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Rev Esc Enferm USP 2005; 39(4):460-8. 460 FUNDAMENTS FOR MANAGING PROCESS IN CARE PRACTICES FUNDAMENTO PARA EL PROCESO GENERENCIAL EN LAS PRÁCTICAS DEL CUIDADO Flavia Raquel Rossi 1 , Maria Alice Dias da Silva Lima 2 RESUMO Apresenta-se uma reflexão sobre elementos que estruturam o processo de trabalho em saúde e o agir do enfermeiro. Abordam-se o processo de trabalho em saúde, as tecnologias em saúde e o geren- ciamento do cuidado como cons- trutos que fundamentam a refle- xão, com o objetivo de auxiliar na ampliação da visibilidade dos atos do enfermeiro. Ressalta-se a im- portância da utilização desses fundamentos para o exercício de práticas do cuidado nos processos gerenciais. DESCRITORES Cuidados de enfermagem (organização e administração). Papel do profissional de enfermagem. Prestação de cuidados de saúde. Relações profissional-paciente. ABSTRACT A reflection on the elements that structure the process of the nurse’s work with health and his/ her action. The study deals with health work, technologies in health and the management of care as pillars that serve as bases for the reflection, with the aim of helping the enlargement of the visibility of the nurse’s acts. The importance of those fundaments for the exercise of care practices in the managing processes is highlighted. KEY WORDS Nursing care (organization and administration). Nurse’s role. Delivery of health care. Professional and patient relations. RESUMEN El presente trabajo constituye una reflexión sobre los elementos que estructuran el proceso del trabajo en salud y el actuar del enfermero. Se aborda el proceso del trabajo en salud, las tecnolo- gías en salud y el gerenciamiento del cuidado como constructores que fundamentan la reflexión, con el objetivo de ayudar a la amplia- ción de la visibilidad de los actos del enfermero. Se resalta la im- portancia de la utilización de estos fundamentos en el ejercicio de las prácticas del cuidado en los pro- cesos gerenciales. DESCRIPTORES Atención de enfermería (organización y administración). Rol de la enfermera. Prestación de atención de salud. Relaciones profesional- paciente. Recebido: 05/04/2004 Aprovado: 12/09/2005 E STUDO T EÓRICO Fundamentos para processos gerenciais na prática do cuidado * * Extraido da Dissertação “Tecnologias leves nos processos gerenciais do enfermeiro: contribuição para o cuidado humanizado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), 2003. 1 Professora do Curso de Enfermagem da Universidade de Caxias do Sul. Mestre em Enferma- gem pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Pesquisadora do Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva e Serviços de Saúde. [email protected] 2 Professora Adjunta da Escola de Enfermagem da UFRGS. Doutora em Enfer- magem pela Universidade de São Paulo. Coordena- dora do Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva e Serviços de Saúde. [email protected]

Processos gerenciais na prática do cuidado

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Flavia Raquel RossiMaria Alice Dias da Silva

FUNDAMENTS FOR MANAGING PROCESS IN CARE PRACTICES

FUNDAMENTO PARA EL PROCESO GENERENCIAL EN LAS PRÁCTICAS DEL CUIDADO

Flavia Raquel Rossi1, Maria Alice Dias da Silva Lima2

RESUMOApresenta-se uma reflexão sobreelementos que estruturam oprocesso de trabalho em saúde eo agir do enfermeiro. Abordam-seo processo de trabalho em saúde,as tecnologias em saúde e o geren-ciamento do cuidado como cons-trutos que fundamentam a refle-xão, com o objetivo de auxiliar naampliação da visibilidade dos atosdo enfermeiro. Ressalta-se a im-portância da utilização dessesfundamentos para o exercício depráticas do cuidado nos processosgerenciais.

DESCRITORESCuidados de enfermagem(organização e administração).Papel do profissional deenfermagem.Prestação de cuidados de saúde.Relações profissional-paciente.

ABSTRACTA reflection on the elements thatstructure the process of thenurse’s work with health and his/her action. The study deals withhealth work, technologies inhealth and the management of careas pillars that serve as bases forthe reflection, with the aim ofhelping the enlargement of thevisibility of the nurse’s acts. Theimportance of those fundamentsfor the exercise of care practicesin the managing processes ishighlighted.

KEY WORDSNursing care (organization andadministration).Nurse’s role.Delivery of health care.Professional and patientrelations.

RESUMENEl presente trabajo constituyeuna reflexión sobre los elementosque estructuran el proceso deltrabajo en salud y el actuar delenfermero. Se aborda el procesodel trabajo en salud, las tecnolo-gías en salud y el gerenciamientodel cuidado como constructoresque fundamentan la reflexión, conel objetivo de ayudar a la amplia-ción de la visibilidad de los actosdel enfermero. Se resalta la im-portancia de la utilización de estosfundamentos en el ejercicio de lasprácticas del cuidado en los pro-cesos gerenciales.

DESCRIPTORESAtención de enfermería(organización y administración).Rol de la enfermera.Prestación de atención de salud.Relaciones profesional-paciente.

Recebido: 05/04/2004Aprovado: 12/09/2005

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Fundamentos para processosgerenciais na prática do cuidado*

* Extraido da Dissertação“Tecnologias leves nosprocessos gerenciais doenfermeiro: contribuiçãopara o cuidado humanizado,Universidade Federal doRio Grande do Sul(UFRGS), 2003.

1 Professora do Curso deEnfermagem daUniversidade de Caxias doSul. Mestre em Enferma-gem pela UniversidadeFederal do Rio Grande doSul (UFRGS). Pesquisadorado Núcleo de Estudos emSaúde Coletiva e Serviçosde Saú[email protected]

2 Professora Adjunta daEscola de Enfermagem daUFRGS. Doutora em Enfer-magem pela Universidadede São Paulo. Coordena-dora do Núcleo de Estudosem Saúde Coletiva eServiços de Saú[email protected]

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INTRODUÇÃO

O contexto atual, caracterizado por rápidas mu-danças, está exigindo dos indivíduos, das organiza-ções e estabelecimentos, respostas diferenciadasno que diz respeito à efetividade dos serviços pres-tados. Na área da saúde, mais especificamente noâmbito da enfermagem, essa efetividade parece es-tar associada, não só a macro resultados sociais,econômicos e políticos, como também às questõesdo micro espaço pertinente ao cotidiano. Esseespaço, no qual ocorre a relação do enfermeiro como usuário e com outros profissionais existentesno cenário da saúde, constitui e imprime determina-das características no processo de trabalho daenfermagem.

O enfermeiro atua além da relação individual como usuário, deixando transparecer o caráter coletivoe de responsabilização também pelas atividades doscomponentes da equipe de enfermagem(1-3). Na mai-oria dos cenários de saúde brasileiros, os enfermei-ros fazem a gerência da assistência ou do cuidado.

Consideramos cuidado

como um ato individual que prestamos a nós mes-mos, desde que adquirimos autonomia mas é,igualmente, um ato de reciprocidade que somoslevados a prestar a toda a pessoa que, tempora-riamente ou definitivamente tem necessidade deajuda(4).

No âmbito da reciprocidade aparece o cuidadoprofissional – o cuidado de enfermagem, que ne-cessita cada vez mais situar-se no contexto da vida,que lhe dá seu real significado. Mais especifica-mente deve situar-se no processo de vida e mortediante do qual os grupos humanos são colocadosa cada dia, durante toda a sua existência. Para asustentação desse contexto de vida é necessárioconsiderar duas formas de cuidado: os cuidadoshabituais e cotidianos relacionados à manutençãoe desenvolvimento da vida e os cuidados de repa-ração ou tratamento da doença(4). Salientamos queesses últimos impregnaram de tal forma os ambien-tes próprios ao cuidado em função do modelo bio-médico de assistência que, embora com algumasflexibilizações, ainda é realizado isolando o indiví-duo do seu meio, do seu grupo de inserção e atémesmo de si próprio.

A atenção a esses aspectos é de fundamentalimportância ao ser considerado o gerenciamento docuidado, tendo em vista que os dois tipos de cuida-do não se excluem mutuamente. Ambos devem serfoco das ações do enfermeiro e constantementeconsiderados diante situações que exigem presta-ção de cuidados. Para dar conta desse cuidado o

enfermeiro deve inserir-se nos espaços que lhedizem respeito, quer seja junto ao usuário ou àsequipes de saúde, de forma consciente e direcionadaàs necessidades especificas dos sujeitos para quesejam cuidados em sua totalidade e não apenas emsuas partes(5). A atenção direcionada à necessidadedo indivíduo (cuidador ou ser cuidado) pode serum determinante para a humanização do cuidado,considerada como relação dialógica entre homensque proporciona o desenvolvimento de cada um, naqual a individualidade, as crenças, as característi-cas pessoais, a linguagem, entre outras coisas, sãorespeitadas(5-6).

Refletindo sobre esse contexto, questionamos:como podemos falar em cuidado humanizado seperpetuamos a idéia de redução dos sujeitos huma-nos, quer sejam produtores ou receptores do cuida-do, à condição de instrumentos dos estabelecimen-tos e das organizações, transformados em recursosou objetos? Podemos afirmar que produzimos cui-dado humanizado, sendo que se percebe ainda emmuitas realidades que os próprios trabalhadores sevêem desprovidos dessa dimensão humanizada?Como podemos garantir um cuidado humanizadoao usuário se o próprio cuidador não se vê e não sesente respeitado nessa dimensão?

Nesse aspecto, cabe ressaltar que o desafio estáem governar para produzir sujeitos, o que implicaem deixar que a sensibilidade, o desejo e as necessi-dades dos mesmos penetrem em todos os poros daorganização de forma que todos venham a sentirrespeito, autonomia, justiça, ética e liberdade(7)!

É possível que a fonte do cuidado humanizadoesteja no engajamento do enfermeiro em trabalharpropostas que contenham essa concepção, sendonecessário para isso, que ela seja reconhecida comopossível pelos profissionais e que esses utilizemtecnologias diferenciadas capazes de aproximar osindivíduos e conduzi-los à busca da satisfação dasnecessidades existentes(5).

As questões expostas introduzem à necessida-de de revisão de conceitos relacionados às ques-tões gerenciais em enfermagem, com o intuitode estimular reflexões e desafios para novas possi-bilidades do “fazer”, tendo em vista o indivíduo,como centralidade dos processos gerenciais doenfermeiro.

Para o entendimento e contextualização dessesprocessos gerenciais torna-se necessária uma fun-damentação teórica que, além de ampliar a visibili-dade do tema, permita discussões de aspectos es-senciais para a ação do enfermeiro e sua associaçãocom o cuidado humanizado. Dessa forma, os pro-

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cessos de trabalho em saúde, as tecnologiasem saúde e o gerenciamento do cuidado serão abordados como os pilares fundamentais destacontextualização.

PROCESSO DE TRABALHO EM SAÚDE

Ao abordar os aspectos relativos aos proces-sos gerenciais do enfermeiro são oportunas algu-mas considerações relativas ao trabalho em saúde,analisando espaços do cotidiano, nos quais ocor-rem as relações do enfermeiro com o usuário e comos profissionais da equipe de saúde.

O trabalho é entendido como uma ação cotidia-na, que coloca homens em relação com outros ho-mens e com a natureza, dentro de um determinadoprocesso social e histórico(8), sendo consideradotambém como uma atividade genérico-social quan-do é útil para os indivíduos, cumpre uma funçãosocial e leva em conta a satisfação das necessida-des sociais em tempo socialmente necessário paraproduzi-lo(2).

O trabalho em saúde é considerado como sendoda esfera não material, que se completa no ato desua realização. Portanto, a objetividade e a subjeti-vidade lhe são inerentes, tendo em vista que o obje-to que o constitui são seres humanos e conseqüen-temente as intervenções técnicas serão semprepermeados por relações interpessoais(2,9).

É um trabalho em serviços e como tal atende adois aspectos. O primeiro é o de preservar, respeitare reconhecer a particularidade, a individualidade, avariabilidade das situações e necessidades dos usu-ários e o segundo é o de estar de acordo com certasregras, regulamentos e valores gerais. No entanto,somente será bem sucedido se produzir o equilíbrioentre ambos(2).

O processo de trabalho é um jogo entre produ-ção, consumo e necessidades dos indivíduos e, naárea da saúde, de forma muito particular, produz atosde saúde que perseguem a produção do cuidado.Os processos de trabalho, embora tenham basesmecanicistas, possuem resultados que dependemdas relações entre as pessoas e que decorrem dainteração de dois componentes, denominados: tra-balho vivo e trabalho morto(10).

O trabalho vivo situa-se na dimensão do cotidi-ano e constitui-se das ações propriamente ditas exe-cutadas pelos trabalhadores de saúde na sua rela-ção com o usuário e diríamos também, entre os pró-prios trabalhadores. Faz parte do trabalho que éinstituinte, que estabelece, que cria, que está emprocesso e em ação. Na dimensão do trabalho vivo

são operacionalizadas as noções de autonomia eauto-governo dos indivíduos. Há a preservação doespaço de julgamento, de decisão, de processo re-flexivo, de integração, de intencionalidade, de utili-zação de saberes específicos para situações em par-ticular que se apresentam na atenção ao usuário(2,10).

O trabalho morto é resultado de um trabalhohumano anterior. É composto por todos os elemen-tos que estão envolvidos nos processos de traba-lho, como ferramentas ou matéria-prima, assim comotambém por componentes vinculados ao saber e aomodo de atuar dos profissionais envolvidos no tra-balho(10).

Entendemos que o processo de trabalho em saú-de se constitui como um espaço de relação e demovimento constante entre o trabalho morto e otrabalho vivo, sendo que ambos são concomi-tantemente condicionantes e condicionados. O cui-dado, por sua vez, enquanto parte desse processoe reconhecido como uma relação entre os indivídu-os, concretiza-se no espaço do trabalho vivo.

Esse entendimento é fonte de preocupaçãoquando associado à humanização do cuidado, poisnos espaços do trabalho vivo ainda estão presen-tes resquícios mecanicistas, fragmentados e bemestruturados demonstrando uma certa invasão, im-pregnação ou soberania do trabalho morto sobre ovivo.

Embora o trabalho vivo em ato seja quase queplenamente capturado por forças instituídas, aindaexiste espaço para exercer variações por se tratar deum trabalho que acontece no exato momento emque ocorre a relação entre os indivíduos(10) - usuá-rio/trabalhador, trabalhador/trabalhador, no qualinevitavelmente aparece o campo da subjetividadehumana.

No entanto, em algumas instâncias, a práticanos mostra um não aproveitamento por parte doenfermeiro, das ricas oportunidades de melhorias,resolutividade, crescimento pessoal e profissionalexistentes nas relações cotidianas, resultantes dosvários encontros feitos com o usuário e com a equi-pe. Os contatos, embora possam acontecer entreos mesmos indivíduos, se fazem em momentos esituações diferentes, sendo, portanto, sempre no-vos. O que parece estar fixo na ação profissional é adefasagem de atualização e contextualização dosdiferentes momentos. Parece haver uma dificulda-de, uma acomodação e uma certa passividade dealguns profissionais diante da necessidade dereciclar a sua prática, de buscar novas tecnologias,novas formas de fazer e principalmente novas for-mas de ser no trabalho.

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Esses posicionamentos são provenientes de umamescla de fatores, incluindo a subjetividade dos pro-fissionais, os resquícios da historicidade da profis-são de enfermagem marcada entre tantas outras coi-sas pela subalternidade, e ainda outras que advêmde questões organizacionais e dos modelosassistenciais e administrativos existentes nos esta-belecimentos de saúde.

Há que se levar em consideração que os profis-sionais podem reproduzir ou modificar os proces-sos de trabalho e os modelos de assistência, dosquais emana o cuidado. Nesse sentido, é importan-te salientar que, determinados tipos de organiza-ções têm como missão controlar o auto-governo dosindivíduos, com o receio de que haja uma alteraçãona lógica de seu funcionamento, assim comoenfatiza-se que a construção de tecnologias para aação do trabalho vivo em ato e para a gestão dessetrabalho, abrem espaços interrogadores e de ruptu-ra dos processos institucionalizados, transforman-do o processo de trabalho em lugar estratégico demudança(10).

Embora o enfermeiro seja um dos profissionaisda equipe de saúde que vivencia a construção, asrepercussões e resultados do trabalho vivo em atoem decorrência de sua inserção nos processos detrabalho, do seu potencial polivalente, mediador earticulador, ele nem sempre está apto, tem espaço e/ou desejo de romper com os processos institu-cionalizados. Os aspectos concretos e estruturadosdão segurança aos indivíduos, tendo em vista o re-ceio e a resistência em se desestabilizarem e se lan-çarem rumo a novos caminhos(5).

Diante disso, decorrem lacunas advindas do fatode o enfermeiro, ainda em muitas instâncias, não sercapaz de explorar com mais intensidade o trânsito ea representatividade que tem de uma ponta a outrado sistema de saúde (desde o cuidado ao usuárioaté os processos de gerenciamento e gestão), nosentido de atuar e investir na qualificação do traba-lho vivo em ato, em encadear suas ações com as deoutros profissionais, em utilizar e construir novastecnologias, em incorporar de vez o papel funda-mental que exerce na organização e estruturação dosprocessos de trabalho em saúde – cenário onde acon-tece o cuidado.

Essas reflexões nos reportam a um outro aspec-to importante na determinação de processos de tra-balho em saúde que é a construção coletiva. O en-fermeiro tem papel preponderante nessa constru-ção por ser um dos articuladores dos processos detrabalho interagindo com todos os profissionais dasaúde, e coordenando a organização desses pro-cessos. Não é raro também que ele seja o ponto de

convergência e distribuição de informações para ousuário, para a grande maioria dos profissionais daequipe de saúde, assim como para os diferentes ser-viços que fazem parte do universo hospitalar(11).

É necessário pontuar, no entanto, a existênciade um problema nos processos de trabalho coleti-vo: o coletivo está fragmentado e dessa forma frag-menta também o trabalho(12). O trabalho coletivo re-sume-se, em muitas instâncias, na prática simplistade um conjunto de pessoas trabalhando no mesmoespaço. Os objetivos do trabalho ainda são regidospor pontos de vista, necessidades e interesses par-ticularizados dos trabalhadores, a sua linguagem nãoé unificada, assim como os seus resultados apare-cem fragmentados, ficando aquém do esperado paraa concretização do verdadeiro trabalho coletivo queimplica em participação, comunicação e continuida-de de ações efetivas(5).

Ao associar esses aspectos com o fato de queos processos de trabalho acontecem em uma redeque se alimenta reciprocamente, impulsionados pe-las necessidades dos indivíduos(2), valem algumasconsiderações. A primeira é relacionada às necessi-dades dos indivíduos, entendendo-as como carên-cias pertinentes a eles, social e historicamenteconstruídas e que só podem ser captadas e traba-lhadas em sua dimensão individual(13).

Quando se fala em trabalho em saúde, de quaisnecessidades falamos? Quais os indivíduos que sãoconsiderados em suas necessidades dentro dos pro-cessos de trabalho em saúde? Embora tenhamos cla-ro que o usuário tem suas necessidades alinhadasao objetivo final do processo de trabalho em saúdee que as necessidades dos trabalhadores tambémaparecem e interferem nas relações que definem osprocessos de trabalho e seus resultados, esses fa-tores não aparecem sedimentados de forma adequa-da dentro do trabalho coletivo, tendo em vista queas necessidades de alguns usuários e trabalhado-res continuam não sendo satisfeitas de forma contí-nua e adequada, existindo inclusive equívocos deinterpretação da satisfação dessas necessidades.

O segundo grupo de considerações relaciona-se com o produto esperado como resultado do tra-balho em saúde. O produto esperado é o mesmopara todos os profissionais que participam do pro-cesso de trabalho em saúde? Este produto tem omesmo significado para todos os profissionais queauxiliam na sua construção? Esse produto – quedeveria ser o usuário recuperado e cuidado deforma humanizada – ainda não é comum a todos e asatisfação de suas necessidades ainda vem parce-lada e alinhada com a satisfação dos profissio-nais que com eles atuam, assim como com o cumpri-

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mento de aspectos organizacionais, chegando emalguns momentos a ser antagônica(5).

Diante dessas reflexões vale ressaltar que areunificação do trabalho só poderá ser feita pelacomplementaridade consciente das atividades, ain-da que cada trabalhador execute uma parte do tra-balho total(12).

Para isso se faz necessária a transversalidadede determinadas ações dos trabalhadores de saú-de, tais como as direcionadas à resolutividade,ao acolhimento, ao vínculo, entre outras, assimcomo a garantia do encadeamento entre as váriase diferentes relações entre trabalhador/usuário etrabalhador/trabalhador que ocorrem no cuidar,que são interdependentes em função de um pro-duto que é comum e que caracterizam o trabalhocoletivo.

TECNOLOGIAS EM SAÚDE

As diferentes possibilidades tecnológicas, as-sim como o desenvolvimento tecnológico devemser contempladas constantemente no cotidiano dosestabelecimentos de saúde na busca de resultadosmais efetivos das ações, evitando a prática de açõesinsuficientes para a satisfação dos usuários.

Através do desenvolvimento tecnológico acon-tece uma transição natural quanto à sua utilização einserção nos ambientes de trabalho e, na área dasaúde, essas transições têm imprimido alteraçõessignificativas nos processos de trabalho ao longodos tempos. Essas alterações são evidenciadasatravés de características do parcelamento dosprocessos de trabalho, no perfil e na qualificaçãodos trabalhadores e nas variações do mercado detrabalho(14).

Temos como tecnologias envolvidas no traba-lho em saúde:

Tecnologias leves (como no caso das tecnologiasde relações do tipo produção de vínculo, autono-mização, acolhimento, gestão como uma formade governar processos de trabalho), leveduras(como no caso de saberes bem estruturadosque operam no processo de trabalho em saú-de, como a clínica médica, a clínica psicanalítica,a epidemiologia, o taylorismo, o fayolismo) e du-ras (como no caso de equipamentos tecnoló-gicos do tipo máquinas, normas, estruturasorganizacionais)(14).

As tecnologias leves podem ser importantes fer-ramentas de gerenciamento utilizadas pelo enfermei-ro na busca da qualidade do cuidado prestado aosusuários, pois estabelecem momentos de interces-

são entre trabalhadores e usuários e permitem a realpossibilidade de reconhecimento e satisfação dasnecessidades dos indivíduos. Dessa forma, podemser utilizadas para a concretização e sustentação deum modelo de assistência que venha a contemplarum cuidado humanizado.

É importante considerar que a reestruturaçãoprodutiva na área da saúde acompanha as interaçõesque o modelo médico hegemônico vem sofrendopelas mudanças operadas pela introdução de no-vos equipamentos. Essa entrada de equipamentosnão anula momentos singulares do trabalho emsaúde, insubstituíveis como as dimensões típicasda produção do ato cuidador e das interaçõesgerenciais(15).

A entrada de equipamentos, denominada detecnologia dura, nos processos produtivos em saú-de, sob a modelagem de gestão médico-hegemônicanão mais provoca reestruturação produtiva e nemcompõe uma transição dos modelos produtivos eassistenciais. Ao contrário, a transição tecnológicabusca atingir o núcleo tecnológico do trabalho vivoem ato, procurando novas conformações dos atosde saúde, descentrando o trabalho em saúde atémesmo dos equipamentos e dos especialistas(14).

Nessa concepção situa-se a tecnologia leve,conceituada como:

a tecnologia de (e das) relações – dos inter-cessores, no interior dos processos que podemgerar alterações significativas no modo de setrabalhar em saúde [....] sob uma ótica analisadorapautada pela ética do compromisso com a vida eexpressa em ato nas dimensões assistenciaisdo trabalho vivo em saúde, como a relação deacolhimento, a criação do vínculo, a produção daresolutividade e a criação de maiores graus deautonomia, no modo das pessoas andarem navida(10).

O uso das tecnologias leves contempla a exis-tência de um objeto de trabalho dinâmico, em contí-nuo movimento, não mais estático, passivo ou re-duzido a um corpo físico. Esse objeto exige dos pro-fissionais da saúde, especialmente do enfermeiro,uma capacidade diferenciada no olhar a eles conce-dido a fim de que percebam essa dinamicidade epluralidade, que desafiam os sujeitos à criatividade,à escuta, à flexibilidade e ao sensível(5).

É importante enfatizar que os instrumentos detrabalho não são naturais, são construídos histori-camente pelo sujeito que assim entende sua possi-bilidade de intervenções sobre o objeto. Se o objetomuda em suas necessidades, as intervenções dotrabalhador também devem mudar(8).

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Fica claro que não se pode restringir a tecnologiaà dimensão constituída pelos instrumentos materi-ais de trabalho. A tecnologia refere-se aos nexostécnicos estabelecidos no interior do processo detrabalho entre a atividade operante e os objetos detrabalho através dos instrumentos utilizados para asua concretização(16). É importante incluir também osaber, entendido como a posse e a manipulação deobjetos de trabalho no seio do processo de produ-ção, como uma tecnologia que organiza a prática desaúde(8).

Para abordar tecnologias em saúde alinhadas àsnecessidades atuais dos usuários e dos própriosserviços de saúde é necessário ir além da dimensãodas máquinas e equipamentos, cujo impacto da suautilização na área da saúde auxilia na garantia e ma-nutenção da vida por todos os indivíduos, quer se-jam usuários ou trabalhadores de saúde, porém nãosubstitui e nem supera outras interaçõestecnológicas também vitais para a busca da inteire-za dos indivíduos participantes do processo.

De forma complementar é importante enfatizarque a tecnologia engloba o processo de trabalhocomo um todo e tem conotações técnicas e sociais.Do ponto de vista técnico consiste na organizaçãodo complexo de recursos destinado ao cumprimen-to de determinada tarefa, ou seja, do ordenamentorecebido pelos diversos instrumentos de trabalho(não só maquinarias), para o processamento dosmateriais de trabalho(17).

Do ponto de vista social, a incorporação de novatecnologia redefine o trabalho em saúde afetandoas relações internas da equipe de trabalho, assimcomo as relações dos profissionais com o usuário.Há a existência de uma tecnologia de organização,que se reporta principalmente aos recursos huma-nos que fazem parte dos serviços de saúde, consi-derando a noção de equipe e o tipo de pessoas queatuam na área assistencial(17).

Embora exista o reconhecimento do forte com-ponente de centralização na figura do médico naspráticas de saúde, ao fazer a observação das rela-ções internas dessas práticas é constatada tambéma captura de determinadas tecnologias por outrosprofissionais. A enfermagem vivencia essa situa-ção nas diferentes especialidades de atuação, as-sim como nas questões que privilegiam aspectosorganizacionais. Nas equipes é evidenciada a rela-ção direta dos diferentes status profissionais, mes-mo que não explícitos, com a complexidade dastecnologias apreendidas e utilizadas. Como exem-plo dessa realidade temos o grande interesse damaioria dos acadêmicos de enfermagem pela altacomplexidade clínica e dos equipamentos existen-

tes nos centros de terapia intensiva, assim como aauto-imagem e o reconhecimento elevados dos pro-fissionais que atuam em intensivismo, também pelodomínio clínico e pelo manuseio de equipamentossofisticados, como se fossem os únicos arsenaistecnológicos capazes de responderem às necessi-dades dos usuários.

Há prejuízo também nas relações enfermeiro/usuário e enfermeiro/equipe, pois essas relações,além de serem intermediadas pelos equipamentos,também o são pela engrenagem organizacionalnormativa e estruturada.

É oportuno reforçar que é imprescindível o con-tato e a permeabilidade constante dos diferentessaberes utilizados pelos profissionais da saúde nasua prática específica, assim como os pertinentes àorganização dos serviços de saúde, com o tecidosocial. Esse contato incentiva a utilização e a cria-ção de tecnologias mais contextualizadas, que res-pondam de forma mais efetiva às necessidades in-tegrais dos indivíduos inseridos nos processos detrabalho - usuários e trabalhadores, repercutindonos próprios estabelecimentos, na organização dasaúde e, conseqüentemente, na sociedade como umtodo(5).

Para tanto, é essencial a apreensão dessastecnologias pelos diferentes profissionais de saú-de, agregada à atividade gerencial. Nessa instânciaé inquestionável a atuação do enfermeiro para aconstrução desse caminho.

GERENCIAMENTO DO CUIDADO

As questões gerenciais têm suscitado muitaspreocupações em todos os segmentos da socieda-de, tendo em vista que delas depende a consecu-ção dos objetivos organizacionais. Na área da saú-de existe porém, uma particularidade: nela encon-tra-se, no interior dos objetivos esperados, o alme-jado resultado proveniente da trajetória do usuárioatravés dos serviços de saúde e da atenção a eleprestada.

Ao enfocar os resultados da atenção ao usuárionos serviços de saúde é conveniente salientar queapesar da alta velocidade das mudanças do ambien-te nas últimas décadas ter contribuído para a flexibi-lidade das empresas, para a procura de agilidade nasrespostas às demandas do ambiente, para um lugardestacado ao capital humano e para uma gestão deprodutos e serviços centrados no cliente, a vida daspessoas tem se alterado muito pouco(1).

Em âmbito hospitalar verifica-se que, apesar damodernização e evolução em nível organizacional e

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tecno-científico, em grande parte desses estabele-cimentos, nos níveis intermediários da hierarquiaadministrativa, nos quais situa-se freqüentementeo enfermeiro, as funções gerenciais são confusas,diluídas e um tanto distantes do usuário e das práti-cas interdisciplinares. Esse modo de ser da organi-zação tem interferência constante nos processos detrabalho, no modelo de assistência e conseqüente-mente na qualidade do cuidado prestado.

No entanto, o usuário de saúde ao pontuar asua insatisfação com a atenção recebida, não a tematrelado à falta de conhecimentos técnico-científi-cos, mas sim, à falta de interesse e responsabilizaçãodos profissionais acerca de seus problemas e ne-cessidades(17), deixando transparecer que há algoerrado na forma como essa atenção está sendoconduzida.

É necessário dar ênfase ao fato de que

no campo da saúde o objeto não é a cura, oupromoção e proteção da saúde, mas a produçãodo cuidado, por meio do qual se crê que se pode-rá atingir a cura e a saúde, que são de fato osobjetivos a que se quer chegar(14).

É impreterível, portanto, reconhecer o cuidado comofoco possível e necessário de ser gerenciado den-tro do universo organizacional em uma dimensãoque extrapole o tecnicismo.

No entanto, o modelo clínico de assistência e omodelo científico de administração ainda embaçamo olhar do enfermeiro enquanto exerce o papelgerencial, tirando-lhe muitas vezes a clareza de quaisações fazem parte da concretização desse cuidado.O enfermeiro, na área hospitalar, ainda se perde noexercício das funções administrativas, voltado paraa tecnoburocracia, fazendo o gerenciamento dasunidades de internação com a lógica do geren-ciamento científico, enfatizando o controle mecâni-co das atividades, muitas vezes desenvolvidas poroutros agentes(18).

O diferencial que irá demarcar o gerenciamentofeito pelos enfermeiros como sendo verdadeiramen-te gerenciamento do cuidado será o seu posiciona-mento diante do modo como desenvolvem o traba-lho. É necessário levar em conta como esses profis-sionais se envolvem em suas atividades, que sabe-res utilizam e principalmente a quem ou ao que res-pondem quando os utilizam.

Fazer gerenciamento do cuidado implica em tê-lo como foco das ações profissionais e em utilizaros saberes administrativos como mais uma tecno-logia (leve-dura) no sentido de sua concretização.No caso específico da enfermagem essa concre-

tização pode ser através de ações diretas do profis-sional com o usuário, por intermédio de delegaçãoe ou articulação com outros profissionais da equi-pe de saúde. O enfermeiro gerencia o cuidado quan-do o planeja, quando o delega ou o faz, quandoprevê e provê recursos, capacita sua equipe, educao usuário, interage com outros profissionais, ocu-pa espaços de articulação e negociação em nomeda concretização e melhorias do cuidado(5).

É impreterível que o enfermeiro ocupe os espa-ços de discussão e negociações estratégicas para agarantia do cuidado e agregue diferentes tecno-logias às suas ações, levando em consideração, deforma muito especial, o conteúdo subjetivo e sensí-vel que permeia o mundo do cuidado. É importanteconsiderar o teor significativo, pessoal, imprevisível,não rotineiro existente nas diversas relações entreos sujeitos que fazem parte dos processos de tra-balho e que precisam ser reconhecidas para que osobjetivos individuais – dos usuários e trabalhado-res – e da própria organização sejam alcançados.

Para tanto, são necessários processos gerenciaisque incorporem conhecimentos, atitudes e açõestanto da ordem do racional como do sensível, assimcomo o entrelaçamento e a aproximação entre o cui-dar e o gerenciar. Essas aproximações fazem partede um novo paradigma da enfermagem que está sen-do construído na atualidade(18).

Nesse contexto em construção é necessária es-pecial atenção aos recursos humanos, pois todo oprofissional de saúde, independente do papel quedesempenhe

(...) estará sempre sendo um operador do cuida-do, ao mesmo tempo que um administrador dasrelações com os vários núcleos de saberes pro-fissionais que atuam nesta intervenção, ocupan-do um papel de mediador na gestão dos proces-sos multiprofissionais e disciplinares que permi-tem agir em saúde, diante do ‘caso’ concretoapresentado (...)(14).

O enfermeiro pode reconhecer-se nessa citação,assim como pode reconhecer também os profissio-nais que com ele atuam e que, por sua vez, tambémcuidam. Ao ser apreendida essa concepção torna-se difícil seguir com práticas calcadas nos modelostradicionais de administração científica e burocráti-ca embutidos no gerenciamento de enfermagem deaté então, tendo em vista a possibilidade de abertu-ra de espaços e a legitimação de possibilidades deum fazer diferente, que pode ser partilhado, co-res-ponsabilizado e descentralizado.

Temos a partir dessa visão a inclusão do outronos processos gerenciais, não como recurso, mas

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sim como sujeito das ações. Esse outro pode ser ocolega de equipe, o profissional de outra área ou opróprio usuário, e vem dotado de saberes, emoções,limitações, potencialidades, poderes – enfim de ca-racterísticas humanas, e define juntamente com oenfermeiro a qualidade do cuidar(5).

Dessas considerações emerge o fato de que otrabalho gerencial é coletivo,

cada vez mais interdependente, determinadopelas demandas e necessidades do cliente e queo seu sucesso está ancorado na solidariedade,na ética e em times de trabalho que respeitem evalorizem as diferenças, enquanto aspectoscomplementares de grupos heterogêneos depessoas que colocam à disposição do clienteseus conhecimentos e habilidades(1).

Sendo assim, devem ser considerados fatorescomo a capacidade e envolvimento dos gestores,dos profissionais que comandam em instâncias maiselevadas no interior dos estabelecimentos, dos pro-fissionais das áreas de apoio, dos profissionais daárea da assistência e o usuário como imprescindí-veis para o sucesso das ações gerenciais focadasno cuidado.

Enfatizamos o envolvimento dos trabalhadoresde saúde e usuários para que haja mudanças nasformas de se fazer gestão e assistência, pois sãoeles que refletem o cotidiano. Dessa forma,instrumentalizá-los e auxiliar na sua construção en-quanto sujeitos que operam nesse cotidiano é im-prescindível(19).

É necessário que o trabalho do enfermeiro, aogerenciar o cuidado, resulte em mais do que sim-plesmente organizar o serviço segundo padrões deeficiência, mas acima de tudo, consiga também cons-truir sujeitos sociais nesse território singular de prá-tica, tendo em vista que são esses sujeitos que con-

tribuem para a concretização e dão característicasao cuidado(20).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É preciso, portanto, refletir criticamente e lançarnovo olhar sobre os processos de gerenciamentodo cuidado, a fim de que seja construída uma novarealidade organizacional alinhada a melhores práti-cas. Essas novas práticas do cuidado devem estarsustentadas pela utilização diferenciada e inovado-ra dos distintos tipos de tecnologias, que não só aspertencentes aos modelos tecnológicos utilizadosno desenvolvimento da administração científica eno modelo clínico de assistência.

O gerenciamento do cuidado exige dos profissi-onais da saúde e particularmente do enfermeiro, umavisão que integre e acolha os valores e lógicas dife-renciadas impressos nas necessidades dos usuári-os, não manifestos ou reconhecidos até algum tem-po atrás. Diante dessa realidade é necessário ummergulho dos profissionais nos aspectos subjeti-vos das inter-relações, na sua potencialidade decriatividade e autonomia, no sentido de darem con-ta da satisfação das necessidades emergentes nosprocessos de trabalho, cujas soluções não são en-contradas em nenhum manual de normas, rotinas etécnicas.

O grande compromisso e desafio de quemgerencia o cuidado hoje é o de valorizar e habilitar-se para utilizar as relações como uma tecnologia, nosentido de edificar um cotidiano, por intermédio daconstrução mútua entre os sujeitos. E, através des-sas mesmas relações, dar sustentação à satisfaçãodas necessidades dos indivíduos e valorizar traba-lhadores e usuários como potentes para interviremno trabalho vivo em ato – espaço de concretizaçãodo cuidado.

REFERÊNCIAS

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Flavia Raquel RossiMaria Alice Dias da Silva

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(8) Gonçalves RBM. Práticas de saúde: processo de tra-balho e necessidades. São Paulo: CEFOR; 1992. (Ca-dernos CEFOR. Textos; 1)

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(12) Vaz MRC. Trabalho em saúde: expressão viva davida social. In: Leopardi MT, organizadora. Proces-so de trabalho em saúde: organização e subjetivida-de. Florianópolis: Papa-Livros; 1999. p. 57-70.

(13) Cecilio LCO. A necessidade de saúde como conceitoestruturante na luta pela integralidade e eqüidade naatenção. In: Pinheiro R, Mattos RA, organizadores.O sentido da integralidade na atenção e no cuidado àsaúde. Rio de Janeiro: ABRASCO; 2001. p. 113-26

(14) Merhy EE. Saúde: a cartografia do trabalho vivo.São Paulo: HUCITEC; 2002.

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(16) Gonçalves RBM. Tecnologia e organização socialdas práticas de saúde: características tecnológicasdo processo de trabalho na rede estadual de centrosde saúde de São Paulo. São Paulo: HUCITEC; 1994.

(17) Testa M. Pensar em saúde. Porto Alegre: Artes Mé-dicas; 1992.

(18) Ferraz CA. As dimensões do cuidado em enferma-gem: enfoque organizacional. Acta Paul Enferm 2000;13(n. esp Pt 1):91-7.

(19) Marques GQ, Lima MADS. As tecnologias levescomo orientadoras dos processos de trabalho emserviços de saúde. Rev Gaúcha Enferm 2004;25(1):17-25.

(20) Fracolli LA, Maeda ST. A gerência nos serviços pú-blicos de saúde: um relato de experiência. Rev EscEnferm USP 2000; 34(2):213-7.

Correspondência:Flávia Raquel RossiUniv. Caxias do SulCentro de CiênciasBiológicas e da SaúdeDepto. de EnfermagemRua Francisco GetulioVargas, 1130 - Petrópolis - Caxias do Sul95070-560 - RGS

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