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PORTUGAL, terra de poetas Terra de marinheiros

Portugal, terra de poetas, terra de marinheiros

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PORTUGAL, terra de poetas

Terra de marinheiros

Mas em que pátria, em que nação é que se esconde Esta Bandeira, esta Índia, este Castelo, aonde? aonde? Fui ter com minha fada, e disse-lhe: «Madrinha! Mas pode haver, assim, na Terra uma Purinha?» E a minha fada com sua vara de marfim Tocou meu peito... e alguém sorriu lá dentro: Sim...

    Meninas, lindas meninas!     Qual de vós é o meu ideal?     Meninas, lindas meninas     Do Reino de Portugal!

António Nobre

No silêncio dos olhos Em que língua se diz, em que nação,

Em que outra humanidade se aprendeuA palavra que ordene a confusãoQue neste remoinho se teceu?Que murmúrio de vento, que douradosCantos de ave pousada em altos ramosDirão, em som, as coisas que, calados,No silêncio dos olhos confessamos?

José Saramago

Minha Terra embalada pelas ondas,Lindo país de mouras encantadas,Onde o amor tece lendas e onde as fadasEm castelos de lua dançam rondas

Oh meu Algarve, quero que me escondasQue na treva da morte haja alvoradas!Hei-de sonhar com moiras encantadas,Se eu dormir embalado pelas ondas

Quando o sol emergir detrás da Serra,Sempre será da minha terraA fecundar-me o chão da sepultura

Ao pão dos meus, na minha aldeia querida,A morte será quase uma ventura,A morte será quase como a vida

Francisco Xavier Cândido Guerreiro

LIBERDADE Ai que prazerNão cumprir um dever,Ter um livro para lerE não o fazer!Ler é maçada.Estudar é nada.O sol doira Sem literatura.

O rio corre, bem ou mal,Sem edição original.E a brisa, essa,De tão naturalmente matinal,Como tem tempo não tem pressa...

Livros são papéis pintados com tinta.Estudar é uma coisa em que está indistintaA distinção entre nada e coisa nenhuma.

Quanto é melhor, quando há bruma,Esperar por Dom Sebastião,Quer venha ou não!

Grande é a poesia, a bondade e as danças...Mas o melhor do mundo são as crianças,Flores, música, o luar, e o sol, que pecaSó quando, em vez de criar, seca.

O mais do que istoÉ Jesus Cristo,Que não sabia nada de finançasNem consta que tivesse biblioteca.... Fernando Pessoa

Ó mar salgado, quanto do teu salSão lágrimas de Portugal!Por te cruzarmos, quantas mães choraram,Quantos filhos em vão rezaram!Quantas noivas ficaram por casarPara que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a penaSe a alma não é pequena.Quem quer passar além do BojadorTem que passar além da dor.Deus ao mar o perigo e o abismo deu,Mas nele é que espelhou o céu.

Universo é feito essencialmente de coisa nenhuma. Intervalos, distâncias, buracos, porosidade etérea. Espaço vazio, em suma. O resto, é a matéria. Daí, que este arrepio,

este chamá-lo e tê-lo, erguê-lo e defrontá-lo, esta fresta de nada aberta no vazio, deve ser um intervalo. António Gedeão

Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes,mas não esqueço de que minha vida é a maior empresa do mundo.E que posso evitar que ela vá a falência.Ser feliz é reconhecer que vale a pena viverapesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas ese tornar um autor da própria história.É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrarum oásis no recôndito da sua alma .É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.É saber falar de si mesmo.É ter coragem para ouvir um ‘não’.É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.Pedras no caminho?Guardo todas, um dia vou construir um castelo

Cantiga, partindo-se 

Senhora, partem tão tristesMeus olhos por vós, meu bem,Que nunca tam tristes vistes

outros nenhuns por ninguém. Tam tristes, tam saudosos,

Tam doentes da partida, Tam cansados, tam chorosos,

Da morte mais desejososCem mil vezes que da vida.

Partem tam tristes os tristes,Tam fora d’esperar bem,

Que nunca tam tristes vistesOutros nunhuns por ninguém. João Ruiz Castell-

Branco

Natal d'um Poeta Em certo reino, á esquina do planeta, Onde nasceram meus Avós, meus Paes, Ha quatro lustres, viu a luz um poeta Que melhor fôra não a ver jamais.

Mal despontava para a vida inquieta, Logo ao nascer, mataram-lhe os ideaes, A falsa-fé, n'uma traição abjecta, Como os bandidos nas estradas reaes!

E, embora eu seja descendente, um ramo D'essa arvore de Heroes que, entre perigos E guerras, se esforçaram pelo ideal:

Nada me importas, Paiz! seja meu amo O Carlos ou o Zé da Th'reza... Amigos, Que desgraça nascer em Portugal!

António Nobre

O SONHO

Pelo sonho é que vamos,Comovidos e mudos.Chegamos? Não chegamos?Haja ou não frutos,Pelo Sonho é que vamos.Basta a fé no que temos.Basta a esperança naquiloQue talvez não teremos.Basta que a alma demos,Com a mesma alegria, ao que é do dia-a-dia.Chegamos? Não chegamos?-Partimos. Vamos. Somos. Sebastião da Gama

Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.Deus quis que a terra fosse toda uma,Que o mar unisse, já não separasse.Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,

E a orla branca foi de ilha em continente,Clareou, correndo, até ao fim do mundo,e viu-se a terra inteira, de repente,Surgir, redonda, do azul profundo.

Quem te sagrou criou-te português.Do mar e nós em ti nos deu sinal.Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.Senhor, falta cumprir-se Portugal!

Fernando Pessoa

Ser poeta é ser mais alto, é ser maiorDo que os homens! Morder como quem beija!É ser mendigo e dar como quem sejaRei do Reino de Aquém e de Além-Dor!

É ter de mil desejos o esplendorE não saber sequer que se deseja!É ter cá dentro um astro que flameja,É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...É condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim, perdidamente...É seres alma, e sangue, e vida em mimE dizê-lo cantando a toda a gente!

Florbela Espanca

URGENTEMENTE

É urgente o amor.É urgente um barco no mar.

É urgente destruir certas palavras,Ódio, solidão e crueldade,Alguns lamentos,Muitas espadas.

É urgente inventar a alegria,Multiplicar as searas,É urgente descobrir rosas e riosE manhãs claras.

Cai o silêncio nos ombros e a luzImpura, até doer.É urgente o amor, é urgentePermanecer.

Eugénio de Andrade

«Voz do mar, mysteriosa; Voz do amôr e da verdade! - Ó voz moribunda e dôce Da minha grande Saudade! Voz amarga de quem fica, Trémula voz de quem parte...»

E os poetas a cantar São echos da voz do mar!

António Botto

Pedra Filosofal

Eles não sabem que o sonhoé uma constante da vidatão concreta e definidacomo outra coisa qualquer,

como esta pedra cinzentaem que me sento e descanso,como este ribeiro mansoem serenos sobressaltos,

como estes pinheiros altosque em verde e oiro se agitam,como estas aves que gritamem bebedeiras de azul.

eles não sabem que o sonhoé vinho, é espuma, é fermento,bichinho álacre e sedento,de focinho pontiagudo,que fossa através de tudonum perpétuo movimento.

Eles não sabem que o sonhoé tela, é cor, é pincel,

base, fuste, capitel,arco em ogiva, vitral,pináculo de catedral,

contraponto, sinfonia,máscara grega, magia,que é retorta de alquimista,

mapa do mundo distante,rosa-dos-ventos, Infante,caravela quinhentista,que é cabo da Boa Esperança,

ouro, canela, marfim,florete de espadachim,bastidor, passo de dança,Colombina e Arlequim,

passarola voadora,pára-raios, locomotiva,barco de proa festiva,alto-forno, geradora,

cisão do átomo, radar,ultra-som, televisão,desembarque em foguetãona superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham,que o sonho comanda a vida,que sempre que um homem sonhao mundo pula e avançacomo bola coloridaentre as mãos de uma criança.

Trova do Vento que Passa

Pergunto ao vento que passa

notícias do meu paíse o vento cala a desgraça

o vento nada me diz.

Pergunto aos rios que levam

tanto sonho à flor das águase os rios não me sossegam

levam sonhos deixam mágoas.

Levam sonhos deixam mágoas

ai rios do meu paísminha pátria à flor das

águaspara onde vais? Ninguém

diz.

Se o verde trevo desfolhaspede notícias e diz

ao trevo de quatro folhasque morro por meu país.

Vi navios a partir(minha pátria à flor das águas)vi minha pátria florir(verdes folhas verdes mágoas).

Há quem te queira ignoradae fale pátria em teu nome. Eu vi-te crucificadanos braços negros da fome.E o vento não me diz nadasó o silêncio persiste.Vi minha pátria paradaà beira de um rio triste.

Aparelhei o barco da ilusão E reforcei a fé de marinheiro.Era longe o meu sonho, e traiçoeiroO mar…(Só nos é concedidaEsta vidaQue temos;E é nela que é precisoProcurarO velho paraísoQue perdemos).Prestes, larguei a velaE disse adeus ao cais, à paz tolhida.Desmentida,A revolta imensidãoTransforma dia a dia a embarcaçãoNuma errante e alada sepultura…Mas corto as ondas sem desanimar.Em qualquer aventura,O que importa é partir, não é chegar.(Miguel Torga)

NEVOEIRO

Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,Define com perfil e serEste fulgor baço da terraQue é Portugal a entristecer

Brilho sem luz e sem arder,Como o que o fogo-fátuo encerra.Ninguém sabe que coisa quer.Ninguém conhece que alma tem,

Nem o que é mal nem o que é bem.(Que ânsia distante perto chora?)Tudo é incerto e derradeiro.Tudo é disperso, nada é inteiro.

Ó Portugal, hoje és nevoeiro...É a Hora!

As armas e os Barões assinaladosQue da Ocidental praia LusitanaPor mares nunca de antes navegados,Passaram ainda além da Taprobana,Em perigos e guerras esforçados,Mais do que prometia a força humana,E entre gente remota edificaramNovo Reino, que tanto sublimaram;

Vereis amor da pátria, não movidoDe prémio vil, mas alto e quase eterno:Que não é prémio vil ser conhecidoPor um pregão do ninho meu paterno.Ouvi: vereis o nome engrandecidoDaqueles de quem sois senhor superno,E julgareis qual é mais excelente,Se ser do mundo Rei, se de tal gente.

E aqueles que por obras valerosas

Se vão da lei da Morte libertando;

Cantando espalharei por toda a parte,

Se a tanto me ajudar o engenho e a arte.

Os Lusíadas

Eis aqui, quase cume da cabeçaDe Europa toda, o Reino Lusitano,Onde a terra se acaba e o mar começaE onde Febo repousa no Oceano.

Esta é a ditosa pátria minha amada,À qual se o Céu me dá, que eu sem perigoTorne, com esta empresa já acabada,Acabe-se esta luz ali comigo.

O dia há-de nascerRasgar a escuridãoFazer o sonho amanhecerAo som da cançãoE então:O amor há-de vencerA alma libertarMil fogos ardem sem se verNa luz do nosso olharNa luz do nosso olharUm dia há-de se ouvirO cântico finalPorque afinal falta cumprirO amor a PortugalO amor a Portugal! Dulce

Dulce Cirino