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Camões… Lírico
da medida velha … ao
dolce stil nuovo
Renascimento em síntese:
Características gerais: * Racionalidade * Rigor Científico * Dignidade do Ser Humano * Ideal Humanista * Reutilização das artes greco-romanas
a) Racionalismo – a razão é o único caminho para se chegar ao conhecimento.
b) Experimentalismo – todo o conhecimento deverá ser demonstrado racionalmente.
c) Antropocentrismo – colocava o homem como a suprema criação de Deus e como o centro do universo.
d) Humanismo – glorificação do homem e da natureza humana, em contraposição ao divino e ao sobrenatural.
e) Classicismo - movimento cultural que valoriza e recupera os elementos artísticos da cultura clássica (greco-romana). Ocorreu nas artes plásticas, teatro e literatura, nos séculos XIV ao XVI.
A lírica tradicional também identificada com a medida velha.
- Revela grande influência da lírica trovadoresca, quer no que diz respeito à forma,
quer no que diz respeito ao conteúdo;
- Uso da redondilha – utilização de versos de cinco (menor) e sete (maior)sílabas
métricas;
- Algumas dessas composições são por exemplo vilancetes e cantigas;
. vilancete – composição com um mote de dois ou três versos e uma ou mais voltas
ou glosas de sete versos; o último verso das voltas repete, com ou sem variantes o
último verso do mote;
. cantiga - composição com um mote de quatro ou cinco versos e uma ou mais voltas
ou glosas de oito versos; o último verso das voltas repete, com ou sem variantes o
último verso do mote;
. Endechas ou Trovas – número variável de estrofes, frequentemente quadras ou
oitavas
. Esparsa – composição de uma estrofe só / entre oito e dezasseis versos
- Ambiente cortesão;
- Arte de ser galante; elogio; mesura; amor cortês;
- Inspiração amorosa predominante; os queixumes do coração resultantes da
saudade, da distância, da coita/sofrimento de amor ; a morte de/por amor; submissão
amorosa; cativo do amor perante a beleza sobrenatural da amada;
- Inspiração de ocasião entre o jocoso e o trivial; as trivialidades do dia-a-dia;
- Ambiente pastoril; o mar; a fonte, etc. – o Bucolismo.
A lírica de corrente renascentista,
também identificada com a medida nova e o dolce stil nuovo
- A maioria das composições adotam os géneros líricos herdados da estética clássica: o
soneto, a canção, terceto, a ode, a elegia, a écloga;
- Revela as grandes influências de Virgílio, Ovídio, Horácio e Petrarca, Neoplatonismo;
- Influência da poesia provençal e do romance cortês presente na lírica de inspiração
tradicional:
. a mulher como ser superior, quase divina e de beleza inefável; idealização da
mulher;
. atitude de reverência perante a amada, mantendo o sentido da distância que os
separa; platonismo;
. a morte de/por amor.
- Análise psicológica de todo o processo, dos seus impulsos contraditórios e a
manifestação de desejos opostos;
- O temperamento ardente e apaixonado do poeta;
- O amor: desde uma abordagem superficial a uma abordagem intensa e trágica;
- O amor platónico; conflito entre o amor puro/espiritual e o amor sensual/carnal;
- Amor ideal – exclui a sensualidade e é concebido como uma contemplação espiritual.
As contradições que este amor acarreta faz parte de um processo de purificação.
- Desconcerto sentimental; sentimento de perda; travo de melancolia; saudade;
- Consciência do pecado;
- O ideal de mulher – cabelos loiros, pele branca, olhos claros; alegria grave, harmonia
pura e exata, o gesto sereno; a mulher amada é um ideal de beleza e perfeição;
- Petrarquismo: temas de Petrarca – a mulher amada, o amor e os seus efeitos, os
conflitos interiores do sujeito, visão subjetiva da natureza.
- Neoplatonismo – perceção da realidade através de dois mundos ( sensível e inteligível)
- Por vezes não segue este modelo e aparecem a sensualidade e descrições de mulher que
se afastam do modelo.
- A natureza como confidente e espelho do estado de espírito do poeta;
- Animização da natureza;
- Locus amoenus – natureza harmoniosa, serena, luminosa, alegre, cristalina,
transparente;
- Referências à mitologia pagã: mitologia grega e romana;
- As circunstâncias da realidade dramática pessoal do poeta;
- A contínua mudança, o destino e o desconcerto do mundo.
- Soneto – duas quadras dois tercetos; decassílabos; esquema rimático abba abbacdc dcd/ou cde cde;
- Canção – série de estrofes com número regular de versos, com uma estrofe mais pequena;
- Ode – Louvor feitos nacionais, a vida campesina, a celebrar o amor e a vida, etc.;
- Elegia – Exprimem sentimentos de tristeza;
- Écloga – intranquilidade e desassossego aliada ao bucolismo;
- Oitava – poemas habitualmente endereçados a individualidades. Estrofe de oito versos decassilábicos, esquema rimático abababcc.
Análise
Medida velha
Verdes são os campos
da cor do limão
assim são os olhos
do meu coração.
Aquela cativa que me tem cativo,Porque nela vivo
Já não quer que viva.
Se Helena apartar Do campo seus olhos,Nascerão abrolhos
Análise de composições poéticas - A influência tradicional- A medida velha Quem ora soubesse
Onde o amor nasce,
Que o semeasse.
Vós, Senhora, tudo tendes,senão que tendes os olhos verdes.
MOTE ALHEIOVós, Senhora, tudo tendes,senão que tendes os olhos verdes.
Dotou em vós Naturezao sumo da perfeiçãoque, o que em vós é senão,é em outras gentileza;o verde não se despreza,que, agora que vós o tendes,são belos os olhos verdes.
Ouro e azul é a milhorcor por que a gente se perde;mas a graça desse verdetira a graça a toda a cor.Fica agora sendo a flora cor que nos olhos tendes,porque são vossos... e verdes!
Análise formalVilancete: mote alheio de dois versosRedondilha maior – 7 silabas métricasDuas voltasRima: abbaacc deeddcc
O sujeito poético elogia a beleza da amada, referindo que ela é perfeita, no entanto refere que ela tem os olhos verdes e isso é um “senão”, segundo o mote alheio que está na base deste vilancete.Se há alguns que desprezam os olhos verdes, agora não há razão para tal, uma vez que ela tem os olhos verdes e isso não pode ser defeito.
A maioria das pessoas acredita que os olhos azuis são os mais belos.O sujeito poético faz um trocadilho com a “graça” do verde, dizendo que a “graça”, ou seja a beleza do verde, rouba a beleza a todas as outras cores.
MOTE ALHEIOVós, Senhora, tudo tendes,senão que tendes os olhos verdes.
Dotou em vós Naturezao sumo da perfeiçãoque, o que em vós é senão,é em outras gentileza;o verde não se despreza,que, agora que vós o tendes,são belos os olhos verdes.
Ouro e azul é a milhorcor por que a gente se perde;mas a graça desse verdetira a graça a toda a cor.Fica agora sendo a flora cor que nos olhos tendes,porque são vossos... e verdes!
Traços comuns na temática camoniana:
Idealização da mulherÊnfase no olhar – espelho da almaElogio e a galanteria
O segundo verso do mote constitui a questão a ser desenvolvida ao longo do vilancete e encontra continuidade nos últimos versos das voltas. O sujeito poético conclui que os olhos verdes são belos, porque são os da amada.
Mote:
Verdes são os campos
da cor do limão
assim são os olhos
do meu coração.
Voltas:
Campo que te estendes
com verdura bela;
ovelhas que nela
vosso pasto tendes:
d’ervas vos mantendes
que traz o Verão,
e eu das lembranças
do meu coração.
Gado que paceis,
comcontentamento
vosso mantimento
não o entendeis;
isso que comeis
não são ervas , não:
São graças dos olhos
Do meu coração.
Mote alheio
Verdes são os campos
da cor do limão
assim são os olhos
do meu coração.
O sujeito poético começa por apresentar o ponto de partida para a criação poética: A semelhança entre a cor dos olhos da amada e a cor dos campos/ da Natureza.
Estabelece uma comparação entre ambos.Os olhos representam a amada no seu todo(a parte pelo todo – sinédoque)
Está já presente a devoção amorosa e os elementos da Natureza.Destaca-se já a banalidade e trivialidade da inspiração poética.
Os elementos bucólicos estão presentes, reforçando essa simplicidade e trivialidade.
Voltas:
Campo que te estendes
com verdura bela;
ovelhas que nela
vosso pasto tendes:
d’ervas vos mantendes
que traz o Verão,
e eu das lembranças
do meu coração.
É apresentado o destinatário ou destinatários deste lamento: Campo, Ovelhas e Gado.O sujeito poético dirige-se a estes elementos.
Primeiro começa por invocar o campo verde que se estende de forma bela, mas passa logo de seguida para as ovelhas que estão tão próximas dessa beleza verde.
O sujeito poético deixa-lhes um recado, ao lembrar-lhes que, por um lado, elas se alimentam/ elas se mantêm vivas por causa dessa verdura que o verão torna possível, por outro lado o sujeito poético alimenta-se vive por causa das lembranças/ das memórias que tem da amada.
Pressupomos, portanto uma relação dominada pela saudade, pela tristeza e pela nostalgia.
Gado que paceis,
co contentamento
vosso mantimento
não o entendeis;
isso que comeis
não são ervas , não:
São graças dos olhos
Do meu coração
Dirige-se agora ao Gado, no geral, que não tem consciênciada realidade do seu sofrimento.
O sujeito poético de uma forma exagerada (hipérbole) assume a projecção da amada na Natureza, assumindo que, sem se dar conta, o gado come a graciosidade dos olhos da amada.
Ao longo da cantiga temos uma comparação entre os olhos da amada e os campos que se vai tornando cada vez mais evidente aos olhos do sujeito poético.A repetição do advérbio de negação “não” transmite um tom de oralidade ao poema, e temos a certeza de que o sujeito poético está convencido desta projeção da amada na Natureza.
No final da composição poética os olhos não são como os campos (comparação)São os próprios campos verdes (metáfora).
(10pts) 1 – Que relação o sujeito poético estabelece entre os campos e a amada.Mote:
Verdes são os campos
da cor do limão
assim são os olhos
do meu coração.
Voltas:
Campo que te estendes
com verdura bela;
ovelhas que nela
vosso pasto tendes:
d’ervas vos mantendes
que traz o Verão,
e eu das lembranças
do meu coração.
Gado que paceis,
co contentamento
vosso mantimento
não o entendeis;
isso que comeis
não são ervas , não:
São graças dos olhos
Do meu coração.
Os campos
ponto de partida para a recordação da amada semelhança entre a cor dos campos e os olhos da natureza os campos alimentam/ dão vida e a amada também mantém o sujeito vivo através das recordações. projeção e posterior união entre a amada e a Natureza.
Mote:
Verdes são os campos
da cor do limão
assim são os olhos
do meu coração.
Voltas:
Campo que te estendes
com verdura bela;
ovelhas que nela
vosso pasto tendes:
d’ervas vos mantendes
que traz o Verão,
e eu das lembranças
do meu coração.
Gado que paceis,
co contentamento
vosso mantimento
não o entendeis;
isso que comeis
não são ervas , não:
São graças dos olhos
Do meu coração.
(10pts) 2 – A presença da cor é importante na construção desta cantiga. Demonstra a sua importância simbólica.
Verde
– símbolo da Natureza, que é o elemento de comparação com a amada;
- Símbolo da esperança, uma vez que a separação causa sofrimento, há o desejo de reencontrar a amada.
Mote:
Verdes são os campos
da cor do limão
assim são os olhos
do meu coração.
Voltas:
Campo que te estendes
com verdura bela;
ovelhas que nela
vosso pasto tendes:
d’ervas vos mantendes
que traz o Verão,
e eu das lembranças
do meu coração.
Gado que paceis,
co contentamento
vosso mantimento
não o entendeis;
isso que comeis
não são ervas , não:
São graças dos olhos
Do meu coração.
(10pts) 3 – Quais os sentimentos que dominam o sujeito poético ao longo da cantiga.
Apaixonado – porque a natureza o faz recordar as características da amada
Nostálgico/ Saudoso – vive de recordações de passado e não de presente
Triste/Incompreendido/Apaixonado – porque os outros, a natureza não o compreende; porque as saudades são muitas e tudo o que tem são recordações
Mote:
Verdes são os campos
da cor do limão
assim são os olhos
do meu coração.
Voltas:
Campo que te estendes
com verdura bela;
ovelhas que nela
vosso pasto tendes:
d’ervas vos mantendes
que traz o Verão,
e eu das lembranças
do meu coração.
Gado que paceis,
co contentamento
vosso mantimento
não o entendeis;
isso que comeis
não são ervas , não:
São graças dos olhos
Do meu coração.
(10pts) 4 – Observa as palavras “Campo” “ovelhas” “Gado”. Relaciona a sua utilização com o tema da composição poética.
É apresentado o destinatário ou destinatários deste lamento: Campo, Ovelhas e Gado.O sujeito poético dirige-se a estes elementos.
Primeiro começa por invocar o campo verde que se estende de forma bela, mas passa logo de seguida para as ovelhas que estão tão próximas dessa beleza verde.
O sujeito poético deixa-lhes um recado, ao lembrar-lhes que por um lado elas se alimentam, elas se mantêm vivas por causa dessa verdura que o verão torna possível, por outro lado o sujeito poético alimenta-se/vive por causa das lembranças/ das memórias que tem da amada.
Mote:
Ver//des// são// os //cam//pos
Da// cor// do// li//mão
assim são os olhos
do meu coração.
Voltas:
Campo que te estendes
com verdura bela;
ovelhas que nela
vosso pasto tendes:
d’ervas vos mantendes
que traz o Verão,
e eu das lembranças
do meu coração.
Gado que paceis,
co contentamento
vosso mantimento
não o entendeis;
isso que comeis
não são ervas , não:
São graças dos olhos
Do meu coração.
(15pts) 5 – Este poema retoma aspectos característicos da poesia tradicional. Identifica-os.
Formal : • Cantiga / redondilha menor (5 sílabas métricas)• mote: quatro versos• voltas com oito versos• repetição do último verso do mote no final de cada volta
Conteúdo:
• Saudade • elogio à beleza da amada• as características da mulher : os olhos claros
a graciosidade• 0 bucolismo: a natureza, os campos, as ervas, as ovelhas, o gado, o pasto
• a simplicidade, trivialidade e banalidade dos elementos que estão na base da inspiração poética: os campos verdes
(15pts) 6 – Apresenta a Paráfrase da última volta. Identificando e clarificando a intenção do recurso expressivo presente nos últimos quatro versos.
Mote:
Verdes são os campos
da cor do limão
assim são os olhos
do meu coração.
Voltas:
Campo que te estendes
com verdura bela;
ovelhas que nela
vosso pasto tendes:
d’ervas vos mantendes
que traz o Verão,
e eu das lembranças
do meu coração.
Gado que paceis,
co contentamento
vosso mantimento
não o entendeis;
isso que comeis
não são ervas , não:
São graças dos olhos
Do meu coração.
Dirige-se agora ao Gado, no geral, que não tem consciência da realidade do seu sofrimento.
O sujeito poético de uma forma exagerada (hipérbole) assume a projeção da amada na Natureza, assumindo que, sem se dar conta, o gado come a graciosidade dos olhos da amada.
Ao longo da cantiga, temos uma comparação entre os olhos da amada e os campos que se vai tornando cada vez mais evidente aos olhos do sujeito poético.A repetição do advérbio de negação “não” transmite um tom de oralidade ao poema, e temos a certeza de que o sujeito poético está convencido desta projeção da amada na Natureza.
No final da composição poética os olhos não são como os campos (comparação)São os próprios campos verdes (metáfora).
A
“Pretos os cabelos
Onde o povo vão
perde opinião
Que os louros são belos”
B
“Tão linda que o mundo espanta”
C
“Os ventos serena,
Faz claras de abrolhos
O ar dos seus olhos.”
D
“Presença serena
Que a tormenta amansa”
E
“Pretidão de amor,
Tão doce a figura,
Que a neve lhe jura
que trocou a cor.”
F
“Mais branca que a neve pura(…)”
“Cabelos de ouro o trançado.”
(20pts) 1 - Organiza as temáticas recorrentes na poesia de influência tradicional, exemplificando com os versos acima apresentados.
• O modelo de mulher correspondia à mulher loura, mas em Camões há muitas vezes a dúvida, a alteração dos padrões habituais. ( A )
• Serenidade no perfil psicológico (D e C)• A presença da antítese, por um lado está presente a inquietação, por outro lado está presente a serenidade. (D)
• A beleza da mulher é sempre enaltecida, dando muitas vezes origem à hipérbole. (B)
• A brancura da pele é sempre motivo para a metáfora e símbolo da sua pureza e simplicidade. Novamente as dúvidas e contradiçõesdo sujeito poético. (E)
• A amada é um agente transformador da natureza supra-humano, divinizado, capaz de fazer coisas que a maioria dos mortais não consegue. (C)
• Além da brancura e dos cabelos louros, ainda se acrescenta a metáfora constante, recorrendo aos metais preciosos (ouro e prata)construindo-se assim um retrato ainda mais valorativo. (F)
Todo o trabalho bem
Promete gostoso fruito,
Mas os trabalhos, que vêm
Para quem dita(1) dita não tem,
Valem pouco e custam muito.
(1) Boa fortuna, felicidade
Os bons vi sempre passar
No mundo graves tormentos;
E, para mais m’espantar,
Os maus vi sempre nadar
Em mar de contentamentos.
2 - “ A experiência do humanista, a experiência amorosa e a experiência de vida
colocam Camões perante uma constatação: a de que o mundo, a realidade, é absurda e
domina o desconcerto. Esta constatação deixou marcas amargas em poemas de revolta,
queixa, desengano, perplexidade angustiada.”
In Amélia Pinto Pais, Eu cantarei de amor – Lírica de Luís de Camões.
(20pts) 2.1 - Clarifica as afirmações e exemplifica com a análise dos versos que se seguem:
Camões foi um humanista, viajou e conheceu o mundo• humanismo alimenta a capacidade nas capacidades humanas;• valorização da razão e do juízo crítico• certificação da verdade através da experimentação• desenvolve a capacidade de conhecer o mundo de o questionar e de reflectir sobre os comportamentos humanos.
No primeiro excerto, conclui que o mundo vive em desconcerto, pois o trabalho deveria levar ao mérito e à honra, o que não acontece.
No segundo excerto, conclui que o mundo vive em desconcerto, pois a bondade deve ser premiada e não é. A maldade deve ser castigada e também não é.
Aquela cativa que me tem cativo,Porque nela vivoJá não quer que viva.Eu nunca vi rosa Em suaves molhos,Que pera meus olhosFosse mais fermosa.
Nem no campo flores,Nem no céu estrelasMe parecem belasComo os meus amores.Rosto singularOlhos sossegadosPretos e cansados,Mas não de matar.
ua graça viva,Que neles lhe mora,Pera ser senhorade quem é cativa.Pretos os cabelos,Onde o povo vãoPerde a opiniãoQue os louros são belos
Pretidão de amor,Tão doce a figura,Que a neve lhe juraQue trocara a cor.Leda mansidãoQue o siso acompanha;Bem parece estranhaMas bárbara não.
Presença serenaQue a tormenta amansa;Nela, enfim descansaToda a minha pena.Esta é a cativaQue me tem cativo,E, pois nela vivo,É força que viva.
Aquela cativa que me tem cativoPorque nela vivoJá não quer que viva.Eu nunca vi rosa Em suaves molhos,Que pera meus olhosFosse mais fermosa.
O sujeito poético começa com um jogo de palavras: cativo/cativa que é sugestivo da escravidão amorosa do sujeito poético.Se por um lado Bárbara é escrava/cativa (socialmente), o sujeito poético também o é.É escravo do seu amor.
O sujeito poético faz um elogio à beleza da amada, construindo já a tradicional hipérbole, onde superioriza a amada.
Os elementos da Natureza são os escolhidos para ajudar a descrever a beleza da amada
Nem no campo flores,Nem no céu estrelasMe parecem belasComo os meus amores.Rosto singularOlhos sossegadosPretos e cansados,Mas não de matar.
Comparativamente com as flores e/ou as estrelas, a sua amada é muito mais bela.Note-se que todo o elogio é pessoal, ou seja, parece ao sujeito poético que a sua amada tem uma beleza incomparável à beleza da grandiosidade da Natureza. Está presente uma comparação.
O rosto da amada não é um rosto banal, é singular/diferente/único, ou seja não corresponde aos padrões habituais.
Mais uma vez, os olhos são apresentados como um espelho da alma, neste caso estão sossegados, o que mais uma vez reforça a ideia da calma e serenidade que caracterizava as mulheres da lírica camoniana.Mas logo de seguida, apresenta características que se opõem ao modelo de mulher: “olhos pretos e cansados”, ou seja, olhos escuros e doridos do trabalho duro.
Mais uma vez o sujeito poético joga com as palavras e diz que ela está cansada, mas não de matar …de amor, não de seduzir e de inspirar paixões.
ua graça viva,Que neles lhe mora,Pera ser senhorade quem é cativa.Pretos os cabelos,Onde o povo vãoPerde a opiniãoQue os louros são belos.
O “povo vão”, ou seja, a opinião geral e pouco acertada é de que os cabelos louros é que são belos. O sujeito poético põe em causa o modelo da época e substitui-o por outro.
Antecedente – “olhos”
Mais uma vez se joga com as palavras “senhora” e “cativa”, reforçando a ideia de que apesar de ser cativa/escrava, domina, é senhora dos corações apaixonados.
O reforço da graciosidade da mulher é contínuo e assemelha-se ao modelo de mulher.
Pretidão de amor,Tão doce a figura,Que a neve lhe juraQue trocara a cor.Leda mansidãoQue o siso acompanha;Bem parece estranhaMas bárbara não.
Presença serenaQue a tormenta amansa;Nela, enfim descansaToda a minha pena.Esta é a cativaQue me tem cativo.E, pois nela vivo,É força que viva.
Inicia esta oitava com uma apóstrofe à mulher amada, pondo em destaque precisamente as características que se opõem ao modelo de mulher da época,
Mas logo se sucedem características psicológicas que se adequam ao modelo:Doçura, leda mansidão, siso.
Toda esta descrição pode parecer diferente, mas não agressiva, ofensiva (“bárbara”).
Novamente o reforço da serenidade. E também a presença da antítese, que põe em destaque as contradições amorosas e os conflitos de opinião.
O sujeito poético encaminha para uma conclusãotodo este elogio, dizendo que nela se concentra a sua inspiração poética e sofrimento poético (“pena”).
Aquela cativa que me tem cativo,Porque nela vivoJá não quer que viva.Eu nunca vi rosa Em suaves molhos,Que pera meus olhosFosse mais fermosa.
Em no campo flores,Nem no céu estrelasMe parecem belasComo os meus amores.Rosto singularOlhos sossegadosPretos e cansados,Mas não de matar.
ua graça viva,Que neles lhe mora,Pera ser senhorade quem é cativa.Pretos os cabelos,Onde o povo vãoPerde a opiniãoQue os louros são belos
Pretidão de amor,Tão doce a figura,Que a neve lhe juraQue trocara a cor.Leda mansidãoQue o siso acompanha;Bem parece estranhaMas bárbara não.
Presença serenaQue a tormenta amansa;Ela, enfim descansaToda a minha pena.
Esta é a cativaQue me tem cativo.E, pois nela vivo,É força que viva.
“Aquela” implica um distanciamento, pois o sujeito poético ainda não apresentou a personagem.
“ Esta” implica proximidade, pois agora as características desta personagem são conhecidas.
A escrava contraria o modelo de mulher renascentista pelas suas características físicas que fogem ao pré-estabelecido: loiro, olhos claros, pele branca.
A sua serenidade, sensatez, calma e forma distante já se inscrevem nesse modelo.
Se Helena apartar Do campo seus olhos,Nascerão abrolhos
Voltas:A verdura amenaGados que pasceisSabei que a deveis Aos olhos de Helena.Os ventos serena,Faz flores de abrolhosO ar de seus olhos.
Faz serras floridas,Faz claras as fontes;Se isto faz nos montes,Que fará nas vidas?Trá-las suspendidasComo ervas em molhos,na luz de seus olhos.
Os corações prendeCom graça inumanaDe cada pestanaUa alma lhe pende.Amor se lhe rendeE, posto em giolhos,Pasma nos seus olhos.
Se Helena apartar Do campo seus olhos,Nascerão abrolhos.
No mote, o sujeito poético deixa evidente que os olhos de Helena irradiam uma luz especial, de origem “divina”, inumana capaz de transfigurar a Natureza, transformando-a de forma bela.
Está presente o universo bucólico, onde a Natureza é o cenário da acção da mulher e do seu elogio.
Voltas:A verdura amenaGados que pasceisSabei que a deveis Aos olhos de Helena.Os ventos serena,Faz flores de abrolhosO ar de seus olhos.
Faz serras floridas,Faz claras as fontes;
Continuam a estar presentes os elementos da Natureza e são o destinatário da mensagem do sujeito poético.Está presente uma anástrofe, que reforça a ação dos olhos de Helena.( “Gado que pasceis, sabei que deveis a verdura amena aos olhos de Helena”).
(Outro caso de inversão da ordem natural: “o ar de seus olhos faz flores de abrolhos”)
O sujeito poético parece querer tornar claro para o gado que este deve tudo à capacidade que os olhos de Helena têm de transmutar a Natureza.
Esta ação está reforçada quer pela utilização de verbos, quer pela utilização de adjectivação e adjectivo anteposto,
Anáfora – “Faz”Reforça o sentido transformador. Sem o seu olhar nada existiria.
--------------------------------------------------------Se isto faz nos montes,Que fará nas vidas?Trá-las suspendidasComo ervas em molhos,na luz de seus olhos.
Os dois primeiros versos desta volta completam a primeira parte do vilancete:• A acção dos olhos de Helena na Natureza
Agora inicia-se a segunda parte:• A acção dos olhos de Helena nas vidas humanas.
Esta segunda parte começa com uma questão retórica que nos leva a reflectir sobre os efeitos que esta mulher terá nos humanos.Logo de seguida, o sujeito poético responde a esta questão, com uma comparação. Conclui que também as almas humanas estão dependentes dela.
Os corações prendeCom graça inumanaDe cada pestanaUa alma lhe pende.Amor se lhe rendeE, posto em giolhos,Pasma nos seus olhos.
Até o amor lhe presta vassalagem.
Helena é uma figura graciosa, inatingível, espiritualizada, pertencente a um outro mundo, onde a matéria se suspende e de si depende.
O amor que inspira é um amor espiritualizado, inefável.
Mote
Quem ora soubesse
Onde o amor nasce,
Que o semeasse.
Voltas:
D’Amor e seus danos
Me fiz lavrador;
Semeava amor
E colhia enganos;
Não vi em meus anos,
Homem que apanhasse
O que semeasse.
Vi terra florida
De lindos abrolhos,
Lindos para os olhos,
duros para a vida;
Mas a rês(1) perdida
Que tal erva pace(2)
Em forte hora nace.
Com quanto perdi,
Trabalhava em vão;
Se semeei grão
Grande dor colhi.
Amor nunca vi
Que muito durasse,
Que não magoasse. Luís de Camões
Mote
Quem ora soubesse
Onde o amor nasce,
Que o semeasse.
O sujeito poético utiliza o Pretérito Imperfeito do Conjuntivo para expressar as suas dúvidas e os seus conselhos.
O sujeito poético começa por lançar uma
questão, uma dúvida para o ar. Ele diz que se alguém conhece o terreno fértil do amor deveria plantá-lo.
O sujeito poético inicia aqui esta metáfora que aproxima o amor de uma cultura que necessita terreno especial, ou seja cuidados especiais.
D’ Amor e seus danos
Me fiz lavrador;
Semeava amor
E colhia enganos;
Não vi em meus anos,
Homem que apanhasse
O que semeasse.
O sujeito poético conta que se tornou lavrador de amor.Inicia aqui uma metáfora que se irá prolongar ao longo de todo o texto: Todo este processo de colher, nascer, cuidar e colher está presente como a metáfora de sentir amor de o alimentar e conduzir ao longo da vida.
Os aspectos da Natureza dominam completamente a metáfora em construção.
O sujeito poético afirma que ao longo da vida semeou amor, mas só colheu enganos, ou seja faz alusão a um amor infeliz e sofrido.
Por fim refere que, partindo da sua experiência pessoal, nunca viu ninguém que apanhasse o que recolheu , ou seja nunca ninguém foi verdadeiramente feliz no amor.
Vi terra florida
De lindos abrolhos,
Lindos para os olhos,
duros para a vida;
Mas a rês(1) perdida
Que tal erva pace(2)
Em forte hora nace.
O sujeito poético recorda que já teve momentos felizes, porém momentos contraditórios: Por um lado eram “lindos”, por outro eram “duros”, porque levavam ao sofrimento .Constrói-se uma antítese, pois os “abrolhos” não são plantas bonitas, pelo contrário, têm picos , ou seja, representam aqui uma ilusão e um perigo de sofrimento.
A “rês perdida” representa aqui o Homem que se alimenta de “tal erva”, ou seja, do amor ilusório. Destaca-se também o facto deste amor (erva) nascer forte/ intenso e condenar o homem.
Com quanto perdi,
Trabalhava em vão;
Se semeei grão
Grande dor colhi.
Amor nunca vi
Que muito durasse,
Que não magoasse.
Luís de Camões
O investimento, a dedicação, o trabalho que este lavrador (homem) dedicou à sementeira ( ao amor) foi em vão, ou seja foi inútil, porque a única coisa que colheu foi dor e sofrimento.
O sujeito poético conclui a metáfora, tornando-a clara nos últimos três versos onde diz que nunca conheceu um Amor que perdure e que não conduza ao sofrimento.
Anáfora
Aliteração
(15pts) 1 – Logo na primeira volta o sujeito poético apresenta-se metaforicamente. Justifica a afirmação.
O sujeito poético inicia esta metáfora que aproxima o amor de uma cultura que necessita terreno especial, ou seja cuidados especiais.D’ Amor e seus danos
Me fiz lavrador;
Semeava amor
E colhia enganos;
Não vi em meus anos,
Homem que apanhasse
O que semeasse.
O sujeito poético conta que se tornou lavrador de amor.Inicia aqui uma metáfora que se irá prolongar ao longo de todo o texto: Todo este processo de colher, nascer, cuidar e colher está presente como a metáfora de sentir amor, de o alimentar e conduzir ao longo da vida.
Os aspectos da Natureza dominam completamente a metáfora
em construção.
O sujeito poético afirma que ao longo da vida semeou amor, mas só colheu enganos, ou seja faz alusão a um amor infeliz e sofrido.
(15pts) 2 – Este texto é uma reflexão pessoal.Justifica a afirmação e apresenta o possível destinatário deste vilancete.
Mote
Quem ora soubesse
Onde o amor nasce,
Que o semeasse.
Voltas:
D’Amor e seus danos
Me fiz lavrador;
Semeava amor
E colhia enganos;
Não vi em meus anos,
Homem que apanhasse
O que semeasse.
Vi terra florida
De lindos abrolhos,
Lindos para os olhos,
duros para a vida;
Mas a rês(1) perdida
Que tal erva pace(2)
Em forte hora nace.
Com quanto perdi,
Trabalhava em vão;
Se semeei grão
Grande dor colhi.
Amor nunca vi
Que muito durasse,
Que não magoasse.
Luís de Camões
O sujeito poético começa por lançar uma questão, uma dúvida para o ar. Ele diz que se alguém conhece o terreno fértil do amor deveria plantá-lo.
Tudo isto é uma reflexão pessoal, porque o sujeito poético recorre à sua experiência pessoal para tirar conclusões. Isto é ele vai contando o que fez, o que semeou, o que colheu, o que viu, o que perdeu, o que trabalhou, e a que conclusões chega: o amor conduz sempre ao sofrimento…
(10pts) 3 – Quais os efeitos e características do Amor? Justifica, fazendo o levantamento de palavras que o comprovam.
Mote
Quem ora soubesse
Onde o amor nasce,
Que o semeasse.
Voltas:
D’ Amor e seus danos
Me fiz lavrador;
Semeava amor
E colhia enganos;
Não vi em meus anos,
Homem que apanhasse
O que semeasse.
Vi terra florida
De lindos abrolhos,
Lindos para os olhos,
duros para a vida;
Mas a rês(1) perdida
Que tal erva pace(2)
Em forte hora nace.
Com quanto perdi,
Trabalhava em vão;
Se semeei grão
Grande dor colhi.
Amor nunca vi
Que muito durasse,
Que não magoasse.
Luís de Camões
Efeitos:
DanosSofrimentoDesilusãoDormagoa
Características:
EnganosoIlusórioContraditórioForte/intensoExigente
O Amor é apenas uma ilusão, cria expectativas, alimenta as esperanças, mas no final acaba sempre por levar ao sofrimento e à desilusão.
É também forte e exigente, pois quando surge é intenso e arrebatador, e todo o apaixonado deve “trabalhar”, ou seja empenhar-se nesta tarefa.
(15pts) 4 – Este poema retoma aspectos característicos da poesia tradicional. Identifica-os.
Mote
Quem ora soubesse
Onde o amor nasce,
Que o semeasse.
Voltas:
D’ Amor e seus danos
Me fiz lavrador;
Semeava amor
E colhia enganos;
Não vi em meus anos,
Homem que apanhasse
O que semeasse.
Vi terra florida
De lindos abrolhos,
Lindos para os olhos,
duros para a vida;
Mas a rês(1) perdida
Que tal erva pace(2)
Em forte hora nace.
Com quanto perdi,
Trabalhava em vão;
Se semeei grão
Grande dor colhi.
Amor nunca vi
Que muito durasse,
Que não magoasse.
Luís de Camões
Formal : • vilancete / redondilha menor (5 sílabas métricas)• mote: três versos• voltas com sete versos• repetição do último verso do mote no final de cada volta
Conteúdo:•0 bucolismo: a natureza, os campos, o lavrador, a sementeira, o gado, o pasto
• a simplicidade, trivialidade e banalidade dos elementos que estão na base da inspiração poética: a sementeira.• o sofrimento amoroso e a submissão amorosa. A coita de amor.
(15pts) 5 – Apresenta a Paráfrase da última volta. Identificando e clarificando a intenção do recurso expressivo presente nos últimos quatro versos.
Mote
Quem ora soubesse
Onde o amor nasce,
Que o semeasse.
Voltas:
D’ Amor e seus danos
Me fiz lavrador;
Semeava amor
E colhia enganos;
Não vi em meus anos,
Homem que apanhasse
O que semeasse.
Vi terra florida
De lindos abrolhos,
Lindos para os olhos,
duros para a vida;
Mas a rês(1) perdida
Que tal erva pace(2)
Em forte hora nace.
Com quanto perdi,
Trabalhava em vão;
Se semeei grão
Grande dor colhi.
Amor nunca vi
Que muito durasse,
Que não magoasse.
Luís de Camões
O investimento, a dedicação, o trabalho que este lavrador (homem) dedicou à sementeira ( ao amor) foi em vão, ou seja foi inútil, porque a única coisa que colheu foi dor e sofrimento.
O sujeito poético conclui a metáfora, tornando-a clara nos últimos três versos onde diz que nunca conheceu um Amor que perdure e que não conduza ao sofrimento.
Análise
Medida novadolce stil nuovo
Ondados fios de ouro reluzente
Ondados fios de ouro reluzente,Que agora da mão bela recolhidos,Agora sobre as rosas estendidosFazeis que sua graça se acrescente;
Olhos, que vos moveis tão docemente,Em mil divinos raios encendidos,Se de cá me levais alma e sentidos,Que fora, se de vós não fora ausente?
Honesto riso, que entre a mor finezaDe perlas e corais nace e parece,Se n'alma em doces ecos não o ouvisse!
Se imaginando só tanta beleza,De si, em nova glória, a alma se esquece,Que será quando a vir? Ah! Quem a visse!
O soneto aborda o tema da mulher, mais propriamente, o ideal Petrarquista.Este ideal é sempre descrito como uma mulher perfeita, bela, nobre, só descritível em imagens hiperbólicas. Verifica-se a descrição física, à maneira de Petrarca, de uma mulher, que contribui para a sua caracterização moral.O poema apresenta uma enumeração metafórica dos atributos físicos da mulher.Esta caracterização respeita o ideal feminino petrarquista e assume também a ausência da amada.Assim, afastado do objeto da sua devoção, o poeta deseja a proximidade.Utiliza um discurso expressivo, marcado pelas expressões interjetivas.
O texto é constituído por duas quadras e dois tercetos em metro decassilábico, com um esquema rimático ABBA // ABBA // CDE // CDE, verificando-se a existência de rima interpolada em “A”, emparelhada em “B” e interpolada em “C,D,E”.
Presença bela, angélica figura,Em quem, quanto o Céu tinha, nos tem dado;Gesto alegre, de rosas semeado,Entre as quais se está rindo a Fermosura;
Olhos, onde tem feito tal misturaEm cristal branco e preto marchetado,Que vemos já no verde delicadoNão esperança, mas enveja escura;
Brandura, aviso e graça que, aumentandoA natural beleza c'um desprezoCom que, mais desprezada, mais se aumenta;
São as prisões de um coração que, preso,Seu mal ao som dos ferros vai cantando,Como faz a sereia na tormenta.
Leda serenidade deleitosa,Que representa em terra um paraíso;Entre rubis e perlas doce riso;Debaixo de ouro e neve cor-de-rosa;
Presença moderada e graciosa,Onde ensinando estão despejo e sisoQue se pode por arte e por aviso,Como por natureza, ser fermosa;
Fala de quem a morte e a vida pende,Rara, suave; enfim, Senhora, vossa;Repouso nela alegre e comedido:
Estas as armas são com que me rendeE me cativa Amor; mas não que possaDespojar-me da glória de rendido.
Contradição do amorfelicidade e sofrimento
Retrato idealizado da amada:Traços físicos e psicológicos
Estrutura interna
Recursos expressivos
Efeitos da mulher no sujeito lírico
Presença/ausência do dialogismo
Dizei, Senhora, da Beleza ideia:Para fazerdes esse áureo crino,Onde fostes buscar esse ouro fino?De que escondida mina ou de que veia?
Dos vossos olhos essa luz febeia,Esse respeito, de um império dino?Se o alcançastes com saber divino,Se com encantamentos de Medeia?
De que escondidas conchas escolhestesAs perlas preciosas orientaisQue, falando, mostrais no doce riso?
Pois vos formastes tal como quisestes,Vigiai-vos de vós, não vos vejais;Fugi das fontes: lembre-vos Narciso.
Retrato idealizado, concetual e divinizado da amada:
Traços físicos e psicológicosSedução, fatalidade do amor
Influência do classicismo –Febo, Medeia, Vénus, Narciso
Estrutura interna
Recursos expressivos
Efeitos da mulher no sujeito lírico
Presença do dialogismo
Pág. 278
Está o lascivo e doce passarinhoCo'o biquinho as penas ordenando,O verso sem medida, alegre e brando,Espedindo no rústico raminho.
O cruel caçador, que do caminhoSe vem, calado e manso, desviando,Na pronta vista a seta endireitando,Lhe dá no Estígio lago eterno ninho.
Destarte o coração, que livre andava,(Posto que já de longe destinado),Onde menos temia, foi ferido.
Porque o Frecheiro cego me esperava,Para que me tomasse descuidado,Em vossos claros olhos escondido.
Locus amoenus
Metáfora do enamoramento
Amor – prisão, cegueira, fatalidade
Ambiente bucólico
Pág. 278
Como quando o mar tempestuosoo marinheiro, lasso e trabalhado,de um naufrágio cruel já salvo a nado,só ouvir falar nele o faz medroso,
e jura que, em que veja bonançosoo violento mar e sossegado,não entre nele mais, mas vai forçadopelo muito interesse cobiçoso;
assi, Senhora, eu, que da tormentade vossa vista fujo, por salvar-me,jurando de não mais em outra ver-me:
minh’alma, que de vós nunca se ausenta,dá-me por preço ver-vos, faz tornar-medonde fugi tão perto de perder-me.
Locus amoenus
Metáfora do enamoramento
Amor – tormenta, cruel, fatalidade
Ambiente bucólico
Pág 290
O céu, a terra, o vento sossegado...As ondas, que se estendem pela areia...Os peixes, que no mar o sono enfreia...O nocturno silêncio repousado...
O pescador Aónio, que, deitadoOnde co vento a água se meneia,Chorando, o nome amado em vão nomeia,Que não pode ser mais que nomeado:
— Ondas – dezia – antes que Amor me mate,Tornai-me a minha Ninfa, que tão cedoMe fizestes à morte estar sujeita.
Ninguém lhe fala; o mar de longe bate;Move-se brandamente o arvoredo;Leva-lhe o vento a voz, que ao vento deita.
Locus amoenus
Metáfora do enamoramento
Amor – tormenta, cruel, fatalidade
Ambiente bucólico
Página 293
Males, que contra mim vos conjurastes,Quanto há-de durar tão duro intento?Se dura, por que dure meu tormento,Baste-vos quanto já me atormentastes.
Mas se assim porfiais, porque cuidastesDerribar o meu alto pensamento,Mais pode a causa dele, em que o sustento,Que vós, que dela mesma o ser tomastes.
E pois vossa tenção com minha morteÉ de acabar o mal destes amores,Dai já fim a tormento tão comprido.
Assim de ambos contente será a sorte:Em vós por acabar-me, vencedores,Em mim porque acabei de vós vencido.
Desconcerto emocional
(pág. 298)
http://www.slideshare.net/HMECOUT/o-dia-em-que-eu-nasci-morra-e-perea
Pág. 291
O dia em que nasci moura e pereça, Não o queira jamais o tempo dar; Não torne mais ao Mundo, e, se tornar, Eclipse nesse passo o Sol padeça.
A luz lhe falte, O Sol se [lhe] escureça, Mostre o Mundo sinais de se acabar, Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar, A mãe ao próprio filho não conheça.
As pessoas pasmadas, de ignorantes, As lágrimas no rosto, a cor perdida, Cuidem que o mundo já se destruiu.
Ó gente temerosa, não te espantes, Que este dia deitou ao Mundo a vida Mais desgraçada que jamais se viu!
Desconcerto emocional
Pág. 301
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,Muda-se o ser, muda-se a confiança:Todo o mundo é composto de mudança,Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,Diferentes em tudo da esperança:Do mal ficam as mágoas na lembrança,E do bem (se algum houve) as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,Que já coberto foi de neve fria,E em mim converte em choro o doce canto.
E afora este mudar-se cada dia,Outra mudança faz de mor espanto,Que não se muda já como soía.
Desconcerto do mundo
(pág. 304)
O mundo tem-me feito desfeitas atrás de desfeitas. Na maior parte das vezes, o mundo entretém-se a mostrar-me que sou estúpido. Admito que, quando isso acontece, o mundo quase não tem de fazer nada para oconseguir. Mas é realmente incrível o trabalho a que o mundo se tem dado para me fazer sentir velho. Todos osdias faz piruetas impossíveis, sem outra justificação que não seja obrigar-me a dizer, como um octogenário, "Nomeu tempo isto não era assim". A última dessas cabriolas foi esta: neste momento, o regime político que aspessoas ricas preferem é o da Rússia. No meu tempo isto não era assim. Gérard Dépardieu, francês, actor,milionário e reputado bêbado urinador no chão de aviões, pediu a cidadania russa para pagar menos impostos.E obteve-a porque, ao passo que no meu tempo a Rússia achava que o ocidente era demasiado capitalista,agora acha que não o é suficientemente.No meu tempo, os russos queriam sair para o ocidente. Agora, os ocidentais querem entrar na Rússia. Alguémsubstituiu a cortina de ferro por aquela cortina que, nos aviões, separa a ralé da primeira classe. E foirapidíssimo. Todo o mundo é composto de mudança, eu sei. Jamais te banharás duas vezes nas águas domesmo rio, e tal. De acordo. Mas isto é um exagero. Qual rio, Heraclito? Quais águas? O próprio rio deixou deser um rio. E já não estamos a banhar-nos em água. Isto é vinho. E Gérard Depardieu está a bebê-lo todo, comoé evidente. Não se muda já como soía porque o próprio devir mudou. E ou muito me engano ou está drogado.Em pouco mais de 20 anos, a Rússia transfigurou-se. Não sei se aguento mudanças do mesmo género nospróximos 20 anos. Receio que a minha saúde não resista ao choque se, em 2033, a Coreia do Norte for um paíslivre, a Alemanha for um país pobre, e Portugal for um país decente. O sobressalto poderia matar-me. Creio queé isso que o mundo pretende, e o mais triste é que estou convencido de que acabará por consegui-lo. Resta-meretaliar como posso. Vou comprar dois ou três aerossóis bem poluentes e ajustar contas com o mundo. Logoveremos se continuará com vontade de fazer pouco de mim quando tiver a camada de ozono toda esburacada.
Ricardo Araújo Pereira, Visão
O mundo tem-me feito desfeitas atrás de desfeitas. Na maior parte das vezes, o mundo entretém-se a mostrar-me que sou estúpido. Admito que, quando isso acontece, o mundo quase não tem de fazer nada para o conseguir.Mas é realmente incrível o trabalho a que o mundo se tem dado para me fazer sentir velho. Todos os dias fazpiruetas impossíveis, sem outra justificação que não seja obrigar-me a dizer, como um octogenário, "No meutempo isto não era assim". A última dessas cabriolas foi esta: neste momento, o regime político que aspessoas ricas preferem é o da Rússia. No meu tempo isto não era assim. Gérard Dépardieu, francês, actor,milionário e reputado bêbado urinador no chão de aviões, pediu a cidadania russa para pagar menosimpostos. E obteve-a porque, ao passo que no meu tempo a Rússia achava que o ocidente era demasiadocapitalista, agora acha que não o é suficientemente.No meu tempo, os russos queriam sair para o ocidente. Agora, os ocidentais querem entrar na Rússia. Alguémsubstituiu a cortina de ferro por aquela cortina que, nos aviões, separa a ralé da primeira classe. E foi rapidíssimo.Todo o mundo é composto de mudança, eu sei. Jamais te banharás duas vezes nas águas do mesmo rio, e tal. Deacordo. Mas isto é um exagero. Qual rio, Heraclito? Quais águas? O próprio rio deixou de ser um rio. E já nãoestamos a banhar-nos em água. Isto é vinho. E Gérard Depardieu está a bebê-lo todo, como é evidente. Não semuda já como soía porque o próprio devir mudou. E ou muito me engano ou está drogado.Em pouco mais de 20 anos, a Rússia transfigurou-se. Não sei se aguento mudanças do mesmo género nospróximos 20 anos. Receio que a minha saúde não resista ao choque se, em 2033, a Coreia do Norte for um paíslivre, a Alemanha for um país pobre, e Portugal for um país decente. O sobressalto poderia matar-me. Creio que éisso que o mundo pretende, e o mais triste é que estou convencido de que acabará por consegui-lo. Resta-meretaliar como posso. Vou comprar dois ou três aerossóis bem poluentes e ajustar contas com o mundo. Logoveremos se continuará com vontade de fazer pouco de mim quando tiver a camada de ozono toda esburacada.
TOPONÍMIA
Mudam-se os tempos. Jánão sabemos as matinais cançõesnem habitamos vilas morenas.Toleramos serventes de pedreiro louros,de preferência não legalizados. Queremosum grande apartamento em condomíniofechado, um ferrari, uma piscina, um topode gama de uma coisa qualquer.
Temos ruas, temos praças e pontescom nome de revolução. Como todosos países temos hino - nação valenteimortal. Tivemos canela e diamantes,santos, barregãs e dinastias detiranos e servos. Andámos muitono mar, trocando rotas e poderes,escravos, inquisições e cruzes.
Agora, neste estreitoquadrilátero, de onde saímose mal regressámos, sem índias nemquinto império - salvou-se o manuscrito doLuís Vaz a nado - restam-nos a sardinhae a conquilha - ao que consta cercadasde barcos espanhóis - o bacalhauque já não vem da Terra Nova, a memóriados pescadores de baleias, esgotada a capturanas ilhas.
Também temos o trezede Maio, o negócio clandestinodas abortadeiras, a broa de Avintes,os tintos, por enquanto de marca eo leitão da Bairrada e o Benfica eo Sporting e o FutebolClube do Porto.
Temos ruas, temos praças epontes com nome de revolução,topónimos nebulosos que a distânciaapagará. Apenas aquela ruachamada Cantor Zeca Afonsopoderá surpreender o transeuntese acrescentarem o aviso:
nunca quis uma ruasó para si.
Inês Lourenço
Elabora um Texto de Opinião que comece assim:
“No meu tempo não era nada assim…”
E que inclua no seu desenvolvimento alguns dos versos de Camões presentes neste soneto.
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,Muda-se o ser, muda-se a confiança:Todo o mundo é composto de mudança,Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,Diferentes em tudo da esperança:Do mal ficam as mágoas na lembrança,E do bem (se algum houve) as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,Que já coberto foi de neve fria,E em mim converte em choro o doce canto.
E afora este mudar-se cada dia,Outra mudança faz de mor espanto,Que não se muda já como soía.
Maria de Lurdes Augusto - 2014