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Cultura e... Autor: Mara Godinho Professor da Disciplina: Profª Judith Pressler

Cultura e tribos urbanas - pdf

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Cultura e...

Autor: Mara Godinho

Professor da Disciplina: Profª Judith Pressler

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Escola Sec. Dr. João Carlos Celestino Gomes – AGEÍlhavo

Psicologia B – Ano letivo 2013/14 12 de fevereiro de 2014

Mara Godinho, 12ºC, nº14 2

O Homem tem características genéticas próprias. De muitas, podemos mencionar o

inacabamento biológico e a neotenia, o que implica, desde logo, a flexibilidade necessária para que,

pouco a pouco, a natureza inata do ser humano seja fortemente influenciada por uma natureza adquirida

culturalmente, no contacto social.

O Homem é uma construção social, todos sabemos que a espécie humana tem uma

predisposição natural para a sociabilidade. Assim, logo após o nascimento, o bebé construirá

mecanismos para interagir com o meio e, especificamente com o contexto social (sobretudo familiar).

Quer isto dizer que o indivíduo se encontra determinado (até certo ponto) pela genética.

Mas será que o que define os nossos comportamentos está simplesmente predeterminado? Ou

será a cultura a responsável por ditar as regras da nossa atuação no mundo? É que o nosso código

genético poderá ser melhorado ou reprimido pelo ambiente (moral, ético, político…) em que o indivíduo

se desenvolve.

A aquisição de comportamentos e capacidades próprias do ser humano só se verifica se as

crianças viverem em sociedades humanas, e mesmo a inteligência humana, que se pressupõe que seja

uma estrutura genética específica, resulta do contacto social. Assim, o Homem não é apenas um ser

social, mas também cultural. Aliás, mais do que a racionalidade, é a cultura que distingue o

comportamento humano do comportamento animal.

Como animal gregário, o ser humano vai estruturar a vida individual de acordo com a

organização social. Isto é, irá adquirir padrões culturais (conjunto de normas de comportamento próprias

de uma cultura ou grupo social), são eles que caracterizam culturas ou grupos sociais e que levam o

indivíduo a agir praticamente espontânea e inconscientemente, de acordo com determinadas regras. Ao

mesmo tempo que aquele que siga os padrões terá uma adaptação ao contexto social facilitada, aquele

que dos padrões se afaste, diversas pressões, sofrerá, por parte da sociedade.

O maior reflexo da globalização na sociedade talvez seja a tendência, cada vez maior, para a

uniformização e individualismo dos seus elementos. Surgem, então, as Tribos Urbanas, cujo conceito

remonta ao século XX, com o sociólogo Michel Maffesoli a referir-se à criação de pequenos grupos em

que os elementos se unem pelos princípios, ideais, gostos musicais ou estéticos que têm em comum e

que sentem grande vontade em expressar e tornar visíveis na adolescência. As tribos surgiram pelo

esforço de diferenciação dos jovens e cada tribo tem particularidades que a caraterizam e a distinguem

das restantes e do resto da sociedade.

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Como todas as coisas, a adesão a uma tribo tem vantagens e desvantagens: a pertença pode

tornar-se positiva na estruturação da identidade pessoal e lá podem “encontrar oportunidade de

legitimar os próprios sentimentos e visões do mundo, norteados pela intensa identificação,

compreensão, aceitação pelo grupo” (Marques, 1996). No entanto, “algumas tribos são temidas pelos

comportamentos violentos, habitualmente associados a uma baixa tolerância do “diferente”” – a tribo

foge do padrão cultural a que a sociedade está habituada, obtendo, deste modo, alguma reprovação da

sociedade atual, que usufrui agora, século XXI, de uma mente mais aberta (em épocas mais longínquas

as tribos eram alvo de um forte preconceito por parte da sociedade, sendo completamente excluídas e

marginalizadas). Por outro lado, o indivíduo integrante do pequeno grupo, obtendo proteção dos

restantes membros, começa ele também a sentir que a sua tribo é capaz de enfrentar o diferente,

demonstrando isso, muitas vezes, com recorrência à violência.

Uma questão que se poderá tornar pertinente é o porquê de o indivíduo, ainda que pertencendo a

uma sociedade que lhe impõe uma cultura, sentir necessidade de se agrupar numa tribo, quer isto dizer,

numa subcultura. Como qualquer matéria que constitui cultura surge pelas necessidades de uma

sociedade (necessidades básicas, de expressão artística, de relação com o transcendente ou divino, de

realização pessoal, de poder e reconhecimento social), também o indivíduo que adere a uma tribo sente

que não dispõe de algo que necessita na sociedade a que pertente, recorrendo, assim, a um pequeno

grupo de elementos que com ele se assemelhem e que, em grupo, o ajudem a solucionar a sua

necessidade (que não poderá ser muito diferente das necessidades da sociedade em geral, o que irá

mesmo divergir é o modo como irá saciar a(s) sua(s)). A sociedade pós-moderna (caraterizada por trazer

consigo todas as mudanças culturais e sociais, resultantes do triunfo do capitalismo) está dotada de toda

uma gama de complexidade que define novos padrões para um comportamento muito particular,

tornando necessário um “olhar ao avesso” que deixa de partir do individualismo, para começar a partir

de “um inconsciente que governa, e de uma necessidade de identificação”, determinada por “uma

metáfora de tribos e mais tribos, que se multiplicam na paisagem urbana do mundo jovem”.

Desta forma, penso poder dizer que, as tribos constituem, para os seus elementos, um importante

fator no processo de individuação, ajudando-o a criar uma identidade cultural, pois uma vez que o

“sujeito contemporâneo é movido pela condição de desamparo, a adequação a uma tribo torna-se uma

garantia da sobrevivência do próprio ego e uma maneira de lidar com o próprio desamparo”. Deste

modo, a tribo ajuda o indivíduo a identificar-se com uma determinada cultura, a cultura de pertença.

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Existem algumas particularidades em cada tribo que nos permitem identificá-la. São,

essencialmente, três os elementos cujo compartilhamento entre os membros vai permitir identificar os

“sistemas semióticos” que caraterizam os grupos: a imagem estética, as práticas de lazer e o estilo

musical. “A eficácia da aparência assume a função de identificar, de agrupar. Nas grandes cidades, em

que os sujeitos se tornam anônimos na multidão, torna-se possível ser visível, e reconhecido.”

(CASTRO,1998) Ao estudarmos uma tribo especificadamente, podemos compreender o todo que a

envolve e, partindo desta tribo, tirar algumas conclusões gerais.

Deste modo, atentemos na história da tribo Rapper (ou do hip-hop), nos seus códigos e

comportamentos, para que de seguida possamos fazer uma reflexão sumária de toda a temática que este

trabalho envolve:

Os rappers são habitualmente conhecidos como Mc (Mestre de Cerimónias, que é a pessoa que,

em concertos ou outros eventos relacionados com Hip-Hop, anima o ambiente), mais do que uma tribo

são uma cultura artística que teve início, durante a década de 70, nos subúrbios negros e latinos de Nova

Iorque. Estes subúrbios (verdadeiros guetos), enfrentavam diversos problemas de ordem social como

pobreza, violência, racismo, tráfico de drogas, carência de infraestruturas e de educação, entre outros.

Assim, era na rua que os jovens encontravam o seu único espaço de lazer, entrando quase sempre num

sistema de gangues que se confrontavam violentamente lutando pelo domínio territorial. Estes gangues

funcionam como um sistema opressor dentro das próprias periferias – quem integra algum, ou mesmo

quem está de fora, conhece os territórios e as regras impostas pelos gangues, devendo respeitá-los

rigidamente. Estes bairros eram, essencialmente, habitados por imigrantes do Caribe, vindos

principalmente da Jamaica, e por lá existiam festas de rua com equipamentos sonoros ou carros

chamados de Sound System. Dado o contexto, nasciam diferentes manifestações artísticas de rua, formas

próprias, dos jovens ligados àquele movimento, fazerem música, dança, poesia e pintura. Foi nestas

novas formas de arte que os gangues encontraram uma maneira de canalizar a violência em que viviam

submersas: passaram a frequentar as festas, a dançar break, a competir com passos de dança e rimas de

rap e não mais com armas. Essa foi a proposta de Afrika Bambaataa, considerado hoje o padrinho da

cultura hip-hop, criador do termo hip-hop.

A cultura hip-hop é formada pelos seguintes elementos: O rap (rhythm and poetry, é a expressão

musical-verbal da cultura), os graffiti (representam a arte plástica, expressa por desenhos coloridos, nas

ruas das cidades espalhadas pelo mundo) e o break (representa a dança).

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O estilo do rapper é composto, geralmente, por calças e blusas largas, bonés, bandanas, tênis

super largos, correntes chamativas e se possível com muitos brilhantes! Como pontos de encontro entre

os hip-hoppers encontramos as estações de metro, algumas ruas sem muito movimento e parques.

A ideologia que marca o hip-hop é a luta contra as injustiças políticas, económicas e sociais, -

quebrar o preconceito, reduzir os efeitos das desigualdades sociais e tentar acabar com o racismo -

mudar uma comunidade através da arte. O hip-hop é, assim, uma forma de reação aos conflitos sociais e

à violência sofrida pelas classes urbanas mais desfavorecidas da época e veio a revelar-se uma

importante ferramenta de integração social e de combate à violência.

Em Portugal (como noutros países), o movimento hip-hop ultrapassou barreiras raciais, sociais e

culturais, e ainda que tenha tido maior expressão nos bairros e zonas menos favorecidas, a sua música e

dança é apreciada pela generalidade dos jovens. No entanto, apesar de tudo o que envolve o conceito de

tribo, atualmente, o mais vulgar é que o jovem se aproprie apenas momentaneamente de alguns

elementos estéticos de algumas tribos, muitas vezes mesmo não se interessando pelos seus códigos ou

razões existenciais.

Concluindo, é verdade que, muitas vezes, comportamentos de risco são associados às tribos

podendo incluir consumo de substâncias ilícitas, violência, automutilação, promiscuidade sexual. No

entanto, “a integração do indivíduo num destes grupos pode não acarretar alarmismo”: como vimos no

caso do hip-hop, toda a sua ideologia é um caminho a seguir. O que não quer dizer que não existam hip-

hoppers que se apoderem da segurança que a tribo lhe confere para defender o mundo das drogas,

prostituição e armas. Tudo depende dos elementos e, consequentemente, das práticas do grupo.

As tribos constituem repercussões a nível da estruturação da personalidade do adolescente,

portanto, é necessário ter atenção e preocuparmo-nos quando observarmos que o “indivíduo inserido

[está a] perde[r] a identidade diante do grupo”. Porém, não podemos fechar os olhos aos benefícios

sociais que uma tribo urbana poderá conferir ao indivíduo e, principalmente, ao jovem que se encontra

em constante busca pelo seu espaço.

Para finalizar, sou da opinião de que apesar de o fenómeno das tribos urbanas ser extramente

interessante e dinâmico (estão sempre a surgir novas tribos), as mais recentes são efémeras pelo seu

cariz superficial, dado que dão apenas importância à questão estética e não apresentam uma ideologia

forte como a do hip-hop, por exemplo, que já existe há décadas e tem vindo a apaixonar gerações.

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Bibliografia/Netgrafia

o “A cultura como construção do indivíduo” (PowerPoint disponibilizado pela Professora

Judith na página do moodle da ESDJCCG)

o “As Tribos Urbanas, as de Ontem até às de Hoje”, de Helena Sofi a Martins de Sousa e

Paula Fonseca, in NASCER E CRESCER, revista do hospital de crianças maria pia, ano

2009, vol. XVIII, n.º 3

o “A sociedade pós-moderna e o fenómeno das tribos urbanas”, de Isabela Fonseca

Cardoza

o http://www.primeiroconceito.com.br/site/?p=1190

o http://grupo1-tribus-urbanas.wikispaces.com/Raperos+(Mc)

o http://triboshiphop.blogspot.pt/

o http://www.bocc.ubi.pt/pag/souza-rose-cultura-hip-hop.pdf

o https://www.google.pt/search?q=sub+culturas&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ei=yIX2

UsKkIuST0QWP9oHQBg&ved=0CAcQ_AUoAQ&biw=1280&bih=709#q=tribos+urba

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