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Geografia Prof. Ivanilson Lima Sistematização da Geografia A falta da constituição de um Estado nacional, a extrema diversidade entre os vários membros da Confederação, a ausência de relações duráveis entre eles, a inexistência de um ponto de convergência das relações econômicas – todos estes aspectos conferem à discussão geográfica uma relevância especial, para as classes dominantes da Alemanha, no início do século XIX. Temas como domínio e organização do espaço, apropriação do território, variação regional, entre outros, estarão na ordem do dia na prática da sociedade alemã de então. É, sem dúvida, deles que se alimentará a sistematização geográfica. Do mesmo modo como a Sociologia aparece na França, onde a questão central era a organização social (um país em que a luta de classes atingia um radicalismo único), a Geografia surge na Alemanha onde a questão do espaço era a primordial. (MORAES, págs. 14 e 15). Nesse quadro de tensões, temos então palco para a criação das ideias que originariam a Geografia no território que hoje compõe a Alemanha. A partir das discussões iniciadas pelos autores Alexander Von Humboldt (1769-1859 – conselheiro do rei da Prússia) e Karl Ritter (1779-1859 – tutor de uma família de banqueiros), ambos de origem prussiana e ligados a aristocracia da época. Ambos ocuparam altos cargos da hierarquia universitária alemã. 1. Alexander Von Humboldt Formação naturalista em Geologia e Botânica. Entendia que a Geografia era uma ciência terrestre que atuaria como uma espécie de ciência de síntese de todos os conhecimentos relativos a Terra. Propõe um empirismo raciocinado, na qual o cientista, deve intuir os fatos a partir da observação dos variados fenômenos naturais, combinando o que foi observado nesses locais e procurando as constantes dos fenômenos, mesmo com as variações aparentes. Podemos então intuir, a partir disso que o geógrafo deveria contemplar a paisagem, esta causaria uma impressão no mesmo e a partir de uma observação constante e sistematizada ele chegaria a uma explicação para o local observado. 2. Karl Ritter Formação social em Filosofia e História. Entendia que a Geografia deveria estudar os arranjos individuais das regiões, comparando-os e buscando suas particularidades. Ritter já propõe uma abordagem metodológica mais explícita, definindo a partir do que ele chama de sistema natural que a Geografia tem por finalidade buscar definir a individualidade dos diferentes locais, compondo os diferentes arranjos naturais. Cada um desses arranjos então teria seu conjunto de elementos, sendo o homem o principal . Outro ponto importante é o fato de o autor considerar que a ciência deveria ser uma forma de relação entre o homem e o “criador”, dessa forma, o estudo geográfico serviria também para uma aproximação com a divindade, pois a ordem natural obedeceria a um fim previsto por Deus. Consequentemente, podemos dizer que a proposta de Ritter é antropocêntrica e regional.

Sistematização e Correntes Geográficas

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Page 1: Sistematização e Correntes Geográficas

Geografia Prof. Ivanilson Lima

Sistematização da Geografia

A falta da constituição de um Estado nacional, a extrema diversidade entre os vários membros da Confederação, a ausência de relações duráveis entre eles, a inexistência de um ponto de convergência das relações econômicas – todos estes aspectos conferem à discussão geográfica uma relevância especial, para as classes dominantes da Alemanha, no início do século XIX. Temas como domínio e organização do espaço, apropriação do território, variação regional, entre outros, estarão na ordem do dia na prática da sociedade alemã de então. É, sem dúvida, deles que se alimentará a sistematização geográfica. Do mesmo modo como a Sociologia aparece na França, onde a questão central era a organização social (um país em que a luta de classes atingia um radicalismo único), a Geografia surge na Alemanha onde a questão do espaço era a primordial. (MORAES, págs. 14 e 15).

Nesse quadro de tensões, temos então palco para a criação das ideias que originariam a

Geografia no território que hoje compõe a Alemanha. A partir das discussões iniciadas pelos autores

Alexander Von Humboldt (1769-1859 – conselheiro do rei da Prússia) e Karl Ritter (1779-1859 – tutor

de uma família de banqueiros), ambos de origem prussiana e ligados a aristocracia da época. Ambos

ocuparam altos cargos da hierarquia universitária alemã.

1. Alexander Von Humboldt

Formação naturalista em Geologia e Botânica.

Entendia que a Geografia era uma ciência terrestre que atuaria como uma espécie de ciência de

síntese de todos os conhecimentos relativos a Terra.

Propõe um empirismo raciocinado, na qual o cientista, deve intuir os fatos a partir da

observação dos variados fenômenos naturais, combinando o que foi observado nesses locais e

procurando as constantes dos fenômenos, mesmo com as variações aparentes. Podemos então intuir,

a partir disso que o geógrafo deveria contemplar a paisagem, esta causaria uma impressão no mesmo

e a partir de uma observação constante e sistematizada ele chegaria a uma explicação para o local

observado.

2. Karl Ritter

Formação social em Filosofia e História.

Entendia que a Geografia deveria estudar os arranjos individuais das regiões, comparando-os e

buscando suas particularidades.

Ritter já propõe uma abordagem metodológica mais explícita, definindo a partir do que ele

chama de sistema natural que a Geografia tem por finalidade buscar definir a individualidade dos

diferentes locais, compondo os diferentes arranjos naturais. Cada um desses arranjos então teria seu

conjunto de elementos, sendo o homem o principal. Outro ponto importante é o fato de o autor

considerar que a ciência deveria ser uma forma de relação entre o homem e o “criador”, dessa forma,

o estudo geográfico serviria também para uma aproximação com a divindade, pois a ordem natural

obedeceria a um fim previsto por Deus. Consequentemente, podemos dizer que a proposta de Ritter é

antropocêntrica e regional.

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A obra de Ritter já e explicitamente metodológica. A formação de Ritter também e radicalmente

distinta da de Humboldt, enquanto aquele era geólogo e botânico, este possui formação em Filosofia

e História. Ritter define o conceito de “sistema natural”, isto é, uma área delimitada dotada de uma

individualidade. A Geografia deveria estudar estes arranjos individuais, e compará-los. Assim, a

Geografia de Ritter é, principalmente, um estudo dos lugares, uma busca da individualidade destes.

Categorias de Análise da Geografia.

A Geografia usa-se de diferentes categorias para basear seus estudos. Essas categorias servem

para orientar e recortar o espaço a ser analisado pelo cientista, delimitando o espaço, usando-se de

conhecimentos cartográficos.

Figura 1: Adaptado de http://obshistoricogeo.blogspot.com.br/2014/12/o-conceito-de-paisagem-lugar-territorio.html

1. Paisagem

Refere-se às configurações externas do espaço. Por muitas vezes, ela foi definida como “aquilo

que a visão alcança”. Porém, essa definição desconsidera as chamadas “paisagens ocultas”, ou seja,

aqueles processos e dinâmicas que são visíveis, mas que de alguma forma foram ocultados pela

sociedade. Além disso, tal definição também peca por apenas considerar o sentido da visão como

preceptora do espaço, cabendo a importância dos demais sentidos, com destaque para a audição e o

olfato.

Dessa forma, podemos afirmar, de maneira simples e direta, que o conceito de paisagem refere-

se às manifestações e fenômenos espaciais que podem ser apreendidos pelo ser humano através de

seus sentidos.

Fonte: http://brasilescola.uol.com.br/geografia/categorias-geografia.htm no dia 05 de março de 2016.

2. Território

É classicamente definido como sendo um espaço delimitado. Tal delimitação se dá através de

fronteiras, sejam elas definidas pelo homem ou pela natureza. Mas nem sempre essas fronteiras são

visíveis ou muito bem definidas, pois a conformação de um território obedece a uma relação de poder,

podendo ocorrer tanto em elevada abrangência (o território de um país, por exemplo) quanto em

espaços menores (o território dos traficantes em uma favela, por exemplo).

Fonte: http://brasilescola.uol.com.br/geografia/categorias-geografia.htm no dia 05 de março de 2016.

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3. Região

É uma área ou espaço que foi dividido obedecendo a um critério específico. Trata-se de uma

elaboração racional humana para melhor compreender uma determinada área ou um aspecto dela.

Assim, as regiões podem ser criadas para realizar estudos sobre as características gerais de um

território (as regiões brasileiras, por exemplo) ou para entender determinados aspectos do espaço (as

regiões geoeconômicas do Brasil para entender a economia brasileira). Eu posso criar minha própria

região para a divisão de uma área a partir de suas práticas culturais ou por suas diferentes paisagens

naturais, entre outros critérios.

Fonte: http://brasilescola.uol.com.br/geografia/categorias-geografia.htm no dia 05 de março de 2016.

4. Lugar:

É uma categoria muito utilizada por aqueles pensadores que preferem construir uma concepção

compreensiva da Geografia. Grosso modo, o lugar pode ser definido como o espaço percebido, ou seja,

uma determinada área ou ponto do espaço da forma como são entendidos pela razão humana de

pertencimento a uma porção do espaço geográfico. Seu conceito também se liga ao espaço afetivo,

aquele local em que uma determinada pessoa possui certa familiaridade ou intimidade, como uma rua,

uma praça ou a própria casa.

Fonte: http://brasilescola.uol.com.br/geografia/categorias-geografia.htm no dia 05 de março de 2016.

Correntes do Pensamento Geográfico

A Geografia, no transcorrer do seu desenvolvimento teve diferentes formas de análise e

interpretação de como ocorreriam as relações entre sociedade e natureza, dessa forma, temos

diferentes pensamentos que se tornaram mais importantes em determinados locais e épocas

históricas, tendo assim constituida as diferentes Correntes do Pensamento Geográfico.

1. Geografia Determinista.

Um revigoramento do processo de sistematização da Geografia vai ocorrer com as formulações de Friedrich Ratzel. Este autor, também alemão e prussiano, publica suas obras no último quartel do século XIX. Enquanto Humboldt e Ritter vivenciaram o aparecimento do ideal de unificação alemã, Ratzel vivencia a constituição real do Estado nacional alemão e suas primeiras décadas. Suas formulações só são compreensíveis em função da época e da sociedade que as engendram. A Geografia de Ratzel foi um instrumento poderoso de legitimação dos desígnios expansionistas do Estado alemão recém-constituído. L. Febvre chegou a denominá-la de “manual de imperialismo”. Assim, cabe analisar, mesmo que em linhas gerais, o processo de unificação da Alemanha. (MORAES, pág. 18)

As formulações de Ratzel, a partir de sua obra Antropogeografia – fundamentos da aplicação da

Geografia à História nascem a partir da consolidação do Estado Alemão. E quais os principais

acontecimentos da unificação da Alemanha?

As relações capitalistas penetram tardiamente nesse país, que mantém características feudais

ainda no início do século XIX. Temos então como primeiro passo para essa unificação a Confederação

Germânica, porém que não conseguiu instaurar de imediato um governo central. Dentro dessa

confederação temos dois reinos mais importantes que disputam a hegemonia do estado alemão, a

Aústria e a Prússia. A partir de 1848 começam a aparecer levantes populares, que farão com que surjam

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movimentos das classes dominantes que pretendem acabar com essa revolução, formando um bloco

reacionário militar, aproximando os integrantes dessa classe e trazendo ações unificadas. Porém, como

a pauta dos dois blocos se concentra na unificação da Alemanha, isso acaba por aproximá-los e fazer

com que a unificação seja um caminho sem volta. Em virtude disso iniciamos uma guerra entre Aústria

e Prússia, saindo o segundo vitorioso.

Com a vitória prussiana, temos uma organização militarizada da sociedade e do Estado, trazendo

assim uma organização que atingiria toda a sociedade civil. Temos então, com a militarização prussiana

a instauração de uma política cultural nacionalista, visando justificar uma política expansionista

agressiva. Isso justificado pela unificação tardia alemã, que fez com que a mesma não participasse da

partilha dos territórios coloniais do século XIX, embora que essa unificação tardia não tenha impedido

um relativo desenvolvimento interno. Temos então um novo país capitalista industrial, que não possue

colônias.

Assim, a Geografia de Ratzel expressa diretamente um elogio do imperialismo, como ao dizer, por exemplo: “Semelhante à luta pela vida, cuja finalidade básica é obter espaço, as lutas dos povos são quase sempre pelo mesmo objetivo. Na história moderna a recompensa da vitória foi sempre um proveito territorial”. (MORAES, pág. 19).

Na obra de Ratzel, Antropogeografia, o autor define que o estudo geográfico tem que se

concentrar na influência que as condições naturais exercem sobre a humanidade. Essas influências

seriam percebidas na fisiologia e na psicologia dos indíviduos e através disso, na sociedade. A natureza

portanto influencia a constituição da sociedade e atuaria nas possibilidades de expansão de um povo,

trazendo obstáculos ou o acelerando. Para Ratzel: “O progresso significaria um maior uso dos recursos

do meio, logo, uma relação mais íntima com a natureza.” (MORAES, pág. 19). Assim, estabelecendo

essa relação de forma consolidada, a sociedade cria o Estado, se organizando para defender seu

território.

Outro ponto da proposta de Ratzel é o conceito de espaço vital: “este representaria uma

proporção de equilíbrio, entre a população de uma dada sociedade e os recursos disponíveis para suprir

suas necessidades, definindo assim suas potencialidades de progredir e suas premências territoriais.”

(MORAES, pág. 19). Através desse conceito podemos perceber que a Geografia proposta por Ratzel visa

defender o processo de expansão da Alemanha.

Na proposta de Ratzel temos ainda uma ciência empírica, mas, como já vimos em Humboldt,

pautada em um empirismo raciocinado. Nele, apesar de termos a figura do homem, esse ainda é visto

pelo seu carater biológico, excluindo suas qualidades específicas.

Um outro detalhe importante dessa escola geográfica são as diferentes visões criadas a partir

das formulações de Ratzel pelos seus seguidores. Acabaram por serem de certa forma extremamente

radicais, fundando a Corrente do Pensamento denominada de Determinismo Geográfico. Temos dessa

forma, uma forma de pensar que leva as formulações de Ratzel ao extremismo, trazendo afirmações

como: “as condições naturais determinam a História” ou “o homem é produto do meio”. De certa forma

reduzindo as proposições de Ratzel, que falava em influências. Uma outra proposição, um pouco

diferente das descritas é a de Huntington que fala por em sua obra Clima e Sociedade que, por exemplo,

os rigores do inverno explicariam o melhor desenvolvimento europeu, enquanto o clima tropical

justicava o subdesenvolvimento. Uma última formulação que surge no meio científico a partir de Ratzel

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é o conceito de Geopolítica, a partir do estudo das dominações territoriais, visando legitimar o

imperialismo.

2. Geografia Possibilista.

A outra grande escola da Geografia, que se opõe às colocações de Ratzel, vai ser eminentemente francesa, e tem seu principal formulador em Paul Vidal de La Blache. [...] A França foi o país que realizou, de forma mais pura, uma revolução burguesa. Ali os resquícios feudais foram totalmente varridos, a burguesia instalou seu governo, dando ao Estado a feição que mais atendia a seus interesses. [...] Napoleão Bonaparte completou este processo de desenvolvimento do capitalismo na França, o qual teve seu ponto de ruptura na Revolução Francesa, que varreu do quadro agrário deste país todos os elementos herdados do feudalismo. (MORAES, pág. 22).

Em face das transformações que ocorreram na França, temos dentro do seu território um grande

acirramento entre as classes sociais, gerando então intensos embates que fazem surgir no território

francês os estudos sobre Ciências Sociais. Em face dessas disputas, a burguesia, para não perder o

controle, investe na defesa das liberdades individuais, subjugadas a ordem do Estado, nesse cenário

então as ciências passam a ter papel fundamental. A França foi portanto o local onde se pode observar

de modo mais claro o avanço, domínio e consolidação da sociedade burguesa.

Na segunda metade do século XIX então, França e Alemanha (nesse caso representada ainda

pela Prússia) disputam a hegemonia sobre o continente europeu, gerando um choque de ideologias, e

a guerra Franco-Prussiana em 1870, na qual a Prússia sai vencedora. No contexto da guerra cai também

o Império de Napoleão Bonaparte, estabelecendo então uma república francesa dominada pela

Comuna de Paris, favorecendo o desenvolvimento da Geografia. Para esse governo, temos a ideia de

que “a guerra foi ganha pelos instrutores alemães”. Assim, Geografia passa a ser disciplina obrigatória

em todas as séries do ensino básico. Temos assim a busca por uma ideia de Geografia que se

contrapunha a Geografia Alemã.

A Geografia de La Blache vai propor então que o estudo da Geografia deve se focar na relação

homem-natureza, focando na perspectiva do estudo das paisagens, que o homem é um sujeito ativo

no meio, que sofre influência do meio, porém atua sobre essa realidade, transformando-a.

A Geografia de La Blache, surge como uma forma de combater e criticar a política expansionista

alemã e justificar as ações da burguesia francesa. Para tanto ele critica Ratzel em alguns pontos a saber.

Uma primeira crítica que La Blache faz é com relação a geografia de Ratzel se propor a tratar de

questões políticas de território, justificando que a ciência deveria ser neutra e imparcial. A outra crítica

é ao carater naturalista de Ratzel, criticando a atividade passiva do homem em relação a natureza. Um

desdobramento dessa crítica se foca nas proposições dos seguidores do pensador alemão, que

atribuíam um carater fatalista na relação homem e natureza, afirmando que a História era determinada

pelas condições naturais.

Uma das principais contribuições e desdobramentos da proposta lablachiana é a constante

discussão de regiões e do espaço humanizado nestas, em virtude da busca pelas individualidades dos

locais. Pode-se então dizer que a própria Geografia Regional é uma consequência do possibilismo. Uma

outra consequência foi o aparecimento de diversas especialidades da Geografia, como Geografia

Agrária, a Geografia Urbana, a Geografia das Indústrias, a Geografia das Populações, a Geografia

Urbana. Em virtude dessas especializações os estudos do possibilismo influenciaram diversos

pesquisadores das ciências humanas.

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3. Geografia Regional.

[...] a terceira grande orientação dentro da Geografia Tradicional, privilegiou um pouco mais o raciocínio dedutivo, antecipando um dos móveis da renovação geográfica nos anos sessenta. Isto decorreu da diferenciada fundamentação filosófica destes autores. A Geografia de Ratzel e a de Vidal tiveram sua raiz filosófica no positivismo de Augusto Comte, a qual foi passada acriticamente para seus seguidores. A geografia de Hettner e Hartshorne fundamentava-se no neokantismo de Rickert e Windelband. O fato de ter sido menos empirista não quer dizer que esta proposta tenha rompido com este traço marcante de toda a Geografia; apenas ela não se negou também ao uso da dedução. (MORAES, pág. 31).

Hettner, geógrafo alemão vai então propor uma terceira proposta de análise geográfica. Para

este, a Geografia deveria estudar as diferenciações entre as áreas, explicando porque e em que se

diferenciam as variadas porções da superfície terrestre. Para ele, essas diferenças seria por conta das

diferentes inter-relações entre os elementos presentes em cada paisagem. Porém, na época que foram

formuladas as idéias deste não alcançaram ampla divulgação em virtude do Determinismo e do

Possibilismo.

Temos então, após a Primeira Guerra Mundial, uma retomada das idéias de Hettner por um

renomado geógrafo americano, Richard Hartshorne, isso ocorre principalmente por conta da

ampliação do domínio cultural dos Estados Unidos sobre o Ocidente. Até o momento os geógrafos

americanos eram meros repetidores das idéias europeias. Hartshorne, apesar de se basear em Hettner,

aprimora as discussões propostas.

A geografia americana passa a se desenvolver a partir de 1930, tendo três diferentes vertentes,

porém, como já vimos, a mais amplamente divulgada formando uma corrente de pensamento foi vista

a partir de Hartshorne, seus estudos e formulações.

Uma diferença implantada por Hartshorne é a defesa de que as ciências se definiriam por

métodos próprios, assim a individualidade da Geografia se dava pela sua forma de analisar a realidade.

Hartshorne também afirma que o estudo geográfico deve trabalhar com as inter-relações entre os

elementos que faz com que ocorra a diferenciação das áreas.

O autor então formula os conceitos que chama de área e integração. A primeira seria uma

parcela da superfície terrestre diferenciada pelos critérios do observador. O segundo conceito defende

que o caráter de cada área é dado pela integração de fenômenos inter-relacionados, cabendo ao

pesquisador buscar todas as inter-relações possíveis nessa região. O autor define então essa forma de

pensar como Geografia Idiográfica, que levaria a um conhecimento bastante aprofundado do local

analisado. Temos dessa forma uma proposta de Geografia Regional.

Hartshorne também propõe o que ele chama de Geografia Nomotética, na qual o pesquisador

pararia nas primeiras observações e buscaria analisar e reproduzir os estudos em diferentes regiões,

comparando as diferentes integrações e chegando a um padrão de variação dos fenômenos

observados. Assim temos nessa proposta uma Geografia Geral, baseada a partir das regionalizações.

Page 7: Sistematização e Correntes Geográficas

4. Geografia Pragmática.

A Geografia Pragmática é uma tentativa de contemporaneizar, em vista dessa nova função, este campo específico do conhecimento, sem romper seu conteúdo de classe. Suas propostas visam apenas uma redefinição das formas de veicular os interesses do capital, daí sua crítica superficial à Geografia Tradicional. Uma mudança de forma, sem alteração do conteúdo social. Uma atualização técnica e lingüística. Passa-se, de um conhecimento que levanta informações e legitima a expansão das relações capitalistas, para um saber que orienta esta expansão, fornecendo-lhe opções e orientando as estratégias de alocação do capital no espaço terrestre. Assim, duas tarefas diferentes, em dois momentos históricos distintos, servindo a um mesmo fim. Nesse sentido, o pensamento geográfico pragmático e o tradicional possuem uma continuidade, dada por seu conteúdo de classe – instrumentos práticos e ideológicos da burguesia. (MORAES, pág. 37).

Nessa corrente geográfica, advinda após um movimento de renovação da Geografia, iniciado no

pós-Segunda Guerra Mundial e tendo sua maior força de divulgação entre os anos de 1960 e 1970.

Nessa linha de pensamento, temos diversos geógrafos, que assumem uma renovação ainda em função

da manutenção da elite burguesa e de sua atuação global em forma de grandes corporações, essa linha

de pensamento pode ser considerada como uma crítica meramente acadêmica que se baseia no que

podemos chamar de neopositivismo.

De forma sucinta, podemos dizer que o neopositivismo sai da linha de um empirismo de mera

observação direta em campo, por um empirismo mais abstrato, baseado em métodos matemático-

estatísticos. Ou seja, defendia que as formulações deveriam se basear mensurações, estatísticas,

gráficos e tabelas ao invés do trabalho de campo. Um claro objetivo dessa forma de pensar é o uso

desses dados para intervenção do Estado sobre a realidade observada nos mais diversos locais.

A partir dessa vertente de pensamento, podemos perceber duas coisas sobre essa nova

realidade de estudo da Geografia: primeiro que essa nova forma torna-se demasiadamente formal,

presa também as aparências do real, já que os dados estatísticos serão o foco de trabalho, para orientar

os investimentos estatais sobre a economia em meio a crise que se coloca no pós-Segunda Guerra de

forma a garantir a maximização dos lucros e capitais, assim como a manutenção da exploração do

trabalho; o segundo ponto é o empobrecimento dado a análise geógrafica em comparação com os

movimentos anteriores, visto que as escolas anteriores com suas observações de campo, ao menos

concebiam o espaço em sua riqueza e complexidade, diminuindo a mesma meramente a análises

quantitativas.

5. Geografia Crítica.

Os autores da Geografia Crítica vão fazer uma avaliação profunda das razões da crise: são os que acham fundamental evidenciá-la. Vão além de um questionamento acadêmico do pensamento tradicional, buscando as suas raízes sociais. Ao nível acadêmico, criticam o empirismo exacerbado da Geografia Tradicional, que manteve suas análises presas ao mundo das aparências, e todas as outras decorrências da fundamentação positivista (a busca de um objeto autonomizado, a idéia absoluta de lei, a não-diferenciação das qualidades distintas dos fenômenos humanos etc.). Entretanto, vão além, criticando a estrutura acadêmica, que possibilitou a repetição dos equívocos: o “mandarinato”, o apego às velhas teorias, o cerceamento da criatividade dos pesquisadores, o isolamento dos geógrafos, a má formação filosófica etc. E, mais ainda, a despolitização ideológica do discurso geográfico, que afastava do âmbito dessa disciplina a discussão das questões sociais. Assim, ao nível da crítica de conteúdo interno da Geografia, não deixam pedra sobre pedra. (MORAES, pág. 42).

Nessa linha de pensamento que se evidencia também no movimento de renovação da ciência

geográfica, tendo seu início em meados dos anos de 1970, como uma forma de pensamento que se

mostrava contrário as propostas tanto da Geografia Pragmática, a quem é contemporânea, como as

Page 8: Sistematização e Correntes Geográficas

escolas anteriores. Ela surge em diversas discussões nos, Estados Unidos, Grã-Bretanha, Alemanha,

Brasil, dentre outros locais, mas com maior força das discussões francesas a partir de Yves Lacoste,

fomentando uma discussão sobre os problemas sociais de forma plural, mas com fortes influências do

materialismo histórico e do método dialético em suas primeiras discussões.

Temos então com essa nova escola, uma crítica ao espaço geográfico em toda sua complexidade,

entendendo que, dado o grau de desenvolvimento da humanidade e de sua complexidade, os fatores

sociais não podem ser desconsiderados, assim como seu processo de desenvolvimento. Cria-se então

uma crítica a própria Geografia, evidenciando que as diferentes escolas surgiram com o intuito de

propagar os ideais que fossem mais apropriados para as classes burguesas detentoras do poder

econômico. A luta dessa escola então vai se concentrar na conscientização da sociedade e defesa do

saber como instrumento de dominação das classes mais favorecidas sobre as classes a menos

favorecidas.

É nítida então que a Geografia Crítica irá se fazer uso do materialismo histórico e dialético

elaborado por Karl Marx, ao propor uma análise histórica das causas que levam as diferentes estruturas

sociais percebidas e suas respectivas consequências sobre o espaço geográfico. Porém, ao mesmo

tempo que faz uso dessa, traz consigo uma perspectiva plural, dado a sua concepção dialética, que as

análises devem levar em consideração as demais formas de análise da realidade que estão em curso e

os diferentes conhecimentos filosóficos, sociológicos, urbanísticos, dentre outros, pois afinal de contas

é defendido também que se quebre com o isolamento dos estudos geográficos.

[...]o movimento de renovação, atualmente em curso na Geografia, com suas duas vertentes, reproduz, ao nível desse campo específico do conhecimento, o embate ideológico contemporâneo – reflexo, no plano da ciência, da luta de classes na sociedade capitalista. Os geógrafos críticos, em suas diferenciadas orientações, assumem a perspectiva popular, a da transformação da ordem social. Buscam uma Geografia mais generosa e um espaço mais justo, que seja organizado em função dos interesses dos homens. (MORAES, pág. 47).

Referências Bibliográficas

MORAES, A. C. R. Geografia: pequena história crítica. 20ª ed. Anna Blume. 2000.

PENA, R. A. Categorias de Análise. Disponível em: < http://brasilescola.uol.com.br/geografia/categorias-

geografia.htm> no dia 05 de março de 2016.

Observatório Histórico Geográfico. O conceito de paisagem, lugar, território e região. Disponível em: <

http://obshistoricogeo.blogspot.com.br/2014/12/o-conceito-de-paisagem-lugar-territorio.html> no dia 05 de março de

2016.

SANTOS, M. Categorias de Análise da Geografia: Espaço Geográfico, Paisagem, Lugar, Território e Região.

Disponível em: <http://pt.slideshare.net/markoabreu/categorias-de-anlise-da-geografia-espao-geogrfico-paisagem-

lugar-territrio-e-regio> no dia 07 de março de 2016.