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1 PARECER DO CENTRO DE LINGUÍSTICA DA UNIVERSIDADE DO PORTO SOBRE A PROPOSTA DE NOVO PROGRAMA DE PORTUGUÊS DO ENSINO BÁSICO O Ministério da Educação e Ciência colocou em discussão pública uma proposta para novo programa de Português do Ensino Básico, esclarecendo, no portal www.dgidc.min-edu.pt, que «Os comentários, críticas e sugestões recebidos durante o período de discussão pública serão analisados pelo Subgrupo de Trabalho, sendo integrados os elementos suscetíveis de enriquecer e melhorar a proposta inicial.» O Centro de Linguística da Universidade do Porto (CLUP) revê-se no desiderato enunciado no parágrafo introdutório do referido documento, concretamente, «melhorar a qualidade do ensino e da aprendizagem através de uma cultura de rigor e de excelência desde o Ensino Básico». Por essa razão, decidiu analisar a proposta de novo programa para que o documento final apresente rigor científico. O parecer que o CLUP elaborou encontra-se dividido em cinco pontos: enquadramento da proposta, conceção de programa disciplinar, conjunto de conteúdos de ensino selecionados, estruturação do documento, viabilidade educativa. A finalizar, sistematizam-se os aspetos a introduzir na revisão da proposta em referência. 1. Enquadramento da nova proposta O enquadramento do programa cuja proposta está em discussão é especificado no texto de introdução, segundo o qual as Metas Curriculares de Português do Ensino Básico, homologadas a 3 de agosto de 2012, «foram construídas com base no Programa de Português do Ensino Básico de 2009» (p. 3). O fundamento em que se sustenta a nova proposta programática é enunciado deste modo: «surgiu a conveniência de harmonizar Programa e Metas Curriculares.» Nesta fundamentação, há várias questões a equacionar. a) O Programa de Português do Ensino Básico, homologado em 2009, iniciou o ciclo de implementação em 2010. Ao longo do processo para a homologação das Metas Curriculares de Português do Ensino Básico, que culminou em agosto de 2012, houve intervenções públicas e pareceres técnicos que alertaram a equipa de trabalho para os desvios que este documento apresentava em relação ao Programa de Português do Ensino Básico legalmente em vigor à época. b) A articulação entre as Metas Curriculares e o Programa de Português ainda em vigor (2009) é possível se a equipa de trabalho harmonizar as Metas Curriculares com esse Programa, em vez de criar uma nova proposta programática. É desejável que o Programa de Português (2009), de que as Metas Curriculares se desviaram, termine o ciclo de implementação e se proceda à divulgação de estudos sobre a sua eficácia. c) O Programa de ensino de uma disciplina do currículo nacional não pode ser o resultado de uma «conveniência» criada por um grupo de trabalho com base num desvio ou desfasamento que ele próprio gerou com um outro documento orientador. Para além disto, considera-se que um programa tem de ser feito de modo ponderado, com base em estudos

Parecer do centro de linguística da universidade do porto

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PARECER DO CENTRO DE LINGUÍSTICA DA UNIVERSIDADE DO PORTO

SOBRE A PROPOSTA DE NOVO PROGRAMA DE PORTUGUÊS DO ENSINO BÁSICO

O Ministério da Educação e Ciência colocou em discussão pública uma proposta para novo

programa de Português do Ensino Básico, esclarecendo, no portal www.dgidc.min-edu.pt, que «Os

comentários, críticas e sugestões recebidos durante o período de discussão pública serão analisados

pelo Subgrupo de Trabalho, sendo integrados os elementos suscetíveis de enriquecer e melhorar a

proposta inicial.»

O Centro de Linguística da Universidade do Porto (CLUP) revê-se no desiderato enunciado no

parágrafo introdutório do referido documento, concretamente, «melhorar a qualidade do ensino e da

aprendizagem através de uma cultura de rigor e de excelência desde o Ensino Básico». Por essa razão,

decidiu analisar a proposta de novo programa para que o documento final apresente rigor científico.

O parecer que o CLUP elaborou encontra-se dividido em cinco pontos: enquadramento da

proposta, conceção de programa disciplinar, conjunto de conteúdos de ensino selecionados,

estruturação do documento, viabilidade educativa. A finalizar, sistematizam-se os aspetos a introduzir

na revisão da proposta em referência.

1. Enquadramento da nova proposta

O enquadramento do programa cuja proposta está em discussão é especificado no texto de

introdução, segundo o qual as Metas Curriculares de Português do Ensino Básico, homologadas a 3 de

agosto de 2012, «foram construídas com base no Programa de Português do Ensino Básico de 2009»

(p. 3).

O fundamento em que se sustenta a nova proposta programática é enunciado deste modo:

«surgiu a conveniência de harmonizar Programa e Metas Curriculares.»

Nesta fundamentação, há várias questões a equacionar.

a) O Programa de Português do Ensino Básico, homologado em 2009, iniciou o

ciclo de implementação em 2010. Ao longo do processo para a homologação das Metas

Curriculares de Português do Ensino Básico, que culminou em agosto de 2012, houve

intervenções públicas e pareceres técnicos que alertaram a equipa de trabalho para os

desvios que este documento apresentava em relação ao Programa de Português do Ensino

Básico legalmente em vigor à época.

b) A articulação entre as Metas Curriculares e o Programa de Português ainda em

vigor (2009) é possível se a equipa de trabalho harmonizar as Metas Curriculares com esse

Programa, em vez de criar uma nova proposta programática. É desejável que o Programa de

Português (2009), de que as Metas Curriculares se desviaram, termine o ciclo de

implementação e se proceda à divulgação de estudos sobre a sua eficácia.

c) O Programa de ensino de uma disciplina do currículo nacional não pode ser o

resultado de uma «conveniência» criada por um grupo de trabalho com base num desvio ou

desfasamento que ele próprio gerou com um outro documento orientador. Para além disto,

considera-se que um programa tem de ser feito de modo ponderado, com base em estudos

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sobre os efeitos de um programa anterior e com a consulta técnica e científica de todos os

parceiros envolvidos no ensino da disciplina.

2. Conceção de programa disciplinar

O documento em apreço está designado como Programa e Metas Curriculares de Português do

Ensino Básico e resulta da junção de objetos criados separadamente, em termos temporais e

processuais.

A conceção de programa que sustenta a nova proposta é apresentada na introdução mediante a

afirmação de que «O Programa define os conteúdos por ano de escolaridade e apresenta uma ordenação

sequencial e hierárquica para os nove anos de escolaridade.» Os objetivos são incluídos num outro

documento, designado por Metas Curriculares de Português, que se constitui como objeto separado.

Aliás, esta separação é corroborada pelo facto de o primeiro documento (Programa) fechar com a

bibliografia e o segundo documento (Metas Curriculares de Português do Ensino Básico) repetir, em

folha de separação, parte do título da capa e apresentar uma Ficha Técnica, que contém os responsáveis

pela coordenação pedagógica, pela autoria e os consultores, apenas das metas.

Muito embora se procure uma articulação entre o Programa e as Metas Curriculares, através da

inserção de uma coluna paralela à dos conteúdos, com indicações numéricas com remissão para as

metas, existe, efetivamente, uma separação objetiva entre ambos.

Tendo em conta o referido, verifica-se, nesta proposta, a existência de um entendimento

reducionista de programa, uma vez que não apresenta mais do que uma lista de conteúdos, sem uma

visão clara dos objetivos por ciclo de ensino, que a enumeração das finalidades do ensino básico

(também designadas pelo termo «objetivos») não supre.

De modo a garantir uma organização lógica, é indispensável uma versão integrada de objetivos

e conteúdos dentro de um mesmo documento, que assegure, de facto, uma correspondência clara e

explícita entre objetivos e conteúdos, nesta sequência exata.

3. Conjunto de conteúdos de ensino selecionados

O corpus dos conteúdos selecionados para o ensino do Português, ao longo dos nove anos de

escolaridade correspondentes ao ensino básico, levanta problemas de ordem diversa.

A. Os conteúdos selecionados revelam um grau de redução nunca visto no ensino do Português,

não acompanhando nem o estádio de desenvolvimento cognitivo dos alunos, nem as aprendizagens que,

atualmente, se verifica existirem nas escolas, em qualquer dos domínios de ensino (oralidade, escrita,

educação literária, leitura, conhecimento explícito da língua).

No que respeita ao domínio da gramática, confinam-se as aprendizagens dos alunos às áreas da

fonologia, das classes de palavras, da morfologia, da lexicologia e da sintaxe. Além disso, dentro de

cada uma destas áreas, está previsto um conjunto mínimo de conceitos operativos, insuficientes para o

cumprimento das metas definidas nos restantes domínios (oralidade, leitura, escrita, educação literária),

como se demonstrará mais adiante. A título exemplificativo, mencione-se a ausência de qualquer

referência a: adjetivo relacional, relações temporais como a anterioridade, posterioridade e

simultaneidade de situações (essencial, por exemplo, para a descrição da «sequência de

acontecimentos», prevista logo desde o 2.º ano de escolaridade).

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B. Os conteúdos selecionados, dentro do mesmo ano de escolaridade, apresentam graus de

dificuldade desiguais entre domínios. Veja-se, a título de exemplo, a distribuição prevista para o 3.º ano

de escolaridade: no domínio da oralidade, está prevista a produção de discurso persuasivo, a par de

trabalho explícito sobre conjugação verbal que apenas considera como conteúdo explícito de

aprendizagem o presente do indicativo.

C. A seleção dos conteúdos considerados essenciais na proposta de programa em discussão

parece não ter tido em atenção a articulação dos domínios entre si, tendo criado lugares vazios na

aprendizagem dos alunos em cada ano de escolaridade. Vejamos o exemplo dos conteúdos relacionados

com os sinais de pontuação, cujo trabalho aparece assim distribuído:

Ao longo do 1.º ano, os alunos leem e escrevem frases e pequenos textos que, em

conformidade com o previsto no domínio da Introdução à Educação Literária, implicam a «Expressão

de sentimentos e emoções». Não se compreende a razão pela qual só possam trabalhar, de modo

explícito, o ponto de exclamação no 3.º ano de escolaridade. Será possível pensar que, durante dois

anos escolares, os alunos não encontrarão ou produzirão frases ou textos que não contenham

interjeições ou frases exclamativas?

D. Alguns dos conteúdos declarativos previstos dizem respeito a conceitos que cientificamente

são usados com pouco rigor e imprecisões. Exemplificaremos com apenas dois casos.

D.1. No primeiro caso, consideram-se expressões como: «Frase: complexidade crescente»

(conteúdos previstos para o 1.º e o 2.º anos, oralidade); «Estruturas frásicas: complexidade» (3.º ano,

oralidade); «estruturas gramaticais correntes e algumas complexas» (6.º ano, oralidade). Estas

formulações não expressam com clareza o que se pretende como conteúdo/conhecimento a adquirir por

parte dos alunos.

O termo complexidade não é unívoco, sobretudo quando usado em contexto de ensino.

Associado à noção de frase, pode ser entendido de três modos:

a) como possibilidade que temos de juntar constituintes dentro de um mesmo constituinte (ex.

O livro/ o livro antigo/ o livro antigo de capas pretas…);

b) como a possibilidade de juntar, dentro do domínio frase, mais constituintes (ex. O João

chegou/O João chegou ontem/O João chegou ontem às três da tarde.);

c) como possibilidade de juntar uma ou mais orações no interior de uma frase, o que

corresponde ao sentido mais técnico de «frase complexa».

Assim, é imperioso especificar o que se pretende quando se associa, repetidas vezes, a noção

de complexidade à unidade sintática “frase”.

D.2. O segundo caso diz respeito ao conceito de «inferência». Este termo surge associado não

só a uma espécie de tipologia («inferências de sentimento–atitude, de tempo, de instrumento, de objeto,

1.º ano 2.º ano 3.º ano 4.º ano

Ponto final

Ponto de interrogação

Vírgula Ponto de exclamação

Dois pontos

Travessão

Dois pontos

Reticências

Vírgula

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de agente–ação, de causa–efeito, por exemplo), mas também a conceitos de Pragmática, como

«implícito» e «pressuposto».

Convém lembrar que o conceito de inferência está na base de processos interpretativos

específicos, estudados nas ciências da linguagem, abarcando fenómenos como “pressuposição”,

“implicação” e “implicaturas conversacionais”. Estes termos não podem ser misturados com aceções do

senso comum relativas a inferência, sem que criem leituras ambíguas.

Mesmo admitindo a inferência como ativação do saber enciclopédico e conhecimento de

mundo enquanto estratégia para compreensão, não é lícito criar ambiguidade em torno de um termo que

tem uma aceção cientificamente consensual, como, aliás, se pode verificar no dicionário terminológico

para o ensino do português.

4. Estruturação interna do documento

No que diz respeito à estrutura interna, o documento em apreço levanta problemas, alguns dos

quais serão explicitados de seguida.

A. Formulação de objetivos

Os objetivos formulados nas páginas iniciais do programa (pp. 5 e 6) são diferentes dos

objetivos que estão definidos no documento das metas curriculares. Uma vez que apresentam um largo

sentido de abrangência, infere-se que terão sido enunciados como finalidades, isto é, aprendizagens

esperadas para o final do ensino básico.

No entanto, essa informação não está explícita, podendo criar dúvida com o que também é

designado como objetivos nas metas curriculares.

Torna-se, por isso, necessário explicitar, no título da página 5, que se trata de objetivos gerais

ou finalidades, no âmbito dos quais se deverão entender os objetivos específicos previstos nas metas

curriculares. A associação dos termos operatórios “geral” e “específico” ao termo “objetivos” contribui

para a clareza do que se pretende expor.

B. Coerência entre os objetivos gerais e os conteúdos

Apesar de os objetivos gerais previstos para o domínio gramatical conterem uma formulação

adequada, não encontram reflexo no conjunto dos conteúdos selecionados, que aponta claramente para

um ensino de natureza classificatória, construído com base em mnemónicas.

Os princípios de progressão, de reflexão, de observação de regularidades, de mobilização de

conhecimento gramatical para leitura, escrita e expressão oral estão corretos e adequados, apontando

para uma prática laboratorial de estudo da língua. Existe, contudo, uma incoerência entre estes

princípios e as indicações e procedimentos inseridos nas páginas subsequentes do documento em

análise.

C. Coerência e coesão dos conteúdos entre si

Uma leitura atenta da coluna correspondente aos conteúdos de ensino e de aprendizagem na

disciplina de Português torna evidente a diversidade e a heterogeneidade dos elementos aí elencados,

sendo clara a incoerência da enumeração. No mesmo plano, surgem indistintos, sob o título

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«conteúdos», termos e expressões que se referem a entidades tão diversificadas como: termos

metalinguísticos dirigidos exclusivamente a professores (como, por exemplo, «princípio de cortesia

– oralidade, 1.º ano»), capacidades a desenvolver (como, por exemplo, «consciência silábica»),

estratégias de leitura (por exemplo, «inferência» ou, outro exemplo, «monitorização da compreensão

de texto»), métodos de ensino (por exemplo, «ditado de texto»), atividades didáticas (exemplo,

«divisão e classificação de orações», «vocabulário: alargamento e adequação»), conteúdos

declarativos (por exemplo, «presente do indicativo») e conteúdos processuais (por exemplo,

«resumo»).

5. Viabilidade educativa (ou pedagógico-didática)

A escolha e a organização dos conteúdos disciplinares determinam a consecução de objetivos e

de metas. No entanto, a proposta de programa em discussão levanta problemas que é imperioso

corrigir, sob pena de se criar a impossibilidade de cumprimento do definido, nas metas curriculares,

como objetivos e descritores de desempenho. Vejamos alguns exemplos.

A) 2.º ano – domínios da Leitura e Escrita e Introdução à Educação Literária

Metas curriculares LE2, IEL2

Objetivo 10. Organizar a informação de um texto lido.

Descritor de desempenho 2.: Relacionar diferentes informações contidas no texto, de maneira a pôr em

evidência a sequência temporal de acontecimentos, mudanças de lugar, encadeamentos de causa e efeito.

(destaque nosso)

Objetivo 16. Transcrever e escrever textos.

Descritor de desempenho 5.: Escrever pequenas narrativas, a partir de sugestões do professor, com

identificação dos elementos quem, quando, onde, o quê, como. (destaque nosso)

Objetivo 18. Redigir corretamente.

Descritor de desempenho 2.: Utilizar, com coerência, os tempos verbais (destaque nosso)

Objetivo 20. Compreender o essencial dos textos estudados e lidos.

Descritor de desempenho 2.: Recontar uma história ouvida ou lida. (destaque nosso)

Objetivo 23. Dizer e escrever, em termos pessoais e criativos.

Descritor de desempenho 2.: Contar pequenas histórias inventadas. (destaque nosso)

Para o desempenho previsto no âmbito do objetivo 10, é necessário o conhecimento explícito de

recursos da língua próprios da expressão de tempo como, por exemplo, os tempos verbais e os

advérbios com valor de tempo.

Do mesmo modo, os desempenhos previstos, no âmbito dos objetivos 16, 18, 20 e 23, não

podem dispensar a utilização consciente e intencional de expressões de tempo como a conjugação dos

verbos no presente ou no pretérito perfeito do indicativo.

No entanto, na proposta de novo programa de Português, os conceitos necessários para as metas

programadas estão distribuídos do seguinte modo:

­ conjugação dos verbos no presente do indicativo – 3.º ano (aos 8 anos de idade);

­ conjugação dos verbos no pretérito perfeito, no pretérito imperfeito e no futuro (p. 18) –

4.º ano (aos 9 anos de idade);

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­ advérbio com valor de tempo (como, por exemplo, “ontem”, “hoje”, “amanhã”) – 5.º

ano (aos 10 ou 11 anos de idade).

Se não estão previstos os conteúdos de conhecimento explícito da língua que funcionam como

pré-requisitos para pôr em evidência a sequência temporal de acontecimentos em texto narrativo,

de que modo poderão os alunos atingir o desempenho esperado?

B) 3.º ano – Domínio da Leitura e Escrita e domínio da Oralidade

Para que os alunos revelem um desempenho adequado, quanto à expressão oral de explicações,

justificações ou fundamentações, têm de usar, de modo consciente e intencional, recursos de língua que

têm de ser explicitados, mediante um ensino e uma aprendizagem específica. O conhecimento implícito

da língua materna que os alunos possuem na idade correspondente ao 3.º ano de escolaridade não é

suficiente para a aquisição e desenvolvimento da meta definida. São necessários conceitos como, por

exemplo, o de oração coordenada explicativa ou o de subordinada causal. No entanto, estes conceitos

estão previstos para ciclos de ensino posteriores, uma vez que, durante todo o 1.º ciclo de ensino,

apenas se prevê, na nova proposta de programa, a noção de frase simples.

C) 3.º ano – Domínio da Leitura e Escrita

Do mesmo modo, não será possível a expansão de frases nem a amplificação textual,

mediante, por exemplo, a «coordenação de verbos» sem admitir uma reflexão mínima sobre

coordenação. Todavia, o conceito de «frase complexa» ocorre como conteúdo apenas no 2.º ciclo do

ensino básico.

Metas curriculares O3, E32, EL3

Objetivo 3. Produzir discursos com diferentes finalidades, tendo em conta a situação e o interlocutor.

Descritor de desempenho 3.: Informar, explicar. (destaque nosso)

Descritor de desempenho 6.: Desempenhar papéis específicos em atividades de expressão orientada,

respeitando o tema, retomando o assunto e justificando opiniões. (destaque nosso)

Objetivo 22. Compreender o essencial dos textos escutados e lidos.

Descritor de desempenho 3.: Identificar, justificando, as personagens principais. (destaque nosso)

Objetivo 24. Ler em textos pessoais.

Descritor de desempenho 2.: Apresentar à turma livros lidos, justificando a escolha. (destaque nosso)

Metas curriculares LE3 e G3

Objetivo 15.: Redigir corretamente.

Descritor de desempenho 3.: Trabalhar um texto, amplificando-o através da coordenação de nomes, de

adjetivos e de verbos. (destaque nosso)

Objetivo 28.: Analisar e estruturar unidades sintáticas.

Descritor de desempenho 4.: Expandir e reduzir frases, substituindo e deslocando palavras e grupos de

palavras.(destaque nosso)

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D) 4.º ano – Domínio da Gramática

As metas curriculares indicam como aprendizagem esperada dos alunos, no final do 1.º ciclo do

ensino básico, a identificação de frases de tipo imperativo.

Em português, o modo imperativo é defetivo, limitando-se à 2.ª pessoa, em frases imperativas.

Nos casos em que o sujeito gramatical é de 1.ª ou de 3.ª pessoa, recorre-se ao modo conjuntivo. Além

disso, é também o modo conjuntivo que supre a impossibilidade de o modo imperativo ocorrer em

frases negativas (exemplo: Não faças barulho!).

No entanto, o documento em análise propõe que o modo conjuntivo seja um conteúdo a

trabalhar, no domínio da gramática, apenas no 2.º ciclo do ensino básico (a 1.ª referência ocorre no 5.º

ano).

E) 4.º ano – Domínio da gramática

O objetivo acima apresentado determina que o aluno conheça o «pronome pessoal (forma tónica

e forma átona)» e o «uso de pronome e retoma da referência nominal». Para se compreender as formas

átonas do pronome pessoal, é indispensável associá-las às funções sintáticas de complemento direto e

complemento indireto. No entanto, estas funções só estão previstas como conteúdo no 5.º ano, o que

inviabiliza o cumprimento deste objetivo de aprendizagem.

F) 4.º ano – Domínio da Gramática

Para que o aluno possa compreender a diferença entre discurso direto e discurso indireto, tem

de conhecer previamente, pelo menos, o conceito de «frase complexa» (para os casos de discurso

indireto). No entanto, como já foi referido, o conceito de «frase complexa» é introduzido apenas no 2.º

ciclo do ensino básico.

Metas curriculares G4

Objetivo 30.: Analisar e estruturar unidades sintáticas.

Descritor de desempenho 2.: Identificar o tipo de frase imperativa.

Metas curriculares G4

Objetivo 28.: Conhecer propriedades das palavras e explicitar aspetos fundamentais da sua morfologia e do

seu comportamento sintático.

Descritor de desempenho 5.: Identificar pronomes pessoais (forma átona), possessivos e demonstrativos.

Descritor de desempenho 7.: Substituir nomes pelos correspondentes pronomes pessoais.

Descritor de desempenho 8.: Relacionar os pronomes pessoais com os nomes que substituem.

Metas curriculares G4

Objetivo 30.: Analisar e estruturar unidades sintáticas.

Descritor de desempenho 3.: Distinguir discurso direto de discurso indireto.

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G) 5.º ano – Domínio da Leitura e Escrita

No 5.º ano, prevê-se que o aluno redija textos usando «dispositivos de encadeamento

(crono)lógico, de retoma e de substituição que assegurem a coesão e a continuidade de sentido».

Contudo, no domínio da gramática, neste ano de escolaridade, não se incluem nem os conectores

(mencionados em 5.e). Aliás, o conteúdo “conectores” e “marcadores discursivos” não aparece em

nenhum ano de escolaridade.

Considerando todos os aspetos expostos, o Centro de Linguística da Universidade do Porto

propõe ao Subgrupo de Trabalho responsável pela proposta de novo programa de Português para o

Ensino Básico:

1. Rever a lista de conteúdos a fim de:

1.1. eliminar todos os termos e expressões que designam métodos de ensino, processos de

operacionalização, atividades pedagógico-didáticas ou outros que não sejam exclusivamente

conteúdos;

1.2. discriminar conteúdos declarativos e conteúdos processuais;

1.3. corrigir ou precisar termos e expressões cientificamente discutíveis.

2. Redistribuir os conteúdos programáticos de modo a garantir que certos conceitos considerados pré-

requisitos para determinadas aprendizagens estejam adquiridos pelos alunos no ano de escolaridade

em que se prevê um determinado desempenho.

Sem a revisão recomendada neste parecer, o Centro de Linguística da Universidade do Porto

considera não estarem reunidas condições nem suficientes nem necessárias para a homologação da

proposta analisada.

Metas curriculares LE5

Objetivo 13.: Redigir corretamente.

Descritor de desempenho 5.: Construir dispositivos de encadeamento (crono)lógico, de retoma e de

substituição que assegurem a coesão e a continuidade de sentido:

a) repetições;

b) substituições por pronomes pessoais;

c) substituições por sinónimos e expressões equivalentes;

d) referência por possessivos;

e) uso de conectores adequados.