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Introdução O Grupo de Informações (GI) faz parte da Rede Vida no Trânsito e tem como objetivo compilar e produzir informações relativas aos desastres de trânsito com óbitos e feridos graves, por meio da articulação intersetorial. Para tanto, o grupo busca formar uma Lista Única de Vítimas, contendo todas as pessoas que foram a óbito ou que tiveram lesões graves em desastres ocorridos em Florianópolis. Estas ocorrências são, então, avaliadas caso a caso, a fim de que sejam levantados os fatores de risco que contribuíram para os eventos. Os riscos, além de outras características como localização, são então compilados em informações para subsidiar a tomada de decisão e a implementação de ações daqueles comprometidos com a pacificação do trânsito. O GI é formado por diversas instituições (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), Instituto Médico Legal (IML), Vigilância Epidemiológica de Florianópolis, Polícia Rodoviária Federal, Policia Militar (através suas unidades operacionais de área e da Rodoviária Estadual) e Corpo de Bombeiros), Vigilância Epidemiológica estadual, que se reúnem quinzenalmente para a análise. Atualmente, apenas os óbitos estão sendo avaliados, mas há um grande esforço para que os desastres com feridos graves ocorridos em 2015 também o sejam. Este relatório compila as informações produzidas pelo GI a partir da avaliação dos desastres ocorridos no trânsito em Florianópolis, no ano de 2014. RESULTADOS DA ANÁLISE DOS DESASTRES DE TRÂNSITO COM ÓBITO OCORRIDOS EM FLORIANÓPOLIS (2014)

Relatório gi desastres 2014

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Page 1: Relatório gi   desastres 2014

Introdução

O Grupo de Informações (GI) faz parte da Rede Vida no Trânsito e tem como objetivo compilar e produzir informações relativas aos desastres de trânsito com óbitos e feridos graves, por meio da articulação intersetorial. Para tanto, o grupo busca formar uma Lista Única de Vítimas, contendo todas as pessoas que foram a óbito ou que tiveram lesões graves em desastres ocorridos em Florianópolis. Estas ocorrências são, então, avaliadas caso a caso, a fim de que sejam levantados os fatores de risco que contribuíram para os eventos. Os riscos, além de outras características como localização, são então compilados em informações para subsidiar a tomada de decisão e a implementação de ações daqueles comprometidos com a pacificação do trânsito.

O GI é formado por diversas instituições (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), Instituto Médico Legal (IML), Vigilância Epidemiológica de Florianópolis, Polícia Rodoviária Federal, Policia Militar (através suas unidades operacionais de área e da Rodoviária Estadual) e Corpo de Bombeiros), Vigilância Epidemiológica estadual, que se reúnem quinzenalmente para a análise. Atualmente, apenas os óbitos estão sendo avaliados, mas há um grande esforço para que os desastres com feridos graves ocorridos em 2015 também o sejam.

Este relatório compila as informações produzidas pelo GI a partir da avaliação dos desastres ocorridos no trânsito em Florianópolis, no ano de 2014.

RESULTADOS DA ANÁLISE DOS DESASTRES DE TRÂNSITO COM ÓBITO OCORRIDOS EM FLORIANÓPOLIS (2014)

Em 2014, os desastres no trânsito provocaram 83 óbitos em Florianópolis, um aumento de 56,6% em relação aos ocorridos em 2013. A taxa de mortalidade por desastres de trânsito no município que era de 11,7/100.000 habitantes se elevou para 18/100.000.1 Se considerarmos que, para cada óbito, até 50 pessoas são feridas devido à violência no trânsito, pode ser estimado um número de aproximadamente 4150 vítimas da violência no trânsito de Florianópolis em 2014.2

Esse aumento é parcialmente explicado pela elevação no número de desastres ocorrida no primeiro semestre de 2014, quando se deram 59% das ocorrências do ano (42 dos 71 desastres), concentrados nos meses de janeiro, fevereiro, março e maio.

1 População estimada pelo IBGE.

2 RETRATO DA SEGURANÇA VIÁRIA NO BRASIL, 2014.

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Os homens seguem sendo as maiores vítimas, mas a proporção se reduziu de 83% (2013) para 71,1% (2014).

Gráfico 1. Proporção dos óbitos, conforme meio de transporte da vítima,Florianópolis-2013/2014.

Fonte: Grupo de Informação, Rede Vida no Trânsito - 2013/2014

A comparação entre os anos permite evidenciar que, em relação ao meio de transporte da vítima, o perfil dos óbitos se manteve relativamente o mesmo. As exceções foram os pedestres e ciclistas, cujas proporções aumentaram mais de 30% em 2014.

Apesar de novamente os ocupantes de motocicleta terem sido as vítimas mais frequentes, não foi registrado o óbito de nenhum motorista de moto profissional (motoboy, etc.).

Gráfico 2. Número de óbitos em desastres de trânsito, conforme faixa etária da vítima, Florianópolis-2013/2014.

Fonte: Grupo de Informação, Rede Vida no Trânsito - 2013/2014. *Uma vítima sem idade identificada em 2014

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No gráfico 2 se observa que o aumento dos óbitos em 2014 se refletiu em praticamente todas as faixas etárias, com destaque para as vítimas com mais de 40 anos.

Gráfico 3. Dia da semana e turno em que ocorreram os desastres com óbitosrelacionados ao trânsito em Florianópolis/2014.

Fonte: Grupo de Informação, Rede Vida no Trânsito - 2014.

Diferente do ano anterior, quando as ocorrências se concentraram nas quintas e domingos, em 2014 os desastres com óbitos ocorreram nas noites de sexta e sábado.

No GI, cada desastre de trânsito com vítima fatal é analisado pelo grupo, buscando identificar os fatores ou condutas de risco que geraram o evento. Após compreensão da dinâmica da ocorrência, cada fator potencialmente envolvido no evento é avaliado e pontuado de forma independente em uma escala de zero a 10, conforme sua contribuição para a ocorrência do desastre ou óbito.

O gráfico 4 traz os fatores e condutas de risco avaliados, em ordem decrescente de frequência para os eventos fatais em 2014.

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Gráfico 4. Proporção dos desastres em que foram identificados fatores ou condutas de risco, Florianópolis/2014

Fonte: Grupo de Informação, Rede Vida no Trânsito - 2014. *Todos os desastres ocorridos à noite foram considerados como “SIM”. **Condutor não-habilitado para o veículo que dirigia

Os achados acima merecem algumas considerações. Mais do que identificar o fator mais importante, o objetivo da análise é identificar os fatores mais criticamente relacionados aos desastres graves e óbitos no trânsito, entendendo que, geralmente, os eventos ocorrem devido à combinação de vários fatores de risco. Estes achados devem identificar e orientar ações mais efetivas para a prevenção de novos casos.

Mais uma vez, embora a articulação intersetorial tenha permitido a possibilidade de avaliação muito mais rica de cada evento, a disponibilidade das informações continua sendo heterogênea entre os fatores. Um exemplo claro é a velocidade. Embora tenha sido identificada em muitos desastres, é necessário advertir que a informação sobre a velocidade dos veículos envolvidos nem sempre estava disponível, o que pode ter subestimado sua importância na ocorrência dos óbitos no trânsito. Apesar destas limitações, algumas associações ficam claras.

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Como pode ser observado no Gráfico 3, mais da metade dos desastres fatais ocorreram durante a noite e os fatores mais frequentes associados foram o uso de álcool, problemas de infraestrutura e excesso de velocidade.

Gráfico 5. Fatores ou condutas de risco para os desastres com óbito no trânsito, de acordo com o turno de ocorrência, Florianópolis/2014

Fonte: Grupo de Informação, Rede Vida no Trânsito - 2014. *Condutor não-habilitado para o veículo que dirigia

Avaliando apenas os acidentes com vítimas fatais que ocorreram durante o dia, entretanto, foram identificados como fatores de risco mais frequentes os problemas de infraestrutura, excesso de velocidade e evitabilidade/(falta de) direção defensiva. Os dois únicos fatores ou condutas de risco identificados com maior frequência no turno do dia foram “Evitabilidade/Direção defensiva” e “Direção perigosa”.

Segundo dados do Vigitel 20143, 14% dos moradores de Florianópolis relataram ainda manter o hábito de conduzir veículos motorizados após o consumo de álcool – o que indica uma queda em relação a 2012, quando 15,9% dos entrevistados referiram cometer a infração. Entretanto, Florianópolis continua sendo a capital com a maior prevalência, seguida por Palmas (TO), com 11%. Os homens de Florianópolis (23,2%) assumem mais os riscos da dupla álcool e direção do que as mulheres (5,8%), mas a proporção destas vem aumentando desde que a pesquisa iniciou.

GEORREFERENCIAMENTO DOS DESASTRES

Diferente do verificado no ano anterior, em 2014 além de o número de desastres e vítimas ter aumentado, os locais de ocorrência desses foram mais distribuídos pelo

3 Inquérito telefônico realizado pelo Ministério da Saúde, com adultos (>18 anos) das 26 capitais dos Estados brasileiros.

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município. Nas figuras a seguir, destacamos algumas das áreas de concentração das ocorrências.

Figura 1: Georreferenciamento dos desastres com óbito no trânsito em Florianópolis, 2014: área de concentração 1 - Norte da ilha.

Nesta área de cerca de 28km2 ocorreram 12 desastres com vítima fatal em 2014, ou um a cada 2,3km2. O destaque negativo é a concentração de atropelamentos e um óbito de ciclista na SC 401, entres os Rios Papaquara e Palha.

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Figura 2: Georreferenciamento dos desastres com óbito no trânsito em Florianópolis, 2014: área de concentração 2 - Saco Grande.

Já na região do Saco Grande (cerca de 2,3km2) houve seis desastres com óbito ou 2,6 por km2 no período.

Figura 3: Georreferenciamento dos desastres com óbito no trânsito em Florianópolis, 2014: área de concentração 3 - Continente/Centro.

Na região continental do município foram identificados 11 desastres com óbito (1,6 por km2) enquanto no Centro a incidência em 2014 foi de 9 ocorrências (2,4 por km2). A concentração de desastres na Av. Gustavo Richard observada em 2013 não se repetiu em 2014.

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Figura 4: Georreferenciamento dos desastres com óbito no trânsito em Florianópolis, 2014: área de concentração 4 - Via Expressa Sul.

A área próxima ao elevado entre a Via Expressa Sul e a SC 405 concentrou 8 ocorrências fatais em 2014 - uma incidência de dez desastres por km2.

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Figura 5: Georreferenciamento dos desastres com óbito no trânsito em Florianópolis, 2014: área de concentração 5 - Trevo do CIC.

*Atropelamento por moto, ambos foram a óbito

A outra região crítica para ocorrência de desastres com óbito em 2014 foi próximo ao trevo do CIC, onde houve seis ocorrências (dez por km2) com dez vítimas.

ANÁLISE DE SUB-GRUPO: DESASTRES ENVOLVENDO ÁLCOOL

Dos 51 desastres de trânsito com óbito ocorridos em 2013 em Florianópolis, em pelo menos 22 (43,1%) os membros do GI do Projeto Vida no Trânsito conseguiram evidenciar o álcool como fator de risco para sua ocorrência. A partir de dados referentes a 2014, em pelo menos 25 dos 71 desastres com óbito (35,2%) havia envolvimento do álcool - embora em outros 18 eventos não se conseguiu as informações para confirmar ou excluir esse fator de risco.

Tabela 1. Número de desastres de trânsito com óbito, ocorridos em Florianópolis/SC, em que foi identificada a presença do fator de risco álcool

2013 2014

Total de desastres de trânsito associados ao álcool

22 25

Turno noite (18h - 6h) 19 (86,4%) 21 (84%)

Dia da semana 5ª, sábado ou domingo (68,2%)

5ª, sábado ou domingo (92%)

Veículo mais envolvido Carro (77,3%) Carro (80%)

Excesso de velocidade concomitante

8 (33,7%) 6 (24%)

Locais mais frequentes 5 na SC 401, 4 na SC 401,

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3 na Via Expressa 4 na SC 405

Fonte: Grupo de Informação, Rede Vida no Trânsito - 2013/2014.

Os desastres de trânsito acima caracterizados causaram 24 vítimas fatais em 2013 (45,3%) e 32 (38,1%) em 2014.

Gráfico 6. Desastres de trânsito, de acordo com o indivíduo que estava alcoolizado, e que resultou em vítima fatal, Florianópolis/2014

Fonte: Grupo de Informação, Rede Vida no Trânsito - 2014.

Em relação aos óbitos acima deve ser ressaltado que o álcool foi identificado como fator de risco para o desastre, mas nem sempre era a vítima quem estava alcoolizada.

Tabela 2. Número de óbitos em decorrência de desastres de trânsito ocorridos em Florianópolis/SC, em que foi identificada a presença do fator de risco álcool

2013 2014

Total de óbitos associados ao álcool

24 32

Sexo masculino 21 (87%) 24 (75%)

Faixa etária mais presente (21-40 anos)

16 (67%) 15 (47%)

Meio de locomoção da vítima

Moto (41,7%),Carro (37,5%)

Moto (43,8%),Carro (28,1%)

Fonte: Grupo de Informação, Rede Vida no Trânsito - 2013/2014.

Embora a motocicleta tenha sido o veiculo que apresentou o maior percentual de vitimas fatais, 41,7% e 43,8%, respectivamente, chama a atenção na análise o fato do automóvel ser o veículo com o maior envolvimento neste tipo de desastre, respondendo por percentuais superiores a 70% em ambos os anos (tabela 1).

Mais de um quarto dos óbitos em 2014 (22) foram atropelamentos; 9 dentre estes (40,9%) estiveram relacionados ao consumo de álcool e em pelo menos 7 casos era o

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pedestre quem estava alcoolizado. Mais da metade desses pedestres alcoolizados tinham mais de 44 anos.

Conclusão

A colaboração intersetorial dos membros da Rede Vida no Trânsito participantes do GI tem permitido uma avaliação mais rica dos eventos fatais do trânsito de Florianópolis do que cada instituição conseguia fazer isoladamente. A agregação de colaboradores e diferentes bancos de dados a este grupo pode ampliar a capacidade de análise e dirimir as lacunas de conhecimento encontradas, permitindo uma melhor aproximação da realidade deste importante problema de saúde pública.

As informações avaliadas, embora com as limitações citadas, identificaram forte associação entre óbitos no trânsito e o período noturno, o uso de álcool e o excesso de velocidade, informações que devem embasar e aumentar a eficiência das medidas de fiscalização. Ao mesmo tempo, pensar em estratégias que incluam os pedestres, tendo em vista o número de vítimas que foram a óbito por atropelamento.

Os problemas de infraestrutura, especialmente nas áreas críticas identificadas pelo georreferenciamento, precisam ser avaliados pelos órgãos competentes, a fim de diminuir os riscos à vida dos usuários do trânsito.

Há necessidade de revisão da intervenção junto aos condutores de motocicletas, que representam quase metade dos óbitos no trânsito em 2014, especialmente considerando o impacto das atitudes imprudentes no trânsito e, em especial, a ausência de habilitação para conduzir as motocicletas, fatores importantes associados ao óbito destas pessoas.