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“Umbanda e Loucura” Simoni Lahud Guedes Bacharelado (1971) e Licenciatura (1973) em Ciências Sociais pela Universidade Federal Fluminense (UFF) Mestrado e Doutorado (1992) em Antropologia Social pelo Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Professora e pesquisadora na área de Antropologia, com ênfase em Cultura de Trabalhadores

Umbanda e loucura

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“Umbanda e Loucura”

Simoni Lahud Guedes

• Bacharelado (1971) e Licenciatura (1973) em Ciências Sociais pela Universidade Federal Fluminense (UFF)

• Mestrado e Doutorado (1992) em Antropologia Social pelo Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

• Professora e pesquisadora na área de Antropologia, com ênfase em Cultura de Trabalhadores

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Loucura como categoria social

• A loucura pode ser manipulada socialmente

• Foucault reconstrói a percepção que apresenta cada sistema cultural, das relações entre razão e não-razão

• Foucault (1968): “O reconhecimento que permite dizer: ‘Este é um louco’ não é um ato simples nem imediato... Cada cultura tem seu limiar [de sensibilidade] particular e ele evolui com a configuração desta cultura”

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Psiquiatra francês Philippe Pinel (1745-1826) avaliando “loucos”, acorrentados, no Asilo (hoje, hospital) de Salpêtrière em Paris, em 1795

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O que é a Umbanda?• “ ...uma religião a pique de fazer-se; ainda não cristalizada, organizada,

multiplicando-se numa infinidade de subseitas, cada uma com seu ritual e mitologia próprios.” (Roger Bastide, 1971)

• “Se o Espiritismo é crença a procura de uma instituição, Umbanda é aspiração religiosa em busca de uma forma” (Ferreira de Camargo, 1961)

• Culto afro- brasileiro e ligado ao Espiritismo: Kardec é leitura obrigatória (informantes)

• Informante A: Umbanda (de mbanda: sacerdote) ≠ Quimbanda (de ki-mbanda: invocadores de espíritos). Quimbanda como baixo espiritismo e Umbanda como médio espiritismo

• Informante B: Não há separação entre Umbanda e Quimbanda

• A ausência de uma entidade unificadora e a relativa liberdade que os chefes de terreiro possuem sobre a definição dos temas rituais ou doutrinários contribui, por exemplo, para a divergência dos dois informantes.

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O que é a Umbanda?• “a Umbanda é subdividida em 7 ‘linhas’ e cada uma delas é comandada

por um Orixá ou Santo Católico ... / cada ‘linha’ se desdobra em legiões, falanges, etc. ... (Ferreira de Camargo, 1961)

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O que é a Umbanda?

A Umbanda é uma religião heterodoxa, com uma junção de elementos africanos (“orixás” e culto aos antepassados),indígenas (culto aos antepassados e elementos da natureza),católicos (europeus que trouxeram o cristianismo e seus santos)e do Espiritismo (fundamentos de mediunidade, reencarnação, lei do carma, progresso espiritual)

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Conceitos básicos encontrados na maioria das casas:

• A existência de uma fonte criadora universal, um Deus supremo, pode receber os nomes Zambi, Olorum ou Oxalá. Algumas das entidades, quando incorporadas, podem nomeá-lo de outra forma, como por exemplo Tupã (para os caboclos)

• O compromisso com "a manifestação do espírito para a caridade". O que significa que a ajuda ao próximo não deve ser retribuída em dinheiro ou valor de qualquer espécie

• Ritual variando pela origem / Vestes, em geral, brancas

• Altar, gongá ou peji com imagens católicas, preto-velhos, caboclos, baianos, marinheiros e boiadeiros.

• Magia branca / Não sacrifício de animais

• Batizado, consagração e casamento

• O culto aos orixás como manifestações divinas

• A manifestação dos guias para exercer o trabalhoespiritual incorporados em seus médiuns ou "aparelhos", também chamados de "cavalos”

• O mediunismo como forma de contato entre o mundofísico e o espiritual, manifestado de diferentes formas / Crença na imortalidade da alma / Crença na reencarnação e nas leis cármicas

O que é a Umbanda?

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A Umbanda e as acusações de loucura

• Nina Rodrigues em seu livro “As Collectidades Anormaes” (1939) aponta a Umbanda como um dos casos de loucura coletiva, onde o contágio se dá por imitação. Como causa, ele aponta a falta de pureza das crenças religiosas, justificada pelo mestiçamento das raças. Concluiu que o Brasil resultou da junção do monoteísmo europeu, do fetichismo africano e da astrolatria aborígene. Assim, a confusão e conflito de idéias provindas de culturas diferentes é a principal causadora dessa doença.

• Arthur Ramos, discípulo de Nina Rodrigues, em “Loucura e Crime” (1937) diz: “ A mentalidade pré-lógica domina em todas estas práticas de curanderismo naquelles que soffrem a influência das religiões primitivas do negro e do índio.”

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• Ainda, para Nina Rodrigues a normalidade está situada na “pura” tradição ocidental e cristã dos colonizadores

• “Médico da AL – PE combate a macumbaAo certificar-se no hospital psiquiátrico estadual - na Tamarineira, subúrbio de Recife - de que 70% dos internados lá diariamente são pacientes em transe por delírios influenciados por pais-de-santo, o deputado e médico Dr. Manuel Gilberto Cavalcanti denunciou a situação ao plenário de AL pernambucana, e agora sustenta campanha contra os terreiros de macumba.”

(Publicado no Rio de Janeiro – Jornal médico Pulso – 10 de novembro de 1972)

A Umbanda e as acusações de loucura

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UMBANDA = LOUCURA Ambas estão fundadas na poluição de idéias e por isso

se equacionam, de onde a luta que se trava contra a loucura e a Umbanda, pode ser resumida na oposição

básica: racional/ irracional

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Umbanda e loucura para os informantes

Informante A:“ Nos casos de loucura que encontramos por aí – pessoas com

alteração de fala, na locomoção, que gritam, esbravejam à toa, que apresentam mudanças de comportamento – cerca de 90% não são doença, somente 10% são realmente doença. A maior parte das manifestações de ordem nervosa correm por conta de EXU e dos EGUNS... São influências espirituais”

Informante B: “Há casos de loucura com origem física com os quais a Umbanda

nada tem que ver. A maioria, entretanto, são problemas espirituais – o encosto de um espírito na vítima. A mediunidade não desenvolvida ou paralisada provoca perturbações mentais”

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Conclusão da autora

“Tanto na teoria que acusa a Umbanda de loucura quanto na teoria que esta apresenta, estamos tratando de poluição. A lógica é a mesma. Só que a Umbanda desloca a poluição para as relações entre os indivíduos... Por isto a Umbanda não trata com ‘LOUCURA’, problema situado numa mente individual, mas com ‘PERTURBAÇÃO’, que envolve uma relação. É por isso que a sua teoria está repleta de referências a comunicação: ’O Exu é um mensageiro’; ‘a comunicação entre os espíritos se dá por aproximação e afastamento’...

Todos clamam pela ordem: no indivíduo (isto é, na cultura individualizada) ou nas relações.”