15

Click here to load reader

Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

Embed Size (px)

DESCRIPTION

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) manteve a decisão liminar que bloqueou R$ 10.348.837,76 de administradores e empregados da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (CASAN) que distribuíram lucros e prêmios de produtividades em favor próprio sem que houvesse qualquer previsão legal que assim permitisse. As irregularidades são referentes aos exercícios de 2008 e 2009 e foram constatadas em ação civil ajuizada pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), através da 26ª Promotoria de Justiça da Capital.

Citation preview

Page 1: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

Agravo de Instrumento n. 2013.012573-5, da CapitalRelator: Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO -CASAN. DISTRIBUIÇÃO DE LUCROS DOS EXERCÍCIOS 2008E 2009. LIMINAR QUE DEFERIU A INDISPONIBILIDADE DEBENS DOS REQUERIDOS. FUMUS BONI IURIS E PERICULUMIN MORA CONFIGURADOS. DECISÃO MANTIDA. RECURSODESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n.2013.012573-5, da comarca da Capital (1ª Vara da Fazenda Pública), em que éagravante Osny Souza Filho e agravado o Ministério Público do Estado de SantaCatarina:

A Primeira Câmara de Direito Público decidiu, à unanimidade, desprovero recurso. Custas legais.

Presidiu a sessão o Excelentíssimo Sr. Desembargador Newton Trisotto.Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Excelentíssimos

Senhores Desembargadores Jorge Luiz de Borba e Carlos Adilson Silva.

Florianópolis, 13 de maio de 2014.

Paulo Henrique Moritz Martins da SilvaRELATOR

Page 2: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

RELATÓRIO

O Ministério Público propôs "ação civil pública" em face de WalmorPaulo de Luca, Pedro Bittencourt Neto, Jucélio Paladini, Nery Antonio Nader, NelsonGomes Mattos, Marco Antonio Koerich Azambuja, José Ari Vequi, Antônio Varella doNascimento, Laudelino de Bastos e Silva, Valmir Humberto Piacentini, Osmar SilverioRibeiro, Cezar Paulo de Lucca, Adelor Francisco Vieira, Osny Souza Filho e Paulo Eli.

Alegou que os requeridos foram responsáveis pela distribuição de lucrosda Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - Casan nos anos de 2008 e2009.

Sustentou a ilegalidade de tal procedimento tendo em vista: a) naturezajurídica da Casan - prestadora de serviço público sujeita a regime jurídico especial,com preponderância do interesse público, b) falta de lei específica autorizadora, c)imunidade tributária recíproca, d) existência de inúmeros débitos não garantidos, e)péssima situação financeira da empresa.

Apontou a configuração dos atos de improbidade descritos nos arts. 9º,I, 10, I, XI e XII e 11, caput, indicando um prejuízo total de R$ 5.174.418,88.

Requereu a indisponibilidade liminar dos bens dos requeridos para cobriro valor citado, bem como multa civil no mesmo montante.

A medida urgente foi deferida, tendo sido bloqueados ativos financeirospor meio do sistema bacen jud (f. 31/42).

O requerido Osny Souza Filho interpõe agravo de instrumentoargumentando que: a) foram indisponibilizadas verbas alimentares; b) não temresponsabilidade no que tange à decisão de distribuição dos lucros; c) legalidade doprocedimento atacado pelo Ministério Público; d) ausência de fumus boni iuris epericulum in mora. Se for mantida a decisão, postula a redução do valor a serconstritado para o montante efetivamente percebido.

O efeito suspensivo foi negado (f. 62/68).Com as contrarrazões (f. 75/84), pronunciou-se a d. Procuradoria-Geral

de Justiça, em parecer da lavra do Dr. Sandro José Neis, pelo desprovimento dorecurso (f. 89/96).

VOTO

A decisão proferida pelo MM. Juiz Luiz Antônio Zanini Fornerolli mereceser confirmada por seus próprios fundamentos, os quais adoto como razão de decidir:

A Administração Pública está, por corolário constitucional, submetida aoprincípio da legalidade (CRFB, art. 37, caput). Como resultante do EstadoDemocrático de Direito (CRFB, art. 1º) e para a estabilidade das relações sociais, aConstituição Federal assegurou a garantia do princípio da legalidade, também, nocatálogo dos direitos e garantias fundamentais.

Como é de conhecimento público, o princípio constitucional da legalidade éprincípio essencial, específico e informador do Estado de Direito, que o qualifica e lhe

Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Page 3: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

dá identidade. (Celso Antônio Bandeira de Mello)A Constituição Federal consagrou o princípio da legalidade nos seguintes

termos: "ninguém será obrigado a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa senão emvirtude de lei;" (inc. II do artigo 5º).

No mesmo ordenamento, está explicito o princípio no artigo 37, caput, queestabeleceu a vinculação de todo o agir administrativo público à legalidade.

A regra, pois, aos particulares, é a liberdade de agir. As limitações, positivas ounegativas, deverão estar expressas em leis. Por outro lado, a aplicação do princípioaos agentes públicos é inversa, pois a liberdade de agir encontra sua fonte legítima eexclusiva nas leis. Não havendo leis outorgando campo de movimentação, não háliberdade de agir. Os agentes públicos, na ausência das previsões legais para seusatos, ficam irremediavelmente paralisados, inertes, impossibilitados de atuação.

A devida conformação do agir administrativo ao princípio constitucional dalegalidade ganhou corpo e se consolidou, dentre outras, na já clássica lição deMeirelles:

"A legalidade, como princípio de administração, (CRFB, art.37, caput), significaque o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aosmandamentos da lei, e às exigências do bem-comum, e deles não se pode afastar oudesviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar,civil e criminal, conforme o caso.

A eficácia de toda atividade administrativa está condicionada ao atendimentoda lei.

Na Administração Pública, não há liberdade nem vontade pessoal. Enquantona administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na AdministraçãoPública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular, significa"pode fazer assim"; para o administrador público significa "deve fazer assim".(MEIRELLES, Hely Lopes, Direito Administrativo Brasileiro. 15 ed., SãoPaulo:Revista dos Tribunais, 1990, p. 78)

Assim, o princípio da legalidade apresenta-se como um freio aos abusos eautoritarismos, restringindo a atuação pública aos ditames legais e resguardandodiretos pessoais e coletivos.

No caso em apreço, isso significa dizer que o agir de todos os agentes públicosenvolvidos deveria ser decorrentes do preceito legal. Inexistindo qualquermanifestação legislativa nesse sentido, não é permitido ao agente público assimproceder, sob pena de responder pelos prejuízos sofridos pelo erário e ainda nasdemais penas previstas na LIA.

Traçadas essas premissas iniciais, passa à análise da liminar.A Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN, por se tratar de

uma sociedade de economia mista, é regulada pelas disposições da Lei n.6.404/1997 (Lei das Sociedades por Ações), da Lei Complementar 381/2007 e seuEstatuto.

Muito embora a Lei da Sociedades Anônimas preveja a possibilidade deadministradores e empregados participarem dos lucros da sociedade, a realidade daCASAN se revela distinta de qualquer outra sociedade de economia mista, haja vistaque se mostra como uma empresa que, apesar de ser dotada de personalidadejurídica de direito privado, executa serviços públicos de caráter essencial, motivopelo qual está sujeita a regime jurídico especial.

Isso significa dizer, portanto, que ela possui personalidade jurídica de direito

Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Page 4: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

privado e público, não estando sujeita nem a um nem a outro regime, mas sim a umterceiro regime jurídico, denominado de especial.

Esse regime caracteriza-se por reger as sociedades de economia mista eempresas públicas por regras de direito privado e regras de direito público,simultaneamente.

Sobre esse hibridismo, é importante conferir a lição da administrativista MariaSylvia Zanella Di Pietro, afirmando que "A sociedade de economia mista é pessoajurídica de direto privado, em que há conjugação de capital público e privado,participação do poder público na gestão e organização sob forme de sociedadeanônima, com as derrogações estabelecidas pelo direito público e pela própria Lei daS.A. No entanto, tais pessoas nunca se sujeitam inteiramente ao direito privado. Oseu regime jurídico é híbrido, porque, sob muitos aspectos, elas se submetem aodireito público, tendo em vista especialmente a necessidade de fazer prevalecer avontade do ente estatal, que as criou para atingir determinado interesse público. Emresumo, em todas as pessoas de direito privado criadas pelo Estado existe um traçocomum: a derrogação parcial de direito privado por normas de direito público."(PIETRO. Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo p. 364/365).

Por isso, quando a sociedade substitui o Estado na consecução do serviçopúblico, como é o caso da CASAN, que tem como finalidade o abastecimento deágua e esgotamento sanitário, a possibilidade de participação nos lucros érestringida, pois essa divisão deve ser aplicada exclusivamente em favor dosacionistas, que, no caso em análise, seria o próprio Estado, detentor de grandeparcela das ações.

Isso é o que ocorre em qualquer outra sociedade anônima, de forma que alucratividade da empresa é distribuída em favor de todos os acionistas na exataproporção de suas ações. Ou seja, significa dizer que aquele que possui maiorquantidade de ações, consequentemente terá direito a maior parcela dos dividendos.

Assim, no caso retratado nos autos, como o Estado de Santa Catarina é opossuidor da grande totalidade das ações da CASAN (fls. 743), isso já incluindotodas as demais entidades pertencentes ao Estado, é inegável que o lucro obtido nosexercícios de 2008 e 2009 deveria unicamente ser direcionado em favor do Estado.Jamais poderia ser cogitada a hipótese de divisão de lucros, muito menos naproporção significante como foi realizada.

Por isso, essa distribuição de dividendos que ocorreu no âmbito da CASANfoge da função essencial entidade, que tem como finalidade primordial cumprir seusfins institucionais, consistentes no abastecimento de água e no saneamento básicodo estado de Santa Catarina, ao invés de distribuir lucros em favor de seusadministradores e empregados.

No mais, ressalte-se que qualquer outra forma de distribuição de lucros, quenão aquela em favor do Estado, deveria se dar somente com expressa disposiçãolegal, sob pena de violação ao princípio da supremacia do interesse público sobre oparticular. No entanto, ao que consta nos autos, os lucros da sociedade referentesaos exercícios de 2008 e 2009 foram distribuídos em favor dos administradores edos empregadores da CASAN, ao arrepio de qualquer permissão legislativa.

Diz-se isso porque, de acordo com a Lei n. 10.101/2000, que "dispõe sobre aparticipação dos trabalhadores nos lucros ou resultados da empresa", a participaçãodos "trabalhadores em empresas estatais, observará diretrizes específicas fixadaspelo Poder Executivo" (artigo 5º, caput).

Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Page 5: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

Todavia, de acordo com a documentação anexada aos autos, oriunda daAssembleia Legislativa de Santa Catarina e da Secretaria do Estado da Fazenda (fls.171,193), há afirmação expressa no sentido de inexistir leis ou diretrizes expedidaspelo Poder Executivo Estadual autorizando a participação nos lucros por parte dosadministradores ou trabalhadores, nos termos do artigo 5º da Lei 10.101/2000, o queobsta a CASAN de realizar a distribuição dos lucros da empresa.

Além do mais, a fundamentação utilizada pelos responsáveis para alicercar opagamento da participação nos lucros (fl. 95), nada mais é do que uma justificativadescabida até então para a situação em apreço, pois ainda que haja um esboçodessa Lei n. 6.404/76, não houve a superveniência de diretriz por parte do PoderExecutivo regulando a divisão desses lucros, nos termos da Lei n. 10.101/2000(artigo 5º, caput)

Por essa razão que se pode afirmar com certa singeleza que o suportenormativo utilizado pelos administradores para fundamentar o nascedouro dagratificação é desqualificado, eis que despido de qualquer juridicidade idônea.

Isso quer dizer que, no caso retratado nos autos, deveria haver subordinaçãocompleta dos administradores à lei. Todos os agentes públicos, desde o que lheocupe a cúspide até o mais modesto deles, devem ser instrumentos de fiel e dócilrealização das finalidades normativas (Celso Antônio Bandeira de Mello).

Além disso, como os Administradores já possuem remuneração mensal, não háqualquer motivo que justifique o incremento com tal verba, mormente com valorestão significativos como aqueles recebidos por eles quando da divisão dos lucros.

Senão bastasse, a distribuição de lucros em favor da alta cúpula (Diretores emembros do Conselho de Administração) afrontou diretamente o princípio daimpessoalidade, eis que esses administradores proferiram decisão que teve comoúnico objetivo se autobeneficiar, isto é, favorecer a própria categoria.

Por fim, com total desrespeito à coisa pública, preferiram os administradores ediretores da sociedade de economia mista realizar a distribuição de lucros em seubenefício a investir em favor da própria CASAN, que como muito bem registrado nainicial, encontra-se à míngua de recursos e necessita anualmente de empréstimosmilionários para cobrir seus custos operacionais.

É de se ressaltar também que, ainda que a companhia tenha obtido lucros nosexercícios de 2008 e 2009, não significa dizer que ela esteja em boa situaçãoeconômica-financeira a ponto de realizar a divisão de lucros, já que em diversasoportunidades houve a necessidade de contrair empréstimos bancários milionários,conforme, por exemplo, pode se constatar pelas autorizações do Conselho deAdministração e/ou das Assembleias Gerais (Quinto item da ordem do dia - fls. 652).

Toda essa trajetória, por sí só, constitui elemento essencial para que os atopraticados pelos demandados ensejem a atenção jurisdicional adequada, vez que osfatos e documentos existentes nos autos se revelam suficientes para demonstrar afumus boni iuris necessário para o deferimento da liminar buscado pelo MinistérioPúblico.

Registre-se neste momento que não se trata de juízo de certeza e absolutossobre os fatos, mas sim de análise superficial, eis que a cognição exauriente só sedará após o contraditório da parte adversa e na sequência da instrução processual

Da legitimidade passivaNos casos de improbidade administrativa, a Lei n. 8.429/92 prescreve em seu

Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Page 6: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

art. 1º que os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidorou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dosPoderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, deempresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação oucusteio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento dopatrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei.

No caso dos autos, justifica-se a indisponibilização dos bens de todos osrequeridos pois eles, no desempenho de suas funções, tiveram participação direta naconduta que culminou com a distribuição de lucros entre administradores eempregados da CASAN.

Assim, passa-se a descrever a conduta perpetrada por cada um dosdemandados, as quais justificam o deferimento da medida:

a) referente ao exercício de 2008:- Walmor Paulo de Luca, Pedro Bittencourt Neto, Jucélio Paladini, Nery Antônio

nader, Nelson Gomes Mattos, Marco Antônio Koerich de Azambuja por fazerem partedo Conselho de Administração da Companhia Catarinense de Águas - CASAN eestarem presentes na 246ª reunião, em que houve a aprovação do pagamento departicipação nos resultados aos administradores da sociedade, bem como aosempregados;

- Antônio Varella do Nascimento, Laudelino de Bastos e Silva, Valmir HumbertoPiacentini, Osmar Silvério Ribeiro, Cezar Paulo de Luca e Walmor Paulo de Luca porfazerem parte da diretoria executiva da empresa e ratificarem o pagamento dosvalores aos empregados e aos administradores; e,

- José Ari Vequi, por ter participado, na condição de representante do Estadode Santa Catarina, da Assembléia Geral Ordinária que culminou naaprovação/ratificação da distribuição dos lucros em favor dos administradores eempregados da CASAN

b) referente ao exercício de 2009:- Walmor Paulo de Luca, Pedro Bittencourt Neto, Jucélio Paladini, Nery Antônio

Nader, Nelson Gomes Mattos, Marco Antônio Koerich de Azambuja e José Ari Vequipor fazerem parte do Conselho de Administração da Companhia Catarinense deÁguas - CASAN e estarem presentes nas 251ª e 260ª reuniões, nas quais houve aaprovação do pagamento de participação nos resultados aos administradores eempregados da sociedade;

- Antônio Varella Nascimento, Laudelino de Bastos e Silva, Adelor FranciscoVieira, Cezar Paulo de Luca, Osny Souza Filho e Walmor Paulo de Luca, porserem diretores executivos da empresa e responsáveis pelas demonstraçõesfinanceiras referente ao exercício de 2009 (fls. 248-255); e,

- Paulo Eli, por ter participado, na condição de representante do Estado deSanta Catarina, da 40ª Assembléia Geral Ordinária que culminou naaprovação/ratificação da distribuição dos lucros em favor dos administradores daCASAN.

Da indisponibilidade de bensA indisponibilidade de bens em ação civil pública visa, sobretudo, dar eficácia

ao provimento final da demanda, a qual deve ser concedida objetivamente, em casosde ausência, dilapidação, alienação, doação ou hipoteca de bens, exigindo-setambém a liquidez e certeza da obrigação, dada a violência da medida ao direito de

Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Page 7: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

propriedade.Assim, como medida extrema que é, devem estar presentes nos autos fortes

indícios de que os atos praticados possam ter lesado o interesse e o erário público.

É isso que, até então, restou demonstrado da conduta dos demandados, pois,como forma de "distribuição nos lucros", "prêmio de produtividade" ou qualquer outradenominação que lhe tenha sido atribuída, transferiram o dinheiro público em favorde administradores e trabalhadores da CASAN, sem que, no entanto, houvessequalquer previsão legal que assim permitisse.

A Constituição Federal, em seu art. 37, § 4º, prevê a indisponibilidade de benspor atos de improbidade, cujo intuito é garantir o ressarcimento do dano sofrido peloerário. Tal dispositivo constitucional faz referência à Lei n. 8.429, de 02 de junho de1992, da qual extrai-se o que dispõe o art. 7º: "Quando o ato de improbidade causarlesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá à autoridadeadministrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para aindisponibilidade dos bens do indiciado. Parágrafo único. A indisponibilidade a que serefere o caput deste artigo recairá sobre bens que assegurem o integralressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante doenriquecimento ilícito."

O Ministro João Otávio de Noronha, em decisão no Resp 731109/PR, afirmouque a medida prevista no art. 7º da Lei 8.429/92 é atinente ao poder geral de cautelado juiz, prevista no art. 798 do Código de Processo Civil, pelo que seu deferimentoexige a presença dos requisitos do fumus boni iuris e periculum in mora.

Humberto Theodor Júnior acentua que está compreendida como medidaatípica dentro do poder geral de cautela a proibição de dispor. (Processo Cautelar.São Paulo: LEUD, 10 ed. )

Visa, sobretudo, afastar o periculum in mora, traduzidos no fim de evitar o dano(CPC, art. 799), desde que haja fundado receio de que uma parte, antes dojulgamento da lide, cause outra lesão de grave e difícil reparação (CPC, art. 798).

Neste passo, insta salientar que o periculum in mora, nas ações deimprobidade administrativa, não deve ser analisado à luz das regras tradicionais dasmedidas cautelares insertas no Código de Processo Civil. Tal requisito, em verdade,normalmente estaria presumido com a deflagração da ação de improbidadeadministrativa. Vale dizer, constatando-se a presença de robustos indícios da práticade improbidade administrativa, já estaria autorizado a decretar a indisponibilidadedos bens do réu, independentemente de provas de que este estivesse dissipando oseu patrimônio.

Nessa ordem de idéias, Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves advertemque -exigir a prova, mesmo que indiciária, da intenção do agente de furtar-se àefetividade da condenação representaria, do ponto de vista prático, o irremediávelesvaziamento da indisponibilidade perseguida em nível constitucional e legal-(Improbidade Administrativa. 2008. p. 751).

Seguindo esse pensamento, Fábio Osório Medina assevera que o periculum inmora emerge, via de regra, dos próprios termos da inicial, da gravidade dos fatos, domontante, em tese, dos prejuízos causados ao erário (Improbidade Administrativa.2008. p. 751).

Forte no art. 37, parágrafo 4º, da Constituição Federal, a indisponibilidadepatrimonial é medida obrigatória, pois traduz conseqüência jurídica do

Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Page 8: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

processamento da ação. Esperar a dilapidação patrimonial, quando se tratar deimprobidade administrativa, é equivalente a autorizar tal ato, na medida em que oajuizamento de ação de seqüestro assumiria dimensão de 'justiça tardia', o quepoderia se equiparar a denegação de justiça.

Aliás, de acordo com o art. 37, § 4º, da Constituição Republicana, o constituintenão fez qualquer menção à necessidade de se aguardar que o agente públicomalbaratasse seus bens, para que só assim o Julgador decretasse aindisponibilidade de seu patrimônio. Diga-se o mesmo em relação à legislaçãoordinária (Lei n. 8.429/92), que também não fez tal exigência.

Garcia e Pacheco Alves lembram que outras legislações tornaramdesnecessária a demonstração da intenção de dilapidação ou ocultação de benspelo causador do dano, a exemplo do que ocorre com a indisponibilidade de bens deex-administradores de instituições financeiras em liquidação (art. 36, § 1º da Lei nº6.024/74) e na medida prevista no art. 6º, parágrafo único, e 69, § 6º, da Lei deFalências.

Se o legislador pretendesse condicionar a decretação da indisponibilidade àcomprovação da dilapidação dos bens pelo agente público, ele certamente o teriafeito de forma expressa, à semelhança do que ocorreu com as medidas cautelaresdo seqüestro e arresto, cujos dispositivos legais (art. 813 c/c art. 822 do Código deProcesso Civil) catalogam situações que configuram o perigo na demora.

Sobre o tema, já decidiu o Tribunal Catarinense:"A caracterização do periculum in mora nas medidas cautelares tradicionais

depende da comprovação de que o agente esteja dilapidando o seu patrimônio, ou,ao menos, esteja na iminência de dissipá-lo. Todavia, tal pensamento não secoaduna com o espírito da Lei n. 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa),porquanto esta legislação, ao reverso das antigas Leis n. 3.164/57 (Lei PitomboGodói Ilha) e n. 3.502/58 (Lei Bilac Pinto), tem por desiderato resguardar opatrimônio público da forma mais eficaz possível, impondo, para tanto, sanções emedidas rigorosas". (AI 2005.033965-2)

In casu, a fumaça do bom direito restou analisada no tópico antecedentea respeito da plausibilidade do direito invocado.

No tocante ao periculum in mora, em se tratando da constrição de bensprevista na Lei de Improbidade Administrativa, deve ser analisado sob óticadiversa daqueles requisitos necessários ao deferimento das medidascautelares tradicionais, porquanto o interesse tutelado diz respeito ao própriopatrimônio público.

Nesse sentido, em situação semelhante o Desembargador AnselmoCerello afirmou que o periculum in mora repousa no dano em potencial quedecorre da demora natural no trâmite das ações principais, de modo que, senão indisponibilizados os bens, a agravante poderia deles se desfazer,tornando-se ineficaz os pedidos formulados nas ações civis públicas. (AI2003.016248-8)

Portanto, não se pode, nem se deve, esperar a ocorrência de um fatodesastroso, in casu, a dilapidação dos bens do demandados.

Deve-se, entretanto, assim que verificados os indícios da possível eeventual prática ilícita, antever-se para evitar prejuízos muitos maiores aos quesupostamente já tenham ocorrido.

Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Page 9: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

"Os atos noticiados em ação civil pública, praticados à sombra daimprobidade administrativa e que tenham dado ensejo à probabilidade deenriquecimento ilícito, autorizam a decretação de bens envolvidos, paragarantir o ressarcimento dos prejuízos causados ao erário, no caso deacolhimento da ação" (AI n. 97.004026-1).

Referente ao periculum in mora: "ele é ínsito à própria Lei n. 8.429/92,conforme se dessume do seu art. 7º, verbis: 'quando o ato de improbidadecausar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá àautoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao MinistérioPúblico, para indisponibilidade dos bens do indiciado'' (RT 759/320),dispensada na hipótese a demonstração do periculum in mora" (AI n.2006.028986-2).

Nesse diapasão, evidenciado perigo na demora, pois sem o deferimentoda providência acautelatória em exame a coletividade corre o risco de não serressarcida do prejuízo que lhe fora causado, bem como a fumaça do bomdireito, o seu deferimento é a medida que se impõe.

Registro que a indisponibilidade abarcará bens suficientes dos réus até oquantum limite de R$ 10.348.837,76 (dez milhões, trezentos e quarenta e oito mil,oitocentos e trinta e sete reais e setenta e seis centavos), referente ao valor daparticipação nos lucros e prêmios de produtividades concedidos aos administradorese empregados referentes ao exercícios de 2008 e 2009, juntamente com o valor damulta civil que eventualmente venha a ser imposta aos réus, assim como já decidiu oSuperior Tribunal de Justiça -O decreto de indisponibilidade de bens em ação civilpública por ato de improbidade deve assegurar o ressarcimento integral do dano (art.7º, parágrafo único da Lei n.º 8.429/92), que, em casos de violação aos princípios daadministração pública (art. 11) ou de prejuízos causados ao erário (art. 10), podeabranger a multa civil, como uma das penalidades imputáveis ao agente ímprobo,caso seja ela fixada na sentença condenatória- (Resp n. 957.766/PR, PrimeiraTurma, rel. Min. Luiz Fux, j. 9.3.2010).

E em outro julgado, também foi decidido que, "Considerando-se que a multacivil integra o valor da condenação a ser imposta ao agente ímprobo, a decretaçãoda indisponibilidade de bens deve abrangê-la, já que essa medida cautelar tem porobjetivo assegurar futura execução da sentença condenatória proferida na ação civilpor improbidade administrativa." (REsp 1023182/SC, Rel. Ministro Castro Meira,Segunda Turma, julgado em 23/09/2008).

Por fim, traz ainda o precedente no qual o Superior Tribunal de Justiça afirmaser "pacífico nesta Corte Superior entendimento segundo o qual a indisponibilidadede bens deve recair sobre o patrimônio dos réus em ação de improbidadeadministrativa de modo suficiente a garantir o integral ressarcimento de eventualprejuízo ao erário, levando-se em consideração, ainda, o valor de possível multa civilcomo sanção autônoma."

Justifica-se a medida em relação ao patrimônio de todos os réus, pois, emtese, atuaram reciprocamente para entabular a divisão de lucros ilegalmenterealizada.

Ante o exposto, DEFIRO o pedido formulado pelo representante doMinistério Público, a fim de determinar a indisponibilidade dos bens dos réusnos valores, que incidirá da seguinte forma:

Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Page 10: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

a) R$ 4.881.089,50 (quatro milhões, oitocentos e oitenta e um mil, oitenta enove reais e cinquenta centavos), sobre os réus Walmor Paulo de Luca, PedroBittencourt Neto, Jucélio Paladini, Nery Antônio nader, Nelson Gomes Mattos, MarcoAntônio Koerich de Azambuja, Antônio Varella do Nascimento, Laudelino de Bastos eSilva, Valmir Humberto Piacentini, Osmar Silvério Ribeiro, Cezar Paulo de Luca eJosé Ari Vequi, pela participação nos lucros referente ao exercício de 2008 dosadministradores da CASAN e da multa civil imposta aos réus e prevista na LIA;

b) R$ 1.452.325,50 (um milhão, quatrocentos e cinquenta e dois mil,trezentos e vinte e cinco reais e cinquenta centavos ), sobre os réus PedroBittencourt Neto, Jucélio Paladini, Nery Antônio Nader, Nelson Gomes Mattos,Marco Antonio Koerich de Azambuja, José Ari Vequi, Walmor Paulo de Luca,Antonio Varella Nascimento, Laudelino de Bastos e Silva, Adelor FranciscoVieira, Cezar Paulo de Luca, Osny Souza Filho e Paulo Eli, pela distribuição delucros referente ao exercício 2009 aos administradores da CASAN;

c) R$ 4.015.422,76 (quatro milhões, quinze mil, quatrocentos e vinte e doisreais e setenta e seis centavos), sobre os rés Pedro Bittencourt Neto, JucélioPaladini, Nery Antônio Nader, Nelson Gomes Mattos, Marco Antonio koerich deAzambuja, José Ari Vequi, Walmor Paulo de Luca, Antonio Varella Nascimento,Laudelino de Bastos e Silva, Adelor Francisco Vieira, Cezar Paulo de Luca, OsnySouza Filho.

A indisponibilização dos bens se dará na seguinte ordem:A) bloqueio on-line, pelo sistema Bacen Jud, dos ativos financeiros de

que forem titulares os Réus, em quantia suficiente a garantir o erário;B) expedição de ofício à Corregedoria-Geral de Justiça do TJSC, para que

comunique a todos os cartórios de registro imobiliário do Estado aindisponibilidade dos bens imóveis titularizados pelos réus;

C) a expedição de ofício ao DETRAN-SC para averbação nos registros detitularidade dos Réus a indisponibilidade de seus veículos;

D) a expedição de ofícios à Comissão de Valores Mobiliários, para queaverbe a indisponibilidade das ações mercantis de que forem titulares os réus.

E) expedição de ofício à Capitania dos Portos para que averbe aindisponibilidade dos bens titularizados pelos réus, cujo registro seja de suacompetência.

F) a expedição de ofício à Junta Comercial do Estado de SC com o fim detornar indisponíveis as cotas sociais pertencentes aos réus. (grifou-se)

Vale acrescentar as ponderações da Desa. Rosane Portella Wolff aoapreciar o pedido de efeito suspensivo:

Inicialmente, no que trata do pleito recursal de desbloqueio do valor de R$38.552,53 (trinta e oito mil, quinhentos e cinquenta e dois reais e cinquenta e trêscentavos) sob o fundamento de tratar-se de verba salarial, destaco que o mesmo nãopode ser analisado por esta Corte neste momento, já que ainda não foi apresentadona origem e, justamente por conta disso, não integrou as razões de decidir dodecisum atacado. Além disso, o documento que instrumentaliza essa pretensão (fl.52) também não foi apresentado na origem para que pudesse passar pelo crivo doJuízo a quo.

Dessa forma, para salvaguardar o princípio do duplo grau de jurisdição, essa

Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Page 11: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

quaestio deve ser apresentada naquela instância pelo Interessado.De saída, destaco que o fundamento que o Ministério Público se ampara na

petição inicial da ação civil pública para apontar a prática de improbidadeadministrativa pelo Agravante não consiste na tomada de decisão de divisão doslucros, nem mesmo pelo fato de ele ter auferido o valor de R$ 3.789,98 (três mil,setecentos e oitenta e nove reais e noventa e oito centavos).

O Parquet indicou o Recorrente no polo passivo da lide de origem sob o motede que a ele incumbia elaborar os relatórios contábeis para indicar a existência ounão de lucro pela Casan.

O fato é que, apesar de o aludido relatório apontar lucro de R$ 34.174.125,08(trinta e quatro milhões, cento e setenta e quatro mil e cento e vinte e cinco reais eoito centavos), a empresa possuía inúmeros débitos, que, em tese não foramconsiderados na elaboração do documento, razão pela qual ele teria sido assimconfeccionado para facilitar ou até mesmo proporcionar que esse lucro, a princípio"inexistente", fosse partilhado entre a diretoria da Casan e seus funcionários.Confira-se:

Quando da distribuição de resultados aos administradores, tramitava aExecução Fiscal n. 2006.72.00.007623-2 na Vara de Execuções Fiscais da JustiçaFederal de Florianópolis, promovida pelo Instituto Nacional de Seguridade Social –INSS em face da CASAN para a satisfação de um débito fiscal, à época, de R$15.762.819,04 (quinze milhões, setecentos e sessenta e dois mil, oitocentos edezenove reais e quatro centavos).

[...] Como se verá adiante, em 2009, a CASAN para cobrir seus custosoperacionais foi obrigada a contratar empréstimos de R$ 100 milhões. Impossívelque os administradores não pudessem saber dessa situação e não previssem aformação de um fundo para cobrir tais despesas ordinárias.

[...] A CASAN, como se depreende em diversos documentos colacionados nosAutos do Inquérito Civil que originou a presente ação, passa por sérias dificuldadesfinanceiras, mesmo apresentando balanços demonstrando supostos lucros aotérmino dos anos de 2008 e de 2009.

O Tribunal de Contas de Santa Catarina, ao realizar auditoria contábil,descreveu os resultados obtidos pela CASAN a partir de 1994 (Plano Real) e chegouao impressionante débito acumulado nas contas, em 2009, de R$ 10 milhões,conforme tabela a seguir:

[...] Nas próprias atas das Assembléia Gerais Ordinárias em que se aprovarama distribuição de resultados aos administradores (atas 39ª e 40ª), o Presidente, emsua mensagem aos acionistas, anunciava a realização de empréstimos pela CASAN,[...].

(fl. 21-25, verso, do volume 1 de documentos).Analisando a "demonstração de resultado do exercício", referente ao período

de 2009, verifico que foi apontado lucro líquido de R$ 34.174 (em milhares de reais),sendo que esse documento foi firmado pelo Recorrente na qualidade de Diretor dePlanejamento e Informação (fl. 420 do volume 2 de documentos).

Balizando nessa premissa, na 40ª Assembléia Geral Ordinária, ocorrida em29-4-2010 (fls. 558-563 do volume 2 de documentos), foram aprovadas as contas doexercício de 2009, oportunidade em que tratou da destinação desse resultado,inclusive no que toca à participação dos lucros.

A mais disso, destaco que na 259ª Reunião do Conselho de Administração

Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Page 12: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

ocorrida em 22-1-2010, (fls. 291-298 do volume 1 de documentos), foi indicada aexistência de inúmeros débitos da Casan, de cifras milionárias, o que redunda nainviabilidade de o exercício anterior ter lucro expressivo. Confira:

[...] o Presidente [...] Em seguida, agradeceu o empenho do Conselheiro JoséAri Vequi, que não mediu esforços no sentido de apresentar ao Governador anecessidade dos recursos financeiros para dar continuidade às obras em andamentoe garantir a contrapartida para os financiamentos contratados junto ao BNDES,CAIXA e Orçamento Geral da União. Em seguinda, o Presidente submeteu à análisedo Conselho a Proposta de aditamento ao contrato firmado com o Banco Prosper, novalor de R$ 75 milhões, para pagamento em 60 meses e com 24 meses de carência,visando dar condições financeiras à Companhia para honrar diversos compromissoscom fornecedores, Prefeituras, impostos e outros encargos [...]. Lembrou oPresidente que em 9 de julho de 2009 o Conselho de Administração aprovou arealização de operação de empréstimo bancário, na modalidade de Cédula deCrédito Bancário, no valor de R$ 100 MM com encargos financeiros e tributáriosantecipados na ordem de R$ 35 MM [...].

(fls. 284-285 do volume 1 de documentos).A propósito, na própria ata da 40ª Assembléia Geral Ordinária, em que se

aprovou a divisão dos lucros da Empresa, foi indicada a necessidade de captação derecursos, de US$ 216 milhões de dólares com o Governo Japonês para viabilzar aintegração da rede de coleta e tratamento de esgoto (fl. 560 do volume 2 dedocumentos). Veja:

Na área do esgotamento sanitário, 8.268 novas famílias foram integradas àrede de coleta e tratamento, número este que será incrementado sensivelmente namedida em que forem realizadas as novas ligações aos sistemas implantados no anode 2009, [...], que resultarão do expressivo volume de recursos negociados duranteeste exercício com vários agentes financeiros e que estarão disponíveis no próximoano. Exemplo disso são as negociações com o governo Japonês que chegaram aoseu término e no primeiro trimestre de 2010 estaremos assinando com a JICA aconptratação da primeira estada de um empréstimo na ordem de US$ 216 milhões,dentro de um programa de investimentos de US$ 390 milhões.

(fl. 560 do volume 2 de documentos).Nesse tom, tenho clarividente que a inclusão do Recorrente no polo passivo da

lide se deu única e exclusivamente pelo fato de que ele aprovou as contas do ano de2009 como sendo superavitárias (fl. 420 do anexo 2 de documentos), quando, naverdade, a Casan apresentava déficit.

Ou seja, com essa postura, foi viabilizada a existência de lucros a serempartilhados.

Ora, essa situação se enquadra na hipótese dos arts. 10, incisos I, II, IV e XII e11, I, II e VI, ambos da Lei n. 8.429/92.

Além do mais, presente o prejuízo ao erário, é plenamente viável aindisponibilização imediata do patrimônio dos apontados como responsáveis pelaimprobidade administrativa para garantir a recomposição do patrimônio público –arts. 7º e parágrafo único da Lei suso citada e 37, § 4º, da Carta Cidadã.

Sobre o tema, confira:PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO DE DISPOSITIVOSCONSTITUCIONAIS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DA

Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Page 13: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

SÚMULA 282/STF. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO ESPECIAL.INDISPONIBILIDADE DE BENS. ART. 7º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI8.429/1992. REQUISITOS PARA CONCESSÃO. LIMINAR INAUDITA ALTERAPARS. POSSIBILIDADE. DELIMITAÇÃO DOS RÉUS. SÚMULA 7/STJ.

1. Descabe o exame de suposta violação de dispositivo constitucional por esteSuperior Tribunal de Justiça, sob pena de usurpação da competência atribuída aoSupremo Tribunal Federal.

2. É inadmissível o recurso especial quanto a questão não decidida peloTribunal de origem, por falta de prequestionamento. Incidência da Súmula 282/STF.

3. O provimento cautelar para indisponibilidade de bens, de que trata o art. 7º,parágrafo único da Lei 8.429/1992, exige fortes indícios de responsabilidade doagente na consecução do ato ímprobo, em especial nas condutas que causem danomaterial ao Erário.

4. O requisito cautelar do periculum in mora está implícito no próprio comandolegal, que prevê a medida de bloqueio de bens, uma vez que visa a 'assegurar ointegral ressarcimento do dano'.

5. A demonstração, em tese, do dano ao Erário e/ou do enriquecimento ilícitodo agente, caracteriza o fumus boni iuris. Fixada a premissa pela instância ordinária,inviável de modificação em recurso especial, ante o óbice da Súmula 7/STJ.

6. É admissível a concessão de liminar inaudita altera pars para a decretaçãode indisponibilidade e seqüestro de bens, visando assegurar o resultado útil da tutelajurisdicional, qual seja, o ressarcimento ao Erário. Precedentes do STJ.

7. Inviável a análise do argumento de suposta parcialidade no aresto recorrido,na parte que afastou a medida constritiva em relação a um réu, pois fundada naausência de indícios fáticos suficientes que indicassem a participação desseparticular na consecução dos ilícitos. Incidência da Súmula 7/STJ.

8. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido.(REsp 1.167.776/SP, Rela. Mina. Eliana Calmon, j. 16-5-2013).Também:PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA.MEDIDA CAUTELAR INCIDENTAL. INDISPONIBILIDADE E SEQÜESTRO DE

BENS ANTES DO RECEBIMENTO ART. 7º DA LEI 8.429/1992. PERICULUM INMORA PRESUMIDO. ENTENDIMENTO DA 1ª SEÇÃO DESTE SUPERIORTRIBUNAL DE JUSTIÇA.

1. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é no sentido de que adecretação da indisponibilidade e do sequestro de bens em ação de improbidadeadministrativa é possível antes do recebimento da Ação Civil Pública.

2. Verifica-se no comando do art. 7º da Lei 8.429/1992 que a indisponibilidadedos bens é cabível quando o julgador entender presentes fortes indícios deresponsabilidade na prática de ato de improbidade que cause dano ao Erário,estando o periculum in mora implícito no referido dispositivo, atendendodeterminação contida no art. 37, § 4º, da Constituição, segundo a qual "os atos deimprobidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda dafunção pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma egradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível". Precedente: REsp1.319.515/ES, 1ª Seção, Rel. p/ Acórdão Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES,DJe 21/09/2012.

Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Page 14: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

3. No caso em concreto, o Tribunal a quo, ao analisar os autos, concluiu pelaexistência do fumus boni iuris, sendo cabível a decretação da indisponibilidade debens ante a presença de periculum in mora presumido no caso em concreto, mesmoantes do recebimento da petição inicial da demanda em que se discute improbidadeadministrativa.

4. Agravo regimental não provido.(AgRg no REsp 1.317.653/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j.

7-3-2013).Por derradeiro, enfatizo a inviabilidade de reduzir a constrição judicial do

patrimônio do Recorrente para o valor correspondente ao numerário que ele obtevecom a divisão dos lucros da Casan referente ao exercício de 2009, já que o atoímprobo apontado consiste não só em auferir essa quantia, mas, sim, em facilitar ouaté mesmo deixar de praticar ato que lhe coubesse pela qualidade do cargo queocupava, possibilitando a divisão de lucros como um todo.

Outrossim, destaco que essa situação, na fase em que o processo deimprobidade administrativa está, consiste tão somente em um juízo preliminar, sendoque a indisponibilidade patrimonial dos Requeridos, por ora, se destinam aresguardar a recomposição do patrimônio público, sendo que a manutenção ou nãodo ora Recorrente no polo passivo da lide será objeto de deliberação pelo Togado aquo quando da análise das manifestações dos Demandados (art. 17, § 7º, da Lei n.8.429/1992), quando, então, proferirá decisão recebendo ou não a petição inicial (§8º do indicado comando normativo).

Destaco, pontualmente, no que tange ao tratamento jurídico dispensadoàs sociedades de economia mista, que o STF decidiu:

[...] SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. PAGAMENTO DE VALORES PORFORÇA DE DECISÃO JUDICIAL. INAPLICABILIDADE DO REGIME DEPRECATÓRIO. ART. 100 DA CONSTITUIÇÃO. CONSTITUCIONAL EPROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA CONSTITUCIONAL CUJA REPERCUSSÃOGERAL FOI RECONHECIDA. Os privilégios da Fazenda Pública sãoinextensíveis às sociedades de economia mista que executam atividades emregime de concorrência ou que tenham como objetivo distribuir lucros aosseus acionistas. Portanto, a empresa Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A. -Eletronorte não pode se beneficiar do sistema de pagamento por precatório dedívidas decorrentes de decisões judiciais (art. 100 da Constituição). Recursoextraordinário ao qual se nega provimento. (grifou-se) (RE 599628 / DF, rel. p/acórdão: Min. Joaquim Barbosa, j. 25-5-2011)

Nesta Corte, a contrario sensu, tem-se considerado que a Casan faz jusàs prerrogativas da Fazenda:

TRIBUTÁRIO. IPTU. [...] SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA.CONCESSIONÁRIA PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL.IMUNIDADE RECÍPROCA. INTELIGÊNCIA DO ART. 150, INC. VI, ALÍNEA "A", DACRFB/88. ILEGALIDADE NA INCIDÊNCIA DO TRIBUTO. MATÉRIA DECIDIDA EMSEDE DE REPERCUSSÃO GERAL PELO STF. [...]

"A Casan - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento, sociedade

Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Page 15: Improbidade administrativa - Agravo de instrumento n. 2013.012573 5

de economia mista prestadora de serviço público essencial, está imune àexigibilidade de IPTU (imposto predial e territorial urbano), já que 'as empresaspúblicas e sociedades de economia mista prestadoras de serviço público deprestação obrigatória e exclusiva do Estado são abrangidas pela imunidadetributária recíproca prevista no art. 150, VI, a, da Constituição Federal'. (RE n.407.099/RS, rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, DJ de 6.8.2004)" (TJSC, AI n.2010.051171-7, rel. Des. João Henrique Blasi, j. 11.4.11) (Reexame Necessário n.2012.086379-1, de Tubarão, rel. Des. Francisco Oliveira Neto, j. 26.2.2013) [...](ACMS n. 2013.022452-1, de Maravilha, rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz,Segunda Câmara de Direito Público, j. 18-2-2014).

Este não é o momento adequado para delinear o perfil jurídico da Casan- são questões reservadas para a sentença.

Mas a probabilidade maior é que se reconheça a primazia do interessepúblico na gestão do seu patrimônio, o que não se coaduna, data venia, com adistribuição de lucros.

O periculum in mora e o fumus boni iuris ficaram bem delineados.O segundo requisito, aliás, é presumido em hipóteses como a dos autos:

ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADEADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. ART. 7º DA LEI 8.429/1992.PERICULUM IN MORA PRESUMIDO. MATÉRIA JULGADA PELA PRIMEIRASEÇÃO/STJ. RESP 1.319.515/ES. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO ACERCA DOFUMUS BONI IURIS. RETORNO DOS AUTOS AO TRIBUNAL A QUO.

1. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimentono sentido de que, de acordo com o disposto no art. 7º da Lei 8.429/1992, aindisponibilidade dos bens é cabível quando o julgador entender presentes fortesindícios de responsabilidade na prática de ato de improbidade que cause dano aoErário, estando o periculum in mora implícito no referido dispositivo, atendendodeterminação contida no art. 37, § 4º, da Constituição Precedente: REsp1319515/ES, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ AcórdãoMinistro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em22/08/2012, DJe 21/09/2012 (AgRg no AREsp 238155/SP, rel. Min. Mauro CampbellMarques, Segunda Turma, p. 5-12-2012).

Não há como reduzir o valor a ser constritado pois, repita-se, "o atoímprobo apontado consiste não só em auferir essa quantia, mas, sim, em facilitar ouaté mesmo deixar de praticar ato que lhe coubesse pela qualidade do cargo queocupava, possibilitando a divisão de lucros como um todo".

A suposta restrição de verbas alimentares deverá ser discutida naorigem, pena de supressão de instância.

Voto pelo desprovimento do recurso.

Gabinete Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva