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COMPORTAMENTO SUICIDA EM CRIANÇAS: ESTUDO DOS COMPORTAMENTO SUICIDA EM CRIANÇAS: ESTUDO DOS COMPORTAMENTOS AUTO-DESTRUTIVOS NA INFÂNCIA COMPORTAMENTOS AUTO-DESTRUTIVOS NA INFÂNCIA

Suicídio na Infânica Congresso Internacional de Suicidologia 2008 Belo Horizonte

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COMPORTAMENTO SUICIDA EM CRIANÇAS: ESTUDO DOS COMPORTAMENTO SUICIDA EM CRIANÇAS: ESTUDO DOS COMPORTAMENTOS AUTO-DESTRUTIVOS NA INFÂNCIACOMPORTAMENTOS AUTO-DESTRUTIVOS NA INFÂNCIA

A realização deste trabalho se justificativa pela necessidade de compreender e esclarecer as diferenças existentes entre o comportamento suicida em criança dos presentes em adolescentes e adulto.

Temos como objetivo realizar uma revisão bibliográfica sobre comportamento suicida na infância, identificando os diferentes conceitos e fatores envolvidos nos fenômenos e, a luz desses conceitos discutir clinicamente quatro casos de atos suicidas cometidos por crianças .

Nosso objetivo específico é compreender a concepção de morte da criança em diferentes fases de seu desenvolvimento e quais influências estes fatores exercem nos comportamentos suicidas na infância.

A palavra suicídio tem sua origem no latim sui cardere e etimologicamente significa matar a si mesmo

(sui = si mesmo; caedes = ação de matar)

Foi utilizada pela primeira vez por Desfontaines em 1737

Significa a morte intencional auto-infligida

Quando a pessoa, por desejo de escapar de uma situação de sofrimento intenso decide tirar sua própria vida.

O comportamento suicida, é um continuum que se inicia em:

- pensamentos de autodestruição,

- passando por ameaças,

- gestos,

- tentativas de suicídio e

- ato suicidia.

Este conjunto de comportamentos necessariamente não se apresentam em ordem de fatores sobrepostos, e podem apresentar uma amplitude maior do que o descrito acima.

Segundo a Organização Mundial da Saúde o suicídio constitui um problema de saúde pública e é responsável por quase a metade de todas as mortes violentas, correspondendo à quase um Milão de vítimas ao ano.

O suicídio encontra-se entre as 10 principais causas de morte no mundo.

Nos países desenvolvidos, representa de 1 a 2% de todas as mortes.

No Brasil a ocorrência está próxima de 1%, sendo que deste total, cerca de 3 a 4% são adolescentes e jovens adultos.

As estimativas indicam que em 2020 as vítimas podem chegar a 1,5 milhões de pessoas em todo mundo.

Levantamentos realizados apontam que crianças têm notavelmente uma baixa taxa de morte por suicídio.

Provavelmente isto ocorra pela ausência de relatos de crianças que cometem suicídio ou pela dificuldade em interpretar as situações em que as crianças apresentam comportamento suicida.

Provavelmente estas taxas também refletem a inabilidade da criança em conceituar e compreender a morte e relacioná-la ao comportamento suicida.

Embora a morte por suicídio em crianças mostre-se estatisticamente um evento raro, o comportamento suicida ou de autodestruição parcial não é.

Um estudo realizado aponta que 33% de um grupo de 39 crianças selecionadas randomicamente em uma clínica haviam ameaçado ou tentado suicídio (NISBERT2000).

Em 1970, o Centro Nacional para Estatísticas de Saúde, nos Estados Unidos (NCHS), informou oficialmente que a taxa de suicídio em crianças de 5 a 14 anos era de 3 por 100,000.

Em 1986, a taxa era de 8 por 100,000, um aumento de 267%.

Dez anos depois, em 1996, a taxa permaneceu em oito, o que significa aproximadamente 302 suicídios por ano.

Certamente não existe uma causa única que levem crianças a cometerem atos suicidas em sua vida.

É necessário uma investigação profunda de quais seriam as condições que se configuram necessárias para produzir ou favorecer a aparição do fenômeno, assim como os fatores que influem na sua origem e as forças favoráveis ou desfavoráveis para o surgimento.

Compreendendo este conjunto: condiçãocondição, , fatorfator e e influênciainfluência poderemos configurar uma compreensão etiológica do comportamento suicida na infância de maneira abrangente.

O Comportamento Suicida na Infância

O comportamento suicida pode ser o resultado final de uma série de fatores que interagem durante a vida do indivíduo, constituindo-se numa complexa rede de influências.

Podemos citar como elementos desta rede:- fatores genéticos / biológicos- psicológicos - sociais- históricos e culturais.

Estes aspectos são interligados e articulados entre si

Predisposição genética e fatores biológicosPredisposição genética e fatores biológicos

Estudos genéticos-epidemiológicos tem sugerido de modo consistente a significância do componente genético no comportamento suicida em geral, entretanto o modo exato de como os genes aumentam a predisposição de comportamento suicida ainda é desconhecido.

Apesar da participação do componente genético na etiologia do comportamento suicida ser considerável, esta carga genética não é específica ao suicídio, muito menos à psicopatologia subjacente freqüentemente vista nestes casos.

Predisposições psicopatológicasPredisposições psicopatológicas

O comportamento suicida em crianças pode estar associado a desordens psiquiátricas, tais como a depressão, distúrbios de conduta, desajustes específicos do desenvolvimento e dificuldades no ajustamento.

A depressão aparece com mais freqüência nos comportamentos suicidas na infância, a severidade da depressão está associada a severidade das tendências suicidas.

Crianças que tentam suicídio, freqüentemente informam que se sentiam tristes, desesperadas e desprezíveis.

Fatores psicológicosFatores psicológicos

A etiologia psíquica pode ser dividida em dois grupos:

Os fatores essenciais referem-se às condições essenciais para o aparecimento das perturbações psíquicas, tais como conhecimento da estrutura psíquica, as relações de objeto, e a problemática do desenvolvimento instintivo

Os fatores gerais tratam-se dos predisponentes e coadjuvantes, não absolutamente necessários para a produção das perturbações psíquicas, porém cuja presença favorece a eclosão das mesmas ao somar-se aos fatores essenciais

Fatores EssenciaisFatores Essenciais Fatores GeraisFatores Gerais

Podemos afirmar que se mantém fortalecida a convicção de que durante meio século ou mais, as afirmações de uma escola de pensamento, liderada por Adolf Meyer, que acreditava que as experiências na infância desempenham um papel importante na determinação da propensão de um indivíduo para desenvolver ao longo da vida uma doença mental, e seguindo esta linha podemos estar diante de situações que colaboram para o estabelecimento de uma estrutura psíquica comprometida desde a infância.

Como conseqüência de fatores essenciais presentes na etiologia psicológica de comportamentos suicidas enumeraremos aqui aquelas que ajudam a determinar o potencial do comportamento suicida da criança.

- Inabilidade para aceitar mudanças necessárias

- Intolerância para separação

- Simbiose sem empatia

- Fixação em padrões infantis na relação primária

- Dificuldade para elaborar situações passadas traumáticas

Influências do período do desenvolvimento Influências do período do desenvolvimento cognitivo na concepção de morte cognitivo na concepção de morte

As diferenças existentes em cada período do desenvolvimento cognitivo da criança resulta em maneiras distintas no modo como a criança compreende e percebe a morte, a maneira como formula seus conceitos, e como organiza sua agressividade dentro de situações específicas.

Dimensões do Conceito de MorteDimensões do Conceito de Morte

Irreversibilidade

compreensão de que o corpo físico não pode viver depois da morte. Portanto, inclui o reconhecimento da impossibilidade de

mudar o curso biológico ou de retornar a um estado prévio.

Não-funcionalidade

Compreensão de que todas as funções definidoras da vida cessam com a morte.

Universalidade

Compreensão de que tudo que é vivo morre.

O conceito de morte também pode ser compreendido através de dois pontos essenciais:

- percepção da ausência

- permanência desta ausência

Distribuídas pela idade cronológica da criança

1. Fase de incompreensão total (0 a 2 anos);2. Fase abstrata de percepção mítica da morte (2 a 4-6 anos);3. Fase concreta de realismo e de personificação (até 9 anos);4. Fase abstrata de acesso à angústia existencial (a partir de 10-11

anos).

Dimensões do Conceito de MorteDimensões do Conceito de Morte

Concepção de morte através dos estágios do Concepção de morte através dos estágios do desenvolvimento cognitivodesenvolvimento cognitivo

Sensório-motor (infância)

Não há conceito de morte para a criança

Pré-operacional

As crianças não fazem distinção entre seres inanimados e animados e têm dificuldade para perceber uma categoria de elementos inorgânicos que, portanto não vive e não morre. As crianças não negam a morte, mas é difícil separá-la da vida; atribuem a fatores externos a impossibilidade de viver. Não percebem a morte como definitiva e irreversível.

Concepção de morte através dos estágios do Concepção de morte através dos estágios do desenvolvimento cognitivodesenvolvimento cognitivo

Operações concretas

A morte é irreversível, com explicações fisiológicas. As crianças distinguem entre animais animados e inanimados, mas não dão respostas lógico-categoriais de causalidade da morte; buscam aspectos perceptivos como a imobilidade para defini-la.

Concepção de morte através dos estágios do Concepção de morte através dos estágios do desenvolvimento cognitivodesenvolvimento cognitivo

Operações formais

Pré-adolescência As crianças reconhecem a morte como um processo interno, implicando em parada de atividades do corpo. Percebem-na como universal, podendo dar explicações lógico-categoriais e de causalidade. As explicações são de ordem natural, fisiológica e teológica. A morte é definida como parte da vida.

Concepção de morte através dos estágios do Concepção de morte através dos estágios do desenvolvimento cognitivodesenvolvimento cognitivo

A criança tem consciência da morte desde o início da infância, porém isto é expresso através dos recursos que a criança tem em cada época de seu desenvolvimento[i]. Geralmente a criança representa a morte através de atividades lúdicas, nem sempre ela fala de maneira clara e aberta. O trabalho psicanalítico com crianças demonstra que elas percebem fatos que lhe são ocultados e geralmente não expressam verbalmente.

[i] ABERASTURY, A. A percepção da morte na criança e outros escritos Porto Alegre, Artes Médicas, 1984.

Concepção de morte psicanalíticaConcepção de morte psicanalítica

O estudo de como a criança desenvolve o conceito de morte deve ir além de uma compreensão que parte apenas das variáveis de idade cronológica ou de desenvolvimento cognitivo, deve-se acrescentar à esta tentativa a ponderação dos fatores que justificam as diferenças individuais do desenvolvimento, e de certas circunstâncias ou condições vivenciadas por certas crianças, tais como perda, doença terminal, tendência suicida, privação socioeconômica e cultural, etc., podem afetar a compreensão da morte. (Torres, 1999)

Fatores sócio-culturais (Familiares)Fatores sócio-culturais (Familiares)

Certas características do ambiente familiar são comuns no comportamento suicida de crianças.

Crianças que tentaram suicídio ou apresentaram pensamento suicida descreveram suas famílias como menos aderente, menos expressiva, e mais conflitante do que crianças que não apresentaram comportamento ou pensamento suicida.

Geralmente o comportamento suicida acontece em um contexto intensamente estressante, em famílias desorganizadas, conflitos entre os pais, pessoas com desordens afetivas, altos índices de alcoolismo.

As relações familiares podem apresentar conflitos de papel e a excessiva proibição de uma relação de intimidade familiar isola a pessoa potencialmente suicida.

As influências familiaresAs influências familiares

Crianças suicidas distinguem-se de outras crianças pela severidade das perdas a que é submetida, tais como aquelas em que predominam a tensão por violência parental, abuso sexual e psicopatologia.

As características destas famílias freqüentemente colaboram para produzir uma atmosfera negativa que afeta o desenvolvimento de personalidade da criança

MÉTODOLOGIAMÉTODOLOGIA

Sujeitos - O sujeitos dessa pesquisa foram duas crianças que apresentaram

comportamento suicida em relatos clínicos ou que procuraram serviço médico em decorrência do ato suicida.

- Elas estão denominadas neste trabalho de sujeito A e B.- Os sujeitos estavam na faixa etária de 6 e 7 anos.- A escolha dos sujeitos considerou os seguintes critérios: - Manifestaram o desejo de morte - Manifestaram o desejo de morte por suicídio - Procuraram serviço institucional solicitando auxílio para lidar com dificuldades relacionadas à criança - Crianças que apresentaram comportamento suicida (com ou sem dano)- A meta é entrevistar quatro crianças que atendam os critérios

estabelecidos

Instrumentos

A pesquisa foi realizada através de entrevista aberta, direcionada para os temas, abordados na autopsia psicológica proposta por Werlang (2000).

- Informações sobre a identidade da vítima (nome, idade, endereço, religião, escolaridade)

- Detalhes do comportamento suicida- Breve esboço da história do sujeito (irmãos, pais, condições

do casamento dos pais)- História de morte de membros da família- Padrões típicos da vítima de reação ao estresse,

incomodações pessoais e desequilíbrio- Aspectos estressantes recentes- Natureza dos relacionamento interpessoais do sujeito- Fantasias, sonhos, pensamentos, premonições ou medos do

sujeito em relação à morte, acidente ou suicídio- Avaliação da intenção, isto é, papel do sujeito em sua própria

morte

Procedimentos

A pesquisa foi realizada em consultório psicológico, com horário marcado e tempo predeterminado de 50 minutos.

Os dados foram coletados através de uma entrevista semi-dirigida.

As entrevistas foram gravadas e transcritas, tendo em vista a omissão de especificidades da língua, como pausas, gritos, gestos, etc.

Trechos da transcrição foi utilizada para a discussão do caso e conclusão.

Análise de dados

Os dados colhidos serão analisados a partir da comparação entre o tema abordado na revisão bibliográfica e os fatos relatados pelo sujeito. Os temas presentes nos relatos serão selecionados e discutidos, partindo dos pressupostos presentes na literatura para cada uma das situações encontradas nos dados colhidos.

História do sujeito AHistória do sujeito A

O sujeito A é uma criança de 7 anos de idade, do sexo masculino, estudante do ensino básico, residente em uma cidade do Interior do Estado de São Paulo com 70 mil habitantes. Reside com avó materna, juntamente com sua mãe e sua irmã de 1 ano e 6 meses.A entrevista foi realizada com avó que apesar de não ter a guarda judicial do sujeito, desde o seu nascimento é a responsável pela criança. Os pais do sujeito A nunca viveram juntos, sua mãe engravidou aos 15 anos de idade e permaneceu residindo com a mãe (avó do sujeito). Atualmente o Pai do sujeito está detido cumprindo pena por furto e tráfico de drogas.O sujeito A sempre foi uma criança peralta, nervosa, birrenta, chorona e com “complexo de inferioridade”; também diz que é inteligente e com bastante “imaginação”.O menino sempre falou em se matar sob a justificativa de que não possuía tudo o que desejava. Num determinado momento, sem motivo aparente, pegou uma faca na cozinha e levou-a ao pescoço; a avó que estava na cozinha surpreendeu-se com a situação a gritou para o menino parar. O avô materno que também estava em casa agrediu-o com um tapa no rosto.

História do sujeito AHistória do sujeito A

O menino tinha no local da agressão um ferimento em cicatrização que começou a sangrar, percebendo o sangue caiu imóvel no chão, permanecendo sem reações por alguns segundos, fato que deixou os avós desesperados. Este evento ocorrera num período em que sua mãe fora trabalhar em uma cidade da região. Ela passou a residir no serviço, o qual a família veio descobrir posteriormente que se tratava de uma casa de prostituição. O evento da mudança de endereço da mãe foi marcado pelo abandono do lar e do menino; a mãe foi embora sem despedir-se, deixando apenas um bilhete e levando a irmã mais nova do sujeito. Além do abandono repentino, o sujeito sempre sofreu de maus-tratos pela sua mãe, a violência sofrida configura-se por agressões físicas, ameaças, ofensas e chantagens emocionais.Após o abandono da mãe, o menino expressava verbalmente que sentia saudades da mãe e da irmã, “pegava fotos da irmã e chorava” e começou a falar que ia se matar. Seu comportamento mudou, aumentando suas birras e recusando freqüentar a escola. Reside com a mãe de 33 anos e irmã de 14 anos na residência da avó materna.

Apresentação dos dados coletados do sujeito BApresentação dos dados coletados do sujeito B

O sujeito B é uma criança de 11 anos de idade, do sexo masculino, estudante da 5a série do ensino fundamental, residente em uma cidade do Interior do Estado de São Paulo com aproximadamente duzentos mil habitantes.A entrevista foi realizada com a mãe que detém a guarda do menino. O sujeito é uma criança com características de liderança entre os colegas. Estabelece amizades com facilidade e é bastante sociável. Inteligente e tem um bom desempenho escolar. Entretanto expressa claramente momentos de insegurança e carência afetiva.É o filho mais novo do casamento, a mãe tem o nível de escolaridade superior e é funcionária de uma universidade privada, o pai morreu em um acidente automobilístico quando voltava para casa, na ocasião o sujeito tinha 4 anos. Após o falecimento do marido, a mãe do sujeito não se relacionou afetivamente com outro homem.Na ocasião do falecimento do pai o sujeito apresentou regressão e a criança passou a falar como bebê e perdeu o controle esfincteriano. Sempre falava que queria morrer. Trancava-se no quarto e por várias vezes a mãe retirou objetos cortantes como faca ou estilete escondido em sua cama. Passou a apresentar crises de auto-agressão.

Apresentação dos dados coletados do sujeito BApresentação dos dados coletados do sujeito B

Desde o falecimento do pai o menino faz tratamento medicamentoso com psiquiatra, não fez psicoterapia até o momento.O menino, por decisão da mãe não ficou sabendo da morte do pai e nem do sepultamento ocorrido em capital de outro estado distante. A criança somente foi informada quando a mãe retornara dos rituais. Ao receber a notícia o menino permaneceu indiferente, após algum tempo é que as queixas de regressão, auto-agressão e ideação suicida se estabeleceram.O seu comportamento suicida apresentou o ponto crítico quando se trancou no quarto do apartamento em que residia, no oitavo andar e ameaçou jogar-se da altura. Sua atitude foi notada pelo porteiro do prédio que alertou a babá que solicitaram auxílio do corpo de bombeiros. Depois deste episódio não ocorreu nenhuma ameaça grave, com exceção dos objetos que esconde em seu quarto.