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O LAGO Sempre que eu o via, estava sentado diante da janela olhando para algo que somente ele poderia enxergar. Isso criava em quem o percebia um constante questionamento: o que o interessava tanto naquela direção? Sua residência era de um estilo neo- gótico, ele residia naquele local há vários anos, desde que sua família ainda existia. A visão daquela casa imensa, com torres, nos reportava aos momentos nostálgicos que não sabíamos descrever, assim como não descrevíamos o que ele via. Sua rotina era monótona, saia todos os dias às seis da manhã, percorria os grandes jardins de sua casa, tocava em algumas plantas, principalmente rosas em botão, e perseguia algumas ervas daninhas, com uma repulsa de algo que não estava ali "fazendo o bem". Procurava a única mercearia do local e comprava, sempre, o mesmo tipo de pão, um pedaço de queijo e levava para casa, onde entrava e permanecia por algumas poucas horas. Parecia o seu desjejum....Depois saia, novamente, em busca de algo nos arredores da pequena cidade em que morávamos, percorria ruelas, escadarias, igrejas já abandonadas e sempre voltava com um ar triste e desapontado. As tardes voltava a sua rotina de vigia, o olhar vago em direção ao infinito de sua janela em uma das torres de sua casa. A curiosidade da cidadela foi se desvanecendo com o processo repetitivo daquele homem, as pessoas já não o percebiam, o seu desjejum, o seu andar pelo jardim e pela cidade não era percebido. No entanto, um grupo de jovens, com sua ânsia de descobertas, emoções associadas a grandes fantasias decidiram que iriam identificar o objetivo das saídas, desapontamentos e olhares vagos em uma direção. O grupo era formado por três adolescentes, sendo que um deles bastante introspectivo e tinha como objetivo conseguir viver o mundo daquele homem, nem que fosse por pequenos momentos. O trio começou uma perseguição ansiosa atrás daquele senhor, subdividiam-se e enquanto um o acompanhava vigiando seus passos, o segundo vigia a possibilidade de seu retorno inesperado e o terceiro entrava em sua casa para a procura de algo que desconhecia.. Essa jornada durou vários dias, meses..... Até que o responsável pelo

O Lago

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Um conto de um grande amor...

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Page 1: O Lago

O LAGO

Sempre que eu o via, estava sentado diante da janela olhando para algo que somente ele poderia enxergar. Isso criava em quem o percebia um constante questionamento: o que o interessava tanto naquela direção? Sua residência era de um estilo neo-gótico, ele residia naquele local há vários anos, desde que sua família ainda existia. A visão daquela casa imensa, com torres, nos reportava aos momentos nostálgicos que não sabíamos descrever, assim como não descrevíamos o que ele via.

Sua rotina era monótona, saia todos os dias às seis da manhã, percorria os grandes jardins de sua casa, tocava em algumas plantas, principalmente rosas em botão, e perseguia algumas ervas daninhas, com uma repulsa de algo que não estava ali "fazendo o bem". Procurava a única mercearia do local e comprava, sempre, o mesmo tipo de pão, um pedaço de queijo e levava para casa, onde entrava e permanecia por algumas poucas horas. Parecia o seu desjejum....Depois saia, novamente, em busca de algo nos arredores da pequena cidade em que morávamos, percorria ruelas, escadarias, igrejas já abandonadas e sempre voltava com um ar triste e desapontado. As tardes voltava a sua rotina de vigia, o olhar vago em direção ao infinito de sua janela em uma das torres de sua casa.

A curiosidade da cidadela foi se desvanecendo com o processo repetitivo daquele homem, as pessoas já não o percebiam, o seu desjejum, o seu andar pelo jardim e pela cidade não era percebido. No entanto, um grupo de jovens, com sua ânsia de descobertas, emoções associadas a grandes fantasias decidiram que iriam identificar o objetivo das saídas, desapontamentos e olhares vagos em uma direção. O grupo era formado por três adolescentes, sendo que um deles bastante introspectivo e tinha como objetivo conseguir viver o mundo daquele homem, nem que fosse por pequenos momentos. O trio começou uma perseguição ansiosa atrás daquele senhor, subdividiam-se e enquanto um o acompanhava vigiando seus passos, o segundo vigia a possibilidade de seu retorno inesperado e o terceiro entrava em sua casa para a procura de algo que desconhecia.. Essa jornada durou vários dias, meses..... Até que o responsável pelo conhecimento da casa encontrou um grande baú, e dentro dele havia diversos objetos, alguns estranhos, outros comuns como fotografias de um tempo em que ele não havia presenciado, mas que sempre tinha um jovem alegre e bonito, acompanhado de uma bela jovem formando um casal feliz. O cenário das fotos era a casa, em seus tempos áureos, com grandes jardins bem cuidados e as torres que se projetavam como uma escadaria para o céu. Em uma das fotos, havia a janela, aquela que o homem sempre sentava, e dela se podiam ver um lago à distância em uma paisagem bucólica e feliz. O jovem saiu rapidamente da casa, mostrou as fotos aos colegas e esses foram em direção ao lago presente na foto....observaram que não mais havia qualquer sinal de lago naquele local. Passaram a perguntar aos cidadãos mais idosos da cidadela sobre o lago e o que havia acontecido com ele, muitos que sabiam da resposta lhes contaram: realmente, havia um lindo lago, rodeado de plantas formando uma paisagem encantadora aos que passavam, mas um grande acidente ocorreu naquele local e desde então aquele lago havia sido soterrado e todos da cidade procuraram esquecer o acidente e aquele paisagem, todos, menos um: aquele senhor que residia na casa de estilo neo-gótico e que permanecia solitário. Os antigos contaram que na casa vivia um lindo casal que havia chegado da grande cidade para viver de

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uma forma pacata e poder criar seus filhos, eram muito felizes. Mas em uma noite com um luar esplendido a jovem resolveu sair e mergulhar naquela água que considerava inofensiva, assim como tudo que a rodeava, mas ela se enganara, o lago não era inofensivo pois dentro dele cresceu uma criatura que matava assim que sentia o cheiro de carne - um crocodilo. Ninguém havia lhe contado isso. Ela inocentemente penetrou na água para se refrescar e sentir os prazeres da natureza e em poucos minutos houve uma grande movimentação da água e uma bocarra abriu-se começando a dilacerar seu corpo. O jovem marido correu ao ouvir os seus apelos mas chegou extremamente tarde, a única coisa que havia sobrado foi um botão de rosa que sua bela esposa havia levado até o lago.

Assim, os pequenos investigadores não somente identificaram a rotina monótona e triste daquele senhor, mas porque ele olhava todas as tardes para um mesmo local....talvez, ele acreditasse que um dia poderia ouvir mais precocemente os apelos de sua amada e poderia salvá-la, ou quem sabe, aquilo não foi um sonho e ele iria encontrá-la em seus passeios pelas ruelas da tranqüila cidade.