções, se tornam protagonistas transformando

para sempre a forma como consumimos con-

14

ICQ, um dos primeiros softwares de bate-papo da década de 1990, pos-sível apenas após a difusão da internet em banda-larga.

Page 14: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

teúdo. Aplicativos, softwares e plataformas de-

terminam novos modelos de negócios criando

um grande mercado digital.

Agora se compra música oficialmente pela

Internet, decretando a morte do CD e, conse-

quentemente, de toda indústria musical. Nos-

sos aparelhos de telefone se transformam em

uma central de entretenimento e uma estação

de trabalho portátil, podendo ser acessado

qualquer tipo de conteúdo de qualquer lugar. É

o momento também da consolidação das Re-

des Sociais (ou Mídias Sociais) onde tudo que é

consumido é compartilhado, onde os grandes

movimentos de colaboração se fortalecem e a

interatividade e a personalização da experiên-

cia de navegação se radicaliza. Esse ponto é o

que chamamos da Fase da Internet dos Apli-

cativos.

Por último mas não por fim, pois a Internet é

um processo de evolução constante, vemos a

desmaterialização da rede. Antes ela estava

apenas nos computadores. Agora ela está em

todos os lugares: no carro, nos eletrodomésti-

cos, nos relógios, nas televisões, no transporte

público, na nuvem! Hoje ela está no ar.

Não concebemos mais o mundo sem a sua pre-

sença. Ao mesmo tempo que ela se desmate-

rializou ela é física, pois está presente em ob-

jetos do dia-a-dia. E é essencialmente social.

15

Ilustração com infinidades de aplicativos disponíveis para computado-res e smartphones. Meados de 2004.

Foto: unicos.cc

Page 15: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

Não se imagina uma Internet sem interações e

colaborações. É extremamente personalizada

mas maleável, pois é possível viver em vários

‘mundos’ distintos com avatares ou personali-

dades diferentes e, principalmente, é uma rede

que gerou uma superdependência. Tudo está

conectado: do caixa do banco à banca de revis-

ta, dos meios de pagamentos às transmissões

de TV a Cabo.

E todas nossas informações estão nelas, flutu-

ando em alguma nuvem mas sempre disponí-

vel. Hoje se consegue acessá-las de qualquer

aparelho conectado à rede e em qualquer can-

to do planeta.

E é também o fim da privacidade individual.

Com a extrema necessidade de ser social, esta

nova Internet exige que seus usuários digam

onde estão, com quem e o que estão fazendo.

É a Internet da Fase Nuvem.

Em resumo, percebemos que a história da re-

volução digital ainda está sendo criada, cami-

nhando para uma direção desconhecida mas

definitivamente sem volta. Evoluímos tecnolo-

gicamente mais em 20 anos do que toda a his-

tória da humanidade.

De todas as revoluções tecnológicas, a cha-

mada Terceira Revolução Industrial apresenta

16

Hoje todos os aparelhos estão concetados à internet, com acesso à conteúdos infinitos.

Ilustração: shutterstock

Page 16: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

uma característica única mas extremamente

transformadora: a horizontalização do conhe-

cimento e da informação.

Nunca tivemos tanto acesso a tantos conteú-

dos distintos. E, o que nos apresenta como um

benefício sem precedentes (e realmente é),

tem o seu lado obscuro, de criar uma geração

ansiosa e muitas vezes superficial. E esse é o

tema que vamos tratar no próximo capítulo. 17

Page 17: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

Durante muito tempo, o acesso à informação sempre foi privilégio de al-

guns, seja para o estabelecimento de um sis-

tema segregador, para a manutenção do poder

ou mesmo para controle das massas. Informa-

ção sempre foi um item caro. Quem a possuía

tinha uma grande mobilidade social enquanto

a grande massa desprovida de informação era

condenada a viver sem muitas perspectivas. O

século XX foi um período onde a humanidade

não tinha o poder de escolher que tipo de in-

formação receberia.

Foi a era da passividade, onde sentávamos

na frente da televisão ou do rádio e recebía-

mos todas as informações passivamente, sem

o poder de interagir, comentar, discordar ou

mesmo contribuir para fortalecer determinado

conteúdo. Grandes grupos de mídias decidiam

o que íamos ver e consumir, sem trocas ou in-

terações.

A partir do final do século XX, muito fomentado

pela geração da contracultura que pregava o

livre acesso à informação, começou se estabe-

lecer uma nova ordem mundial onde a Era da

passividade iria se tornar a Era da colaboração

e do compartilhamento. Com o surgimento da

Internet, era necessáro preenchê-la com con-

teúdo. Ao mesmo tempo que as mesmas gran-

des corporações que dominavam a mídia via

broadcast viram que essa nova rede possuia

um pontencial de propagação de informação

infinitamente mais rápida e eficaz do que os

tradicionais meios de comunicação, o cidadão

comum também realizou que esse novo canal

estava aberto e pronto para receber qualquer

tipo de conteúdo, independente da verba ou

estratégia de grandes empresas.

Mas, ao contrário dos processos tradicionais

de difusão de conteúdo (televisão, rádios, re-

vistas, jornais, que dependem de grandes

18

3.0

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Page 18: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

infraestruturas e um complexa rede de lo-

gística e distribuição), a Internet permitia um

alcance de audiência absurdamente maior a

partir de uma estrutura mínima para a criação

desse conteúdo.

Ou seja, o que era caro antes se tornou sen-

sivelmente mais barato, onde todos poderiam

concorrer de igual para igual por audiência em

um ambiente sem o controle da informação.

Durante muitos séculos, criar conteúdo sem-

pre foi caro e demorado. Antes da invenção da

Prensa de Gutenberg6 , em 1450, produzir um

livro demandava centenas de horas de produ-

ção por pessoas com habilidades muito espe-

cíficas, como os monges copistas, que ficam

anos trancados em monastérios literalmente

copiando livros inteiros para serem distribuí-

dos à elite intelectualizada. Mas, mesmo de-

pois da criação do processo de produção de li-

vros em massa por Gutemberg, tanto o volume

quanto o custo do papel ainda limitava o conte-

údo a ser reproduzido. O cinema e a fotografia,

por exemplo, dependiam de matérias-primas

caras, frágeis e raras. O registro em áudio se

limitava a quantidade de tempo disponível de

cada mídia física, seja o vinil ou o CD.

Hoje podemos ter centenas de livros dispo-

níveis em nossos computadores ou celulares

19

Sala de controle para trasnmissão de conteúdo via broadcast.

Ilustração: shutterstock

6 Johannes Gutenberg, inventor e gráfico alemão que introduziu a moderna forma de reprodução em massa de livros através do processo de im-pressão de tipos móveis (tipografia) no século XV

Page 19: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

sem a necessidade de lugares adequados para

armazená-los e estima-se que a cada minuto

é carregado no You Tube mais de 1 hora de ví-

deo7. A quantidade de informação disponível e

aberta que temos acesso é única na história da

humanidade, apesar de lidarmos com isso tão

corriqueiramente.

Como metáfora de uma Era saturada de infor-

mação podemos pensar que a edição de do-

mingo do New York Times, um dos maiores e

principais jornais do mundo e que custa algo

em torno de U$ 5 (R$ 10,00) - ou disponível

praticamente de graça na internet -, se equi-

vale à todo o conhecimento que um homem re-

ceberia durante toda sua vida no século XVIII.

Em 2008 se estimava que existia aproximada-

mente mais de um trilhão de páginas na Inter-

net. Em 2012, esse valor já deve estar na casa

dos muitos trilhões de páginas, o que alguns

afirmam haver mais páginas na rede do que

estrelas em nossa galáxia. Desde a invenção

da Prensa por Gutemberg no século XV, mais

de centenas de bilhões de livros foram publi-

cados durante esses quinhentos anos, o que

representa menos de um mês de conteúdo que

está sendo disponibilizado na Internet atual-

mente8.

20

7 Dados de 2011, Segundo Tom Chatfield (Como viver na Era Digital, PP. 26)8 CHATFIELD, Tom: Como viver na era digital. PP.26

Monge copista, início século XI.

Page 20: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

Com essa constatação que a disponibilidade de

informação hoje é infinitamente maior do que

podemos absorver, naturalmente uma enorme

angústia é gerada em uma sociedade cada vez

mais aniosa. É perfeitamente proporcional a

equação de quanto menos tempo temos dis-

ponível, mais informação é gerada na rede, o

que caracteriza uma nova geração de ‘genera-

listas’, com muito acesso à tudo mas com pou-

quissíma profundidade nos assuntos. É o que a

escritora norte-americana Linda Stone chama

de ‘atenção parcial contínua’ para caracterizar

a possibilidade de acompanhar informações

distintas, ao mesmo tempo, mas superficial-

mente.

Em um cenário como esse, onde a produção

de conteúdo é imensa, um profissional de co-

municação digital deve ter como elemento

fundamental em sua formação a ideia de filtro

ou curadoria. Saber filtrar e escolher correta-

mente os conteúdos, saber aplicá-los a cada

mídia específica e com sua linguagem própria

é uma tarefa básica no dia a dia desse profis-

sional.

Mas, o mais importante que é preciso saber

para lidar da melhor forma possível com esse

novo mundo em transformação é que o que

está acima de tudo – de informação, de pro-

cessos, de empresas, etc - são as experiências

humanas. É o que o pensador Tom Chatfild

deixa claro nessa passagem:

“Se quisermos prosperar juntos a elas (as mídias

digitais), a primeira lição que devemos aprender

é que só podemos ter esperança de compreendê-

-las de uma forma construtiva falando não da tec-

nologia de modo abstrato, mas das experiências

que ela proporciona.” (Chatfield 2012)

21

Page 21: Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual

Afinal, essa nova geração faz parte do que o es-

tudioso de Redes Sociais, Gil Giardelli, da hu-

manidade 5.0, composta por pessoas em plena

sinergia com a democracia absoluta existente

nas redes sociais.

Para Giardelli a Humanidade 1.0 era a agrícola,

de subexistência enquanto a 2.0 tinha o caráter

industrial, passando pela 3.0, com uma gran-

de veia tecnológica e a 4.0, uma humanidade

‘cyber-espiritual’, com uma conexão profunda

com as tecnologias. A 5.0 é uma mistura des-

sas todas, levando em conta que a ‘rede’ não é

mais um artigo para poucos mas uma ambien-

te aberto a todos. Que a rede não é mais o fim

e sim o meio.

Então, podemos deduzir que hoje não basta

apenas ter acesso a todo o tipo de informação

mas sim o que fazemos com ela, com a inter-

pretamos, como a tornamos relevante e, prin-

cipalmente, como comunicamos corretamen-

te para os nossos alvos, que antes de serem

consumidores, são seres-humanos da geração

5.0, com liberdade de questionamento, intera-

ção e participação nos processos de comuni-

cação das empresas ou marcas. Saber como

falar com essas pessoas é o mesmo que en-

tender a linguagem da rede: fundamental para

qualquer projeto de comunicação seja bem su-

cedido.

E, além desse discernimento básico do pro-

cesso evolutivo da Internet e da capacidade de

critério na curadoria de informação, é preci-

so entender também quais as ferramentas e

metodologias usadas para que essas informa-

ções ajudem na construção da imagem de uma

marca ou até mesmo na venda de um produto

ou serviço.

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