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Página 1 de 12 PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO ONLINE Docentes: Antonio Quintas Mendes e Elena Maria Mallmann Artigo: Inteligência Coletiva Fonte: https://randrepereirampel7.files.wordpress.com/2014/03/image1.jpg Mestrandos: Claudio Rogerio do Nascimento Pinto Débora Ricardo Eliane Gonçalves Ciolfi Fevereiro 2015

INTELIGÊNCIA COLETIVA

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PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO ONLINE

Docentes: Antonio Quintas Mendes e Elena Maria Mallmann

Artigo: Inteligência Coletiva

Fonte: https://randrepereirampel7.files.wordpress.com/2014/03/image1.jpg

Mestrandos:

Claudio Rogerio do Nascimento Pinto

Débora Ricardo

Eliane Gonçalves Ciolfi

Fevereiro 2015

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Resumo: Este artigo é o resultado da reutilização do artigo realizado pelo grupo de

mestrandos Madalena Hoszko, Rossana Marinho, Rui Pereira e Yara Nunez, do Curso de

Mestrado Pedagogia Elearning da Universidade Aberta de Portugal, 7ª edição, e da análise do

livro Net Smart, de Howard Rheingold e outras fontes bibliográficas. Propõe uma análise

sobre o tema Inteligência coletiva, com uma inicial e breve descrição do contexto

histórico/antropológico da evolução dos processos colaborativos em nossa sociedade,

abordando, mais precisamente, a teoria da Inteligência Coletiva desenvolvida por Howard

Rheingold, concepções sobre comunidades virtuais, colaboração em massa e o conceito

de commons nessa perspectiva. Realiza uma reflexão sobre competências necessárias à

cooperação, indicando a necessidade do trabalho partilhado e a constituição de inteligências

coletivas como alternativas para a resolução de problemas da sociedade atual.

Palavras-chave: colaboração, commons, comunidades virtuais, cooperação, Howard

Rheingold, inteligência coletiva.

Introdução

No percurso evolucionista humano, o Homem deparou-se com um conjunto de limitações.

Os hominídeos eram lentos e desprovidos de garras, presas, ou mesmo asas, num ambiente

hostil onde a lei do mais forte predominava. De modo a superar estas dificuldades, os

hominídeos utilizaram a sua capacidade cerebral de processamento de informação e as

apetências sociais de modo a sobreviver.

Devido às condições em que evoluiu, o homem demonstrou uma aptidão inata para a

colaboração (instinto social) com seres da sua espécie, facilitando a sua

adaptação ao ambiente em que vive. O Homem afastou-se da autossuficiência e ao

envolver-se em processos colaborativos ampliou a chance de sucesso e tornou-se especialista

nas tarefas a desempenhar, valorando o seu produto através da articulação de potencialidades

conjuntas.

Graças a sua superior capacidade craniana (demonstrativa de um cérebro maior) e ao

seu raciocínio, o Homem desenvolveu uma cultura, definida como “comunicação simbólica,

aprendizagem por imitação (que requer prestar atenção aos outros), e metodologias

cooperativas como a dança e o ritual”, o que o distanciou de todas as outras espécies.

(Rheingold, 2012, p. 151).

A socialização humana se fortaleceu com o aparecimento da linguagem, pois agilizou a

homogeneização de comportamentos e atitudes. “O conjunto de invenções sociais e culturais

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humanas auto compôs o sistema de comunicação-cooperação-inovação que nos impeliu da

savana ao topo civilizacional, incluindo punição, linguagem, tecnologia, inteligência

individual, inovação, criação de acordos recíprocos, sistemas de prestígio e soluções de

coordenação.” (idem, p.151).

Ainda que o instinto biológico da socialização evoluísse geneticamente durante milhões

de anos, Rheingold salienta que a evolução das competências de cooperação esteve subjacente

ao desenvolvimento do sistema simbólico, que possibilitou a organização do indivíduo e do

grupo em torno de dinâmicas socioculturais, através da criação de instituições. Estas

instituições (como a cultura) aceleraram a transmutação da cooperação humana do nível

biológico para o cultural (Rheingold, 2012, p.151).

O aparecimento de uma comunicação elaborada permitiu ao Homem organizar ações

coletivas, dando-lhe a capacidade de construir civilizações. Nesta perspectiva, Rheingold

(2012) define o Homem como “supercooperador”, o que se pode traduzir em constantes

inovações que visam melhorar as capacidades humanas, por outras palavras, a cooperação e a

inovação mantém uma relação simbiótica na evolução humana.

A colaboração

Diferente de participar, colaborar busca cooperar com a rede, mais do que competir

(Rheingold, 2012). Aprender em grupo online é o chamado aprendizado colaborativo, o que

dá forma ao social (p.191). Rheingold (2012) aponta para algumas características que

envolvem a colaboração na internet, como a de que há uma variedade enorme de maneiras de

participar e de que as pessoas contribuem por razões diferentes (p. 192).

Atualmente, com as inovações técnicas, a colaboração atingiu níveis nunca antes

conquistados, tratando-se, por isso, de colaboração em massa.

Rheingold apresenta quatro entendimentos sobre as habilidades que se deve ter em conta

na introdução colaboração online: 1) a atenção é o pilar da colaboração social (prestar a

atenção no outro); 2) os humanos são supercolaborantes porque aprendemos a desenvolver

ferramentas, competências e métodos que nos permitem ultrapassar dilemas sociais; 3) as

instituições sociais inovadoras evoluem em conjunto com os meios de comunicação; 4)

cooperação recíproca.

É nessa perspectiva que atribuímos aqui à inteligência coletiva um potencial de uma

população à disponibilidade para a ação coletiva, salientando a disposição simultânea do

potencial de interação de um grupo ou comunidade e de seu respectivo ecossistema de ideias.

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Embora os meios digitais não assegurem, por si só, o acesso mais democrático à

informação, o fenômeno da Web 2.0 rompeu com os mecanismos tradicionais de transmissão

da informação, a qual pressupunha a existência do emissor e do receptor, onde a recepção

ocorre de maneira passiva, com a mensagem já tratada sob uma determinada ótica.

Diferentemente, em ambientes colaborativos da Web 2.0, a comunicação acontece de todos

para todos, não havendo apenas um pólo emissor e outro receptor, ao contrário, os usuários

passam a ter disponíveis informações originadas de variados pólos emissores e também

passam a construir suas representações, na medida em que contrapõem pontos de vista e

podem inserir as tags nas informações que emitem. A multiplicidade de culturas, línguas,

interpretações de mundo e outras, é que gera este saber coletivo, onde todos os indivíduos

podem colaborar com os seus repertórios individuais para a construção do laço social baseado

no saber, na perspectiva de revitalizar as singularidades e não somente de fundi-las, como se a

inteligência coletiva fosse tão somente uma somatória de informações isoladas.

Howard Rheingold, por exemplo, narra em seu livro, Smart Mobs, o movimento social

nas Filipinas, que depôs o então presidente Estrada, sendo resultado da inteligência afluente

da população. No dia do julgamento de impeachment do presidente, mensagens enviadas

através de celulares conseguiram mobilizar em questão de minutos mais de um milhão de

cidadãos diante do Congresso. Traduzindo na percepção pública da força de uma ideia capaz

de mobilizar a tantos de forma consciente, permitindo ao coletivo lidar com o imprevisto,

gerando uma inteligência afluente e com isso uma flexibilidade de ação coletiva onde os

indivíduos são convocados a agir, decidir, adotar comportamentos não apenas em função de si

mesmos, mas também conjuntamente de um determinado grupo.

Para Pierre Lévy, "O ciberespaço, dispositivo de comunicação interativo e comunitário,

apresenta-se justamente como um dos instrumentos privilegiados da inteligência coletiva."

(Lévy, 2009. p. 29).

Independentemente dos motivos que levam à colaboração online, se por individualismo

(Rheingold, 2012, p.211) ou vontade de aprender aos pares, esta prática é uma forma de

aprendizagem que vem crescendo nos últimos anos.

Comunidades Virtuais e Inteligência Coletiva

Com a vivência em sociedade, é normal que surjam dilemas sociais, ou seja, conflitos

entre os interesses individuais e as ações coletivas. Existe uma assimetria entre a dimensão

do indivíduo, com suas preferências, interesses, inteligência e a dimensão do coletivo, onde os

indivíduos precisam agir e tomar decisões em conjunto. Indivíduos devem negociar suas

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preferências pessoais no momento em que estão em grupo. As novas tecnologias facilitaram a

constituição de grupos, com características e interesses em comum, ligados por vínculos não

formalizados, constituindo as primeiras comunidades virtuais.

Rheingold utiliza o conceito de bens coletivos para identificar quais agregados na rede

poderiam ser classificados como comunidades, o que seria produzido por grupos de

indivíduos que cooperam por reconhecerem que podem ganhar através de sua união. Dessa

forma, ele diz que identificar os bens coletivos de um grupo é uma maneira de reconhecê-lo

como uma comunidade. (Rheingold, 1996, p.26).

O autor, em seu livro "Comunidade Virtual" (1996), comenta que as comunidades

virtuais são lugares onde as pessoas se encontram e um meio para se atingir diversos fins e

constatou que havia uma relação mais profunda nessas interações, motivado, em especial, pela

questão do número excessivo de informações. Um dos problemas da rede, segundo o autor,

era o da "oferta demasiada de informação e poucos filtros efetivos passíveis de reterem os

dados essenciais, úteis e do interesse de cada um" (Rheingold, 1996, cap.4).

O termo Comunidade Virtual é atribuído a Howard Rheingold que a define como:

“agregados sociais surgidos na rede, quando os intervenientes de um debate levam por diante

em número e sentimento suficientes para formarem teias de relações pessoais no

ciberespaço”. (Rheingold, 1994:18).

Enquanto programadores buscavam desenvolver agentes inteligentes que realizassem

busca e filtragem de informações que se acumulavam na rede, Rheingold detectava a

existência de "contratos sociais entre grupos humanos - imensamente mais sofisticados,

embora informais - que nos permitem agir como agentes inteligentes uns para os outros"

(p.82). Daí iniciou-se o conceito de mente coletiva ou de inteligência coletiva. A questão não

era mais a resolução de problemas em conjunto, mas trabalhar em grupo, em benefício de

cada indivíduo.

Segundo Rheingold (1996), as comunidades virtuais são constituídas por diversos

profissionais que lidam diretamente com o conhecimento, fornecendo informação específica,

com opinião especializada, funcionando com uma enciclopédia viva, dinâmica, auxiliando os

membros da comunidade a lidar com a abundância de informações e com a filtragem das

mesmas. Segundo o mesmo autor, são "verdadeiros filtros humanos inteligentes".

“As mentes coletivas populares e seu impacto no mundo material podem tornar-se uma

das questões tecnológicas, na verdade a ideia de uma mente ou uma inteligência coletiva

mediada por computadores não chega a ser uma novidade”. Em 1976, o pesquisador

americano Murray Turoff, idealizador do sistema de intercâmbio de informação eletrônica

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(EIES), considerado o ponto de partida das atuais comunidades online, prenunciava que "a

conferência por computador pode fornecer aos grupos humanos uma forma de exercitarem a

capacidade de ‘inteligência coletiva’ (...) um grupo bem sucedido exibirá um grau de

inteligência maior em relação a qualquer um de seus membros" (Rheingold, 1996, cap. 4).

As Comunidades Virtuais proporcionam a ativação da Inteligência Coletiva a partir da

dinâmica de redes, na qual cada participante é um ponto e todos os pontos são fundamentais

para que a rede se constitua.

O interessante nas possibilidades que se abrem com a emergência de uma nova

inteligência é que se trata de uma inteligência coletiva, ou seja, estamos na direção de uma

potencialização da sensibilidade, da percepção, do pensamento, da imaginação propiciadas

por novos dispositivos, mídias e ferramentas que permitem novas formas de cooperação e

coordenação em tempo real.

Sempre houve alguma forma de inteligência coletiva, na medida em que o homem

é um ser social, se pensarmos em nossa rotina e em nossos círculos de relações diárias, vemos

que fazemos parte de todo tipo de Inteligência Coletiva, seja no nível familiar, profissional,

pessoal ou acadêmico. Tomamos como exemplo a Wikipédia, que é um produto de

inteligência coletiva, culturalmente evoluída, que integra grandes e pequenos contributos de

muitos, resolve disputas e mantém procedimentos de auto reabilitação e de proteção contra

vandalismos. Com o conhecimento de todos, a ciência, uma das mais importantes formas de

inteligência positiva, pode ser construída através da colaboração em massa.

Muitas vezes dizemos que determinado ponto de vista sobre um assunto foi elaborado por

nós, quando na verdade ele é fruto de nossa convivência com outras pessoas que

compartilham da mesma opinião. Haverá alguma ideia de autoria exclusiva ou todas elas são

reconfigurações daquilo que já existe e fruto de dialogismos com textos lidos, ouvidos,

conversas, reflexões com nossos eus?

Mussoi et al (2007) fazem referência aos elementos citados por Ralha (2000), que

caracterizam a comunidade virtual: o sentimento de pertencimento, a territorialidade, a

permanência, a ligação entre o sentimento de comunidade, caráter corporativo e a emergência

de um projeto comum, e a existência de formas próprias de comunicação. Estes elementos

estabelecem os vínculos entre os membros das comunidades, tornando-as "habitadas" e cheias

de sentido, por enquanto os conteúdos, os objetivos, as simbologias e as linguagens utilizadas

em cada uma delas despertam nos indivíduos o sentimento de pertencimento.

As autoras caracterizam ainda as comunidades virtuais de aprendizagem como espaços

onde os indivíduos realizam comunicações interativas e a aprendizagem acontece de modo

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cooperativo, com base em interesses mútuos, mediada pelos meios eletrônicos de

comunicação. Nos ambientes nos quais ocorrem trocas os líderes ou moderadores têm o papel

de "animador de comunidades", visando desenvolver de forma mais ampla o potencial de

comunicação cooperativa das redes e mediar os interesses presentes nas comunidades, para

ajudar a satisfazer as necessidades dos seus membros.

Assim, as comunidades virtuais, são espaços virtuais em que são realizadas interações

entre pessoas que possuem interesses em comum, partilham emoções, conhecimentos, fazem

amizades duradouras ou não, solicitam e fornecem ajuda. É um local onde se conhecem

pessoas novas, mesmo que nunca se encontrem fisicamente, participa-se de conferências

sobre diversos assuntos, sejam eles públicos ou privados. Além disso, nas comunidades

virtuais as pessoas podem encontrar grupos de referências e até mesmo criar e/ou participar de

grandes causas de bem público.

Howard Rheingold participou da WELL, que era um sistema de teleconferência, criado

em 1985 no EUA em que as pessoas poderiam se comunicar tanto particular (correio

eletrônico) quanto publicamente (conferência) através de seus computadores, em qualquer

lugar do planeta. Quando ele estava na WELL, a rede começou a crescer de forma assustadora

e os computadores começaram a ficar lentos, uma mensagem digitada demorava muito para

aparecer na tela. A comunidade estava unida e percebeu o que estava acontecendo. Então, os

integrantes se uniram e acumularam dinheiro suficiente para trocar o computador da sede e a

rede começou a funcionar mais rapidamente, além de adquirir novos membros.

Rheingold também nos deixa claro que os limites devem ser respeitados sempre e as

pessoas precisam ficar atentas às armadilhas que podem encontrar na rede, já que: [...] as

comunicações mediadas por computador originam novas formas de enganar o próximo, e as

fraudes de identidade mais óbvias só desaparecerão quando um número suficiente de utentes

aprender a usar o meio com espírito crítico. (Rheingold, 1996, p. 44).

Considerando que essa facilidade de comunicações e informações podem propiciar

também atitudes inadequadas na rede, torna-se necessário abordar também a questão do

Commons.

Um pouco sobre Commons

Silveira (2008), no artigo O conceito de commons na cibercultura, faz uma revisão das

principais interpretações deste conceito, comparando as visões liberais e aquelas de linhagem

marxista. Nesta abordagem é possível perceber uma relação entre as discussões em torno da

inteligência coletiva e o conceito de commons, tendo em vista as definições de commons

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apontarem para traduções como "(...) comum, produção ou espaço comum. Seu significado

também comporta a noção de público em oposição ao que é privado. Seu uso evoca ainda a

ideia de algo que é feito por todos ou por coletivos e comunidades. Os commons pretendem

expressar recursos que são comuns. Bens públicos são commons." (Silveira, 2008, p. 49) .

Em seu artigo, Silveira delineia o contexto em que os commons estão inseridos, ao

demonstrar que um novo contexto informacional se constituiu com a cibercultura, organizado

a partir da popularização da disponibilidade de recursos de mídia, do estabelecimento de

novos comportamentos e da produção de novos estilos de comunicação e de arte, construídos

e reproduzidos através das redes de comunicação, tendo por base tecnologias e procedimentos

que viabilizam processos massivos de colaboração. Este contexto da cibercultura tem como

princípio a remixagem, ou seja, a recombinação de conteúdos, incluindo-se o plágio.

As definições de commons presentes no artigo são apontadas de acordo com as visões de

Benkler, de Lessig e de Hardt e Negri. Estabelece-se uma análise conceitual das concepções

destes autores, considerando-se não somente as descrições por eles apresentadas, mas os

posicionamentos político ideológicos dos mesmos quanto à questão dos direitos autorais e,

por conseguinte, das motivações de cada autor para defender a flexibilidade das licenças de

criação e reprodução de conteúdos.

O primeiro autor analisado por Silveira é Benkler, o qual compreende ter havido e estar se

consolidando uma rede de troca de informações digitais que tem proporcionado a

descentralização do rígido controle da comunicação de massa. Para Benkler, a constituição

dessa rede representa uma batalha entre os meios tradicionais de comunicação de massa, que

promovem um rígido controle da informação, e a liberdade de criação, e da rede emerge a

produção social colaborativa fundada na liberdade individual e que "está colaborando para

ampliar o não-proprietário" (Silveira, 2008, p.52), em contraposição à racionalidade do

mercado da era industrial e da regulação autoritária do Estado.

Um dos destaques no debate sobre direito autoral é Lessig, um professor de Direito de

linha liberal e considerado um dos principais líderes dos commons. Silveira indica que os

debates sobre direito à propriedade emergiram fundamentalmente dos pensadores do direito

ao invés da cultura e da comunicação, dado os conflitos judiciais ocorrerem de modo

efervescente no mercado. Por conta da sua formação em Direito e da sua linhagem liberal,

Lessig destaca-se nesta discussão acerca do direito autoral, sem, entretanto atacar o direito

privado; sua principal preocupação reside na defesa da liberdade e da criatividade artística e

cultural, pois este pensador compreende que a super-regulação enrijece os processos criativos

e a inovação, desperdiçando as possibilidades da criatividade democrática contidas

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potencialmente nas tecnologias digitais. Nessa perspectiva, Lessig idealizou um modelo mais

flexível de licenciamento de obras artísticas e bens culturais, o Creative Commons.

A perspectiva de construção do commons também é analisada em conformidade com o

pensamento de Hardt e Negri. Pensadores do campo marxista propõem o common (não o

commons) enquanto construção e sinalizam que a colaboração e a cooperação necessárias para

esta construção representam transformações no mundo do trabalho, rupturas na estrutura do

capitalismo, o que indica, segundo esta análise, o surgimento de um capitalismo cognitivo,

onde a lógica fordista da reprodução dá lugar à lógica da inovação. Mas, na perspectiva

de Hardt e Negri, esta inovação não seria determinada pelos interesses e sim pela emergência

de um fazer comum das multidões, uma construção possível pela expressão das

singularidades, ou seja, as multidões, nesse sentido, não têm o caráter de povo ou de massa,

significando, dado o nomadismo existente na rede, uma superação da lógica mercadológica do

capitalismo e deste sistema em si.

A Internet como elemento potencializador da inteligência coletiva

A internet é um dos exemplos mais característicos de cooperação, onde diferentes

especialistas contribuem para uma visão do conhecimento, que promove a partilha à

acessibilidade e a comunicação entre usuários e informação, sendo conhecida como um

fenômeno de colaboração em massa. A combinação desta arquitetura de participação com

normas sociais como confiança partilha e reciprocidade veiculou a realização de tarefas

conjuntas, de forma inovadora. (O´Reilly).

A internet veiculou o uso das potencialidades do computador, quebrando as fronteiras do

pensamento individual. Não é fácil pensar no comportamento humano, hoje em dia, sem

interpretar a influência da colaboração em massa. Ainda que em grande parte a cultura seja

veiculada por instituições tradicionais, e esta forma de colaboração seja relativamente recente,

o utilizador digital deveria saber como funciona a utilização das ferramentas (sociais). O

surgimento da Web 2.0 permite que sejamos incluídos na inteligência coletiva da web. As

competências digitais e ferramentas que as capacitam fazem parte duma visão global sobre o

ser humano, que assume esta apropriação de poder conjunto, através da procura de soluções

sustentáveis e cooperativas. Pensar sobre as interdependências potencia a visão sistêmica

essencial à sobrevivência sustentável de espécie.

À medida que a tecnologia e o desenvolvimento da Web foram acontecendo, foram

surgindo novas arquiteturas colaborativas, onde sites escritos manualmente em linguagem

HTML passaram a conviver com programas que oferecem recursos de escrita

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hipertextual. Surgiram os blogs, plataformas wikis, redes sociais, sites para troca de imagens

e exibição de vídeos, etc.

Uma forma de colaboração em massa em que se efetua a união de diferentes

esforços/contribuições onde cada participante/voluntário pode contribuir através duma

multiplicidade de formas, realizada pela distribuição de tarefas em prol dum objetivo

comum é o crowdsourcing. O poder multifacetado do crowdsourcing redunda da procura de

soluções sustentáveis para problemas massivos, veiculada pela organização de ações,

distribuição de tarefas, aos voluntários Online, que se coaduna numa agregação coletiva de

esforços. Tal como a inteligência coletiva, o crowdsourcing está a transformar/influenciar

diferentes campos (Rheingold, 2012, p.168).

Competências

Em função do emaranhado de informações e interconexões existentes na Web, dada a sua

característica de comunicação horizontal, surge a necessidade de os profissionais serem

preparados para atuar nesta nova realidade comunicacional, tornando-se "aptos a administrar

conflitos, proporcionar encontros e organizar a memória dos coletivos inteligentes, a fim de

que seja recuperada de maneira eficiente." (Bembem & Costa, 2013. p. 146).

Pierre Lévy vê a inteligência coletiva como um agregador de competências,

entendimentos e conhecimentos. Lévy argumenta que uma nova arquitetura coletiva de poder

está a emergir no ciberespaço. Esta dinâmica alimenta-se das capacidades de grupos/pessoas

para fabricar conhecimentos (cibercultura), colaborar na pesquisa, no debate e interpretação,

mobilizada através dum processo colaborativo que aperfeiçoa a sua visão de mundo. A

inteligência coletiva na Web é amplificada pela colaboração em massa, veiculada pelos média

e vinculada à dinâmica da rede (sem hierarquia de poder), permitindo assimilar as pequenas

contribuições, dos múltiplos participantes, em grandes repositórios de conhecimento. No

ciberespaço, outro nível de inteligência coletiva emerge. O ciberespaço e a cibercultura

alteraram as formas de socialização, de transmissão e de aquisição de saberes. A

conectividade permitida pelo ciberespaço trouxe o compartilhamento de ideias e a construção

de conhecimento em rede.

A liberação do pólo de emissão, o princípio da conexão em rede e a reconfiguração de

formatos midiáticos e práticas sociais favorecem a emergência da Inteligência Coletiva, que

pode ser percebida em Comunidades Virtuais. A Inteligência Coletiva no ciberespaço, na

verdade, potencializa uma situação já existente: conceitos e ideias circulam entre nós e é

difícil apontar a quem pertencem.

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O processo de inteligência coletiva evidencia o desenvolvimento de novas competências,

sendo essencial criar sinergias entre a gestão do conhecimento pessoal e coletivo. Assim, é

imprescindível associar esforços na procura de fontes de informação, assim como

filtrar, selecionar e categorizar informação (curadoria). Decidir qual a informação a reter

– de forma a podermos partilhar o conhecimento pessoal em grupo/comunidade através de

ferramentas sociais (bookmarking, blog, twitter).

Devemos atribuir valor à informação que encontramos, ao acrescentar a nossa opinião

crítica.

As competências associadas ao processo colaborativo e à curadoria são essenciais à

Inteligência coletiva. A análise da obtenção de sucesso, no processo de inteligência coletiva,

não apresenta uma correlação linear com os níveis de inteligência individual (QI), mas com

competências sociais e comunicacionais e com a diversidade do grupo.

Alguns aspectos podem potenciar este processo: encorajar a conversação casual, a diversidade

do grupo, prática de dinâmicas colaborativas e a facilitação de contribuições.

Conclusão

Pensar em soluções isoladas, fragmentadas, significa a inversão dos pilares que sustentam

a produção do conhecimento hoje.

Rheingold utiliza a metáfora de fumantes passivos para sinalizar que, embora os adultos

não percebam, suas formas de utilizar as mídias sociais e a tecnologia também modelam o

comportamento de crianças e jovens. Nesse sentido, os mais velhos devem aprender a utilizar

as tecnologias de forma correta para ajudar as novas gerações a viver a cibercultura de

maneira inteligente, humana e acima de tudo, consciente.

Muitos pesquisadores dizem que uma inteligência coletiva global está longe de ser

realizada, por conta ainda de muitas pesquisas realizadas que mostram que o individualismo

ainda impera, mas que, com a possibilidade muito maior de formarmos comunidades e

desenvolvermos competências necessárias, aos poucos, o coletivo vai ocupando um maior

espaço neste mundo conectado chamado ciberespaço.

Enfim, quando utilizada de forma consciente e construtiva, as comunidades virtuais

podem servir tanto para soluções de problemas específicos, visto que podem ser formadas por

diversos membros com diferentes tipos de conhecimento, quanto para filtrar a quantidade

enorme de informações que permeiam o ciberespaço. Elas podem trazer para o grupo

informações realmente importantes, fomentar discussões e buscar soluções sobre um

determinado assunto.

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Referências bibliográficas:

Bembem, A.H.C. & Costa, P.L.V.A.(2013). Inteligência coletiva: um olhar sobre a produção

de Pierre Lévy. Artigo disponível em: http://www.scielo.br/pdf/pci/v18n4/10.pdf. Acessado

em: 09 de janeiro de 2015.

Costa, R. (2005). Por um novo conceito de comunidade: redes sociais, comunidades pessoais

e inteligência coletiva. Interface Comunic, Saúde, Educ., v.9, n.17. Disponível

em http://www.scielo.br/pdf/icse/v9n17/v9n17a03

Lévy, P. (2009). Cibercultura. São Paulo: Editora 34.

Rheingold, H. (1996). Comunidade Virtual. Lisboa: Gradiva.

Rheingold, H. (2002). Mobs Inteligentes: A Próxima Revolução social . Basic Books

Rheingold, H. (2012). Net Smart: How to Thrive Online. MIT Press.

http://www.abciber.org.br/simposio2014/anais/GTs/carolina_campos_rodeghiero_79.pdf

http://grupo-ecausp.com/digicorp/monografiasTurma1/monografia_ana_maria.pdf

http://www.sapientia.pucsp.br/tde_arquivos/33/TDE-2008-09-05T06:13:52Z-

6326/Publico/Roger%20Pascoal.pdf

Vídeos:

https://www.youtube.com/watch?v=zMtDr1vfNgQ

https://www.youtube.com/watch?v=g9Pm0hu8KGs

https://www.youtube.com/watch?v=GAcM3cntJGo

https://www.youtube.com/watch?v=8kCV4EEy2IE