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Paulo Mascarenhas MANUAL DE DIREITO CONSTITUCIONAL Salvador 2010

Manual de direito constitucional - Paulo Mascarenhas

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  • Paulo Mascarenhas

    MANUAL DE DIREITO CONSTITUCIONAL

    Salvador

    2010

  • 4

    Para os meus alunos, grandes responsveis por

    este trabalho, com carinho.

  • 5

    INDICE 1 DIREITO CONSTITUCIONAL: ORIGEM E CONCEITO

    1.1 FONTES DO DIREITO CONSTITUCIONAL

    1.2 O SENTIDO DE CONSTITUIO

    1.3 HISTRICO

    1.4 CONSTITUCIONALISMO

    1.5 CONSTITUCIONALISMO MODERNO E CONTEMPORNEO

    1.6 TIPOLOGIA

    1.7 CLASSIFICAO DOS TIPOS CONSTITUCIONAIS

    2 O SISTEMA CONSTITUCIONAL

    2.1 ESTRUTURA NORMATIVA

    3 TEORIA DA NORMA CONSTITUCIONAL

    4 HERMENUTICA E INTERPRETAO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

    4.1 PRINCPIOS DE HERMENUTICA CONSTITUCIONAL

    A) PRINCPIO DA SUPREMACIA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

    B) PRINCPIO DA UNIDADE DA CONSTITUIO

    C) PRINCPIO DA IMPERATIVIDADE (OU DA MXIMA EFETIVIDADE) DA NORMA

    CONSTITUCIONAL

    D) PRINCPIO DA SIMETRIA CONSTITUCIONAL

    E) PRINCPIO DA PRESUNO DE CONSTITUCIONALIDADE DAS NORMAS

    INFRACONSTITUCIONAIS

    4.2 INTERPRETAO DA CONSTITUIO

    4.2.1 FORMAS DE INTERPRETAO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

    4.3 FONTE DE INTERPRETAO CONSTITUCIONAL

    a) INTERPRETAO AUTNTICA b) INTERPRETAO DOUTRINRIA c) INTERPRETAO JUDICIAL

  • 6

    4.4 MTODOS CLSSICOS DE INTERPRETAO CONSTITUCIONAL

    a) DA INTERPRETAO LGICA OU RACIONAL

    b) DA INTERPRETAO SISTEMTICA

    c) DA INTERPRETAO HISTRICA

    d) DA INTERPRETAO SOCIOLGICA OU TELEOLGICA

    5 A NORMA CONSTITUCIONAL NO TEMPO E A SUA APLICAO

    5.1 A RECEPAO

    5.2 A REPRISTINAO

    5.3 A DESCONSTITUCIONALIZAO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

    6 O PREMBULO CONSTITUCIONAL

    O PREMBULO DA CONSTITUIO FEDERAL BRASILEIRA DE 1988

    7 A EVOLUO CONSTITUCIONAL BRASILEIRA

    A CONSTITUIO DE 1824

    A PRIMEIRA REPBLICA E A CONSTITUIO DE 1891

    A REVOLUO DE 1930 E A CONSTITUIO DE 1934

    O ESTADO NOVO E A CONSTITUIO DE 1937

    A DEMOCRACIA E A CONSTITUIO DE 1946

    O REGIME MILITAR E A CONSTITUIO DE 1967; A EMENDA CONSTITUCIONAL DE 1969

    A CONSTITUIO PROMULGADA DE 1988

    8 O PODER CONSTITUINTE

    8.1 DOS TITULARES DO PODER CONSTITUINTE

    8.2 ESPCIES DE PODER CONSTITUINTE

    8.2.1 PODER CONSTITUINTE ORIGINRIO

    8.2.2 PODER CONSTITUINTE DERIVADO

  • 7

    9 TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

    9.1 ORIGEM

    9.2 CONCEITUAO

    9.3 NATUREZA JURDICA

    9.4 CARACTERSTICAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

    9.5 CLASSIFICAO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

    10 OS PRINCPIOS FUNDAMENTAIS

    10.1 FUNDAMENTOS

    I A SOBERANIA: II A CIDADANIA; III A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: IV - OS VALORES SOCIAIS DO TRABALHO E DA LIVRE INICIATIVA:

    V - O PLURALISMO POLTICO:

    10.2 DA TRIPARTIO DOS PODERES

    10.3 DOS OBJETIVOS FUNDAMENTAIS DA REPBLICA FEDERATIVA DO BRASIL

    10.4 DOS PRINCPIOS DA REPBLICA FEDERATIVA DO BRASIL NA ORDEM

    INTERNACIONAL

    11 OS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS E COLETIVOS

    11.1 DOS DESTINATRIOS DA PROTEO CONSTITUCIONAL

    11.2 DO DIREITO VIDA

    11.3 DA IGUALDADE

    11.4 DA IGUALDADE ENTRE HOMENS E MULHERES

    11.5 PRINCPIO DA LEGALIDADE

    11.6 DA VEDAO DA TORTURA E A TRATAMENTO DESUMANO OU DEGRADANTE

    11.7 DA LIBERDADE DE MANIFESTAO DO PENSAMENTO

    11.8 DO DIREITO DE RESPOSTA E INDENIZAO

    11.9 DA INVIOLABILIDADE LIBERDADE DE CREDO

    11.10 DA PRESTAO DE ASSISTNCIA RELIGIOSA

    11.11 DA LIBERDADE DE EXPRESSO

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    11.12 DA INVIOLABILIDADE DA INTIMIDADE, DA VIDA PRIVADA, DA HONRA E DA

    IMAGEM

    11.13 DA INVIOLABILIDADE DA CASA

    11.14 DA INVIOLABILIDADE DAS CORRESPONDNCIAS E DAS COMUNICAES

    TELEGRFICAS, DE DADOS E TELEFNICAS

    11.15 DO LIVRE EXERCCIO DE QUALQUER TRABALHO

    11.16 DO SIGILO DA FONTE

    11.17 DA LIBERDADE DE LOCOMOO

    11.18 DO DIREITO DE REUNIO PACFICA

    11.19 DA LIBERDADE DE ASSOCIAO

    11.20 DO DIREITO DE PROPRIEDADE E SUAS LIMITAES

    11.21 DO DIREITO AUTORAL

    11.22 DO DIREITO DE HERANA E DA SUCESSO

    11.23 DA DEFESA DO CONSUMIDOR

    11.24 DO DIREITO DE RECEBER INFORMAES DOS RGOS PBLICOS

    11.25 DO DIREITO DE PETIO E DE OBTENO DE CERTIDES

    11.26 DO PRINCPIO DA LEGALIDADE

    11.27 DO DIREITO ADQUIRIDO, DO ATO JURDICO PERFEITO E DA COISA JULGADA

    11.28 DA VEDAO AO JUZO OU TRIBUNAL DE EXCEO

    11.29 DO JRI POPULAR

    11.30 DO PRINCPIO DA ANTERIORIDADE LEGAL

    11.31 DA IRRETROATIVIDADE DA LEI

    11.32 DA VEDAO S DISCRIMINAES AOS DIREITOS E LIBERDADES

    FUNDAMENTAIS

    11.33 DA CRIMINALIZAO DA PRTICA DO RACISMO

    11.34 DOS CRIMES INAFIANVEIS E HEDIONDOS

    11.35 DO PRINCPIO DA PERSONALIZAO E DA INDIVIDUALIZAO DAS PENAS

    11.36 DA EXTRADIO

    11.37 DO PRINCPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL

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    11.38 DO CONTRADITRIO E DA AMPLA DEFESA

    11.39 DA INADMISSIBILIDADE DAS PROVAS OBTIDAS POR MEIOS ILCITOS

    11.40 DA PRESUNO DE INOCNCIA

    11.41 DA ASSISTNCIA JUDICIRIA GRATUITA

    11.42 DO ERRO JUDICIRIO

    11.43 DA GRATUIDADE DE CERTIDES E DE AES CONSTITUCIONAIS

    11.44 DA RAZOABILIDADE DA DURAO DO PROCESSO

    12 TUTELA CONSTITUCIONAL DAS LIBERDADES

    12.1 DA AO CIVIL PBLICA

    12.2 DO DIREITO DE PETIO

    12.3 DA AO POPULAR

    12.4 HABEAS CORPUS

    12.5 DO MANDADO DE SEGURANA

    12.6 DO MANDADO DE SEGURANA COLETIVO

    12.7 DO MANDADO DE INJUNO

    12.8 DO HABEAS DATA

    13 DOS DIREITOS SOCIAIS

    13.1 DOS DIREITOS DOS TRABALHADORES URBANOS E RURAIS

    13.2 DA PROTEO CONTRA DESPEDIDA ARBITRRIA, SEGURO DESEMPREGO E DO

    FGTS

    13.3 DO SALRIO, DA SUA IRREDUTIBILIDADE E DA SUA PROTEO

    13.4 .DO PISO SALARIAL

    13.5 DA IRREDUTUBILIDADE DO SALRIO

    13.6 DO 13 SALRIO

    13.7 DA RETENO DOLOSA DO SALRIO

    13.8 DA JORNADA DE OITO HORAS, DA REMUNERAO DO SERVIO

    EXTRAORDINRIO, DAS FRIAS ANUAIS, DO AVISO PRVIO, DOS ADICIONAIS DE

    INSALIBRIDADE E PERICULOSIDADE, E OUTROS DIREITOS.

    13.9 DA LIBERDADE DE ASSOCIAO PROFISSIONAL E SINDICAL

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    13.10 DO DIREITO DE GREVE

    13.11 DA PARTICIPAO NOS COLEGIADOS DOS RGOS PBLICOS

    13.12 DA ELEIO DE REPRESENTANTES EM EMPRESA COM MAIS DE 200

    EMPREGADOS

    14 DA NACIONALIDADE

    14.1 DA LNGUA E DOS SMBOLOS DA REPBLICA

    15 DOS DIREITOS POLTICOS

    15.1 CONDIES DE ELEGIBILIDADE E CAUSAS DE INELEGIBILIDADE

    15.2 DA AO DE IMPUGNAO DE MANDATO ELETIVO

    15.3 DA PERDA E SUSPENSO DOS DIREITOS POLTICOS

    15.4 DO PRINCPIO DA ANUALIDADE DA LEI ELEITORAL

    15.5 NATUREZA JURDICA

    15.6 DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDRIO E DO ACESSO GRATUITO A REDE DE RDIO

    E TELEVISO

    16 DA ORGANIZAO DO ESTADO

    16.1 DOS TIPOS DE ESTADO

    16.2 DA ORGANIZAO POLTICO-ADMINISTRATIVA DO BRASIL

    16.2.1 DA UNIO

    16.2.2 DOS ESTADOS-MEMBROS

    16.2.3 DOS MUNICPIOS

    16.2.4 DO DISTRITO FEDERAL

    16.2.5 DOS TERRITRIOS

    16.3 DA FORMAO DOS ESTADOS

    16.4 DA FORMAO DOS MUNICPIOS

    16.5 DA INTERVENO FEDERAL

    17 DA ADMINISTRAO PBLICA

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    17.1 PRINCPIOS CONSTITUCIONAIS DA ADMINISTRAO PBLICA (OU DO DIREITO

    ADMINISTRATIVO)

    17. 2 DOS AGENTES PBLICOS

    17.2.1 DOS SERVIDORES PBLICOS

    18 DA ORGANIZAO DOS PODERES (Ttulo IV, CF)

    18.1 O PODER LEGISLATIVO

    18.1.1 O CONGRESSO NACIONAL (art. 44 a 50)

    18.1.1.1 CMARA DOS DEPUTADOS (art. 51)

    18.1.1.2 O SENADO FEDERAL (art. 52)

    18.1.1.3 A FUNO FISCALIZADORA DO PODER LEGISLATIVO

    18.1.1.4 DAS COMISSES PARLAMENTARES (art. 58. CF).

    18.1.2 DO PROCESSO LEGISLATIVO

    18.1.2.1 DA EMENDA CONSTITUCIONAL

    18.1.2.2 DA LEI COMPLEMENTAR

    18.1.2.3 DA LEI ORDINRIA

    18.1.2.4 DA LEI DELEGADA

    18.1.2.5 DA MEDIDA PROVISRIA

    18.1.2.6 DO DECRETO LEGISLATIVO

    18.1.2.7 DA RESOLUO

    18.2 DO PODER EXECUTIVO

    18.2.1 DO CONSELHO DA REPBLICA

    18.2.2 CONSELHO DE DEFESA NACIONAL

    18.3 DO PODER JUDICIRIO

    18.3.1 GARANTIAS DO PODER JUDICIRIO

    18.3.2 DA ESTRUTURA DO PODER JUDICIRIO

    18.3.2.1 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

    18.3.2.2 DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIA (CF, art. 103-B)

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    18.3.2.3 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA

    18.3.2.4 DA JUSTIA FEDERAL COMUM

    18.3.2.5 DA JUSTIA FEDERAL ESPECIALIZADA

    18.3.2.5.1 DA JUSTIA DO TRABALHO

    18.3.2.5.2 DA JUSTIA ELEITORAL

    18.3.2.5.3 DA JUSTIA MILITAR

    18.3.2.6 DA JUSTIA ESTADUAL

    19 DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

    19.1 DO CONTROLE PREVENTIVO

    19.2 DO CONTROLE REPRESSIVO

    19.2.1 CONTROLE REPRESSIVO PELO PODER JUDICIRIO

    19.2.1.1 DO CONTROLE DIFUSO

    19.2.1.2 DO CONTROLE CONCENTRADO

    19.2.1.2.1 DA AO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

    19.2.1-2-2 DA MEDIDA CAUTELAR EM AO DIRETA DE

    INCONSTITUCIONALIDADE

    19.2.1.2.3 DA AO DECLARATRIA DE CONSTITUCIONALIDADE

    19.2.1.2.4 ARGIO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO

    FUNDAMENTAL

    20 DAS FUNES ESSENCIAIS JUSTIA

    20.1 DO MINISTRIO PBLICO

    20.1.1 MINISTRIO PBLICO DA UNIO

    20.1.2 MINISTRIO PBLICO DOS ESTADOS

    20.1.3 PRINCPIOS DO MINISTRIO PBLICO

    20.1.4 FUNES DO MINISTRIO PBLICO

    20.1.5 DAS VEDAES CONSTITUCIONAIS

    20.1.6 DO CONSELHO NACIONAL DO MINISTRIO PBLICO (CF, art. 130-A)

  • 13

    20.2 DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIO

    20.3 DA ADVOCACIA

    20.4 DA DEFENSORIA PBLICA

    21 A DEFESA DO ESTADO E DAS INSTITUIES DEMOCRTICAS O ESTADO DE DEFESA E O ESTADO DE STIO

    21.1 O ESTADO DE DEFESA

    21.2 O ESTADO DE STIO

    21. 3 DAS FORAS ARMADAS

    21.3.1 DISPOSIES GERAIS

    21.4 DA SEGURANA PBLICA

    21.4 1 DAS POLCIAS DA UNIO

    21.4.1.1 POLCIA FEDERAL

    21.4.1.2 POLCIA RODOVIRIA FEDERAL

    21.4.1.3 POLCIA FERROVIRIA FEDERAL

    21.4.2 DAS POLCIAS ESTADUAIS

    21.4.3 DAS GUARDAS MUNICIPAIS

    22 DA ORDEM ECONMICA E FINANCEIRA

    22.1 DOS PRINCPIOS GERAIS DA ATIVIDADE ECONMICA

    22.2 FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS DA ORDEM ECONMICA

    22.3 PRINCPIOS DA ORDEM ECONMICA

    22.4 INTERVENO ESTATAL NA ECONOMIA

    22.5 MONOPLIOS DA UNIO

    22.6 DA POLTICA URBANA

    22.7 DA POLTICA AGRCOLA E FUNDIRIA E DA REFORMA AGRRIA

    22.7.1 DA FUNO SOCIAL DA PROPRIEDADE

    22.7.2 DO PLANEJAMENTO AGRCOLA

    22.7.3 DA REFORMA AGRRIA

  • 14

    23 O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL

    23.1 CONSIDERAES GERAIS

    24 ORDEM SOCIAL

    24.1 A ORDEM SOCIAL NA CONSTITUIO

    24.1.1 CONSIDERAES GERAIS

    24.2 SEGURIDADE SOCIAL

    24.3 DA SADE

    24.4 DA PREVIDNCIA SOCIAL

    24.5 DA ASSISTNCIA SOCIAL

    24.6 DA EDUCAO

    24.7 DA CULTURA

    24.8 DO DESPORTO

    24.9 DA CINCIA E TECNOLOGIA

    24.10 DA COMUNICAO SOCIAL

    24.11 DO MEIO AMBIENTE

    24.12 DA FAMLIA

    24.13 DA CRIANA, DO ADOLESCENTE E DO IDOSO

    24.14 DOS NDIOS

    ANEXOS

    I - LEGISLAO

    I.a AAO CIVIL PBLICA

    I.b AAO POPULAR

    I.c HABEAS DATA

    I.d HABEAS CORPUS

    I.e MANDADO DE SEGURANA

    I.f MANDADO DE SEGURANA II MODELOS

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    II.a AAO CIVIL PBLICA

    II.b - AAO POPULAR

    II.c - HABEAS DATA

    II.d - HABEAS CORPUS

    II.e MANDADO DE INJUNAO

    II.f MANDADO DE SEGURANA

    II.g MANDADO DE SEGURANA

    BIBLIOGRAFIA

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    DIREITO CONSTITUCIONAL

    1 DIREITO CONSTITUCIONAL: ORIGEM E CONCEITO

    Conceito

    Ramo do Direito Pblico que estuda os princpios indispensveis organizao do

    Estado, distribuio dos poderes, os rgos pblicos e os direitos individuais e coletivos.

    Origem

    O Direito Constitucional, enquanto ramo do Direito que estuda os princpios

    necessrios e indispensveis estruturao da vida do Estado, teve como origem a

    Assemblia Nacional Constituinte da Frana de 26/09/1791, que determinou a obrigatoriedade

    do ensino da Constituio para os estudantes franceses.

    A expresso Direito Constitucional, contudo, somente surgiu em 1797, em Milo,

    norte da Itlia.

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    1.1 FONTES DO DIREITO CONSTITUCIONAL

    As fontes do Direito Constitucional podem ser divididas em fontes imediatas e

    fontes mediatas.

    Como fontes imediatas temos a prpria Constituio poltica, fonte primria do

    Direito Constitucional, que estabelece as diretrizes polticas e organizacionais de uma

    sociedade podendo esta ser escrita como verbi gratia, a Constituio brasileira ou no escrita como a Constituio inglesa, e as leis constitucionais esparsas, escritas ou no estas nos pases que adotam o common law.

    Como fontes mediatas temos o Direito Natural, a doutrina, a jurisprudncia e

    os costumes e tradies do povo, da sociedade.

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    1.2 O SENTIDO DE CONSTITUIO

    Em sentido geral, amplo, constituio a estrutura fundamental ou a maneira de

    ser de qualquer coisa.

    Em teoria poltica e direito, Constituio, em letra maiscula, refere-se a Estado,

    podendo ser empregada em sentido amplo ou restrito.

    Em sentido amplo, genrico, a prpria organizao estatal. Todos os pases

    possuem suas Constituies, que lhes so prprias.

    Em sentido restrito, define-se a Constituio como o conjunto de normas jurdicas

    necessrias e bsicas estruturao de uma sociedade poltica, geralmente agrupadas em uma

    nica Lei Fundamental.

  • 17

    Para Ferdinand Lassale (1825-1864) 1, advogado na antiga Prssia, as questes

    constitucionais no so jurdicas, mas polticas, onde os fatores reais do poder formam a

    chamada Constituio real do pas. Para Lassalle, o poder da fora seria sempre superior ao

    poder das normas jurdicas, situao em que a normatividade submetida realidade ftica.

    Isso significaria a negao da Constituio jurdica, que teria unicamente a funo de

    justificar as relaes de poder dominantes.

    Hesse2, traduzido entre ns por Gilmar Ferreira Mendes, se contrape s

    concepes de Lassalle demonstrando que o desfecho entre os fatores reais de poder e a

    Constituio no implica necessariamente na derrota desta ltima. Para Hesse, existem

    pressupostos realizveis que permitem assegurar sua fora normativa, e que apenas quando

    esses pressupostos no sejam satisfeitos que as questes jurdicas podem se converter em

    questes de poder. O primeiro desses pressupostos a vontade de Constituio. A

    Constituio transforma-se em fora ativa se existir a disposio de orientar a prpria

    conduta segundo a ordem nela estabelecida, se fizerem-se presentes, na conscincia geral

    (especialmente na conscincia dos principais responsveis pela ordem constitucional), no s

    a vontade de poder, mas tambm a vontade de Constituio. E conclui Hesse, que a fora

    normativa da Constituio no est assegurada de plano, configurando misso que somente

    em determinadas condies poder ser realizada de forma excelente. Para ele, compete ao

    direito constitucional realar, despertar e preservar a vontade de Constituio, que,

    indubitavelmente, constitui a maior garantia de sua fora normativa.

    Hans Kelsen, formulador e principal defensor da Teoria Pura do Direito, fundador da Escola Normativista, tambm chamada Escola de Viena, contraps-se a Lassalle e a Hesse. Para

    Kelsen, o direito deve ser examinado como ele de fato o , isento de juzos valorativos, e no como

    deveria ser. Vale dizer, o direito tem de ser despido de todo seu contedo valorativo, e que necessita

    existir uma respeitabilidade entre o conjunto hierarquizado das normas, que contm na Constituio

    seu pice.

    Segundo Kelsen 3, o ordenamento jurdico no , portanto, um sistema jurdico

    de normas igualmente ordenadas, colocadas lado a lado, mas um ordenamento escalonado de

    vrias camadas de normas jurdicas. VOLTAR

    1.3 HISTRICO

    At meados do sculo XVIII, as Constituies eram costumeiras, baseadas nas

    tradies, hbitos e costumes do povo, e, tambm, baseadas em leis e documentos esparsos,

    como por exemplo, a Magna Carta inglesa, de Joo Sem Terra, de 1215, que consubstanciou

    o acordo entre o Rei e o baronato revoltado com os amplssimos poderes do Monarca sobre

    tudo e sobre todos.

    Posteriormente, em 1689, na mesma Inglaterra, para, uma vez mais, estabelecer

    limites aos poderes do Monarca, foi editada a Bill of Rights.

    A idia de Constituio veio a ganhar fora quando foi associada s concepes

    iluministas, com o liberalismo poltico representando a ideologia revolucionria do sculo

    XVIII. O triunfo das idias liberais d-se com as Revolues dos sculos XVII, na Inglaterra,

    e XVIII, nos Estados Unidos e na Frana, quando se afirmam os direitos fundamentais e a

    no-interveno arbitrria do Estado.

    A partir da segunda metade do sculo XVIII, inspirado na filosofia scio-

    contratualista existente especialmente durante os sculos XVI a XVIII, compreendeu-se a

    1 LASSALLE, Ferdinand. A Essncia da Constituio. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 1998.

    2 HESSE, Konrad. A Fora Normativa da Constituio. Porto Alegre: Safe, 1991.

    3 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Revista dos Tribunais, So Paulo, p. 103, 2003,

  • 18

    necessidade da elaborao de uma Constituio escrita, baseada no pacto social, de maneira

    que ela significasse uma verdadeira expresso contratual da sociedade, devendo, por isso, ser

    clara, objetiva, racional e firme, de modo a representar um princpio de maior proteo contra

    possveis e provveis deformaes de carter autoritrio, arbitrrio.

    A primeira Constituio escrita, criada pelo Poder Constituinte e em termos

    similares aos que atualmente so conhecidos, surgiu em 1787, nos Estados Unidos, tendo por

    base a teoria do contrato social.

    bem de ver, contudo, que antes da revoluo americana, e, por conseguinte, bem

    antes dessa primeira Constituio escrita, todas as treze colnias americanas j tinham as suas

    cartas constitucionais.

    Com a independncia dessas colnias, depois transformadas em Estados

    soberanos, foram publicados documentos formais como a Declarao de Direito do Estado da

    Virgnia, de 12/06/1776, e a de Massachussets, em 1780, tomada como principal modelo da

    Constituio Federal americana.

    Depois disso, a Constituio se tornaria uma instituio poltica que tinha por

    objetivo a delimitao do Poder, sendo que esta delimitao se operava, de maneira

    extrnseca pela garantia dos direitos naturais, e de maneira intrnseca, como decorrncia da

    adoo do princpio da separao de poderes, conforme explicitado pela Declarao dos

    Direitos do Homem, de 1789.

    Segundo Norberto Bobbio, o Estado moderno, liberal e democrtico surgiu da

    reao contra o Estado absoluto.4 Para Bobbio, o problema fundamental do Estado

    constitucional moderno, que se desenvolve como uma anttese do Estado absoluto, o dos

    limites do poder estatal.

    VOLTAR

    1.4 CONSTITUCIONALISMO

    Conceito

    o estudo dos meios utilizados no processo da evoluo constitucional ao longo

    dos tempos.

    1.5 CONSTITUCIONALISMO MODERNO E CONTEMPORNEO

    O constitucionalismo moderno tem as suas origens nas revolues inglesa de

    1688, americana de 1776, e francesa de 1789, embora o seu embrio possa ser encontrado na

    Magna Carta de Joo Sem Terra, na Inglaterra, de 1215, posto que nela j se encontravam

    presentes alguns dos elementos essenciais do moderno constitucionalismo, quais sejam a

    limitao do poder do Estado e a garantia de alguns dos direitos fundamentais da pessoa

    humana.

    O constitucionalismo moderno, cujo nascimento coincidiu com o nascimento do

    Estado Liberal, decorreu, assim, da idia e da necessidade de submeter o Estado ao Direito,

    limitando as suas funes, estabelecendo a segurana nas relaes jurdicas e garantindo a

    proteo do indivduo contra o Estado. que o Estado, antes das revolues a que nos

    referimos, era absoluto. O soberano tudo podia e no se subordinava a ningum. partir das

    constituies modernas o estado, e, consequentemente, o soberano, vem-se submetidos

    constituio e ao princpio da separao dos poderes

    4 BOBBIO, Norberto. Direito e Estado no Pensamento de Emanuel Kant. Braslia: UNB, 1997, p. 15.

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    Para J.J.Gomes Canotilho, trs seriam as caractersticas principais do

    constitucionalismo moderno: I a ordenao jurdico-poltica estampada em documento escrito; II a declarao de direitos fundamentais e seu modo de garantia; III a organizao do poder poltico segundo esquemas tendentes a torn-lo limitado e moderado

    5.

    VOLTAR

    1.6 TIPOLOGIA

    Os tipos constitucionais diferem, pois existem Constituies sem qualquer

    preocupao com a liberdade e com os direitos individuais dos cidados, como, por exemplo,

    as Constituies dos pases totalitrios, verbi gratia a da China e a da ilha de Cuba, enquanto

    outras existem que priorizam os direitos individuais, dentre as quais a nossa Constituio.

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    1.7 CLASSIFICAO DOS TIPOS CONSTITUCIONAIS

    Quanto ao contedo: material e formal

    Constituio material o conjunto de regras constitucionais esparsas, codificadas

    ou no em um nico documento.

    J a Constituio, no seu conceito formal, consubstancia-se em um contedo

    normativo expresso, estabelecido pelo poder constituinte originrio em um documento solene

    que contm um conjunto de regras jurdicas estruturais e organizadoras dos rgos supremos

    do Estado.

    A diferena entre sentido material e sentido formal da Constituio que nesta

    temos a existncia estatal reduzida sua expresso jurdica formalizada atravs da codificao

    solene das normas constitucionais.

    Quanto forma: escrita e no escrita

    Constituio escrita o conjunto de regras codificado e sistematizado em um

    nico documento para fixar-se a organizao fundamental.6

    Caracteriza-se por ser a lei fundamental de um povo, colocada no pice da

    pirmide das normas legais, dotada de coercibilidade.

    Todas as Constituies brasileiras foram escritas, desde a Carta Imperial at a

    Constituio de 1988.

    Constituio no escrita o conjunto de normas constitucionais esparsas, baseado

    nos costumes, na jurisprudncia e em convenes. Exemplo: Constituio inglesa.

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    Quanto forma de elaborao: dogmticas e histricas

    Constituio dogmtica aquela que se nos apresentada de forma escrita e

    sistematizada, por um rgo constituinte, a partir de princpios e idias fundamentais da teoria

    poltica e do direito dominante em uma determinada sociedade.

    5 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituio. Coimbra: Almedina, 2002, pp.56.

    6 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. So Paulo: Atlas, 2001. p. 36.

  • 20

    Constituio histrica aquela que resulta da histria, dos costumes e da tradio

    de um povo.

    Quanto origem: promulgadas (democrticas e populares) e outorgadas

    A Constituio promulgada, tambm chamada de democrtica ou popular,

    aquela fruto do trabalho de uma Assemblia Nacional Constituinte, eleita pelo povo com a

    finalidade da sua elaborao. Exemplos: Constituies brasileiras de 1891, 1934, 1946 e

    1988.

    Constituio outorgada aquela estabelecida atravs da imposio do poder, do

    governante, sem a participao popular. Exemplos: Constituies brasileiras de 1824, 1937,

    1967 e a Emenda Constitucional de 1969.

    Quanto estabilidade: imutveis, rgidas, flexveis e semi-rgidas

    Constituio imutvel aquela onde vedada qualquer modificao. Essa

    imutabilidade pode ser, em alguns casos, relativa, quando prev a assim chamada limitao

    temporal, consistente em um prazo em que no se admitir qualquer alterao do legislador

    constituinte reformador.

    Constituio rgida aquela escrita, mas que pode ser alterada atravs de um

    processo legislativo mais solene e com maior grau de dificuldade do que aquele normalmente

    utilizado em outras espcies normativas. Exemplo: Constituio brasileira de 1988 (Ver artigo

    60 Emendas Constituio). Constituio flexvel aquela em regra no escrita e que pode ser alterada pelo

    processo legislativo ordinrio, sem qualquer outra exigncia ou solenidade.

    Constituio semi-rgida ou semiflexvel aquela que pode ter algumas de suas

    regras alteradas pelo processo legislativo ordinrio, enquanto outras somente podem s-las

    por um processo legislativo mais solene e com maior grau de dificuldade.

    Alexandre de Moraes entende que a Constituio brasileira de 1988 super-

    rgida, porque em regra poder ser alterada por um processo legislativo diferenciado, mas, excepcionalmente, em alguns pontos imutvel (CF, art. 60, 4

    o clusulas ptreas).7

    Quanto sua extenso e finalidade: analticas (dirigentes) e sintticas (negativas,

    garantias)

    Constituio analtica aquela que examina e regulamenta todos os assuntos

    relevantes formao, destinao e funcionamento do Estado. tambm chamada de

    Constituio dirigente porque define fins e programa de ao futura. Exemplo: Constituio

    brasileira de 1988.

    Constituio sinttica aquela que prev somente os princpios e as normas gerais

    de organizao do Estado e a limitao do seu poder atravs da fixao de direitos e garantias

    fundamentais para o cidado. Exemplo: a Constituio dos EUA.

    A Constituio brasileira , destarte, formal, escrita, dogmtica, promulgada,

    rgida e analtica.

    VOLTAR

    7 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. So Paulo: Atlas, 2001. p. 37.

  • 21

    2 O SISTEMA CONSTITUCIONAL

    Duas so as acepes de sistema constitucional admitidos pela doutrina: o sistema

    externo ou extrnseco, e o sistema interno ou intrnseco.

    O sistema extrnseco refere-se ao trabalho intelectual, cujo resultado forma um

    conjunto de conhecimentos logicamente classificados, ou, na lio de Kant, em Crtica da

    razo pura: entendo por sistema a unidade dos diversos conhecimentos debaixo de uma idia.

    Os requisitos do sistema extrnseco ou externo so de natureza puramente formal.

    O sistema intrnseco ou interno cuida do conhecimento do objeto, da sua

    sistematizao, da sua estruturao jurdica.

    A Constituio escrita sistematizada atravs de um conjunto de normas

    referentes s mais diversas matrias e finalidades buscadas pelo legislador constituinte. Tais

    normas, autnticas regras jurdicas, so agrupadas em ttulos, captulos e sees, formando um

    todo que se convencionou chamar de elementos constitucionais do Estado.

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    2.1 ESTRUTURA NORMATIVA

    Para Jos Afonso da Silva8 as Constituies contemporneas, em sua estrutura

    normativa, revelam cinco categorias de elementos destacveis: orgnicos; limitativos; scio-

    ideolgicos; de estabilizao constitucional; e, finalmente, formais de aplicabilidade.

    Elementos orgnicos: so aqueles contidos em normas jurdicas que regulam a

    estrutura e o funcionamento do poder estatal, sendo, portanto, fundamentais existncia do

    Estado. Na atual Constituio brasileira, tais elementos podem ser encontrados nos Ttulos III

    (Da Organizao do Estado), no Ttulo IV (Da Organizao dos Poderes e do Sistema de

    Governo), no Ttulo V, Captulos II e III (Das Foras Armadas e da Segurana Pblica), e no

    Ttulo VI (Da Tributao e do Oramento);

    Elementos limitativos: so aqueles que tm origem no liberalismo clssico, que

    busca estabelecer limites ao do Estado, assegurando um Estado de Direito onde os

    direitos individuais e coletivos devem estar presentes no texto constitucional.

    Na atual Constituio brasileira podemos encontrar esses elementos limitativos ao

    longo do Ttulo II (Dos Direitos e Garantias Fundamentais), exceo do Captulo II, que

    trata dos direitos sociais;

    Elementos scio-ideolgicos: no existiam nas primeiras Constituies escritas,

    porque elas tratavam exclusivamente da limitao ingerncia estatal. Tais elementos

    revelam a emergncia de um Estado Social, mais intervencionista que o velho Estado Liberal.

    O surgimento e emergncia do assim chamado Estado Social trazem como

    conseqncia governos de cunho intervencionista, cuja atividade governamental busca

    garantir a promoo dos direitos sociais voltados aos menos favorecidos, com aumento dos

    gastos pblicos e com o conseqente endividamento pblico.

    Na Constituio brasileira em vigor, vislumbramos os elementos scio-

    ideolgicos no Captulo II, do Ttulo II (Dos Direitos Sociais), e, tambm, nos Ttulos VII e

    VIII (Da Ordem Econmica Financeira e Da Ordem Social);

    Elementos de Estabilizao Constitucional: so aqueles que trazem nsitos a

    necessidade da proteo do texto constitucional, e, por isso mesmo, destinam-se defesa da 8 SILVA, Jos Afonso. Curso de direito constitucional positivo. So Paulo: Malheiros, 1992.

  • 22

    Constituio e soluo de conflitos constitucionais, garantindo os meios de efetivao e

    continuidade da norma constitucional.

    Na Constituio brasileira de 1988 encontramos esses elementos nos arts. 102, I,

    a, e 103 (relativos jurisdio constitucional), nos arts. 34 a 36 (Da Interveno nos Estados e

    Municpios), nos arts. 59, I, e 60 (referentes ao processo de emendas Constituio), e no

    Ttulo V, Captulo I (Do Estado de Defesa e do Estado de Stio);

    Elementos Formais de Aplicabilidade: so aqueles que dizem respeito formao

    das regras de aplicao das normas constitucionais.

    So, assim, elementos de aplicabilidade os artigos 1o ao 4

    o, que revelam

    princpios fundamentais da Constituio, assim tambm as disposies constitucionais

    transitrias.

    Tambm devemos considerar como elemento de aplicabilidade o 1o, do art. 5

    o,

    onde est disposto que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais tm

    aplicao imediata.

    Finalmente, encontramos no artigo 24 as regras para aplicao do federalismo

    cooperativo, que tambm representam elementos formais de aplicabilidade.

    VOLTAR

  • 23

    3 TEORIA DA NORMA CONSTITUCIONAL

    A teoria da norma constitucional cuida do estudo da aplicabilidade das normas

    constitucionais.

    Jos Afonso da Silva o autor mais aclamado e acatado em se tratando da

    classificao das normas em relao a sua aplicabilidade.

    Para o Mestre paulistano as normas constitucionais dividem-se em normas

    constitucionais de eficcia plena, contida e limitada9.

    Normas constitucionais de eficcia plena so

    aquelas que, desde a entrada em vigor da Constituio, produzem ou tm

    possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses,

    comportamentos e situaes, que o legislador constituinte, direta e normativamente,

    quis regular.10

    So, portanto, normas que no necessitam de regulamentao, sendo auto-

    aplicveis ou auto-executveis, como por exemplo, os remdios constitucionais: mandado de

    segurana, habeas corpus, mandado de injuno, habeas data.

    J as normas constitucionais de eficcia contida so aquelas

    que o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a

    determinada matria, mas deixou margem atuao restritiva por parte da

    competncia discricionria do poder pblico, nos termos que a lei estabelecer ou nos

    termos de conceitos gerais nela enunciados11

    .

    Vale dizer, a matria constitucional foi devidamente regulada, mas a sua aplicao

    est condicionada a prvia existncia de outra lei especfica que a discipline, assim previsto

    expressamente. Exemplo: Art. 5o, XIII: livre o exerccio de qualquer trabalho, ofcio ou profisso, atendidas as qualificaes profissionais que a lei estabelecer.

    Normas constitucionais de eficcia limitada so aquelas que apresentam

    aplicabilidade indireta, mediata e reduzida, porque somente incidem totalmente sobre esses interesses aps uma normatividade ulterior que lhe desenvolva a aplicabilidade.

    Isto quer dizer que esse tipo de norma constitucional, para entrar em vigor, vale

    dizer, para ter aplicabilidade prtica, depende de uma lei posterior que a regulamente.

    Ao lado da classificao de Jos Afonso da Silva, adotada pela maioria dos nossos

    doutrinadores, temos as chamadas normas programticas, que no tm aplicao ou execuo imediata, mas se constituem em comandos-regras, pois explicitam comandos-valor.

    Jorge Miranda12

    , mestre portugus da Universidade de Coimbra, diz que as

    normas programticas

    conferem elasticidade ao ordenamento constitucional; tm como destinatrio

    primacial embora no nico o legislador, a cuja opo fica a ponderao do tempo e dos meios em que vm a ser revestidas de plena eficcia (e nisso consiste a

    discricionariedade); no consentem que os cidados ou quaisquer cidados as

    invoquem j (ou imediatamente aps a entrada em vigor da Constituio), pedindo

    aos tribunais o seu cumprimento s por si, pelo que pode haver quem afirme que os

    direitos que delas constam, mxime os direitos sociais, tm mais natureza de

    9 SILVA, Jos Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais.Revista dos Tribunais, So Paulo, p. 89-91,

    1998. 10

    MORAES, Alexandre. Direito constitucional. So Paulo: Atlas, 2001. p. 39. 11

    Ibid., p. 39. 12

    MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. Coimbra: Coimbra Editora, 1997. v. 4.

  • 24

    expectativas que de verdadeiros direitos subjectivos; aparecem, muitas vezes,

    acompanhadas de conceitos indeterminados ou parcialmente indeterminados.

    Assim, na prtica, verificamos que as normas programticas so aquelas que no

    regulam diretamente interesses ou direitos nelas consagrados, mas, ao contrrio, limitam-se a

    traar preceitos que devem ser cumpridos pelo Poder Pblico.

    Trcio Sampaio Ferraz Jr.13

    , afirma que a eficcia tcnica, neste caso, limitada. E a eficcia social depende da prpria evoluo das situaes de fato. Da resulta uma

    aplicabilidade dependente. So exemplos de normas programticas os arts. 21, IX, 23, 170, 205, 211, 215 e

    218, da Constituio Federal.

    VOLTAR

    13

    FERRAZ JR., Trcio Sampaio. Interpretao e estudos da Constituio de 1988. So Paulo: Atlas, 1990.

  • 25

    4 HERMENUTICA E INTERPRETAO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

    A hermenutica constitucional tem por objetivo o estudo das tcnicas de

    interpretao da Constituio, fornecendo os princpios bsicos segundo os quais os

    operadores do Direito devem apreender o sentido das normas constitucionais.

    A interpretao constitucional, por outro lado, consiste no desvendar do

    significado da norma, com vistas aplicao em um determinado caso concreto.

    4.1 PRINCPIOS DE HERMENUTICA CONSTITUCIONAL

    A hermenutica estabelece princpios para se interpretar as regras constitucionais,

    que so os seguintes: a) princpio da Supremacia da Constituio; b) princpio da Unidade da

    Constituio; c) princpio da Imperatividade da Norma Constitucional; d) princpio da

    Simetria Constitucional; e) princpio da Presuno de Constitucionalidade das Normas

    Infraconstitucionais.

    a) Princpio da Supremacia das Normas Constitucionais

    As normas constitucionais so, sempre, superiores s demais normas no

    constitucionais, ou infraconstitucionais.

    A norma no constitucional, ou inferior, somente se torna vlida na medida em

    que feita em estrita obedincia ao procedimento legislativo que lhe adequado e que,

    tambm, preserva o fundamento bsico da supremacia das normas constitucionais que no

    admite a existncia de normas jurdicas conflitantes.

    Isto que dizer que, sob o ponto de vista normativo, a Constituio representa o

    pice de uma figura piramidal de hierarquizao da norma jurdica.

    Em outras palavras, a Constituio seria um conjunto de normas jurdicas

    superiores que determina a criao de todas as demais regras que integram o ordenamento

    jurdico estatal.

    Segundo Kelsen 14

    , o ordenamento jurdico no , portanto, um sistema jurdico de normas igualmente ordenadas, colocadas lado a lado, mas um ordenamento escalonado de

    vrias camadas de normas jurdicas.

    b) Princpio da Unidade da Constituio

    As normas constitucionais devem ser interpretadas de modo a se evitar qualquer

    tipo de contradio entre si.15

    Isto porque a Constituio no um aglomerado de normas constitucionais isoladas, mas, ao contrrio disso, forma um sistema orgnico, no qual cada

    parte tem de ser compreendida luz das demais.16 J.J. Gomes Canotilho ensina que este princpio obriga o intrprete a considerar a

    Constituio na sua globalidade e a procurar harmonizar os espaos de tenso existentes entre

    as normas constitucionais a concretizar.17

    14

    KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Revista dos Tribunais, So Paulo, p. 103, 2003, 15

    ZIMMERMANN, Augusto. Curso de direito constitucional. Rio de Janeiro: Lmen Juris, 2002. p. 138. 16

    SARMENTO, Daniel. A ponderao de interesses na Constituio Federal. RJ: Lmen Juris, 2002. p. 100. 17

    CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituio. Coimbra: Almedina, 1997. p.232.

  • 26

    por meio dessa viso unitria que fica consagrada a interdependncia entre as

    normas constitucionais.

    c) Princpio da Imperatividade (ou da Mxima Efetividade) da Norma

    Constitucional

    Sendo a norma constitucional de ordem pblica e de carter imperativo, emanada

    que da vontade popular, o intrprete deve lhe conferir o mximo de efetividade no momento

    de sua aplicao.

    Para Rui Barbosa (apud Zimmermann, 2002), a hermenutica da norma

    constitucional devia ser o mais ampla possvel, pois para ele nas questes de liberdade, na inteligncia das garantias constitucionais, no cabe a hermenutica restritiva.18

    d) Princpio da Simetria Constitucional

    Este princpio postula que haja uma relao simtrica entre as normas jurdicas da

    Constituio Federal e as regras estabelecidas nas Constituies Estaduais, e mesmo

    Municipais. Isto quer dizer que no sistema federativo, ainda que os Estados-Membros e os

    Municpios tenham capacidade de auto-organizar-se, esta auto-organizao se sujeita aos

    limites estabelecidos pela prpria Constituio Federal.

    Assim, pelo princpio da simetria, os Estados-Membros se organizam obedecendo

    ao mesmo modelo constitucional adotado pela Unio. Por este princpio, por exemplo, as

    unidades federativas devem estruturar seus governos de acordo com o princpio da separao

    de poderes.

    e) Princpio da Presuno de Constitucionalidade das Normas

    Infraconstitucionais

    Segundo este princpio, todas as normas jurdicas infraconstitucionais possuem a

    presuno de constitucionalidade at que o controle judicial se manifeste em contrrio.

    Trata-se, portanto, da presuno juris tantum, posto que a norma

    infraconstitucional possui eficcia jurdica at que se prove o contrrio.

    Este princpio decorre do prprio Estado de Direito, da separao de Poderes, pois

    a prpria Constituio que delega poderes ao Poder Legislativo para editar normas

    ordinrias, infraconstitucionais, que lhe do plena operatividade, e o Legislativo assim o faz

    na convico de que est a respeitar a Constituio, na presuno de que as leis que elaborou

    e que foram promulgadas so, efetivamente, constitucionais, devendo a quem argi a sua

    inconstitucionalidade perante o Poder Judicirio provar o vcio que alega, e a declarao de

    inconstitucionalidade das normas ordinrias somente deve ocorrer quando afastada toda e

    qualquer dvida quanto sua incompatibilidade com a Constituio.

    VOLTAR

    18

    BARBOSA, Rui. Comentrios Constituio Federal Brasileira. So Paulo: Saraiva, 1993, p. 495, 506 e 516,

    v.5.

  • 27

    4.2 INTERPRETAO DA CONSTITUIO

    No entendimento clssico de Savigny, interpretao a reconstruo do contedo

    da lei, sua elucidao, de modo a operar-se uma restituio de sentido ao texto viciado ou

    obscuro.

    Noutras palavras, trata-se de operao lgica, de carter tcnico, atravs do qual

    busca-se investigar o sentido exato da norma jurdica imprecisa ou no muito clara.

    Para Felice Battaglia, jurista italiano, o momento da interpretao vincula a norma geral s conexes concretas, conduz do abstrato ao concreto, insere a realidade no

    esquema19. Reis Friede adverte que os problemas de interpretao constitucional, em certa

    medida, so mais amplos e complexos do que aqueles afetos lei comum, at porque, sob

    certa tica, tambm repercutem sobre todo o ordenamento jurdico.20 VOLTAR

    4.2.1 FORMAS DE INTERPRETAO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

    Todos os cidados tm o direito de buscar interpretar a Constituio, as normas

    constitucionais. O Poder Legislativo o faz quando elabora uma lei complementar

    Constituio ou mesmo quando estabelece regras para as suas futuras interpretaes. O Poder

    Judicirio, por seu turno, interpreta a norma constitucional quando, instado por uma Ao

    Direta de Inconstitucionalidade ADIN ou mesmo por uma Ao Declaratria de Constitucionalidade ADC , emite uma deciso.

    VOLTAR

    4.3 FONTE DE INTERPRETAO CONSTITUCIONAL

    a) Interpretao autntica

    Ocorre quando o legislador constituinte interpreta as normas constitucionais por

    ele mesmo elaboradas. Nesta interpretao, o legislador constituinte busca extrair o verdadeiro significado da norma jurdica, revelando-nos o mbito de sua atuao (Zimmermann, 2002, p.142).

    b) Interpretao Doutrinria

    aquela levada a efeito pelos estudiosos do Direito Constitucional. Segundo

    Paulo Bonavides,

    a interpretao doutrinria aquela que deriva da doutrina, dos doutores, dos

    mestres e teoristas do direito, dos que, mediante obras, pareceres, estudos e ensaios

    jurdicos intentam precisar, a uma nova luz, o contedo e os fins da norma, ou abrir-

    lhe caminhos de aplicao a situaes inditas ou de todo imprevistas.21

    19

    BATTAGLIA, Felice. Curso de filosofia del derecho. Madrid, 1951. p. 151. v. 2. 20

    FRIEDE, Reis. Lies Objetivas de direito constitucional. So Paulo: Saraiva, 1999. p. 73. 21

    BONAVIDES, Paulo. Direito constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 1986. p. 270.

  • 28

    c) Interpretao Judicial

    aquela emanada pelo magistrado, na aplicao da norma legal.

    Desta interpretao surgem decises de efeitos prticos e definitivos, quer para a

    sociedade como um todo, como, por exemplo, no caso de controle judicial da norma

    constitucional in abstracto, atravs de uma ao direta de inconstitucionalidade, ou apenas

    para as pessoas submetidas ao processo jurisdicional concreto, incidental.

    VOLTAR

    4.4 MTODOS CLSSICOS DE INTERPRETAO CONSTITUCIONAL

    So as diferentes possibilidades de se analisar as normas constitucionais dentro de

    um plano metodolgico.

    a) Da Interpretao Gramatical (ou literal)

    Meio atravs do qual busca-se aferir o significado literal da norma jurdica por

    meio de uma interpretao que leve em considerao o exame das palavras e das regras

    gramaticais vigentes poca da elaborao do texto legal.

    meio fundamental como etapa preliminar a toda interpretao jurdica, no

    devendo ser utilizado unicamente, contudo, como meio de interpretao.

    O Juiz Black, da Suprema Corte dos Estados Unidos, foi um dos principais

    defensores da interpretao literal, dizendo que tal meio de interpretao visava restringir o apetite de alguns juzes em extrapolar os limites constitucionais e impor suas prprias

    preferncias, utilizando-se de argumentos retirados do direito natural ou do devido processo

    legal.22

    b) Da Interpretao Lgica ou Racional

    aquela que, na lio de Paulo Bonavides,

    sobre examinar a lei em conexidade com as demais leis, investiga-lhe tambm as

    condies e os fundamentos de sua origem e elaborao, de modo a determinar a

    ratio ou mens do legislador. Busca, portanto reconstruir o pensamento ou inteno

    de quem legislou, de modo a alcanar depois a precisa vontade da lei.23

    Esse mtodo est sintetizado pela locuo inteno do legislador, subdividindo-

    se em cinco:

    Mens legis busca verificar o que o legislador realmente disse, independentemente de suas intenes;

    Mens legislatori busca verificar, ao contrrio do anterior, o que o legislador quis efetivamente dizer, independentemente do que acabou efetivamente dizendo;

    Ocasio legis conjunto de circunstncias que determinaram a criao da lei;

    22

    ZIMMERMANN, 2002, p. 144. 23

    BONAVIDES, 1986, p. 272.

  • 29

    O argumento a contrario sensu componente da interpretao lgica que utiliza o fato de que a lei sempre faculta a concluso pela excluso, dada a regra hermenutica

    que afirma que as excees devem vir sempre expressas; e, por fim,

    O argumento a fortiori pode ser resumido pela mxima do Direito segundo a qual quem pode o mais pode o menos.

    Este mtodo de interpretao deve ser utilizado imediatamente aps a

    interpretao gramatical ou literal, independentemente da aparente soluo definitiva que esta

    possa ter sugerido ao intrprete.

    c) Da Interpretao Sistemtica

    As normas jurdicas esto dispostas em captulos, ttulos, livros e artigos, onde se

    encontram indicados o assunto e, conseqentemente, o direito tutelado.

    A interpretao sistemtica, assim, consiste no propsito de resolver eventuais

    conflitos de normas jurdicas, examinando-as sob a tica de sua localizao junto ao direito

    que tutela.24

    Com este mtodo devemos interpretar a norma constitucional vendo-o como um

    todo lgico e harmnico.

    Destarte, a interpretao da Constituio deve ser feita de modo a se permitir que

    as normas constitucionais sejam compatveis entre si.25

    d) Da Interpretao Histrica

    Mtodo atravs do qual o intrprete busca o conhecimento evolutivo (histrico) da

    ambincia em que se originou a lei e da linguagem utilizada na redao do texto legal, de

    modo a se chegar essncia do dispositivo normativo, o verdadeiro significado da lei.

    e) Da Interpretao Sociolgica ou Teleolgica

    Busca interpretar as leis com vistas a sua melhor aplicao na sociedade. Este tipo

    de interpretao, no dizer de Zimmermann,

    permite a alterao da ratio legis, possibilitando ao intrprete conferir um novo

    sentido norma, contrapondo-se ao sentido original da mesma e otimizando o

    cumprimento da sua finalidade.

    Afirma, com propriedade, o Professor Reis Friede que

    por esta razo, deve ser sempre observado em ltimo lugar, evitando os elevados

    riscos de que o intrprete acabe por se confundir com o prprio legislador, criando

    normas jurdicas onde no existam ou, no mnimo, deturpando o verdadeiro

    significado das j existentes. 26

    VOLTAR

    24

    FRIEDE, Reis. Cincia do direito, norma, interpretao e hermenutica jurdica. Rio de Janeiro: Forense,

    2002. p. 158. 25

    ZIMMERMANN, 2002, p. 146. 26

    FRIEDE, op.cit., p. 159.

  • 30

    5 A NORMA CONSTITUCIONAL NO TEMPO E A SUA APLICAO

    Com os anos, a norma constitucional, como qualquer norma jurdica, pode ser alterada

    ou mesmo substituda por outra.

    O surgimento de nova norma constitucional pode levar, mas no leva,

    necessariamente, revogao da legislao anterior. Tal fato gera trs fenmenos jurdicos

    distintos que dizem respeito aplicabilidade das novas normas constitucionais no tempo, em

    contraponto s normas constitucionais anteriores sua existncia: a recepo, a repristinao

    e a desconstitucionalizao.

    5.1 A RECEPO por esse fenmeno jurdico a norma jurdica infraconstitucional entendida como compatvel com o novo texto constitucional, condicionada a sua interpretao

    e o seu significado aos novos parmetros estabelecidos pela nova ordem constitucional. Destarte, diz-se que a norma foi recepcionada pela nova Constituio, vale dizer, que foi

    acolhida e incorporada nova ordem constitucional porque compatvel com os termos da

    nova Constituio.

    Essa recepo vem ao encontro do princpio da segurana jurdica e mesmo da

    economia legislativa, uma vez que inexiste razo tcnico-jurdica para a retirada da norma

    infraconstitucional em perfeita harmonia com o novo ordenamento constitucional.

    5.2 A REPRISTINAO por esse outro fenmeno jurdico, uma norma infraconstitucional anteriormente revogada, de maneira tcita, pela anterior ordem jurdica,

    restaurada pela nova ordem constitucional. Significa, pois, a revalidao de uma norma

    revogada pela Constituio mas que se apresenta compatvel com a nova Carta

    Constitucional.

    A repristinao, por razes de segurana jurdica, somente admissvel em nosso

    sistema jurdico se e quando expressamente prevista e autorizada.

    5.3 A DESCONSTITUCIONALIZAO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS fenmeno ainda no inteiramente absorvido pela doutrina, contestado mesmo por uma grande

    parte dos doutrinadores, segundo o qual algumas normas da Constituio anterior

    permaneceriam vigentes sob a forma de lei ordinria. Ocorre quando a nova ordem

    constitucional se queda silente sobre algumas normas constantes da Constituio anterior,

    deixando de revog-la, tcita ou expressamente, permitindo, assim, que continue a viger como

    lei infraconstitucional.

    Os que no admitem esse fenmeno da desconstitucionalizao alegam, com razo ao

    nosso sentir, que o efeito mais forte e visvel de uma nova Constituio , exatamente, o de

    revogar a anterior, o que ocorre de forma integral, plena. Assim, todas as normas

    constitucionais da Constituio anterior so revogadas plenamente pelo novel ordem

    constitucional, no podendo ser absorvidas de nenhuma forma.

    VOLTAR

  • 31

    6 O PREMBULO CONSTITUCIONAL

    A sua utilidade consiste em esclarecer o sentido ideolgico da Constituio escrita

    que se examina, traduzindo-se, assim, em autntico subsdio hermenutica constitucional,

    pois, traz em si, de forma sinttica, os anseios e aspiraes do legislador constituinte.

    Julian Barraquero27

    , constitucionalista argentino, diz que o prembulo

    constitucional uma espcie de resumo da Constituio, em que se consignam de uma maneira geral

    os princpios que lhe servem de norma. a melhor chave para interpretar uma

    constituio porque explica os motivos e fins que teve em vista ao formul-la.

    Entre ns, Luiz Pinto Ferreira considera o prembulo constitucional como parte

    integrante da Constituio, porque, segundo ele, revelaria a verdadeira inteno do legislador 28.

    O professor e doutrinador Paulino Jacques tem entendimento diferente ao acima

    esposado, pois considera o prembulo constitucional um mero princpio constitucional, e no

    como norma jurdica, pois, segundo o Mestre, ningum poder ingressar em juzo com ao fundada, nica e exclusivamente, no prembulo, que no contm normas jurdicas, mas

    princpios que no autorizam a ao judiciaI. VOLTAR

    O PREMBULO DA CONSTITUIO FEDERAL BRASILEIRA DE 1988

    O prembulo da nossa Constituio Federal de 1988 revela o anseio do legislador

    constituinte brasileiro na construo de valores democrticos e pluralistas do liberalismo

    poltico e a vontade de que o Estado venha promover o bem-estar geral, numa perspectiva que seria mais propriamente a do intervencionismo estatal de natureza social-democrtica 29.

    Assim que o prembulo da nossa Constituio Federal revela e consagra os

    princpios do Estado Democrtico de Direito dentro de uma viso de governo representativo,

    da consagrao dos direitos individuais, e dos mecanismos jurdicos de aumento dos direitos e

    garantias sociais:

    Prembulo

    Ns, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assemblia Nacional

    Constituinte para instituir um Estado Democrtico, destinado a assegurar o exerccio

    dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurana, o bem-estar, o

    desenvolvimento, a igualdade e a justia como valores supremos de uma sociedade

    fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida,

    na ordem interna e internacional, com a soluo pacfica das controvrsias,

    promulgamos, sob a proteo de Deus, a seguinte Constituio da Repblica

    Federativa do Brasil.

    Registre-se que a Constituio no pode ser interpretada ou aplicada de forma

    contrria ao seu esprito, de forma contrria ao texto expresso no seu prembulo.

    VOLTAR

    27

    Espiritu y pratica de la constitucin argentina, p. 53. 28

    ZIMMERMANN, 2002, p. 71 29

    ZIMMERMANN, 2002, p.154.

  • 32

    7 A EVOLUO CONSTITUCIONAL BRASILEIRA

    A Constituio de 1824

    Com a Proclamao da Independncia do Brasil, em 7 de setembro de 1822,

    surgiu a necessidade da estruturao de um poder centralizador para o Imprio que emergia,

    de modo a manter a unidade nacional.

    Na discusso de idias acerca da melhor forma poltica para a nova Nao, dois

    grupos polticos se destacaram com idias e propostas diametralmente opostas. Esses grupos,

    que antes marcharam unidos na luta pela independncia do Brasil, divergiam quanto aos

    destinos do Pas. O grupo encabeado por Jos Bonifcio de Andrada e Silva, de tendncia

    mais conservadora, propunha um governo forte, centralizador no seu aspecto administrativo,

    onde o monarca era o Chefe de Estado e, ao mesmo tempo, Chefe de Governo, enquanto o

    grupo mais liberal, encabeado por Gonalves Ledo, defendia a monarquia constitucional

    representativa, onde o Parlamento seria o poder mais forte e importante, e propunha, ainda, a

    liberdade de expresso, de iniciativa, a descentralizao administrativa e a ampla autonomia

    das provncias.

    Vencendo a disputa, Bonifcio inicia uma perseguio a Gonalves Ledo e

    maonaria por ele liderada. Ledo foi obrigado a refugiar-se em Buenos Aires.

    Em meio a essa crise acontece a coroao de D. Pedro I, aclamado como o

    Imperador e Defensor Perptuo do Brasil, ainda em 1822.

    Dom Pedro I chegou a convocar uma Assemblia Constituinte para discutir a

    primeira Constituio do Brasil, onde a proposta federativa foi discutida exausto, mas,

    considerando que os constituintes de 1823 estavam criando uma Constituio que no era do

    seu agrado, restringindo os seus poderes e deixando de propor a criao do Poder Moderador,

    como queria, o monarca determinou a dissoluo, fora, da Assemblia Constituinte,

    passando para a histria como o primeiro e nico dos mandatrios brasileiros a cometer tal ato

    de fora.

    Assim, em 1824, no ano seguinte, portanto, o Imperador outorgou uma

    Constituio para o Pas, criando mecanismos polticos-institucionais que representaram o

    triunfo da centralizao proposta por Jos Bonifcio sobre o anseio federativo de Ledo.

    Essa Constituio Imperial de 1824 teve forte influncia da Constituio da

    Frana de 1814, e iniciou o hbito de se fazer Constituies analticas.

    A Constituio outorgada de 1824, consagrando o unitarismo, dividiu o Pas em

    vinte provncias inteiramente subordinadas ao poder central, e dirigidas por Presidentes

    escolhidos e nomeados pelo Imperador, demissveis ad nutum. Criou, ademais, os chamados

    Conselhos Gerais das Provncias, embrio do que viria ser mais tarde o Poder Legislativo, s

    que com pouqussimas atribuies.

    Por essa Constituio todo o aparelho poltico estava voltado para o Poder

    Moderador, controlado unicamente pelo Imperador. Assim, Dom Pedro I no somente

    reinava, mas tambm governava, e acumulava os Poderes Executivo e Moderador, o que veio

    a trazer, como esperado, a concentrao excessiva de poder pelo Monarca.

    No segundo reinado, j com o Imperador Dom Pedro II, o Brasil viveu a sua

    primeira experincia parlamentarista, de origem costumeira, uma vez que no estava prevista

    na Constituio Imperial.

    Dom Pedro II, ao contrrio de seu pai, jamais usou o Poder Moderador de forma

    abusiva. Com o golpe militar de 15 de novembro de 1889, comandado por Deodoro da

    Fonseca, Ministro da Guerra de Pedro II, surge a Repblica Federativa do Brasil.

    VOLTAR

  • 33

    A Primeira Repblica e a Constituio de 1891 A Repblica foi instaurada no Pas muito mais pela necessidade da implantao

    do federalismo do que por oposio forma monrquica do governo de Pedro II, mesmo

    porque este era respeitado pela sua inteligncia, pela sua moderao e pela sua honestidade.

    Dom Pedro II morreu pobre, conquanto tenha governado o Pas por mais de cinqenta (50)

    anos.

    E a prova desta assertiva est no Decreto Republicano de 15/11/1889, elaborado

    por Rui Barbosa, que logo no seu primeiro artigo assim dispunha: Art. 1o As Provncias do Brasil, reunidas pelo lao da federao, ficam constituindo os Estados Unidos do Brasil.

    E no seu artigo 2 dispunha que As antigas Provncias sero consideradas Estados.

    A nossa Federao teve como modelo a Constituio americana de 1787,

    caracterizando-se por ser um federalismo dualista e estabelecendo a igualdade jurdica entre

    todos os novos Estados-membros.

    Para Rui Barbosa, a adoo do modelo federativo americano se impunha para dar

    feio liberal nova Constituio Republicana. Segundo esse ilustre jurista baiano fora dela s teramos a democracia helvtica, intransplantvel para estados vastos, e os ensaios

    efmeros da Frana, tipo infeliz, alm do oposto s condies de um pas naturalmente

    federativo como o nosso.30 Atravs do Decreto n 78-B, de 21/12/1889, o Governo Provisrio convocou uma

    Assemblia Constituinte para ser instalada no dia 15/11/1890.

    Este mesmo Governo Provisrio, antes mesmo de convocar uma Assemblia

    Constituinte, j havia nomeado, atravs do Decreto n 29, uma Comisso formada de cinco

    membros para elaborar um anteprojeto para servir de base aos debates da referida Assemblia,

    sendo, pois, o seu ponto de partida. Aps receber o anteprojeto da Comisso dos cinco, o Governo Provisrio decidiu que Rui Barbosa deveria retoc-lo antes de ser apreciado pela

    Assemblia Constituinte.

    Em 15 de novembro de 1890 comearam as sesses da Assemblia Constituinte, e

    em 22/11/1890 procedeu-se escolha de uma comisso de 21 deputados e senadores, um de

    cada Estado e um do Distrito Federal, para que emitissem parecer sobre o Projeto do Governo

    Provisrio, devidamente retocado por Rui.

    O parecer dessa Comisso foi apresentado em 10/12/1890, e os debates duraram

    at 23/02/1891, sendo no dia imediatamente seguinte, vale dizer, 24/02/1891, promulgada a

    Constituio Republicana, de cunho liberal e sinttica, com 91 artigos e 8 disposies

    transitrias.

    A primeira Constituio Republicana brasileira foi promulgada em 1891, e

    representou uma ruptura com a antiga ordem poltica imperial, porque, confirmando o

    federalismo dual, concedeu autonomia aos estados, s antigas provncias, consagrou a

    tripartio dos poderes proposta por Montesquieu, desconheceu privilgios, separou o Estado

    da Igreja, garantiu o direito de propriedade, e muitos direitos e garantias fundamentais, dentre

    os quais o habeas corpus, a livre manifestao de pensamento, a inviolabilidade do domiclio,

    a liberdade de associao, etc.

    Segundo o historiador Jos Maria Bello, na sua obra Histria da Repblica,

    Com a Constituinte de 1891, realizava o Brasil, enfim, os seus sonhos republicanos e

    federalistas. O projeto apresentado pelo Governo modelava-se pela Constituio dos

    Estados Unidos. Vivas eram as influncias argentinas, e muito mais atenuadas as da

    Confederao sua. Em vez dos doutrinadores franceses e ingleses de outrora, os

    publicistas norte-americanos. Como os homens de 1824, os de 1891 acreditavam

    30

    BARBOSA, Rui. Cartas da Inglaterra. So Paulo: Saraiva, 1929, p. 167.

  • 34

    religiosamente nas frmulas do liberalismo poltico. Embutia-se o Brasil no molde

    norte-americano, como, outrora, o tinham enquadrado no constitucionalismo

    francs. Da extrema centralizao para o mais largo federalismo, eis o salto que ele

    ia dar.31

    De se lamentar que a 1

    a Constituio Republicana brasileira, de feio nitidamente

    liberal e democrtica, tenha sido to desrespeitada pelos presidentes da poca, a comear por

    Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, respectivamente, primeiro e segundo presidentes do

    Brasil. O primeiro inaugurou a dissoluo do Congresso Nacional, e decretou estado de stio. O segundo, igualmente militar, tambm desrespeitou a Constituio, uma vez que, na

    condio de vice-presidente de Deodoro, e com a sua morte, deveria ter convocado eleies

    presidenciais, como determinava a Constituio, mas, em vez disso, optou por assumir, ao arrepio da Lei, o cargo de Presidente at o fim do que seria o mandato de Deodoro.

    Os demais presidentes que se lhe seguiram Prudente de Moraes (15/11/1894 a 15/11/1898), Campos Salles (15/11/1898 a 15/11/1902), Rodrigues Alves (15/11/1902 a

    15/11/1906), Affonso Penna (15/11/1906 a 15/11/1910), Hermes da Fonseca (15/11/1910 a

    15/11/1914), Wenceslau Braz (15/11/1914 a 15/11/1918), Delfim Moreira (15/11/1918 a

    28/07/1919), Epitcio Pessoa (28/07/1919 a 15/11/1922), Arthur Bernardes (15/11/1922 a

    15/11/1926) e Washington Lus (15/11/1926 a 24/10/1930) tambm agiram de forma ditatorial, uns mais, outros menos.

    Para Augusto Zimmermman32

    o domnio presidencial, em no raros momentos, transformava o chefe do Executivo

    em um ditador de fato. Os polticos de Minas Gerais e So Paulo, aliando-se para a

    finalidade de elegerem os seus candidatos presidncia da repblica, assumiram

    rapidamente a liderana do Pas, submetendo a nao vontade destas oligarquias

    regionais.

    Assim, aos poucos, os ideais e a eficcia jurdica da Carta Constitucional de 1891

    foi ruindo, e o federalismo, na prtica, ficou desmoralizado.

    Em 1926 foi efetuada uma reforma constitucional, de modo a tentar amenizar as

    inmeras contestaes sociais que assolavam o Pas, mas sem xito, mesmo porque algumas

    das reformas introduzidas tinham contedo claramente autoritrio e centralizador, pois que

    restringia a competncia da justia federal e limitava a garantia do habeas corpus to somente

    aos casos de priso ou de ameaa de constrangimento ilegal liberdade de locomoo, dentre

    outras limitaes.

    A revoluo de 1930 colocou fim assim chamada Repblica Velha, e, com ela, a Constituio de 1891.

    VOLTAR

    A Revoluo de 1930 e a Constituio de 1934

    Quando, em 1930, o Presidente Washington Lus escolheu mais um paulista, Jlio

    Prestes, para suced-lo, a oligarquia mineira se rebelou entendendo ter sido desrespeitada a

    chamada poltica do caf com leite, resultante do constante rodzio de presidentes paulistas o caf , e mineiros o leite , juntando-se aos fluminenses, gachos e a polticos de outros estados do Nordeste, formando a famosa Aliana Liberal em torno da candidatura de Getlio

    Vargas, gacho, ex-Ministro da Fazenda de Washington Lus.

    31

    BELLO, Jos Maria. Histria da Repblica. So Paulo: Cia Editora Nacional, 1954, p. 83. 32

    ZIMMERMANN, 2002, p. 168.

  • 35

    Com a derrota da Aliana Liberal e com a continuao da desordem no Pas

    agravada pela grave situao econmica, jovens tenentes e jovens dissidentes da oligarquia

    dominante partiram para a luta armada, e, em 3 de novembro de 1930, Getlio Vargas e os

    seus jovens tenentes marcharam sobre o Rio de Janeiro, assumindo o poder uma Junta

    Pacificadora, que ento j havia derrubado o Presidente Washington Lus.

    Atravs de um Decreto, editado em 11/11/1930, Getlio Vargas passou a exercer

    os poderes Executivo e Legislativo, dissolvendo o Congresso Nacional, as Assemblias

    Legislativas Estaduais e as Cmaras Municipais, acabando de vez com os ltimos resqucios

    da incipiente democracia brasileira. Todos os governadores de estado foram afastados e

    substitudos por interventores federais, recrutados, na sua maioria, dentre os tenentes que

    apoiaram o Golpe de Estado, e que obedeciam cegamente as ordens de Getlio Vargas.

    Depois de mais de um ano e meio da revoluo, estando o Brasil administrado

    ainda sob mtodos arbitrrios e antidemocrticos, comearam a surgir focos de resistncia e

    rebeldia a partir de So Paulo, em favor da sua redemocratizao. Surge da a Revoluo

    Constitucionalista, de pequena e efmera existncia, sufocada que foi pelas tropas leais ao

    Governo.

    Mesmo tendo sido um fiasco do ponto de vista militar, a Revoluo

    Constitucionalista foi um sucesso do ponto de vista poltico, pois forou Getlio a consentir

    na elaborao de uma nova Constituio para o Pas, em 1933, e que marcaria o retorno do

    Brasil normalidade democrtica.

    A nova Constituio, a segunda Constituio da Repblica, promulgada em

    16/07/1934, era analtica, contendo mais do dobro das disposies presentes na de 1891. Foi

    ela fortemente influenciada pela Constituio de Weimar, alem, e pelo fascismo, conquanto

    trouxesse, poca, um grande avano do Pas para o chamado Estado Social.

    Por esta Constituio foi introduzido no Brasil o voto para as mulheres, a

    obrigatoriedade e gratuidade do ensino primrio, a criao do mandado de segurana, a

    instituio do salrio-mnimo, a criao da Justia do Trabalho, as frias anuais remuneradas,

    dentre outras.

    Noutra linha, a Constituio de 1934 autorizou a Unio a monopolizar as riquezas

    do subsolo o petrleo, o ouro , das guas e da energia hidrulica, e na economia visava a monopolizar, de forma progressiva, os Bancos de depsito, amparar e estimular a produo e

    estabelecer novas condies de trabalho. Concedeu, ainda, autonomia aos Municpios como

    instrumento de descentralizao e democratizao do Estado.

    O mestre Paulo Bonavides, a respeito desta nova Constituio, assim se

    pronunciou:

    A Carta de 1934 uma colcha de retalhos, em que pese seu brilhantismo jurdico e

    sua lio histrica. Princpios antagnicos (formulados antagonicamente, inclusive)

    so postos de lado. Eles marcam duas tendncias claramente definidas, dois projetos

    polticos diversos. Um deles haveria de prevalecer. O que efetivamente aconteceu:

    sobreveio a ditadura getulista a partir de 1937. O texto de 1934 est marcado de

    indecises e ambigidades. No possvel delinear a partir dele um projeto poltico

    hegemnico para o pas. Essa hegemonia ento questo de vida ou morte. Se ela no

    pode ser resolvida no plenrio, teve de s-lo com a ajuda das articulaes de

    bastidores e das falsificaes histricas para no dizer com a fora das armas. A

    Constituio de 1937 o registro definitivo da derrocada da tendncia liberal.33

    Getlio Vargas, conquanto tivesse reduzido gravemente os direitos individuais

    dos cidados, do ponto de vista poltico, como um presidente-ditador legou inmeras

    33

    BONAVIDES, Paulo. Poltica e Constituio: os caminhos da democracia. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p.

    320-321.

  • 36

    conquistas sociais para os trabalhadores, ainda que de forma ditatorial, reforando, assim, o seu desprezo pela democracia e, ao mesmo tempo, a imagem paternalista e personificadora do

    Poder Estatal.

    Assim, a outorga dos direitos sociais, que no foram introduzidos graas luta

    poltica, mas por obra e vontade do ditador, acabou por gerar o saudosismo popular para com

    as ditaduras; fenmeno reforado com o regime militar.34

    VOLTAR

    O Estado Novo e a Constituio de 1937

    Em 10/11/1937, o Presidente Getlio Vargas, dando um autogolpe, outorgou uma

    nova Constituio ao Pas, de feio nitidamente ditatorial, inteiramente redigida pelo ex-

    Deputado Federal por Minas Gerais Francisco Campos.

    Essa Constituio de 1937 ficou conhecida como Carta Polaca, em virtude da

    grande semelhana que guardava com a fascista Constituio da Polnia, de 1935, outorgada

    pelo Marechal Pilsudsky.

    O presidente/ditador interveio nos estados-membros afastando todos os

    governadores e designando, em seus lugares, interventores nomeados, escolhidos, na sua

    maioria, entre os tenentes do exrcito que o ajudaram a derrotar a Aliana Liberal, em 1930, e

    que apoiaram o seu autogolpe.

    A Constituio outorgada de 1937, a Polaca, carecia de vrios dispositivos de garantia dos direitos fundamentais, como, por exemplo, o mandado de segurana e o direito

    de manifestao de pensamento. E, pior, foi instituda a pena de morte para crimes polticos e

    homicdios considerados mais graves.

    Como se isso no bastasse, foi suprimido o nome de Deus do prembulo; conferiu

    amplos poderes ao Presidente da Repblica; ampliou o prazo do mandato presidencial, criou o

    estado de emergncia para a restrio temporria das garantias individuais; estabeleceu o

    plebiscito para aprovao da Constituio outorgada (que acabaria no sendo realizado);

    dissolveu o Congresso Nacional e as Assemblias estaduais; restringiu as prerrogativas do

    novo Congresso a ser instalado (e que nunca o foi), e a autonomia do Poder Judicirio; mudou

    o nome do Senado para Conselho Federal; eliminou a autonomia dos Estados-Membros.

    Segundo Pinto Ferreira, a Constituio Federal de 1937 nunca foi

    verdadeiramente cumprida. Para ele,

    dissolvidos os rgos do Poder Legislativo, tanto da Unio como dos Estados-

    Membros, dominou a vontade desptica do presidente, transformado em caudilho,

    maneira do caudilhismo dominante nas Repblicas latino-americanas. Os Estados-

    Membros viveram sob o regime da interveno federal, os interventores sendo na

    verdade delegados do presidente. As liberdades de imprensa e de opinio foram

    amordaadas e tambm dissolvidos os partidos polticos.35

    VOLTAR

    A democracia e a Constituio de 1946

    A derrota da aliana nazi-fascista, envolvendo a Alemanha e a Itlia, na Segunda

    Guerra, que inicialmente era simptica ao ento ditador brasileiro fez com que crescessem as

    presses internas para a reconquista das liberdades democrticas, criando um clima

    verdadeiramente hostil ao presidente/ditador Getlio Vargas.

    34

    ZIMMERMMAN, 2002, p. 173-174. 35

    PINTO FERREIRA. Curso de direito constitucional. So Paulo: Saraiva, 1996. p. 57.

  • 37

    Submetido presso de juristas, intelectuais e de parcela da populao, Getlio

    v-se obrigado a fazer emendas Constituio outorgada em 1937, abrindo, ainda que

    timidamente, o regime.

    Assim que editou a Lei Constitucional n 9, em fevereiro de 1945, contendo

    vrias emendas Constituio, sendo a mais importante delas a que fixava eleies diretas

    para o ms de dezembro do mesmo ano. Demais disso, em abril de 1945 concedeu liberdade

    aos presos polticos, dentre eles Luis Carlos Prestes, o Cavaleiro da Esperana, presidente do

    proscrito Partido Comunista Brasileiro PCB , que, em uma jogada poltica uniu-se ao seu algoz, durante a campanha eleitoral, em um movimento denominado queremista que tinha por

    objetivo manter o Presidente Vargas no poder.

    Em 29 de outubro de 1945, antes mesmo das eleies, e quatro dias aps a

    nomeao do seu irmo Benjamim Vargas para chefe de polcia do Rio de Janeiro, ento

    Distrito Federal, Getlio Vargas era deposto pelos militares, chefiados pelos Generais Eurico

    Gaspar Dutra e Ges Monteiro, assumindo provisoriamente o governo o Presidente do

    Supremo Tribunal Federal, Ministro Jos Linhares.

    A queda de Vargas levou ao incio da elaborao de uma nova Constituio,

    democrtica, em lugar da outorgada, com vezo autoritrio.

    Em 12 de novembro de 1945, atravs da Lei Constitucional n 13, foram dados

    poderes constitucionais ao Parlamento que seria, como o foi, eleito em 2 de dezembro de

    1945, para a elaborao de uma nova Constituio. Dois meses depois, em fevereiro de 1946,

    os constituintes iniciaram os trabalhos de elaborao da nova Constituio que somente

    ficaria pronta em setembro de 1946, cerca de sete meses depois.

    Essa nova Constituio procurou conciliar os princpios de liberdade e justia

    social, garantindo os direitos dos trabalhadores conquistados durante o estado Novo, e

    coibindo abusos do poder econmico.

    A Constituio promulgada de 1946 foi, na opinio de vrios juristas, dentre eles

    Celso Ribeiro Bastos,

    a mais municipalista que tivemos. Foram muitos os constituintes que se bateram

    pela causa. Lembremos aqui, exemplificativamente, de Ataliba Nogueira, grande

    combatedor do ideal municipalista. Procurou-se, enfim, dar uma competncia certa e

    irrestringvel ao Municpio centrada na idia da autonomia em torno de seu peculiar

    interesse.36

    A nova Constituio restabeleceu o princpio da separao e harmonia dos

    poderes, o cargo de Vice-Presidente da Repblica, integrou a Justia do Trabalho no mbito

    do Poder Judicirio, proibiu a organizao, registro ou funcionamento de qualquer partido

    poltico ou associao cujo programa de ao contrariasse o regime democrtico, como por

    exemplo, o Partido Comunista Brasileiro PCB , reconheceu o direito de greve, dentre outros.

    Essa Constituio de 1946 sofreu apenas trs emendas, e levou a Nao a viver de

    forma democrtica, inclusive com a eleio do antigo ditador Getlio Vargas para o

    quadrinio 1951/1955 com 3.849.040 (trs milhes oitocentos e quarenta e nove mil e

    quarenta) votos, tendo como seu vive o Doutor Caf Filho. Em 24/08/1954 Getlio comete

    suicdio assumindo o seu vice at 08/11/1955, quando se afastou por problemas de sade. O

    Presidente da Cmara, Carlos Luz, ocupou a Presidncia por trs dias (08 a 11/11/1954)

    quando foi afastado por um dispositivo militar e impedido de assumir o cargo por

    determinao do Congresso Nacional (motivo: o Sr. Carlos Luz no queria dar posse ao

    Presidente eleito naquele ano Juscelino Kubitschek). Em seu lugar assumiu o Vice Presidente

    36

    BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. So Paulo: Saraiva, 1999. p. 56.

  • 38

    do Senado Nereu Ramos que empossou o Presidente eleito em 31/01/1956 e que cumpriu

    mandato at 31/01/1961. Jnio da Silva Quadros, Presidente eleito em 15/11/1960, assumiu

    em 31/01/1961 governando at 25/08/1961, quando, tentando aplicar um autogolpe, renunciou

    Presidncia, e levou o Pas a uma crise institucional que culminou com a implantao do

    regime parlamentarista.

    As Foras Armadas e setores conservadores da Repblica no queriam que o

    Vice-Presidente Joo Goulart assumisse a Presidncia, ao argumento de que ele era

    esquerdista e discpulo de Getlio Vargas, criando, assim, uma grave crise institucional.

    O vice-presidente, quando da renncia de Jnio Quadros, encontrava-se em

    viagem diplomtica China, e os militares tentaram impedir o seu retorno ao Pas para

    assumir a Presidncia. Contra essa tentativa de golpe de estado levantou-se a populao,

    estimulada pela cadeia da legalidade, criada pelo governador Leonel Brizola, do Rio Grande do Sul, que defendia a posse do Presidente e a normalidade democrtica.

    Para resolver esse impasse, editou-se a Emenda Constitucional n 4, de 2 de

    setembro de 1961, instituindo o regime parlamentarista, sendo escolhido como Primeiro-

    Ministro o ento deputado federal por Minas Gerais, Tancredo Neves.

    O parlamentarismo foi, assim, a sada encontrada e aceita pelas partes para que o

    Presidente Joo Goulart pudesse assumir o poder central.

    Assumindo o governo, Jango apelido de Joo Goulart , com excepcional maestria, conseguiu convocar um plebiscito logo para o ano imediatamente seguinte para que o povo decidisse soberanamente sobre o regime de governo, se parlamentarista ou

    presidencialista, vencendo este ltimo, que culminou com a edio da Emenda Constitucional

    n 6, de 23 de janeiro de 1963, trazendo de volta o velho presidencialismo.

    Em 31 de maro de 1964, os militares insatisfeitos com o governo nacionalista de

    Jango que, dentre outras coisas, nacionalizou a explorao do petrleo e estatizou instituies financeiras coadjuvados pela velha oligarquia poltica de Minas Gerais e So Paulo, alm de polticos oportunistas, deram um golpe de estado e afastaram o Presidente

    Joo Goulart.

    Os militares, no dia 1o de abril, vale dizer, no dia seguinte ao golpe, assumiram o

    poder e impuseram o Ato Institucional n 1, institucionalizando o Regime Militar de forma a

    ordenar os plenos poderes constituintes que passaram a possuir, e fortalecendo o Poder

    Executivo centralizando a administrao. Era a primeira de uma srie de medidas arbitrrias.

    Para dar foros de legalidade situao, de forma subserviente e covarde, o ento

    Presidente do Senado Federal Auro de Moura Andrade, mesmo sabedor que Jango

    encontrava-se em territrio brasileiro, mais precisamente no Rio Grande do Sul, de onde

    pretendia reagir ao golpe, no dia 2 de abril de 1964, declarou a vacncia do cargo, ao

    argumento de que o Presidente teria deixado espontaneamente o Pas.

    Deu-se incio, a partir de ento, a mais uma ditadura, com a supresso das

    liberdades, j agora sob o jugo dos militares.

    VOLTAR

    O Regime Militar e a Constituio de 1967; a Emenda

    Constitucional de 1969

    O regime militar, atravs da Constituio outorgada de 1967, e da Emenda

    Constitucional n 1, de 1967, na prtica uma nova Constituio, governou por mais de vinte e

    cinco anos, concentrando de forma excessiva os poderes, transformando os governadores de

    estado e os prefeitos em verdadeiros fantoches, manipulados pelo Poder Central.

  • 39

    Os militares golpistas reduziram as liberdades individuais e coletivas,

    suspenderam direitos e garantias constitucionais, e passaram a governar atravs dos

    execrveis Decretos-lei, usurpando a competncia do Poder Legislativo.

    Em 13 de dezembro de 1968 foi promulgado o Ato Institucional n 5, o

    famigerado AI-5, que concedeu uma gama extraordinria de poderes ao Presidente da

    Repblica, inclusive os de decretar o fechamento do Congresso Nacional, das Assemblias

    Legislativas e das Cmaras Municipais, cassar os mandatos dos parlamentares e suspender os

    direitos polticos de qualquer pessoa por dez anos.

    Com essa medida, o Poder Executivo usurpava, de uma vez por todas, os poderes

    do Legislativo.

    Alm disso, esse AI-5 suspendia, tambm, as garantias da magistratura, como a

    vitaliciedade e a inamovibilidade, assim como as garantias do funcionalismo em geral, tal

    como a estabilidade, e, usurpando poderes do Judicirio, suspendeu o instituto do habeas

    corpus nos casos de crimes polticos contra a segurana nacional, a economia popular e ordem econmica, alm de subtrair do Judicirio a competncia para apreciar qualquer ato praticado com fundamento nele, AI-5.

    No perodo do governo do General Ernesto Geisel, penltimo dos governos

    militares, foram baixados os assim chamados pacotes de abril/1977 e julho/1978. No primeiro pacote de medidas foram editadas, pelo Executivo, catorze

    emendas Constituio e seis decretos-lei, trazendo as seguintes medidas: diminuio do

    quorum para emenda constitucional (de 2/3 para maioria absoluta de cada uma das casas

    legislativas); criao dos chamados senadores binicos, escolhidos indiretamente pelas Assemblias Legislativas estaduais (tinha o objetivo de dar maioria ao Governo no Senado);

    prorrogao do mandato de Geisel de 4 anos para 6 anos, dentre outros.

    J no segundo pacote, o de julho/1978, revogaram o AI-5 e a suspenso dos direitos polticos, e reduziram-se alguns dos poderes do Presidente/ditador, como por

    exemplo, o de decretar o recesso legislativo.

    J no governo do General Joo Batista de Oliveira Figueiredo, o ltimo do ciclo

    militar, a populao foi s ruas para exigir a redemocratizao do Pas, com os clebres e

    concorridos comcios pelas Diretas j, que somente aconteceria anos depois. O Congresso elegeu, de forma indireta, como ltimo presidente daquele triste

    perodo, o Dr. Tancredo Neves, tendo como seu vice o Sr. Jos Sarney, poltico governista,

    filiado ao partido oficial, mas, que na ltima hora, vislumbrando a derrocada do regime,

    bandeou-se para a oposio, derrotando, na oportunidade, a chapa governista integrada por

    Paulo Maluf e Nelson Marquezan.

    O Presidente Tancredo Neves no chegou a ser diplomado em razo da sua morte,

    tendo assumido a Presidncia o Sr. Jos Sarney, que, cumprindo os compromissos de Neves,

    convocou uma Assemblia Nacional Constituinte.

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    A Constituio promulgada de 1988

    A nova Constituio brasileira teve como fonte de inspirao a Constituio

    portuguesa de 1976, fortemente influenciada pelo Mestre constitucionalista J. J. Gomes

    Canotilho.

    O novo texto constitucional proclamou os direitos individuais e sociais; fortaleceu

    o Poder Legislativo, conquanto tenha permitido a chamada medida provisria ato normativo com fora de lei , instituto que veio a substituir os famigerados Decretos-lei, o que vem permitindo aos sucessivos governos a usurpao de competncia do poder de legislar;

    aprimorou o sistema democrtico atravs do incremento da democracia semidireta (o

  • 40

    plebiscito, o referendo e a iniciativa popular); alm de trazer inegveis e incontveis avanos

    no reconhecimento dos direitos e garantias individuais e coletivos.

    Para os seus crticos, as superposies e o detalhismo minucioso, prolixo e

    casustico, so imprprios para um documento desta natureza.37

    Acrescenta, ainda, o autor acima citado, que o assdio dos lobbies, dos grupos de

    presso de toda ordem, geraram um texto com inmeras esquizofrenias ideolgicas e

    demasiadamente corporativo. Avalia, contudo, que as crticas Constituio, segundo ele

    cabveis e necessrias, no empanam o seu carter democrtico, mas apenas realam a

    fisionomia ainda imatura de um Pas fragilizado pelas sucessivas rupturas institucionais e pela

    perversidade de suas relaes sociais.

    Entendemos, diferentemente do mestre Lus Roberto Barroso, que, naquele

    momento, saindo o Pas de uma longa ditadura que durou mais de vinte anos na qual morreram milhares de brasileiros, afora outros tantos que foram torturados e exilados e ainda chocada com a morte do Presidente Tancredo Neves, depositrio das grandes

    esperanas e aspiraes do povo brasileiro, a Assemblia Nacional Constituinte produziu a

    melhor Constituio que, na circunstncia, poderia produzir, com avanos sociais

    extraordinrios, alm da consagrao de direitos e garantias fundamentais, que ser objeto de

    nosso estudo mais adiante.

    VOLTAR

    37

    BARROSO, Lus Roberto. O direito constitucional e a eficcia de suas normas limites e possibilidades da constituio brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 42.

  • 41

    8 O PODER CONSTITUINTE

    a manifestao soberana da suprema vontade poltica de um povo, social e

    juridicamente organizado.38

    O Poder Constituinte tem por objetivo a elaborao de normas jurdicas de

    contedo constitucional.

    Da dizer-se que a compreenso de um Poder Constituinte contempornea idia de Constituio escrita.

    39

    Para Reis Friede,

    fato inconteste que foi somente a partir da Constituio entendida em seu sentido

    formal que a afirmao pela existncia de uma norma fundamental e, por efeito, de

    um Poder Constituinte como genuna fonte do Texto Constitucional passou a ser compreendida [...] em sua exata dimenso, tornando explcita [...] uma autntica

    teoria sobre a prpria origem das Constituies.40

    O Poder Constituinte somente aparece em ocasies excepcionais, quando inexiste

    uma Constituio, ou, no dizer de Celso Ribeiro Bastos,

    a imprestabilidade das normas constitucionais vigentes para manter a situao sob a

    sua regulao fazem eclodir ou emergir este Poder Constituinte, que, do estado da

    virtualidade ou latncia, passa a um momento de operacionalizao do qual surgiro

    as novas normas constitucionais.41

    O criador da teoria do Poder Constituinte foi o abade francs Emmanuel Joseph

    Siys, que, j nos idos de 1788, postulava a soberania constitucional da Nao,

    compreendida como um corpo de associados que vivem sob uma lei comum e representados

    pela mesma legislatura. Para ele, a vontade nacional deveria ser nica e indivisvel, de modo a

    se evitar qualquer forma de privilgio, sendo manifestada pelo resultado das vontades

    individuais, atravs da representao poltica exercida por especialistas da coisa pblica

    dotados de mandato imperativo.

    Siys considerava o Poder Constituinte como inalienvel e permanente, e que se

    configurava como um poder de direito incondicionado, que no era possvel de limitao por

    qualquer outro direito positivo, mas to-somente pelo direito natural, aqui considerado como

    anterior nao e, neste sentido, acima de sua vontade.

    Para ele, apenas a nao que poderia modificar a Constituio, mantendo-se os

    poderes constitudos limitados e condicionados.42

    Conquanto Siys tenha entrado para a histria como o criador da teoria do Poder

    Constituinte, quem, em verdade, primeiramente desenvolveu a formulao terica acerca do

    Poder Constituinte foi o americano Alexander Hamilton.

    Hamilton, j em 1787, afirmava, no seu artigo O Federalista, n.78, a superioridade da Constituio sobre qualquer outra norma jurdica, advertindo aos Tribunais

    de Justia sobre o seu dever de declarar nulos todos os atos manifestamente contrrios aos

    termos da Constituio. Trata-se, aqui, de nti